Liszt: Sonata em si menor e “Études d’exécution transcendante d’après Paganini” / Ravel: “Concerto em Sol”, “Concerto para mão Esquerda” e obras para piano solo (Cécile Ousset)

Liszt: Sonata em si menor e “Études d’exécution transcendante d’après Paganini” / Ravel: “Concerto em Sol”, “Concerto para mão Esquerda” e obras para piano solo (Cécile Ousset)
Cécile Ousset, pianista francesa, nascida em Tarbes, França, 1936.

Cécile Ousset é destas pianistas com imensa verve musical e domínio técnico. De forma generosa e incansável, ao longo da carreira, entregou-se ao permanente lapidar da interpretação – às novas percepções e possibilidades… E o fez com cuidados de ourivesaria, tanto no repertório solo, quanto nas massas sonoras e grandiloquência dos concertos com orquestra…

Neste sentido, as bases da “escola russa”, realizada com o pianista Marcel Ciampi, em Paris, final dos anos 40, lhe proporcionaram vigor e aguçado controle técnico. De resto, personalidade artística e sensibilidade se agregaram à paixão e originalidade…

No “concurso Queen Elizabeth”, 1956, vencido por Vladimir Ashkenazy, a pianista francesa, então com 20 anos, obteve 4° lugar, quem sabe, posição desconfortável para quem almejasse carreira internacional. Mas, se pensarmos que Lazar Berman e Tamas Vasary ficaram em 5ª e 6ª colocação, podemos ter ideia do nível da competição e dimensão da jovem musicista…

Prodígio musical, Cécile Ousset ingressou no “Conservatório de Paris” aos 10 anos e estudou com Marcel Ciampi, que havia orientado Hephzibah e Yaltah Menuhin… A pianista recordou a técnica de Ciampi: “Meu treinamento foi baseado na ‘escola russa’, não na francesa. O método era modelado em Anton Rubinstein, com ênfase em dedos fortes e ombros livres, para garantir precisão e ‘peso de braço’… E quando Ciampi percebeu meus dedos curvados, no clássico estilo francês, ficou horrorizado”… E mudou tudo…

Arthur Rubinstein, pianista polonês (1887-1982)

A estreia profissional de Cécile ocorreu na “salle Gaveau”, Paris, organizada por Arthur Rubinstein, ninguém menos, impressionado com a musicalidade e potencial da pianista. Membro do júri, no concurso “Marguerite Long – Jacques Thibaud”, de 1953, o polonês ficou descontente com o 4° lugar obtido por Cécile Ousset, então, aos 17 anos… E a opinião de Rubinstein, neste caso, foi premiação maior que qualquer classificação…

Finalmente, Cécile Ousset obteria 2° lugar no concurso “Busoni”, 1959, sem vencedor em 1° lugar… E ainda perseguida pelo número quatro, outra 4ª colocação, no concurso “van Cliburn”, 1962, mantendo-se sempre entre primeiros colocados… Tais competições eram e continuam sendo vitrines a projetar solistas e dar início à carreiras internacionais…

A projeção artística de Ousset foi gradual. A partir dos anos 80, após substituir Martha Argerich no “Festival de Edimburgo”, Escócia, os convites aumentaram consideravelmente… E suas gravações ofereciam conjunto soberbo em performances, onde destacavam-se autores românticos e repertório francês… Registros afirmativos de amplitude técnica e sensibilidade…

Cécile Ousset, notável pianista, especialmente, no repertório romântico e francês.

Entre público e crítica, em geral, há diversidade de opiniões e muita controvérsia… Mas, Cécile Ousset convida e conduz o ouvinte, seduzindo-o através do fraseado, ritmo e sonoridades – com toque intenso, busca densidade e encantamento. Seus registros de “Alborada del Gracioso” ou “Une barque sur l’océan”, de Ravel, são preciosos… E sua discografia oferece fidelidade estilística, beleza e prazer. “The Musical Times” referiu-se como “pianista estimulante, pelas sonoridades robustas e virtuosismo incontestável”, mas que ia além, “ao buscar cor e clareza”…

Se pensarmos que emotividade e sensorialidade controlam o toque… E que através de leitura e técnica, passo a passo, percebem-se efeitos sonoros e expressivos, que resultarão na concepção poética e musical… Então, imaginem-se os desafios a enfrentar em grandes obras musicais…

“Entre os mais notáveis pianistas da atualidade” – “Financial Times”.

Assim, o pianismo de Ousset é um mundo sonoro a descobrir e encantar-se. E não por acaso, trabalhou com regentes do porte de Simon Rattle – a quem profetizou “brilhante carreira”, em 1985; além de Ghünther Herbig, Rudolf Barshai e Neville Marriner… E com Kurt Masur e a “Gewandhausorchester”, de Leipzig, obteve “Gran prix du Disque” pela “Académie Charles Cros”, de Paris, com o “2° concerto para Piano”, de Brahms…

Clareza e originalidade emergem de obras amplamente conhecidas, com renovado interesse, tais como “La campanella”, de Liszt; ou “Impromptu” op. 31 n°2, de Fauré. Mas, sobretudo, em obras de fôlego e “alto romantismo”, como “Sonata em si menor”, de Liszt; “2ª Ballada” e sonata “Marcha fúnebre”, de Chopin; ou nas desafiantes “Variações sobre tema de Paganini”, de Brahms, revela-se a intérprete soberana…

Capítulo especial ocupa a música francesa, em gravações completas de Debussy e Ravel… Na imensa riqueza harmônica e variedade de cores e nuances de “Ce qu’a vu le vent d’ouest”, “Poisson d’or” e “Feux d’Artifice”, de Debussy; ou em “Jeux d’eau”, “Le tombeau de Couperin” e “Valses nobles et sentimentales”, de Ravel, entre outras…

Também realizou notáveis performances em concertos para piano, marcadas pelo diálogo intenso com os conjuntos orquestrais e sonoridades exuberantes no piano, expertises da “escola russa”, em Tchaikowsky, Grieg, Rachmaninov, Poulenc e Prokofiev; além de peculiar leitura das “33 Variações sobre valsa de Diabelli”, de Beethoven… 

Yaltah Menuhin, pianista e poetisa, irmã caçula de Yehudi e Hephzibah Menuhin (1962).

Vocacionada para docência, a partir de 1984, Cécile propôs “Master Classes” anuais, na vila medieval de Puycelsi, França. E ministrou cursos nos USA, Canadá, Europa, Austrália e extremo Oriente, além de integrar júri em grandes competições, como “van Cliburn”, “Rubinstein”, “Leeds” e “Queen Elisabeth”…

Pelo dinamismo e contribuição artística, tornou-se patrona honorária do “Yaltah Menuhin Memorial Fund” – memorial à poetisa e pianista Yaltah Menuhin, sediado na Holanda, em apoio à jovens músicos… Problemas de saúde levaram Cécile Ousset encerrar apresentações públicas, em 2006. Atualmente, conta 87 anos, com relevantes discografia e trajetória musical…

Download no PQP Bach

Cécile Ousset deixou belíssimo legado e ganhou abrangente edição da “Warner Classics” – Box com 16 CDs, excetuando-se o “2° concerto para Piano”, de Brahms, com Kurt Masur, que não integra a coleção…

Capa da “Warner Classics”, Box 16 CDs, com acervo completo de Cécile Ousset.

Para download no PQP Bach, seguem três CDs:

  • CD 07, com obras de Franz Liszt – “Sonata em si menor” e “6 Études d’exécucion transcendante d’après Paganini”, piano solo

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE

  • CD 13, com obras de Maurice Ravel – “Valses nobles et sentimentales”, “Jeux d’eau”, “Menuet sur le nom de Haydn”, “Sonatine”, “Pavane pour une infante Défunte”, “Mirroirs”, piano solo…
  • CD 16, com obras de Maurice Ravel – “Concerto em Sol” e “Concerto para mão Esquerda”, para piano e orquestra, com “Birminghan Symphony Orchestra”, direção de Simon Rattle; e suíte “Le tombeau de Couperin”, piano solo…

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Sugerimos também:

1. Áudio youtube “EMI classics” – Claude Debussy, “Images, Book 2” – I. “Cloches à travers les feuilles”; II. “Et la lune descend sur le temple qui fut”; III. “Poissons d’or”, com Cécile Ousset…

2. Áudio youtube “EMI classics” – Francis Poulenc, “Concerto para Piano”, Cécile Ousset com a “Bournemouth Symphony Orchestra”, direção Rudolf Barshai… 

Movimentos: I. “Allegretto” – II. “Andante con moto” – III. “Rondeau à la Française”

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“Nesta edição, reiteramos nossa gratidão e saudamos as mulheres!”

“Dia Internacional da Mulher, 08/03/2023”

Alex DeLarge

J. S. Bach (1685-1750): Concertos para 2, 3 e 4 pianos (Eschenbach, Oppitz, Frantz, Schmidt)

J. S. Bach (1685-1750): Concertos para 2, 3 e 4 pianos (Eschenbach, Oppitz, Frantz, Schmidt)

338 ANOS DE PAPAI BACH!!

Como perguntou o querido René Denon aos demais pqpianos hoje: Deus faz aniversário? Uma boa questão, e a resposta varia de acordo com a religião de cada um. Para nós, que somos devotos de Johann Sebastian Bach, a resposta é sim, e é justamente hoje, 21 de março, que comemoramos a chegada do filho mais notório de Eisenach neste planetinha azul…

Dando prosseguimento às comemorações aqui no blog, um disquinho algo curioso: os concertos para 2, 3 e 4 pianos de Bach tocado por três grandes nomes da música alemã – Christoph Eschenbach (que também rege a Filarmônica de Hamburgo), Justus Frantz e o jovem talento Gerhard Oppitz – e um, digamos, pianista bissexto. Mas não um qualquer! Trata-se de Helmut Schmidt, que, na época dessas gravações (fevereiro de 1985), era “apenas” membro do parlamento e ex-chanceler da Alemanha, sucedendo ninguém menos do que Willy Brandt.

E a verdade é que Schmidt não faz feio (reforçando uma opinião já esboçada quando de sua gravação dos concertos de Mozart, ao lado de parte da turma desse disco). São gravações simpáticas, leves, que jogam luz sobre um repertório que não está entre os mais tocados do velho mestre. Um disco despretensioso, que não decepciona.

O encarte traz um trecho de um discurso proferido por Schmidt em Hamburgo por ocasião do 300º aniversário de Bach:

“Há dez anos, durante uma visita à Feira de Leipzig, nós escutamos uma cantata de Bach executada na Thomaskirche. A igreja estava lotada até o último assento. Nós ficamos calmamente observando aquele lugar. Nosso olhar caiu então sobre uma longa rosa vermelha caída sobre o chão. Um exame mais detido mostrou que ela repousava sobre uma placa memorial. Sua simplicidade, sem adornos, trazia o nome e as datas de Johann Sebastian Bach. Eu fui tomado por uma indescritível sensação. Ali em sua Thomaskirche, ouvindo sua música, eu tomei consciência de tudo que, ao longo de toda minha vida, me fez ser grato pela música de Bach.

A música é um fenômeno cultural internacional, trans-nacional. Viver sem música – esse poderia ser o destino de uma geração que afunda em meio a um mar de ruídos. A cultura musical é algo que deve ser sempre preservado e recriado. Devemos, por isso, assegurar que se cante e que se toque música em nossos lares e escolas, para que as novas gerações aprendam a encontrar a alegria que a música oferece a elas.”

Alles Gute zum Geburtstag, Herr Bach!

Karlheinz

Helmut Schmidt e sua esposa Loki visitando Justus Frantz

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Johann Sebastian Bach (1685-1750)

Concerto para 4 pianos e cordas em lá menor, BWV 1065
1. I – (sem indicação de tempo)
2. II – Largo
3. III – Allegro

Solistas: Christoph Eschenbach, Justus Frantz, Gerhard Oppitz, Helmut Schmidt

Concerto para 2 pianos e cordas em dó maior, BWV 1061
4. I – (sem indicação de tempo)
5. II – Adagio ovvero Largo
6. III – Fuga

Solistas: Christoph Eschenbach, Justus Frantz

Concerto para 2 pianos e cordas em dó menor, BWV 1060
7. I – Allegro
8. II – Adagio
9. III – Allegro

Solistas: Justus Frantz, Christoph Eschenbach

Concerto para 3 pianos e cordas em ré menor, BWV 1063
10. I – (sem indicação de tempo)
11. II – Alla Siciliana
12. III – Allegro

Solistas: Christoph Eschenbach, Gerhard Oppitz, Justus Frantz

Orquestra Filarmônica de Hamburgo
Christoph Eschenbach, regência

J. S. Bach (1685-1750): Suítes Francesas completas e mais (Hewitt)

J. S. Bach (1685-1750): Suítes Francesas completas e mais (Hewitt)

IM-PER-DÍ-VEL !!!

338 ANOS DE PAPAI BACH !!!

Este é um disco também muito bom — é outro dos que me foram enviados por FDP Bach, mas que confusão fez a grande, enorme, imensa e admirável Hyperion? Que mistureca foi essa de enfiar Pequenos Prelúdios, Sonatas e outras coisas antes, entre e depois das verdadeiras estrelas dos CDs, as Suítes Francesas? Não creio que alguém possa me explicar o motivo desta bisonha opção. Os CDs? Bá, a interpretação é excelente. Baixe logo. Tá esperando o quê?

Em comentário à potagem anterior desta série, Barto Lima resumiu tudo e disse mais:

Muito bem PQP! Essa Pianista é realmente estrondosa, estupenda! Técnica perfeita e “muitíssimo” musical. Ela consegue realçar motivos, partes do fraseado ou notinhas que a maioria deixa “prá lá”, dando um equilíbrio musical maravilhoso por onde ela mexe. É precisão rítmica, sentido dos andamentos, dinâmica tocante, deixa a gente todo “embasbacado”, mas feliz!
E quanto a essa questão de pronúncia… Tudo bem, já que ela é canadense! Mas na Alemanha qualquer um dirá “Ânguela Hê-Vit” e nem por isto ela deixa de “ficar” também por lá. Certas “preciosidades” com o inglês… será que valem a pena? Em outras línguas, que não a nativa, se pronuncia, por aqui e por toda parte, quase tudo “errado” (sobretudo os americanos!). E aí?

