In Memoriam Arthur Moreira Lima – Coleção Meu Piano/Três Séculos de Música para Piano – Volumes 1, 3 & 12 (Clássicos Favoritos I, II & III)

Arthur Moreira Lima, um dos maiores brasileiros de todos os tempos (e percebam que nem mencionei seu instrumento!), completaria hoje 85 anos. Para celebrar seu legado extraordinário e honrar sua memória, publicaremos a integral da coleção Meu Piano/Três Séculos de Música para Piano – seu testamento musical – de hoje até 30 de outubro, primeiro aniversário de seu falecimento.

Se me perguntassem qual minha primeira memória de Arthur Moreira Lima, eu provavelmente lhes diria que ela é tão remota quanto a que eu tenho de um pianista. Nasci sob o Terror e cresci entre os ventos da Abertura que traziam de volta quem partira em rabos de foguete. Em minha casa ouvia-se muita música – nenhuma que atraísse cassetetes, e quase sempre daquela prevalente em elevadores e consultórios odontológicos. Ainda assim, era música bastante para que a aparição de um pianista na tela da TV, daquelas de antenas finamente ajustadas com palha de aço, não fosse sumariamente rechaçada por uma mudança de canal para a novela da vez. E o pianista, bem, ele era sempre o mesmo: aquele tipo de perfil pontiagudo, olhos a um só tempo alheios e dardejantes, de postura algo gibosa ao teclado e a drapejar sua cabeleira enquanto debulhava com os dedos coisas que eu não imaginava possíveis a mim, menino telespectador. Ele tocava de tudo, e em todo lugar, e ante centenas, milhares, dezenas de milhares de pessoas, e sozinho, e com orquestras, e em toda e qualquer companhia. No programa que teve na TV aberta, inimaginável nesses nossos tristes tempos de Tigrinho, dividiu a ribalta com chorões e roqueiros, seresteiros e jazzistas; mostrou-me Ney Matogrosso pela primeira vez de cara limpa, e apresentou-me o semideus Raphael Rabello, que toca, como Gardel canta para os argentinos, cada dia melhor. Entre um número e outro, com o maroto sotaque que nunca renegou seu berço, entrevistava seus convidados com muita descontração – tanta que promoveu o seguinte diálogo entre meus genitores:

– Esse é aquele pianista?
– É.
– Bem informal, hein?
– Sim.
– Nem parece pianista…

O programa saiu do ar sem-cerimoniosamente, e eu, exceto por um LP e outro que encontrava em briques, fiquei sem saber do madeixudo carismático, até o dia em que, exaurido por um plantão no pronto-socorro e disposto a tudo para ver algo que não fosse sangue ou pus, encontrei um palco montado no meio do maior parque de minha Dogville natal. Sobre ele, um piano, e ante este – sim, adivinharam! – o pianista que nem parecia pianista, e que, contrariando tudo o que se dizia dele – que não estudava, que não se levava a sério, que estava decadente – despachava com segurança os arpejos do Estudo Op. 10 no. 1 de Chopin sob o olhar tietante duns gatos-pingados aos quais me juntei, lá na fila do gargarejo. Emendou, em seguida, o “Revolucionário“, o “Tristesse“, o das Teclas Pretas, e foi esgotando o Op. 10, estudo a estudo, inteiros ou em parte, até que faltou somente…

– O número 2, Arthur.
– Hein?
– Faltou o número 2.
– Cê me odeia, né? – gargalhava – Mas certamente não tanto quanto eu odeio o número 2.

E atacou o temido Op. 10 no. 2, com aquelas escalas rapidíssimas todinhas com os dedos fracos da mão direita, enquanto resmungava das tendinites que ele lhe trouxera.

– Que mais cês querem?
– …
– Digam logo, que daqui a pouco vão me levar à força pro camarim.
– Piazzolla, então!

E nos deu um Adiós Nonino com a mesma eletricidade que pôs suas madeixas em riste na memorável capa do álbum que dedicou a Astor. Ao terminar, com o produtor já a olhar com ganas de arrancá-lo do palco, um dos gatos-pingados lhe alcançou um número de telefone:

– Volto hoje para o Rio – explicava-se, enquanto guardava o papelucho na casaca – mas não deixo de lhe ligar.
– A costela estava assando desde que saí de casa. Eu e ela te aguardamos.
– E a cerveja?
– Ela também. Mais gelada que em Moscou.

E sumiu para as coxias, de onde voltou para tocar um Tchaikovsky furioso com a Sinfônica de Dogville. Nunca soube se ele, enfim, telefonou para o churrasqueiro. Imagino que sim. Afinal, aquele ex-menino prodígio, de nobre arte forjada no Brasil e burilada na França e na União Soviética, sempre foi um grande agregador, capaz de dialogar com bolcheviques e mencheviques, maragatos e chimangos, cronópios e famas – e também um perfeito exemplo do que em minha terra de chama de “pau de enchente”, aquele tipo que, como os galhos de árvores levados pelas enxurradas, vai sempre parando aqui e ali e nunca perde a oportunidade de falar, ouvir e aprender.

– Decadente.
– Quê?
– Sim. Olha aí: tá vendendo disco na Caras!
– Eita…

O brasileiro não é gentil com seus heróis, e os mesmos que mais tarde o chamariam de “tiozão do caminhão” desancaram o Sr. Pau de Enchente quando ele lançou sua antologia pianística a preços módicos e acessível em qualquer banca de revista. Onde eles viam dinheirismo e decadência, eu, seu desde sempre tiete, só via generosidade – a mesma que o fez tocar para aquelas centenas, aqueles milhares, aquelas dezenas de milhares de gentes, a brilhar na TV e matar de inveja tantos colegas de ofício, a implodir o Muro da Vergonha entre o erudito e o popular, e que o levaria, com seu caminhão, a tocar para compatriotas que nunca tinham visto um piano na vida.

