Divulgação: Música Rara Brasileira – Paulo Costa Lima (1954): Pós-Aboio a Três, para trio de cordas – Dvernik – Filipenko – Vendeland

Um dos efeitos colaterais mais previsíveis do jubileu de Beethoven em 2020 foi o aumento de sua já considerável participação no repertório das salas de concerto. Não conheço muitas pessoas capazes de contestar sua importância para a Música, nem de discutir a justiça de celebrar a efeméride. No entanto, era bastante óbvio, natural até, que esse destaque hipertrófico para a obra do renano aconteceria em detrimento de outros repertórios – inclusive, como puderam ver, aqui no PQP Bach. Somem-se a isso as restrições trazidas pela pandemia, e uma tendência a pouco ousar nas programações, e o resultado foi um Ano Beethoven que, bem, foi quase só Beethoven.

Não quero com isso me desculpar por ter publicado tanto Beethoven, e, sim, saudar iniciativas a que lhes apresento a seguir:


“Começa nessa sexta [18/12/2020] a mostra MÚSICA RARA BRASILEIRA – o mais novo projeto do ZENON Instituto Cultural – trazendo a estreia mundial de Pós-Aboio a Três (2020), trio de cordas de Paulo Costa Lima, gravado em Moscou por Daria Dvernik, Darya Filippenko e Yulia Vendeland. Rara porque pouco executada, desconhecida, mas também porque brilhante e inusual, fruto de uma criatividade que precisa ser desvendada. É certo que com a internet temos dado belos passos para conhecer a música brasileira de concerto, mas ainda há muito o que fazer para desembaçar nossa compreensão desse repertório. Ao menos, parece que o estigma, muito corrente algumas décadas atrás, de uma música deslocada no país, que copiaria a Europa e mostraria uma faceta colonizada do Brasil, vai rapidamente perdendo força e abrindo alas para uma realidade mais divertida, rica e cheia de matizes. Ainda assim, mesmo compositores teoricamente consagrados, como Francisco Mignone, César Guerra-Peixe, Claudio Santoro, Alberto Nepomuceno ainda penam para que diversas de suas obras de fôlego sejam tocadas e publicadas. E de muitos outros não conhecemos nem a qualidade nem a variedade da sua produção. A mostra Música Rara Brasileira procura contribuir para a divulgação dessa música, apresentando um repertório de câmara pouco tocado, quase sempre inédito em gravações e/ou inacessível para o público interessado. Em tempos de pandemia e na urgência de dar a conhecer um pouco mais da música brasileira, o Zenon Instituto Cultural se propôs a usar todos os meios disponíveis e uma ampla gama de parcerias para organizar esta mostra. No decorrer dos próximos meses, será apresentado um vídeo por semana, às sextas, no canal do YouTube do instituto, de obras brasileiras dos séculos XX e XXI para pequenas formações — solos, duos, trios e quartetos de instrumentação diversa — gravados nas mais diversas condições: de concertos ao vivo a performances em casa. As peças são interpretadas por brasileiros e estrangeiros, no Brasil, EUA, Rússia, Bulgária e Azerbaijão. Dentre as inúmeras primeiras gravações mundiais realizadas, abrimos com o trio de cordas de Paulo Costa Lima, intitulado Pós-Aboio a Três (2020) e gravado em Moscou por Daria Dvernik, Darya Filippenko e Yulia Vendeland”
“É com enorme alegria que a mostra “Música Rara Brasileira” abre hoje com a obra Pós-Aboio a Três (2020), de Paulo Costa Lima, já que esse trio de cordas foi escrito especialmente para o projeto. Seguem as palavras do próprio compositor acerca dessa criação: ‘O gesto que abre e sustenta a peça vem do campo da violência – a violência como ferramenta de afastamento de um certo ninho de possibilidades expressivas (o canto nordestino do aboio, a música que se diz brasileira, o modo mixolídio e lídio-mixolídio). Todavia, esse afastamento não visa destruir e sim recompor o que foi abandonado, enxergá-lo de longe, por uma fresta. De um discurso original escrito para violoncelo solo (Pós-Aboio) surgiu por decalque (projeção desse discurso nos outros instrumentos) a presente obra, um tanto tensa em sua linearidade, porém fiel ao campo expressivo que persegue, sua ideia motriz.’ A obra foi estreada em concerto, em Moscou, no dia 1° de novembro, por um trio formado pelas russas Daria Svernik (violino) e Yulia Vendeland (cello) e pela violista bielorrussa Darya Filippenko, que tem feito um extenso trabalho de divulgação da música brasileira. Boa audição!”

Para assistir a Pós-Aboio a Três (2020), de Paulo Costa Lima, clique na imagem abaixo:

Para saber mais sobre a mostra MÚSICA RARA BRASILEIRA, siga sua página no Facebook, acessando-a pelo link abaixo:

Para saber mais sobre o ZENON Instituto Cultural, clique em seu logo:


Vassily

BTHVN250 – A Obra Completa de Ludwig van Beethoven (1770-1827) – Der Katzenkorb/O Balaio de Gatos [atualizado em 18/12/2020]

Pensavam que tinha acabado?

Até tinha – mas não para os completistas compulsivos.

ooOoo

Fim de aniversário, pança cheia, ressaca (em vocês que bebem, claro). Chega a hora de arrumar os destroços deixados pelos convivas, a quem despachamos para suas casas com o que restou do festim pantagruélico, de catar, também, objetos aleatórios por eles esquecidos – e, para mim, de ouvir as queixas dos completistas.

Os “gatos” do título são obras de Beethoven que, por vários motivos, não foram publicados no corpo principal de nossa finada série. São, primariamente, só bagatelas e curiosidades, e versões preteridas de peças publicadas. Há, volta e meia, algo de maior valor – como uma versão alternativa do extraordinário movimento de abertura do quarteto em Dó sustenido menor -, mas quase tudo é esquecível. Como sempre haverá o completista pronto a dizer que “ah, tem aquele cânone que Beethoven escreveu para o jornaleiro de Heiligenstadt” ou “ih, vocês esqueceram daquela bagatela que Beethoven deixou como promissória na bodega de Gneixendorf”, achei necessário reunir todas as sobras no mesmo saco, que aqui ficará para quem o quiser abrir.

Esta postagem restará, então, necessariamente inconclusa. Beethoven não era um Hindemith, que praticamente tossia sonatas, mas deixou muita coisa rabiscada e espalhada entre suas tralhas, mas sempre que descobrirem alguma nova obra, e dela houver alguma gravação – e nem que sejam duas notas largadas num papel de embrulho -, eu a colocarei aqui.

Pois bem: o balaio começa com alguns grupos de gatos, que não achei suficientemente importantes para entrarem na série, e termina com os gatos soltos, espremidos num só arquivo que, imaginamos, crescerá vagarosamente nas décadas vindouras.

BEETHOVEN – THE YOUNG PROMETHEUS

Esse LP contém doze estudos de contraponto que Beethoven escreveu durante seus estudos com Kapellmeister Albrechtsberger, alguns dos quais não tinham aparecido antes na série. Eles foram orquestrados por Alex Brott, que também rege a função. A ripagem não é minha, e não consegui as faixas separadamente, então vão os doze gatinhos num faixa só:

1 –  Prelúdio e fuga em Fá maior, Hess 30
2 – Fuga em Lá menor, Hess 238 no. 6
3 – Prelúdio e fuga em Dó maior, Hess 31
4 – Prelúdio e fuga em Mi menor, Hess 29
5 – Fuga coral em Sol maior, Hess 239 no. 3
6 – Fugue em Si bemol maior, Hess 238 no. 5
7 – Fuga alla duodecima, em Ré menor, Hess 243 no. 5
8 – Fuga dupla com três temas em Fá maior, Hess 244 no. 2
9 – Fuga alla duodecima, em Dó maior, Hess 243 no. 4
10 – Fuga em Dó maior, Hess 238 no. 3, seguida por uma repetição de Hess 243 no. 4
11 – Fuga coral em Fá maior, Hess 239 no. 1
12 – Fuga dupla com três temas, em Ré menor, Hess 244 no. 1

The Canadian Broadcasting Corporation Festival Orchestra
Alex Brott, regência

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BEETHOVEN – DAS ORGELWERK

Essa gravação do alemão (difícil ser mais alemão que esse nome) Wilhelm Krumbach deveria chamar-se “Orgelwerke” (“Obras para órgão”), e não “Das Orgelwerk” (“A Obra para Órgão”), porque o disco deixa de fora mais da metade das composições de Beethoven para o instrumento. Em compensação, há o chamado “Ciclo de Fugas sobre Temas de Johann Sebastian Bach”, com algumas fugas que não achei em qualquer outro lugar. O nome é uma propaganda enganosa, pois trata-se duma série de exercícios de contraponto e fuga para Albrechtsberger que jamais se pretendeu que fosse ouvida como um ciclo. Os temas, também, não são de Bach – alguns são do próprio professor, e outros, de Johann Joseph Fux (ca. 1660-1741), autor do Gradus ad Parnassum, o tratado de composição do qual ninguém escapava na época.

“Suíte para órgão” (mais apropriadamente, Peças para um Flötenuhr, WoO 33)
1 – Adagio
2 – Scherzo
3 – Allegro

Prelúdio em Fá menor, WoO 55
4 – Prelúdio

Dois prelúdios em todas as tonalidades, Op. 39
5 – No. 1

Fuga em Dó maior, WoO 215
6 – Fuga

Trio-sonata em Mi menor
7 – Adagio
8 – Fuga

“Ciclo de fugas em Ré menor sobre temas de J. S. Bach”
9 – Fuga a três vozes
10 – Fuga a quatro vozes
11 – Fuga coral a quatro vozes
12 – Fuga dupla
13 – Fuga cromática a 4 vozes
14 – Fuga com três temas

Wilhelm Krumbach, órgão

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Por fim, aqui vão os gatos soltos. As faixas não estão numeradas, e sim organizadas conforme a catalogação, a fim de facilitar reorganizações futuras, se houver adições ao arquivo. Prometo que em breve coloco o nome dos artistas.

Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)

DER KATZENKORB  (“O BALAIO DE GATOS”)

Hess 25 – Finale original do trio para violino, viola e violoncelo em Mi bemol maior, Op. 3
Hess 38 – Arranjo para quinteto de cordas da fuga em Si bemol menor, BWV 867, de “O Cravo bem Temperado” de J. S. Bach
Hess 40 -Prelúdio e fuga para quinteto de cordas em Ré Menor
Hess 41 – Quinteto para cordas em Dó maior (fragmento, arranjo para piano solo) – versão incompleta, diferente da antes publicada, que foi completada por Anton Diabelli
Hess 201 – Bonny Laddie, Highland Laddie (versão com variante na parte de violino)
Op. 108 – 25 canções escocesas, nº 4, The Maid of Isla [1ª versão]
Op. 108 – 25 canções escocesas, nº 4, The Maid of Isla [2ª versão]
Op. 108 – 25 canções escocesas, nº 7, Bonnie Laddie, Highland Laddie [1ª versão]
Op. 108 – 25 canções escocesas, nº 7, Bonnie Laddie, Highland Laddie [2ª versão]
Op. 108 – 25 canções escocesas, nº 11, O! Tu és o rapaz do meu coração [1ª versão]
Op. 108 – 25 canções escocesas, nº 20, Faithfu ‘Johnie [1ª versão]
Op. 131 – Quarteto para cordas nº 14 em Dó sustenido menor – I. Adagio ma non troppo e molto espressivo (versão alternativa)
WoO 18 – Marcha em Fá maior, 2ª versão (Hess 6)
WoO 18 – Marcha em Fá maior, 3ª versão (Hess 7)
WoO 18 – Marcha em Fá maior, Yorkscher Marsch
WoO 19 – Marcha em Fá Maior
WoO 19 – Marcha em Fá maior, 2ª versão (Hess 8)
WoO 19 – Marcha em Fá maior, 3ª versão (Hess 9)
WoO 63 –Nove variações em uma marcha de Dressler – versão revisada em 1803 (fortepiano)
WoO 63 – Nove variações em uma Marcha de Dressler – versão revisada em 1803 (piano)
WoO 64 – Seis variações sobre uma canção suíça em Fá maior – versão para harpa
WoO 116 – Que le temps me dure, WoO 116- 2ª versão (Hess 130)
WoO 153 – 20 canções irlandesas, nº 13, ‘Tis Sunshine at Last
WoO 153 – 20 canções irlandesas, nº 11, When Far from the Home [versão alternativa]
WoO 153 – 20 canções irlandesas, nº 12, I’ll Praise the Saints [1ª versão]
WoO 153 – 20 canções irlandesas, nº 15. ‘Tis But in Vain, for Nothing Thrives
WoO 153 – 23 canções irlandesas, nº 5, I Dream’d I Lay Where Flow’rs Were Springing
WoO 154 – 12 canções irlandesas, nº 9, Oh! Would I Were but That Sweet Linnet  [1ª versão]
WoO 155 – 26 canções galesas, nº 7, O Let the Night My Blushes Hide [2ª versão]
WoO 155 – 26 canções galesas, nº 14, The Dream [1ª versão]
WoO 155 – 26 canções galesas, No. 19, The Vale of Clwyd [1ª versão]
WoO 155 – 26 canções galesas, nº 20, To the Blackbird [1ª versão]
WoO 158a – 23 canções de várias nacionalidades, nº 19, Una paloma blanca [1ª versão]
WoO 209 – Minueto em Lá Bemol Maior, para quarteto de cordas

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#BTHVN250, por René Denon

Vassily

BTHVN250 – Beethoven Reimagined – Prokofiev – Segal


Bem, para a saideira do BTHVN250 eu escolhi um disco que talvez ponha a perder todo crédito que possa ter ganhado junto a vocês em função de meu trabalhão de trazer-lhes a obra completa do renano.

O disco começa relativamente convencional, com um bom arranjo da sonata para violino, Op. 30 no. 2, reimaginada como peça orquestral pelo regente Yaniv Segal e por Garrett Schumann, que não tem relação com o saxão. Em seguida, uma engenhosa suíte de Fidelio que nos conduz em meia hora, e de modo muito eficiente, por toda narrativa da mais obra mais complicada que Beethoven pariu. Um Fidelio com restrições orçamentárias? É, talvez.

Por fim…

Ok, confesso que olhei a palavra remix e esperei o pior. Gabriel Prokofiev? “Compositor e DJ russo”, respondeu-me a googleada… Hmmmm, DJ com sobrenome de compositor? Fui ver, e constatei que Gabriel é filho de Oleg Sergeievich, que é filho de…

Sim: Sergei Sergeievich.

Acabou que Gabriel é neto do homem. Resolvi dar-lhe uma chance, nem que fosse pelo pedigree, e admito que me surpreendi. Seu Beethoven9 Symphonic Remix é uma manipulação eletrônica da Nona que, embora imagine que vá soar herética à maioria de vós outros, soou-me melhor que a expectativa. Não sei se a posso recomendar, mas, por via das dúvidas, eu a postarei às três da madrugada e… sairei correndo.

Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)

Sonata para violino e piano em Dó menor, Op. 30 no. 2
Orquestrada por Garrett Schumann (1987) e Yaniv Segal (1981)

1 – Allegro con brio
2 – Adagio cantabile
3 – Scherzo: Allegro
4 – Finale: Allegro


Yaniv Segal (1981), sobre obra de Ludwig van BEETHOVEN

A Fidelio Symphony, para orquestra, baseada na ópera Fidelio de Ludwig van Beethoven

5 – I. Einleitung
6 – II. Aktion
7 – III. Apotheose


Gabriel PROKOFIEV (1975)

Beethoven9 Symphonic Remix

8 – I. Presto
9 – II. Allegro assai
10 – III. Freunde, haben wir ein neues Babel: Presto
11 – IV. Freude Schöner GötterFUNKen: Allegro assai
12 – V. Über Sternen (Beyond Stars): Andante Maestoso a mezzo tempo
13 – VI. Alla marcia
14 – VII. Ode finale: Molto vivace ma tranquillo

Gabriel Prokofiev, eletrônicos
BBC National Orchestra of Wales
Yaniv Segal, regência

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Vassily

 

 

BTHVN250 – Inspirados por Beethoven (Andriessen – Dean – Lindberg – Oehring – Rouse – Turnage)

Calma: estamos quase arrematando nossa homenagem a Beethoven pelo natalício. Como prometemos folga ao velho homem, deixaremos alguns de seus colegas contemporâneos aqui mostrarem a que vieram e o que fizeram com que Ludwig nos deixou.

Para começar, duas obras do australiano Brett Dean – que estudou na Alemanha e foi violista da Filarmônica de Berlim. Testament, naturalmente, refere-se ao Testamento de Heiligenstadt e aborda as sensações e sentimentos de Beethoven ante a inexorável surdez. A abertura, com sussurros do sopros e cordas tocadas com arcos sem breu, evoca a respiração do compositor e sua pena a singrar o papel. A irrupção de temas do primeiro dos quartetos “Razumovsky”, com o brilhante fugato, lembra a firme resolução com que, depois contemplar o suicídio, deixou Heiligenstadt para os vinte e cinco anos que lhe restaram de vida. Pastoral Symphony costuma, claro, ser pareada com a Sexta Sinfonia do renano. Após uma bucólica abertura festiva, surgem os sons que sugerem a devastação da Natureza que Beethoven evocou, e que o próprio Dean encontrou quando voltou para a Austrália. Em suas próprias palavras, “levem em conta nosso incansável e desrespeitoso saque das florestas e áreas selvagens do mundo, tudo em nome de mais consumo, autoestradas, estacionamentos e conveniência… Essa peça é sobre o glorioso canto dos pássaros, a ameaça que ele sofre, a perda, e o ruído sem alma que nos resta quando eles terminarem”.

O alemão Helmut Oehring, filho de surdos, cresceu com todos motivos para admirar e compreender Beethoven. Em GOYA I – Yo lo vi, ele lembra as trajetórias paralelas do renano e de seu contemporâneo espanhol, Francisco de Goya, cujas surdezes começaram na mesma época, levando-os ao isolamento. A atração inicial e posterior rejeição aos ideais napoleônicos também é abordada na obra, bem como os testemunhos oculares que ambos foram dos horrores da guerra (Yo lo vi refere-se a uma famosa gravura de Goya, que representa uma dramática cena com vítimas civis). Há citações da Eroica e da Vitória de Wellington – representativas da desilusão com Napoleão e da celebração de sua derrota -, bem como de concertos para piano e do sublime quarteto Op. 132. Os Two Episodes do finlandês Magnus Lindberg, por sua vez, servem como prelúdio para a Nona Sinfonia. Escritos para as mesmas forças orquestrais da obra mais velha, eles evocam, em ordem, o poderoso tutti do primeiro movimento e o Adagio molto e cantabile, numa homenagem ao compositor que, para Lindberg, “sempre representou o que significa ser um compositor contemporâneo”.

A provocativa The nine symphonies of Beethovende Louis Andriessen, foi composta para “orquestra e sineta de sorveteiro”. Estreada em 1970, durante o bicentenário do compositor, ela não manifesta qualquer objeção a Beethoven, e sim acerca da predominância de suas sinfonias no repertório, em detrimento de música contemporânea. Ela é, grosso modo, um mexidão das nove sinfonias em ordem cronológica, com intervenções de outros gêneros mais modernos (alguns ultramodernos), das onipresentes Pour Elise Sonata ao Luar, uma participação especial do Barbeiro de Sevilha e, claro, da sineta do sorveteiro.

Nossa compilação se encerra com duas obras de maior escopo. A primeira, a Sinfonia no. 5 do estadunidense Christopher Rouse, serve como homenagem explícita ao renano, que primeiro o impressionou aos tenros seis anos, justamente com sua Quinta Sinfonia. Quando chegou a sua vez de escrever sua Quinta, Rouse resolveu abri-la com a mesma famosa célula rítmica da contraparte, seguindo um plano semelhante ao dela, embora com linguagens completamente diferentes. Por fim, Frieze, de Mark-Anthony Turnage, cujo nome se refere ao “Friso Beethoven” de Gustav Klimt, obra fundamental do Palácio da Secessão em Viena,  foi composta para servir de prelúdio à Nona Sinfonia a pedido da mesma Royal Philharmonic Society que primeiramente a encomendou ao renano, e segue em seus quatro movimentos os mesmos estados de ânimo da obra icônica.


Brett Dean (1961)

1 – Testament, para orquestra de câmara (2008)

Tasmanian Symphony Orchestra
Sebastian Lang-Lessing, regência

2 – Pastoral Symphony, para orquestra de câmara (2000)

Svenska Kammarorkestern
H. K. Gruber, regência


Helmut OEHRING (1961)

3 – GOYA I – Yo lo vi, para orquestra (2006)

SWR Symphonieorchester
Rupert Huber, regência


Magnus LINDBERG (1958)
Two Episodes (2016)

4 – No. 1
5 – No. 2

Finnish Radio Symphony Orchestra (Radion sinfoniaorkesteri)
Hannu Lintu, regência


Louis ANDRIESSEN (1939)

6 – The nine symphonies of Beethoven, para orquestra e sineta de sorveteiro (1970)

Holland Festival Orchestra
Louis Andriessen, regência

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Christopher ROUSE (1949-2019)

Sinfonia no. 5 (2017)

Nashville Symphony Orchestra
Giancarlo Guerrero, regência

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Mark-Anthony TURNAGE (1960)

Frieze, para orquestra (2012)

01 – I. Hushed and Expansive
02 – II. With Veiled Menace
03 – III.♩= 60
04 – IV.♩= 120

New York Philharmonic
Alan Gilbert,
regência

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Vassily

 

BTHVN250 – John Adams (1947) – Absolute Jest – Roll over Beethoven – Oundjian – Havlat – Moore


John Adams (1947) é um dos mais interessantes compositores de nossa época. Sua devoção pela obra de Beethoven (seu compositor favorito, junto com Bartók) despertou muito cedo, e iniciou por onde os fãs de Ludwig costumam terminar: os quartetos de cordas, principalmente as cinco obras-primas da maturidade (seis, se contarmos a Grande Fuga). Os dois quartetos de cordas de Adams refletem essa forte influência, sem tentar emulá-la – até porque ele, enfim, sabe do que Beethoven é feito.

Entre suas obras recentes, Absolute Jest (2011) é uma das que se baseiam literalmente em obras de Beethoven. Este scherzo para quarteto de cordas e orquestra usa fragmentos – às vezes, meros gestos – dos grandes quartetos Opp. 131 e 135 e da Grande Fuga supracitada. A quase meia hora de composição é uma jornada frenética, à altura das melhores obras de Adams, em que as partículas beethovenianas surgem, espalham-se e reagrupam-se das maneiras mais surpreendentes. O compositor sempre admirou a “energia extática” de Beethoven e como ele era “mestre em tomar a mínima quantidade de informação e transformá-la em estruturas fantásticas, expressivas e energizadas”. A julgar por esta gravação, capitaneada por alguém que conhece muito bem os quartetos do renano – Peter Oundjian, o primeiro violino do Tokyo String Quartet em sua melhor formação -, Adams segue com dedicação os passos do mestre, que, não duvido, aprovaria o resultado.

A outra obra de Adams que lhes trago, Roll over Beethoven (2012), apesar do nome, nada tem de chuckberryano, além da energia. Baseado no Second Quartet, a partir do qual foi habilmente transcrito por Preben Antonsen para dois pianos, ele devolve aos teclados os fragmentos de temas tomados à sonata Op. 110 e às Variações Diabelli para desenvolvimento no quarteto de cordas. Adams pretendia levar “esses pequenos fractais musicais para um grand tour duma sala de espelhos harmônica e rítmica”. Cheia de dinamismo e muito transparente, parece-me mais bem-sucedida que o próprio Second Quartet e é uma adição formidável ao repertório para a formação.

John ADAMS (1947)

Absolute Jest, para quarteto de cordas e orquestra (2011)

1 – Beginning
2 – Presto
3 – Lo stesso tempo
4 – Meno mosso
5 – Vivacissimo
6 – Prestissimo

Doric String Quartet
Royal Scottish Symphony Orchestra
Peter Oundjian, regência

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Roll over Beethoven, para dois pianos
Arranjo de Preben Antonsen (1991)

1 – Allegro molto
2 – Andantino

Joseph Havlat e Philip Moore, pianos

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Vassily

BTHVN250 – Reflections (Shchedrin – Šerkšnytė – Staud – Mochizuki – Kancheli – Widmann) – Jansons

No jubileu do grande homem, deixemo-lo descansar – e que ele receba homenagens dos compositores, cujo ofício foi revolucionado pela marcante passagem do renano por esse mundo.

Ao gravar sua integral das sinfonias de Beethoven com os bávaros da rádio, ocorreu ao maravilhoso Mariss Jansons encomendar a compositores contemporâneos algumas reflexões sobre o Mestre. As respostas, que ouvirão no disco a seguir, não só comentam as sinfonias, como também tentam evocar sentimentos e sensações associadas a Beethoven.  Não à toa, o Testamento de Heiligenstadt e a surdez lhes são temas recorrentes.

Maniai (“Fúrias), de Johannes Maria Staud, por exemplo, evoca a espiral descendente de cólera em que Beethoven mergulhou ao constatar a surdez, entre a composição da Primeira e da Segunda sinfonias. Rodion Shchedrin, em contrapartida, oferece uma peça que se projeta das trevas para a luz, como se o desespero e a contemplação suicida de Heiligenstadt se transfigurassem na resolução de viver (e sobreviver) através da Arte. Fires, da lituana Raminta Šerkšnytė, conjura sons associados à própria perda auditiva, enquanto Dixi (“Eu disse”), do georgiano Giya Kancheli, serve como eloquente comentário à Nona Sinfonia.

Ainda que as obras sustentem-se bem por si sós, elas foram concebidas para serem ouvidas em determinados lugares dentro da série de sinfonias de Beethoven. Assim, sugiro que, depois de baixarem o disco, aproveitem os links que disponibilizarei logo abaixo para as gravações das sinfonias, a fim de que possam desfrutar dessas instigantes reflexões dentro dos contextos pretendidos por seus compositores.

Johannes Maria STAUD (1974)

1 – Maniai
[ouvir entre a Primeira e a Segunda Sinfonias]

Misato MOCHIZUKI (1969)

2 – Nirai
[ouvir entre a Segunda e a Sexta Sinfonias]

Rodion Konstantinovich SHCHEDRIN (1932)

3 – Beethovens Heiligenstadter Testament, fragmento sinfônico para orquestra
[ouvir após a Terceira sinfonia]

Raminta ŠERKŠNYTĖ (1975)

4 – Fires I. Misterioso
5 – Fires II. Con brio
[ouvir antes da Quinta Sinfonia]

Giya KANCHELI (1935-2019)

6 – Dixi, para coro e orquestra
[ouvir após a Nona Sinfonia]

Jörg WIDMANN (1973)

7 – Con brio, abertura de concerto para orquestra
[ouvir entre a Sétima e a Oitava Sinfonias]

Chor und Orchester des Bayerischen Rundfunks
Mariss Jansons, 
regência

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BTHVN250, por René Denon

Vassily

BTHVN250 – Max Reger (1873-1916): Variações sobre um tema de Beethoven, Op. 86 – Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791): Fuga, K. 426 e Sonata, K. 448/375a – Ferruccio Busoni (1866-1924): Fantasia Contrappuntistica, BV 256b – András Schiff – Peter Serkin

Ao longo de seus quarenta e cinco anos de carreira, Beethoven tomou emprestados dezenas de temas a seus colegas compositores. No começo, ele o fazia simplesmente porque a forma do tema com variações era muito popular entre os compositores-pianistas, e era praxe lucrativa compor sobre árias e canções em voga. Ao estabelecer-se como o melhor pianista de Viena, ele acostumou-se a usar temas alheios – às vezes já conhecidos, outras vezes ditados pelo público ou mesmo por rivais – para exibir seu talento como improvisador, pelo qual foi por um bom tempo até mais famoso do que como compositor. Por fim, e principalmente nas Variações “Diabelli”, ele mostrava a sua incomparável capacidade de transformar o mais frugal dos temas ao decompô-lo, parodiá-lo e reinventá-lo, enquanto exibia seu enciclopédico conhecimento das capacidades do teclado.

O bicho era tão bom nisso que não surpreende que poucos compositores depois dele tenham tomado seus temas para comporem variações – ninguém, enfim, quer mostrar seus pés pequenos sambando dentro de tão grandes chinelas. Um dos poucos insensatos a fazê-lo foi Max Reger…

ECCE HOMO (DP)

… que, só pela cara, a gente já vê que manjava de todos os paranauê.

De fato, sua vasta e mormente desconhecida obra demonstra duma forma quase fanfarronística seu domínio das técnicas de composição. Escrever fugas, por exemplo, parecia-lhe um passatempo. Compor variações E fuga sobre um tema de Beethoven, então, jamais o intimidaria – foi ele, enfim, o homem responsável pela transcrição de muito da obra de J. S. Bach para duo pianístico, o que fez com muita competência e resistindo firme à tomatina que lhe jogaram.

As “Variações e Fuga sobre um Tema de Beethoven” (1904) são uma obra fundamental do repertório para duo, e aliás uma das poucas composições de Reger que, infelizmente, aparecem com alguma frequência em qualquer repertório. O tema que escolheu foi o da breve bagatela para piano em Si bemol maior, Op. 119, no. 11, que ele passa por um rigoroso corredor-polonês contrapontístico que culmina – como era seu costume em obras com variações – com uma assertiva fuga final. Anos mais tarde, ele orquestraria oito das doze variações, mas a roupagem sinfônica não conquistou a relativa popularidade do original.

Neste álbum duplo que lhes apresento, a obra ganha um ótimo tratamento por dois artistas de primeiríssima. András Schiff e Peter Serkin apresentaram o repertório do disco numa série de recitais ao longo de 1999, para enfim gravá-lo em New York, e é evidente que se deram muito bem no processo. Tenho pena, só, das duas singelas obras de Mozart, eclipsadas pelas variações de Reger e pela tonitruante Fantasia Contrappuntistica de Busoni que, apesar de inicialmente intitulada Grosse Fuge, homenageia a “Arte da Fuga” de J. S. Bach. Talvez seja demais para uma quinta-feira à tarde, então compreenderia se, para prevenirem a saturação sensorial (se é que eu já não os saturei para sempre com tanto Beethoven), vocês salvassem o álbum para ouvi-lo depois dum bom tempo longe de mim.



Wolfgang Amadeus MOZART
 (1756-1791)

Fuga em Dó menor para dois pianos, K. 426
1 – Allegro Moderato

Johann Baptist Joseph Maximilian REGER (1873-1916)

Variações e fuga sobre um tema de Beethoven para dois pianos, Op. 86
2 – Thema: Andante
3 – Un poco più lento
4 – Agitato
5 – Andantino grazioso
6 – Andante sostenuto
7 – Appassionato
8 – Andante sostenuto
9 – Vivace
10 – Sostenuto
11 – Vivace
12 – Poco vivace
13 – Andante con grazia
14 – Allegro pomposo
15 – Fuge: Allegro con spirito

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Dante Michaelangelo Benvenuto Ferruccio BUSONI (1866-1924)

Fantasia Contrappuntistica para dois pianos, BV 256b
1 – Choral-Variationen
2 – Fuga I
3 – Fuga II
4 – Fuga III
5 – Intermezzo
6 – Variatio I
7 – Variatio II
8 – Variatio III
9 – Cadenza
10 – Fuga IV
11 – Corale
12 – Stretta

Wolfgang Amadeus MOZART

Sonata em Ré maior para dois pianos, K. 448/375a
13 – Allegro con spirito
14 – Andante
15 – Allegro Molto

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András Schiff e Peter Serkin, pianos

Vassily

BTHVN250 – Ludwig van Beethoven (1770-1827) – Christian Gottlob Neefe (1748-1798) – Joseph Haydn (1732-1809) – Johann Albrechtsberger (1735-1809) – Beethoven and his Teachers – Rachmanov – Bryant

Depois que publiquei o epílogo de nossa travessia da integral da obra beethoveniana, um querido colega procurou-me aqui em minha jaulinha no subsolo da PQP Tower. Ele me agradeceu pelas postagens e comentou que eu adotara uma abordagem à Benjamin Button, descrevendo, às portas do aniversário de Beethoven e com toda riqueza de excretas e coágulos, as miseráveis semanas finais de nosso herói.