J. S. Bach (1685-1750): Suítes Francesas completas e mais (Hewitt)

Disc: 1
1. Sonata In D Minor, BWV964: Adagio
2. Sonata In D Minor, BWV964: Fuga: Allegro
3. Sonata In D Minor, BWV964: Andante
4. Sonata In D Minor, BWV964: Allegro

5. French Suite No. 1 In D Minor, BWV812: Allemande
6. French Suite No 1 In D Minor, BWV812: Courante
7. French Suite No. 1 In D Minor, BWV812: Sarabande
8. French Suite No. 1 In D Minor, BWV812: Menuet I And II
9. French Suite No. 1 In D Minor, BWV812: Gigue

10. French Suite No. 2 In C Minor, BWV813: Allemande
11. French Suite No. 2 In C Minor, BWV813: Courante
12. French Suite No. 2 In C Minor, BWV813: Sarabande
13. French Suite No. 2 In C Minor, BWV813: Air
14. French Suite No. 2 In C Minor, BWV813: Menuet I And II
15. French Suite No. 2 In C Minor, BWV813: Gigue

16. French Suite No. 3 In B Minor, BWV814: Allemande
17. French Suite No. 3 In B Minor, BWV814: Courante
18. French Suite No. 3 In B Minor, BWV814: Sarabande
19. French Suite No. 3 In B Minor, BWV814: Anglaise
20. French Suite No. 3 In B Minor, BWV814: Menuet And Trio
21. French Suite No. 3 In B Minor, BWV814: Gigue

22. Six Little Preludes: Prelude In C Major, BWV 924
23. Six Little Preludes: Prelude In G Minor, BWV 930
24. Six Little Preludes: Prelude In D Major, BWV 925
25. Six Little Preludes: Prelude In D Minor, BWV 926
26. Six Little Preludes: Prelude In F Major, BWV 927
27. Six Little Preludes: Prelude In F Major, BWV 928

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Disc: 2
1. Six Little Preludes: Prelude In C Major, BWV 933
2. Six Little Preludes: Prelude In C Minor, BWV 934
3. Six Little Preludes: Prelude In D Minor, BWV 935
4. Six Little Preludes: Prelude In D Major, BWV 936
5. Six Little Preludes: Prelude In E Major, BWV 937
6. Six Little Preludes: Prelude In E Minor, BWV 938

7. Six Little Preludes: Prelude In C Major, BWV 939
8. Six Little Preludes: Prelude In D Minor, BWV 940
9. Six Little Preludes: Prelude In E Minor, BWV 941
10. Six Little Preludes: Prelude In A Minor, BWV 942
11. Six Little Preludes: Prelude In C Major, BWV 943
12. Six Little Preludes: Prelude In C Minor, BWV 999

13. French Suite No. 4 In E Flat Major, BWV815: Praeludium
14. French Suite No. 4 In E Flat Major, BWV815: Allemande
15. French Suite No. 4 In E Flat Majoe, BWV815: Courante
16. French Suite No. 4 In E Flat Major, BWV815: Sarabande
17. French Suite No. 4 In E Flat Major, BWV815: Gavotte I
18. French Suite No. 4 In E Flat Major, BWV815: Gavotte II
19. French Suite No. 4 In E Flat Major, BWV815: Menuet
20. French Suite No. 4 In E Flat Major, BWV815: Air
21. French Suite No. 4 In E Flat Major, BWV815: Gigue

22. French Suite No. 5 In G Major, BWV816: Allemande
23. French Suite No. 5 In G Major, BWV816: Courante
24. French Suite No. 5 In G Major, BWV816: Sarabande
25. French Suite No. 5 In G Major, BWV816: Gavotte
26. French Suite No. 5 In G Major, BWV816: Bourree
27. French Suite No. 5 In G Major, BWV816: Loure
28. French Suite No. 5 In G Major, BWV816: Gigue

29. French Suite No. 6 In E Major, BWV817: Allemande
30. French Suite No. 6 In E Major, BWV817: Courante
31. French Suite No. 6 In E Major, BWV817: Sarabande
32. French Suite No. 6 In E Major, BWV817: Gavotte
33. French Suite No. 6 In E Major, BWV817: Polonaise
34. French Suite No. 6 In E Major, BWV817: Bourree
35. French Suite No. 6 In E Major, BWV817: Menuet
36. French Suite No. 6 In E Major, BWV817: Gigue

37. Prelude And Fugue In A Minor, BWV894: Prelude
38. Prelude And Fugue In A Minor, BWV894: Fugue

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Angela Hewitt, piano

Angie, sempre à vontade em nosso blog.

PQP

J. S. Bach (1685-1750): A Arte da Fuga, BWV 1080 (Emerson String Quartet)

J. S. Bach (1685-1750): A Arte da Fuga, BWV 1080 (Emerson String Quartet)

ABSOLUTAMENTE IM-PER-DÍ-VEL !!!

338 ANOS DE PAPAI BACH !!!

Faz uns três ou quatro meses que o blog recebeu este presente. Como sou muito sacana, demorei a entregá-lo para vocês… Não, não é bem assim: na verdade achei tão extraordinário o CD, uma realização artística tão impressionante do Emerson String Quartet, que o reservei para uma data especial, um aniversário de Johann Sebastian ou… ou… a ocasião da centésima postagem de Bach em nosso blog. Sim, se você for na coluna da direita onde está a lista de compositores postados, você deverá encontrar um “Bach, J.S. (100)”. Cem CDs de papai num blog que se aproxima dos 1000 CDs!

(Esta postagem é antiga. Hoje temos 778 posts de J. S. Bach, 7479 publicações e muito mais CDs do que isto).

Ouso dizer que o P.Q.P. Bach, fundado por mim numa feia manhã de sábado para substituir os e-mails que enviava a amigos que precisavam de uma ou outra obra — pois sempre achei obsceno alguém possuir uma vasta biblioteca ou cedeteca se não fosse para emprestar, distribuir, divulgar ou, como dizemos em nosso “editorial”, polinizar –, hoje tem um acervo respeitável e variado. Orgulho-me muito deste blog que se tornou coletivo após duas semanas de existência, com o ingresso do mano F.D.P., e que depois recebeu outros colaboradores, um melhor que o outro.

Mas voltemos a esta versão da Arte da Fuga: imaginem que, dos 28 ouvintes que escreveram a respeito deste CD para a Amazon, 25 deram-lhe 5 estrelas — a pontuação máxima — e 3 deram 4.

Vou copiar aqui os dois primeiros parágrafos do capítulo sobre A Arte da Fuga do livro 48 variações sobre Bach de Franz Rueb:

Muitos músicos confessam que a Arte da Fuga é uma daquelas obras da arte universal, diante da qual só é possível calar. A obra seria o somatório da profissão de fé musical de Bach, e seu conteúdo metafísico a colocaria no limiar de outro mundo. Ela seria “a abstração na música”, “a forma pura”, “um sopro de ar claro e gelado”, “uma caixa fria” repleta de invenções melódicas cheias de vida. (…) Wolfgang Rihm escreveu: O único espaço sonoro para a realização dessa música continua sendo aquele reservado ao pensamento, situado debaixo da caixa craniana. Esse espaço, porém, é o mais amplo de todos, desde que se possa conceber em pensamento tal realidade sonora.”

Adorno chamou a Arte da Fuga de economia de motivos. Para ele, o tema é esgotado até me seus mínimos componentes e disso resulta algo perfeito. A obra seria a arte da dissecação. O resultado é uma forma de quase insuperável precisão: a fuga. O cruzamento magistral da grande e da pequena ordem, das grandes e das pequenas formas. Com a Arte da Fuga, Bach teria se voltado para o passado e para o futuro. Nela, porém, o mais importante não seria a técnica, nem as leis do ofício da música, mas expressão musical.

Bom, o que o Emerson consegue aqui… Nem vou começar a enfileirar elogios. Só vou repetir:

IM-PER-DÍ-VEL !!!

Bach – A Arte da Fuga

1. The Art of Fugue, BWV 1080 – Contrapunctus I 3:04
2. The Art of Fugue, BWV 1080 – Contrapunctus 2 2:44
3. The Art of Fugue, BWV 1080 – Contrapunctus 3 2:31
4. The Art of Fugue, BWV 1080 – Contrapunctus 4 3:30
5. The Art of Fugue, BWV 1080 – Contrapunctus 5 2:32
6. The Art of Fugue, BWV 1080 – Contrapunctus 6 4:10
7. The Art of Fugue, BWV 1080 – Contrapunctus 7 3:07
8. The Art of Fugue, BWV 1080 – Contrapunctus 8 Eugene Drucker 4:54
9. The Art of Fugue, BWV 1080 – Contrapunctus 9 2:13
10. The Art of Fugue, BWV 1080 – Contrapunctus 10 3:02
11. The Art of Fugue, BWV 1080 – Contrapunctus 11 4:43
12. The Art of Fugue, BWV 1080 – Contrapunctus 14a: Canon per Augmentationem in contrario motu Eugene Drucker 5:18
13. The Art of Fugue, BWV 1080 – Contrapunctus 12a 1:49 $0.45
14. The Art of Fugue, BWV 1080 – Contrapunctus 12b 1:53 $0.45
15. The Art of Fugue, BWV 1080 – Canon alla Ottava Lawrence Dutton 4:02
16. The Art of Fugue, BWV 1080 – Canona alla Decima, in Contrapunto alla Terza Eugene Drucker 3:42
17. The Art of Fugue, BWV 1080 – Canon alla Duodecima in Contrapunto alla Quinta Philip Setzer 4:12
18. The Art of Fugue, BWV 1080 – Contrapunctus 13a Philip Setzer 2:06
19. The Art of Fugue, BWV 1080 – Contrapunctus 13b Eugene Drucker 2:09
20. The Art of Fugue, BWV 1080 – Contrapunctus 14: Canon per Augmentationem in contrario motu Philip Setzer 6:53
21. The Art of Fugue, BWV 1080 – Contrapunctus 14(18): Fuga a 3 Soggetti 8:06
22. The Art of Fugue, BWV 1080 – Chorale: Wenn wir in höchsten Nöten sein 3:16

Emerson String Quartet
Eugene Drucker, violin
Philip Setzer, violin
Lawrence Dutton, viola
David Finckel, cello

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PQP

.: interlúdio :. Jaco Pastorius: Truth, Liberty & Soul

.: interlúdio :. Jaco Pastorius: Truth, Liberty & Soul

IM-PER-DÍ-VEL !!!

Só para ouvir Liberty City e lembrar do melhor programa do rádio brasileiro — o extinto A Hora do Jazz, de Paulo Moreira — já valeria a pena baixar esta obra-prima de Jaco Pastorius (John Francis Anthony Pastorius III, nascido em 1 de dezembro de 1951 e falecido em 21 de setembro de 1987). Este Truth, Liberty & Soul foi gravado ao vivo em 1982 em Nova Iorque. Houve muitos deuses da guitarra, mas nunca houve um deus baixista como Jaco Pastorius. Genial e imaginativo, ele comportava-se loucamente, era drogado e convencido como as estrelas do jazz do passado. Também era dono de uma sofisticação harmônica inalcançável. Segundo o próprio, suas principais influências musicais foram “James Brown, Beatles, Miles Davis, e Stravinsky, nessa ordem”. Além desses, Jaco cita outros nomes como Jerry Jemmott, James Jamerson, Paul Chambers, Harvey Brooks, Tony Bennett, Sinatra, Duke Ellington, Charlie Parker, e com especial atenção o nome de Lucas Cottle, um desconhecido baixista neozelandês que tem algumas gravações a seu lado. Uma das maiores homenagens prestadas a ele, foi registrada por Miles Davis, que gravou a música Mr. Pastorius, composição do baixista Marcus Miller, lançada no álbum Amandla. Se você nunca ouviu o Fender Jazz Bass dele — sim, sei que o importante é ter saúde –, está perdendo boa parte do que a vida e a alegria têm a oferecer. Não vou falar sobre a morte estúpida de Pastorius aos 35 anos, ainda mais após ouvir esta obra-prima.

Jaco Pastorius: Truth, Liberty & Soul

Disc One

1. Invitation (13:04)
2. Soul Intro/The Chicken (9:10)
3. Donna Lee (13:18)
4. Three Views to a Secret (6:38)
5. Liberty City (10:10)
6. Sophisticated Lady (7:43)
7. Bluesette (5:31)

Disc Two

1. I Shot the Sheriff (6:55)
2. Okonkolé y Trompa (15:07)
3. Reza/Giant Steps (Medley) (10:19)
4. Mr. Fonebone (10:37)
5. Bass and Drum Improvisation (14:05)
6. Twins (2:53)
7. Fannie Mae (5:55)

WORD OF MOUTH BIG BAND
Jaco Pastorius – bass, vocals
Bob Mintzer – tenor and soprano saxophones, bass clarinet
Randy Brecker – trumpet
Othello Molineaux – steel drums
Don Alias – percussion
Peter Erskine – drums

SAXOPHONES
Bob Stein – alto saxophone
Lou Marini – tenor saxophone
Frank Wess – tenor saxophone
Howard Johnson – baritone saxophone
Randy Emerick – baritone saxophone

TRUMPETS
Alan Rubin
Lou Soloff
Jon Faddis
Ron Tooley
Kenny Faulk

TROMBONES
David Taylor
Jim Pugh
Wayne Andre

FRENCH HORNS
John Clark
Peter Gordon

TUBA
David Bargeron

Special Guest:
Toots Thielemans
(harmonica on “Three Views of a Secret,” “Liberty City,” “Sophisticated Lady,””Bluesette,” “I Shot the Sheriff,” “Mr. Fonebone” and “Fannie Mae”)

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Jaco Pastorius (1951-1987)
Jaco Pastorius (1951-1987)

PQP

Johann Friedrich Fasch (1688-1758): Concertos para vários instrumentos

Johann Friedrich Fasch (1688-1758): Concertos para vários instrumentos

Um CD que vale mais pelos intérpretes do que pela música de Fasch. Gostar mesmo, só gostei do primeiro movimento do Concerto para 2 oboés, 2 violas e dois fagotes e baixo contínuo, além do inteiramente bom Concerto para trompete, 2 oboés e cordas que fecha o CD. Il Gardellino é um conjunto instrumental holandês de música barroca, fundado em 1988 por iniciativa do oboísta holandês Marcel Ponseele e do flautista Jan De Winne. O nome foi derivado de uma peça de Vivaldi para flauta transversal, oboé, violino, fagote e continuo Il Gardellino. O conjunto toca em instrumentos de época. Como se diz agora, são historicamente informados… Obras de Johann Sebastian Bach são seu foco, mas também se interessam por seus contemporâneos como Johann Friedrich Fasch, Carl Heinrich Graun, Handel, Johann Gottlieb Janitsch, Telemann e Vivaldi.

Johann Friedrich Fasch (1688-1758): Concertos para vários instrumentos

01. Concerto in D for 3 Trumpets, timpani, 2 oboes, violin, strings, B.C. – I. Allegro
02. Concerto in D for 3 Trumpets, timpani, 2 oboes, violin, strings, B.C. – II. Andante
03. Concerto in D for 3 Trumpets, timpani, 2 oboes, violin, strings, B.C. – III Allegro

04. Concerto in B minor for flute, oboe, strings, B.C. – I. Allegro
05. Concerto in B minor for flute, oboe, strings, B.C. – II. Largo
06. Concerto in B minor for flute, oboe, strings, B.C. – III. Allegro

07. Concerto in G for 2 oboes, 2 violas, 2 bassons, B.C. – I. Un poco allegro
08. Concerto in G for 2 oboes, 2 violas, 2 bassons, B.C. – II. Air
09. Concerto in G for 2 oboes, 2 violas, 2 bassons, B.C. – III. Allegro
10. Concerto in G for 2 oboes, 2 violas, 2 bassons, B.C. – IV. Menuet

11. Concerto in D for 2 flutes, strings, B.C. – I. Allegro
12. Concerto in D for 2 flutes, strings, B.C. – II. Andante
13. Concerto in D for 2 flutes, strings, B.C. – III. Allegro

14. Concerto in C minor for basson, 2 oboes, strings, B.C. – I. Allegro
15. Concerto in C minor for basson, 2 oboes, strings, B.C. – II. Largo
16. Concerto in C minor for basson, 2 oboes, strings, B.C. – III. Allegro

17. Concerto in D for trumpet, 2 oboes, strings, B.C. – I. Allegro
18. Concerto in D for trumpet, 2 oboes, strings, B.C. – II. Largo
19. Concerto in D for trumpet, 2 oboes, strings, B.C. – III. Allegro (tempo di menuetto)

Il Gardellino

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O núcleo central do Il Gardellino
O núcleo central do Il Gardellino

PQP

Johannes Brahms (1833-1897): Concerto Duplo e Quinteto para Clarinete (Capuçons)

Johannes Brahms (1833-1897): Concerto Duplo e Quinteto para Clarinete (Capuçons)

IM-PER-DÍ-VEL !!!