Eu nunca consegui lhe agradecer, que se dirá o bastante – se é que haveria gratidão suficiente para tanta dedicação aos ouvidos de seu país! Até tive oportunidades: afinal, tanto eu quanto o Tiozão do Caminhão escolhemos a mesma ilha para passar nossos últimos anos. Por algum tempo, inclusive, compartimos a mesma praia em que, vez que outra, nossos percursos se cruzavam. Numa delas, ele jogava bola com uma criança que, com um pontapé somado ao vigor do Vento Sul, mandou a redondinha na minha direção. Eu, que tenho dois pés esquerdos, devolvi-a com uma vergonhosa rosca para os devidos donos. Já me conformava com a ideia de ir buscá-la ainda mais longe, quando, antes mesmo dela quicar no chão, aquele torcedor doente do Fluminense Football Club aparou a pelota com um golpe seco que faria inveja ao Príncipe Etíope e, com um toque de letra digno de Super Ézio, devolveu-a à remetente.

– Valeu, meu bom!

Craque com as mãos e com os pés, o Pelé e o Garrincha do Piano Brasileiro, gênio da raça: também tocas cada dia melhor! Venero-te tanto que jamais te conseguirei ser crítico. Se os leitores-ouvintes o quiserem, que assim sejam – mas minha homenagem aqui, ela terá só carinho e saudade ❤️.

Em memória de Fluminense Moreira Lima (16 de julho de 1940, Rio de Janeiro – Florianópolis, 30 de outubro de 2024) em seu 85º aniversário.


 

MEU PIANO/TRÊS SÉCULOS DE MÚSICA PARA PIANO
Coleção publicada pela Editora Caras entre 1998-99, em 41 volumes
Idealizada por Arthur Moreira Lima
Direção artística de Arthur Moreira Lima e Rosana Martins Moreira Lima

VOLUME 1 – CLÁSSICOS FAVORITOS I

Johann Sebastian BACH (1685-1750)
Transcrição de Myra Hess (1890-1965)
Da Cantata “Herz und Mund und Tat und Leben“, BWV 147:
1 – Coral: Jesus bleibet meine Freude

Wolfgang Amadeus MOZART (1756-1791)
Da Sonata para piano no. 11 em Lá maior, K. 331:
2 –  Alla Turca: Allegretto

Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
Bagatela em Lá menor, WoO 59, “Für Elise”
3 – Poco moto

Carl Maria Friedrich Ernst Freiherr von WEBER (1786-1826)
Da Sonata para piano no. 1 em Dó maior, Op. 24:
4 – Rondo: Presto (“Perpetuum mobile“)

Robert Alexander SCHUMANN (1810-1856)
Das Fantasiestücke, Op. 12:
5 – No. 3: “Warum?”

Ferenc LISZT (1810-1886)
Dos Grandes Estudos de Paganini, S. 141:
6 – No. 3: La Campanella

Jules Émile Frédéric MASSENET (1842-1912)
De Thaïs, ópera em três atos:
7 – Méditation (transcrição do compositor)

Jakob Ludwig Felix MENDELSSOHN Bartholdy (1809-1847)
Da Música Incidental para Ein Sommernachtstraum (“Sonho de uma Noite de Verão”), de William Shakespeare, Op. 61:
8 – No. 9: Marcha nupcial (transcrição do compositor)

Pyotr Ilyich TCHAIKOVSKY (1840-1893)
Das Dezoito Peças para piano, Op. 72:
9 – No. 2: Berceuse

Sergei Vasilievich RACHMANINOFF (1873-1943)
Dos Morceaux de Fantaisie, Op. 3:
10 – No. 2: Prelúdio em Dó sustenido menor

Anton Grigorevich RUBINSTEIN (1829-1894)
Das Duas Melodias, Op. 3:
11 – No. 1: Melodia em Fá maior

Alexander Nikolayevich SCRIABIN (1872-1915)
Dos Doze Estudos, Op. 8:
12 – No. 12 em Ré sustenido menor, “Patético”

Achille Claude DEBUSSY (1862-1918)
Da Suite Bergamasque, L. 75:
13 – No. 3: Clair de Lune

Manuel DE FALLA y Matheu (1876-1946)
De El Amor Brujo, balé em um ato:
14 – Dança Ritual do Fogo (transcrição do compositor)

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE


VOLUME 3 – CLÁSSICOS FAVORITOS II

Johann Sebastian BACH (1685-1750)
Transcrição de Ferrucio Busoni (1866-1924)
Da Toccata e Fuga em Ré menor para órgão, BWV 565:
1 – Toccata

Giuseppe Domenico SCARLATTI (1685-1757)
2 – Sonata em Mi Maior, L. 23 (K. 380)

Carl Philipp Emanuel BACH (1714-1788)
3 – Solfeggietto em Dó menor, H 220, Wq. 117:2

Georg Friedrich HÄNDEL
Da Suíte para Teclado no. 5 em Mi maior, HWV 430:
4 – No. 4: Ária com Variações, “The Harmonious Blacksmith”

Ludwig van BEETHOVEN
5 – Seis Escocesas, WoO 83

Fryderyk Franciszek CHOPIN (1810-1849)
6 – Fantasia-Improviso em Dó sustenido menor, Op. 66

Gioachino Antonio ROSSINI (1792-1868)
Das Soirées Musicales:
7 – No. 8: La Danza (Tarantella Napolitana)

Felix MENDELSSOHN
Das Canções sem Palavras:
8 – Allegro non troppo (Op. 53 no. 2) – Allegretto grazioso (Op. 62 no. 6, Frühlingslied) – Presto (Op. 67 no. 4, La Fileuse)

Ferenc LISZT
Dos Liebesträume, Noturnos para piano, S. 541:
9 – No. 3 em Lá bemol maior

Edvard Hagerup GRIEG (1843-1907)
Do Peças Líricas, Livro III, Op. 43:
10 – No. 1: Papillon

Antonín Leopold DVOŘÁK (1841-1904)
Das Oito Humoresques, Op. 101:
11 – No. 7 em Sol bemol maior

Pyotr TCHAIKOVSKY
Das Estações, Op. 37a:
12 – No. 11: Novembro (Troika)

Sergey Sergeyevich PROKOFIEV (1891-1953)
Das Dez Peças para piano, Op. 12:
13 – No. 2: Gavota em Sol menor

Claude DEBUSSY
14 – La Plus que Lente, L. 121

Isaac Manuel Francisco ALBÉNIZ y Pascual (1860-1909)
Da Suíte Espanhola no. 1, Op. 47:
15 – No. 3: Sevilla

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE


VOLUME 12 – CLÁSSICOS FAVORITOS III

Johann Sebastian BACH
Concerto em Ré menor, BWV 974 (transcrição do Concerto para oboé de Alessandro Marcello):
1 – Allegro
2 – Adagio
3 – Allegro