O colega, que tem toda razão no comentário, completou, com seu habitual bom humor, que esperava “sangue e pústulas” na descrição do nascimento de Ludwig, que aconteceu em algum dia próximo ao 17 de dezembro em que foi batizado.

Registro de nascimento de Beethoven na paróquia de São Remígio em Bonn. “17ma [Decima septima] Xbris [Decembris]. Parentes: D: Joannes van Beethoven & Helena Keverichs, conjuges. Proles: Ludovicus. Patrini: D: Ludovicus van Beethoven & Gertrudis Müllers dicta Baums” (“17 de dezembro. Pais: Johann van Beethoven & Helena [Magdalena] Keverich, casados. Criança: Ludwig. Padrinhos: Ludwig van Beethoven [avô do compositor] & Gertrude Müller, nascida Baum [vizinha]”

Temia decepcioná-lo, pois Ludovicus van Beethoven era um Zé-Ninguém (ou, talvez, uns “Niemand-Hans”) quando nasceu na casinha da Bonngasse, no. 20. Assim, diferentemente de sua morte, cinquenta e seis anos depois, quando era amplamente reconhecido como o maior músico da Europa, não há qualquer registro preciso nem da data, nem  das circunstâncias em que ocorreu seu nascimento. Suponho que não houvesse pústulas, pois elas costumam surgir em infecções, e naquela época elas costumavam matar os recém-nascidos. O sangue, no entanto, me parece assegurado: o parto, afinal, sempre foi uma cena poderosa, talvez bela, e invariavelmente brutal.

Assegurado, também, era que Ludwig se tornaria músico – ou, pelo menos, que tentariam transformá-lo num. Afinal, seu avô e padrinho, nascido Lodewijk na flamenga Mechelen, mas que adorarei chamar de Ludwig van Beethoven, o Velho, chegara a Bonn para ser baixo e galgara a hierarquia musical da corte do Eleitor de Colônia até chegar ao cargo de Kapellmeister. Seu único filho que sobreviveu à infância, Johann, seria tenor na mesma corte e, após casar-se com a cozinheira Maria Magdalena Keverich, deu ao mundo nosso herói daqueles meados de dezembro de 1770.

Digo 1770, mas se o dissesse a Ludwig, o Jovem, ele não acreditaria em mim, pois jurou de pés juntos uma boa parte da vida que nascera em 1772. Quando lhe apresentaram um certificado baseado no registro de batismo, dando conta de que um Ludwig van Beethoven nascido em 1770, ele escreveu no verso dele o seguinte:

Es scheint der Taufschein nicht richtig, da noch ein Ludwig vor mir. Eine Baumgarten war glaube mein Pathe
(“A certidão de batismo não parece correta, há outro [ou é um outro] Ludwig antes de mim. Eu acho que uma Baumgarten era minha madrinha”)

E assinava:

“1772.   Ludwig van Beethoven”

Teimosia? Certamente, e muita – e legendária! -, mas Ludwig tinha seus motivos para acreditar no engano. Seu pai, Johann, era um sujeito avaro e truculento (e deixo barato ao assim chamá-lo), que enxergou na óbvia aptidão do primogênito uma potencial mina de ouro, ao torná-lo um menino-prodígio. Sob muita violência física e psíquica, tentou forjar um Wunderkind e, quando o apresentou em público pela primeira vez em Colônia, em 1778, alegava que ele tinha seis anos. Quando o garoto publicou sua primeira obra, em 1772, o frontispício atribuía-lhe apenas dez.

“Variações para o cravo sobre uma marcha do Sr. Dresler [sic] – Compostas e dedicadas à Sua Excelência Madame Condessa de Wolfmetternich, nascida Baronesa de Afsebourg [sic] por um jovem amador, Louis de Betthoven [sic], com dez anos de idade”

Ludwig teve vários professores na infância – incluindo o próprio pai, Johann; Gilles van den Eeden, organista da corte; Tobias Friedrich Pfeiffer, professor de piano; e Franz Rovantini, que lhe ensinou violino e viola. A pedagogia era incorporada aos maus tratos. Sem nem mencionar os do pai, a quem Ludwig odiaria por toda a vida, o tal Pfeiffer tinha insônia e tirava o menino da cama de madrugada para obrigá-lo a estudar. O primeiro professor de quem guardou boas lembranças foi Christian Gottlob Neefe, um saxão luterano que só foi empregado na corte católica de Bonn porque o novo Eleitor de Colônia, Maximilian Franz, era razoavelmente liberal e aberto a todas artes e artistas. Neefe certamente não era um músico brilhante, mas era culto e amável com o menino, para quem arranjou o cargo de seu assistente como organista da corte e também a publicação das variações “Dressler” em Mannheim. O competente moleque não se tornaria um menino-prodígio, apesar de sua grande capacidade, e só atrairia alguma atenção quando adolescente. A morte da querida mãe piorou a situação doméstica, que só afundava com o alcoolismo de Johann. Em 1792, como já lhes contei em outra postagem, Ludwig deixou Bonn para nunca mais retornar. Seus destinos eram Viena e Haydn, o maior compositor europeu vivo, com quem estudaria sob o patrocínio do Eleitor de Colônia. Os estudos com Papa foram erráticos e, a seu ver, insatisfatórios. Depois de causar uma saia-justa ao velho mestre, a quem mentiu sobre composições novas que tinham sido compostas em Bonn, e que deve ter ficado com cara de tacho quando escreveu ao Eleitor de Colônia citando-as como obras novas, terminaram de comum acordo a relação pedagógica. Embora nunca poupasse acidez ao falar dos estudos com o Mestre de Rohrau, Beethoven admitiria paulatinamente que os estudos com ele lhe foram importantes. Mais tarde, como também já lhes contamos, Ludwig tomaria lições de contraponto com Albrechtsberger, o organista e Kapellmeister da Stephansdom, na capital imperial – um sujeito que eu, confesso, escolheria só pelo sobrenome para ter aulas de contraponto.

[e acharam que eu não mencionaria aqueles hilariantes concertos para marranzano? Pois se enganaram]

Vocês já devem ter deduzido que eles meus chalalás sobre os professores de Beethoven tinham só a finalidade de introduzir-lhes estas gravações. Pois bem: além da integral de Ludwig para piano a quatro mãos, na qual somente a transcrição da Grande Fuga é digna de nota, este ótimo álbum duplo traz obras dos ditos-cujos – o que é ótimo, pois é sempre uma dureza apresentar o repertório beethoveniano para duo pianístico. Não que estas sejam lá coisas inesquecíveis, mas os arranjos de Neefe para trechos da “Flauta Mágica” são muito simpáticos, e a fuga de Albrechtsberger pareceu a primeira obra do homem a merecer algum lugar no repertório. O ponto alto, para mim, é o divertimento de Haydn. Baseado no tema do “Ferreiro Harmonioso” e alcunhado “‘Il Maestro e lo Scolare” (“O Mestre e o Aluno”), descreve a relação de ambos. A obra foi composta antes de Haydn conhecer o aluno mais famoso, e fico imaginando, se ele a compusesse depois disso, se o “tema com variações” e o “minuetto” não seriam substituídos com um “Grave con furia” e um “Andante con molta malinconia”. E me redimo da infeliz piada de tiozão comentando que a escolha de fortepianos para executar as obras foi muito feliz, e que a Grande Fuga, em particular, soa muito satisfatória no timbre dos instrumentos anciões.

Em tempo: apesar do que alega a ademais cuidadosa Naxos na capa do disco, o conde Waldstein não foi professor de Beethoven. Ele foi, sim, seu patrono e empregador – Beethoven foi o ghost writer do Ritterballet que Waldstein estreou num baile como seu próprio – e lhe forneceu o tema para as variações para piano a quatro mãos que está no disco, além de dedicatário da brilhante sonata “Waldstein” e autor do profético bilhete que adornou o livro de despedida de Ludwig, quando este partiu para Viena:


Lieber Beethowen!
Sie reisen itzt nach Wien zur Erfüllung ihrer so lange bestrittenen Wünsche. Mozart’s Genius trauert noch und beweinet den Tod seines Zöglinges. Bey dem unerschöpflichem Hayden fand er Zuflucht, aber keine Beschäftigung; durch ihn wünscht er noch einmal mit jemanden vereinigt zu werden. Durch ununterbrochenen Fleiß erhalten Sie: Mozart’s Geist aus Haydens Händen.

Bonn d 29t. Oct. 792. Ihr warer Freund Waldstein”

“Caro Beethowen!
Você viaja agora para Viena para realizar suas vontades tão longamente constritas. O gênio de Mozart ainda está de luto
e chorando pela morte de seu pupilo. Ele encontrou refúgio no inesgotável Hayden, mas não tinha emprego; através deste, ele deseja unir-se uma vez mais a alguém. Por meio de diligência ininterrupta você obtém: o espírito de Mozart das mãos de Hayden.

Bonn, 29 de outubro de [1]792. Seu querido amigo Waldstein”

 

Ludwig van BEETHOVEN (1770–1827)

Sonata para piano a quatro mãos em Ré maior, Op. 6 (1797)
1- Allegro molto
2 – Rondo: Moderato


Christian Gottlob NEEFE (1748–1798)

Seis peças fáceis para piano a quatro mãos, baseadas em trechos da ópera Die Zauberflöte, de Mozart (1793)
3 – No. 1: Der Vogelfänger bin ich ja
4 – No. 2: Bei Männern, welche Liebe fühlen
5 – No. 3: Soll ich dich, Teurer, nicht mehr seh’n
6 – No. 4: Das klinget so herrlich
7 – No. 5: Ein Mädchen oder Weibchen
8 – No. 6: Klinget, Glockchen, klinget


Ludwig van BEETHOVEN

Oito variações em Dó maior sobre um tema do conde Waldstein, para piano a quatro mãos, WoO 67 (1794)
9 – Thema – Variationen I-VIII


Johann Georg ALBRECHTSBERGER (1736–1809)

Prelúdio e fuga em Si bemol maior (1796)
10 – Sem indicação de andamento


Ludwig van BEETHOVEN

Três marchas para piano a quatro mãos, Op. 45 (1804)
11 – No. 1 em Dó maior
12 – No. 2 em Mi bemol maior
13 – No. 3 em Ré maior

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Ludwig van BEETHOVEN

Seis variações em Ré maior sobre a ária Ich denke dein, para piano a quatro mãos, WoO 74 (1805)
1 – Thema – Variationen I-VI

Maria Ferrante, soprano


Franz Joseph HAYDN (1732–1809)

Divertimento em Fá maior, Hob.XVIIa:1, “Il Maestro e lo Scolare”  (c.1766–1767)
2 – Tema con Variazioni
3 – Tempo di menuet


Ludwig van BEETHOVEN

Grande Fuga em Si bemol maior, para piano a quatro mãos, Op. 134 (1827)
4 – Overtura – Fuga – Meno mosso e moderato – Fuga – Coda

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Cullan Bryant e Dmitry Rachmanov, fortepianos (Caspar Katholnig, Vienna, ca. 1805–1810 e Johann Nepomuk Tröndlin, Leipzig, 1830)


Apesar desse famoso retrato, hoje no Kunsthistorisches Museum em Viena, ser conhecido como “Beethoven aos doze anos”, a Beethovenhaus de Bonn diz que não há provas de que ele seja autêntico. As bochechas vermelhas e os olhos desde já dardejantes me dizem que o menino é Ludwig. E vocês, o que acham?

 

Vassily

Lieber Ludwig, alles gute zum Geburtstag! – Índice das composições de Ludwig van Beethoven publicadas na série #BTHVN250

Ninguém sabe ao certo quando Beethoven nasceu – e nem ele sabia. Seu registro de batismo data de 17 de dezembro de 1770, e era a praxe no Eleitorado de Colônia que os bebês fossem registrados até o primeiro dia de vida. Assim, era muito provável que ele tivesse nascido mesmo em 16 de dezembro, dia que ele considerava seu natalício. Em sua Bonn natal, entretanto, a grande celebração anual de Beethoven sempre aconteceu no dia 17, no chamado “Dia Batismal”.

Os alemães acreditam que dar os parabéns antes do aniversário dá má sorte, mas eles próprios adoram o costume de reinfeiern, que consiste em iniciar as comemorações do natalício na véspera, antes da meia-noite. Os convivas chegam, cumprimentam o em-breve aniversariante sem dar-lhe os parabéns e, tão logo chega a meia-noite, cantam a inescapável musiquinha:

Como nosso herói era alemão, e ele não precisa de mais má sorte do que aquela tanta que teve durante sua passagem terrena, resolvi parabenizá-lo um minuto depois da meia-noite.

Os presentes, mundo afora, serão alcançados em todo lugar em que houver um seu fã, onde houver um músico, onde existir uma sala de concertos. Aqui, como já sabem, preferimos preparar nosso presente ao longo do ano, para que ele culminasse justamente nesses 16 e 17 de dezembro. E conseguimos: toda a obra publicada de Beethoven foi aqui apresentada, comentada e compartilhada em gravações até então inéditas no PQP Bach.

Para ajudá-los na navegação desse acervo, bem como a encontrar os textos que se referem as obras, preparamos este índice em que as composições estão listadas na ordem crescente dos principais catálogos dedicados a Beethoven: seu catálogo pessoal de obras (indicadas pelo número de Opus), o Kinsky-Halm (Werke ohne Opuszahl, WoO), o de Willy Hess (Hess) e o de Giovanni Biamonti (Bia).

Cabe lembrar que, embora a maioria das obras apareça em todos os catálogos, algumas são específicas àqueles mais recentemente atualizados (caso do Biamonti, o único a organizar todas as composições e fragmentos numa só relação cronológica). Notem também que, na medida do possível, evitamos publicar as composições erroneamente atribuídas a Beethoven (indicadas na lista como “espúrias”) ou de atribuição duvidosa (que aparecem nos apêndices – Anhang, Anh.) dos catálogos Kinsky-Halm e Hess.

Ainda que esta lista abranja todas as obras publicadas de Beethoven que tenham sido gravadas, é evidente que ela terá omissões. Todas obras importantes, bem como todas aquelas que alguma vez pretendeu que se tornassem públicas, aqui estão. Entre os inúmeros esboços e fragmentos espalhados em desordem por seus cadernos de anotações mundo afora, há muitos que ainda não foram publicados e gravados. Assim, esta lista seguirá aberta, e será completada à medida que novos itens, por mais curtos que sejam, vierem a ser acrescentados à discografia de Beethoven.

Na relação abaixo, o link que acompanha o título da obra leva à publicação em que ela é comentada, enquanto os números entre colchetes indicam interpretações alternativas das obras – o que não significa, claro, que elas sejam piores.

Por fim, ressalvo que a lista inclui somente as publicações feitas dentro da série “A Obra Completa de Ludwig van Beethoven”. Houve muitas outras, com preciosas contribuições de meus colegas de blog, e que vós outros poderão encontrar ao clicarem no “BTHVN” abaixo, escrito pelo próprio punho de Beethoven (porque, sim, além de gênio da Música, ele também bolou o logo de seu 250º aniversário!)

Para procurar por “BTHVN250”, clique no Bthvn

 


RELAÇÃO DAS OBRAS PUBLICADAS NA SÉRIE “BTHVN 250 – A OBRA COMPLETA DE LUDWIG VAN BEETHOVEN”

OBRAS PUBLICADAS COM NÚMEROS DE OPUS:

Op. 1: Três Trios para piano, violino e violoncelo (1795) [2]
– No. 1 em Mi bemol maior
– No. 2 em Sol maior
– No. 3 em Dó menor
Op. 2: Três Sonatas para piano (1796)
No. 1: Sonata para piano no. 1 em Fá menor
No. 2: Sonata para piano no. 2 em Lá maior
No. 3: Sonata para piano no. 3 em Dó maior [2]
Op. 3:
Trio para violino, viola e violoncelo em Mi bemol maior (no. 1) (1794)
Op. 4: Quinteto para dois violinos, viola e violoncelo em Mi bemol maior (adaptação do Octeto para sopros, Op. 103) (1795)
Op. 5: Duas Sonatas para violoncelo e piano (1796) [2] [3]
No. 1: Sonata para violoncelo e piano em Fá maior
No. 2: Sonata para violoncelo e piano em Sol menor
Op. 6: Sonata para piano a quatro mãos em Ré maior (1797) [2]
Op. 7: Grande Sonata em Mi bemol maior para piano (No. 4) (1797) [2]
Op. 8: Trio (Serenata) para violino, viola e violoncelo em Ré maior (No. 2) (1797)
Op. 9: Três trios para violino, viola e violoncelo (1798)
No. 1 em Sol maior (no. 3)
– Scherzo com trio alternativo
No. 2  em Ré maior (no. 4)
No. 3 em Dó menor (no. 5)
Op. 10: Três sonatas para piano (1798)
No. 1: Sonata para piano no. 5 em Dó menor
No. 2: Sonata para piano no. 6 em Fá maior
No. 3: Sonata para piano no. 7 em Ré maior [2] [3]
Op. 11: Trio para clarinete, piano e violoncelo em Si bemol menor, “Gassenhauer” (1797)
para violino, piano e violoncelo  [2]
Op. 12: Três sonatas para violino e piano (1798)
No. 1: Sonata para violino e piano no. 1 em Ré maior
No. 2: Sonata para violino e piano no. 2 em Lá maior
No. 3: Sonata para violino e piano no. 3 em Mi bemol maior
Op. 13: Sonata para piano no. 8 em Dó menor (“Pathétique”) (1799) [2]
Op. 14: Duas sonatas para piano (1799) [2]
No. 1: Sonata para piano no. 9 em Mi maior
Arranjo para quarteto de cordas pelo compositor em Fá maior, Hess 34 (1801)
No. 2: Sonata para piano no. 10 em Sol maior
Op. 15: Concerto para piano e orquestra no. 1 em Dó maior (1795) [2]
Op. 16: Quinteto em Mi bemol maior para piano, oboé, clarinete, trompa e fagote (1796) [2]
Quarteto em Mi bemol maior para piano, violino, viola e violoncelo
Op. 17: Sonata em Fá maior para trompa e piano (1800) [2] [3] [4]
Versão para violoncelo e piano (arranjo do compositor)
Versão para flauta e piano
Versão para fagote e piano
Versão para corno di bassetto e piano
Versão para corne inglês e piano
Op. 18: Seis quartetos para dois violinos, viola e violoncelo (1800)
No. 1: Quarteto no. 1 em Fá maior
No. 2: Quarteto no. 2 em Sol maior
No. 3: Quarteto no. 3 em Ré maior
No. 4: Quarteto no. 4 em Dó menor
No. 5: Quarteto no. 5 em Lá maior
No. 6: Quarteto no. 6 em Si bemol maior
Op. 19: Concerto para piano e orquestra no. 2 em Si bemol maior (1795) [2]
Op. 20: Septeto in Mi bemol maior para violino, viola, clarinete, trompa, fagote, violoncelo e contrabaixo (1799) [2]
Arranjo para noneto de sopros
Op. 21: Sinfonia no. 1 em Dó maior (1800)
Op. 22: Sonata para piano no. 11 em Si bemol maior (1800)
Op. 23: Sonata para violino e piano no. 4 em Lá menor (1801)
Op. 24: Sonata para violino e piano no. 5 em Fá maior, “Primavera” (1801) [2]
Op. 25: Serenata para flauta, violino e viola em Ré maior (1801)
Op. 26: Sonata para piano no. 12 em Lá bemol maior, “Marcha Fúnebre” (1801) [2]
Op. 27: Duas sonatas para piano (1801)
No. 1: Sonata para piano no. 13 em Mi bemol maior [2]
No. 2: Sonata para piano no. 14 em Dó sustenido menor (“Luar”) [2]
Op. 28: Sonata para piano no. 15 em Ré Maior (“Pastoral”) (1801)
Op. 29: Quinteto para dois violinos, duas violas e violoncelo em Dó maior (1801) [2]
Op. 30: Três sonatas para violino e piano (1802)
No. 1: Sonata para violino e piano no. 6 em Lá maior
No. 2: Sonata para violino e piano no. 7 em Dó menor
No. 3: Sonata para violino e piano no. 8 em Sol maior
Op. 31: Três sonatas para piano (1802)
No. 1: Sonata para piano no. 16 em Sol maior
No. 2: Sonata para piano no. 17 em Ré menor (“Tempestade”) [2] [3]
No. 3: Sonata para piano no. 18 em Mi bemol maior (“A Caça”) [2] [3]
Op. 32: “An die Hoffnung”, canção (1805)
Op. 33: Sete bagatelas para piano (1802) [2]
Op. 34: Seis variações para piano sobre um tema original, em Fá maior (1802)
Op. 35: Quinze variações e uma fuga para piano sobre um tema original, em Mi bemol maior, “Variações Eroica” (1802) [2]
Op. 36: Sinfonia no. 2 em Ré maior (1802)
– Versão para violino, piano e violoncelo  [2]
Op. 37: Concerto para piano no. 3 em Dó menor (1800)
Op. 38: Trio para clarinete, piano e violoncelo em Mi bemol maior (arranjo do Septeto, Op. 20) (1803)
– Versão para violino, piano e violoncelo
Op. 39: Dois Prelúdios sobre todas as doze tonalidades maiores para piano (1789) [2]
– Versão para órgão
Op. 40: Romance para violino e orquestra no. 1 em Sol maior (1802) [2] [3] [4]
Op. 41: Serenata em Ré maior para flauta e piano (1803)
Op. 42: Noturno em Ré maior para viola e piano (1803) (arranjo da serenata, Op. 8)
Op. 43: Die Geschöpfe des Prometheus, abertura e música para balé (1801)
– Abertura [2]
– Transcrição para piano do próprio compositor (Hess 90)
Op. 44: Variações em Mi bemol maior para piano, violino e violoncelo sobre um tema original (1792) [2]
Op. 45: Três Marchas para piano a quatro mãos (1803) [2]
Op. 46: “Adelaide”, canção (1795) [2]
Op. 47: Sonata para violino e piano no. 9 em Lá maior (“Kreutzer”) (1803)
– Arranjo para quinteto de cordas
Op. 48: Seis canções (1802)
– Variante da no. 3 (“Vom Tode”)
– Variante da no. 6 (“Busslied”)
Op. 49: Duas sonatas para piano (1795-1798)
No. 1: Sonata para piano no. 19 em Sol menor
No. 2: Sonata para piano no. 20 em Sol maior
Op. 50: Romance para violino e orquestra no. 2 em Fá maior (1798) [2] [3] [4]
Op. 51: Dois rondós para piano (1797) [2]
No. 1: Rondó em Dó maior [2] [3] [4]
No. 2: Rondó em Sol maior  [2] [3]
Op. 52: Oito canções (1804–1805)
Versão preliminar do no. 2, Feuerfarb’ (Hess 144) [2]
Op. 53: Sonata para piano no. 21 em Dó maior (“Waldstein”) (1803)
Op. 54: Sonata para piano no. 22 em Fá maior (1804)
Op. 55: Sinfonia no. 3 em Mi bemol maior, Op. 55 (“Eroica”) (1805)
Op. 56: Concerto em Dó maior para violino, violoncelo, piano e orquestra (1804–1805) [2] [3] [4] [5]
Op. 57: Sonata para piano No. 23 em Fá menor (“Appassionata”) (1805–1806) [2] [3] [4]
Op. 58: Concerto para piano e orquestra no. 4 em Sol maior (1805–1806) [2][3][4] [5]
– Versão para piano e quinteto de cordas
Op. 59: Três quartetos para dois violinos, viola e violoncelo (“Razumovsky”) (1806)
No. 1: Quarteto no. 7 em Fá maior
No. 2: Quarteto no. 8 em Mi menor
No. 3: Quarteto no. 9 em Dó maior
Op. 60: Sinfonia no. 4 em Si bemol maior (1806)
Op. 61: Concerto em Ré maior para violino e orquestra (1806) [2] [3] [4] [5]
Op. 61a: Transcrição para piano do concerto para violino e orquestra, Op. 61 (1810)
Op. 62: “Coriolan”, abertura para orquestra (1807)
Op. 63: Arranjo do quinteto para cordas (Opus 4) para trio com piano (1806) (dúbio)
Op. 64: Sonata para violoncelo e piano em Mi bemol maior (arranjo do trio para cordas, Op. 3) (1807) (arranjo atribuído a Franz Xaver Kleinheinz)
Op. 65: Recitativo e Aria: “Ah! perfido” (1796) [2] [3] [4] [5]
Op. 66: Doze Variações para violoncelo e piano em Fá maior sobre “Ein Mädchen oder Weibchen”, de “Die Zauberflöte” de Mozart (1796) [2] [3]
Op. 67: Sinfonia no. 5 em Dó menor (1807–1808) [2] [3]
Op. 68: Sinfonia no. 6 em Fá maior (“Pastoral”) (1807–1808)
Op. 69: Sonata para violoncelo e piano no. 3 em Lá maior (1808) [2] [3]
Op. 70: Dois trios para piano, violino e violoncelo (1808) [2]
No. 1 em Ré maior (“Fantasma”)
No. 2 em Mi bemol maior
Op. 71: Sexteto para dois clarinetes, duas trompas e dois fagotes em Mi bemol maior (1796) [2]
Op. 72: Fidelio, ópera em dois atos (c. 1803–05) [2] [3] [4] [5] [6] [7]
– Abertura “Fidelio” (1814) [2]
Op. 72a: Leonore, ópera em três atos (primeira versão, com a abertura “Leonore” no. 2) (1805) [2] [3]
– Abertura “Leonore” no. 2 [2] [3]
Op. 72b:
Leonore, ópera em dois atos (segunda versão, com a abertura “Leonore” no. 3) (1806)
– Abertura “Leonore” no. 3 [2] [3] [4]
Op. 73:
Concerto para piano e orquestra no. 5 em Mi bemol maior (“Imperador”) (1809) [2]
Op. 74: Quarteto em Mi bemol maior para dois violinos, viola em violoncelo (“Harpa”) (1809)
Op. 75: Seis canções (1809)
– Versão alternativa do no. 4, Gretels Warnung [2]
Op. 76: Seis variações para piano sobre um tema original, em Ré maior (1809) (a marcha turca de “Die Ruinen von Athen”)
Op. 77: Fantasia para piano em Sol menor (1809) [2] [3] [4]
Op. 78: Sonata para piano em Fá sustenido maior (“À Thérèse”) (1809) [2] [3]
Op. 79: Sonata para piano em Sol maior (“Sonatina”) (1809)
Op. 80: Fantasia em Dó para piano, coro e orquestra, “Fantasia Coral” (1808) [2] [3]
Op. 81a: Sonata para piano em Mi bemol maior (“Lebewohl”) (1809)
Op. 81b: Sexteto em Mi bemol maior para duas trompas, dois violinos, viola e violoncelo (1795)
Op. 82: Quatro arietas e um dueto (1809)
– Versão preliminar do no. 1, Dimmi, ben mio, che m’ami [2]
Op. 83: Três canções (1810)
– Versão preliminar do no. 1, Wonne der Wehmut [2]
Op. 84: Egmont, abertura e música incidental para a tragédia de Johann Wolfgang von Goethe (1810) [2]
– Abertura
– Primeira versão da canção de Clärchen, com acompanhamento de piano [2]
– Segunda versão da canção de Clärchen [2]
– Terceira versão da canção de Clärchen
Op. 85: “Christus am Ölberge”, oratório para solistas, coro e orquestra (1803) [2] [3]
Op. 86: Missa em Dó maior para solistas, coro e orquestra (1807)
– Excertos
Op. 87:
Trio em Dó maior para dois oboés e corne inglês (1795)
Versão para oboé, clarinete e fagote
– Versão para dois violinos e viola
– Versão para trompete, trompa e trombone
– Versão para três clarinetes
Op. 88: “Vita Felice/Das Glück der Freundschaft”, canção (1803)
Op. 89: Polonaise para piano em Dó maior (1814) [2] [3]
Op. 90: Sonata para piano em Mi menor (1814) [2] [3] [4]
Op. 91: “A Vitória de Wellington” ou “A Batalha de Vitoria” (1813) [2]
Op. 92: Sinfonia no. 7 em Lá maior (1812) [2] [3]
Arranjo para noneto de sopros
Op. 93: Sinfonia no. 8 em Fá maior (1812)
Arranjo para noneto de sopros
Op. 94: “An die Hoffnung”, canção (2ª versão) (1814)
Op. 95: Quarteto em Fá menor para dois violinos, viola e violoncelo (“Serioso”) (1810) [2]
Versão para orquestra de cordas
Op. 96: Sonata para violino e piano no. 10 em Sol maior (1812) [2]
Op. 97: Trio para piano, violino e violoncelo no. 7 em Si bemol maior (“Arquiduque”) (1811) [2]
Op. 98: “An die ferne Geliebte”, ciclo de canções (1816)
Op. 99: “Der Mann von Wort”, canção (1816)
Op. 100: “Merkenstein”, canção (1814)
Op. 101: Sonata para piano no. 28 em Lá maior (1816) [2] [3] [4] [5] [6]
Op. 102: Duas sonatas para violoncelo e piano (1815) [2] [3]
No. 1: Sonata para violoncelo e piano no. 4 em Dó maior
No. 2: Sonata para violoncelo e piano n0. 5 em Ré maior
Op. 103: Octeto em Mi bemol maior para dois oboés, dois clarinetes, duas trompas e dois fagotes (1792)
Op. 104: Quinteto para dois violinos, viola e violoncelo em Dó menor (adaptação do Trio, Op. 1 no. 3) (1817)
Op. 105: Seis temas folclóricos com variações para piano e flauta (1819)
– para piano e violino
excertos
– para piano
Op. 106: Grande Sonata para piano em Si bemol maior (“Hammerklavier”) (1818) [2] [3] [4] [5]
Op. 107: Dez temas folclóricos com variações para piano e flauta (1820)
– para piano e violino
excertos
– para piano
Op. 108: Vinte e cinco canções escocesas para voz e conjunto vocal misto, com acompanhamento de violino, violoncelo e piano (1818)
Op. 109: Sonata para piano em Mi maior (1820) [2] [3] [4] [5]
Op. 110: Sonata para piano em Lá bemol maior (1821) [2] [3] [4]
Op. 111: Sonata para piano em Dó menor (1822) [2] [3] [4] [5] [6]
Op. 112: “Meeresstille und glückliche Fahrt”, cantata para coro e orquestra (1815) [2]
Op. 113: “Die Ruinen von Athen”, abertura e música incidental para a peça de August von Kotzebue (1811)
– Abertura
Op. 114: “Schmückt die Altäre”, marcha e coro para “Die Ruinen von Athen” (1822)
Op. 115: “Zur Namensfeier”, abertura para orquestra (1815)
Op. 116: “Tremate, empi tremate”, para soprano, tenor, baixo e orquestra (1802) [2]
Op. 117: “König Stephan, oder: Ungarns Erster Wohltäter”, abertura e música incidental para a peça de August von Kotzebue (1811)
Op. 118: “Elegischer Gesang” para quatro vozes e quarteto de cordas (1814)
– Versão para coro e piano
– Versão para coro e orquestra
Op. 119: Onze novas bagatelas para piano (1822) [2] [3] [4]
Op. 120: Trinta e três variações em Dó maior sobre uma valsa de Anton Diabelli, para piano (“Variações Diabelli”) (1823) [2] [3] [4] [5]
Op. 121a: Variações em Sol maior sobre “Ich bin der Schneider Kakadu” para piano, violino e violoncelo (1803) [2]
Op. 121b: “Opferlied” para soprano, coro e orquestra (1822) [2]
– Versão para soprano, contralto, tenor, coro e orquestra (1823)
– Versão para soprano, coro e piano [2]
Op. 122: “Bundeslied” para solistas, coro e sopros (1824)
– Versão para solistas, coro e piano [2]
Op. 123: Missa solemnis em Ré maior para solistas, coro e orquestra (1823)
Op. 124: “Die Weihe des Hauses”, abertura e música incidental para a peça ocasional de Carl Meisl (1822)
– Abertura [2]
Op. 125: Sinfonia no. 9 em Ré menor (“Coral”) (1824)
Op. 126: Seis bagatelas para piano (1824) [2] [3]
excertos
Op. 127: Quarteto em Mi bemol maior para dois violinos, viola e violoncelo (1825) [2] [3] [4] [5] [6] [7] [8]
Op. 128: “Der Kuss“, canção (1822) [2]
Op. 129: Rondo alla ingharese quasi un capriccio, para piano, em Sol maior (“Fúria sobre o Tostão Perdido) (1795) [2]
Op. 130: Quarteto em Si bemol maior para dois violinos, viola e violoncelo (1825–1826) [2] [3] [4] [5] [6] [7] [8]
Op. 131: Quarteto em Dó sustenido menor para dois violinos, viola e violoncelo (1826) [2] [3] [4] [5] [6] [7] [8]
– Versão alternativa do Adagio ma non troppo e molto espressivo 
Op. 132: Quarteto em Lá menor para dois violinos, viola e violoncelo (1825) [2] [3] [4] [5] [6] [7] [8]
Op. 133: Große Fuge (Grande Fuga) em Si bemol maior para dois violinos, viola e violoncelo (finale original do Op. 130) (1825) [2] [3] [4] [5] [6] [7] [8]
Op. 134: Große Fuge (Grande Fuga) em Si bemol maior, para piano a quatro mãos (transcrição de Beethoven do Opus 133) (1826) [2] [3]
Op. 135: Quarteto em Fá maior para dois violinos, viola e violoncelo (1826) [2] [3] [4] [5] [6] [7] [8]
Op. 136: “Der glorreiche Augenblick”, cantata para solistas, coro e orquestra (1814)
Op. 137: Fuga para quinteto de cordas em Ré maior (1817)
Op. 138: Leonore, ópera (versão inicial de Fidelio, com a abertura “Leonore No. 1”) (1807)
– Abertura [2]