Talvez o Quinteto para Clarinete seja a obra de Brahms que mais amo. Brahms já tinha parado de compor quando ouviu Richard Mühlfeld, um clarinetista virtuoso, tocar. Gostou. Curioso notar que Mozart também se interessou pelo clarinete ao ouvir o famoso Anton Stadler. Mozart dedicou a Stadler várias obras, incluindo o Quinteto para Clarinete e Cordas e o Concerto para Clarinete, que estão entre suas maiores realizações. A história de Brahms com Richard Mühlfeld é a mesma. Ele viria a dedicar ao instrumentista seu Quinteto para Clarineta e Cordas, Op. 115, e outras obras para clarinete, como as duas Sonatas. Além disso, há outra relação entre os dois compositores: Brahms usou em sua peça a mesma estrutura do Quinteto de Mozart. O Quinteto de Brahms é geralmente considerado outonal, até mesmo nostálgico, mas há aspectos mais sombrios e mais vigorosos.

O belíssimo Concerto Duplo para Violino e Violoncelo de Brahms tem origem curiosa. Será verdade que “em briga de marido e mulher, ninguém mete a colher”? Pois este polêmico ditado não foi seguido por Brahms. Em 1884, o célebre violinista Joseph Joachim e sua mulher se separaram depois que ele se convenceu de que ela mantinha uma relação com o editor de Brahms, Fritz Simrock. Brahms, certo de que as suposições do violinista eram infundadas, escreveu uma carta de apoio à Amalie, a esposa, que mais adiante seria utilizada como prova no processo de divórcio que Joseph moveu contra ela. Este fato motivou um resfriamento das relações de amizade entre Joachim e Brahms, que depois foram restabelecidas quando Brahms escreveu o Concerto para Violino e Violoncelo e o enviou a Joachim para fazer as pazes. Acontece. Mas por que o violoncelo? Ora, a combinação inusitada — este é o primeiro concerto escrito para esta dupla de instrumentos — surgiu porque o violoncelista Robert Hausmann, amigo comum de Brahms e Joachim, pedira um concerto ao compositor. Então, o compositor encontrou uma forma de satisfazer ao violoncelista , ao mesmo tempo que reconquistava a amizade do violinista. Clara Schumann escreveu em seu diário: “O Concerto é uma obra de reconciliação. Joachim e Brahms falaram um com o outro novamente.”

Joseph Joachim (1831-1907) e Amalie Weiss (1839-1899)
Fritz Simrock (1837-1901)

Após completar sua Sinfonia Nº 4 em 1885 e embora tenha vivido mais doze anos depois de completá-la, Brahms produziu apenas mais uma obra orquestral, e esta não foi uma sinfonia, mas este concerto. E não era um concerto solo comum, mas sim uma composição que uniu pela primeira vez a forma de violino e violoncelo. Mozart fez os não tão díspares solistas de violino e viola quase se enfrentarem em sua Sinfonia Concertante. Beethoven fez o mesmo em seu Concerto Triplo Concerto, juntando piano, violino e violoncelo. Mas aqui nós temos realmente um casamento. O violoncelo introduz a maioria dos temas, mas há muitos trechos onde um acompanha o outro. Há menos exploração de contrastes  violino-violoncelo de Brahms, que se baseia menos na exploração das individualidades contrastantes do casal solista, mas em sua capacidade de viverem felizes juntos. O Concerto possui uma enorme riqueza de ideias que são trabalhadas com a extrema habilidade.

Robert Hausmann (1852-1909)

Brahms fez o violoncelo e o violino se fundirem em vez de projetar identidades separadas e talvez conflitantes. Há muitos uníssonos e trechos onde um instrumento acompanha o outro.  Exigências artísticas como essas são feitas ao longo do Concerto Duplo. Durante o período de testes do Concerto, tanto Joachim quanto Hausmann aconselharam o compositor sobre algumas questões técnicas de seus respectivos instrumentos.

Johannes Brahms (1833-1897): Concerto Duplo e Quinteto para Clarinete (Capuçons)

Double Concerto For Violin, Cello And Orchestra In A Minor (En La Mineur . A-Moll) Op.102
1 I Allegro 18:05
2 II Andante 7:48
3 III Vivace Non Troppo 8:32

Clarinet Quintet In B Minor (En Si Mineur . H-Moll) Op.115
4 I Allegro 12:41
5 II Adagio 11:05
6 III Andantino 4:37
7 IV Finale, Con Moto 8:47

Cello – Gautier Capuçon
Clarinet – Paul Meyer (tracks: 4-7)
Directed By – Myung-Whun Chung (tracks: 1- 3)
Ensemble – Capuçon Quartet (tracks: 4-7)
Orchestra – Gustav Mahler Jugendorchester (tracks: 1- 3)
Viola – Béatrice Muthelet (tracks: 4-7)
Violin – Aki Saulière (tracks: 4-7), Renaud Capuçon

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Johannes Brahms (1833-1897) meteu a colher em briga de marido e mulher

PQP

.: interlúdio :. Homenagem a Wayne Shorter — Miles Davis: Filles de Kilimanjaro (1968) / Weather Report: Procession (1983)

Wayne Shorter (1933-2023) em 1969

Limpo como a água de um rio sem qualquer traço de poluição, com as borbulhas suaves de uma cachoeira nesse rio, o som do saxofone de Wayne Shorter pode ser comparado à pureza da voz de Milton Nascimento. E por um desses acasos da vida, os dois se tornaram bons amigos. Em sua longa carreira, Shorter gravou uma imensa discografia: aqui no blog, não faz tanto tempo que PQP postou um dos seus principais álbuns como instrumentista e compositor: Schizophrenia, de 1967. Anos antes, com Freddie Hubbard (trompete) e McCoy Tyner (piano), ele participou do grande álbum Ready for Freddie (1962). Vejamos a seguir outros momentos da discografia de Wayne Shorter em dois álbuns que não têm o seu nome na capa, mas que têm nele, como compositor, instrumentista, arranjador, um dos pilares de construções musicais coletivas.

Menos conhecido que álbuns mais dançantes e acelerados como Bitches Brew, Filles de Kilimanjaro é um disco do início da fase de experimentações de Miles Davis e seu grupo com instrumentos elétricos. Um delicioso disco mais calmo, cheio de floreios de blues lento, com bastante destaque para o sax tenor de Shorter e para o piano elétrico Fender Rhodes de Herbie Hancock. A linda mulher da capa é Betty Gray Mabry – depois Betty Davis – que se casou com Miles em 1968. O casamento durou apenas cerca de um ano, mas tudo indica que foi Betty quem fez Miles escutar a música psicodélica de gente como Jimi Hendrix, além de apresentar o guitarrista – amigo dela – ao trompetista. A faixa Mademoiselle Mabry também é uma referência a Mabry e se baseia em um dos riffs mais suaves de Hendrix, o da balada The wind cries Mary, lançada em 1967.

Em álbuns posteriores como o já citado Bitches Brew (“Miles wanted to call it Witches Brew, but I suggested Bitches Brew and he said, ‘I like that’.”Betty Davis), com a chegada da guitarra elétrica de John McLaughlin e de dois ou três percussionistas, Wayne Shorter teria menos destaque no grupo de Miles, do qual ele sairia em 1970 para fundar o grupo fusion Weather Report com o tecladista Joe Zawinul.

Miles Davis Quintet: Filles de Kilimanjaro
1. Frelon Brun
2. Tout de Suite
3. Petits Machins
4. Filles de Kilimanjaro
5. Mademoiselle Mabry
6. Tout de suite (alternate take)

Miles Davis – trumpet
Wayne Shorter – tenor saxophone
Herbie Hancock – electric piano on “Tout de Suite”, “Petits Machins”, and “Filles de Kilimanjaro”
Chick Corea – piano, RMI electra-piano on “Frelon Brun” and “Mademoiselle Mabry”
Ron Carter – electric bass on “Tout de Suite”, “Petits Machins”, and “Filles de Kilimanjaro”
Dave Holland – double bass on “Frelon Brun” and “Mademoiselle Mabry”
Tony Williams – drums
Recorded: June-September 1968, New York City, USA

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE – Filles de Kilimanjaro (mp3 320kbps)

Os discos mais famosos do Weather Report são aqueles com o fenomenal baixista Jaco Pastorius. Mas este Procession, de 1983, pouco após a saída de Jaco, é um outro interessante momento da discografia de Wayne Shorter que não merece ser esquecido. Se a faixa Where the Moon Goes, que dá início ao lado B do LP, inclui um coral com efeitos que alguns ouvidos não vão aprovar (os meus desaprovam), nas composições de Shorter – Plaza Real e The Well – temos aquele sax de som puro e calmo que mencionei lá em cima, associado aos sons muito originais dos sintetizadores de Zawinul e ao pau comendo nas percussões, que utilizam inovações dos anos 1980 sem soarem bregas, ao contrário de outros bateristas que abusararam de reverb e outros efeitos de gosto duvidoso naquela década.

Weather Report: Procession
1. Procession (Josef Zawinul)
2. Plaza Real (Wayne Shorter)
3. Two Lines (Zawinul)
4. Where the Moon Goes (Zawinul, lyrics by Nan O’Byrne and Zawinul)
5. The Well (Shorter, Zawinul)
6. Molasses Run (Omar Hakim)

Josef Zawinul – keyboards
Wayne Shorter – tenor and soprano saxophones
Omar Hakim – drums, guitar, vocals
Victor Bailey – bass
José Rossy – percussion, concertina
The Manhattan Transfer – vocals on “Where the Moon Goes”

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE – Procession (mp3 320kbps)

Wayne Shorter & Joe Zawinul, 2007

Pleyel

Gustav Mahler (1860-1911): Sinfonia no. 9 em Ré menor (Walter, Viena, 1938)

Entre as características inerentes à música, há uma dualidade essencial que parece se manifestar de forma mais cristalina quando se trata da chamada música clássica: a questão da presença. Se, por um lado, a experiência de um concerto ao vivo nos desperta uma série de sensações (físicas, espirituais, anímicas) que nascem da vivência coletiva de compartilhar o silêncio com outras pessoas para escutar algo em comum, por outro a música gravada tem uma capacidade ímpar entre as artes de nos transportar para outros tempos, outros lugares e mundos.

Há algo de quase mágico em poder sentar-se em casa na terceira década do terceiro milênio da era cristã e escutar, em detalhes, o que fizeram gente como Glenn Gould, Birgit Nilsson, Msitslav Rostropovich ou Guiomar Novaes. É uma riqueza inestimável, uma Cocanha eterna de beleza, verdade e sentimento.

Nesse sentido, o disco de hoje é histórico no mais profundo dos sentidos — com toda a grandeza trágica que isso carrega consigo. Trata-se da gravação da Nona Sinfonia, em Ré menor, de Gustav Mahler (1860-1911), feita por Bruno Walter à frente da Orquestra Filarmônica de Viena, em 16 de janeiro de 1938, no Musikverein, no centro da capital austríaca.

Ao parágrafo anterior, adiciono duas informações. A primeira é que a estreia da obra, já após a morte do compositor, foi em 1912 com o mesmo Bruno Walter à frente da mesma Filarmônica de Viena. A segunda é que semanas após essa gravação as tropas nazistas invadiram a Áustria e a orquestra expurgou os membros judeus do grupo, incluindo o próprio maestro Walter, que terminaria por emigrar para os Estados Unidos e se tornaria diretor artístico da Filarmônica de Nova York, uma parceria mitológica.

A Stolperstein de Bruno Walter em Salzburgo, na Áustria.

Sinfonias são, afinal, manchas de tinta preta em uma página em branco; sinais que, traduzidos pelos músicos, viram sons organizados no tempo. A equação é simples, mas contém em si esse elemento de infinitas possibilidades que é o ser humano. Escutar a Filarmônica de Viena naquele janeiro de 1938, o último respiro antes de um longo abismo de trevas, é sentir a urgência daquele momento, naquele lugar.

Frente a tudo isso, penso que devo me furtar a falar qualquer coisa mais sobre esse disco; tudo correria o risco de soar banal frente ao absoluto feito histórico que é essa gravação ter sobrevivido a um dos períodos mais terríveis da história da humanidade. O disco é um testemunho de um mundo que desabaria para nunca mais ser o mesmo. A guerra foi uma mancha que transformou a tudo que tocou, e para a sociedade vienense daquele final de década o impacto foi profundo. O pesadelo estava apenas começando.

Bruno Walter, o responsável por estrear a Nona de Mahler

Gustav Mahler (1860-1911)
Sinfonia no. 9 em Ré menor
(1912)

1. Andante comodo
2. Im Tempo eines gemächtlichen Ländlers
3. Rondo – Burleske
4. Adagio

Orquestra Filarmônica de Viena
Bruno Walter, regência

16.01.1938
Musikverein, Viena

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Karlheinz

… e como ninguém vem ao nosso programa e sai de mãos vazias, um pequeno bônus para esse post: o áudio de Walter ensaiando a mesma Nona em um contexto bem diferente: 1962, Los Angeles, à frente da Columbia Symphony Orchestra. Que tesouro, que acontecimento que é escutar alguns minutos desse ensaio! Conseguimos ter uma pequena amostra da maneira de trabalhar de Walter na preparação para um estúdio de gravação. O homem que regeu a estreia da peça, amigo pessoal do velho Gustav! Wahnsinn, como dizem os alemães.

.: interlúdio :. The Michael Landau Group: Organic Instrumentals

.: interlúdio :. The Michael Landau Group: Organic Instrumentals

IM-PER-DÍ-VEL !!!

Olhando assim, Michael Landau não parece um guitarrista de rock. Sua natureza discreta guarda no currículo atuações junto a Joni Mitchell, James Taylor, Pink Floyd e… também Miles Davis, para citar alguns. Mas ele tem um grupo fantástico a seu serviço. Um discreto grupo fusion. É rock e blues com belas improvisações. Porém, ao contrário de alguns de seus contemporâneos roqueiros, Landau evita frescuras de guitar hero, concentrando seus talentos na criação de peças musicais que nos tocam em um nível mais profundo. Cada faixa é independente, mas leva você para a próxima. Não é um CD não superproduzido, mas também não é áspero. Como diz o título, é orgânico. Todas as composições são ótimas, com excelentes atuações de todos os envolvidos. Minhas preferidas são Delano, Smoke e Big Sur Howl.