Ludwig van BEETHOVEN
Transcrição de Ferenc Liszt (S. 464)
Da Sinfonia no. 5 em Dó menor, Op. 67:
4 – Allegro con brio

Franz Peter SCHUBERT (1797-1828)
Dos Improvisos para piano, Op. 90 (D. 899):
5 – No. 2 em Mi bemol maior

Robert SCHUMANN
6 – Arabeske em Dó maior, Op. 18

Ferenc LISZT
Das Soirées de Vienne d’après Schubert, S. 427:
7 – No. 6: Valse-caprice

Claude DEBUSSY
Das Deux Arabesques, L. 66:
8 – No. 1 em Mi maior

Christian August SINDING (1856-1941)
Das Seis Peças, Op. 32:
9 – No. 3: Frühlingsrauschen

Manuel de FALLA
De La Vida Breve, ópera em dois atos:
10 – Dança Espanhola no. 1 (arranjo do compositor)

Pyotr TCHAIKOVSKY
Das Estações, Op. 37:
11 – No. 6: Junho (Barcarola)

Sergei RACHMANINOFF
Dos Études-Tableaux, Op. 39:
12 – No. 9 em Ré maior

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE

Arthur Moreira Lima, piano

Gravações realizadas na Saint Philip’s Church em Londres, Reino Unido, em 1998
Piano Steinway and Sons
Engenheiro de som: Peter Nichols
Direção Musical, produção, edição e masterização por Rosana Martins Moreira Lima

Vassily

J. S. Bach (1685-1750): Concertos de Brandenburgo (completo) e Suítes Orquestrais (idem) (Pinnock)

J. S. Bach (1685-1750): Concertos de Brandenburgo (completo) e Suítes Orquestrais (idem) (Pinnock)

Mais um post do grande pai – dessa vez os deliciosos Concertos de Brandenburgo.  “Os Concertos de Brandeburgo ou Concertos de Brandenburgo (BWV 1046-1051, título original: Six Concerts avec plusieurs instruments, em alemão: Brandenburgische Konzerte) são uma coleção de seis peças musicais composta por Johann Sebastian Bach entre 1718 – 1721, dedicados e apresentados ao margrave de Brandenburg-Schwedt, Christian Ludwig em 1721. São amplamente considerados como expoentes do barroco na música, além de estar entre os clássicos mais populares. Estes trabalhos foram esquecidos na biblioteca do margrave até sua morte em 1734 quando foram vendidos por poucos centavos. Os concertos foram descobertos em arquivos de Brandemburgo no século XIX sendo publicados em 1850″ (wikipédia). Boa apreciação!

J. S. Bach (1685-1750): Concertos de Brandenburgo (completo) e Suítes Orquestrais (idem) (Pinnock)

DISCO 1

Brandenburg concerto No. 1 in F major, BWV 1046
01. 1 (Without tempo indication)
02. 2 Adagio
03. 3. Allegro
04. 4. Menuetto – Trio I – Polacca – Trio II

Brandenburg concerto No. 2 in F major, BWV 1047
05. 1. (Without tempo indication)
06. 2. Andante
07. 3. Allegro assai

Brandenburg concerto No. 3 in G major, BWV 1048
08. 1. (Without tempo indication)
09. 2. Adagio
10. 3. Allegro

Brandenburg concerto No. 4 in G major, BWV 1049
11. 1. Allegro
12. 2. Allegro
13. 3. Andante
14. 4. Presto

DISCO 2

Brandenburg concerto No. 5 in D major, BWV 1050
01. 1. Allegro
02. 2. Affetuoso
03. 3. Allegro

Brandenburg concerto No. 6 in B flat major, BWV 1051
04. 1. (Without tempo indication)
05. 2. Adagio ma non tanto
06. 3. Allegro

Orchestral Suite No. 1 in C major, BWV 1066
07. 1. Ouverture
08. 2. Courante
09. 3. Gavotte I-II
10. 4. Forlane
11. 5. Menuet I-II
12. 6. Bourrée I-II
13. 7. Passepied I-II

DISCO 3

Orchestral Suite No. 2 in B minor, BWV 1067
01. 1. Ouverture
02. 2. Rondeau
03. 3. Sarabande
04. 4. Bourrée I-II
05. 5. Polonaise
06. 6. Menuet
07. 7. Badinerie
08. 8. Ouverture

Orchestral Suite No. 3 in D major, BWV 1068
09. 1. Ouverture
10. 2. Air
11. 3. Bourrée
12. 4. Gigue

Orchestral Suite No. 4 in D major, BWV 1069
13. 1. Ouverture
14. 2. Bourrée I-II
15. 3. Gavotte
16. 5. Menuet I-II
17. 6. Réjouissance

The English Concert
Trevor Pinnock, regente

BAIXE AQUI — DOWNLOAD HERE

Bach em pleno turismo tropical
Bach em pleno turismo tropical

Carlinus

Dmitri Shostakovich (1906-1975): A Execução de Stepan Razin y otras cositas (Schwarz)

Dmitri Shostakovich (1906-1975): A Execução de Stepan Razin y otras cositas (Schwarz)

Este CD vale por Stepan Razin e pelo Cinco Fragmentos orquestrais preparatórios para a Sinfonia Nº 4. Outubro é uma música escrita para comemorar os 50 anos da revolução socialista e é um horror, data de uma época em que o relacionamento entre Shostakovich e o regime soviético ia muito mal.

A Execução de Stepan Razin, Op. 119 (1964), assim como a Sinfonia Nº 13, foi baseada em poemas de Ievtushenko. Trata-se de uma obra coral-sinfônica poderosa e pouco conhecida fora da Rússia, mas essencial para entender o compositor em sua fase mais sombria e politicamente carregada. Stepan Razin foi um líder cossaco do século XVII que liderou uma rebelião camponesa contra o czar e foi executado brutalmente. Tornou-se símbolo da resistência popular na cultura russa. Shostakovich usou texto do mesmo poeta de Babi Yar, mas aqui o foco é a violência do Estado e o sacrifício dos rebeldes. Composta durante o governo de Brejnev, a obra ecoa críticas indiretas à repressão stalinista (que Shostakovich sofreu). O baixo representa Razin (voz grave e heroica), enquanto o coro é o “povo” — alternando entre gritos de revolta e lamento. A orquestra cria cenas vívidas: cavalos galopando (trompetes), golpes de machado (tímpanos), o rio Volga (cordas graves). O clímax é aterrorizante: a execução é retratada com acordes dissonantes e um silêncio súbito; depois, o coro sussurra “E o rio flui…”, simbolizando que a luta continua. Há trechos que lembram músicas folclóricas e marchas militares, mas distorcidas — uma crítica à propaganda soviética que glorificava “heróis” enquanto perseguia dissidentes. Stepan foi banida de gravações por anos, pois autoridades viram na figura de Razin um paralelo com rebeldes modernos, claro.