OBRAS COM NÚMEROS WoO (“Werke ohne Opuszahl”/”Obras sem número de opus”) DO CATÁLOGO KINSKY-HALM

Música orquestral

WoO 1: Musik zu einem Ritterballett (Música para um ballet de cavaleiros) (1790–1)
– Versão para piano
WoO 2a: Marcha Triunfal, para orquestra, para a tragédia “Tarpeja” de Christoph Kuffner (1813)
– Versão para piano
WoO 2b: Introdução ao ato II de “Leonore” (1813) [2]
WoO 3: Minueto para orquestra, “Gratulations-Menuett”(1822)

Concertante

WoO 4: Concerto para piano em Mi bemol maior (parte para piano – completado por Willy Hess) (1784)
Versão para piano e quinteto de sopros
WoO 5: Concerto em Dó maior para violino e orquestra, fragmento (1790–2) [2]
WoO 6: Rondo em Si bemol maior para piano e orquestra (fragmento completado por Carl Czerny, possivelmente parte da versão inicial do concerto para piano, Op. 19) (1793)

Danças

WoO 7: Doze minuetos para orquestra (1795)
– Versão para piano
WoO 8: Doze danças alemãs para orquestra (1795)
Versão para piano
WoO 9: Seis minuetos para dois violinos e contrabaixo (antes de 1795)
WoO 10: Seis minuetos para piano (arranjo de um original perdido para orquestra) (1795)
– Reconstrução da versão orquestral
WoO 11: Sete Ländler para piano (arranjo de um original perdido para dois violinos e violoncelo) (1799)
WoO 12: Doze minuetos para orquestra (obra espúria, escrita por Karl van Beethoven, irmão de Ludwig)
WoO 13: Doze Danças Alemãs para orquestra (perdidas; existem apenas em versão para piano) (1792–7)
WoO 14: Doze contradanças para orquestra (1791–1801)
Versão para piano
WoO 15: Seis Ländler para dois violinos e contrabaixo (1802)
Versão para piano
WoO 16: Doze Écossaises para orquestra (fraudulentas)
WoO 17: Onze Danças para sete instrumentos, “Mödlinger Tänze” (provavelmente espúrias) (1819)

Marchas e danças para instrumentos de sopro

WoO 18: Marcha em Fá maior para banda militar, “Für die Böhmische Landwehr”/Yorck’scher Marsch (1809)
Versão para piano
WoO 19: Marcha em Fá maior para banda militar, “Pferdemusik” (1810)
WoO 20: Marcha em Dó maior para banda militar, “Zapfenstreich” (1810)
WoO 21: Polonesa em Ré maior para banda militar (1810)
WoO 22: Escocesa em Ré maior para banda militar (1810)
WoO 23: Escocesa em Sol maior para banda militar (1810, perdida)
– Arranjo para piano de Carl Czerny [2]
WoO 24:
Marcha em Ré maior para banda militar (1816)

Obras de câmara

Sem piano

WoO 25: Rondino em Mi bemol maior para dois oboés, dois clarinetes, duas trompas e dois fagotes (1792) [2]
WoO 26: Duo em Sol maior para duas flautas (1792)
WoO 27: Três duetos para clarinete e fagote (provavelmente espúrios)
No. 3 em Si bemol maior
WoO 28: Variações em Dó maior para dois oboés e corne inglês sobre “Là ci darem la mano” do “Don Giovanni” de Mozart (1795)
Versão para oboé, clarinete e fagote
WoO 29: Marcha para dois clarinetes, duas trompas e dois fagotes em Si bemol maior (1797–8)
Versão para piano
WoO 30: Três Iguais para quatro trombones (1812)
WoO 31: Fuga em Ré maior para órgão (1783)
WoO 32: Duo para viola e violoncelo, “mit zwei obligaten Augengläsern” (“com dois óculos obbligati”) (1796–7)
WoO 33: Cinco peças para Flötenuhr (1794–1800) [2]
WoO 34: Dueto para dois violinos (1822)
WoO 35: Cânone para dois violinos (1825)

Com piano

WoO 36: Três quartetos para piano, violino, viola e violoncelo (1785)
WoO 37: Trio para piano, flauta e fagote em Sol maior (1786) [2]
WoO 38: Trio para piano, violino e violoncelo em Mi bemol maior (no. 8) (1791) [2]
WoO 39: Allegretto para piano, violino e violoncelo em Si bemol maior (1812) [2]
WoO 40: Doze variações em Fá maior para piano e violino sobre “Se vuol ballare” de “Le Nozze di Figaro” de Mozart (1792–93)
WoO 41: Rondó para piano e violino em Sol maior (1793–94)
WoO 42: Seis danças alemãs para violino e piano (1796)
WoO 43a: Sonatina para bandolim e piano ou cravo (1796)
para violoncelo e piano
WoO 43b:
Adagio para bandolim e piano ou cravo (1796)
para violoncelo e piano
WoO 44a: Sonatina para bandolim e piano ou cravo (1796)
para violoncelo e piano
WoO 44b: Andante e variações para bandolim e piano ou cravo (1796)
para violoncelo e piano
WoO 45: Doze variações para violoncelo e piano em Sol maior sobre “See, the conqu’ring hero comes” do “Judas Maccabaeus” de Händel (1796) [2] [3]
WoO 46: Sete variações para violoncelo e piano em Mi bemol maior sobre “Bei Männern welche Liebe fühlen” de “Die Zauberflöte” de Mozart (1801) [2] [3]

Obras para piano a 2 e 4 mãos

WoO 47: Três sonatas para piano (Mi bemol maior, Fá menor, Ré maior) (“Kurfürsten Sonatas”) (1783)
WoO 48: Rondó para piano em Dó maior (1783) [2]
WoO 49: Rondó para piano em Lá maior (1783) [2]
WoO 50: Sonata para piano em Fá maior (1790–92) [2]
WoO 51: Duas peças para órfica (1797-98)
Versão para piano em Dó maior (1797–98), fragmento completado por Ferdinand Ries em 1830
WoO 52: Presto (Bagatela) para piano em Dó menor (1795) [2]
WoO 53: Allegretto (Bagatela) para piano em Dó maior (1796–97) [2] [3] [4]
WoO 54: Lustig-Traurig (Bagatela) para piano em Dó maior (1802) [2]
WoO 55: Prelúdio para piano em Fá menor (1803) [2]
WoO 56: Allegretto (Bagatela) para piano em Dó maior (1803)
WoO 57: Andante para piano em Fá maior, “Andante favori”– movimento central original da sonata para piano no. 21, “Waldstein” (1805) [2]
WoO 58: Cadenzas para o primeiro e terceiro movimento do concerto para piano em Ré menor de Mozart (K. 466) (1809) [2]
WoO 59: Poco moto (Bagatela) para piano em Lá menor (“Für Elise”) (c. 1810) [2] [3]
Versão revisada (1822) [2]
WoO 60: Ziemlich lebhaft (Bagatela) para piano em Si bemol maior (1818) [2]
WoO 61: Allegretto for piano em Si menor (1821) [2] [3]
WoO 61a: Allegretto quasi andante para piano em Sol menor (1825) [2]
WoO 62: Quinteto para cordas em Dó maior
– Fragmento inconcluso, reconstruído para piano
– Completado e transcrito para piano por Anton Diabelli) [2] [3]
– Completado e reconstruído para quinteto de cordas por Hideaki Shichida

Variações

WoO 63: Nove Variações para piano sobre uma Marcha de Ernst Christoph Dressler (1782) [2]
WoO 64: Seis Variações sobre uma Canção Suíça para piano (1790–1792) [2]
– Versão para harpa
WoO 65: Vinte e quatro Variações para piano sobre a ária “Venni Amore” de Vincenzo Righini (1790–1791)
WoO 66: Treze Variações para piano sobre a ária “Es war einmal ein alter Mann” da ópera “Das rote Käppchen” de Carl Ditter von Dittersdorf (1792) [2]
WoO 67: Oito Variações para piano a quatro mãos sobre um tema do Conde Waldstein (1792) [2]
– Versão revisada em 1803
WoO 68:
Doze Variações para piano sobre “Menuet a la Vigano” do balé “La nozza disturbate” de Jakob Haibel (1795)
WoO 69: Nove variações para piano sobre “Quant’e piu bello”, da ópera “La Molinara” de Giovanni Paisiello (1795)
WoO 70: Seis variações para piano sobre “Nel cor più non mi sento”, da ópera “La Molinara” de Giovanni Paisiello (1795)
WoO 71: Doze variações para piano sobre a Dança Russa do balé “Das Waldmädchen” de Paul Wranitzky (1796–7)
WoO 72: Oito variações para piano sobre “Une Fièvre Brûlante”, da ópera “Richard Coeur-de-Lion” de André Ernest Modeste Grétry (1795)
WoO 73: Dez variações para piano sobre “La stessa, la stessissima” da ópera “Falstaff” de from Antonio Salieri (1799)
WoO 74: “Ich denke dein”, canção com seis variações para piano a quatro mãos (1799) [2]
WoO 75: Sete variações para piano sobre “Kind, willst du ruhig schlafen”, da ópera “Das unterbrochene Opferfest” de Peter Winter (1799)
WoO 76: Oito variações para piano sobre “Tändeln und scherzen”, da ópera “Soliman II” de Franz Xaver Süssmayr (1799)
WoO 77:  Seis variações fáceis em Sol maior sobre um tema original (1800) [2]
WoO 78: Sete variações para piano sobre “God Save the King” (1802–3) [2]
WoO 79: Cinco variações para piano sobre “Rule Britannia!” (1803) [2]
WoO 80: Trinta e duas variações para piano sobre um tema original, em Dó menor (1806) [2]
WoO 81: Allemande para piano em Lá maior (1793) [2]
WoO 82: Minueto em Mi bemol maior para piano (1803)
WoO 83: Seis escocesas em Mi bemol maior para piano (1806)
WoO 84: Valsa para piano em Mi bemol maior (1824) [2]
WoO 85: Valsa para piano em Ré maior (1825) [2]
WoO 86: Écossaise para piano em Mi bemol maior (1825) [2] [3]

Obras vocais

Cantatas, coros e árias com orquestra

WoO 87: Cantata sobre a morte do Imperador Joseph II (1790)
WoO 88: Cantata sobre a Elevação do Imperador Leopold II (1790)
WoO 89: Ária “Prüfung des Küssens” (1790–2)
WoO 90: Ária “Mit Mädeln sich vertragen” (1790–2)
WoO 91: Duas árias para o Singspiel “Die Schöne Schusterin”  de Ignaz Umlauf (1795–6)
WoO 92: Ária “Primo Amore” (1790–2)
WoO 92a: Ária “No, non turbati” (1802)
WoO 93: “Nei giorni tuoi felici”, para soprano, tenor e orquestra (1802) [2]
WoO 94: “Germania,” ária com coro em Si bemol maior para o Singspiel “Die gute Nachricht”, de Georg Friedrich Treitschke (1814)
WoO 95: Chor auf die verbündeten Fürsten, para coro e orquestra, escrito para o Congresso de Viena (1815)
WoO 96: Música incidental para a peça “Leonore Prohaska”, de Friedrich Dunker (1815)
WoO 97: “Es ist vollbracht”, ária com coro para o Singspiel “Die Ehrenpforten”, de Georg Friedrich Treitschke (1815)
WoO 98: “Wo sich die Pulse”, coro para “Die Weihe des Hauses”

Obras para múltiplas vozes, com acompanhamento de piano, ou a cappela

WoO 99: Canções polifônicas em italiano (1801-2)
No. 1: Bei labbri che amore (Hess 211)
No. 2: Ma tu tremi (Hess 212)
No. 3: E pur fra le tempeste (Hess 232)
No. 4: Sei mio ben (Hess 231)
No. 5a: Giura il nocchier (Hess 227)
No. 5b: Giura il nocchier (Hess 230)
No. 5c: Giura il nocchier (Hess 221)
No. 6: Ah rammenta (incompleta)
No. 7: Chi mai di questo core (Hess 214)
No. 8: Scrivo in te (Hess 215)
No. 9: Per te d’amico aprile (Hess 216)
No. 10a: Nei campi e nelle selve (Hess 217)
No. 10b: Nei campi e nelle selve (Hess 220)
No. 11a: Fra tutte le pene (Hess 208)
No. 11b: Fra tutte le pene (Hess 225/209)
No. 11c: Fra tutte le pene (Hess 224/210)
No. 12a: Salvo tu vuoi lo sposo
No. 12b: Salvo tu vuoi lo sposo (Hess 228)
No. 13a: Quella cetra ah pur tu sei (Hess 218)
No. 13b: Quella cetra ah pur tu sei (Hess 219)
No. 13c: Quella cetra ah pur tu sei (Hess 213)
No. 14a: Gia la notte savvicina (Hess 223)
No. 14b: Gia la notte savvicina (Hess 222) (
No. 15: Silvio amante disperato (perdido) (Hess 226)
WoO 100: “Lob auf den Dicken”, brincadeira musical a três vozes
WoO 101: “Graf, Graf, liebster Graf”, brincadeira musical a três vozes com coro
WoO 102: “Abschiedsgesang”, para coro masculino
WoO 103: “Un lieto brindisi”, para coro e piano
WoO 104: “Gesang der Mönche”, do Wilhelm Tell de Schiller, para coro masculino
WoO 105: “Hochzeitslied”, canção para voz, coro e piano [2]
Segunda versão
WoO 106: “Es lebe unser teurer Fürst”, cantata para ao aniversário do príncipe Lobkowitz

 

Canções para voz e piano

WoO 107–151: Quarenta e cinco canções

WoO 107: Schilderung eines Mädchens [2]
WoO 108: An einen Säugling [2]
WoO 109: Trinklied, beim Abschied zu singen [2]
WoO 110: Elegie auf den Tod eines Pudels [2]
WoO 111: Punschlied [2]
WoO 112: An Laura [2]
WoO 113: Klage [2] [3]
Segunda versão [2]
WoO 114: Ein Selbstgesprach [2]
WoO 115: An Minna [2]
WoO 116: Que le Temps me dure
Segunda versão
WoO 117: Der freie Mann [2]
Versão preliminar (Hess 146)
WoO 118: Seufzer eines Ungeliebten – Gegenliebe [2]
WoO 119: Oh Care Selve, Oh Cara [2]
WoO 120: Man strebt, die Flamme zu verhehlen [2]
WoO 121: Abschiedsgesang an Wiens Burger [2]
WoO 122: Kriegslied der Österreicher [2]
WoO 123: Ich liebe dich, so wie du mich (Zärtliche Liebe) [2]
W0O 124: La Partenza [2]
WoO 125: La Tiranna [2]
WoO 126: Opferlied [2]
WoO 127: Neue Liebe, neues Leben [2] [3]
WoO 128: Romance  [2]
WoO 129: Der Wachtelschlag [2]
WoO 130: Gedenke Mein! [2]
WoO 131: Erlkönig
WoO 132: Als die Geliebte sich Trennen Wollte [2]
WoO 133: In Questa Tomba Oscura [2] [3]
Primeira versão [2]
WoO 134: Sehnsucht [2] [3]
Segunda versão [2] [3]
Terceira versão [2] [3]
Quarta versão [2]
WoO 135:
Die Laute Klage [2] [3]
WoO 136:
Andenken [2
WoO 137:
Gesang aus der Ferne [2] [3]
Segunda versão [2]
WoO 138a: Der Jüngling in der Fremde [2] [3]
WoO 138b:
Lied aus der Ferne [2]
WoO 139: Der Liebende [2]
WoO 140: An die Geliebte [2] [3]
Segunda versão [2] [3]
Esboço
WoO 141: Der Gesang der Nachtigall [2
WoO 142:
Der Bardengeist [2]
WoO 143: Des Kriegers Abschied [2]
WoO 144: Merkenstein (segunda versão do Op. 100) [2]
WoO 145:
Das Geheimnis (Liebe und Wahrheit) [2]
WoO 146:
Sehnsucht [2]
WoO 147: Ruf vom Berge [2]
WoO 148: So oder So[2
WoO 149:
Resignation [2] [3]
WoO 150: Abendlied unterm gestirnten Himmel [2]
WoO 151: Der edle Mensch [2]

Arranjos de canções folclóricas para voz, conjuntos vocais e trio de piano, violino e violoncelo

WoO 152: Vinte e cinco canções folclóricas irlandesas [2]
WoO 153:
Vinte canções folclóricas irlandesas [2]
WoO 154:
Doze canções folclóricas irlandesas [2]
WoO 155: Vinte e seis canções folclóricas galesas
WoO 156: Doze canções folclóricas escocesas
WoO 157: Doze canções de várias nacionalidades
WoO 158a: Vinte e três canções folclóricas continentais
WoO 158b: Sete canções folclóricas britânicas
WoO 158c: Seis canções folclóricas sortidas
WoO 158d: “Air Français”

Cânones vocais

WoO 159–198: Cânones

WoO 159: Im Arm der Liebe ruht sich’s wohl
WoO 160: Cânone em Sol maior (“Care selve”) – Cânone em Dó maior
WoO 161: Ewig dein
WoO 162: Ta ta ta (espúria; falsificada por Anton Schindler)
WoO 163: Kurz ist der Schmerz
WoO 164: Freundschaft ist die Quelle wahrer Glückseligkeit
WoO 165: Glück zum neuen Jahr!
WoO 166: Kurz ist der Schmerz
WoO 167: Brauchle, Linke
WoO 168: Das Schweigen – Das Reden
WoO 169: Ich küsse Sie
WoO 170: Ars longa, vita brevis
WoO 171: Glück fehl’ dir vor allem (espúria; composta por Michael Haydn)
WoO 172: Ich bitt’ dich, schreib’ mir die Es-Scala auf
WoO 173: Hol Euch der Teufel! B’hüt’ Euch Gott!
WoO 174: Glaube und hoffe
WoO 175: Sankt Petrus war ein Fels – Bernardus war ein Sankt
WoO 176: Glück, Glück zum neuen Jahr!
WoO 177: Bester Magistrat, Ihr friert!
WoO 178: Signor Abate!
WoO 179: Seiner Kaiserlichen Hoheit! – Alles Gute, alles Schöne
WoO 180: Hoffmann, sei ja kein Hofmann
WoO 181: Gedenket heute an Baden! – Gehabt euch wohl – Tugend ist kein leerer Name
WoO 182: O Tobias!
WoO 183: Bester Herr Graf, Sie sind ein Schaf!
WoO 184: Falstafferel, lass’ dich sehen!
WoO 185: Edel sei der Mensch, hülfreich und gut
WoO 186: Te solo adoro
WoO 187:  Schwenke dich ohne Schwänke!
WoO 188: Gott ist eine feste Burg
WoO 189: Doktor sperrt das Tor dem Tod
WoO 190: Ich war hier, Doktor, ich war hier
WoO 191: Kühl, nicht lau
WoO 192: Ars longa, vita brevis
WoO 193: Ars longa, vita brevis
WoO 194: Si non per portas
WoO 195: Freu dich des Lebens
WoO 196: Es muss sein!
WoO 197: Da ist das Werk
WoO 198: Wir irren allesamt
WoO 199: Ich bin der Herr von zu”, brincadeira musical
WoO 200: “O Hoffnung!”, tema para piano destinado a exercícios de composição do arquiduque Rudolph [2]
WoO 201:
“Ich bin bereit! – Amen”, brincadeira musical
WoO 202: Das Schöne zum Guten”, cânone enigmático
WoO 203: Das Schöne zu dem Guten”, cânone enigmático
WoO 204: “Holz, Holz, Geigt die Quartette So”, brincadeira musical (espúria; composta por Karl Holz)
WoO 206: Concerto em Fá maior para oboé e orquestra (perdido; restam apenas o esboço do 2º movimento e incipits dos demais) (Hess 12)
Largo (reconstruído por Cees Nieuwenhuizen and Jos van der Zanden)
WoO 207: Romance cantabile em Mi menor para piano, flauta, fagote, dois oboés e orquestra de cordas (Hess 13)
WoO 208: Quinteto em Mi bemol maior para oboé, três trompas e fagote (Hess 19) [2]
WoO 209: Minueto em Lá bemol maior  para quarteto de cordas (Hess 33)
WoO 210: Allegretto em Si maior para quarteto de cordas (Quarteto Pencarrow, Gardi 16)
WoO 211: Andante para piano em Dó maior (Biamonti 52) [2]
WoO 212: Anglaise para piano em Ré maior (Hess 61) [2]
WoO 213a: Andante (bagatelle) em Ré bemol maior (Biamonti 283)
WoO 213b: Finale (bagatelle) em Sol maior (Biamonti 282)
WoO 213c: Allegro (bagatelle) em Lá maior (segunda parte do Biamonti 284) [2]
WoO 213d: Rondó (bagatelle) em Lá maior (Biamonti 275)
WoO 214: Allegretto (bagatelle) em Dó menor (Hess 69)
WoO 215: Fuga em Dó maior para piano (Hess 64) [2]
WoO 216a: Bagatela em Dó maior para piano (Hess 73)
WoO 216b: Bagatela em Mi bemol maior para piano (Hess 74)
WoO 217: Minueto em Fá maior (Biamonti 66) [2]
WoO 218: Minueto em Dó maior (Biamonti 74) [2]
WoO 219: Valsa (ou Ländler) em Dó menor (Hess 68) [2]
WoO 220: Kriegslied für die verbündeten Heere (perdido) (Hess 123)
WoO 221: Canon, Herr Graf (Hess 276)
WoO 222: Cânone em Lá bemol maior (Hess 275)
WoO 227: “Esel aller Esel”, brincadeira musical (Hess 277)

Obras com números Anhang (Anh., “Apêndice”) e Unvollendete (Unv., “Inacabadas”)

Anh. 3: Trio em Ré maior para piano, violino e violoncelo (espúrio – composto por Karl, irmão de Beethoven)
Anh. 4: Sonata em Si bemol para flauta e piano (atribuição incerta) [2]
Anh. 5: Duas sonatinas para piano (provavelmente espúrias)
Sonatina em Sol maior
Anh. 10: Oito variações em Si bemol maior para piano sobre “Ich hab’ein kleines Hüttchen nur” (dúbia) [2]
Unv. 3: Sinfonia no. 10 em Mi bemol maior = Biamonti 838
Unv. 6: Concerto para piano e orquestra em Ré maior = Hess 15
Unv. 8: Duo para violino e violoncelo em Mi bemol maior = Gardi 2
Unv. 9: Allegretto em Mi bemol maior para piano, violino e violoncelo = Hess 48)
Unv. 11: Sonata para violino e piano em Lá maior (Hess 46)
Unv. 12: Fantasia ou Sonata para piano em Ré maior (Biamonti 213) [2]
Unv. 15: “Vestas Feuer”, ópera = Hess 115


OBRAS COM NÚMERO HESS (do catálogo de Willy Hess)
(somente aquelas que não foram mencionadas nas listas anteriores)

Hess 25: Finale original do trio para cordas em Mi bemol maior, Op. 3
Hess 29–31: Prelúdios e fugas para Albrechtsberger (1794–5)
Hess 32: Quarteto de cordas em Fá maior (1799)
Hess 34: Arranjo para quarteto de cordas da sonata para piano Opus 14 no. 1 (1801–02) [2]
Hess 35: Arranjo para quarteto de cordas de uma fuga de Bach (fragmento) (1817)
Hess 36: Arranjo para quarteto de cordas de uma fuga de Händel (1798) [2]
Hess 38: Arranjo para quinteto de cordas de uma fuga de J. S. Bach
Hess 40: Prelúdio e fuga para quinteto de cordas (incompleto) (1817)
Hess 46: Sonata para violino e piano em Lá maior (fragmento) (c.1790)
Hess 47: Allegro con brio em Mi bemol maior para piano, violino e violoncelo
Hess 48: Allegretto em Mi bemol maior para piano, violino e violoncelo
Hess 57: Bagatela em Dó maior (1824) [2]
Hess 58: Exercício para piano em Si bemol maior (1800) [2]
Hess 59: Exercício para piano em Dó maior (1792–1800) [2]
Hess 60: Esboço em Lá maior para piano (1793)
Hess 63: Arranjo para piano da canção “Kaplied” de Christian Friedrich Daniel Schubart (1789)
Hess 64: Fuga em Dó maior
Hess 65: Finale de concerto em Dó maior (arranjo do Opus 37) (1820–1)
Hess 66: Allegretto em Dó menor (1796–7)
Hess 67: Duas danças alemãs para piano (1811) [2]
Hess 69: Allegretto para piano em Dó menor (1794) [2]
Hess 70: Adagio para piano em Sol maior (1803–4) [2]
Hess 71: Molto adagio para piano em Sol maior (1803–4) [2]
Hess 72: Tema com variações para piano em Lá maior, fragmento (1803) [2]
Hess 73: Bagatela em Dó maior [2]
Hess 74:
Bagatela em Mi bemol maior [2]
Hess 84: Rondó para piano (cadenza para o Op. 61a)
Hess 85: Cadenza para piano para o Op. 61a
Hess 87: Grenadiermarsch para piano (arranjo do WoO 29) (1797–8)
Hess 88: Minueto para piano (arranjo do WoO 208) (1790–2) [2]
Hess 89: Ritterballet para piano (arranjo do WoO 1) (1791)
Hess 90: Die Geschöpfe des Prometheus para piano (arranjo do Op. 43) (1801)
Hess 96: Fragmento da sinfonia no. 7, para piano (1813) [2]
Hess 97: “A Vitória de Wellington” para piano e dois canhões (arranjo do Op. 91) (1816) [2]
Hess 98: Scherzo para piano (versão preliminar para o trio Op. 1 no. 2) (1794–9)
Hess 107: Grenadiermarsch para Flötenuhr (arranjo do WoO 29) (1798)
Hess 115: Cena de “Vestas Feuer”, ópera
Hess 118: Música para “Die Weihe des Hauses” (1822)
Hess 133: Das liebe Kätzchen [2]
Hess 134:
Der Knabe auf dem Berge [2]
Hess 137:
Schwinge dich in meinen Dom
Hess 144: Feuerfarb’ [2]
Hess 146:
Der freie Mann
Hess 151: An Henrietten
Hess 192: On the Massacre of Glencoe (versão preliminar)
Hess 201:
Bonny Laddie, Highland Laddie (versão preliminar)
Hess 236:
Fugas a duas vozes
Hess 237: Fugas a três vozes
Hess 238: Fugas para quarteto de cordas
Hess 239: Fugas corais
Hess 243: Fugas duplas
Hess 244: Fugas triplas
Hess 245: Fuga em Ré maior para quarteto de cordas (fragmento)
Hess 263: Te solo adoro

Hess 274: Cânones em Sol maior (1803)
Hess 297: Adagio em Fá maior para três trompas (1815)
Hess 329–30: Esboços
Hess 331: Minueto para quarteto de cordas em Si bemol maior (1799)
Hess 332: Pastorella para quarteto de cordas em Ré maior (1799)
Hess 333: Minuet-Scherzo para quarteto de cordas em Lá maior (1799)
Hess 334: Esboço para quarteto de cordas em Lá maior (1799)

Obras com números Anhang (Anh., “Apêndice”)

Anh. 57: Fugue “Dona nobis pacem” (agora considerada genuína) (1795)


OBRAS COM NÚMEROS BIAMONTI (do catálogo cronológico das obras por Giovanni Biamonti)
(somente aquelas que não foram mencionadas nas listas anteriores)

Bia 48: Anglaise para piano em Sol menor (1792)
Bia 69: Três esboços em estilo canônico
Bia 96: Dezoito esboços
Bia 98: Esboço em Mi bemol maior para sonata
Bia 99: Esboços para Allegretto
Bia 191: Intermezzo em Dó menor para sonata
Bia 213: Fantasia ou Sonata para piano em Ré maior
Bia 268: Fragmento em Lá maior reproduzindo efeito de trompas
Bia 269: Andante molto para piano em Mi bemol maior
Bia 270: Andante em Fá maior
Bia 271:
Fragmento em Mi bemol maior
Bia 272:
 Andante para piano em Si bemol maior (1793)
Bia 273: Fragmento em Fá maior
Bia 276: Dois esboços (1793)
Bia 277: Presto para piano em Sol maior (1793)
Bia 279: Allegro para piano em Dó maior (1793)
Bia 280: Passagem em Si maior
Bia 317: Esboço em Mi bemol maior
Bia 318: Esboço para sonata em Lá menor
Bia 319: Esboços não utilizados para o final das variações “Eroica” (1802)
Bia 345: Tema de fuga em Dó maior
Bia 346: Fuga Antique para piano em Dó maior (1803)
Bia 720: Fragmento em Sol maior
Bia 849: Esboço para piano [últimas notas escritas por Beethoven] (1827)


OBRAS NÃO CATALOGADAS

Do caderno de esboços Kafka:

Peça em Lá maior, Kafka f. 41v
Peça em Dó maior, Kafka f. 47v – pautas 5-8
Allegretto em Lá menor/maior, Kafka f. 47v
Peça em Lá maior, Kafka f. 160r

Do caderno de esboços Kullak

Peça em Fá menor, Kullack f. 51 / 52


Esses incríveis retratos digitais de Beethoven basearam-se em sua máscara feita em vida e em pinturas contemporâneas consideradas fidedignas por pessoas que o conheceram, e são obras do fantástico artista iraniano Hadi Karimi (www.hadikarimi.com)

Vassily

BTHVN250 – A Obra Completa de Ludwig van Beethoven (1770-1827) – Epílogo [The Late String Quartets – Tokyo String Quartet]

A dor nos flancos que recebeu Beethoven no retorno de Gneixendorf agravou-se, e em alguns dias ele estava a afogar-se no sangue que cuspia. Após alguns dias de aparente melhora, passou a vomitar incoercivelmente. Sua pele ficou amarelada, e as pernas e abdome tornaram-se grotescamente inchados. Um médico realizou uma punção para retirar líquido e aliviar-lhe o abdome, depois da qual piorou muito. Propuseram-lhe várias medicações, e a única que lhe adiantou alguma coisa foi um ponche de ervas que Schindler arranjou e, goró que era, ele adorou. Sob o efeito do remédio, que talvez tão só lhe saciasse a sede por álcool, Beethoven melhorou e voltou a contar piadas. Quando ficou óbvio que ele estava a abusar da panaceia, os médicos cortaram seu barato. Ele piorou, ficando ainda mais inchado, alternando períodos de lucidez com desorientação. Outras punções do abdome – paracenteses, no jargão médico – foram realizadas. Logo ficou óbvio que ele não melhoraria, e arranjaram um padre para administrar-lhe a Extrema Unção. Beethoven, que sempre fora um anticlerical, aceitou os ritos com aparente serenidade. Ao se espalhar a notícia de que ele estava em angústias de morte, amigos e parentes começaram a chegar a seu caótico apartamento na Schwarzspanierhaus – o último de seus sessenta e sete endereços em Viena. Vinham, também, presentes. Quando lhe mostraram uma caixa de vinho Riesling enviada pelo seu editor Schott, de Mainz, Ludwig lamentou:


Pena, pena: tarde demais!