.: interlúdio :. The Michael Landau Group: Organic Instrumentals

1 Delano
Bass – Jimmy Haslip
Drums – Charley Drayton
Electric Organ [Hammond Organ] – Larry Goldings
Guitar – Michael Landau

2 Sneaker Wave
Bass – Teddy Landau
Drums – Vinnie Colaiuta
Electric Organ [Hammond Organ] – Larry Goldings
Guitar, Bass – Michael Landau

3 Spider Time
Bass – Jimmy Haslip
Drums – Gary Novak
Electric Organ [Hammond Organ], Piano – Larry Goldings
Guitar – Michael Landau

4 The Big Black Bear
Bass – Andy Hess
Drums – Gary Novak

5 Karen Mellow
Bass – Andy Hess
Drums – Gary Novak
Electric Organ [Hammond Organ] – Larry Goldings
Guitar – Michael Landau

6 Ghouls And The Goblins
Bass – Chris Chaney
Drums – Gary Novak
Electric Organ [Hammond Organ] – Larry Goldings
Guitar – Michael Landau

7 Big Sur Howl
Drums – Gary Novak
Electric Organ [Hammond Organ] – Larry Goldings
Flugelhorn – Walt Fowler
Guitar – Michael Landau

8 Woolly Mammoth
Bass – Andy Hess
Drums – Charley Drayton
Electric Organ [Hammond Organ] – Larry Goldings
Guitar – Michael Landau

9 Smoke
Electric Organ [Hammond Organ], Organ [Estey Reed Organ], Carillon – Larry Goldings
Guitar – Michael Landau

10 The Family Tree
Guitar – Michael Landau

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Landau: um roqueiro sem cara de roqueiro

PQP

Gabriel Fauré (1845-1924): Quintetos para Piano Nº 1 e 2 (Schubert Ensemble)

Gabriel Fauré (1845-1924): Quintetos para Piano Nº 1 e 2 (Schubert Ensemble)

IM-PER-DÍ-VEL !!!

A música de Fauré é tímida. Ela não bate na porta pedindo para entrar. Você é que tem que convidá-la para se acomodar. Ela não grita chamando você, não chama sua atenção, tem que ser convidada, repito. Depois disso você poderá fruir de algumas das melhores obras low profile deste planeta, uma curiosa e discreta ligação entre romantismo e modernismo. Neste CD, o Schubert Ensemble traz requintadas e compreensivas versões destas duas obras extraordinárias do compositor. O pianista William Howard traz uma leveza de toque à parte de piano, timidamente virtuosa. O grupo é apaixonado pela música de Fauré e, nos últimos anos, deu muitos recitais com estes quintetos reflexivos e altamente individuais. Fauré foi aluno de Saint-Saëns e professor de Ravel. Sua fluidez acontece aparentemente sem esforço, mas se você ouvir atentamente seus Quintetos para Piano, ouvirá grandes dramas, tensões e profunda emoção, tudo habilmente demonstrado. “A música de câmara”, escreveu Fauré, “é a verdadeira música e a expressão mais sincera de uma personalidade genuína.” E em sua música de câmara ele conseguiu algo efetivamente notável.

Gabriel Fauré (1845-1924): Quintetos para Piano Nº 1 e 2 (Schubert Ensemble)

Piano Quartet No.1 in C minor, Op.15 (1876-79)
1 – I. Molto moderato
2 – II. Adagio
3 – III. Allegretto moderato
Piano Quintet in C minor, Op. 115 (1919-21)
5 – I. Allegro moderato
6 – II. Allegro vivo
7 – III. Andante moderato
8 – IV. Allegro Molto

The Schubert Ensemble Of London:
Piano – William Howard
Cello – Jane Salmon
Viola – Douglas Paterson
Violin – Maya Koch, Simon Blendis

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Fauré lendo a versão impressa de “Os Imortais Posts de PQP Bach”

PQP

Domenico Scarlatti (1685-1757): 17 Sonatas – Wolfram Schmitt-Leonardy, piano ֍

Domenico Scarlatti (1685-1757): 17 Sonatas – Wolfram Schmitt-Leonardy, piano ֍

Domenico Scarlatti

Sonatas

Wolfram Schmitt-Leonardy

 

Como uma personagem de Virginia Wolf, Domenico Scarlatii viveu duas vidas em uma. Até seus quase quarenta anos seguiu o modelo e imposições de seu pai, Alessandro Scarlatti, compositor de óperas napolitano. A música que produziu nesta vida – essencialmente óperas e música litúrgica sacra, não é má (há um disco de John Eliot Gardiner regendo o famoso Monteverdi Choir no qual você pode ouvir um Stabat Mater), mas não chega levantar a plateia. A morte de um Scarlatti permitiu o nascimento (ou o renascimento) do outro. Domenico, ou Domingo, como viria a ser conhecido em sua nova vida, deixou seu cargo como Diretor Musical da Basílica de São Pedro, onde trabalhava para o Cardeal Ottoboni e também servia a Rainha da Suécia, e rumou para o Oeste!

Maria Bárbara, Princesa de Portugal, Rainha de Espanha

Podemos mudar de vida, mas certos hábitos são do tipo ‘die hard’. Domingo Scarlatti foi servir a Casa Real de Portugal e ficou encarregado de dar lições de cravo para a Princesa Maria Bárbara de Bragança. A garota era longe de ser bonita e seria feia caso não fosse princesa, mas era ótima aluna e se tornou Rainha da Espanha. Tudo isso para nossa (e de Domenico) sorte. Pois que o marido dela, Fernando, também apreciava a música.

Como parte da entourage do casal real, Scarlatti teve sua subsistência para lá de garantida – morou em linda casa em Madri e a rainha também lhe socorria quando havia problemas devido aos pecadilhos dos jogos. Ele chegou mesmo a ser Cavaleiro da Ordem de Santiago, que lhe garantia o direito de usar roupas de veludo e seda, assim como anéis, colares e até mesmo um chapéu também de veludo.

Dom Domingo

Este luxo todo foi recompensa pela criatividade que desabrochou neste novo Scarlatti e o fez produzir mais de 500 sonatas – uma novidade após a outra. Incrementadas por sabores e sons de Espanha, elas deram ar da graça em 1738, quando trinta delas foram publicadas e depois republicadas em Londres, com mais doze acrescentadas ao lote.

Schmitt-Leonardy em pose de pianista…

Toda essa obra foi preservada em cópias lindamente manuscritas e encadernadas com capas de couro, a mando da Rainha. Essa verdadeira música de Scarlatti nunca deixou de encantar os apaixonados pela música de teclado, Frederico Chopin sendo um deles, e eu adoro ouvi-las interpretadas ao piano, como é o caso neste álbum mesmo espetacular. Ouça as três primeiras sonatas do disco e terás uma perspectiva do que está pela frente… Uma faixa melhor do que a outra. Se fores ouvir uma só, para alegrar seu dia, ouça a faixa No. 7, que aqui chamamos ‘A Espivetada’. E se estiver sobrando mais um tempinho, e precisares de um bom momento de reflexão, vá para a faixa No. 12, a Sonata Reflexiva!

O pianista Wolfram Schmitt-Leonardy gravou álbuns para o selo Brillant com música de Chopin e Schumann e Brahms, entre outros. Este disco com música de Scarlatti é o primeiro que eu ouço, mas fiquei animado para conhecer mais suas interpretações. Os Prelúdios de Chopin estão já na minha lista de futuras audições…

Domenico Scarlatti (1685 – 1757)

  1. Sonata K. 1 em ré menor
  2. Sonata K. 32 em ré menor
  3. Sonata K. 33 em ré maior
  4. Sonata K. 87 em si menor
  5. Sonata K. 29 em ré maior
  6. Sonata K. 27 em si menor
  7. Sonata K. 427 em sol maior
  8. Sonata K. 132 em dó maior
  9. Sonata K. 98 em mi menor
  10. Sonata K. 135 em mi maior
  11. Sonata K. 162 em mi maior
  12. Sonata K. 208 em lá maior
  13. Sonata K. 39 em lá maior
  14. Sonata K. 322 em lá maior
  15. Sonata K. 455 em sol maior
  16. Sonata K. 95 em dó maior
  17. Sonata K. 466 em fá menor

Wolfram Schmitt-Leonardy, piano

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FLAC | 213 MB

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MP3 | 320 KBPS | 180 MB

Wolfram ficou bem mais relaxado depois que você baixou o álbum….

Wolfram Schmitt-Leonardy was born in Saarlouis, Germany, in 1967, and his first important teacher was a student of Walter Gieseking and Edwin Fischer. His quintessentially pianistic approach to Scarlatti exploits all the colouristic possibilities of a modern grand, while articulating the quick sonatas with sparkling deftness of touch.

Sparkling and touching!

Aproveite!

René Denon

Monteverdi (1567-1643): Teatro d’Amore – L’Arpeggiata & Christina Pluhar ֎

Monteverdi (1567-1643): Teatro d’Amore – L’Arpeggiata & Christina Pluhar ֎

Claudio Monteverdi

Teatro d’Amore

Nuria Rial & Philippe Jaroussky

L’Arpeggiata

Christina Pluhar

Antes deste disco eu costumava ver Claudio Monteverdi como uma figura de valor histórico, compositor que desempenhara um papel importante no desenvolvimento da música entre os períodos renascentista e barroco. Sim, tem a coleção ‘Vespro della Beata Vergine’ e eu já havia ouvido o ‘Torna Zéfiro’, que está no disco, mas não havia me dado conta que a música de Claudio Monteverdi têm esta dimensão de atualidade, que identificamos na música que faz parte de nossa vida. Este álbum mostrou-me como sua música é atemporal – acordes, suspiros, e todo o encanto de cantar sobre amar e ser amado. Não deixe de ouvir!

Nuria adorou o fim de semana na Ilha do PQP Bach

A Abertura é cartão de visita e ecoa no início de ‘Vespro della Beata Vergine’. É claro que os músicos que produziram o álbum têm enorme mérito e passarei a buscar outros discos associados a seus nomes. Um destaque para Nuria Rial e Philippe Jaroussky, que tornam mágicos alguns dos momentos aqui, como no dueto ‘Pur ti miro’, da ópera ‘L’Incoronazione de Poppea’. Esta faixa é a campeã em número de bis aqui em casa. Sem contar o efeito da língua italiana, apropriada para falar de ‘amore’:

O mia vita, o mio tesoro,

Io son tua, tuo son io…

Philippe ficou no Castelo do PQP Bach e se divertiu muito!

É verdade que é quase a mesma coisa em português, mas dito assim, pelo menos aqui, faz enorme sucesso!

Ah, os instrumentistas que acompanham os cantores são sensacionais. Sopros, percussão e instrumentos dedilhados, um som envolvente e expressivo.

L’Arpeggiata é um grupo liderado pela harpista Christina Pluhar que tem muita presença e personalidade, mas deve ser também muita aglutinadora, pois todos estão muito bem. O álbum foi produzido na Sala de Concerto Vredenburg, em Utrecht, durante uma edição do Festival Oude Muziek.

L’Arpeggiata

Christina Pluhar diz: “O que há de mais admirável em Monteverdi é a tremenda diversidade de técnicas composicionais que ele domina e combina de forma brilhante. Nesta gravação, gostaríamos de destacar a variedade de suas composições seculares.”

Claudio Monteverdi (1567 – 1643)

  1. L’Orfeo, SV 318 – Toccata (Alessandro Striggio)
  2. Ohimè ch’io cado, SV 316 (PJ)
  3. Pur ti miro, dueto de L’Incoronazione di Poppea (PJ & NR)
  4. Damigella tutta bella, SV 235 (JF, NA, CA, PJ, JvE, NR)
  5. Madrigais, Livro 8: Lamento della ninfa, SV 163: IV. Amor (NA, CA, NR, JvE)
  6. Si dolce è’l tormento (do Libro Nono di Magrigali e Canzonette) (PJ)
  7. L’Orfeo, SV 318, Act 5: Sinfonie & Moresca (Alessandro Striggio)
  8. Madrigais, Livro 7: Interrotte speranze, SV 132 (JvE, CA)
  9. Chiome d’oro, bel thesoro, SV 143 (Arranjo de Christina Pluhar) (NR)
  10. L’Incoronazione di Poppea, SV 308, Act 2: “Oblivion soave” (Arnalta) (PJ)
  11. Hor che’l ciel e la terra (Livro 8), SV 147 (NA, JF, MR, CA, LA, PJ, JvE)
  12. Madrigais, Livro 7: Tempro la cetra, SV 117 (JvE, CA)
  13. Livro 8: Ballo, SV 154b
  14. Madrigais, Livro 7: Con che soavità, SV 139 (NR)
  15. Madrigais, Livro 8: Vago augelletto che cantado vai, SV 156 (NA, JF, ZT, CA, LA, PJ, JvE)
  16. Zefiro torna e di soavi accenti, SV 251 (Arranjo de Christina Pluhar) (PJ, NR)

Nuria Rial, soprano

Philippe Jaroussky, contra-tenor

João Fernandes, baixo

Nicolas Achten, baritono

Cyril Auvity, tenor

Jan van Elsacker, tenor

Michaela Riener, soprano

Lauren Armishaw, soprano

Zsuzsanna Toth, soprano

L’Arpeggiata

Christina Pluhar

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FLAC | 291 MB

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MP3 | 320 KBPS | 142 MB

Christina Pluhar

Seção “The book is on the table”:

“As resident ensemble at the Festival Oude Muziek Utrecht in August 2006, L’Arpeggiata presented the programme of this CD in concert and recorded it in the main auditorium of the Vredenburg with its outstanding acoustics.” – Liner notes

The gorgeous singing of the soloists and stylish instrumental performances, though dazzling and gimlet-eyed, are also elegant and respectful without being obsequiously slavish to convention. BBC Music, 2009

Still, as a whole, this CD is joyous and moving. In short, Monteverdi by a magnificent artist, presented in a manner that is either the height of bastardization, or a genuine example of intelligent democratization–you choose!

Improvised cornett parts are much in evidence, but not in the excerpts from Poppea. Jaroussky is not quite gentle enough in Arnalta’s lullaby; but in “Pur ti miro” he and Nuria Rial make the most of the semitone clashes, their lines intertwining sensuously over a beguiling plucked continuo accompaniment. Do give this very lively disc a try.

Não deixe de ouvir este maravilhoso disco! Aproveite! (Eu fiquei pluhado…)

René Denon

Christina e Philippe no recital para o pessoal do PQP Bach

.: interlúdio :. Ithamara Koorax: Rio Vermelho (1995)

Nossa homenagem ao saudoso Ranulfus continuará, também, através da republicação de suas preciosas contribuições ao nosso blog – como esta, que veio à luz em 31/12/2015

.Senhorxs: sei que este último dia de 2015 já está carregado até não poder mais de postagens tremendas, mas, desculpem, eu não posso deixar virar para 2016 sem registrar o vigésimo ano deste disco que considero um “unicum”, isto é: sem similar.