Nos anos 1960, jovens russos viram Razin como um “Che Guevara” medieval. A obra ressurgiu em protestos contra autoritarismo, como, por exemplo, as manifestações na Bielorrússia em 2020. A curiosidade é que Shostakovich disse que compôs o final — onde a cabeça decepada de Razin rola pelo chão — inspirado em pesadelos.

Dmitri Shostakovich (1906-1975) – A Execução de Stepan Razin y otras cositas (Schwarz)

1. The Execution Of Stepan Razin, Symphonic Poem For Baritone Soloist, Mixed Chorus And Orchestra Op.119 (28:37)
Conductor Gerard Schwarz
Performer Charles Austin (Bass Baritone)
Ensemble Seattle Symphony Orchestra

2. October, Op.131 (13:10)
Conductor Gerard Schwarz
Ensemble Seattle Symphony Orchestra

Cinco Fragmentos, Op. 42 (10:35)
3. Moderato
4. Andante
5. Largo
6. Moderato
7. Allegretto
Conductor Gerard Schwarz
Ensemble Seattle Symphony Orchestra

BAIXE AQUI — DOWNLOAD HERE

Em imagem de Sergei Kirillov, Stepan Razin

PQP

Stephen Hartke (1952): The Horse with the Lavender Eye / Piano Sonata / The King of the Sun (Faria, Jewett, Bjerken, Los Angeles Piano Quartet)

Stephen Hartke (1952): The Horse with the Lavender Eye / Piano Sonata / The King of the Sun (Faria, Jewett, Bjerken, Los Angeles Piano Quartet)

Uma joia, uma maravilha esse CD. Música moderna do melhor nível. Fiquei entusiasmado com a qualidade do que ouvi e dos reconhecimentos que fiz. Ouvi My favorite things distorcida em meio às belas invenções desse Hartke. Não sabia nada acerca do autor e fui ver se havia alguma notícia biográfica ou entrevista do sujeito. Encontrei e a qualidade do ser humano não nega sua música. Um postura impecável frente à religião e… Bem, copio abaixo a entrevista e peço para vocês prestarem atenção a sua resposta para a pergunta de número 12.

Hartke is one of the most exciting contemporary composers, writing orchestral and chamber music that blends the most experimental aspects of concert music with simpler elements of folk songs, and the comprehensible structures of song forms. Listen to his piece “The King of the Sun.”

1. What’s the first piece of music you listened to today?
The sound of finches dive-bombing the windows of my house to pick off the moths that had taken refuge on the glass during the night.  I know this sounds rather like a John Cage sort of answer, and, to be honest, I don’t have much use for John Cage. The fact is, I don’t listen to recorded music every day. I rather think we hear too much music nowadays, and it ceases to be special. When I was younger, I certainly did listen to recordings a lot, and attended far more concerts, but now I’m more inclined to sit quietly and remember pieces or to flip through a score or play something. Later this morning, after the finch attack was over, I played through a couple of the Bach English Suites and a few Scarlatti sonatas.

2. What are your vices?
My musical vices include a fondness for unison orchestral doublings of flutes, oboes and clarinets. Some folks think I am overfond of natural harmonics in the strings, but there’s no twelve-step program for that (most string instruments can’t get past the eighth step partial anyway). I also take perverse and anachronistic delight in the vibraphone with the motor on.

3. What is one of your prejudices?
I heartily dislike popular culture, especially rock and roll.

4. In what way do you think music has the ability to change the way people live their lives?
This question suggests that you think that such an ability might be a good thing. I’m not so sure. Music makes life worth living, but I don’t know if it is because it might have a power to change someone’s life. Certainly most music written with a political purpose does not achieve its aim. The Three-Penny Opera was intended as a work of musique-engagee and was tremendously successful as a work of musical theater, but it did nothing to alter the course of German political or social life, more’s the pity.

5. At what age did you first feel distrust?
At the age of 54 when I was first posed this question by you.

6. What is the best piece of music you’ve ever created, in your opinion?
My favorites shift according to my mood and my ever-evolving perspective as I write more. However, at the moment I’m inclined to say “Cathedral in the thrashing rain.”

7. Right now, how are you trying to change yourself?
By relaxing.

8. If you had the time, what else would you do?
Learn a few more languages.

9. What social cause do you feel the most strongly about (negative or positive)?
Bringing an end to all superstition and releasing mankind from the thralldom imposed by religion.

10. What are your fears?
That religionists will hasten the demise of life on this planet through their vainglorious belief that the world was created for them by some sort of uber-parent.

11. What is your favorite joke (tasteful or tasteless)?
A nice old lady meets a 9-year old child and starts an innocent little chat.  “What do you want to be when you grow up?” she asks. The kid replies: “A dry-cleaner.”

12. Who is your favorite author?
Joaquim Machado de Assis

13. What is your favorite movie?
Fellini’s Eight and a Half

14. Favorite album(s) from the last few years?
The Complete Sacred Music of Henry Purcell (Hyperion)

15. What would you like to know more about?
Just about everything.

16. What is one thing you would like to do/see/accomplish before you die?
I’d like to visit Japan.

.oOo.