Seriam suas últimas palavras.

Em seguida ele mergulharia em obnubilação e coma. A julgar pelos relatos dos contemporâneos, teriam sido necessárias arquibancadas para acomodar todos aqueles que afirmaram estarem do seu lado no seu leito de morte. Seu irmão Johann e o fiel amigo e secretário Karl Holz estavam próximos, mas apenas o amigo Hüttenbrenner e a cunhada Therese testemunharam o momento em que, na tarde de 26 de março de 1827, durante uma brutal tormenta, Ludwig revirou-se na cama e, fazendo um brusco gesto com um dos braços, expirou.

Tinha cinquenta e seis anos.

ooOoo

Ninguém tem certeza, mas é bastante provável que a detalhada autópsia que se realizou no famélico cadáver tenha sido encomendada pelo próprio Beethoven, que vinte e cinco anos antes manifestara, no chamado “Testamento de Heiligenstadt”, a vontade de que o mundo soubesse o que o levara à surdez:


Peço-vos, meus irmãos, assim que eu fechar os olhos, se o professor Schmidt [seu então médico] ainda for vivo, fazer-lhe em meu nome o pedido de descrever a minha moléstia e juntai a isto que aqui escrevo para que o mundo, depois de minha morte, se reconcilie comigo”


Para alguns mórbido, para outros (eu incluso) fascinante, o laudo da autópsia de Beethoven, escrito em latim, foi encontrado em 1970, ano do bicentenário do Mestre. Entre os achados, cirrose do fígado e uma imensa quantidade de líquido dentro do abdome, que levam o profissional de saúde que sou nas horas vagas a concluir que Ludwig morreu de insuficiência hepática, provavelmente decorrente do alcoolismo, para qual a gota d’água foi a pneumonia que ele contraiu ao brigar com o irmão em Gneixendorf e voltar para Viena numa carroça de leite. Sobre seus ouvidos, lamentavelmente, nada se pôde concluir: apesar da autópsia mostrar que eles estavam gravemente comprometidos, não se chegou a um diagnóstico definitivo. Beethoven, esteja onde estiver, segue sem saber a causa da surdez que o desgraçou, embora haja – como em quase tudo que lhe diz respeito à vida – muitas suposições e anedotas.

[há muito mais para comentar, e muito ainda se escreve e se pesquisa acerca das pestes que assolaram Ludwig a vida toda e a doença que acabaria por matá-lo. Encerro o plantão médico por aqui, mas convido os interessados a continuarmos o assunto, que envolve chumbo mas provavelmente não mencionará sífilis, na caixa de comentários]

Dois dias depois da morte, o corpo de Beethoven foi preparado para o funeral. Tomaram-lhe um molde para a máscara mortuária, vestiram-no com uma túnica e um gorro – ao estilo de Dante – e coroaram-no com rosas. Já no caixão, as mãos de Ludwig receberam uma cruz (que ele certamente estranharia) e um lírio – sua flor favorita.

O convite para as exéquias de Beethoven, impresso por seu irmão Johann

O cortejo fúnebre reuniu dezenas de milhares de pessoas. Entre os que se revezaram na condução do caixão, naturalmente predominavam os músicos. Os mais notáveis eram Seyfried, Weigl, Gyrowetz, e Hummel, dos quais apenas este último ainda é ouvido nos dias de hoje. Junto a eles estava alguém que bem que poderia ser eu, um introspecto rapaz de óculos que idolatrava Beethoven. Diferentemente de mim, no entanto, Franz Schubert era um gênio. Dentro de um ano, por ocasião do primeiro aniversário da morte de Ludwig, ele teria, com o primeiro concerto público de suas obras, o único gosto de sucesso em sua breve vida. Não veria o final daquele 1828, pois morreria em novembro. De acordo com Hüttenbrenner, ao retornar do funeral de Beethoven, Schubert fez um brinde ao venerado mestre, acrescentando um outro “àquele que enterraremos a seguir” – sem imaginar que brindava a si mesmo.

Túmulos originais de Beethoven e Schubert (hoje cenotáfios) no antigo cemitério de Währing (hoje Parque Schubert), em Viena, Áustria

Claro que houve música no funeral: além do Réquiem de Cherubini (hoje esquecido, mas muito admirado por Beethoven), foram ouvidas três peças do mestre. Uma delas foi a “Marcha Fúnebre” da sonata Op. 26, na orquestração que ele preparara para a música de cena de “Leonore Prohaska”. As outras foram dois de seus três “equali” para trombone, num arranjo vocal de Ignaz Seyfried que, apesar de publicado, eu nunca soube se foi gravado.

De acordo com a praxe da época, uma ode fúnebre foi declamada à turba na entrada do cemitério. Escrita pelo então famoso dramaturgo Franz Grillparzer, ela foi assim lida pelo ator Heinrich Anschütz:


Nós, que estamos aqui junto ao túmulo do falecido, somos, em certo sentido, os representantes de uma nação inteira, todo o povo alemão, vindo para lamentar o falecimento de uma metade célebre daquilo que nos restou do brilho desaparecido da Pátria. O herói da poesia na língua e na língua alemã [Goethe] ainda vive – e que viva muito! Mas o último mestre da canção retumbante, a boca graciosa pela qual a música falava, o homem que herdou e aumentou a fama imortal de Händel e Bach, de Haydn e Mozart, deixou de existir; e ficamos chorando pelas cordas partidas de um instrumento agora calado.

Um instrumento agora calado – deixem-me chamá-lo assim! Pois ele era um artista, e o que era, o era apenas por meio da arte. Os espinhos da vida o feriram profundamente, e, tal qual o náufrago que se agarra à costa salvadora, voou para os teus braços, ó maravilhosa irmã dos bons e verdadeiros, consoladora na aflição, a Arte que vem do alto! Ele se agarrou a você, e, mesmo quando o portão pelo qual você entrou foi fechado, você falou por um ouvido surdo àquele que não mais a podia discernir; e ele carregou sua imagem em seu coração e, quando ele morreu, ela ainda estava em seu peito.

Ele era um artista – e quem ficará ao lado dele? Tal qual o gigante varre os mares, ele trespassou os limites de sua arte. Do arrulhar da pomba ao ruído do trovão, do mais engenhoso entrelaçamento de artifícios intencionais até aquele ponto terrível em que o tecido pressiona para a desordem das forças naturais em choque – ele atravessou tudo, ele compreendeu tudo. Quem o segue não pode continuar; ele deve começar de novo, pois seu predecessor terminou onde a Arte termina.

Adelaide e Leonore! Celebrações dos heróis de Vittoria e humílimos tons da Missa! Prole de três e quatro vozes. Sinfonia retumbante, “Freude, schöner Götterfunken” – o Canto do Cisne. Musas de canto e de cordas, reúnam-se em seu túmulo e cubram-no com louros!

Ele era um artista, mas também um homem, um homem em todos os sentidos, no mais elevado dos sentidos. Porque ele se isolou do mundo, eles o chamaram de hostil; e insensível, porque evitava sentimentos. Oh, quem sabe que está empedernido não foge! (é o ponto mais delicado que mais facilmente se cega, que se dobra, que parte).

O excesso de sentimento evita sentimentos. Ele fugiu do mundo porque não encontrou, em todo o âmbito de sua natureza amorosa, uma arma para resistir a ela. Ele se afastou de seus semelhantes depois de dar tudo a eles e não receber nada em troca. Ele permaneceu sozinho porque não encontrou um segundo eu. Mas, até sua morte, ele preservou um coração humano para todos os homens, um coração de pai para seu próprio povo: o mundo inteiro.

Assim ele foi, assim ele morreu, assim ele viverá para sempre!

E você, que seguiu seu cortejo até este lugar, mantenha sua tristeza sob controle. Você não o perdeu, mas o ganhou. Nenhum homem vivo entra nos corredores da imortalidade. O corpo deve morrer antes que os portões sejam abertos. Aquele por quem você lamenta está agora entre os maiores homens de todos os tempos, para sempre inexpugnável. Voltem para suas casas, então, angustiados, mas recompostos. E sempre que, durante suas vidas, o poder de suas obras os oprimir como uma tempestade que se aproxima; quando o seu arrebatamento se derramar no meio de uma geração ainda não nascida; então, lembre-se desta hora e pense: nós estávamos lá quando o sepultaram, e quando ele morreu nós choramos!

E vocês me achavam prolixo…

ooOoo

O sossego de Beethoven foi interrompido em duas ocasiões. Na primeira, em 1863, quando seus restos mortais (e os de Schubert) foram exumados e estudados pela Sociedade de Amigos da Música de Viena. Na ocasião, foi tomada uma fotografia de seu crânio que, juntamente com várias mechas de cabelo espalhadas pelo mundo, são as únicas relíquias que restaram da combalida carcaça do Mestre. A segunda exumação, em 1888, ocorreu por causa da desativação do velho cemitério de Währing, e seguiu-se duma pomposa procissão de honra que levou os despojos de Beethoven e Schubert até o distante Cemitério Central de Viena que, apesar do nome, está a uma eternidade do centro da cidade. Ali, Ludwig repousa próximo a vários de seus fãs –  Schubert (que segue a seu lado), Brahms (dobrando a esquina) e até Schoenberg (um pouco mais adiante) – e é anualmente visitado por milhares de outros que asseguram, mesmo nos mais bicudos invernos, que o Mestre sempre receba flores frescas.

Túmulos de Beethoven (à esquerda) e Schubert (à direita), ladeando o cenotáfio de Mozart no Cemitério Central de Viena (foto do autor)

Termino de contar-lhes, aqui, as desventuras terrenas de Ludwig van Beethoven.

Admiti desde o começo desta série – quando eu e Beethoven éramos meninos de seis anos – que esse meu tributo composto ao longo de mais de dez meses seria completamente parcial. Sou fã de Beethoven e, assim como o mundo, não me consigo imaginar sem suas criações. E, ainda que sua improvável trajetória da provinciana Bonn à imperial Viena, através duma existência infeliz e quase todas agruras possíveis à saúde de um homem, esteja ligada de modo inexorável à sua produção artística, a apreciação de seu gênio prescinde completamente de nossa compaixão por ele. Basta-nos a contemplação do espetáculo: de seus burilados trios dos vinte e poucos anos ao quarteto que escreveu a poucos meses da morte; das ingênuas Variações “Dressler” à visionária Grande Fuga; do Op. 1 ao Op. 135, não há na História da Arte evolução mais coerente e impressionante que a deste homem que nasceu há exatos duzentos e cinquenta anos, num 16 de dezembro, para ser batizado no dia seguinte, que celebraria como seu aniversário.

ooOoo

Ao Mestre, com carinho.

In memoriam Ludwig van Beethoven – gênio da Música e herói de minha vida inteira – por ocasião de seu ducentésimo quinquagésimo aniversário

CONSVMMATVM EST
29-1-2020 – 16-12-2020

Vassily Genrikhovich


Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)

Quarteto em Mi bemol maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 127
Composto entre 1824-25
Publicado em 1826
Dedicado ao príncipe Nikolay von Golitsyn

1 – Maestoso – Allegro
2 – Adagio, ma non troppo e molto cantabile – Andante con moto – Adagio molto espressivo – Tempo I
3 – Scherzando vivace
4 – Allegro

Quarteto em Dó sustenido menor para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 131
Composto entre 1825-26
Publicado em 1827
Dedicado ao barão Joseph von Stutterheim

5 – Adagio ma non troppo e molto espressivo
6 – Allegro molto vivace
7 – Allegro moderato – Adagio
8 – Andante ma non troppo e molto cantabile – Andante moderato e lusinghiero – Adagio – Allegretto – Adagio, ma non troppo e semplice – Allegretto
9 – Presto
10 – Adagio quasi un poco andante
11 – Allegro

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE


Quarteto em Si bemol maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 130
Composto entre 1824-25
Publicado em 1827
Dedicado ao príncipe Nikolay von Golitsyn

1- Adagio, ma non troppo – Allegro
2 – Presto
3 – Andante con moto, ma non troppo. Poco scherzoso
4 – Alla danza tedesca. Allegro assai
5 – Cavatina. Adagio molto espressivo

Grande Fuga em Si bemol maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 133
6 – Overtura – Fuga – Meno mosso e moderato – Fuga – Coda

Quarteto, Op. 130
7 – Finale: Allegro

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE


Quarteto em Lá menor para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 132
Composto em 1825
Publicado em 1826
Dedicado ao príncipe Nikolay von Golitsyn

1 – Assai sostenuto – Allegro
2 – Allegro ma non tanto
3 – Heiliger Dankgesang eines Genesenen an die Gottheit, in der Lydischen Tonart: Molto adagio – Andante
4 – Alla marcia, assai vivace – attacca:
5 – Allegro appassionato

Quarteto em Fá maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 135
Composto em 1826
Publicado em 1827
Dedicado a Johann Wolfmayer

6 – Allegretto
7 – Vivace
8 – Lento assai, cantante e tranquillo
9 – Der schwer gefaßte Entschluß. Grave, ma non troppo tratto (“Muss es sein?“) – Allegro (“Es muss sein!“) – Grave, ma non troppo tratto – Allegro

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE

Tokyo String Quartet:
Peter Oundjian e Kikuei Ikeda, violinos
Kazuhide Isomura, viola
Sadao Harada, violoncelo

Ludwig e Vassily

 

BTHVN250, por René Denon

Vassily

BTHVN250 – A Obra Completa de Ludwig van Beethoven (1770-1827) – Quarteto para cordas em Fá maior, Op. 135 [The Late String Quartets – Guarneri Quartet]

Depois da expansividade dos complexos quartetos Opp. 130 a 132, que redefiniram o gênero, e da visionária Grande Fuga, a aparente simplicidade do Op. 135 pode causar estranheza. Tanto em tamanho quanto em transparência das partes, ele é mais afeito aos primeiros quartetos do Op. 18 do que a qualquer um que Beethoven tenha escrito com grisalhos. Além disso, ele tem tão só os tradicionais quatro movimentos,  na ordem em que ele os preferia na maturidade, com o Scherzo antes do movimento lento. As aparências, no entanto, são somente superficiais, pois só um consumado e experiente mestre poderia criá-lo – como se, depois de ousadas jornadas de expansão, Ludwig se voltasse agora para a concentração.

Transparência é quase tudo o que se ouve no melífluo primeiro movimento, repleto de delicadas filigranas e que, apesar da riqueza de detalhes das partes, desenvolve-se com leveza, sem a menor sugestão de prolixidade. Ele nos faz baixar a guarda completamente, a fim de que o enérgico e sincopado Scherzo – num gesto beethoveniano bem típico – nos surpreenda com sua energia crua, particularmente no alvoroçado solo de violino no Trio. Segue-se um belíssimo movimento lento, na distante tonalidade de Ré bemol maior, à guisa da Cavatina do Op. 130 ou do Cântico do Op. 132. Não há aqui, entretanto, nada de caloroso ou consolador: o tema e as variações são constritos, como se tentassem manter-se sob controle após a explosão temperamental do Scherzo.

Nenhum desses movimentos, no entanto, deu tanto pano para manga quanto o finale. Não é à toa: além de colocar-lhe o críptico título Der schwer gefasste Entschluss (“A decisão tomada com dificuldade”), Beethoven escreveu sobre a partitura as frases Muss es sein?/Es muss sein! (“Tem que ser?”/”Tem que ser!”), atribuindo-lhes fragmentos melódicos ouvidos no início do movimento – a pergunta enunciada em Grave por viola e violoncelo, e a resposta estridentemente dada em Allegro pelos violinos.


Muito – mas muito mesmo – se conjecturou sobre o que levou Beethoven a fazer isso no encerramento da derradeira obra de seu catálogo. Da aceitação da morte iminente até uma piada interna a um amigo para o qual perdera uma aposta, o cardápio de achismos e anedotas é vasto. Há quem afirme que as inscrições são uma referência a um certo Dembscher, um músico amador que queria tomar emprestada de Ludwig a partitura do Op. 130. Como ele não tinha comparecido à estreia do quarteto, o compositor recusou-se, e só cederia as partes da obra até então inédita se o rapaz pagasse retroativamente o ingresso do concerto do Quarteto Schuppanzigh. Dembscher, então, perguntou-lhe se assim tinha que ser, e Beethoven lhe respondeu com um cânone:


“Tem que ser! Sim, sim, sim, sim: pegue sua carteira!”

Pitoresco? Sem dúvidas, mas também por demais prosaico para aparecer com tanto destaque numa partitura duma obra importante. Muitos biógrafos, assim, preferiram levar a sério o que escreveu o editor Schlesinger, trinta anos depois:

Em relação à frase enigmática Muss es sein? que surge no último quarteto, acho que posso explicar seu significado melhor do que a maioria das pessoas, pois possuo o manuscrito original com as palavras escritas por sua própria mão, e quando ele as enviou, ele também escreveu o seguinte; ‘Você pode traduzir o Muss es sein como uma demonstração de que tive azar, não só porque foi extremamente difícil escrever isso quando eu tinha algo muito maior em minha mente, e porque eu só o escrevi de acordo com minha promessa a você, e porque estou precisando desesperadamente de dinheiro – o que é difícil de conseguir; ocorreu também que estava ansioso para enviar-lhe a obra em partes, para facilitar a gravação, e em toda Mödling (onde ele vivia) não consegui encontrar um único copista, por isso tive de copiá-la eu próprio, e você pode imaginar que função foi isso!”

Imagino que alguma lágrima deva ter escapado a Schlesinger ao receber as partes passadas a limpo nos hieróglifos de Beethoven, mas o que ele alegava (e que não podia provar materialmente, pois o bilhete do compositor se perdera num incêndio) realmente tinha fundamento. Que Ludwig precisava desesperadamente de dinheiro, isso nunca foi qualquer novidade (e foram poucas as postagens em nossa série em que não mencionamos suas aperturas financeiras); e o algo “muito maior” em sua mente bem que poderia ser a tentativa de suicídio de seu sobrinho Karl, que continha mais um pedido de socorro do que uma verdadeira intenção de matar-se, e que certamente carcomeu qualquer improvável reserva monetária que tivesse. No entanto, Beethoven não estava em Mödling, e sim em Gneixendorf, o que indica que, talvez, Schlesinger tenha tomado algumas licenças poéticas para com sua memória.

Qualquer que fosse a difícil decisão, ela também envolveu alguma indecisão sobre como intitulá-la: Beethoven hesitou entre der gezwungene Entschluss (“a decisão forçada”) e der harte Entschluss (“a dura decisão”) antes de chegar ao título definitivo. E parece mesmo que ela não foi firme, pois – após a introdução com a pergunta lenta e a resposta exultante – o movimento segue lépido até que, surpreendentemente, o tema da pergunta retorna, como uma soturna nota de advertência. Por fim, ele parece repelido por um episódio à maneira de dança e uma coda imensamente assertiva.

Um dos primeiros biógrafos de Beethoven encontrou a seguinte nota, com a medonha letra do compositor:

Aqui, meu caro amigo, está o meu último quarteto. Será o último; e de fato me deu muitos problemas, pois não consegui compor o último movimento. Mas como as suas cartas estavam a lembrar disso, no final decidi compô-lo. E é por isso que escrevi o lema: “A difícil resolução – Deve ser? – Deve ser, deve ser!”

Embora alguns estudiosos afirmem que Beethoven pretendesse inaugurar com o Op. 135 uma nova série de quartetos, ele não deixou qualquer anotação legível para algum outro. O enigmático movimento “Tem que ser?” acabou por encerrar a última obra que completaria. Depois dela, ainda escreveria o “Pequeno Finale” do Op. 130 – aquele que substituiu a Grande Fuga, extirpada para publicação separada – e faria outros esboços na tranquilidade de Gneixendorf, a uns 60 km de Viena, onde seu irmão Johann tinha uma propriedade rural. A bucólica estadia, no entanto, chegou a fim num tradicional acesso de cólera beethoveniana – e, no caso, envolvendo não apenas um, mais dois Beethovens – que o levou a deixar Gneixendorf intempestivamente. Conta-se que, por questão de orgulho, Ludwig se recusou a tomar emprestada a carruagem de Johann, e voltou numa carroça de leite aberta, em passos de formiga, no gelado inverno austríaco. Como a carroça não o levaria até Viena – talvez porque o carroceiro tenha se cansado dele -, passou uma noite numa espelunca sem aquecimento. Quando enfim chegou em casa, seus cinquenta e seis explodidos anos e a exposição insensata ao frio apresentaram-lhe a conta: uma dor aguda nos flancos e muita tosse.

A morte, com que sua carcaça flertara por toda a vida, fora finalmente convidada a entrar.

Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)

Quarteto em Mi bemol maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 127
Composto entre 1824-25
Publicado em 1826
Dedicado ao príncipe Nikolay von Golitsyn

1 – Maestoso – Allegro
2 – Adagio, ma non troppo e molto cantabile – Andante con moto – Adagio molto espressivo – Tempo I
3 – Scherzando vivace
4 – Allegro

Quarteto em Fá maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 135
Composto em 1826
Publicado em 1827
Dedicado a Johann Wolfmayer

5 – Allegretto
6 – Vivace
7 – Lento assai, cantante e tranquillo
8 – Der schwer gefaßte Entschluß. Grave, ma non troppo tratto (“Muss es sein?“) – Allegro (“Es muss sein!“) – Grave, ma non troppo tratto – Allegro

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Quarteto em Si bemol maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 130
Composto entre 1824-25
Publicado em 1827
Dedicado ao príncipe Nikolay von Golitsyn

1- Adagio, ma non troppo – Allegro
2 – Presto
3 – Andante con moto, ma non troppo. Poco scherzoso
4 – Alla danza tedesca. Allegro assai
5 – Cavatina. Adagio molto espressivo
6 – Finale: Allegro

Grande Fuga em Si bemol maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 133
Composto entre 1825-26
Publicado em 1827
Dedicado ao arquiduque Rudolph da Áustria

7 – Overtura – Fuga – Meno mosso e moderato – Fuga – Coda

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Quarteto em Dó sustenido menor para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 131
Composto entre 1825-26
Publicado em 1827
Dedicado ao barão Joseph von Stutterheim

1 – Adagio ma non troppo e molto espressivo
2 – Allegro molto vivace
3 – Allegro moderato – Adagio
4 – Andante ma non troppo e molto cantabile – Andante moderato e lusinghiero – Adagio – Allegretto – Adagio, ma non troppo e semplice – Allegretto
5 – Presto
6 – Adagio quasi un poco andante
7 – Allegro

Quarteto em Lá menor para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 132
Composto em 1825
Publicado em 1826
Dedicado ao príncipe Nikolay von Golitsyn

8 – Assai sostenuto – Allegro
9 – Allegro ma non tanto
10 – Heiliger Dankgesang eines Genesenen an die Gottheit, in der Lydischen Tonart: Molto adagio – Andante
11 – Alla marcia, assai vivace – attacca:
12 – Allegro appassionato

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Guarneri Quartet:
Arnold Steinhardt e John Dalley,
violinos
Michael Tree, viola
David Soyer, violoncelo

Adoro essas poses para fotos: parecem que vão se furar os olhos com os arcos uns aos outros
BTHVN250, por René Denon

Vassily

BTHVN250 – A Obra Completa de Ludwig van Beethoven (1770-1827) – Quarteto para cordas em Lá menor, Op. 132 [The Late String Quartets – The Juilliard Quartet]

Varíola, asma, diarreia; melancolia, hemorroidas, tifo; febres intermitentes, abscessos na mão e na mandíbula, mais diarreia; zumbido e surdez progressiva; reumatismos, icterícia, e sempre diarreia; gota, bronquites, pneumonias; por fim, ascite, peritonite e óbito.

Estar vivo, para Beethoven, sempre foi um fenômeno, e qualquer um que leia a lista abreviada de suas agruras de saúde – às quais se somava o notório alcoolismo – surpreende-se com que ele tenha chegado aos cinquenta e seis anos. A morte, aliás, sempre foi um tema recorrente em sua existência. Perdera irmãos recém-nascidos; perdera Maria Magdalena, sua querida mãe, para a tuberculose; morreu-lhe o pai, Johann, um alcoolista violento, deixando-o responsável pelos irmãos; mais tarde, a constatação da surdez leva-o a contemplar o suicídio, conforme contou-nos pelo Testamento de Heiligenstadt; anos depois, morre seu irmão Caspar Karl, também vítima de tuberculose, legando-lhe o cuidado de Karl, seu sobrinho; após encarniçada batalha judicial com a mãe de Karl, por fim, este tenta se matar. Para alguém de existência e derredores tão mórbidos, até que o resiliente Beethoven se saiu admiravelmente bem em manter-se vivo.

No inverno de 1824, no entanto, a morte chamou-o para conversar. Passou vários meses gravemente enfermo, com uma violenta inflamação intestinal, e a sangrar por todos os orifícios. Seu médico mandou-o para um spa onde, muito a contragosto, manteve-se longe do goró e de sua comida favorita, a sopa alemã de bolinhos de fígado (Leberknödelsuppe). Passou quase a estação toda acamado, excretando pestilências, enquanto escrevia aos amigos em tom de despedida, na certeza de que não veria a primavera.

Contrariando as expectativas, a primavera lhe chegou. Retornou ao trabalho e aos quartetos que prometera ao príncipe Golitsyn. Para o segundo deles, escreveu um dos cumes de toda Música: o autoexplicativo  Heiliger Dankgesang eines Genesenen an die Gottheit, in der lydischen Tonart (“Cântico de Agradecimento à Divindade por um Convalescente, no Modo Lídio”), coração cálido do mais ossudo de seus quartetos da maturidade. Escrito no modo lídio – que aqui corresponde às teclas brancas do piano, de um Fá a outro -, o “Cântico” é uma obra francamente devocional que remete à música sacra de Palestrina, interrompida por momentos jubilosos, na radiante tonalidade de Ré maior, aos quais Beethoven apôs a descrição Neue Kraft fühlend (“Sentindo nova força”). Volto a ele sempre que posso – afinal de contas, as moléstias incuráveis do mundo assim me exigem – e ele nunca deixa de me impressionar. É daqueles momentos que justificam toda Arte, todos os ouvidos, e a própria existência do som.

Admito que, muitas vezes, revisito o Cântico sem passar por seus movimentos vizinhos. Naturalmente, ele soa muito diferente fora de seu contexto original. Antecedem-no um constrito e turbulento movimento de abertura, e um minueto com scherzo que pouco fazem por aliviar a sensação opressiva. Vem o Cântico, que soa libertador, e parece não se extinguir, e sim dirigir-se ao espaço – e nenhuma surpresa poderia ser maior que a impetuosa, crua marcha que o segue imediatamente. Ela logo desemboca um tenso recitativo, muito evocativo dos recitativos para cordas que abrem o Finale da Nona Sinfonia, e que se resolve num Allegro que foi esboçado exatamente para o Finale da Nona. Tenso e turbulento como o movimento de abertura, ele só alivia a opressão nos compassos finais, que soam incrivelmente parecidos com os que encerram a Grande Fuga, terminando em tonalidade maior.

Lembro que, numa conversa online, enquanto discutíamos no grupo de autores aqui do blog a beleza avassaladora do Cântico, ocorreu a nosso patrão PQP perguntar que tipo de doença tão terrível seria capaz de prostrar um homem a ponto de fazê-lo agradecer de maneira tão maravilhosa por sua recuperação. Eu, que nas minhas horas vagas tento ajudar as pessoas a se manterem vivas, tentei dar-lhe uma descrição detalhada do mal de Ludwig, com todos dissabores e fedores. Acredito tê-lo traumatizado para sempre, e aposto que até hoje suas narinas evocam memórias do que lhe descrevi cada vez que escuta o Cântico. Já eu, ao ouvi-lo, e acostumado pela profissão a não me impressionar com a podridão de que nossa sarx é capaz, não canso de reverenciar o mestre renano que carregou seu saco de tripas até onde pôde e, em angústias de morte, soube elevar seu canto à Música das Esferas.

Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)

Quarteto em Lá menor para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 132
Composto em 1825
Publicado em 1826
Dedicado ao príncipe Nikolay von Golitsyn

1 – Assai sostenuto – Allegro
2 – Allegro ma non tanto
3 – Heiliger Dankgesang eines Genesenen an die Gottheit, in der Lydischen Tonart: Molto adagio – Andante
4 – Alla marcia, assai vivace – attacca:
5 – Allegro appassionato

Quarteto em Fá maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 135
Composto em 1826
Publicado em 1827
Dedicado a Johann Wolfmayer

6 – Allegretto
7 – Vivace
8 – Lento assai, cantante e tranquillo
9 – Der schwer gefaßte Entschluß. Grave, ma non troppo tratto (“Muss es sein?“) – Allegro (“Es muss sein!“) – Grave, ma non troppo tratto – Allegro

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Quarteto em Mi bemol maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 127
Composto entre 1824-25
Publicado em 1826
Dedicado ao príncipe Nikolay von Golitsyn

1 – Maestoso – Allegro
2 – Adagio, ma non troppo e molto cantabile – Andante con moto – Adagio molto espressivo – Tempo I
3 – Scherzando vivace
4 – Allegro

Quarteto em Dó sustenido menor para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 131
Composto entre 1825-26
Publicado em 1827
Dedicado ao barão Joseph von Stutterheim

5 – Adagio ma non troppo e molto espressivo
6 – Allegro molto vivace
7 – Allegro moderato – Adagio
8 – Andante ma non troppo e molto cantabile – Andante moderato e lusinghiero – Adagio – Allegretto – Adagio, ma non troppo e semplice – Allegretto
9 – Presto
10 – Adagio quasi un poco andante
11 – Allegro

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Quarteto em Si bemol maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 130
Composto entre 1824-25
Publicado em 1827
Dedicado ao príncipe Nikolay von Golitsyn

1- Adagio, ma non troppo – Allegro
2 – Presto
3 – Andante con moto, ma non troppo. Poco scherzoso
4 – Alla danza tedesca. Allegro assai
5 – Cavatina. Adagio molto espressivo
6 – Finale: Allegro

Grande Fuga em Si bemol maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 133
Composto entre 1825-26
Publicado em 1827
Dedicado ao arquiduque Rudolph da Áustria

7 – Overtura – Fuga – Meno mosso e moderato – Fuga – Coda

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The Juilliard Quartet:
Robert Mann e Earl Carlyss,
violinos
Samuel Rhodes,
viola
Joel Krosnick,
violoncelo

 

BTHVN250, por René Denon

Vassily

BTHVN250 – A Obra Completa de Ludwig van Beethoven (1770-1827) – Grande Fuga em Si bemol maior para quarteto de cordas, Op. 133 [The Late String Quartets – LaSalle Quartet]

“Schuppanzigh é um patife!”