Ithamara é mais um desses casos de brasileirx vítima do nosso complexo de vira-lata endêmico: indicada não sei quantas vezes pela Downbeat entre as principais cantoras de jazz do mundo, diva absoluta no Japão, e ainda – ai! – “Ithamara quem?” para a maior parte dos brasileiros – isso quando este disco contém nada menos que a última gravação de Tom Jobim (no piano de algumas faixas); solos inacreditáveis de Ron Carter ao baixo; Luiz Bonfá, Marcos Valle, Paulo Malaguti e o próprio Tom entre os arranjadores – etc. etc.

Mas não deixo de compreender que, para brasileiros, ouvir sua própria música dita “popular” interpretada assim tenha que causar alguma estranheza. É realmente incomum – e tanto, que eu mesmo tenho dificuldades em colocar em palavras de que modo é incomum. Minha hipótese principal: por uma lado, Ithamara faz uma leitura instrumental da melodia – quero dizer, usando a voz como um instrumento solista, muitas vezes a-lu-ci-na-da-men-te; por outro, não esquece o texto, mas faz dele uma leitura teatral, de alta dramaticidade. São duas intensidades simultâneas tão altas que o resultado definitivamente não cabe em situação assim como embalar um jantar: ou você embarca e navega junto, ou se sente jogado para lá e para cá pela turbulência; sem paz – o que parece chegar ao extremo nas duas faixas em inglês, Cry me a river e Empty glass.

Quanto às onze faixas em português, admito que algo dificulta a fruição do disco até para mim: seis delas são um revival da chamada “música de fossa”, ou “música de dor de cotovelo” (ou mesmo sete, se incluirmos ‘Retrato em branco e preto’ nessa categoria) – sendo cinco numa sequência só. Ora, justamente com as leituras de La Koorax, isso pode ser uma travessia de efetivo risco para depressivos e bipolares… Se eu avalio que há um erro neste disco, é este excesso – entre tantos outros excessos que resultaram felizes!

‘Rio Vermelho’ foi o terceiro disco de Ithamara. Conheço bem este e o segundo, ‘Ao Vivo’, um pouco menos colorido timbristicamente porém igualmente intenso – mas conheço pouco dos posteriores, pois me passaram a impressão de que os produtores internacionais tenham conseguido domar um tanto o vulcão inventivo da artista – com o que confesso que meu interesse caiu um pouco.

Estarei dizendo que acho que na média Ithamara pode ter ficado sendo uma cantora menor? Não! Não acho que arte comporte esse tipo de cálculo mesquinho. Para mim, uma sílaba pode ser bastante para consagrar um(a) artista. No caso, sugiro que ouçam com atenção o gradualíssimo crescendo de tensão em Retrato em branco e preto, até a sílaba -CA- de “pecado”. Vocês me considerarão completamente maluco se seu disser que dentro dessa sílaba eu vejo se abrir uma paisagem tão ampla quanto as do Planalto Central, ou quem sabe a de algum mirante da Serra do Mar?

Pois bem: a uma cantora que conseguiu fazer isso comigo eu jamais admitirei que alguém venha a chamar de “menor” – seja lá o que houver feito ou deixado de fazer depois!

ITHAMARA KOORAX : RIO VERMELHO
Data de gravação: outubro de 1994
Data de lançamento: abril de 1995

1. Sonho de Um Sonho (Martinho da Vila/R. De Souza/T. Graúna) – 3:50
2. Retrato Em Branco E Preto (Buarque/Jobim) – 5:38
3. Correnteza (Bonfá/Jobim) – 6:41
4. Preciso Aprender a Ser Só (Valle/Valle) – 4:54
5. Tudo Acabado (Martins/Piedade) – 5:26
6. Ternura Antiga (Duran/Ribamar) – 3:48
7. Não Sei (DeOliveira/Gaya) [d’aprés Chopin] – 4:27
8. É Preciso Dizer Adeus (de Moraes/Jobim) – 3:36
9. Cry Me a River (Hamilton) – 6:06
10. Índia (Flores/Fortuna/Guerreiro) – 7:05
11. Rio Vermelho (Bastos/Caymmi/Nascimento) – 3:44
12. Se Queres Saber (Peter Pan) – 8:14
13. Empty Glass (Bonfá/Manning) – 4:02

Ithamara Koorax – Arranger, Vocals, Executive Producer
Antonio Carlos Jobim – Piano, Arranger
Luiz Bonfá – Guitar, Arranger
Ron Carter – Bass
Sadao Watanabe – Sax (Alto)
José Roberto Bertrami – Arranger, Keyboards
Arnaldo DeSouteiro – Arranger, Producer
Jamil Joanes – Bass (Electric)
Carlos Malta – Flute (Bass), Sax (Tenor)
Pascoal Meirelles – Drums
Paulo Sérgio Santos – Clarinet
Marcos Valle – Arranger, Keyboards
Mauricio Carrilho – Guitar (Acoustic), Arranger
Daniel Garcia – Sax (Soprano), Sax (Tenor)
Paulo Malaguti – Piano, Arranger, Keyboards
Sidinho Moreira – Percussion, Conga
Marcos Sabóia – Engineer, Mixing
Otto Dreschler – Engineer
Fabrício de Francesco – Engineer
Rodrigo de Castro Lopes – Engineer, Mastering
Livio Campos – Cover Photo
Hildebrando de Castro – Cover Design, Cover Art
Celso Brando – Liner Photo
Christian Mainhard – Artwork

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Ranulfus

[restaurado com carinho e saudades por Vassily em 14/3/2023, como parte das homenagens a Ranulfus e ao Dia Internacional da Mulher]

Sofia Gubaidúlina (n. 1931): Quartetos Nº 1, 2 e 3 / Trio de Cordas (Danish) – Semana do Dia Internacional da Mulher

Sofia Gubaidúlina (n. 1931): Quartetos Nº 1, 2 e 3 / Trio de Cordas (Danish) – Semana do Dia Internacional da Mulher

O “Quarteto de Cordas Nº 1” de Gubaidúlina foi escrito em 1971. Desta forma, é de antes de sua maturidade como compositora. Trata-se de uma obra sobre o isolamento, a partitura contém pausas prescritas durante as quais os músicos, que iniciaram a obra sentados juntos no centro do palco, avançam lentamente em direção aos quatro cantos do mesmo. O resultado é que cada instrumentista toca as últimas seis páginas da partitura como se fosse um músico solo. Infelizmente, um aparelho de som não pode comunicar totalmente esse conceito…

O “Quarteto de Cordas Nº 2” foi encomendado em 1987 pelo Kuhmo Chamber Music Festival para o Sibelius Quartet. Dezesseis anos se passaram desde seu primeiro quarteto e nesse tempo sua técnica de composição mudou completamente. Durante a década de 1970, seu trabalho começou a ser profundamente inspirado pela fé ortodoxa e, na década de 1980, essa inspiração religiosa foi acompanhada por um profundo interesse pelo uso de fórmulas matemáticas como a Sequência de Fibonacci. Esta peça está relacionada com a sua sinfonia “Stimmen …Verstummen”, do ano anterior.

Em contraste com a grande lacuna entre o primeiro e o segundo quarteto, o “Quarteto de Cordas Nº 3” veio logo após o Nº 2. Ele encontra inspiração nas linhas de “The Waste Land” de T.S. Eliot, e é um trabalho de movimento único dividido igualmente em uma seção de abertura dedilhada e uma segunda metade onde o arco é introduzido e o som drasticamente transformado. Considero este o menos bem-sucedido dos quartetos de Gubaidúlina, mas admito que posso estar totalmente errado.

O “Trio de Cordas” para violino, viola e violoncelo (1988) foi escrito logo após o terceiro quarteto de cordas e é emocionante. O primeiro movimento começa com austeridade áspera. O segundo movimento tem um ritmo mecânico que lembra o segundo quarteto de cordas de Ligeti, enquanto o terceiro resume o que veio antes e o decompõe em uma calmamente. Para terminar, digo que o Danish Quartet é uma joia, sensacional mesmo.

Sofia Gubaidúlina (n. 1931): Quartetos Nº 1, 2 e 3 / Trio de Cordas (Danish)

01. Streichquartett Nr. 1 22:56
02. Streichquartett Nr. 2 09:04
03. Streichquartett Nr. 3 18:36
04. Streichtrio – I 06:21
05. Streichtrio – II 04:54
06. Streichtrio – III 08:08

Performers:
Tim Frederiksen (1-3), Arne Balk-Møller, violins
Claus Myrup, viola
Henrik Brendstrup, cello

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Gubaidúlina tem reagido positivamente às piadinhas que colocamos nas legendas das fotos

PQP

O compositor negro que influenciou Mozart: 2 concertos de Joseph Bologne, Chevalier de Saint-George (1745?-1799)

Publicado originalmente em 18.06.2010. Re-publicado em 25.01.2016 em um “pacote” de postagens que talvez se possa relacionar aos 161 anos da Revolta do Malês (negros letrados, portadores da alta cultura mandê) na Bahia.

A participação de afrodescendentes na construção do “clássico” brotado da Europa é um assunto riquíssimo ainda bem pouco explorado, no qual me fascinam especialmente dois violinistas.

Um, George Bridgetower, filho de um negríssimo escravo forro e de uma polonesa, entusiasmado pelo qual Beethoven compôs em uma semana a maior de suas sonatas para violino e piano. Um dia conto aqui sobre a estreia, talvez a primeira jam-session – e sobre a briga de bebedeira que levou o genioso gênio a re-dedicar a obra a Rudolph Kreutzer, que fez pouco caso e nunca a tocou.

O outro, o autor destes concertos, nascido em Guadeloupe, Caribe, de um nobre francês com sua escrava Nanon. Pouco depois, encrencas “correm” o pai de volta para a Europa, e este – milagre dos milagres na história da colonização! – em vez de abandonar mãe e filho leva-os consigo. Nanon parece ter sido uma espécie de segunda esposa mantida discretamente no ambiente doméstico, mas mesmo assim chegará a ser mencionada como “o mais belo presente que a África deu à França”, e o pequeno Joseph terá uma educação em letras e armas para nobre nenhum botar defeito. Aos 15 anos ingressa na guarda do rei, e aos 26 é mencionado como mestre “inimitável” na esgrima, mencionado nos tratados dessa arte dos séculos 19 e 20 como referência e com reverência (as idades são presumidas a partir de seu nascimento no Natal de 1745, data mais aceita, embora ainda disputada).

Porém aos 23 já havia sido chamado “inimitável” em outra arte: a do violino. Assume o posto de spalla numa das orquestras mais prestigiosas da Paris de então, a Concert des Amateurs, em cuja direção sucede Gossec quatro anos depois. É apenas a primeira das muitas sociedades musicais que dirigirá, posição que lhe permitirá, entre outras coisas, encomendar a Haydn a série de sinfonias que ficarão conhecidas como “parisienses”. Haydn tinha 53 anos por ocasião da encomenda, Saint-George 39 ou 40.

Oito anos antes, em 1777, Mozart chegara a Paris pela terceira vez. Havia poucos anos a cidade o havia aclamado ainda como garoto prodígio, mas agora já tem 21, deixou de ser novidade em mais de um sentido. Coincidentemente, nesse mesmo momento a estrela de Saint-George está brilhando a toda, inclusive com a estréia de sua “comédia com árias” Ernestine, com libreto do autor de As Ligações Perigosas, Choderlos de Laclos.Mozart escreve ao pai que a coisa está difícil; o pai o aconselha a procurar justamente o Concert des Amateurs, mas ao que parece o filho reluta, não sabemos a razão. O que sabemos é que indiferente à música de Saint-George, Mozart não ficou: têm sido apontadas semelhanças estilísticas e até mesmo temáticas entre obras suas desse momento, ou pouco posteriores, e obras de Saint-George publicadas pouco antes.

Desonra nenhuma para Mozart: é mesmo pelo acolhimento de influências e sua posterior transformação que qualquer artista se faz. Mas é sem dúvida honra para Saint-George, que ninguém menos que Mozart tenha considerado sua música digna de semelhante atenção!

Aos 45, apesar das origens aristocráticas, Joseph se junta à Revolução com o posto de coronel, logo assumindo o comando de um batalhão de negros e mestiços, entre eles o futuro pai do escritor Alexandre Dumas. Mas apesar de seus serviços terem sido decisivos para a vitória da Revolução (como foi demonstrando recentemente), nos anos do terror foi denunciado e mantido preso por um ano e meio, à espera da guilhotina. Embora indultado de última hora, sua saúde jamais voltou a ser a mesma, levando-a à morte com apenas 53 anos.

Se é verdade que seus últimos anos foram vividos com simplicidade, não o é o mito romântico de que Joseph Bologne de Saint-George tenha morrido esquecido: os jornais de Paris noticiaram sua morte como a de uma personalidade nacional. (Aproveito para mencionar que as grafias Bologne e Saint-George [sem s] foram adotadas aqui no lugar de Boulogne e de Saint-Georges de acordo com os estudos mais recentes).

O esquecimento quase total veio um pouco mais tarde, ao longo dos séculos 19 e 20. Em 1936 o violinista Marius Casadesus fez um primeiro esforço de revivê-lo, porém isso só veio acontecer de fato a partir de 1974, quando Jean-Jacques Kantorow espantou o mundo com gravações de algumas sonatas e concertos, entre os quais os dois postados aqui. [Ranulfus havia postado o LP brasileiro CBS Odissey, 1976, digitalizado por Avicenna. Na repostagem de 2023, trago o CD de 1990 com mais dois concertos, também gravados nos anos 70]  De lá para cá têm surgido cada vez mais estudos, biografias e gravações, incluindo integrais dos concertos e dos quartetos (às quais infelizmente ainda não tive acesso).

Se posso fazer uma sugestão para a sua audição, é a seguinte: não preste atenção só no efeito geral, nem só nos momentos de arrebatamento dos solos: não deixe de reparar na qualidade da textura e/ou trama da parte orquestral, o tempo todo. Se depois disso você ousar dizer que Saint-George é um “compositor menor”, por favor já mande junto seu endereço postal, que minha carta-bomba não tardará…

Joseph Bologne, Chevalier de Saint-George
DOIS CONCERTOS PARA VIOLINO E CORDAS

Concerto em sol maior, op.8 nº 9
01 Allegro
02 Largo
03 Rondeau

Concerto em la maior, op.5 nº 2
04 Allegro moderato
05 Largo
06 Rondeau

Concerto em do maior, op.5 nº 1
07 Allegro
08 Andante moderato
09 Rondeau

Concerto em re maior, op.5 nº 2
10 Allegro maestoso
11 Adagio
12 Rondeau

Orquestra de Câmara Bernard Thomas
Jean-Jacques Kantorow, violino solo e regência
Gravação original Arion France, 1974/1976

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE – MP3 320kbps

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Ranulfus

Florence Price (1887-1953): Scenes in Tin Can Alley (Peças para piano) – Josh Tatsuo Cullen, piano – Semana do Dia Internacional da Mulher ֎

Florence Price (1887-1953): Scenes in Tin Can Alley (Peças para piano) – Josh Tatsuo Cullen, piano  – Semana do Dia Internacional da Mulher ֎

 

Florence Beatrice Price

Peças para piano

Josh Tatsuo Cullen

 

 

Homenagem pelo Dia Internacional da Mulher

Em muitos sentidos, Florence Beatrice Price foi uma mulher única. Nascida em uma família multiracial, tornou-se a primeira compositora afro-americana a ter uma sinfonia interpretada por uma grande orquestra americana. Nada menos que a Chicago Symphony Orchestra, sob a regência de Frederick Stock, seu regente principal, em 1933.