Stephen Hartke (1952):
The Horse with the Lavender Eye – Piano and Chamber Music

The Horse with the Lavender Eye (1997)
Episodes for Violin, Clarinet and Piano
1 I Music of the Left. Left-handed
2 II The Servant of Two Masters. Quite manic
3 III Waltzing at the Abyss. Gingerly, but always moving along
4 IV Cancel My Rumba Lesson. Two Left Feet

Selections from ‘Post-modern Homages’ (1984-92)
for Piano
5 Sonatina-Fantasia (1987). Giubilante
6 Gymnopédie No. 4 (1984). Suave
7 Template (1985). Presto
8 Estudo-Scherzo (1992). Presto-leggiero
9 Sonatina DCXL (1991). Boppin’ along

Sonata (1997-98)
for Piano
10 I Prelude. Massive
11 II Scherzo. Epicycles, Tap-dancing, and a Soft Shoe. Deft and lively
12 III Postlude. Floating

The King of the Sun (1988)
Tableaux for Violin, Viola, Cello and Piano
13 I Personage in the night guided by the phosphorescent tracks of snails. Stealthily
14 II Dutch interior. Phantasmagorical
15 III Dancer listening to the organ in a Gothic cathedral. Granitic
16 Interlude. Tempo of Movement I
17 IV The flames of the sun make the desert flower hysterical. Fiery
18 V Personages and birds rejoicing at the arrival of night. Quietly energetic, with an air of innocence

Richard Faria: clarinet
Xak Bjerken: piano
Ellen Jewett: violin
Los Angeles Piano Quartet

BAIXE AQUI — DOWNLOAD HERE

Stephen Hartke

PQP

Gustav Mahler (1860-1911): Sinfonia Nº 3 (Svetlanov)

Mais uma gravação de Svetlanov fazendo Mahler com músicos russos, mezzo-soprano russa, coro russo. Há momentos muito bons aqui, mas tanto os músicos como a cantora não alcançam as sublimes sonoridades da 3ª por Haitink, tanto a primeira com a Orquestra do Concertgebouw de Amsterdam em 1966 (aqui) como a última com a Orquestra da Rádio Bávara em 2016 (aqui).

Esta sinfonia, a mais longa do repertório sinfônico usual e atualmente uma das mais amadas pelos especialistas, se baseava inicialmente em um programa relacionado a uma relação panteista do ser humano com o mundo natural, relação que é alegre na maior parte do tempo mas alcança um momento de pensativo desespero no breve 4º movimento com solo de mezzo-soprano. As palavras ali são do Zaratustra de Friedrich Netzsche, que naquela década de 1890 alcançava ao mesmo tempo grande fama como escritor e, pessoalmente, vivia seus últimos anos internado com neurossífilis.

Múltiplas fontes indicam que Mahler era um leitor atento de Nietzsche, assim como de literatura russa, tendo recomendado a Schoenberg que estudasse menos contraponto e lesse mais Distoievsky. Em 1892, um ano antes de Gustav Mahler iniciar esta 3ª Sinfonia (que ele concluiu em 1896), uma publicação em Leipzig pelo Dr. Max Zerbst afirmava, sobre a popularidade do autor de O Nascimento da Tragédia e da Genealogia da Moral:

“Há dois Nietzsches. Um é o mundialmente famoso ‘filósofo na moda’, o brilhante poeta e mestre soberano da língua alemã e do estilo, de quem todos falam na atualidade e em cuja obra algumas frases de efeito mal-compreendidas se transformam em duvidoso patrimônio comum das pessoas ‘cultivadas’.” O outro Nietzsche corresponderia à real essência do autor, que ele (Zerbst) e seus colegas eruditos compreendiam ou pretendiam compreender. Se Mahler compreendia bem ou mal o filósofo, isso já é assunto para os biógrafos e, no fundo, um detalhe pouco relevante.

Imaginemos, em todo caso, que a leitura do irônico e inquieto Nietzsche ajudou Mahler a se afastar da pompa majestosa da música sinfônica da sua época (Wagner, Bruckner, Strauss…) Ou melhor dizendo: Mahler utiliza, quando lhe convém, os meios orquestrais lapidados por Wagner e Bruckner, aquelas sonoridades ainda mais brilhantes, grandiosas e luxuosas que as de Beethoven. Mas ele alterna, em cada uma de suas obras, essa orquestra grandiosa com momentos camerísticos, canções populares, de modo que o luxo parece conviver lado a lado com melodias que se ouvia na rua.

Em cada uma das suas sinfonias, e mais ainda nesta longa Terceira que às vezes parece uma versão secularizada da grandiosa Criação de Haydn, há momentos grandiosos, elevados, emocionantes. Mahler deixa claro que estudou bem as orquestrações de Berlioz e Wagner. Mas também, em cada uma das sinfonias, há quebras nessas espectativas monumentais. Em uma introdução para uma edição das canções (Lieder) de Mahler, Richard Specht mostra esse caráter duplo de Mahler:

“Nos séculos passados devia ser assim que cantavam soldados, pastores e camponeses nas feiras das pequenas cidades” e ao mesmo tempo a “admirável instrumentação alcança uma delicadeza, uma variedade no colorido orquestral que só a nossa época [Specht morreu em 1930], posterior a Wagner e a Berlioz, poderia conseguir.”

Gustav Mahler (1860-1911): Sinfonia Nº 3 (1896)
1. Kräftig. Entschieden (Strong and decisive) D minor to F major
2. Tempo di Menuetto Sehr mässig (In the tempo of a minuet, very moderate) A major
3. Comodo (Scherzando) Ohne Hast (Comfortable (Scherzo), without haste) C minor to C major
4. Sehr langsam—Misterioso (Very slowly, mysteriously) D major
5. Lustig im Tempo und keck im Ausdruck (Cheerful in tempo and cheeky in expression) F major
6. Langsam—Ruhevoll—Empfunden (Slowly, tranquil, deeply felt) D major
Russian State Symphony Orchestra
Evgeny Svetlanov, conductor
Olga Alexandrova, mezzo-soprano
Recording: Moscow, Large Hall of the Conservatory, 1994

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE

Svetlanov (1928-2002), grande especialista no repertório romântico tardio (Tchaikovsky, Glazunov, Mahler)

Pleyel

J. S. Bach (1685-1750): A Paixão Segundo Mateus, BWV 244 (Oberfrank)

J. S. Bach (1685-1750): A Paixão Segundo Mateus, BWV 244 (Oberfrank)

A Paixão Segundo Mateus (em alemão Matthäuspassion) é uma das grandes peças compostas pelo grande pai, Johann Sebastian Bach. Trata-se de uma das obras mais excelsas que o ser humano já teve a capacidade de criar. A beleza e a monumentalidade da obra é um desafio à nossa inteligência. Ela possui toda a sofisticação que somente alguém como o maior compositor da música ocidental teria condições de imprimir. Bach baseou-se no Evangelho segundo Mateus para retratar paixão de Cristo – o tema do sofrimento e da morte de Jesus. O compositor possivelmente escreveu a obra em 1727. Parece clichê afirmar isso, mas foi somente em 1829 com Mendelssohn, que houve um resgate esplendoroso da obra de Johann Sebastian. Foi assim que pela primeira vez a obra foi apresentada fora de Leipzig e isso mais de um século depois. Foi aclamada pelo público, assim como o restante da obra de Bach. A gravação que ora apresento não é a de um Tom Koopman, de um Klemperer, de um Gardiner, de um Harnoncourt ou de um Herreweghe. Tentei fugir dessa referência e trouxe essa interpretação alternativa com Géza Oberfrank pela imortal Naxos. Apreciemos. Permitamos que ela nos envolva e nos console.