Assim começa a carinhosa homenagem que Beethoven fez a seu amigo de longa data, o violinista Ignaz Schuppanzigh, no curto cânone lisonjeiramente intitulado Lob auf den Dicken (“Louvor ao Gordo”). Nenhum dos dois imaginaria que, duzentos e tantos anos depois, suas piadas de quinta série  tivessem não só sido publicadas como disponíveis a zilhões de pessoas através de gravações e redes sociais.

Em magros tempos, bem antes daqueles em que Beethoven se divertia ao vê-lo chegar a seu bagunçado apartamento em estado pré-óbito, depois de subir quatro lances de escadas, Schuppanzigh ensinou violino ao boçal amigo, que já aprendera violino e tocara viola profissionalmente em Bonn – e, sim, admito que gostaria de viajar no tempo não só para conhecer Beethoven, mas abastecer Schuppanzigh com piadas de violistas e ajudá-lo a ir à forra.

Beethoven, aparentemente, não detinha o monopólio das piadas sobre Schuppanzigh

Não sei lhes dizer para que as lições de violino serviram a Ludwig, mas a amizade entre eles sustentou-se, entre raios e trovões, até o final da vida de nosso herói. Mais ainda: afora as piadas e incursões trêbadas por tavernas e zonas de baixo meretrício, Schuppanzigh foi fundamental para que Beethoven revolucionasse o quarteto de cordas. Até então, as obras do gêneros eram executadas por amadores hábeis ou profissionais esporadicamente reunidos. O “patife” liderou o que foi provavelmente primeiro quarteto de cordas estável e profissional, que serviu ao príncipe Lichnowsky e, posteriormente, ao conde Razumovsky, que encomendara a Beethoven os três quartetos que eternizariam seu nome. A determinação de Ludwig em expandir os então quadradinhos limites do gênero agradeceu a oportunidade de dispor de um quarteto permanente de grandes músicos disponíveis para ensaiar e apresentar as desafiadores obras que lhes escreveria e, a partir daí, não parou de abastecê-los com obras-primas.

O quarteto do conde terminou juntamente com seu palácio vienense, que pegou fogo, o que fez Schuppanzigh mudar-se para São Petersburgo. Quando voltou, a tempo de servir de spalla na estreia da Nona Sinfonia, reestabeleceu seu quarteto com músicos mais jovens, com os quais passou a apresentar-se num inédito sistema de assinaturas. Beethoven, que aceitara a encomenda de três quartetos pelo príncipe Golitsyn, naturalmente confiou ao velho amigo suas estreias. A primeira delas foi a do Op. 127, que, como vimos, acabou num fiasco creditado por Ludwig – a quem mais? – à corpulência do violinista, tanto pela alegada lentidão da performance quanto pelos problemas de entonação de seus gordos dedos. Numa prova sem precedentes de amizade, Beethoven – que não era exatamente conhecido por praticar o perdão – acabou livrando a barra de Schuppanzigh e mantendo sob suas responsabilidade as demais estreias.

Fico imaginando o que passou pela cabeça do Dicke, que já tinha queimado sua cota de tolerância com o compositor, quando ele recebeu a partitura do Op. 130 e viu seu último movimento. Em lugar dum finale espirituoso, consonante com leveza da maioria dos cinco movimentos precedentes, lá estava uma assim intitulada “Overtura” que começava com um violento Sol em uníssono e, após alguma hesitação murmurante, redundava em algo chamado “Fuga” que, evidentemente, era muito diferente de qualquer coisa que já existira. Além de modulações inusitadas, os temas angulosos a provocarem incontáveis dissonâncias, a completa falta de empatia com os músicos, tanto individualmente (com as partes dificílimas) quanto para o conjunto… Meu palpite é que, ao folhear as páginas, Schuppanzigh – que já achara complicado ensaiar os sinfônicos quartetos para Razumovsky – tenha sido invadido por um misto de horror e desespero. Acima de tudo, devia morder-lhe a inevitável pergunta: como tocar aquela criatura transcendentalmente difícil, e tão completamente sem precedentes e concessões?

Certamente não o perguntaria a Beethoven, que tinha por aquela fuga tanta consideração que, como já lhes escrevi antes, chamou de jegues e vacuns aqueles que não pediram para bisá-la na estreia. Com o passar do tempo, o gado falante começou a espalhar a notícia de que talvez ele ficara louco, e de aplicar epítetos que iam de “incompreensível” a “horrendo” o movimento final do quarteto, que só poderia ser produto de surdez e desatino. O compositor sempre defendia com ferocidade suas convicções e não agiu diferentemente: ainda que várias vezes na carreira demonstrasse insegurança a respeito da aceitação de suas obras, e tenha muitas vezes substituído movimentos inteiros nesse sentido – como, por exemplo, Andante favori que limou da “Waldstein” e o finale original da sonata “Kreutzer, que acabou migrando para a Op. 30, no. 1 -, afirmou que nada mudaria em sua Grande Fuga.

Ao editor Artaria, que já tinha pago a Beethoven o valor estipulado para publicação, só cabia a resignação. Enquanto preparava os clichês, no entanto, ocorreu-lhe que talvez pudesse mudar a posição do legendário turrão ao tocar-lhe nos infalíveis pontos fracos: a vaidade, o bolso e os amigos.

Artaria começou pela vaidade, e perguntou a Beethoven se ele se disporia a fazer uma transcrição da Grande Fuga para duo pianístico. A oferta foi recusada, pois Ludwig já se via envolto nos trabalhos do monumental quarteto seguinte (Op. 131), que prometera a outro editor, mas resolveu depois ele próprio fazê-la, porque odiou a transcrição feita por outro compositor contratado por Artaria. O resultado desse trabalho (publicado após sua morte sob o Op. 134) foram alguns tostões e a firme consideração de que a Grande Fuga, que agora revisitava, tinha plenas condições de manter-se como uma obra independente.

Artaria, então, resolveu acariciar-lhe o bolso. Como não era louco nem nada, não tratou diretamente com a fera, e sim acionar um amigo de Beethoven para convencê-lo a substituir o final. E, nessa guerrilha negociatória, o editor tocou em seu terceiro ponto sensível: a opinião dos amigos mais próximos, que sempre levava em conta para todas decisões que tomava, exceto em sua falida vida amorosa.

Imagino que tenha conversado com Schuppanzigh e que este tenha refugado, com medo de se queimar outra vez com o amigo. A opção mais óbvia, no entanto, era Karl Holz, também amigo de Beethoven e, mais importante, seu secretário desde que o velho factotum Schindler fora demitido. Nas palavras de Holz:

Artaria encarregou-me da terrível e difícil tarefa de convencer Beethoven a compor um novo finale, mais acessível aos ouvintes e também aos instrumentistas, para substituir a fuga tão difícil de compreender. Afirmei a Beethoven que essa fuga, que se afastou do ordinário e ultrapassou até os últimos quartetos em originalidade, deveria ser publicada como uma obra separada e que também merecia uma designação separada. Comuniquei-lhe que a Artaria estava disposto a pagar-lhe honorários suplementares pelo novo final. Beethoven disse-me que iria refletir sobre isso, mas já no dia seguinte recebi uma carta dando sua anuência.

Vencido pela vaidade, pelo bolso e pelos amigos, Beethoven preparou rapidamente o finale alternativo – a última peça que completaria, e que, assim como a Grande Fuga e os últimos quartetos, não veria publicada.

ooOoo

Analisar a Grande Fuga é tarefa, talvez, tão árdua quanto tocá-la. Claro que não o farei aqui, até porque como obra sui generis e criação mais radical de Beethoven, talvez nunca haja uma análise formal que lhe faça jus. Já mencionamos, em postagem anterior, a permanente discussão sobre se deve ou não tocar como final do Op. 130. Hoje, nós a oferecemos como peça independente, bem de acordo com alguns comentadores que a consideram uma obra de vários movimentos embrulhados no mesmo saco rosnante. Não acredito que ela seja, como sugerem outros, uma paródia da fuga barroca. Prefiro pensá-la como um paralelo fugal ao que as “Variações Diabelli” foram para seu gênero: uma reverência a uma forma tradicional, feita de maneira que sua premissa fundamental – no caso da fuga, a repetição do tema e do contratema em diferentes vozes – acaba expandida, contraída, dilacerada e transformada de modo a oferecer algo totalmente novo. E a dedicatória ao arquiduque Rudolph, cujo nome já adornava as capas das edições do trio “Arquiduque”, da sonata “Hammerklavier”, da Missa Solemnis e das próprias “Diabelli”, confirma a prática de Beethoven de consagrar aqueles que considerava seus pináculos, seus testamentos nos gêneros que tanto ajudara a expandir, a seu amigo e mais generoso patrono.

Depois do rechaço inicial, que perdurou até meados do século passado, a Grande Fuga passou a ter o merecido reconhecimento como a mais visionária das obras de Beethoven. Deixo que o atestem pessoas mais capazes do que eu. Igor Stravinsky, por exemplo, que trouxe Paris abaixo com a “Sagração da Primavera”, disse sobre ela o seguinte:


A Grande Fuga agora me parece o milagre mais perfeito da música (…) É também a peça musical mais absolutamente contemporânea que conheço, e será contemporânea para sempre… Quase nada datada por sua idade, a Grande Fuga é, só no ritmo, mais astuta do que qualquer música do meu século … Eu a amo acima de tudo”


Glenn Gould, apesar das grandes e controversas gravações que nos legou das obras do renano, tinha a pior opinião possível sobre o Beethoven tardio, também era fã confesso do Leviatã fugal:

Para mim, a Grande Fuga não é tão só a maior obra que Beethoven jamais compôs, mas também a mais surpreendente peça da literatura musical


A Segunda Escola de Viena, claro, não deixaria de amá-la, tampouco. Oskar Kokoschka chamou-a de “berço” de Arnold Schoenberg, que foi um dos mais ferrenhos opositores que se tem registro à prática de substituir, na execução do Op. 130, a Grande Fuga pelo chamado “pequeno final”. Essa afinidade óbvia com a linguagem musical dum movimento que só teria voz mais de oitenta anos depois da morte de Beethoven ajuda a explicar por que os registros que ora lhes apresento nasceram clássicos e assim sempre se manterão. O quarteto LaSalle, afinal, criou sua reputação justamente sobre o repertório da Segunda Escola de Viena e não é à toa, portanto, que a Grande Fuga apareça como o final do Op. 130. Esse recuo às raízes  mais remotas do movimento vienense dá aos registros do LaSalle o corte afiado e o sotaque moderno que levaram os derradeiros quartetos de Beethoven a permanecerem por tanto tempo na ilha dos visionários epígonos. Ainda que tenda a preferir, para cada quarteto, interpretações de outros conjuntos, o LaSalle me é insuperável em sua qualidade de tratar os quartetos como um coerente conjunto e, em particular, a Grande Fuga como a pua radical da obra de Beethoven.

 

Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)

Quarteto em Si bemol maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 130
Composto entre 1824-25
Publicado em 1827
Dedicado ao príncipe Nikolay von Golitsyn

1- Adagio, ma non troppo – Allegro
2 – Presto
3 – Andante con moto, ma non troppo. Poco scherzoso
4 – Alla danza tedesca. Allegro assai
5 – Cavatina. Adagio molto espressivo
6 – Grande Fuga em Si bemol maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 133:
Overtura – Fuga – Meno mosso e moderato – Fuga – Coda
7 – Finale: Allegro

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Quarteto em Mi bemol maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 127
Composto entre 1824-25
Publicado em 1826
Dedicado ao príncipe Nikolay von Golitsyn

1 – Maestoso – Allegro
2 – Adagio, ma non troppo e molto cantabile – Andante con moto – Adagio molto espressivo – Tempo I
3 – Scherzando vivace
4 – Allegro

Quarteto em Dó sustenido menor para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 131
Composto entre 1825-26
Publicado em 1827
Dedicado ao barão Joseph von Stutterheim

5 – Adagio ma non troppo e molto espressivo
6 – Allegro molto vivace
7 – Allegro moderato – Adagio
8 – Andante ma non troppo e molto cantabile – Andante moderato e lusinghiero – Adagio – Allegretto – Adagio, ma non troppo e semplice – Allegretto
9 – Presto
10 – Adagio quasi un poco andante
11 – Allegro

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Quarteto em Lá menor para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 132
Composto em 1825
Publicado em 1826
Dedicado ao príncipe Nikolay von Golitsyn

1 – Assai sostenuto – Allegro
2 – Allegro ma non tanto
3 – Heiliger Dankgesang eines Genesenen an die Gottheit, in der Lydischen Tonart: Molto adagio – Andante
4 – Alla marcia, assai vivace – attacca:
5 – Allegro appassionato

Quarteto em Fá maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 135
Composto em 1826
Publicado em 1827
Dedicado a Johann Wolfmayer

6 – Allegretto
7 – Vivace
8 – Lento assai, cantante e tranquillo
9 – Der schwer gefaßte Entschluß. Grave, ma non troppo tratto (“Muss es sein?“) – Allegro (“Es muss sein!“) – Grave, ma non troppo tratto – Allegro

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LaSalle Quartet:
Henry W. Meyer e Walter Levin, violinos
Peter Kamnitzer, viola
Jack Kirstein, violoncelo

BTHVN250, por René Denon

Vassily

BTHVN250 – A Obra Completa de Ludwig van Beethoven (1770-1827) – Grande Fuga em Si bemol maior para piano a quatro mãos, Op. 134 – Robert Schumann (1810-1956) – Seis estudos canônicos, Op. 56 – Franz Schubert (1797-1828) – Lebenssturme, D. 947 – Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) – Fuga em Sol menor, K. 491 – Simon – Várjon

Um dos mais curiosos subprodutos da treta envolvendo o finale original do Quarteto Op. 130, doravante denominado “Grande Fuga”, foi esta transcrição para piano feita, no que a tornaria por si só muito especial, pelo próprio Beethoven.

No início de 1826, o editor Artaria preparava em suas oficinas a publicação do Op. 130, estreado no ano anterior com boa acolhida para cinco de seus seis movimentos, exceto a gigantesca e largamente incompreendida fuga final. A ideia de substituí-la por um final mais convencional não tinha sequer sido trazida à tona quando Artaria perguntou a Beethoven se poderia fazer-lhe um arranjo da fuga para piano a quatro mãos. Arranjos assim eram de praxe para a divulgação de música orquestral e de câmara, que assim poderia ser ouvida em qualquer lugar onde houvesse um piano e dois pianistas, e eram lançados pouco depois das obras de referência. A alegação do editor era de lhe tinham manifestado interesse, mas a proposta não veio acompanhada de remuneração interessante, então Beethoven lhe deu de ombros e Artaria solicitou pediu a outro compositor que lhe fizesse a empreitada. Quando a transcrição foi mostrada a Beethoven, este indignou-se com o que considerou simplificações e concessões a amadores e resolveu ele próprio fazer, em tempo recorde, sua transcrição bastante literal da obra, que acabou publicada após sua morte sob o Op.134 e com o mesmo dedicatário da “Grande Fuga” para quarteto de cordas – o arquiduque Rudolph.

Essa história toda é muito esquisita, pois seria improvável que uma obra tão unanimemente detestada por seus contemporâneos fosse suscitar solicitações de seus arranjos ao editor, se nem hoje, em tempos que veem a “Grande Fuga” ser considerada um dos pináculos da Música de concerto do Ocidente, nós ouvimos o Op. 134 executado com frequência, e muito menos neste ano de jubileu de Beethoven. Houve sugestões de que essa fosse tão só a estratégia de Artaria para, comendo pelas bordas e evitando confrontos diretos com o irascível compositor, tentar convencê-lo a publicar a “Grande Fuga” em separado.

Se foi isso mesmo, funcionou: Beethoven fez seu arranjo com evidente zelo, sem nada facilitar para os executantes (e ele não poderia se preocupar menos com isso) e, pelo jeito, constatou que aquele finale monumental poderia ter, sim, vida própria. Não se sabe ao certo quem estreou o arranjo, nem quando isso aconteceu. O fato é que ele é pouquíssimo tocado e gravado, salvo na proximidade de jubileus como o de agora. Entre o punhado de gravações novas que ouvi do Op. 134, uma das que mais me atraiu foi a do duo húngaro Izabella Simon-Denes Várjon. Neste álbum, a “Grande Fuga” encerra uma procissão de obras bem diversas para duo pianístico, começando pelos estudos que Schumann escreveu para o piano com pedaleira, no surpreendente arranjo de Debussy, passando pelo grande duo “Lebenssturme” de Schubert e por um dos mais óbvios frutos do devotado estudo que Mozart fez da obra de Bach, a Fuga K. 401. Embora prefira a versão original, com seus ataques furiosos às cordas e todo colorido tonal de quatro instrumentos incandescentes, reconheço que o arranjo de Beethoven lhe dá mais clareza e transparência. Simon e Várjon – que, a julgar pela pose arrulhante na capa do álbum, devem dividir além do teclado também os lençóis – saem-se muito bem, quase a ponto de agradecermos a Artaria por sua convoluta tentativa de manipulação.

Ponto para Artaria, e parabéns aos músicos. Merecem os lençóis.


Robert Alexander SCHUMANN (1810-1856)
Seis estudos canônicos para piano de pedaleira, Op. 56
Arranjo para dois pianos por Claude-Achille DEBUSSY (1862-1918)

1 – Pas trop vite
2  – Avec beaucoup d’expression
3 – Andantino
4 – Espressivo
5 – Pas trop vite
6 – Adagio


Franz Peter SCHUBERT (1797-1828)

Allegro em Lá menor para piano a quatro mãos, Op. Posth. 144, D. 947, ‘Lebenssturme’

7 – Allegro


Wolfgang Amadeus MOZART (1756-1791)
Fuga em Sol menor, K. 401 (375e) para piano a quatro mãos

8 – [sem indicação de andamento]


Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)

Grande Fuga em Si bemol maior, para piano a quatro mãos, Op. 134
Composta em 1826
Publicada em 1827
Dedicada ao arquiduque Rudolph da Áustria

8 –  Overtura. Allegro –  Fuga. Allegro – Meno mosso e moderato – Allegro – Allegro molto e con brio – Allegro molto e con brio


Izabella Simon e Dénes Varjon, pianos

 

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Foto: Peter Selbach (licença livre Pixabay)
BTHVN250, por René Denon

Vassily

BTHVN250 – A Obra Completa de Ludwig van Beethoven (1770-1827) – Quarteto para cordas em Dó sustenido menor, Op. 131 [The Late String Quartets – Emerson String Quartet]

“O Everest”.

“O Parnasso”.

“A peça mais sobre-humana de música que Beethoven escreveu”.

“Inefável”.

“Pináculo”.

“Inexaurível”.

“Zênite”.

“Santo Graal”.

Mesmo num mundo de superlativos como é o dos últimos quartetos de Beethoven, o quarteto em Dó sustenido menor parece conjurar todos eles. Ainda que cada ouvinte tenha seu par de quartetos preferidos, há razoável consenso de que o Op. 131 seja o maior deles em termos de escopo, ousadia e experimentação. Richard Wagner, que não era exatamente uma pessoa afeita a elogios (que não fossem, claro, à sua própria pessoa), assim descreveu a obra-prima, em seu tradicional estilo über-enfático, por ocasião do centenário de Beethoven, em 1870:


Esta é a dança do mundo inteiro: a alegria selvagem, o lamento da dor, o veículo do amor, felicidade suprema, tristeza, frenesi, tumulto, sofrimento, os relâmpagos bruxuleantes, o rugido dos trovões: e, acima disso, o estupendo violinista que tudo carrega e une, que o conduz com altivez de redemoinho em redemoinho, à beira do abismo – ele sorri para si mesmo, pois para ele essa feitiçaria era uma mera brincadeira – e a noite lhe acena. Seu dia acabou.

Talvez o melhor veredito seja o de Franz Schubert, outro gênio da Música, que em seus derradeiros dias pediu para escutar este quarteto – que, ao que tudo indica, foi a última música que ouviu – e comentou:

Depois disso, o que nos resta mais escrever?

Talvez nem Beethoven soubesse.

Depois duma vida toda a compor quartetos sob os estritos conformes legados por Haydn – quatro movimentos, um Allegro em sonata-forma, um movimento lento seguido dum Scherzo, etc. -, ele passou a romper com as convenções para expandir seus quartetos e permitir-se experimentações. A mudança mais óbvia nesse sentido foi no número de movimentos. Se levarmos em conta a ordem cronológica da composição dos últimos quartetos, percebemos um aumento gradativo do número de movimentos: o Op. 127 tem quatro; o Op. 132, cinco; no Op. 130, são seis, e o Op. 131 tem sete. Mais ainda: Beethoven pretendia que o Op. 131 fosse tocado sem interrupções, mas numerou os sete episódios na partitura, para que fossem tratados com individualidade dentro do fluxo contínuo dos quase quarenta minutos de música.

Essa experimentação desenfreada tem explicação nas circunstâncias da composição. Depois de finalmente completar a encomenda dos quartetos dedicados ao príncipe Golitsyn (Opp. 127, 130 e 132), Beethoven viu-se livre e, como sempre, precisando de dinheiro. Estava muito contente em compor quartetos de cordas, e satisfeito com a acolhida que tivera a “Trilogia Golitsyn”, mesmo com sua profundidade e complexidade sem precedentes. Planejava assim, e com entusiasmo, escrever novas séries no gênero. Enquanto não chegavam novas encomendas, buscou produções independentes, e o Op. 131 foi vendido ainda nos planos para o editor Schott, de Mainz, que publicara a Nona Sinfonia. Durante a composição, uma anunciada desgraça surgiu: Karl, o sobrinho de Beethoven, tentou suicidar-se. Enquanto era socorrido, o rapaz alegou que o tio o perturbara muito, e insinuou que fora ele que o levara a dar-se um tiro na têmpora. De fato, Ludwig não largava do seu pé desde que vencera a feia batalha por sua custódia e, por mais que se esmerasse em pagar-lhe educação privada e prover-lhe o melhor que tinha, realmente o oprimia incessantemente. A gota d’água foi a descoberta de que Karl, para quem seu tio já traçara uma carreira acadêmica – que lhe era uma questão de honra, posto que tivera tão pouca educação formal -, desejava seguir a carreira militar, o que desencadeou uma nova onda de cólera e manipulação. O embate entre o turrão legendário e o jovem oprimido teve um vencedor surpreendente: depois de recuperar-se, Karl foi servir num regimento na Boêmia. Beethoven, pelo jeito, resignou-se com incomum facilidade, pois não só retomou os trabalhos no Op. 131, como acabou por dedicá-lo ao barão Joseph von Stutterheim, um marechal austríaco que o ajudou a colocar o garoto na caserna.

Esta obra-prima demonstra a incomparável capacidade de Beethoven de integrar seus múltiplos episódios e diversas tonalidades num só melífluo fluxo de música. É evidente que a análise formal pormenorizada duma composição como essa vai muito além do que cabe numa desimportante postagem de blog, mas os músicos entre vós outros certamente compreenderão o tamanho da proeza ao verem que a obra abre em Dó sustenido menor, e daí modula para Ré maior, Si menor, Lá maior, Mi maior e Sol sustenido menor, até voltar à tonalidade inicial.

Pela primeira vez desde a sonata Op. 27 no. 2, dita “Ao Luar”, de 1801 -coincidentemente, na mesma e incomum tonalidade de Dó sustenido menor -, Beethoven escolhe abrir uma obra com um movimento lento. Mais incomum ainda é ele fazer dele uma fuga solene e constrita, uma contrapartida austera às angulares selvagerias da Grande Fuga que originalmente finalizara o quarteto de cordas anterior. Entre todas suas composições fugais, talvez seja este Adagio ma non troppo e molto espressivo o que melhor reflita seu devotado estudo do Cravo bem Temperado daquele que chamava, com muito respeito, de Sebastian Bach, e cujas fugas copiara meticulosamente em seus cadernos de esboços. Ainda que ela evoque a fuga na mesma tonalidade do Primeiro Livro do Cravo, a obra de Beethoven parece conjurar muito mais a Arte da Fuga, com sua inabalável adesão às regras do contraponto e aos ditames da forma. Há quem escute nesse movimento ecos da conturbada religiosidade do compositor, ou mesmo a preocupação com sua morte próxima.

Eu nada disso escuto, e só consigo me comover enquanto a fuga, em vez de se resolver, vai se esvaindo no episódio seguinte que, na luminosa tonalidade de Ré maior e com a indicação de Allegro molto vivace, parece uma abertura convencional dum quarteto de cordas. Ele desemboca num brevíssimo episódio, em Si menor, que serve tão só de prelúdio ao cerne da obra, um tema em Lá maior com sete intrincadas variações, cada uma num andamento diferente e repletas do mais engenhoso uso das cordas que se poderia conceber, encerradas por uma coda que evanesce lindamente. Segue-se um scherzo cheio de humor demoníaco, com uma notável passagem sul ponticello para os quatro instrumentos que intrigou os primeiros comentadores: teriam os ouvidos de Beethoven realmente escutado algo parecido antes, ou ele simplesmente inventara tudo lá do fundo do seu mundo de silêncio?

scherzo é impetuoso e, comparativamente, convencional, e quase não permite conjeturas: logo vem um Adagio, hã, quase un poco andante, ainda mais curto, e que é notório pela citação de Kol Nidrei, a sentida prece judaica do Yom Kippur:

Muito já se discutiu sobre o que teria levado Beethoven, um cristão nada devoto que jamais demonstrara interesse pelo judaísmo, a citar uma melodia judaica de modo tão explícito. Há quem diga que ele chegou a Kol Nidrei por interesses correlatos depois de estudar o Saul de Händel, a quem idolatrava, aliás mais que Bach. O mais provável, entretanto, é que ele tenha citado a melodia porque a ouvira e gostara dela – e o mais comovente, que suas memórias de Kol Nidrei certamente não eram vienenses, posto que as sinagogas na capital imperial só foram permitidas quando ele já estava surdo, e sim de sua distante Bonn natal, e de sua pequena sinagoga, não muito longe da casa em que nasceu.

O final retorna a Dó sustenido menor, com muita aspereza, que logo se dilui num tema sombrio, a que se seguem outros, decididamente tristes e melancólicos. O material temático dos episódios anteriores ressurge, num precedente visionário da forma cíclica que Liszt e, principalmente, Franck consolidariam décadas depois. A música encaminha-se quase para a sonata-forma, até que o desenrolar da coda (eu adoro as escalas descendentes!) muda completamente seu caráter e a leva para uma assertiva conclusão com acordes em maior, à maneira do surpreendente final do “Quarteto Serioso”, Op. 95.

Beethoven, ao que tudo indica, considerava o Op. 131 como seu quarteto preferido. Ainda que o tenha descrito a um amigo como “feito com coisas roubadas daqui e dali”, também lhe afirmou que “encontrou um novo caminho na escrita de partes e, graças a Deus, menos falta de imaginação que antes”.

Além de gênio da Música, um rei da Comédia.

Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)

Quarteto em Mi bemol maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 127
Composto entre 1824-25
Publicado em 1826
Dedicado ao príncipe Nikolay von Golitsyn

1 – Maestoso – Allegro
2 – Adagio, ma non troppo e molto cantabile – Andante con moto – Adagio molto espressivo – Tempo I
3 – Scherzando vivace
4 – Allegro

Quarteto em Dó sustenido menor para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 131
Composto entre 1825-26
Publicado em 1827
Dedicado ao barão Joseph von Stutterheim

5 – Adagio ma non troppo e molto espressivo
6 – Allegro molto vivace
7 – Allegro moderato – Adagio
8 – Andante ma non troppo e molto cantabile – Andante moderato e lusinghiero – Adagio – Allegretto – Adagio, ma non troppo e semplice – Allegretto
9 – Presto
10 – Adagio quasi un poco andante
11 – Allegro

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Quarteto em Si bemol maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 130
Composto entre 1824-25
Publicado em 1827
Dedicado ao príncipe Nikolay von Golitsyn

1- Adagio, ma non troppo – Allegro
2 – Presto
3 – Andante con moto, ma non troppo. Poco scherzoso
4 – Alla danza tedesca. Allegro assai
5 – Cavatina. Adagio molto espressivo
6 – Finale: Allegro

Grande Fuga em Si bemol maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 133
Composto entre 1825-26
Publicado em 1827
Dedicado ao arquiduque Rudolph da Áustria

7 – Overtura – Fuga – Meno mosso e moderato – Fuga – Coda

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Quarteto em Lá menor para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 132
Composto em 1825
Publicado em 1826
Dedicado ao príncipe Nikolay von Golitsyn

1 – Assai sostenuto – Allegro
2 – Allegro ma non tanto
3 – Heiliger Dankgesang eines Genesenen an die Gottheit, in der Lydischen Tonart: Molto adagio – Andante
4 – Alla marcia, assai vivace – attacca:
5 – Allegro appassionato

Quarteto em Fá maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 135
Composto em 1826
Publicado em 1827
Dedicado a Johann Wolfmayer

6 – Allegretto
7 – Vivace
8 – Lento assai, cantante e tranquillo
9 – Der schwer gefaßte Entschluß. Grave, ma non troppo tratto (“Muss es sein?“) – Allegro (“Es muss sein!“) – Grave, ma non troppo tratto – Allegro

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Emerson String Quartet:
Eugene Drucker e Philip Setzer,
violinos
Lawrence Dutton,
viola
David Finckel,
violoncelo


BTHVN250, por René Denon

Vassily

BTHVN250 – A Obra Completa de Ludwig van Beethoven (1770-1827) – Quarteto para cordas em Si bemol maior, Op. 130 [The Late String Quartets – Borodin Quartet]

Dos três quartetos “Golitsyn”, o Op. 130 foi o último a ser concluído, e é curioso que, mesmo ao completar com ele a encomenda do russo, Beethoven o tenha concebido numa escala tão vasta. Com o Op. 130 em sua forma original, ele ofereceu a Golitsyn uma obra duas vezes mais longa que a maioria dos quartetos contemporâneos – praticamente dois quartetos pelo preço de um.

Ludwig, entretanto, parecia àquela altura mais preocupado com o conteúdo do que com o dinheiro – a cor do qual, como vimos ontem, ele não veria em vida, posto que Golitsyn só o pagaria a seu sobrinho Karl, mais de vinte anos depois de sua morte. Depois de compor os dois primeiros movimentos com rapidez, empacou em indecisões quanto ao que fazer em seguida. Sua escolha foi sem precedentes: compôs mais três movimentos e, depois de ruminar quase um ano sobre como arrematá-lo, decidiu fazê-lo com uma imensa fuga e dar o quarteto por completo com inéditos seis movimentos.

O Op. 130 foi estreado em sua versão original pelo Quarteto Schuppanzigh, num recital privado, em março de 1826. Beethoven não se fez presente, escolhendo – como quase sempre fazia, se lhe fosse dada a opção – a companhia do goró barato. Lá mesmo, na espelunca mais próxima, um dos membros do quarteto foi prestar-lhe contas da estreia. Não sei se lhe perguntou se preferia receber as boas novas primeiro, mas o violinista Karl Holz – um dos amigos que estaria do seu lado no momento de sua morte – começou por lhe falar que a obra tinha sido mormente bem acolhida, e que dois dos movimentos (provavelmente a Danza Tedesca e o Presto) tiveram que ser repetidos. Quando Beethoven perguntou sobre a fuga final e Holz lhe respondeu que a plateia não pedira sua repetição, o embriagado veredito foi imediato:

– Bois! Jumentos!