Nascida em Little Rock, Arkansas, em uma comunidade racialmente integrada, era filha de um dentista e uma professora de música. Aos 16 anos foi aceita no New England Conservatory, em Boston, e recebeu completa formação musical na mais respeitada instituição deste tipo nos EUA. Retornou a Little Rock após sua formação, até a morte de seus pais. Depois foi para o sul e tornou-se professora da Clark Atlanta University, onde conheceu o advogado Thomas Price, com quem se casaria. As condições de vida no sul, com a segregação racial, tornou a vida muito difícil e eles mudaram-se para Chicago. O casamento não foi feliz e eles divorciaram-se.

Em Chicago havia algumas oportunidades de trabalho, tais como composição de peças instrucionais, especialmente para crianças, com muitas publicações, mas nenhuma posição em alguma instituição de ensino. Outra fonte de renda vinha de tocar música durante os filmes do cinema mudo e compor música para o rádio (usando codinome).

Florence e sua obra foram caindo em esquecimento após sua morte, mas a sua verdadeira dimensão começou a ser vislumbrada em 2009. Um casal de St. Anne, Illinois, se preparava para reformar uma casa abandonada em péssimas condições quando se depararam com pilhas e pilhas de papéis, com o nome Florence Price escrito por todos os lados. Arquivistas da Universidade de Arkansas foram informados e recolheram esse tesouro. A casa havia sido usada por Florence Price para veraneio e depois de sua morte havia sido abandonada e, como muitas de suas contribuições, caído em esquecimento. Não fosse o cuidado do casal, esse esquecimento teria se perpetuado. Entre os papéis foram encontrados uma sinfonia e dois concertos para violino, além de muitas outras coisas. Lentamente agora a obra dessa notável mulher está sendo apresentada a uma maior audiência. Assim, para homenageá-la trazemos um álbum com algumas de suas peças para piano, interpretadas por Josh Tatsuo Cullen. Eu gostei muito da música deste disco e esta é a principal razão de incluí-lo nas postagens comemorativas do Ano Internacional da Mulher. Há um que de ragtime, em algumas das peças, mas há bem mais do que isso. As peças Clouds e Church Spires in Moonlight são bastante especiais. Talvez algum de nossos outros colaboradores consiga trazer outras postagens que ilustrem ainda mais a obra desta notável compositora.

Florence Beatrice Price (1887 – 1953)

  1. Scenes in Tin Can Alley: The Huckster
  2. Scenes in Tin Can Alley: Children at Play
  3. Scenes in Tin Can Alley: Night
  4. Thumbnail Sketches of a Day in the Life of a Washerwoman: Morning
  5. Thumbnail Sketches of a Day in the Life of a Washerwoman: Dreaming at the Washtub
  6. Thumbnail Sketches of a Day in the Life of a Washerwoman: A Gay Moment
  7. Thumbnail Sketches of a Day in the Life of a Washerwoman: Evening Shadows
  8. Clouds
  9. Village Scenes: Church Spires in Moonlight
  10. Village Scenes: A Shaded Lane
  11. Village Scenes: The Park
  12. Preludes: No. I Allegro Moderato
  13. Preludes: No. II Andantino Cantabile
  14. Preludes: No. III Allegro Molto
  15. Preludes: No. IV Wistful. Allegretto con Tenerezza
  16. Preludes: No. V Allegro
  17. Cotton Dance (Presto)
  18. Three Miniature Portraits of Uncle Ned: At Age 17
  19. Three Miniature Portraits of Uncle Ned: At Age 27
  20. Three Miniature Portraits of Uncle Ned: At Age 70

Josh Tatsuo Cullen, piano

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE

MP3 | 320 KBPS | 118 MB

Josh gostou de aparecer aqui no PQP Bach apresentando música de Florence Price

Trechos da resenha de Jed Distler para a revista Gramophone:

There’s no question, however, that Josh Tatsuo Cullen’s taking on the short and charming piano pieces gathered for this release is an act of the utmost sincerity and a true labour of love. He believes in this music and plays it with finesse, flair and conviction.

Cullen infuses the impressionistic Clouds with the same concern for nuance and tonal application that a pianist such as Ivan Moravec brought to Debussy. Conversely, he serves up Cotton Dance like the hard-hitting cakewalk it is.

Mais informações sobre F. Price, aqui.

Aproveite!
René Denon

J. S. Bach / Brahms / Chopin / Rachmaninov / Domenico Scarlatti / Schubert / Schumann: Yara Bernette – Encores – Semana do Dia Internacional da Mulher

Nota: esta postagem, assim como todas as demais com obras de Heitor Villa-Lobos, não contém links para arquivos de áudio com obras do gênio brasileiro, pelos motivos expostos AQUI


Uma semana de celebrações por conta do Dia da Mulher não poderia deixar de prestar reverência a um território específico de excelência no nosso panorama musical: o piano. A galeria de pianistas brasileiras é uma verdadeira constelação que atravessa gerações: Guiomar Novaes, Magda Tagliaferro, Cristina Ortiz, Eliane Rodrigues, Erika Ribeiro, Diana Kacso, Linda Bustani, Clara Sverner, Menininha Lobo, Mariinha Fleury, Anna Stella Chic, Eudóxia de Barros, Felicja Blumental (nascida na Polônia, naturalizada brasileira), Rosana Martins…

Entre elas, uma estrela brilha com particular intensidade, por conta de sua sonoridade singular: estamos falando de Yara Bernette (1920-2002), uma artista de carreira tão impecável quanto longeva: foram mais de 4.000 concertos e recitais, ao longo de quase sete décadas. Uma vida inteira dedicada ao instrumento.

O verbete dedicado a ela na Enciclopédia do Instituto do Piano Brasileiro, escrito por Marcia Pozzani, está bem completo e rico em informações – vale a leitura. Para atiçar um pouco a curiosidade, no entanto, deixo um trecho de uma crônica escrita por Tarsila do Amaral (recolhida no livro Tarsila Cronista, organizado por Aracy Amaral e publicado pela Edusp em 2001). Ela relata uma história contada para ela pela própria Yara, quando se vira em apuros ao estar sem uma partitura para um concerto no Canadá. É um delicioso relato do frisson causado pela pianista, que a levaria inclusive até a glória de ter o selo dourado da Deutsche Grammophon estampado na capa de seus discos:

       ” (…) Nisso bate alguém na porta. Aparece um velhinho simpático – o maior crítico musical do Canadá – com uma música na mão e diz: “Miss Bernette, desculpe incomodá-la justamente agora, mas estou curioso por saber se a ‘Chaconne’ que a senhora vai tocar é desta edição”. Yara Bernette diz ao anjo que os céus lhe enviaram: “Peço-lhe deixar aqui a música. No primeiro intervalo conversaremos”. Deu-se o milagre. E o mais interessante é que o crítico não costumava levar música aos concertos. Apenas abriu a primeira página, foi chamada para o palco. Nunca tocou tão bem como naquela noite. O crítico musical, A. A. Alldrick, que a salvara sem o saber, dedicou-lhe excepcionalmente dois artigos ao invés de um, como de costume, afirmando no Winnipeg Free Press: “O recital de Yara Bernette foi um acontecimento fascinante… Yara Bernette é obviamente uma artista do calibre de ‘uma entre mil’. 
       Ao terminar a narrativa a grande pianista me diz: “Desde então, sinto que existe na minha carreira artística uma proteção divina”.
       Mais tarde num de seus inúmeros concertos, dizia o crítico Irving Kolodin no New York Sun: “Miss Bernette, prendendo a atenção dos ouvintes, fez com que a versão da ‘Chaconne’ de Bach  por Busoni valesse a pena de ser ouvida. Isso acontece uma vez por temporada e essa vez coube a Miss Bernette na sua execução definitiva”.
       Na sua tournée pelo México, disse o crítico musical do Excelsior: “Há muito não ouvíamos uma pianista do seu calibre, e também há muito tempo nenhum outro pianista havia interessado tanto os críticos nem obtido tantos elogios”.
       O New York Post exclama: “Tirem os chapéus, senhores! Miss Bernette é a última e irresistível palavra”, enquanto o New York Sun comenta: “Talentos pianísticos deste calibre têm raros similares”. (…)”

Flavio de Carvalho, “Retrato de Yara Bernette”, óleo sobre tela, 1951

O disco que apresento nesse post – gravado em 1995, já nos últimos anos de vida de Yara, no auge de sua maturidade – evoca essas antigas turnês, já que reúne uma série de peças que ela costumava tocar como bis (ou encore, em francês) em seus concertos e recitais. São peças emblemáticas do repertório pianístico, que refletem as preferências da artista. As interpretações são puro deleite; é um disco a que retorno, de tempos em tempos, há muitos anos.

Lançado em comemoração pelos 75 anos da pianista, o álbum foi gravado em fevereiro de 1995 no Teatro Cultura Artística, no centro de São Paulo, em um dos Steinways que faziam parte do acervo da casa. Tragicamente, o piano queimou junto com o teatro no dantesco incêndio que o consumiu em 17 de agosto de 2008. São, portanto, memórias fonográficas de um tempo que um universo que já nos deixou.

Áudio da apresentação de Yara Bernette na TV Excelsior, em 1961, tocando Debussy e Chopin. Créditos, como de praxe, para o espetacular Instituto Piano Brasileiro

Viva Yara Bernette!

Karlheinz

 

1. Domenico Scarlatti (transcr. Carl Tausig) – Pastorale
2. Domenico Paradies – Sonata em Lá – Tocata
3. J. S. Bach (transcr. W. Kempff) – Sonata BWV 1.031 – Siciliano
4. Felix Mendelssohn – Rondó Capriccioso, op. 14
5. Felix Mendelssohn – Scherzo, op. 16 no. 2
6. Robert Schumann – Cenas Infantis, op. 15 no. 7 – Rêverie
7. Robert Schumann – Cenas da Floresta, op. 82 no. 7 – O pássaro profeta
8. Johannes Brahms – Intermezzo, op. 117 no. 2
9. Frederic Chopin – Mazurka, op. 7 no. 3
10. Frederic Chopin – Mazurka, op. 17 no. 4
11. Frederic Chopin – Mazurka, op. 24 no. 4
12. Frederic Chopin – Estudo póstumo no. 1
13. Frederic Chopin – Noturno, op. 48 no. 1
14. Frederic Chopin (transcr. Franz Liszt) – Canção polonesa, op. 74 no. 5 – Minhas alegrias
15. Claude Debussy – Segundo Caderno – Prelúdio no. 7 – La Terrasse des Audiences du Clair de Lune
16. Sergei Rachmaninoff – Prelúdio, op. 32 no. 5
17. Sergei Rachmaninoff – Prelúdio, op. 32 no. 10
18. Sergei Rachmaninoff – Prelúdio, op. 32 no. 12
19. Heitor Villa-Lobos – Suíte Prole do Bebê no. 1 – O Polichinelo

Yara Bernette, piano

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Sofia Gubaidúlina (n. 1931): The Lyre of Orpheus & Canticle of the Sun (Kremer) – Semana do Dia Internacional da Mulher

Sofia Gubaidúlina (n. 1931): The Lyre of Orpheus & Canticle of the Sun (Kremer) – Semana do Dia Internacional da Mulher

A profundidade destas obras… O quanto são intrigantes… Bem, solistas talentosos, o violinista Gidon Kremer e o violoncelista Nicolas Altstaedt, trazem à tona a alma musical única da russa Gubaidúlina. A Kremerata Baltica apoia com competência os dois músicos. Na minhs opinão, a peça principal do álbum é The Lyre of Orpheus, um tributo emocionante à memória da filha da compositora. Com lirismo despido e inspirado, o conjunto deslumbra com tons pulsantes. Sofia Gubaidúlina não designa nenhuma das peças desta gravação como concertos, embora apresentem um instrumento solo e um conjunto que o acompanha. Essa lógica é evidente na sonoridade da música, que integra organicamente os solistas em sua textura e estrutura. Gubaidúlina é inquestionavelmente uma modernista, mas também é uma mística, então sua música tende a transmitir uma busca pela transcendência. Ela escreveu The Lyre of Orpheus para violino, percussão e orquestra de cordas para Gidon Kremer e a Kremerata Baltica. Em suas notas sobre a peça, Gubaidúlina escreve de forma um tanto enigmática, mas a música em si brilha com doçura tímbrica e quase inevitavelmente convida o ouvinte a trazer à mente a pungência do mito de Orfeu. Ela não menciona isso nas notas, diz que escreveu a peça como um memorial para sua filha, o que certamente explica a intensa profundidade de sentimento da música. O Canticle of the Sun para violoncelo, coro de câmara, percussão e celesta foi dedicado a Mstislav Rostropovich, que o estreou em 1998. A orquestração cria uma atmosfera de mistério. A compositora quis homenagear a personalidade solar do violoncelista. O violoncelo faz ouvir todo o tipo de acordes no primeiro movimento e há um rugido de êxtase furioso no final do segundo movimento. A peça termina em tom maior, numa delicada filigrana. Nicolas Altstaedt apresenta uma performance convincente e o Coro de Câmara de Riga é fantástico. Adorei a primeira peça, mas a segunda me cansou um pouco. Talvez o problema seja eu, claro.

Sofia Gubaidúlina (n. 1931): Canticle of the Sun (Kremer)

01 – The Lyre of Orpheus (2006)

02 – The Canticle of the Sun (1997, rev. 1998): Glorification of the Creator, and His Creations – the Sun and the Moon
03 – The Canticle of the Sun (1997, rev. 1998): Glorification of the Creator, the Maker of the four elements: air, water, fire and earth
04 – The Canticle of the Sun (1997, rev. 1998): Glorification of life
05 – The Canticle of the Sun (1997, rev. 1998): Glorification of death

Musicians:
Gidon Kremer – violin (track 1)
Marta Sudraba – violoncello (track 1)
Kremerata Baltica – string orchestra (track 1)

Nicolas Altstaedt – violoncello (tracks 2-5)
Andrei Pushkarev – percussion (tracks 2-5)
Rihards Zajupe – percussion (tracks 2-5)
Rostislav Krimer – celesta (tracks 2-5)
Riga Chamber Choir, Conducted by Māris Sirmais (tracks 2-5)

BAIXE AQUI — DOWNLOAD HERE

Sofia Gubaidúlina tentando exorcizar você, meu endemoniado leitor

PQP

Ruth Crawford Seeger (1901-1953): Vocal and Chamber Music – Semana do Dia Internacional da Mulher

 

Existem artistas que lamentamos que, por circunstâncias da vida, tenham deixado uma obra mais curta do que poderiam. Entre eles, há um grupo mais seleto cujas obras não só resistem à passagem do tempo, como também, justamente por respirarem ousadia, tornam-se ainda mais interessantes. Só nos resta imaginar quanta música boa poderia ter nascido se as condições fossem mais favoráveis.