Johann Sebastian Bach (1685-1750) – A Paixão Segundo Mateus, BWV 244

DISCO 1

01. Nr. 1 Chor mit Choral (Kommt, ihr Töchter, helft mir klagen!) (7:34)
02. Nr. 2 Rezitativ (Da Jesus diese Rede vollendet hatte) (0:33)
03. Nr. 3 Choral (Herzliebster Jesu, was hast du verbrochen) (0:47)
04. Nr. 4 Rezitativ und Chor (Da versammleten sich die Hohenpriester) (2:49)
05. Nr. 5 Rezitativ (Alt) (Du lieber Heiland du) (0:40)
06. Nr. 6 Arie (Alt) (Buß’ und Reu’) (4:14)
07. Nr. 7 Rezitativ (Da ging hin der Zwölfen einer) (0:30)
08. Nr. 8 Arie (Sopran) (Blute nur, du liebes Herz!) (4:47)
09. Nr. 9 Rezitativ und Chor (Aber am ersten Tage der süßen Brot) (1:48)
10. Nr. 10 Choral (Ich bin’s, ich sollte büßen) (0:50)
11. Nr. 11 Rezitativ (Er antwortete und sprach) (2:44)
12. Nr. 12 Rezitativ (Sopran) (Wiewohl mein Herz in Tränen schwimmt) (1:14)
13. Nr. 13 Arie (Sopran) (Ich will dir mein Herze schenken) (3:39)
14. Nr. 14 Rezitativ (Und da sie den Lobgesang gesprochen hatten) (0:56)
15. Nr. 15 Choral (Erkenne mich, mein Hüter) (0:59)
16. Nr. 16 Rezitativ (Petrus aber antwortete und sprach zu ihm) (1:01)
17. Nr. 17 Choral (Ich will hier bei dir stehen) (1:08)
18. Nr. 18 Rezitativ (Da kam Jesus mit ihnen zu einem Hofe) (1:32)
19. Nr. 19 Rezitativ (Tenor) mit Choral (O Schmerz!) (1:35)
20. Nr. 20 Arie (Tenor) mit Chor (Ich will bei meinem Jesu wachen) (5:25)
21. Nr. 21 Rezitativ (Und ging hin ein wenig) (0:42)
22. Nr. 22 Rezitativ (Bass) (Der Heiland fällt vor seinem Vater nieder) (0:47)
23. Nr. 23 Arie (Bass) (Gerne will ich mich bequemen) (4:27)
24. Nr. 24 Rezitativ (Und er kam zu seinen Jüngern) (1:13)
25. Nr. 25 Choral (Was mein Gott will) (1:27)
26. Nr. 26 Rezitativ (Und er kam und fand sie aber schlafend) (2:12)
27. Nr. 27 Arie mit Chor (So ist mein Jesus nun gefangen) (3:50)
28. Nr. 28 Rezitativ (Und siehe, einer aus denen) (2:02)
29. Nr. 29 Choral (O Mensch, bewein dein Sünde groß) (6:04)

DISCO 2

01. Nr. 30 Arie (Alt) mit Chor (Ach, nun ist mein Jesus hin!) (3:32)
02. Nr. 31 Rezitativ (Die aber Jesum gegriffen hatten) (0:52)
03. Nr. 32 Choral (Mir hat die Welt trüglich gericht’) (0:50)
04. Nr. 33 Rezitativ (Und wiewohl viel falsche Zeugen) (1:05)
05. Nr. 34 Rezitativ (Tenor) (Mein Jesus schweight zu falschen Lügen stille) (0:53)
06. Nr. 35 Arie (Tenor) (Geduld! Geduld!) (3:26)
07. Nr. 36 Rezitativ und Chor (Und der Hohepriester antwortete und sprach zu ihm) (2:03)
08. Nr. 37 Choral (Wer hat dich so geschlagen) (0:51)
09. Nr. 38 Rezitativ und Chor (Petrus aber saß draußen im Palast) (2:14)
10. Nr. 39 Arie (Alt) (Erbarme dich, mein Gott!) (7:06)
11. Nr. 40 Choral (Bin ich gleich von dir gewichen) (1:14)
12. Nr. 41 Rezitativ und Chor (Des Morgens aber hielten alle Hohepriester) (1:48)
13. Nr. 42 Arie (Bass) (Gebt mir meinen Jesum wieder!) (3:30)
14. Nr. 43 Rezitativ (Sie hielten aber einen Rat) (1:51)
15. Nr. 44 Choral (Befiehl du deine Wege) (1:12)
16. Nr. 45 Rezitativ und Chor (Auf das Fest aber hatte der Landpfleger Gewohnheit) (2:21)
17. Nr. 46 Choral (Wie wunderbarlich ist doch diese Strafe!) (0:47)
18. Nr. 47 Rezitativ (Der Landpfleger sagte) (0:11)
19. Nr. 48 Rezitativ (Sopran) (Er hat uns allen wohlgetan) (1:00)
20. Nr. 49 Arie (Sopran) (Aus Liebe will mein Heiland sterben!) (4:49)
21. Nr. 50 Rezitativ und Chor (Sie schrieen aber noch mehr und sprachen) (1:52)
22. Nr. 51 Rezitativ (Alt) (Erbarm es Gott!) (0:48)
23. Nr. 52 Arie (Alt) (Können Tränen meiner Wangen Nichts erlangen) (6:26)