A reação dos bovinos e asininos presentes à estreia espalhou-se à boca miúda e logo Viena soube que seu maior músico escrevera algo “muito difícil”, “incompreensível como o chinês”, “dissonante” e “amedrontador”. Referiam-se, claro, à transcendente fuga que, pelo menos assim se conta, foi substituída a pedido do editor. Beethoven, assim, comporia um final alternativo, mais convencional e palatável, ao qual atribuiu a lacônica indicação Allegro e que seria a última coisa que completaria antes de morrer, no março seguinte.

No entanto, há chapas de impressão que provam que o editor, Mattias Artaria, preparou a primeira publicação do Op. 130 com a fuga a encerrá-lo. Assim, parece que a opção por um final diferente recaiu totalmente sobre o compositor. Ademais, é óbvio que ele tinha a fuga em grande consideração, tanto que preparou ele próprio sua versão para piano a quatro mãos (Op. 134), e dedicou o original para quarteto de cordas, quando publicado separadamente sob o Op. 133, ao arquiduque Rudolph da Áustria – seu dedicatário favorito e um amigo e benfeitor cujo nome jamais associaria a um mero refugo musical.

Isto posto, o que enfim levou Beethoven a substituir o final? E qual dos finais devemos preferir?

Essas são questões cujas respostas – se é que existem – fogem ao escopo duma postagem de blog. O leitor-ouvinte deve já ter sua preferência, e pode mesmo admitir que as duas opções tenham seus fundamentos (e menciono duas enquanto lembro que há uma terceira – ouvir os dois finales). Nós outros, nessa mole vida de espectadores, não precisamos nos comprometer com escolhas – e que sorte, essa nossa!

Os intérpretes, por sua vez, veem-se premidos por escolhas mais difíceis, que envolvem o equilíbrio entre os movimentos e a intensidade com que são tocados, dependendo do final que escolham para o quarteto.

Isso porque o Op. 130 tem, como já mencionamos, uma estrutura sui generis. Ele abre com um movimento longo, com uma pesada introdução lenta que se repete ao longo da exposição e da recapitulação. Seguem-se quatro movimentos bem mais curtos: um breve e lépido Presto, cheio de contrastes; um Andante com a curiosa indicação Poco scherzoso (“Pouco brincalhão”); uma esquisitíssima Danza Tedesca, que não se parece com qualquer dança alemã, antes ou depois dela, e que sugere uma valsa transfigurada por alguém da Segunda Escola de Viena; e, por fim, a sublime Cavatina, talvez o mais belo movimento que Beethoven escreveu, que foi capaz de fazerem suar, de acordo com testemunhas, os duros olhos de Ludwig, e que parece, mais que qualquer outra composição que eu conheça, um eco da Música das Esferas.

Concluir essa sequência de curtas entidades, praticamente uma suíte, com uma fuga imensa e radical acaba por dar alguma contrapartida ao substancial primeiro movimento; por outro lado, ela assim acaba por eclipsar os movimentos mais curtos. Dessa forma, a Cavatina – o cerne emocional da obra – ganha em gravitas e aumenta o contraste da sem-cerimoniosa transição entre a delicada nota Sol que a encerra e o violento Sol em uníssono que abre a fuga.

Por outro lado, o Finale alternativo, muito leve e despretensioso, soa mais apropriado como encerramento dessa neo-suíte de peças breves, embora a obra muito perca, claro, em impacto e contundência. A maior parte das gravações modernas dos quartetos tardios de Beethoven oferece-nos a Grande Fuga e o singelo Allegro no mesmo disco, o que nos torna muito fácil a escolha que é tão difícil para os intérpretes. O que sempre me pergunto ao escutar o Op. 130, e agora estimulo o leitor-ouvinte a também se perguntar, é qual dos dois finais os intérpretes tinham em mente ao executarem os cinco movimentos anteriores.

A gravação que ora lhes alcanço, com o distinto sotaque russo do Quarteto Borodin, é talvez a que melhor prepare o ouvinte para o final alternativo. Os movimentos iniciais são tocados com precisão e frescor, e a celeste Cavatina eleva-se a grandes alturas, tratado pelo Borodin como o caloroso e também oprimido (pois é isso que significa a indicação beklemmt que nela aparece) coração da obra. Talvez haja interpretações tecnicamente mais perfeitas, mas nenhuma outra soube me agradar mais – nem há, tampouco, uma Cavatina que me faça suarem tanto os já tão secos olhos. Ouçam-na com cuidado, e – desde já aviso – preparem-se para suarem os seus.

 

Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)

Quarteto em Si bemol maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 130
Composto entre 1824-25
Publicado em 1827
Dedicado ao príncipe Nikolay von Golitsyn

1- Adagio, ma non troppo – Allegro
2 – Presto
3 – Andante con moto, ma non troppo. Poco scherzoso
4 – Alla danza tedesca. Allegro assai
5 – Cavatina. Adagio molto espressivo
6 – Finale: Allegro

Grande Fuga em Si bemol maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 133
Composto entre 1825-26
Publicado em 1827
Dedicado ao arquiduque Rudolph da Áustria

7 – Overtura – Fuga – Meno mosso e moderato – Fuga – Coda

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Quarteto em Mi bemol maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 127
Composto entre 1824-25
Publicado em 1826
Dedicado ao príncipe Nikolay von Golitsyn

1 – Maestoso – Allegro
2 – Adagio, ma non troppo e molto cantabile – Andante con moto – Adagio molto espressivo – Tempo I
3 – Scherzando vivace
4 – Allegro

Quarteto em Dó sustenido menor para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 131
Composto entre 1825-26
Publicado em 1827
Dedicado ao barão Joseph von Stutterheim

5 – Adagio ma non troppo e molto espressivo
6 – Allegro molto vivace
7 – Allegro moderato – Adagio
8 – Andante ma non troppo e molto cantabile – Andante moderato e lusinghiero – Adagio – Allegretto – Adagio, ma non troppo e semplice – Allegretto
9 – Presto
10 – Adagio quasi un poco andante
11 – Allegro

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Quarteto em Lá menor para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 132
Composto em 1825
Publicado em 1826
Dedicado ao príncipe Nikolay von Golitsyn

1 – Assai sostenuto – Allegro
2 – Allegro ma non tanto
3 – Heiliger Dankgesang eines Genesenen an die Gottheit, in der Lydischen Tonart: Molto adagio – Andante
4 – Alla marcia, assai vivace – attacca:
5 – Allegro appassionato

Quarteto em Fá maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 135
Composto em 1826
Publicado em 1827
Dedicado a Johann Wolfmayer

6 – Allegretto
7 – Vivace
8 – Lento assai, cantante e tranquillo
9 – Der schwer gefaßte Entschluß. Grave, ma non troppo tratto (“Muss es sein?“) – Allegro (“Es muss sein!“) – Grave, ma non troppo tratto – Allegro

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Borodin Quartet:
Ruben Aharonian e Andrei Abramenkov,
violinos
Igor Naidin,
viola
Valentin Berlinsky,
violoncelo

 

BTHVN250, por René Denon

Vassily

BTHVN250 – A Obra Completa de Ludwig van Beethoven (1770-1827) – Quarteto para cordas em Mi bemol maior, Op. 127 [Gli Ultimi Quartetti per Archi – Quartetto Italiano]

Sendo um amador tão apaixonado quanto um admirador do seu talento, tomo a liberdade de lhe escrever para lhe perguntar se estaria disposto a compor um, dois ou três novos quartetos. Terei o maior prazer em pagar-lhe, pelo trabalho, qualquer quantia que considere adequada.


Assim Nikolay Borisovich Golitsyn escreveu de sua São Petersburgo natal a Beethoven, a quem conhecera durante os anos que passara em Viena.

Se o sobrenome de Golitsyn não é tão famoso quanto o de Andrey Kirillovich Razumovsky, é porque qualquer encomenda feita a Beethoven nos oitocentos e vintes entrava numa fila de espera da qual nada tinha qualquer previsão de saída. Assim, quando o conde (e depois príncipe) Razumovsky pediu a Ludwig três quartetos com temas russos, em 1806, a trinca de novas obras ficou pronta no mesmo ano e, mais ainda, acabou publicada sob o mesmo número de Opus, e alcunhada com o sobrenome que imortalizariam. Já em 1822, quando o príncipe russo seguinte, cujo sobrenome vocês também encontrarão transliterado como “Galitzin”, pediu três novos quartetos ao renano, talvez tenha se deixado levar pelo entusiasmo com que o compositor aceitou a proposta. Beethoven já tinha em seus planos dedicar-se só a quartetos de cordas, e um estipêndio generoso como o que pediu a Golitsyn viria bem a calhar para tapar as crateras de suas finanças. O que ele não contou ao príncipe é que, naquele momento, ele nadava no turbilhão composicional da Missa Solemnis e da Nona Sinfonia, alimentava a conta-gotas sua obsessão sobre uma valsa de Diabelli e dava os retoques em duas das três sonatas que prometera a Maurice Schlesinger – em outras palavras, que o príncipe não veria a cor de suas encomendas por um bom tempo. Assim, o russo teve que esperar que as duas pantagruélicas obras corais fossem finalizadas e estreadas para que os trabalhos nos quartetos começassem. Somente três anos depois, em 1825, Golitsyn receberia seu primeiro quarteto, o Op. 127, pelo qual pagaria a quantia prometida. As duas outras obras, Opp. 130 e 132, ser-lhe-iam também entregues, mas Ludwig não viveria para ver a cor do dinheiro delas. A dívida só foi saldada somente na década de 1850, quando Karl van Beethoven – sobrinho e único herdeiro do compositor – recebeu o pagamento devido.

Ao concluir o Op. 127, e evidentemente entusiasmado pela obra, Beethoven ditou a seu factotum Anton Schindler a seguinte carta aos membros do quarteto Schuppanzigh, todos eles seus amigos:


Meus melhores companheiros!

Cada um de vós está a receber aqui sua parte. E cada um de vós compromete-se a cumprir o seu dever e, o que é mais importante, compromete-se com palavra de honra a competir pela excelência com os outros. Cada um de vocês, participantes do referido empreendimento, deverá assinar este
papel.

BEETHOVEN

Schindler secretarius”

Não sei se alguém chegou a assinar o papel, mas a estreia – sob Ignaz Schuppanzigh, Franz Weiss, Joseph Linke e Karl Holz – foi mal ensaiada e acabou por ser, como talvez Beethoven a definiria, uma verdammte Scheiße. Ludwig descarregou sua indignação em Schuppanzigh, um homem extremamente obeso e alvo recorrente de seu escárnio (chegou a escrever um cânone a chamá-lo de Falstafferel (“Falstaffinho”) que, humilhação suprema, foi publicado e gravado), e cujos lipídios acusava de fazerem “tudo ficar mais lento”.

Tiririca com o desastre da estreia, Beethoven repassou o Op. 127 aos cuidados de um outro quarteto, liderado por Joseph Michael Böhm. Dessa feita, entretanto, resolveu ficar de butuca. Böhm deixou-nos o seguinte relato:

Quando Beethoven soube da péssima apresentação [a de Schuppanzigh] – pois não estava presente na estreia – ele ficou furioso e não permitiu que os artistas tivessem paz até que a desgraça fosse lavada. Ele mandou chamar-me logo de manhã e, com o seu jeito brusco de sempre, disse-me: ‘Tens que tocar o meu quarteto’, e o assunto foi resolvido. Nem objeções, nem dúvidas poderiam prevalecer; o que Beethoven queria tinha que acontecer, então dediquei-me à difícil tarefa. [O quarteto] Foi estudado e ensaiado com frequência sob os próprios olhos de Beethoven. Eu digo ‘olhos’ intencionalmente, pois o infeliz era tão surdo que não conseguia mais ouvir o som celestial de suas composições… Com muita atenção, seus olhos seguiam os arcos e, assim, ele foi capaz de constatar as menores flutuações de tempo e ritmo e corrigi-los imediatamente. No final do último movimento do quarteto, ocorreu um ‘meno vivace’ que me pareceu enfraquecer o efeito geral. No ensaio, portanto, aconselhei que o ritmo original fosse mantido… Beethoven, agachado em um canto, não ouviu nada, mas assistiu com tensa atenção. Depois do último movimento do arco, ele disse, laconicamente, ‘deixe assim’ – e foi até as mesas e riscou o ‘meno vivace’ nas quatro partes”

Fazer o encanzinado Beethoven mudar de ideia seria por si só uma proeza, e isso só atesta o quanto Böhm e seu grupo deviam ser bons músicos. A reestreia, sob eles, foi um grande sucesso que não só alegrou o compositor, como também salvou a pele (embora Ludwig, em sua correspondência, preferisse mencionar “der Arsch”) de Schuppanzigh, que teve uma nova chance com o compositor, estrearia seus quartetos seguintes e continuaria a ser a vítima preferencial de sua mordaz gordofobia.


Quem vem do mundo intensamente concentrado dos quartetos Opp. 74 e 95. ou da impetuosidade às vezes agressiva dos “Razumovsky”, surpreende-se com o Op. 127, o primeiro dos chamados “quartetos de cordas tardios”. Trata-se duma obra muito expansiva, em que Beethoven toma o seu tempo para desenvolver seus temas e expor suas ideias duma maneira notavelmente desprovida de tensão. O resultado, claro, é que ela acabou bastante longa – seu movimento lento sozinho, por exemplo, dura mais que todo quarteto Op. 95. Nada, entretanto, soa enfadonho. A tônica, parece, é a da leveza, e a sonata-forma não está a premir o desenvolvimento, que o compositor permite que siga em várias direções, sem premências de tempo.

Os solenes acordes de abertura, que tão somente anunciam a tonalidade, levam a um tema surpreendentemente pungente, ao qual se segue uma seção com toques nostálgicos e, brevemente, dramáticos. Na descrição certeira da musicóloga alemã Birgit Lodes, “neste quarteto, Beethoven solapou as qualidades direcionais e dinâmicas de um Allegro em sonata-forma, que é uma forma adequada para contar uma história teleológica única; ao invés, ele procurou evocar o que poderíamos chamar ‘tempo mítico'”.

É no mesmo “tempo mítico” que se desenvolve o terno segundo movimento. Baseado na forma de tema com variações, em que a imaginação de Beethoven – afinal de contas, o compositor das “Diabelli” – voa longe na modificação do singelo tema, oferecendo-lhe variações sucessivamente mais elaboradas e criativas. No Scherzando vivace, os instrumentos dialogam, às vezes retrucam, mas não há qualquer tensão, e tampouco ela faz falta. Há momentos geniais nas transições e cromatismo ousado no Trio, e tudo se arremata com uma linda coda. O Finale soa enganosamente simples, porque foi criado por um consumado mestre: com forte tom folclórico, desenvolve-se como se jamais fosse acabar, até que isso acontece de maneira engenhosa e pouco abrupta.

Segundo William Kinderman, autor já mencionado anteriormente, o Op. 127 é “uma composição fundamental entre as obras-primas de seu último período criativo, uma em que aspectos estruturais e simbólicos de suas duas grandes obras corais-orquestrais são absorvidos pela esfera da música de câmara”, e nisso estamos de completo acordo. Acrescento que, diferentemente da Nona e da Missa Solemnis, que graças às gravações podemos ouvir quantas vezes quisermos, o Op. 127 não causa qualquer saturação sensorial. Sua leveza e fluidez levam-no a transcorrer sem que quase o percebamos. Quando enfim o percebemos, e tudo acabou, sentimo-nos prontos a repeti-lo.


Antes de conhecê-lo pela reputação, conheci o Quartetto Italiano pela imagem que está logo abaixo: quatro fleumáticos músicos de perfil, encarando mediterraneamente a luz solar – avis rara, convenhamos, na iconografia de conjuntos de câmara -, como se acompanhassem uma passeggiata. Quando tive, enfim, a oportunidade de escutá-los, foi como se essa imagem se transportasse ao universo sonoro do Quarteto: o som do Italiano é, talvez, o mais belo entre os conjuntos de sua época. Nós outros, no século XXI, tivemos a grata sorte de tê-lo maravilhosamente gravado pela Philips para que hoje, cinquenta anos depois, ele nos chegue assim, tão fresco. O registro privilegia a naturalidade: ouvimos o virar das páginas, a respiração dos instrumentistas, os miados das cadeiras, e o eventual golpe em falso de algum arco. Nada disso, entretanto, há de lhes importar: o Italiano faz o luminoso Mi bemol maior do Op. 127 cintilar e, mais que qualquer outro conjunto, leva o Adagio nos tragar para aquele estado meditativo tão próprio a quem ouve o Beethoven tardio em seu “tempo mítico”.


Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)

Quarteto em Mi bemol maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 127
Composto entre 1824-25
Publicado em 1826
Dedicado ao príncipe Nikolay von Golitsyn

1 – Maestoso – Allegro
2 – Adagio, ma non troppo e molto cantabile – Andante con moto – Adagio molto espressivo – Tempo I
3 – Scherzando vivace
4 – Allegro

Quarteto em Dó sustenido menor para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 131
Composto entre 1825-26
Publicado em 1827
Dedicado ao barão Joseph von Stutterheim

5 – Adagio ma non troppo e molto espressivo
6 – Allegro molto vivace
7 – Allegro moderato – Adagio
8 – Andante ma non troppo e molto cantabile – Andante moderato e lusinghiero – Adagio – Allegretto – Adagio, ma non troppo e semplice – Allegretto
9 – Presto
10 – Adagio quasi un poco andante
11 – Allegro

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Quarteto em Si bemol maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 130
Composto entre 1824-25
Publicado em 1827
Dedicado ao príncipe Nikolay von Golitsyn

1- Adagio, ma non troppo – Allegro
2 – Presto
3 – Andante con moto, ma non troppo. Poco scherzoso
4 – Alla danza tedesca. Allegro assai
5 – Cavatina. Adagio molto espressivo
6 – Finale: Allegro

Grande Fuga em Si bemol maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 133
Composto entre 1825-26
Publicado em 1827
Dedicado ao arquiduque Rudolph da Áustria

7 – Overtura – Fuga – Meno mosso e moderato – Fuga – Coda

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Quarteto em Lá menor para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 132
Composto em 1825
Publicado em 1826
Dedicado ao príncipe Nikolay von Golitsyn

1 – Assai sostenuto – Allegro
2 – Allegro ma non tanto
3 – Heiliger Dankgesang eines Genesenen an die Gottheit, in der Lydischen Tonart: Molto adagio – Andante
4 – Alla marcia, assai vivace – attacca:
5 – Allegro appassionato

Quarteto em Fá maior para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 135
Composto em 1826
Publicado em 1827
Dedicado a Johann Wolfmayer

6 – Allegretto
7 – Vivace
8 – Lento assai, cantante e tranquillo
9 – Der schwer gefaßte Entschluß. Grave, ma non troppo tratto (“Muss es sein?“) – Allegro (“Es muss sein!“) – Grave, ma non troppo tratto – Allegro

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Quartetto Italiano:
Paolo Borciani e Elisa Pegreffi,
violinos
Piero Farulli,
viola
Franco Rossi,
violoncelo


BTHVN250, por René Denon

Vassily

BTHVN250 – A Obra Completa de Ludwig van Beethoven (1770-1827) – Sinfonia no. 10 em Mi bemol maior, Unv. 3 (completada por Barry Cooper) – Weller

Propaganda enganosa?

Talvez.

O fato é que Beethoven começou a esboçar uma sinfonia em Mi bemol maior mesmo antes de completar a Nona, assim como iniciou a “Pastoral” durante o obsessivo trabalho na Quinta. No início do mesmo 1827 em que morreria, ele ofereceu o que seria sua Décima Sinfonia à mesma Sociedade Filarmônica de Londres que lhe encomendara a sinfonia anterior. Há relatos de seu sempre inconfiável factotum Schindler – alguém que lhe  foi indiscutivelmente próximo, mas que frequentemente falsificava documentos para dar a impressão de ser mais íntimo do compositor do que de fato era – dando conta de queBeethoven esboçava temas em Mi bemol maior e Dó menor alguns dias antes de cair no leito de morte. Uma outra fonte menos atochadora, o amigo Karl Holz, afirma que Beethoven lhe tocou os esboços duma nova sinfonia naquele mesmo ano cujo fim não chegaria a ver.

Ainda assim, quando o musicólogo e estudioso beethoveniano Barry Cooper surgiu com esquetes da alegada Décima Sinfonia e os planos de publicar uma versão passível de apresentação, houve frenesi e algum escândalo. Segundo Cooper, o material legado pelo renano, mesmo que espalhado por diversos cadernos de esboços e criptografados pela medonha caligrafia do compositor, fazia sentido o bastante para se perceber que  à mesma obra. Ademais, organizavam-se em torno dum Andante em Mi bemol maior e dum Allegro em Dó menor e, assim, correspondiam à descrição daquilo que Beethoven tocara para Holz.

Nas palavras de Cooper,


Como a maioria dos esboços de Beethoven para outras obras, aqueles da Décima sinfonia estão espalhados em vários conjuntos de manuscritos diferentes (quatro principais, e mais alguns acessórios, foram identificados até agora). Como de costume, eles não têm rótulos e são quase ilegíveis para quem não conhece bem a caligrafia idiossincrática de Beethoven. Consequentemente, foi somente na década de 1980 que os primeiros deles foram identificados com alguma certeza. Nesse ínterim, rumores sobre a Décima Sinfonia, iniciados principalmente por Holz e Anton Schindler, alimentaram especulações de que poderia haver um manuscrito completo escondido em algum lugar ou, alternativamente, que a sinfonia nunca havia sido iniciada e que os rumores eram infundados. Agora, porém, temos clareza e mais de 50 esboços são conhecidos, embora muitas perguntas ainda permaneçam sem resposta e seja bastante possível que mais esboços ainda sejam descobertos. Todos os esboços são muito fragmentários, nenhum contendo mais do que cerca de 30 compassos de música contínua; mas, para alguém familiarizado com os métodos normais de rascunho de Beethoven, eles dão uma ideia clara do tipo de movimento que ele tinha em mente. Além disso, eles contêm um material muito bom. Portanto, parece muito valioso tentar torná-los disponíveis para apresentações, preenchendo-os em uma versão de concerto, em vez de deixá-los em arquivos onde podem ser úteis apenas a alguns especialistas. Afinal, os esboços representam sons em vez de formas no papel e não podem ser avaliados completamente até que sejam ouvidos – e de preferência ouvidos num ambiente orquestral apropriado. O presente autor [Cooper] já estudara os esboços de Beethoven para inúmeras outras obras, em conexão com um livro que ele estava a escrever [Beethoven and the Creative Process, Oxford University Press] e, portanto, sentiu que estava em uma posição melhor do que a maioria dos estudiosos para tentar completar o primeiro movimento, embora a tarefa a princípio parecesse impossivelmente assustadora. Ao todo são cerca de 250 compassos de esquetes para o primeiro movimento. Alguns se duplicam ou se contradizem, deixando menos de 200 utilizáveis; mas muitos deles podem ser usados ​​mais de uma vez, por meio de repetições e reprises, como ocorre em todas as sinfonias de Beethoven (por exemplo, um tema esboçado para a exposição recorrerá na recapitulação). Os esboços, portanto, nos fornecem bem mais de 300 compassos, enquanto os 200 ou mais compassos restantes (dum total de 531) tiveram que ser adaptados dos mesmos temas básicos por vários meios (por exemplo, por transposição e sequência) e desenvolvidos da maneira normalmente própria a Beethoven. Assim, todo o material temático básico é de Beethoven; mas a harmonia apropriada teve que ser adicionada em lugares onde estava a faltar, e o movimento teve que ser orquestrado no estilo de Beethoven (com a ajuda de apenas algumas pistas dadas nos esboços), e passagens de ligação baseadas nos temas de Beethoven foram inseridas onde necessário.
O resultado, obviamente, não é o que Beethoven teria escrito e, em certos lugares em particular, ele provavelmente teria sido mais criativo. Também soa mais típico do período intermediário do que o Beethoven tardio, embora isso possa ser devido às conexões estreitas com as primeiros sonatas para piano. Não obstante, minha realização fornece pelo menos uma impressão aproximada do movimento que ele tinha em mente na época dos esboços e certamente está muito mais próxima da Décima Sinfonia de Beethoven do que qualquer coisa ouvida anteriormente. Portanto, é provável que ela seja extremamente interessante para qualquer pessoa que queira saber o que ele planejou para a sinfonia que viria após a Nona; além disso, também pode ser apreciada como uma peça musical, de uma forma que os esquetes fragmentários por si próprios nunca poderiam ser.”

Muito convincente, não?

O trabalho de Cooper foi publicado em 1988 e estreado por Walter Weller e a Royal Liverpool Philharmonic Orchestra, num evento organizado pela Sociedade Filarmônica de Londres que, 161 anos após a oferta de Beethoven, recebia a encomenda que lhe foi proposta. A primeira gravação foi feita por Wyn Morris à frente da London Symphony, acompanhada da gravação duma palestra de Cooper explicando o seu trabalho, e que pode ser encontrada no vídeo mais abaixo. Eu a escutei sem muito entusiasmo: parecia uma coleção de retalhos (o que, enfim, é verdade) com alguns meros gestos que permitiam reconhecer seu compositor, um balão semivazio que não ia a lugar algum.

No começo deste 2020, no entanto, descobri esta gravação do escocês Walter Weller, que teve distinta carreira em Viena antes de assumir a direção de orquestras em sua ilha natal. Weller parece resgatar aquilo de Beethoven que há no considerável esforço feito por Cooper, e chega muitas vezes até a convencer. Esse coto da Décima surge, ainda que sem o desenvolvimento coeso tão próprio do compositor, tanto com acenos para o passado, quanto com cromatismos que flertam com o futuro remoto, como se o Beethoven da “Eroica” e da “Quinta”, e principalmente o da “Pastoral” e da Nona – cujas citações são bastante óbvias nesse movimento – dialogasse com o Beethoven da “Grande Fuga” e o “proto-jazz” da Sonata Op. 111, e ambos tentassem um consenso para seguirem adiante. Se não é uma audição imperdível, parece-me pelo menos recomendável aos beethovemaníacos entre vós outros.

Completando o disco, mais uma gravação – inda outra – do Concerto Triplo, que acabou por ser o “arroz de festa” de nossa série, na qual faz sua quinta e (esperamos!) última aparição.

Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)

Concerto em Dó maior para violino, violoncelo, piano e orquestra, Op. 56
Composto entre 1803-05
Publicado em 1807
Dedicado a Joseph Franz Maximilian, príncipe Lobkowitz

1 – Allegro
2 – Largo (attacca)
3 – Rondo alla polacca

Kalichstein–Laredo–Robinson Trio:
Joseph Kalichstein, piano
Jaime Laredo, violino
Sharon Robinson, violoncelo
English Chamber Orchestra
Sir Alexander Gibson, regência

Sinfonia no. 10 em Mi bemol maior, Unv. 3
Completada e orquestrada por Barry Cooper (1949)

4 – Andante – Allegro – Andante

City of Birmingham Symphony Orchestra
Walter Weller, regência

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O destemido Cooper, que certamente não tem medo de tomates, descreve aqui
(em inglês) o processo de estudo de esboços de Beethoven e da organização de
sua versão da Sinfonia no. 10

#BTHVN250, por René Denon

Vassily

BTHVN250 – A Obra Completa de Ludwig van Beethoven (1770-1827) – Sinfonia no. 9 em Ré menor, Op. 125, “Coral” – Chailly – Furtwängler – Gardiner – Giulini – Goodman – Haitink – Hogwood – Jansons – Karajan – Leibowitz – Rattle – Reiner – Scherchen – Schmidt-Isserstedt – Solti – Szell – Toscanini – Wand

Ao contrário da Missa Solemnis, uma obra-prima que pouca gente sabe amar, a Nona Sinfonia foi ensandecidamente querida desde sua estreia, em 7 de maio de 1824 – no mesmo concerto em que, curiosamente, algumas fatias da Missa foram pela primeira vez ouvidas em Viena.

Embora Beethoven tenha se dedicado à sua composição entre 1822 e 1824, os primeiros gérmens duma sinfonia em Ré menor datam de 1812. Sua obsessão com a “Ode à Alegria” de Friedrich von Schiller, no entanto, era ainda mais antiga: colocá-la em música já estava em seus planos desde 1793, meros oito anos depois da composição do poema. Não é difícil entender por que o texto calou tão fundo no jovem idealista e universalista, que idolatrava tanto a “Ode” e seu poeta que acabou por afogar-se em reticências e inseguranças cada vez que tirava da gaveta os planos de musicá-la.

Tais reticências começaram elas próprias a afogar-se quando, em 1817, a Sociedade Filarmônica de Londres encomendou-lhe uma nova sinfonia. Em verdade, fora Ferdinand Ries, seu aluno e conterrâneo, que o convidara para visitar a cidade com promessas de lucrativas turnês e exibições ao feitio das que enriqueceram o professor de Ludwig, o velho Haydn. Sabendo o quão baixo era o apreço de Beethoven pelas ilhas britânicas e seus músicos, não fica difícil imaginar que a ideia de visitá-las, mesmo para ganhar uma boa grana, o repelia. O contexto geral também não o ajudava: desilusões amorosas, desesperos gerais com a vida, a surdez completa que o afastara das salas de concertos e sepultara sua reputação de melhor pianista de seu tempo – e, acima de tudo, a amarga briga pessoal e judicial com a ex-cunhada Johanna pela custódia de seu sobrinho Karl, filho de seu falecido irmão homônimo. Tudo isso lhe quebrara os nervos e os bolsos, e as preocupações com o sobrinho só cresciam, de maneira que não deixou de ser um alívio abrir mão da turnê para aceitar a encomenda da nova sinfonia.

Ludwig, no entanto, resolvera encerrar seu hiato composicional com a imensa sonata “Hammerklavier”, praticamente uma sinfonia para piano solo, e logo em seguida enrolou-se com outras duas promessas: as três sonatas para piano encomendadas pelo editor Schlesinger (que viriam a ser suas últimas) e, enrolação máxima, a enorme missa para a entrada solene do arquiduque Rudolph como arcebispo de Olomouc. Isso tudo significou que apenas em 1822 – cinco anos após a encomenda da Sociedade Filarmônica – os trabalhos na sinfonia de fato começaram, com dedicação febril e integral a ela entre abril de 1823 e fevereiro de 1824, quando enfim a deu por completa.

Apesar de instigada por londrinos, Beethoven pretendia apresentar sua nova obra em Berlim, por pensar que naquela corte teria melhor acolhida do que em Viena, onde achava-se um tanto demodé, tamanho era o frenesi causado pelas óperas de Rossini, um compositor pelo qual não tinha qualquer apreço. A notícia da nova obra e dos planos berlinenses se espalhou. Em breve, amigos e patronos organizavam-se para demovê-lo da ideia, no que, surpreendemente, tiveram sucesso. A legendária teimosia de Beethoven fora vencida pelo apreço que ele percebeu em seu público, ansioso por ouvir uma sinfonia nova do maior compositor da Europa, depois de mais de doze anos. O hype foi tamanho que, na estreia da obra, o Kärntnertortheater estava abarrotado a ponto de precisarem colocar cadeiras no palco, além de  várias pessoas que ficaram de pé. Beethoven fez questão de reger a première e oficialmente conseguiu, embora o combinado com os músicos fosse que eles seguissem as indicações de Michael Umlauf – que acompanhara, anos antes, o patético desastre de um ensaio geral de Fidelio sob o compositor surdo, e decidira conduzir a obra longe de seu campo de visão. Aplausos irromperam ainda durante o scherzo, durante as intervenções dos tímpanos, que caíram no gosto do público. Ao final do terceiro movimento, ainda mais aplausos – e no fim, enquanto Beethoven ainda julgava estar a reger sua obra, a contralto solista tomou sua mão e mostrou-lhe a plateia que vinha abaixo em aclamação. O maior sucesso de sua vida, que o deixou irreconhecivelmente alegre, acabaria sendo sua última aparição pública ante uma plateia anônima.