Este é certamente o caso de Ruth Crawford Seeger (1901-1953), uma compositora norte-americana que é muito menos tocada e conhecida do que deveria. Nascida em East Liverpool, Ohio, era filha de um pastor metodista, o que levou a família a perambular por diversas cidades de Ohio, Missouri e Indiana até se estabelecer em Jacksonville, Flórida.

Com grande sensibilidade para as artes, Ruth primeiro interessou-se por poesia, até que decidiu estudar música seriamente. Primeiro estabeleceu-se em Chicago e depois em Nova York, desbravando corajosamente um ambiente francamente machista, conquistando uma série de prêmios e bolsas de estudo. Ela foi a primeira compositora mulher a receber uma bolsa da Fundação Guggenheim, em 1930, que a levou a Berlim e Paris no ano seguinte. Foi na capital alemã que ela compôs sua obra mais influente e conhecida, o String Quartet 1931.

De volta aos Estados Unidos, ela se casou em 1932 com um de seus professores, o compositor e musicólogo Charles Seeger, que logo depois assumiu um cargo na capital Washington, no setor de música da Resettlement Administration, em meio aos programas de reconstrução da economia norte-americana em torno do new deal do presidente Franklin Roosevelt.

A união com Charles selou o destino de Ruth em muitos sentidos, já que sua promissora carreira de compositora foi sacrificada em nome do machismo e da construção de uma família. Sem receber apoio do marido, que expressamente declarava que ela deveria se relegar ao papel de mãe e esposa para que a carreira dele prosperasse, Ruth compôs poucas obras autorais nas duas décadas seguintes, até sua prematura morte por câncer em 1953.

Isso, no entanto, não impediu que desempenhasse um valiosíssimo trabalho no Arquivo de Música Folclórica da Biblioteca do Congresso, em Washington. Trabalhando ao lado de Alan e John Lomax, ela prestou uma imensa contribuição na preservação das raízes da música dos Estados Unidos, recolhendo temas, escrevendo arranjos, transcrições e organizando coletâneas de canções e música tradicional.

Entre os filhos do casal Ruth e Charles Seeger, ao menos dois seguiram de perto o trabalho dos pais: o cantor folk Mike Seeger e a cantora country Peggy Seeger.

***

Neste álbum, um dos portraits da série Continuum da gravadora Naxos, há um interessante apanhado dos anos de juventude de Ruth, reunindo obras compostas entre 1924 (o Prelude no. 1 – Andante, para piano) e 1932, quando regressa da Europa (Two Ricercari, para voz e piano, sobre poemas de H. T. Tsiang).

Ao longo das peças, para diferentes grupos e combinações de instrumentos, podemos intuir as razões que levam a obra de Crawford a ser situada como “modernista” na tradição composicional americana. Podemos notar como o ímpeto mais melódico, pós-romântico das primeiras obras vai se transformando em uma escrita mais precisa, econômica e radical.

Um pequeno disco que funciona como boa porta de entrada para o universo de uma compositora que merece ser muito melhor explorado.

Ruth Crawford Seeger (1901-1953): Vocal and Chamber Music

Suite for Five Wind Instruments and Piano
(1927; revised 1929)

1. Adagio religioso/Giocoso – Allegro non troppo
2. Andante tristo
3. Allegro con brio

Jayn Rosenfeld, flauta
Marsha Heller, oboé
Joch Craig Barker, clarinete
Daniel Grabois, trompa
Cynde Iverson, fagote
Cheryl Seltzer, piano
Joel Sachs, regência

Sonata for Violin and Piano
(1925-26)

4. Vibrante, agitato
5. Buoyant
6. Mistico, intenso; Allegro

Mia Wu, violino
Cheryl Seltzer, piano

Two Ricercari
(Poems of H. T. Tsiang)
(1932)

7. Sacco, Vanzetti
8. Chinaman, Laundryman

Nan Hughes, mezzo-soprano
Joel Sachs, piano

9. Prelude no. 1 – Andante (1924)
10. Prelude no. 9 – Tranquilo (1928)
11. Study in Mixed Accents (1930)

Cheryl Seltzer, piano

Diaphonic Suite no. 1 for Flute
(1930)

12. Scherzando
13. Andante
14. Allegro
15. Moderato, ritmico

Jayn Rosenfeld, flauta

Diaphonic Suite no. 2 for Bassoon and Cello
(1930)

16. Freely
17. Andante cantando
18. Con Brio

Susan Heineman, fagote
Maria Kitsopoulos, violoncelo

Three Songs
(Poems of Carl Sandburg)
(1930-32)

19. Rat Riddles
20. Prays of Steel
21. In Tall Grass

Nan Hughes, mezzo-soprano
Marsha Heller, oboé
Erik Charlston, percussão
Cheryl Seltzer, piano
Orchestral Ostinato
Joel Sachs, regência

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Karlheinz

Chiquinha Gonzaga (1847-1935): tangos, choros, polkas, corta-jaca, maxixes… (H. Gomes, C. Sverner, P. Moura) – Semana do Dia Internacional da Mulher

Depois de uma curta vida de casada, Chiquinha se revoltou, fugiu, foi viver independente no seu canto, repudiada por todos, parentes e amigos, que não podiam se conformar com aquella ofensa à moral pública. (…) Foi professora de piano, constituiu um chôro para execução de dansas em casas de família, em que se fazia acompanhar do filhinho mais velho, tocador de cavaquinho, com dez anos de idade.
Francisca Gonzaga compôs 77 obras teatrais e umas duas mil peças avulsas. Quem quiser conhecer a evolução das nossas danças urbanas terá sempre que estudar muito atentamente as obras dela. (Mario de Andrade, em artigo de 1940)

Enquanto a mãe de Chiquinha era uma mulher negra que teria sido alforriada na pia batismal, o pai da compositora era um militar de família tradicional carioca e colocou a filha para ter aulas de piano com o maestro Lobo e apresentou-a a Francisco Manuel da Silva (1795-1865), autor do Hino Nacional e fundador do Conservatório do Rio de Janeiro, atual Escola de Música da UFRJ. A família de José Basileu Gonzaga, aliás, era parente distante de Ernesto Nazareth e de Francisco Manuel da Silva (cujo avô era “Silva Nazareth”) (mais sobre o parentesco aqui).

Mas aos 23 anos, ao separar-se do marido, Chiquinha foi considerada morta por seu pai: seu nome era impronunciável na casa dos Gonzaga e ela não pôde criar seus três filhos. O divórcio era um grande escândalo naquela época e, nas palavras de Chiquinha (citada na biografia de Dalva Lazaroni, p.68), “jamais diga que eu abandonei meu primeito marido; eu fui uma vítima que fugiu do seu torturador”.
Ela passava, então, a dedicar-se profissionalmente à música para sua manutenção econômica: dava aulas de piano, tocava à noite na Lapa e na praça Tiradentes, compôs obras teatrais e outras para os salões brasileiros, mas em alguns casos também impressas e vendidas na Europa. Ou seja, se não fosse a separação de seu marido – repito, um escândalo imenso à época – talvez Chiquinha Gonzaga não tivesse uma vida tão cheia de aventuras e inovações. Ela foi autora da primeira marchinha de Carnaval – Ó Abre alas, de 1899 – e atuou também no chamado “teatro de revista”, que passava “em revista” os acontecimentos políticos e sociais do ano, com humor, ironia e música. Chiquinha também atuou na campanha abolicionista nos anos 1880. Imaginem as reações na época a uma mulher que dava opiniões sobre política e regia orquestras em teatros…

É preciso deixar claro, porém, que Chiquinha Gonzaga, assim como seus contemporâneos Ernesto Nazareth (1863-1934) e Pixinguinha (1897-1973), tiveram uma educação musical formal, mas não tiveram a oportunidade de estudar profundamente orquestração: o instrumento que os dois primeiros conheciam bem era o piano. Se vocês virem alguma obra de Chiquinha ser tocada por orquestra, confiram bem se não se trata de um arranjo mais recente. Por outro lado, em 1932, com mais de 80 anos, Chiquinha publicou um grupo de composições para saxofone e para flauta – reunidas sob o título Alma Brasileira. Essas obras, na maioria já publicadas antes para piano solo, apareciam agora reunidas como “chôros para flauta” e “chôros para saxofone” como explica Edinha Diniz, aqui:

O conjunto compreende três volumes, chamados ‘séries’, contendo dez peças cada, num total de 30 músicas, sendo 20 para sax e dez para flauta. O mais curioso é a designação choro para essas músicas impressas, uma vez que elas foram antes  concebidas, e algumas até publicadas, para piano, como ‘polcas’, ‘habaneras’ e ‘tangos’. Por que somente na década de 1930 uma compositora que estreou em 1877, e que sempre fora ligada às rodas de choro, atuando inclusive como pianista do conjunto Choro Carioca, liderado pelo compositor e flautista Joaquim Antonio Callado, usaria pela primeira vez a designação choro em sua obra impressa? Por que não antes?
Sabemos que a palavra choro designou, na década de 1870, o conjunto musical Choro Carioca, liderado pelo citado flautista Callado e, por extensão, os conjuntos instrumentais responsáveis pelo abrasileiramento das técnicas de execução dos instrumentos europeus. Em sua formação original, o choro era um grupo musical constituído de uma flauta, um cavaquinho e dois violões, com predominância de um solista. […] Somente mais tarde, o original estilo interpretativo dos gêneros musicais importados tornou-se ele próprio um gênero.

Joaquim Callado (1848-1880) dedicou a Chiquinha sua composição “Querida por todos”, gravada no disco abaixo, de Hercules Gomes. Hercules é um pianista que mistura os clássicos e os populares, tomando certas liberdades interpretativas que provavelmente seriam aprovadas nas rodas de choro de Joaquim Callado, Chiquinha Gonzaga, pixinguinha e Villa-Lobos. Já o outro disco, gravado por Paulo Moura e Clara Sverner, traz gravações mais sóbrias, fiéis aos textos e que parecem querer mostrar o quanto toda essa música é não somente dançante e alegre mas também sofisticada.

No tempo da Chiquinha
1. Gaúcho (O Corta-jaca) (Chiquinha Gonzaga)
2. Água do Vintém (Chiquinha Gonzaga)
3. Cintilante (Chiquinha Gonzaga)
4. Querida por Todos (J. Callado)
5. Cananéa (Chiquinha Gonzaga)
6. Atraente (Chiquinha Gonzaga)
7. Machuca!… (Chiquinha Gonzaga, Patrocínio Filho)
8. Não Se Impressione (forrobodó de Massada) (Chiquinha Gonzaga, Carlos Bettencourt/Luiz Peixoto)
9. Santa (Chiquinha Gonzaga)
10. Argentina (Xi) (Chiquinha Gonzaga)
11. No Tempo da Chiquinha (Laércio de Freitas)
12. Walkyria (Chiquinha Gonzaga)
13. Biónne (adeus) (Chiquinha Gonzaga)
Hercules Gomes – piano
Convidados: Rodrigo Y Castro (flauta) e Vanessa Moreno (voz)
Recorded: Estúdio Arsis, São Paulo, Brasil, fev/2018

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE – No tempo da Chiquinha (2018)

Vou Vivendo
1 Vou Vivendo (Benedito Lacerda, Pixinguinha)
2 Lamento (Pixinguinha)
3 Ingênuo (Benedito Lacerda, Pixinguinha)
4 Atraente (Chiquinha Gonzaga)
5 Amapá (Chiquinha Gonzaga)
6 Io T’Amo (Chiquinha Gonzaga)
7 Monotonia (Radamés Gnattali)
8 Samba-Canção (Radamés Gnattali)
9 Devaneio (Radamés Gnattali)
10 Fantasia (Ronaldo Miranda)

Clara Sverner – piano
Paulo Moura – saxofone
Recorded: Escola Nacional de Música, Rio de Janeiro, Brasil, jan/1986

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE – Vou Vivendo (1986)

PS: Todas as fotos desta postagem mostram a rua Riachuelo, onde Chiquinha Gonzaga viveu boa parte de sua vida. Antes chamada rua de Matacavallos, ela vai dos Arcos da Lapa até perto do Campo de Santana e Igreja de Santana, onde Chiquinha se casou aos 15 anos de idade (igreja demolida para a construção da Central do Brasil e Av. Pres. Vargas). Na rua de Mata-Cavallos também moraram Dom Casmurro e Capitu, Villa-Lobos e Pixinguinha. Em 1865 a rua recebeu o nome de Riachuelo em homenagem a uma batalha naval na nojenta guerra em que brasileiros e aliados massacraram homens, mulheres e crianças paraguaias. As fotos são respectivamente de 1915, 1928, 1958 e 1965. Ao fundo, na penúltima foto, vê-se o alto prédio da Mesbla, próximo da Cinelândia, inaugurado em 1934, quando Chiquinha ainda era viva.

Fui, cheguei aos Arcos, entrei na rua de Matacavallos. A casa não era logo alli, mas muito além da dos Invalidos, perto da do Senado.
(Machado de Assis – Dom Casmurro – grafia original)

Pleyel

.: interlúdio :. Ira Kaspi – You And The Night And The Music – Semana do Dia Internacional da Mulher

.: interlúdio :. Ira Kaspi – You And The Night And The Music – Semana do Dia Internacional da Mulher

Ira Kaspi é uma cantora finlandesa nascida em 1964. Não há novidades em sua música, é o velho, bom e elegante disco de jazz de cantora + uma competente banda de jazz + cordas. Os solos são dela, do pianista e do saxofonista. Mas como são bons esses finlandeses! Talvez a única surpresa seja o fato de tratar-se de canções autorais, quase todas compostas pelo grupo, mas sempre dentro daquele estilo fora de uma época determinada — quero dizer, são atemporais desde os anos 50… You and the Night and the Music é o 7º álbum de Ira. Suas gravações anteriores incluem álbuns em duo e um outro CD com suas próprias canções de jazz influenciadas pelo pop. Este aqui apresenta o quinteto Ira`s Jazz Diva Band e a Lohja City Symphonic Orchestra. Gostei de tudo, mas me entusiasmei especialmente por duas canções mais agitadas: Call Me Irresponsible e The Best Is Yet to Be Coming.