DISCO 3

01. Nr. 53 Rezitativ und Chor (Da nahmen die Kriegsknechte des Landpflegers Jesum zu sich in das Richthaus) (1:01)
02. Nr. 54 Choral (O Haupt voll Blut und Wunden) (2:25)
03. Nr. 55 Rezitativ (Und da sie ihn verspottet hatten) (0:44)
04. Nr. 56 Rezitativ (Bass) (Ja! freilich will in uns das Fleisch und Blut) (0:32)
05. Nr. 57 Arie (Bass) (Komm, süßes Kreuz, so will ich sagen) (6:27)
06. Nr. 58 Rezitativ und Chor (Und da sie an die Stätte kamen mit Namen Golgatha) (3:22)
07. Nr. 59 Rezitativ (Alt) (Ach Golgatha, unsel’ges Golgatha!) (1:13)
08. Nr. 60 Arie (Alt) mit Chor (Sehet, Jesus hatdie Hand) (3:13)
09. Nr. 61 Rezitativ und Chor (Und von der sechsten Stunde an war eine Finsternis über das ganze Land) (2:02)
10. Nr. 62 Choral (Wenn ich einmal soll scheiden) (1:27)
11. Nr. 63 Rezitativ und Chor (Und siehe da, der Vorhang im Tempel) (2:14)
12. Nr. 64 Rezitativ (Bass) (Am Abend, da es kühle war) (1:24)
13. Nr. 65 Arie (Bass) (Mache dich, mein Herze rein) (7:44)
14. Nr. 66 Rezitativ und Chor (Und Joseph nahm den Leib) (2:20)
15. Nr. 67 Rezitativ (Solisten und Chor) (Nun ist der Herr zur Ruh gebracht) (1:37)
16. Nr. 68 Chor (Wir setzen uns mit Tränen nieder) (6:27)

József Mukk, evangelist
István Gáti, Jesus
Judit Németh, first Witness
Peter Köves, Judas
Péter Cser, Pilatos
Ferenc Korpás, First High Priest
Rózsa Kiss, Pilate’s Wife
Hungarian State Symphony Orchestra
Hungarian Festival Choir
Children’s Choir Of The Hungarian Radio
János Remémyi, chorus Master
Géza Oberfrank, regente

BAIXE AQUI — DOWNLOAD HERE

São Mateus, dizem.
São Mateus, dizem.

Carlinus

Franz Xaver Mozart (1791-1844), Leopold Mozart (1719-1789), Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791): The Mozart Family Album (The Chicago Sinfonietta, Freeman)

Franz Xaver Mozart (1791-1844), Leopold Mozart (1719-1789), Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791): The Mozart Family Album (The Chicago Sinfonietta, Freeman)

Claro que um álbum com este nome – The Mozart Family Album – deveria ser uma caixa de 200 CDs e não apenas um mero disquinho de 48 minutos, mas este é um CD simpático. Não é grande música, são antes as pequenas e divertidas obras da família. Wolfgang comparece com um fragmento de uma de suas partituras mais desconhecidas, a música para o balé Les Petits Riens, composta em junho de 1778, em Paris. A obra tem 20 movimentos, mas os que foram garantidamente escritos por W. A. Mozart são os cinco aqui presentes. Mais divertida é a sinfonia de Leopold, cujos gritos da orquestra me pregaram um susto ontem, depois da meia-noite. Um disco despretensioso e bom.

Franz Xaver Mozart (1791-1844), Leopold Mozart (1719-1789), Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791): The Mozart Family Album (The Chicago Sinfonietta, Freeman)

Franz Xaver Mozart – Piano Concerto n°2 in Eb major Op.25
1. Allegro Con Brio
2. Andante Espressivo
3. Rondo

Wolfgang Amadeus Mozart – Music from ”Le petit riens” KV299b
4. Allegro
5. Largo
6. Andantino
7. Larghetto
8. Gavotte

Leopold Mozart – Sinfonia in D ”Die Bauernhochzeit” – O Casamento dos Mendigos
9. Marcia Villanesca
10. Menuet
11. Andante
12. Menuet
13. Finale

Grant Johannesen (Piano)
Jacalyn Bettridge, bagpipes
The Chicago Sinfonietta
dir. Paul Freeman

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE

Leopold e Wolfgang estão presentes.

PQP

Johann Adam Birckenstock (1687-1733) / Franz Benda (1709-1786): Sonatas para Violino e baixo contínuo (Sans Souci)

Johann Adam Birckenstock (1687-1733) / Franz Benda (1709-1786): Sonatas para Violino e baixo contínuo (Sans Souci)

Um esplêndido e inesperado disco de música barroca. Também é uma raridade, tanto que não consegui em lugar nenhum a relação das faixas. Mas adorei ouvi-lo muitas vezes. O Ensemble Sans Souci é extremamente competente e dá vida aos desconhecidos Birckenstock e Benda. Sim, sei da família Benda.

Johann Adam Birkenstock foi um compositor e violinista alemão. Foi considerado um dos principais violinistas de sua época. Em Kassel, tornou-se músico da corte em 1708, onde permaneceu até 1722, quando embarcou em uma turnê pela Holanda. Lá, foi oferecido a Birkenstock um posto na comitiva do Rei de Portugal. Ele recusou a oferta e após seu retorno a Kassel foi nomeado Konzertmeister da capela local em 1725. Quando o Landgrave de Kassel morreu em 1730, Birkenstock mudou-se para Eisenach, onde também se tornou o Kapellmeister da corte.

Franz (František) Benda nasceu na Boêmia na povoação de Altbenatky. Tornou-se o fundador de uma escola alemã de tocar violino. Depois obteve um cargo na Capela Real de Dresden. Ao mesmo tempo, juntou um grupo de músicos que tocavam em festas, feiras, etc. Aos dezoito anos de idade Benda abandonou esta vida errante e retornou a Praga, indo depois para Viena, onde estudou violino com Heinrich Graun, um aluno de Tartini. Dois anos depois, foi nomeado mestre de capela em Varsóvia. Benda foi um mestre na arte de tocar violino. Tinha muitos alunos e escreveu uma série de obras, principalmente exercícios e estudos de violino.

Johann Adam Birckenstock (1687-1733) / Franz Benda (1709-1786): Sonatas para Violino e baixo contínuo (Sans Souci)

BAIXE AQUI — DOWNLOAD HERE

Benda foi bem feio, não?