Tanto se ama a Nona Sinfonia, e principalmente seu finale coral sem precedentes na história do gênero, que é difícil de imaginar que foi justamente ele o maior alvo de críticas. Muitos críticos e alguns colegas compositores não compartilharam o entusiasmo do público da estreia, e disseram (como Verdi, por exemplo) que Beethoven estragara a forte impressão dos três primeiros movimentos com um dantesco espetáculo de “partes mal escritas para vozes”. Outros, simplesmente, tascavam que, além de surdo, Beethoven ficara gagá e louco.

Não quererei ser eu a concordar com eles, inda mais quando se fala dum patrimônio universalmente amado da Humanidade, mas eu acho que compreendo os reproches. Os três primeiros movimentos, ainda que cheios de radicalidade, comportam-se como uma sinfonia tradicional – com o scherzo adiantado em relação ao movimento lento, como era costumeiro para o Beethoven maduro. Já o movimento coral parece inorgânico, alheio a tudo o que antecedera, rejeitando-o explicitamente, como mostram as breves recapitulações dos três primeiros movimentos – novamente algo sem precedentes – que parecem enxotadas pelos recitativos das cordas, ou a explícita afirmação do barítono, logo em sua entrada, com palavras escritas pelo próprio compositor, a conclamar os amigos a desprezarem “esses sons” entoarem algo mais agradável e alegre. Sem dúvidas, essa apoteose da alegria é uma conclusão convincente para uma obra que parece, no primeiro movimento, surgir dum vazio opressor. Por outro lado, o finale parece ter vida própria – e tanta que muitos que o conhecem de cor não têm ideia dos movimentos que o precederam. Ele funcionaria bem, inclusive, como uma sinfonia independente, pois ele dura mais que muitas das co da época, e não é impossível imaginá-lo com quatro movimentos: uma abertura (da introdução instrumental até “steht vor Gott”); um scherzo (da “música turca” de “Froh, wie seine Sonnen fliegen” até o final da estrofe com o coro, em “Wo dein sanfter Flügel weilt“); um movimento lento (de “Seid umschlungen, Millionen” até o início da fuga dupla); e a própria fuga dupla sobre “Seid umschlungen” e “Freude, schöner Götterfunken”, e tudo que se segue a ela, arrematando a “sinfonia dentro da sinfonia”.

O público de hoje parece não se importar essas picuinhas. Pelo contrário, parece haver uma tendência a supervalorizar o popularíssimo finale, com seu tema da “Alegria” que até meus gatos conhecem, em detrimento dos movimentos precedentes, principalmente o Adagio, um singelo tema com maravilhosas variações, que é o cerne da obra. Lembro duma senhora que, na saída duma récita da Nona, comentava com a filha que “o começo estava chato, mas depois que entraram os cantores ficou bonito”. Com a “Ode à Alegria” em toda parte, usada e abusada como um lugar-comum de tudo que é apoteótico, eu acho que a consigo compreender essa senhora, a buscar esperar o conforto do que lhe era familiar após longos minutos de grande, mas desconhecida música.

É preciso ouvir a Nona com tímpanos frescos, como se fosse a primeira vez – e preferencialmente, claro, desde o começo. Para facilitar-lhes esta experiência, resolvi alcançar-lhes não só as doze gravações que encerram as integrais paralelas que iniciamos há alguns meses, mas também algumas outras, das quais não dispunha quando publiquei a Primeira Sinfonia, lá em abril. Algumas foram pedidas – caso das versões de George Szell e aquela, extraordinária, de Hans Schmidt-Isserstedt. Outras, como as de Hermann Scherchen e René Leibowitz, porque são pioneiras nas tentativas de interpretação historicamente informada, mesmo antes desse movimento se consolidar como tal, com instrumentos originais, Lás diferentes de 440 Hz, e por aí vai. Há também a versão de Christopher Hogwood, que serve como contraponto às duas versões com instrumentos de época que já vínhamos publicando – as de Gardiner e aquelas da Hanover Band. E, por fim, a bonita série daquele discreto mestre da batuta, o versátil e eficiente Carlo Maria Giulini. Como não as imaginava postar por aqui num futuro próximo, tamanha a superdosagem de Beethoven que lhes propusemos neste ano, decidi que elas não trariam mais exagero a este nosso já tão esdrúxulo exagero de apresentar-lhe uma dúzia de versões.

Pretendo completar retrospectivamente a série com as novas-velhas versões em muito breve. Por ora, sugiro começarem pela especialíssima, ainda que jurássica, versão de Furtwängler gravada no Festival de Bayreuth. O legendário maestro nunca gravou a Nona em estúdio, por considerá-la digna tão só dos mais importantes eventos. Por isso, achou apropriado apresentá-la na reabertura do Festival de Bayreuth, em 1951, ocasião que marcava tanto a reestreia da Alemanha como um dínamo cultural, depois da infâmia da guerra, quanto sua própria reabilitação, depois de ter sido (e injustamente, que é o que nos dizem todas evidências razoáveis) considerado colaborador dos nazistas. Ao conduzir a obra no Festspielhaus, Furtwängler seguia o precedente do fundador do Festival: Richard Wagner adorava a Nona, muito por considerá-la uma precursora de sua própria concepção de Arte Total, e a regeu na inauguração da primeira edição, tradição que se manteve em todas edições subsequentes.

Espero que alguma dessas agora dezoito versões consiga lhes entregar o beijo que Schiller e Beethoven mandaram para o mundo inteiro.

Seid umschlungen, Millionen! Tschüss!

 

 


Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)

Sinfonia no. 9 em Ré menor, Op. 125, “Coral”
Composta entre 1822-1824
Publicada em 1826
Dedicada ao rei Friedrich Wilhelm III da Prússia

1 – Allegro ma non troppo, un poco maestoso
2 – Molto vivace – Presto – Molto vivace – Presto
3 – Adagio molto e cantabile – Andante moderato – Andante moderato – Adagio -Lo stesso tempo
4 – Presto – Allegro assai – Presto (“O Freunde”) – Allegro assai (“Freude, schöner Götterfunken”) – Alla marcia; Allegro assai vivace (“Froh, wie seine Sonnen”) – Andante maestoso (“Seid umschlungen, Millionen!”) – Allegro energico, sempre ben marcato (“Freude, schöner Götterfunken” – “Seid umschlungen, Millionen!”) – Allegro ma non tanto (“Freude, Tochter aus Elysium!”) – Prestissimo (“Seid umschlungen, Millionen!”)


Elisabeth Schwarzkopf, soprano
Elisabeth Höngen,
mezzo-soprano
Hans Hopf,
tenor
Otto Edelmann,
baixo
Bayreuther Festspielorchester und Chor
Wilhelm Furtwängler
, regência

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Jarmila Novotná, soprano
Kerstin Thorborg,
mezzo-soprano
Jan Peerce,
tenor
Nicola Moscona,
baixo
Westminster Choir
NBC Symphony Orchestra

Arturo Toscanini, regência

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Inge Borkh, soprano
Ruth Siewert, contralto
Richard Lewis, tenor
Ludwig Weber, baixo
The Beecham Choral Society
Royal Philharmonic Orchestra
René Leibowitz, regência

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Magda Laszló, soprano
Hilde Rössel-Majdan,
contralto
Petre Munteanu,
 tenor
Richard Standen, baixo
Orchester der Wiener Staatsoper
Hermann Scherchen, regência

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Phyllis Curtin, soprano
Florence Kopleff, contralto
John McCollum,
tenor
Donald Gramm,
baixo
Chicago Symphony Orchestra and Chorus

Fritz Reiner, regência

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Adele Addison, soprano
Jane Hobson,
contralto
Richard Lewis,
tenor
Donald Bell, barítono
Cleveland Orchestra & Choir
George Szell, 
regência

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Gundula Janowitz, soprano
Hilde Rössel-Majdan,
contralto
Waldemar Kmentt,
tenor
Walter Berry,
baixo
Wiener Singverein
Berliner Philharmoniker
Herbert von Karajan,
regência

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 Jessye Norman, soprano
Reinhild Runkel,
mezzo-soprano
Hans Sotin,
tenor
Robert Schunk,
baixo
Chicago Symphony Orchestra and Chorus

Sir Georg Solti, regência

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Joan Sutherland, soprano
Marilyn Horne, contralto
James King, tenor
Martti Talvela, baixo
Wiener Staatsopernchor
Wiener Philharmoniker

Hans Schmidt-Isserstedt, regência

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Julia Várady, soprano
Jard van Nes,
mezzo-soprano
Keith Lewis,
tenor
Simon Estes,
baixo
Ernst Senff Chor
Berliner Philharmoniker
Carlo Maria Giulini

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Edith Wiens, soprano
Hildegard Hartwig,
contralto
Keith Lewis,
tenor
Roland Hermann,
baixo
Chor der Hamburgischen Staatsoper
Sinfonieorchester des Norddeutschen Rundfunks

Günter Wand, regência

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Lucia Popp, soprano
Carolyn Watkinson,
contralto
Peter Schreier,
tenor
Robert Holl,
baixo
Groot Omroepkoor
Koninklijk Concertgebouworkest

Bernard Haitink, regência

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Arleen Augér, soprano
Catherine Robbin,
contralto
Anthony Rolfe Johnson, tenor
Gregory Reinhart,
baixo
London Symphony Chorus
The Academy of Ancient Music
Christopher Hogwood,
regência

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Eiddwen Harrhy, soprano
Jean Bailey,
contralto
Andrew Murgatroyd,
tenor
Michael George,
baixo
Oslo Domchor
The Hanover Band

Roy Goodman, regência

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Ľuba Orgonášová, soprano
Anne Sofie von Otter,
contralto
Anthony Rolfe Johnson,
tenor
Gilles Cachemaille,
baixo
Monteverdi Choir
Orchestre Révolutionnaire et Romantique

John Eliot Gardiner, regência

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Krassimira Stoyanová, soprano
Lioba Braun,
contralto
Michael Schade,
tenor
Michael Volle,
barítono
Chor des Bayerischen Rundfunks
Symphonieorchester des Bayerischen Rundfunks

Mariss Jansons, regência

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Kateřina Beranová, soprano
Lilli Paasikivi,
mezzo-soprano
Robert Dean Smith,
tenor
Hanno Müller-Brachmann,
baixo
GewandhausKinderchor
GewandhausChor
MDR Rundfunkchor
Gewandhausorchester Leipzig

Riccardo Chailly, regência

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Annette Dasch,
soprano
Eva Vogel,
mezzo-soprano
Christian Elsner,
tenor
Dimitry Ivashchenko,
baixo
Rundfunkchor Berlin
Berliner Philharmoniker

Sir Simon Rattle, regência

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BTHVN250, por René Denon

Vassily

BTHVN250 – A Obra Completa de Ludwig van Beethoven (1770-1827) – Missa Solemnis, Op. 123 – Gardiner

O dia em que uma missa solene composta por mim for apresentada durante as cerimônias solenizadas para Vossa Alteza Imperial será o dia mais glorioso da minha vida; e Deus me iluminará para que meus pobres talentos possam contribuir para a glorificação desse dia solene.

Ao prometer a seu pupilo e arquiamigo imperial, Rudolph da Áustria, uma composição para marcar sua entrada solene como arcebispo da cidade morávia de Olmütz (hoje Olomouc, República Checa), Beethoven embarcava naquela que seria uma de suas maiores contendas criativas. Fora a campeoníssima Leonore/Fidelio – sua maior usina de desgostos e gastrites -, nenhuma outra obra tomou-lhe tanto tempo e lhe deu tanto trabalho.  É bem verdade que a Quinta Sinfonia, e em especial seu primeiro movimento, lhe foi uma obsessão por quatro anos, mas seu empenho nela foi no sentido de reelaborá-la e refiná-la para buscar aquela qualidade tipicamente beethoveniana de que cada nota pareça seguir-se da única possível. Os quatro anos dedicados à Missa, no entanto, viram a obra expandir constantemente seu escopo e ambição. Quando Rudolph foi investido do cargo, em 1820, Beethoven ainda trabalhava no Credo. Ao enfim dar por encerrados os trabalhos, em 1823 – depois de deixá-los de lado por um bom tempo para escrever as três últimas sonatas para piano e variar a marota valsinha de Diabelli -, enviou ao arquiduque uma composição imensa, repleta de grandes dificuldades técnicas, e totalmente incapaz de ser absorvida por qualquer cerimônia eclesiástica. Beethoven, ademais surdo, nunca testemunharia uma apresentação completa da obra, que foi estreada na distante corte russa em São Petersburgo por instigação de Nikolai Galitsyn – o encomendante dos últimos quartetos de cordas. Viena ouviria três de seus movimentos – o Kyrie, Credo e o Agnus Dei – no mesmo concerto em que a Nona Sinfonia foi estreada com êxito colossal, em 7 de maio de 1824, na presença do compositor.

Ei-los, compositor e missa (Joseph Karl Stieler, óleo sobre tela, 1820)

A Missa Solemnis marcou, assim como a sonata “Hammerklavier” e as Variações Diabelli, as tendências típicas da maturidade artística de Beethoven: abordar formas musicais consolidadas dum modo radicalmente novo e expansivo, quase a ponto de romper-lhes as costuras, sem ter qualquer pudor em propor dificuldades transcendentais a seus intérpretes, e com um inovador uso de formas contrapontísticas, especialmente da fuga. De fato, e exceto pelo Kyrie relativamente convencional, os demais movimentos não têm precedentes em música litúrgica; as exigências da partitura só atestam a total falta de empatia do renano para com seus intérpretes, principalmente os cantores (façam uma enquete para saber qual o compositor mais citado no Livro do Ódio dos coristas, e não se surpreenderão com o resultado); e imensas fugas corais que fazem picadinho das traqueias do coral, em especial na reprise de Et vitam venturi saeculi que conclui o credo, em que o já apressado andamento é retomado com o dobro da velocidade.

Não tenho dúvidas de que a Missa Solemnis seja, com folgas, a menos apreciada das grandes composições da maturidade de Beethoven. Muitos são os que a tratam com respeito, e poucos os que lhe têm devoção. Para mim, ela foi um gosto adquirido. Sempre gostei do Kyrie – que, como já mencionamos, é quase convencional em seu equilíbrio e no que se chamou de “serenidade bizantina” -, mas experimentava uma estranha inquietude ao escutar o restante. Quando percebi que inquietar e provocar talvez fossem exatamente a intenção de Beethoven, consegui apreciá-la melhor.

Ouçamos o Gloria, por exemplo. Depois do Kyrie, esperar-se-ia a habitual expressão de júbilo quase infeccioso com que o Gloria é tratado por outros compositores de missas.  Em seu lugar, Beethoven oferece um furioso fortíssimo do tímpano e instala uma massa sonora maníaca, que parece se resolver com o relaxamento à menção ao Cordeiro de Deus (Agnus Dei, qui tollis peccata mundi), só para, após os sis bemóis mais odiados pelas sopranos dos corais mundo afora (qui sedes ad dexteram patris), encerrar tudo com o verdadeiro clímax: uma gigantesca fuga coral. Tensão, relaxamento, preparação, resolução: tudo o que há habitualmente nas melhores sonatas, e no entanto inédito em música litúrgica.

Também escuto na Missa Solemnis expressões do ambicioso compositor que quis enriquecer com a ópera, mas abandonou-a para sempre após as agruras que viveu com Leonore/Fidelio. Momentos altamente dramáticos, como a constrita prece dos solistas (com a indicação ängstlich, “assustado”) após as distantes fanfarras militares do Agnus Dei, não seriam inapropriados às cenas finais no cárcere de Fidelio. Da mesma maneira, a maravilhosa exclamação Et… Et homo factus est, feita pelo tenor solista durante o Credo, nunca deixa de me emocionar ao prorromper, luminosa, após o idílico Et incarnatus: outra vez o drama, e não a liturgia, levando este homem cínico às genuínas lágrimas.

A abordagem do Credo expressa mais sobre a religiosidade de Beethoven do que qualquer coisa que ele tenha escrito. Alguns dos mais importantes dogmas cristãos são apressadamente escorraçados (trinta e sete palavras em vinte e dois compassos, para ser mais exato), para que a confissão de fé – a própria palavra Credo – se repita muitíssimas vezes: difícil haver maneira mais efetiva de nos contar que a fé, para ele, valia mais que dogmas eclesiásticos. Apesar de ser o mais heterodoxo dos movimentos da Missa, o Credo não suscitou nem uma fração das críticas que a parte seguinte, o Sanctus. Nada no Sanctus propriamente dito, aliás – que aqui começa de maneira pouco convencional, quase em sussurros, até que a esperada exaltação enfim surja em Pleni sunt coeli e no Osanna in excelsis. As críticas recaíram sobre o Benedictus, que Beethoven resolveu unir ao Sanctus através de uma ponte instrumental que imita lindamente o prelúdio habitualmente improvisado pelo organista durante esta transição. Após a referida ponte, um violino, acompanhado de duas flautas, entoa uma frase descendente que representa, explicitamente, a descida do Espírito Santo, para depois acompanhar solistas e coro num elaborado solo concertante. As sensibilidades da época, que conseguiram aturar o Gloria maníaco e o Credo quase alijado de dogmas, não aturaram tanta secularidade e acusaram Ludwig de anticlerical (o que ele de fato era, com orgulho) e pueril. Azar deles: eu acho o Benedictus e seu violino maravilhosos, e volto a eles sempre que posso.

Admito, mesmo com todo meu apreço pela Missa Solemnis, que seu Agnus Dei sempre me inspira sentimentos mistos. Aos movimentos anteriores, com todas suas idiossincrasias, nunca falta o senso de coesão. O Agnus me parece uma colagem e, com suas transições bruscas e o acorde final que parece nada resolver, deixa uma esquisita sensação de incompletude. Mas pode ser que, uma vez mais – desta feita, depois duma citação à Missa In Tempore Belli, do mestre Haydn, e outra, ainda mais explícita, ao He shall reign forever do Messiah de seu ídolo Händel -, Beethoven desejasse isso mesmo. Não tenho dúvidas de que ele fosse um homem em constantes buscas espirituais, capaz de repetir por várias vezes a indicação Mit Andacht (“Com devoção”) e colocar uma outra, Bitte um innern und äussern Frieden (“Rogue pela paz interior e exterior”) na sua mais importante obra de música sacra. Sua maior busca, no entanto, sempre foi a de que sua arte provocasse uma reação significativa em seu ouvinte – e a maior pista nesse sentido, para mim, foi a inscrição que ele quase publicou no frontispício dessa partitura:


Von Herzen – möge es wieder zu Herzen gehen”
(“De coração – que possa voltar ao coração”)


Ludwig, parece, acertou-me em cheio.

ooOoo

Encontrar uma interpretação satisfatória dessa obra desafiadora foi, realmente, muito difícil. A Missa Solemnis é, assim como a Sinfonia “Pastoral”, um calcanhar de Aquiles de muitos bons regentes. Poderia fazer aqui um enfadonho relato de quanto tempo perdi ouvindo gravações ruminativas que, talvez para facilitar a execução, reduziam a marcha dos frenéticos andamentos prescritos por Beethoven e delongavam a já imensa composição até o limiar do soporífero. Há outras tantas que, pouco atentas ao turbilhão de contrastes da partitura, acabam com um nada atraente jeitão rapsódico.

Em 2012, no entanto, John Eliot Gardiner voltou à Missa Solemnis, que já gravara em 1989, e meus problemas acabaram. Os ótimos solistas têm o brilho e a potência vocal para vencerem a imensa massa sonora que Beethoven tantas vezes os manda enfrentarem. É difícil imaginar um coro melhor que o Monteverdi, que não aparenta estrebuchar com as torturas prescritas pelo malvado alemão, e a Orchestre Révolutionnaire et Romantique, apesar do nome esdrúxulo, acerta tudo. Como acertar tudo não é o bastante, Gardiner guia suas forças musicais com segurança ao longo da armadilhada partitura, e a Missa Solemnis soa sanguínea e fresca como aquela madrugada que raiou para as pombas. Baixem agora que, em uma hora e meia, estarão a aplaudi-los de pé.


Ludwig van BEETHOVEN
 (1770-1827)

Missa Solemnis em Ré maior, para solistas, coro e orquestra com órgão, Op. 123
Composta entre 1819-1823
Publicada em 1826
Dedicada ao arquiduque Rudolph da Áustria

1 – Kyrie (Assai sostenuto – Mit Andacht – Andante assai bem marcato – Tempo I)
2 – Gloria (Allegro vivace – Meno Allegro – Tempo I – Larghetto – Allegro maestoso – Allegro, ma non troppo e ben marcato – Poco più Allegro – Presto)
3 – Credo (Allegro na non troppo – Adagio – Andante – Adagio expressivo – Allegro – Allegro molto  – Allegro ma non troppo – Allegro ma non troppo- Allegro con moto – Grave)
4 – Sanctus (Adagio. Mit Andacht – Allegro pesante  – Presto) – Praeludium (Sostenuto ma non troppo) – Benedictus (Andante molto cantabile e non troppo mosso)
5 – Agnus Dei (Adagio – Allegretto vivace (Bitte um innern und äussern Frieden) – Allegro assai  – Tempo I –  Presto – Tempo I)

Lucy Crowe, soprano
Jennifer Johnston, contralto
James Gilchrist, tenor
Matthew Rose, baixo
The Monteverdi Choir
Orchestre Révolutionnaire et Romantique
Peter Hanson,
spalla
James Johnstone, órgão
Sir John Eliot Gardiner, regência

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BTHVN250, por René Denon

Vassily

BTHVN250 – Anton Diabelli (1781-1858) et al. – Vaterländischer Künstlerverein – Buchbinder

Certa vez, há muitos anos, o irmão de um amigo estava num bar com um pequeno palco e um violão à disposição daqueles que quisessem fazer um pouco de música. Ele, um bom violonista, animou-se e lá foi tocar algumas coisinhas. Recebeu aplausos sinceros e, enquanto voltava ao seu lugar, viu o dono do estabelecimento afobar-se rumo ao microfone:

– Gurizada, acabo de saber que está aqui conosco uma das maiores revelações da Música brasileira, e queria chamá-lo agora ao palco.

Era Yamandu Costa, que atendeu ao chamado e, claro, logo começou a derramar maravilhas do violão. Enquanto isso, o irmão de meu amigo, sentindo-se um procarionte, saía de fininho e, até onde sei, nunca mais tocou em público.

ooOoo

Sentimento semelhante deve ter tomado conta de cinquenta entre os cinquenta e um colaboradores do projeto Vaterländischer Künstlerverein, quando o colaborador restante, um alemão de nome Beethoven, enviou ao editor Diabelli não somente a variação que este pedira sobre uma sua valsinha, mas trinta e três transfigurações dela que, juntas, formam a maior obra em variações da história da Música.


Ei-las

Ninguém tem certeza sobre os motivos que levaram Diabelli, um pianista e violonista amador cuja notoriedade resumia-se à composição de numerosas bagatelas pedagógicas, a organizar o projeto. Como sócio duma editora, pode-se sempre supor que o motivo fosse caçar bufunfa. Corre a lenda, no entanto, de que ele, horrorizado com a penúria dos órfãos e feridos de guerra em Viena, resolveu convocar a Associação Patriótica de Artistas (uma das traduções possíveis para Vaterländischer Künstlerverein) para aliviar o sofrimento daqueles miseráveis, através duma composição beneficente. O fato é que esse alívio, se de fato houve, demorou a chegar, pois, entre a composição da primeira variação (por Czerny, em 1819) e a da última (por Wittasek, em 1824), cinco anos se passaram. Nesse meio-tempo, Beethoven –  obviamente obcecado pelo tema de Diabelli – pariu trinta e três variações, escritas entre os exigentes trabalhos da Missa Solemnis e das três últimas sonatas para piano, e as publicou antes de todas as demais, em 1823, como o primeiro volume da Vaterländischer Künstlerverein. As cinquenta contribuições restantes só iriam à prensa no ano seguinte, formando seu segundo e obscuro volume.

Ninguém sabe, tampouco, a quantos compositores Diabelli enviou seu convite e a cópia da hoje célebre valsinha. O que houve, e disso já sabemos, foram cinquenta e uma respostas. Afora o renano aberrante com suas trinta e três geniais variações, houve dois outros compositores que se deram ao trabalho de escrever mais de uma variação. Gottfried Rieger e Franz Xaver Wolfgang Mozart (filho de Amadeus e por isso chamado, na primeira edição, de “Wolfgang Amadeus Mozart Filho”) contribuíram cada qual com um par, do qual Diabelli escolheu apenas uma (as outras, que acabaram descartadas, estão inclusas na gravação que ouvirão).

Entre os outros quarenta e oito, há um gênio: o então pouco conhecido Franz Schubert, cuja singela variação praticamente grita sua autoria e soa como um dos seus “moments musicaux”. Há também músicos que fizeram o movimento oposto e desceram do alto do panteão musical para um relativo esquecimento, como o mui competente Johann Nepomuk Hummel, cujo  maior defeito e tremendo azar foi ser contemporâneo de Ludwig. Entre as muitas celebridades pianísticas da época que legaram suas variações, duas eram muito próximas a Beethoven: Carl Czerny, seu aluno de piano e fundador duma linha pedagógica que chegou a nossos tempos, e Ignaz Moscheles, que o auxiliou na organização de Fidelio e lhe foi um amigo extraordinário nos dolorosos anos finais. Outras dessas celebridades hoje mal ocupam notas de rodapé, como Friedrich Kalkbrenner, o mais famoso pianista de Paris quando da chegada de Chopin àquela cidade e dedicatário do primeiro concerto para piano do polonês (Op. 11), e de J. P. Pixis, um artista famoso pelo nariz descomunal e que também recebeu uma dedicatória de Chopin – aquela da Fantasia sobre Temas Poloneses (Op. 13). Escondidos sob a forma alemã de seus sobrenomes – Tomaschek e Worzischek – estão dois bons compositores boêmios, Václav Tomášek e Jan Voříšek. Também encontramos no rol alguns cidadãos de oblíqua fama, como Michael Umlauf, o regente de fato da première da Nona Sinfonia de Beethoven (pois o regente oficial era Beethoven, que nada mais escutava e menos ainda regia), e Anselm Hüttenbrenner, amigo de Schubert e fiel depositário dos manuscritos da Sinfonia Inacabada. Encontramos alguns falsos cognatos – um Czerny que nada tem a ver com o Czerny famoso, autor daquelas centenas de estudos que são o terror dos estudantes de piano, e um Kreutzer sem relações com aquele que esnobou a sonata que imortalizou seu nome. No mais, somente nomes dos quais nada mais sabemos, nem por notas de rodapé, com duas exceções.

A primeira exceção é a sigla S. R. D., que para os íntimos significa Serenissimus Rudolphus Dux e designa o arquiduque Rudolph da Áustria, grande amigo e generoso patrono de Beethoven, de quem foi o único aluno de composição. Rudolph, que se preparava para assumir a arquidiocese de Olmütz (atual Olomouc, Tchéquia), estava um tanto afastado da Música e deve ter, por isso, preferido a discrição.

A segunda é um “menino de onze anos, nascido na Hungria”, de nome…


O então desconhecido moleque de Raiding tinha oito anos quando Czerny, seu influente professor, escreveu sua variação, e treze quando sua própria variação foi publicada. Liszt ainda não sonhava com a fama e a histeria em que surfaria por toda a Europa nas décadas seguintes, e certamente ingressou no rol de Diabelli por  influência de Czerny. Curiosamente, Liszt, Czerny e o supracitado Pixis juntar-se-iam futuramente a Chopin, Thalberg e Herz na publicação duma outra obra colaborativa: o Hexameron(1837), composto por variações sobre uma marcha de Bellini e organizado por Liszt.

Convites enviados, variações recebidas, restava organizá-las para publicação. E qual o critério escolhido para fazê-lo? O mais mocorongo possível: a ordem alfabética.


Francamente, Herr Diabelli!

Para não ficar tão feio, Diabelli pediu a Czerny, seu primeiro colaborador no projeto, que compusesse uma coda que arrematasse a colcha de retalhos. Apesar de seu cuidado, o mexidão pianístico não deu tão certo e, mesmo que lhe concedamos a cortesia de não escutarmos as “Diabelli” de Beethoven primeiro, o segundo volume da Vaterländische Künstlerverein é dureza de ouvir. A posteridade foi rápida no veredito e concedeu-lhe, por fim, a mais definitiva das cortesias: o completo esquecimento.

Não fosse a abnegação de gente como Rudolf Buchbinder a tirar-lhes o bolor, soprar-lhes a poeira e volta e meia tocá-las (Buchbinder significa “encadernador”, e talvez isso explique sua predileção por papel roído por cupins), vocês só saberiam dessas cinquenta outras variações através de poentos volumes e debaixo de violentos acessos de rinite. Por isso, agradeçam a Buchbinder e ao PQP Bach pelo duvidoso privilégio, sem esquecer daquele valeuzinho para mim, que tanto trabalho tive digitando nomes obscuros para identificar as faixas e as categorias na lista de compositores publicados aqui no blog – o qual, certamente, nunca ganhou tantas figurinhas novas num só dia.

De nada.