Ira Kaspi – You And The Night And The Music

1 Don’t Go To Strangers
Lyrics By – Redd Evans
Music By – Arthur Kent, Dave Mason*
4:36

2 You And The Night And The Music
Lyrics By – Howard Dietz
Music By – Arthur Schwartz
6:15

3 How Do You Keep Up The Light
Lyrics By – Ira Kaspi
Music By – Ape Anttila
3:50

4 Someday My Prince Will Come
Lyrics By – Larry Morey
Music By – Frank Churchill
4:35

5 The Gentle Rain
Lyrics By – Matt Dubey
Music By – Luiz Bonfa*
4:24

6 Call Me Irresponsible
Lyrics By – Sammy Kahn*
Music By – Jimmy Van Heusen
5:06

7 The Good Life
Lyrics By – Jack Reardon
Music By – Alexander Distel*
3:08

8 That Old Devil Called Love
Lyrics By – Doris Fisher
Music By – Allan Roberts
5:07

9 In The Wee Small Hours Of The Morning
Lyrics By – Bob Hilliard
Music By – David Mann (3)
4:28

10 The Best Is Yet to Be Coming
Lyrics By – Ira Kaspi
Music By – Ape Anttila
3:30

Arranged By – Ape Anttila, Mikko Hassinen
Bass Guitar, Percussion – Ape Anttila
Conductor – Esa Heikkilä
Drums – Markku Ounaskari
Orchestra – Lohja City Orchestra*
Orchestrated By – Mikko Hassinen
Piano – Mikael Jakobsson
Recorded By [Vocals] – Ape Anttila
Tenor Saxophone – Jussi Kannaste
Vocals – Ira Kaspi

BAIXE AQUI — DOWNLOAD HERE

Kaspi ficou feliz ao saber de sua estreia no melhor e mais tradicional blog de música brasileiro.

PQP

Diversos Compositores – Antologia de Intérpretes Femininas – Semana do Dia Internacional da Mulher

Diversos Compositores – Antologia de Intérpretes Femininas – Semana do Dia Internacional da Mulher

Ji Su Jung, percussionista

Marin Alsop, regente

Maria João Pires, pianista

Gina Bachauer, pianista

 

Nesta postagem especial preparada para homenagear as mulheres nesta semana do Dia Universal da Mulher, escolhi algumas excelentes intérpretes que representam a enorme e inestimável contribuição delas para a música.

Ji Su Jung

Começamos nosso programa com o Concerto para Marimba, escrito pelo jovem compositor norte-americano Kevin Puts. A solista chama-se Ji Su Jung, que foi a primeira percussionista a ganhar a prestigiosa bolsa Avery Fisher Career Grant. Formada pelo Peabody Institute, da Johns Hopkins University, e pela Yale School of Music, Ji Su Jung é agora uma solista requisitada universalmente e professora do Curtis Institute of Music e do Peabody Institute.

Marin Alsop

Sobre o Concerto, o compositor explicou como surgiu a inspiração: A melodia da abertura do Concerto foi provavelmente inspirada quando ouvi o aquecimento de um pianista no placo do Teatro Eastman enquanto por lá passava a caminho da aula. A tonalidade de mi bemol maior sempre me foi muito próxima devido à sua riqueza e também por aparecer com frequência nas obras de Mozart, em particular em dois de seus concertos para piano, que de certa forma serviram como modelo para a minha peça.

Ji Su Jung é acompanhada pela Baltimore Symphony Orchestra, regida pela maestrina Marin Alsop, que foi uma das primeiras a interpretar as obras de Kevin Puts.

M-J Pires

Como eu gosto muito de ouvir o piano, na sequência teremos uma linda Sonata de Schubert interpretada pela maravilhosa pianista Maria João Pires.

Com uma carreira longa e de excelente qualidade, passou pelas gravadoras Denon e Erato e tem sido uma das estrelas do selo amarelo, Deutsche Grammophon. Esta sonata de Schubert é uma das mais belas e faz parte de um lançamento que reúne algumas obras de Schubert gravadas por Maria João Pires.

Gina Bachauer

Para a última etapa da nossa compilação escolhi uma artista que chamou a atenção exatamente por desempenhar um papel que estava quase exclusivamente dominado por homens, interpretando grandes concertos para piano, como o Concerto em si bemol maior, de Brahms, o Concerto de Grieg, Concerto em mi bemol maior de Liszt e o Concerto em si bemol maior, de Tchaikovsky. Gina Bachauer nasceu em Atenas, de pais estrangeiros, e iniciou sua carreira na Grécia. Estudou em Paris com Alfred Cortot e nos anos 1930 trabalhou na França e na Suíça com Rachmaninov em seus Concertos para Piano. Ela tornou-se uma expoente nestes concertos, especialmente no de No. 3. Suas gravações para o selo Mercury são bastante conhecidas. Aqui podemos ouvir suas interpretações de algumas peças solo de Debussy e atuando como solista de um concerto de Mozart. A orquestra da gravação foi fundada pelo seu regente, Alec Sherman que foi o segundo marido de Gina Bachauer.

Kevin Puts (Nascido em 1972)

Concerto para Marimba (1997, ver. 2021)

  1. Flowing
  2. Broad and deliberate
  3. With energy

Ji Su Jung, marimba

Baltimore Symphony Orchestra

Marin Alsop

Franz Schubert (1757 – 1828)

Sonata para piano em lá maior, D. 664

  1. Allegro moderato
  2. Andante
  3. Allegro

Maria João Pires, piano

Claude Debussy (1862 – 1918)

Pour le piano

  1. Prélude
  2. Sarabande
  3. Toccata

Prelúdios

  1. La cathédrale engloutie
  2. Bruyères
  3. Danseuses de Delphes

Gina Bachauer, piano

Wolfgang Amadeus Mozart (1756 – 1791)

Concerto para piano No. 17 em dó maior, K. 453

  1. Allegro
  2. Andante
  3. Allegretto

Gina Bachauer, piano

London Orchestra

Alec Sherman

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE

MP3 | 320 KBPS | 268 MB

Maria-João Pires

Viva as mulheres!

Ji Su Jung

Sofia Gubaidúlina (n. 1931): Quinteto com piano / Introitus (Concerto para piano) / Dançando na corda bamba – Semana do Dia Internacional da Mulher

A esperança
dança
na corda bamba de sombrinha
e em cada passo dessa linha
pode se machucar
(Aldir Blanc / João Bosco)

Se a metáfora da esperança equilibrista foi lembrada pelos dois sambistas brasileiros no tempo da Anistia e de fim de uma ditadura (embora fim lento, gradual e com sigilo), a mesma metáfora ocorreu a Sofia Gubaidúlina logo após se mudar para a Alemanha, saindo de uma Moscou em colapso. Nas palavras da compositora, o título da obra Dancer on a tightrope se relaciona com um

desejo de se livrar das amarras da vida cotidiana. O desejo de voar pelo prazer do movimento, da dança e da virtuosidade estática. Um dançarino na corda-bamba é também uma metáfora para esta oposição: a vida como risco, e a arte como fuga para uma outra existência. O que me interessou nesta peça foi criar as circunstâncias para o jogo de contrastes no qual o ritmo preciso da dança do violino triunfa sobre o curso movimentado da parte para piano.

Os materiais usados por um dos grandes pianistas em atividade para tocar Gubaidúlina

Por exemplo, esse contraste é obtido pela deformação do ritmo ao se tocar sobre as cordas do piano com um cálice de vidro; pela gradual transformação destes sons harmônicos transparentes em fortissimo agressivo do cálice sobre as cordas graves do piano; pelo som ameaçador desse ritmo quando tocado pelo pianista que utiliza um dedal de costura de metal e, finalmente – o evento principal na forma da peça – pela passagem do pianista das cordas para o teclado. Todos esses eventos são dominados pelo violinista em uma dança extática.

O violinista Gidon Kremer foi importante na carreira de Gubaidúlina ao divulgar seu 1º concerto para violino e outras obras por todo o mundo. O 2º concerto para violino seria estreado em 2007 por Anne-Sophie Mutter. Kremer aparece neste disco de hoje da gravadora BIS, junto com pianistas não tão famosos como ele ou Mutter.

O concerto “Introitus” já foi postado e comentado por este mesmo Pleyel em 2018. Sigo com a opinião de que, junto com os não-concertos de Messiaen, são as melhores obras para piano e orquestra da segunda metade do século XX.

E o quinteto composto em 1957, quando Gubaidúlina era uma estudante em Moscou, me parece obra de alguém ainda com uma voz menos própria, mas parecida com a de Shostakovich e outros russos, mas enganos sempre são possíveis nesses juízos de valor.

Sofia Gubaidúlina (n. 1931):
1-4. Piano quintet (1957)
5. “Introitus” – Piano Concerto (1978)
6. Dancer on a tightrope (1993)

R. Aizawa, K. Vogler, M. Wang, U. Eichenauer, P. Bruns (1-4); B. Rauchs, Kyiv Chamber Players, V. Kozhukhar (5); G. Kremer, V. Sakharov (6). Recorded: 1995-1997

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE – mp3 320kbps

Gidon Kremer relaxa após passar pela corda-bamba sem sombrinha, com violino

Pleyel

Guiomar Novaes: transcrições & miniaturas, de Bach e Gluck a Villa-Lobos (+ a Fantasia Triunfal de Gottschalk)

Nossa homenagem ao saudoso Ranulfus continuará, também, através da republicação de suas preciosas contribuições ao nosso blog – como esta, que veio à luz em 11/5/2010.

Nota: esta postagem, assim como todas as demais com obras de Heitor Villa-Lobos, não contém links para arquivos de áudio com obras do gênio brasileiro, pelos motivos expostos AQUI


À medida em que avança a aventura de redescoberta de Guiomar Novaes, iniciada aqui há duas semanas, começo a ter a impressão de que seu legado de gravações é um tanto desigual: algumas são realizações gigantescas, cuja importância se percebe com absoluta certeza de modo intuitivo, mas alcança tão longe que temos dificuldade de explicar em palavras (do que ouvi até agora, é o caso das suas realizações de Chopin, especialmente os Noturnos); já outras são, digamos, meramente grandes…

Temos aqui as 7 peças curtas retiradas do CD Beethoven-Klemperer postado há alguns dias, mais o disco só de peças brasileiras (com certo desconto para Gottschalk) lançado em 1974 pela Fermata – creio que o seu último.

As primeiras parecem ter se firmado em sua carreira como standards no tempo dos discos de 78 rotações, que só comportavam peças curtas. Hoje qualquer pianista “sério” franziria o nariz pra esse repertório: “transcrições de concerto” de um prelúdio para órgão de Bach e de trechos orquestrais de Gluck e Beethoven. Ao que parece, no começo do século XX o fato de serem coisas agradáveis de ouvir ainda era tido como justificativa bastante para tocá-las.

Mas o que mais me surpreendeu foi à abordagem às 3 peças originais de Brahms: nada da solenidade que se costuma associar a esse nome; sem-cerimônia pura! Como também nos movimentos rápidos do Concerto de Beethoven com Klemperer, tenho a impressão de ver uma “moleca” divertindo-se a valer, e me pergunto se não é verdade o que encontrei em uma ou duas fontes: que a menina Guiomar teria sido vizinha de Monteiro Lobato, e este teria criado a personagem Narizinho inspirado nela!

Também me chamou atenção que Guiomar declarasse que sua mãe, que só tocava em casa, teria sido melhor pianista que ela mesma, e que tenha escolhido por marido um engenheiro que também tocava piano e compunha pequenas peças: Otávio Pinto. Casaram-se em 1922, ano de sua participação na Semana de Arte Moderna, ela com 27, ele com 32. Guiomar nunca deixou de tocar peças do marido em recitais mundo afora – nada de excepcional, mas também não inferiores a tantos standards do repertório europeu – e ainda no disco lançado aos 79 anos encontramos as Cenas Infantis do marido, além de uma peça do cunhado Arnaldo (Pregão).

Dados sem importância? Não me parece. Parecem apontar para que a própria Guiomar visse as raízes últimas da sua arte não no mundo acadêmico, “conservatorial”, e sim numa tradição brasileira hoje extinta: a (como dizem os alemães) Hausmusik praticada nas casas senhoriais e pequeno-senhoriais, paralela à arte mais de rua dos chorões, mas não sem interações com esta. Aliás, podem me chamar de maluco, mas juro que tive a impressão de ouvir evocações de festa do interior brasileiro – até de sanfona! – tanto no Capricho de Saint-Saëns sobre “árias de balé” de Gluck quanto no Capricho de Brahms.

Será, então, que podemos entender Guiomar como uma espécie de apoteose (= elevação ao nível divino) da tradição das “sinhazinhas pianeiras”? Terá ela querido conscientemente levar ao mundo clássico um jeito brasileiro de abordar a música?

E terá sido ao mesmo tempo um “canto de cisne” dessa tradição, ou terá tido algum tipo de herdeiro? Não sei, mas se alguém me vem à cabeça na esteira dessa hipótese, certamente não é o fino Nelson Freire e sim o controverso João Carlos Martins!

Para terminar: a vida inteira Guiomar insistiu em terminar programas com a ‘famigerada’ Fantasia Triunfal de Gottschalk sobre o Hino Brasileiro, que, honestamente, não chega a ser grande música. Acontece que, segundo uma das biografias, logo ao chegar a Paris, com 15 anos, Guiomar teria sido chamada pela exilada Princesa Isabel – ela mesma pianista – e teria recebido dela o pedido de que mantivesse essa peça sempre no seu repertório. E, curioso, ainda ontem o Avicenna postava aqui duas peças de Gottschalk como músico da corte de D. Pedro II (veja AQUI).

Será que isso traz água ao moinho da hipótese de Guiomar como apoteose e canto-de-cisne de um determinado Brasil? Bom, vamos ouvir música, e depois vocês contam as suas impressões!

Pasta 1: faixas adicionais do CD “Guiomar-Beethoven-Klemperer”
04 J. S. Bach (arr. Silotti) – Prelúdio para Órgão em Sol m, BWV 535
05 C. W. Gluck (arr. Sgambati e Friedman) – Danças dos Espíritos Bem-Aventurados, de “Orfeo”
06 C. Saint-Saëns: Caprice sur des airs de ballet de “Alceste”, de Gluck
07 J. Brahms – Intermezzo op.117 nº 2
08 J. Brahms – Capriccio op.76 nº 2
09 J. Brahms – Valsa em La bemol, op.39 nº 15
10 L. van Beethoven (arr. Anton Rubinstein) – Marcha Turca das “Ruínas de Atenas”

. . . . BAIXE AQUI – download here 

Pasta 2: disco “Guiomar Novaes”, Fermata, 1974
a1 Francisco Mignone – Velho Tema (dos Estudos Transcedentais)
a2 Otávio Pinto – Cenas Infantis
a3 Marlos Nobre – Samba Matuto (do Ciclo Nordestino)
a4 Arnaldo Ribeiro Pinto – Pregão (de Imagens Perdidas)
a5 J. Souza Lima – Improvisação
a6 M. Camargo Guarnieri – Ponteio
b1 H. Villa-Lobos – Da Prole do Bebê: Branquinha, Moreninha
b2 H. Villa-Lobos – O Ginete do Pierrozinho (do Carnaval das Criancas)
b3 H. Villa-Lobos – Do Guia Prático: Manda Tiro, Tiro, Lá; Pirulito; Rosa Amarela; Garibaldi foi a Missa
b4 L. M. Gottschalk – Grande Fantasie Triomphale sur l’Hymne National Brésilien Op. 69

. . . . BAIXE AQUI – download here 

Ranulfus

[restaurado com reverência e saudade por seu amigo Vassily em 4/3/2023]

Nelson com Guiomar Novaes. Foto do acervo particular de Nelson Freire, publicada pelo sensacional Instituto Piano Brasileiro