Anton DIABELLI (1781–1858) [organizador]

Vaterländischer Künstlerverein – Veränderungen für das Piano-Forte über ein vorgelegtes Thema componiert von den vorzüglichsten Tonzetzern und Virtuosen Wiens und der kaiserlichen-königlichen österreichischen Staaten (“Associação Patriótica de Artistas – Variações sobre um tema proposto, compostas pelos mais renomados compositores e virtuosos de Viena e dos estados imperiais e reais da Áustria”)

PARTE I

Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)

Trinta e três variações em Dó maior para piano sobre uma valsa de Anton Diabelli, Op. 120
Compostas entre 1819–23
Publicadas em 1823
Dedicadas a Antonie Brentano

1 – Thema: Vivace
2 – Variation 1: Alla marcia maestoso
3 – Variation 2: Poco allegro
4 – Variation 3: L’istesso tempo
5 – Variation 4: Un poco più vivace
6 – Variation 5: Allegro vivace
7 – Variation 6: Allegro ma non troppo e serioso
8 – Variation 7: Un poco più allegro
9 – Variation 8: Poco vivace
10 – Variation 9: Allegro pesante e risoluto
11 – Variation 10: Presto
12 – Variation 11: Allegretto
13 – Variation 12: Un poco più moto
14 – Variation 13: Vivace
15 – Variation 14: Grave e maestoso
16 – Variation 15: Presto scherzando
17 – Variation 16: Allegro
18 – Variation 17: Allegro
19 – Variation 18: Poco moderato
20 – Variation 19: Presto
21 – Variation 20: Andante
22 – Variation 21: Allegro con brio – Meno allegro – Tempo primo
23 – Variation 22: Allegro molto, alla « Notte e giorno faticar » di Mozart
24 – Variation 23: Allegro assai
25 – Variation 24: Fughetta (Andante)
26 – Variation 25: Allegro
27 – Variation 26: (Piacevole)
28 – Variation 27: Vivace
29 – Variation 28: Allegro
30 – Variation 29: Adagio ma non troppo
31 – Variation 30: Andante, sempre cantabile
32 – Variation 31: Largo, molto espressivo
33 – Variation 32: Fuga: Allegro
34 – Variation 33: Tempo di Menuetto moderato

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PARTE II

Anton DIABELLI
1 – Thema: Vivace

Ignaz ASSMAYER (1790–1862)
2 – Variação I: Moderato

Carl Maria von BOCKLET (1801–1881)
3 – Variação II: Vivace

Leopold Eustachius CZAPEK (1792–1840)
4 – Variação III: Vivace molto legato

Carl CZERNY (1791–1857)
5 – Variação IV [Sem indicação de andamento]

Joseph CZERNY (1785–1842)
6 – Variação V[Sem indicação de andamento]

Moritz Joseph Johann, Príncipe de DIETRICHSTEIN (1775–1864)
7 –  Variação VI: Tempo vivo del Thema

Joseph DRECHSLER (1782–1852)
8 – Variação VII: Quasi overture: Adagio – Allegro

Emanuel Aloys FÖRSTER (1748–1823
9 – Variação VIII: Capriccio: Allegro

Franz Jakob FREYSTÄDTLER (1761–1841)
10 – Variação IX [Sem indicação de andamento]

Johann Baptist GÄNSBACHER (1778–1844)
11 – Variação X [Sem indicação de andamento]

Joseph GELINEK (1758–1825)
12 – Variação XI: Presto

Anton HALM (1789–1872)
13 – Variação XII: Dolce

Joachim HOFFMANN (1788–1856)
14 – Variação XIII: Fugato: Vivo

Johann HORZALKA (1798–1860)
15 – Variação XIV: Adagio

Joseph HUGLMANN (1768–1839)
16 – Variação XV: Allegro

Johann Nepomuk HUMMEL (1778–1837)
17 – Variação XVI [Sem indicação de andamento]

Anselm HÜTTENBRENNER (1794–1868)
18 – Variação XVII: Allegro

Friedrich KALKBRENNER (1785–1849)
19 – Variação XVIII: Allegro non troppo

Friedrich August KANNE (1778–1833)
20 – Variação XIX [Sem indicação de andamento]

Joseph KERZKOWSKY (1791?)
21 – Variação XX: Moderato con espressione

Conradin KREUTZER (1780–1849)
22  – Variação XXI: Vivace

Eduard, Barão de LANNOY (1787–1853)
23 – Variação XXII [Sem indicação de andamento]

Maximilian Joseph LEIDESDORF (1787–1840)
24 – Variação XXIII: Vivace

Franz LISZT (1811–1886)
25 – Variação XXIV: Allegro

Joseph MAYSEDER (1789–1863)
26 – Variação XXV: Allegro

Ignaz MOSCHELES (1794–1870)
27 – Variação XXVI [Sem indicação de andamento]

Ignaz Franz Edler von MOSEL (1772–1844)
28 – Variação XXVII [Sem indicação de andamento]

Franz Xaver Wolfgang MOZART (1791–1844), listado como “Wolfgang Amadeus Mozart Filho”
29 – Variação XXVIIIa: Con fuoco
30 – Variação XXVIIIb [Sem indicação de andamento]

Joseph PANNY (1796–1838)
31 – Variação XXIX: Allegro con brio

Hieronymus PAYER (1787–1845)
32 – Variação XXX [Sem indicação de andamento]

Johann Peter PIXIS (1788–1874)
33 – Variação XXXI [Sem indicação de andamento]

Wenzel PLACHY (1785–1858)
34 – Variação XXXII: Con fuoco

Gottfried RIEGER (1764–1855)
35 – Variação XXXIIIa: Allegro ma no troppo
36 – Variação XXXIIIb: [Sem indicação de andamento]

Philipp Jakob RIOTTE (1776–1856)
37 – Variação XXXIV: Allegro

Franz de Paula ROSER (1779–1830)
38 – Variação XXXV [Sem indicação de andamento]

Johann Baptist SCHENK (1753–1836)
39 – Variação XXXVI: Caprice: Moderato

Franz SCHOBERLECHNER (1797–1843)
40 – Variação XXXVII [Sem indicação de andamento]

Franz Peter SCHUBERT (1797–1828)
41 – Variação XXXVIII [Sem indicação de andamento] (D. 718)

Simon SECHTER (1788–1867)
42 -Variação XXXIX: Imitatio quasi Canon a 3 voci

“S.R.D.” (Serenissimus Rudolfus Dux, Arquiduque RUDOLPH da Áustria) (1788–1831)
43 – Variação XL: Fuga: Allegro

Maximilian STADLER (1748–1833)
44 – Variação XLI [Sem indicação de andamento]

Joseph von SZALAY (1800–1860)
45 – Variação XLII [Sem indicação de andamento]

Wenzel Johann Tomaschek (Václav Jan TOMÁŠEK) (1774–1850)
46 – Variação XLIII: Polonaise: Tempo giusto

Michael UMLAUF (1781–1842)
47 – Variação XLIV: Presto

Friedrich Dionysius Weber (Bedřich Diviš WEBER) (1766–1842)
48 – Variação XLV: Con fuoco

Franz WEBER (1805–1876)
47 – Variação XLVI: Brillante

Carl Angelus von WINKHLER (1796–1845)
48 – Variação XLVII: Allegro con fuoco

Franz WEISS (1778–1830)
49 – Variação XLVIII [Sem indicação de andamento]

Johann Nepomuk August Wittasek (Jan Nepomuk August VITÁSEK) (1770–1839)
50 – Variação XLIX: Un poco moderato

Johann Hugo Worzischek (Jan Václav VOŘÍŠEK) (1791–1825)
51 – Variação L [Sem indicação de andamento]

Carl CZERNY
52 – Coda

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Rudolf Buchbinder, piano

BTHVN250, por René Denon

Vassily

BTHVN250 – A Obra Completa de Ludwig van Beethoven (1770-1827) – Trinta e três variações sobre uma valsa de Anton Diabelli, Op. 120 – Staier

Sou ávido ouvinte da chamada interpretação historicamente informada, a ponto de ter uma discografia historicamente informada paralela à de interpretações, assim digamos, convencionais. A música de Beethoven, que esteve por décadas além dos limites de exploração da turma dos instrumentos originais, foi por ela enfim acolhida, e a produção pianística de Ludwig, tão fundamental ao repertório, não ficou de fora, e o mundo viu surgirem muitas atraentes leituras das sonatas, tocadas em fortepianos por mestres como Paul Badura-Skoda e Ronald Brautigam.

 

Faltavam, no entanto, as Variações Diabelli.

É bem provável que, por sua transcendência e exigências ao instrumento e ao executante, elas tenham ficado fora da alçada das aventuras dos primeiros fortepianistas contemporâneos. Beethoven, que já estava completamente surdo quando compôs as “Diabelli”, nunca as escutou, exceto em sua imaginação. Suas frequentes  reclamações quanto às limitações dos pianos de sua época, no entanto, permitem-nos supor que ele desejasse para as “Diabelli” um instrumento mais potente, com timbre mais uniforme entre os registros, e vasta gama dinâmica – um instrumento, enfim, como os modernos pianos de concerto.

Entra em cena Andreas Staier, um fortepianista com toque de Midas, disposto a recriar as “Diabelli” dum modo que ninguém antes as ouvira: numa cópia dum instrumento de Conrad Graf, semelhante ao que o compositor mantinha em seu caótico apartamento, e baseado no manuscrito autógrafo que, depois de cento e oitenta anos flanando entre coleções privadas, foi enfim adquirido pela Beethovenhaus em Bonn.

Tão logo anunciaram esse projeto de Staier, passei a esperar, claro, pelo sublime. Não me frustrei: sua gravação, parida em 2012, nasceu clássica. Mesmo se tivesse sido feita num piano moderno, ela seria excelente, pelo afinco com que Staier abraçou o conceito beethoveniano de sintetizar, com as “Diabelli”, o estado da arte pianístico daqueles 1820’s. À sua exploração aventurosa do teclado soma-se o domínio dos timbres do fortepiano, usados em todos seus recursos – incluindo seus pedais de abafamento e efeitos de registros, como o de fagote (que dá um toque fanhoso às notas) e o dito “registro janízaro”, que tenta emular a percussão das bandas de regimentos otomanos, feito para saciar o apetite europeu por “música turca”, naquela época.

Staier não para por aí: ele adiciona ornamentos e ligeiras variações às repetições; usa as pausas de maneira extremamente expressiva – por vezes irônica, noutras muito dramática – tanto durante as variações quanto entre elas; e, não menos importante, abre a gravação com doze das variações que diversos compositores (entre eles Liszt e Schubert) mandaram a Diabelli, para que sirvam de prelúdio à obra-prima de Beethoven. Para arredondar, presenteia-nos com uma introdução improvisada antes da obra de Beethoven, que é sua própria variação sobre a marota valsinha.

Nas palavras de Staier:

Minha intenção com a introdução foi criar um espaço sonoro que separa os doze ‘prelúdios’, de Czerny a Schubert, do grande ciclo de Beethoven. É uma pausa para respirar no meio do que, de outra forma, seria música rigorosamente composta. Por isso, eu acho que o elemento improvisado é aqui perfeitamente apropriado. Dessa forma, pode-se garantir que a valsa de Diabelli tenha o frescor necessário na segunda vez que for tocada. […] Este manuscrito fascinante nos permite inferir o lado colérico e impaciente de Beethoven, mas não o lado irônico de seu caráter. As anotações mostram suas preocupações e dificuldades durante um processo de composição bastante trabalhoso. O que começou como uma cópia limpo se transforma cada vez mais em um manuscrito funcional. Com a dinâmica da caligrafia e as muitas correções e rasuras, ele fornece toda uma gama de indicadores para as intenções do compositor. É um tesouro para o intérprete”

Nada que eu e Staier lhes contemos será capaz de dar-lhes ideia da delícia que é ouvir este álbum, uma apoteose do fortepiano e, acima de tudo, uma afirmação de suas qualidades ante suas potentes contrapartes modernas. Calo-me, portanto, para que vocês se deleitem.

Bom proveito!

Anton DIABELLI (1781–1858) [organizador]

De Vaterländischer Künstlerverein – Veränderungen über ein vorgelegtes Thema componiert von den vorzüglichsten Tonzetzern und Virtuosen Wiens und der kaiserlichen-königlichrn österreichischen Staaten (“Associação de Artistas Patrióticos – Variações sobre um tema proposto, compostas pelos mais renomados compositores e virtuosos de Viena e dos estados imperiais e reais da Áustria”)

Anton DIABELLI
1 – Thema: Vivace

Carl CZERNY (1791–1857)
2 – Variação IV [Sem indicação de andamento]

Johann Nepomuk HUMMEL (1778–1837)
3 – Variação XVI [Sem indicação de andamento]

Friedrich Wilhelm Michael KALKBRENNER (1785–1849)
4 – Variação XVIII: Allegro non troppo

Joseph KERZKOWSKY (1791?)
5 – Variação XX: Moderato con espressione

Conradin KREUTZER (1780–1849)
6 – Variação XXI: Vivace

Franz LISZT (1811–1886)
7- Variação XXIV: Allegro

Ignaz MOSCHELES (1794–1870)
8- Variação XXVI [Sem indicação de andamento]

Johann Peter PIXIS (1788–1874)
9 – Variação XXXI [Sem indicação de andamento]

Franz Xaver Wolfgang MOZART (1791–1844)
10 – Variação XXVIIIa: Con fuoco

Franz Peter SCHUBERT (1797–1828)
11 – Variação XXXVIII [Sem indicação de andamento]


Andreas STAIER (1955)
12 – Introduktion (improvisação)


Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)

Trinta e três variações em Dó maior para piano sobre uma valsa de Anton Diabelli, Op. 120
Compostas entre 1819–23
Publicadas em 1823
Dedicadas a Antonie Brentano

13 – Thema: Vivace
14 – Variation 1: Alla marcia maestoso
15 – Variation 2: Poco allegro
16 – Variation 3: L’istesso tempo
17 – Variation 4: Un poco più vivace
18 – Variation 5: Allegro vivace
19- Variation 6: Allegro ma non troppo e serioso
20 – Variation 7: Un poco più allegro
21 – Variation 8: Poco vivace
22 – Variation 9: Allegro pesante e risoluto
23 – Variation 10: Presto
24 – Variation 11: Allegretto
25 – Variation 12: Un poco più moto
26 – Variation 13: Vivace
27 – Variation 14: Grave e maestoso
28 – Variation 15: Presto scherzando
29 – Variation 16: Allegro
30 – Variation 17: Allegro
31 – Variation 18: Poco moderato
32 – Variation 19: Presto
33 – Variation 20: Andante
34 – Variation 21: Allegro con brio – Meno allegro – Tempo primo
35 – Variation 22: Allegro molto, alla « Notte e giorno faticar » di Mozart
36 – Variation 23: Allegro assai
37 – Variation 24: Fughetta (Andante)
38 – Variation 25: Allegro
39 – Variation 26: (Piacevole)
40 – Variation 27: Vivace
41 – Variation 28: Allegro
42 – Variation 29: Adagio ma non troppo
43 – Variation 30: Andante, sempre cantabile
44 – Variation 31: Largo, molto espressivo
45 – Variation 32: Fuga: Allegro
46 – Variation 33: Tempo di Menuetto moderato

Andreas Staier, fortepiano (baseado num modelo de Conrad Graf)

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE

“Conrad Graf – Fabricante de Fortepianos da Corte Imperial e Real – Viena – Próximo à Igreja de São Carlos, na rua Mondschein [“Luar”], no. 102″
Da coleção do Metropolitan Museum of Art, New York City, Estados Unidos (licença Creative Commons CC0 1.0)
BTHVN250, por René Denon

Vassily

BTHVN250 – A Obra Completa de Ludwig van Beethoven (1770-1827) – Trinta e três variações sobre uma valsa de Anton Diabelli, Op. 120 – O’Conor

Nossa travessia da obra beethoveniana chega hoje àquela que é, para mim, sua obra mais genial. Nas palavras de Hans von Bülow, as variações sobre uma valsa de Anton Diabelli, (doravante chamadas simplesmente de “as Diabelli”) são o “microcosmos da arte de Beethoven”. De fato, elas são um portfólio do poder de sua imaginação e um tour de force de seu incomparável conhecimento do teclado. A maior obra em variações de toda Música também é, na minha desimportante opinião, a maior de todas as obras escritas para piano.

Ninguém imaginaria tantos superlativos quando o editor Diabelli o convidou, juntamente com trocentos outros compositores do Império, a contribuir com uma variação para um compêndio beneficente que estava a organizar (e que será abordado numa próxima publicação) sobre uma faceira valsa de sua lavra. Beethoven, aparentemente, desdenhou o tema que lhe foi proposto, chamando-o de Schusterfleck, o “remendo de sapateiro”, uma referência às repetições de figuras em tons ascendentes a se sobreporem como remendos nas solas de sapatos, e que é um artifício comum em peças de baixo calão.


William Kinderman – um ótimo intérprete e talvez a maior autoridade hoje no
Op. 120 –  demonstra os “Schusterflecker” na valsa de Diabelli

“Tema”, aliás, não parece um termo apropriado à pequenina valsa – ou, mais exatamente, um Ländler – com pouquíssimos gestos melódicos. De qualquer maneira, Beethoven mudou de ideia a seu respeito e, deixando de lado o trabalho na Missa Solemnis, debruçou-se sobre a ninharia de Diabelli no final de 1819. Rapidamente, compôs vinte e três variações sobre ela – vinte e duas além do pedido. Os queimados prazos da Missa e das três últimas sonatas para piano chamaram-no de volta para essas obras, e ele só voltaria às Diabelli em 1823, para acrescentar-lhes mais dez variações e, enfim, mandá-las ao editor.

Diabelli deve ter-se espantado com o contraste entre a singeleza do que pediu e a transcendência do que recebeu. Seu prefácio à primeira edição deixa claro o seu pasmo:


Doravante apresentamos ao mundo Variações em nada ordinárias, e sim uma grande e importante obra-prima digna de ser alinhada com as criações imortais dos antigos clássicos – uma obra tal como apenas Beethoven, o maior representante vivo da verdadeira Arte – apenas Beethoven, e nenhum outro, pode produzir. As estruturas e ideias mais originais, os idiomas e harmonias musicais mais ousados aqui exaurem-se; todo efeito de piano baseado em uma técnica sólida é empregado, e este trabalho torna-se mais interessante pelo fato de que ele é extraído de um tema que ninguém suporia capaz dum desenvolvimento à altura do caráter com que nosso exaltado Mestre se destaca sozinho entre seus contemporâneos. As esplêndidas fugas, nos. 24 e 32, surpreenderão todos os amigos e conhecedores do estilo sério, assim como os nºs 2, 6, 16, 17, 23 &c, os brilhantes pianistas; em verdade, todas essas variações, por meio da novidade de suas idéias, do cuidado na elaboração e da beleza nas mais engenhosas de suas transições, darão à obra um lugar ao lado da famosa obra-prima de Sebastian Bach na mesma forma. Estamos orgulhosos de ter ensejado esta composição e, além disso, nos esforçamos ao máximo na impressão para combinar elegância com o máximo de precisão”

Diabelli estava certo, e as “Diabelli” ganharam um lugar no panteão das grandes obras em variações, ao lado das Goldberg. Mais que isso, foram – a despeito de suas imensas dificuldades técnicas – um instantâneo sucesso que imortalizou seu nome ademais esquecível.

Como se nota pela citação acima, o próprio autor do tema reconhecia sua surpresa com a resposta de Beethoven à sua bagatela. Ludwig, que se interessava por variações desde que usava calças curtas, decompôs a valsa de Diabelli em seus pequenos gestos – como o floreio inicial e as figurações descendentes – e assim encontrou imensas possibilidades de transformá-la (pois o termo “Veränderungen” também significa “transformação”), explorando-os às últimas consequências.

O grande Alfred Brendel assim definiu o resultado:


O tema deixou de mandar sobre sua prole rebelde. Em lugar disso, as variações decidem o que o tema pode ter a lhes oferecer. Em vez de ser reafirmado, adornado e glorificado, é melhorado, parodiado, ridicularizado, negado, transfigurado, lamentado, eliminado e finalmente elevado…

As “Diabelli” são o apogeu duma carreira intimamente ligada ao teclado, um compêndio do estado da arte de um instrumento, e o testamento pianístico de Beethoven, que, fora algumas bagatelas e rabiscos, não voltaria mais a escrever para o piano.

Analisar essa obra monumental foge, claro, ao escopo duma postagem de blog. Recomendo fortemente, nesse sentido, o livro essencial que William Kinderman (o mesmo que mais acima falou sobre a Schusterfleck) escreveu sobre ela: nada menos que sensacional, ou, como diria nosso patrão PQP Bach, IM-PER-DÍ-VEL para os diabellimaníacos entre vós outros. Limitar-me-ei a falar sobre seus intérpretes: cresci ouvindo as legendárias versões de Schnabel e Gulda; aprendi a reverenciar as leituras de Kovacevich, Pollini e Sokolov – mas, desde que o irlandês John O’Conor, talvez o mais exuberante beethoveniano da atualidade, lançou a sua, eu a tenho ouvido sem parar. Há de tudo em suas “Diabelli”: o elã, o humor, a vivacidade; a ironia, o sarcasmo, a paródia; o pathos, a ferocidade, o sublime. Uma gravação, enfim, para a eternidade.

Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)

Trinta e três variações em Dó maior para piano sobre uma valsa de Anton Diabelli, Op. 120
Compostas entre 1819–23
Publicadas em 1823
Dedicadas a Antonie Brentano

1 – Thema: Vivace
2 – Variation 1: Alla marcia maestoso
3 – Variation 2: Poco allegro
4 – Variation 3: L’istesso tempo
5 – Variation 4: Un poco più vivace
6 – Variation 5: Allegro vivace
7 – Variation 6: Allegro ma non troppo e serioso
8 – Variation 7: Un poco più allegro
9 – Variation 8: Poco vivace
10 – Variation 9: Allegro pesante e risoluto
11 – Variation 10: Presto
12 – Variation 11: Allegretto
13 – Variation 12: Un poco più moto
14 – Variation 13: Vivace
15 – Variation 14: Grave e maestoso
16 – Variation 15: Presto scherzando
17 – Variation 16: Allegro
18 – Variation 17: Allegro
19 – Variation 18: Poco moderato
20 – Variation 19: Presto
21 – Variation 20: Andante
22 – Variation 21: Allegro con brio – Meno allegro – Tempo primo
23 – Variation 22: Allegro molto, alla « Notte e giorno faticar » di Mozart
24 – Variation 23: Allegro assai
25 – Variation 24: Fughetta (Andante)
26 – Variation 25: Allegro
27 – Variation 26: (Piacevole)
28 – Variation 27: Vivace
29 – Variation 28: Allegro
30 – Variation 29: Adagio ma non troppo
31 – Variation 30: Andante, sempre cantabile
32 – Variation 31: Largo, molto espressivo
33 – Variation 32: Fuga: Allegro
34 – Variation 33: Tempo di Menuetto moderato

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE

John O’Conor, piano

 

BTHVN250, por René Denon

Vassily

BTHVN250 – A Obra Completa de Ludwig van Beethoven (1770-1827) – “Meeresstille und glückliche Fahrt”, Op. 112 – Sinfonia no. 5 em Dó menor, Op. 67 – Gustav Mahler (1860-1911): Sinfonia no. 10 em Fá sustenido maior – Boulez

A cantata “Mar Calmo e Viagem Próspera” está entre as mais concisas e menos conhecidas obras-primas de Beethoven. Dedicada a Goethe, que Ludwig idolatrava, baseou-se em dois breves poemas do mestre de Weimar – porque, sim, “Mar Calmo” não é sinônimo de “Viagem Próspera”, pelo menos para quem depende de velas para propelir suas embarcações. “Mar Calmo” descreve, assim, e com música quase estática, o medo mortal do marinheiro (não me arriscarei a traduções de Goethe, então googleiem aí):


Tiefe Stille herrscht im Wasser,
Ohne Regung ruht das Meer,
Und bekümmert sieht der Schiffer
Glatte Fläche rings umher.
Keine Luft von keiner Seite!
Todesstille fürchterlich!
In der ungeheuern Weite
Reget keine Welle sich”

O contraste com a “Viagem Próspera” não poderia ser mais vivo: uma erupção quase maníaca de euforia com os ventos que encerram a calmaria:

Die Nebel zerreißen,
Der Himmel ist helle,
Und Äolus löset
Das ängstliche Band.
Es säuseln die Winde,
Es rührt sich der Schiffer.
Geschwinde! Geschwinde!
Es teilt sich die Welle,
Es naht sich die Ferne,
Schon seh’ ich das Land!”

As semelhanças da “Viagem Próspera” com o finale da Nona Sinfonia são notáveis, quanto mais por compartilharem a mesma tonalidade (Ré maior) e serem imbuídas do mesmo frenético elã. Beethoven tinha essa breve cantata em muito alta consideração, pois de outra maneira não se arriscaria a dedicá-la a Goethe, que era notoriamente blasé no que tangia às tentativas de colocar seus poemas em música, e a quem escreveu:


… por causa de seus caráteres constrastantes, esses dois poemas me pareceram muito adequados para a expressão desse contraste em música. Ser-me-ia um deleite saber que uni minha harmonia com a sua de maneira apropriada”


Goethe, claro, nunca lhe respondeu.

ooOoo

Admito que esta não seja minha versão favorita da cantata – a favorita, na verdade, está aqui. Eu a trouxe porque ela me serve de pretexto para alcançar-lhes a famosa leitura que Pierre Boulez fez da indefectível Quinta de Beethoven. Fama não significa necessariamente aclamação, e a reputação de lentidão do primeiro movimento é, como ouvirão, justamente merecida. Boulez, sempre o enfant terrible, aborda ruminativa e pontilhisticamente o célebre Allegro con brio, mas comporta-se razoavelmente nos movimentos seguintes. O contraste da Quinta com o Mar Calmo e a Viagem Feliz que a seguem é, para dizer o mínimo, muito peculiar. E, como heterodoxia pouca é bobagem, resolveram que seria necessário preencher com música os vinte e tantos minutos que faltavam ao velho LP ocupar todo um CD, e alguém achou que seria uma boa ideia justapor o Adagio da incompleta sinfonia no. 10 de Mahler.

Pelo jeito, chá de fita era o que não faltava aos produtores da Columbia. E devia estar bem bom.

Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)

Sinfonia no. 5 em Dó menor, Op. 67
Composta entre 1804-8
Publicada em 1809
Dedicada ao príncipe Lobkowitz e ao conde Andreas Razumovsky

1 – Allegro con brio
2 – Andante con moto
3 – Scherzo. Allegro
4 – Allegro

New Philharmonia Orchestra
Pierre Boulez, regência


“Meeresstille und Glückliche Fahrt”, cantata para solistas, coro e orquestra, Op. 112
Composta entre em 1814–5
Publicada em 1822
Dedicada a Johann Wolfgang von Goethe

5 – Meeresstille. Sostenuto – Glückliche Fahrt. Allegro vivace

John Alldis Choir
New Philharmonia Orchestra
Pierre Boulez, regência


Gustav MAHLER (1850-1911)

Sinfonia no. 10 em Fá sustenido maior (1910)
6 – Andante – Adagio

London Symphony Orchestra
Pierre Boulez, regência

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE

Falando em chá de fita…
BTHVN250, por René Denon

Vassily

BTHVN250 – A Obra Completa de Ludwig van Beethoven (1770-1827) – Sonata para piano em Dó menor, Op. 111 [Beethoven – The Late Piano Sonatas – Hungerford]

A promessa furada de enviar “sem demora” as três sonatas encomendadas por Schlesinger começou a deixar de ser potoca quando Beethoven, já atrasadíssimo, começou a última delas, a Op. 111, antes mesmo de terminar a Op. 110. Depois de muito ruminar sobre o finale de sua antecessora, a rapidez com que escreveu sua derradeira sonata para piano foi impressionante – ela ficou pronta em poucas semanas e, a despeito de várias correções e reformulações que a transformaram no costumeiro caldo de garranchos, foi enviada logo em seguida ao editor Schlesinger. E quem a ouve – ou, como é meu caso, a reouve pela “incontavelésima” vez – fica com a impressão de que esta obra-prima só poderia mesmo ter sido escrita assim, num jorro contínuo de inspiração.

A atrapalhação de que se poupou na composição, Beethoven despendeu-a na dedicatória. Além de encerrar o ciclo de sonatas prometido para Schlesinger em Viena, a Op. 111 foi oferecida à firma de Muzio Clementi em Londres. Para ambos editores, Ludwig enviou o manuscrito com dedicatória a seu aluno, amigo e patrono, o arquiduque Rudolph da Áustria. Enquanto a obra estava no prelo, e talvez para compensar a babada de querer dedicar a sonata anterior a Antonie Brentano e acabar por ver a partitura publicada sem qualquer dedicatória, mudou de ideia e resolveu homenagear Brentano. Clementi mudou a dedicatária; Schlesinger, não. Assim, a sonata surgiu em Londres dedicada a sua talvez-mais-que-amiga, e em Viena, a seu amigo imperial.

A concentrada obra tem apenas dois movimentos, o que levou seus editores a perguntarem se algum outro não fora esquecido. Talvez Beethoven tenha planejado um terceiro, pois há anotações de um Presto seguindo-se à Arietta no primeiro manuscrito do Allegro de abertura. O fato é que nenhuma imaginação conseguiria conceber algo capaz de se seguir à pungente morte das notas finais da Arietta, na qual um longo tema é variado cinco vezes, com várias mudanças no já invulgar compasso de 9/16 que abre o movimento, passando por um notável, sincopado episódio que já foi chamado de proto-jazz, e isso setenta anos antes de qualquer coisa nesse sentido ser criada na Louisiana. Muito já se escreveu sobre a impossibilidade de apor um poslúdio à Op. 111, e de maneira especialmente famosa por Thomas Mann em seu Doutor Fausto, de modo que meu mal-amanhado texto não lhes fará perder mais tempo sobre o assunto.

Meu assunto será outro: o intérprete, talvez a maior descoberta que fiz na tremenda vasculhada que dei na discografia beethoveniana à cata de gravações que pudessem honrar o jubileu que comemoraremos em alguns dias mais.

Bruce Hungerford (1922-1977) era, também, um homem afeito a descobertas. Apesar de ter brilhado cedo ao teclado, suas raízes no improvável lugarejo de Korumburra, e a formação musical na remota Austrália fizeram-no ser visto com pouco caso por muita gente. Assim, e percebendo que talvez seu futuro não passasse pelos teclados, dedicou-se à paleontologia e à egiptologia, que lhe fizeram viajar muito mais do que qualquer coisa que tenha feito com um piano. Seu pedigree musical, no entanto, era dos melhores: estudou com Carl Friedberg, aluno de Clara Schumann e professor, para minha surpresa, da espetacular Nina Simone. Também estudou, inda que brevemente, com Ignaz Friedman, o que o colocou em linha pedagógica direta (através de Theodor Leschetizky e Carl Czerny) com Beethoven. Os rumos de sua carreira mudaram quando o produtor Maynard Solomon, também autor duma influente biografia de Ludwig convidou-o para gravar a obra completa do renano para o selo Vanguard. Hungerford aceitou e mudou-se para os Estados Unidos. Gravou rapidamente vinte e duas das trinta e duas sonatas, e só não completou a série pois, enquanto voltava de uma viagem com a família, um desastre automobilístico os matou.

O desaparecimento precoce e inesperado, somada a seu caráter introvertido e pouco afeito a vaidades, manteve Hungerford praticamente desconhecido a públicos maiores. A julgar pelo torso de integral que nos deixou, imagino que, se tivesse completado o projeto com a Vanguard, sua reputação seria hoje muito diferente. Admito que nada sabia dele até que seu nome me surgiu enquanto buscava um intérprete que pudesse encerrar com a devida autoridade a monumental série das trinta e duas sonatas para piano. Quando eu o ouvi, a impressão foi imediata e profunda. Seu estilo é, se o tivéssemos que descrever numa só palavra, austero, mas a atenção ao detalhe e particularmente, a precisão rítmica tornam suas leituras de Beethoven espetaculares. As duas últimas sonatas, em especial (que o compositor, nunca muito empático com seus intérpretes, descreveu como “não muito difíceis”) são repletas de desafios técnicos e interpretativos que Hungerford tira de letra com sensacional musicalidade. Quem espera um Beethoven colorido e romântico talvez se decepcione com as aparentes frieza e secura dessas versões. Asseguro-lhes, entretanto, que quem ouvir Hungerford não se decepcionará. Arrisco, mesmo, afirmar-lhes que ele é o melhor intérprete de Beethoven que quase ninguém conhece – e digo “quase” porque vocês, leitores-ouvintes, agora terão o privilégio de conhecê-lo.


Ludwig van BEETHOVEN
(1770-1827)

Sonata para piano em Fá sustenido maior, Op. 78
Composta em 1809
Publicada em 1810
Dedicada a Therese von Brunsvik

01 – Adagio cantabile
02 – Allegro vivace

Sonata para piano em Mi maior, Op. 109
Composta em 1820
Publicada em 1821
Dedicada a Maximiliane Brentano

3 – Vivace ma non troppo – Adagio espressivo
4 – Prestissimo
5 – Andante molto cantabile ed espressivo – Variazione I: Molto espressivo – Variazione II: Leggermente – Variazione III: Allegro vivace – Variazione IV: Un poco meno andante – Variazione V: Allegro ma non troppo – Variazione VI: Tempo I del tema

Sonata para piano em Lá bemol maior, Op. 110
Composta em 1821
Publicada em 1822

6 – Moderato cantabile – Molto espressivo
7 – Allegro molto
8 – Adagio, ma non troppo – Arioso
9 – Fuga: Allegro ma non troppo – L’istesso tempo di arioso – L’istesso tempo della Fuga poi a poi di nuovo vivente

Sonata para piano em Dó menor, Op. 111
Composta em 1821-22
Publicada em 1823
Dedicada ao arquiduque Rudolph da Áustria (edição vienense) e a Antonie Brentano (edição londrina)

10 – Maestoso – Allegro con brio ed appassionato
11 – Arietta – Adagio molto semplice e cantabile

Bruce Hungerford, piano

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Cheers, mate

BTHVN250, por René Denon

Vassily