PQP

J. S. Bach (1685-1750): Alles mit Gott (Gardiner)

J. S. Bach (1685-1750): Alles mit Gott (Gardiner)

Grande sucesso de vendas, este CD é um dos melhores lançamentos da discografia mais recente. Ignoro qual foi a inspiração ou motivação para este lançamento de grandes árias e corais de Bach, o que sei é que é um CD raro por sua qualidade e pela originalidade da coletânea. As maravilhosas vozes envolvidas e a orquestra de Gardiner garante um disco perfeito com seus mais notáveis momentos nas faixas 1, 7, 8 e 10. Obrigatório baixar este CD que foi presenteado ao blog por um de nossos leitores-ouvintes. Desconheço outra introdução melhor e mais “alternativa” à música vocal de meu pai. Repito: desconheço a história ou motivação deste disco, apenas atesto-lhe a imensa qualidade.

J. S. Bach (1685-1750): Alles mit Gott (Gardiner)

Alles Mit Gott Und Nichts Ohn’ Ihn, BWV 1127
1 Birthday Ode For Duke Wilhelm Ernst of Saxe-Weimar, 1713

Cello – Alison McGillivray
Lute – David Miller (7)
Organ – Silas John Standage*
Soprano Vocals – Elin Manahan Thomas
12:20
From The Bach Cantata Pilgrimage:
Himmelskönig, Sei Willkommen, BWV 182
2 No. 1 Sinfonia

Recorder – Catherine Latham
Violin – Maya Homburger
2:05
3 No. 2 Coro – Himmelskönig, Sei Willkommen 3:06
Widerstehe Doch Der Sünde, BWV 54
4 No. 1 Aria – Widerstehe Doch Der Sünde

Alto Vocals – Nathalie Stutzmann
8:08
Gott Ist Mein König, BWV 71
5 No. 7 Coro – Du Wolltest Dem Feinde 3:26
Mein Gott, Ach Wie Lange? BWV 155
6 No. 4 Aria – Wirf, Mein Herze, Wirf Dich Noch

Soprano Vocals – Joanne Lunn
2:19
Jesu, Der Du Meine Seele, BWV 78
7 No. 2 Aria (Duetto) – Wir Eilen Mit Schwachen

Alto Vocals – Robin Tyson
Soprano Vocals – Malin Hartelius
4:32
Singet Dem Herrn Ein Neues Lied, BWV 190
8 No. 5 Aria (Duetto) – Jesus Soll Mein Alles Sein

Bass Vocals – Peter Harvey
Tenor Vocals – James Gilchrist
Viola d’Amore – Katherine McGillivray
3:40
Süßer Trost, Mein Jesus Kömmt, BWV 151
9 No. 1 Aria – Süßer Trost, Mein Jesus Kömmt

Flute – Rachel Beckett
Soprano Vocals – Gillian Keith
10:01
Sehet! Wir Gehen Hinauf Gen Jerusalem, BWV 159
10 No. 4 Aria – Es Ist Vollbracht

Bass Vocals – Peter Harvey
Oboe – Xenia Löffler
7:31
11 No. 5 Choral – Jesu, deine Passion 1:40

Composer: Johann Sebastian Bach
Conductor: John Eliot Gardiner
Performer: Peter Harvey, Alison McGillivray, Rachel Beckett, David Miller, English Baroque Soloists

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE

PQP

.: interlúdio :. Claude Bolling Trio & Pinchas Zukerman – Suite for Violin & Jazz Piano Trio

Após o mega sucesso da Suite para Flauta e Piano Jazz Trio, Claude Bolling recebeu uma encomenda do violinista Pinchas Zukerman para fazer uma Suíte nos mesmos moldes, mas para seu instrumento, o violino. O resultado é este CD que ora vos trago, lançado lá em 1977, quando este que escreve estas linhas era apenas um jovem adolescente crescendo e absorvendo tudo o que ouvia e escutava, e desenvolvendo um gosto peculiar por música.

Mas enfim, Zukermann era um renomado violinista, já com várias gravações em seu currículo, em especial sua versão hoje considerada histórica do Concerto para Violino de Elgar, ao lado de seu amigo, Daniel Barenboim. Mas isso não vem ao caso. O que importa aqui é esse CD. Bolling nunca escrevera uma peça para violino solo, mas encarou o desafio. Quando ouvi este CD pela primeira vez achei o resultado meio irregular, mas em se tratando dos músicos envolvidos, resolvi dar mais uma chance, e que bom que fiz isso. Depois de alguns anos, encontrei o CD em um sebo e o ouvi com mais atenção.

Talvez o melhor momento dele seja a última faixa, ‘Hora’, um tour de force para os instrumentistas, e a ‘fuga’ inicial nos mostra um Zukerman um tanto receoso de exibir toda a sua energia e versatilidade, presentes, por exemplo, em suas gravações dos Concertos para Violino de Mozart. Entendo que como o Jazz não era a sua ‘praia’, ele não quis se expor muito. Como comentei acima, só depois de algumas audições comecei a perceber que Bolling dominava o disco, o violino de Zukerman por vezes soava apenas como um coadjuvante, de luxo, mas ainda um coadjuvante: na verdade,  a exuberância do piano de Bolling era a verdadeira estrela do disco. E só depois de entender isso, comecei a admirar mais este disco. Entendi que as gravações com Rampal me criaram uma expectativa tremenda com os outros projetos do incrível pianista, mas que as coisas não eram bem assim. Estou curioso para ouvir o disco com lendário trompetista Maurice André, um projeto futuro de postagem.

Enfim, que os senhores tirem suas próprias conclusões após ouvirem este disco. Deixem sua opinião nos comentários.

01.Romance
02.Caprice
03.Gavotte
04.Tango (with Viola)
05.Slavonic Dance (with A Swing)
06.Ragtime
07.Valse Lente
08.Hora

Claude Bolling – Piano
Pinchas Zukerman – Violino, Viola
Max Hediguer – Contrabaixo Acústico
Marcel Sabiani – Bateria

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE

Giuseppe Verdi (1813-1901): “Simon Boccanegra” – Ópera em prólogo e três atos (Gencer, Gobbi, Mazzoli, Picchi e Rossi)

Giuseppe Verdi (1813-1901): “Simon Boccanegra” – Ópera em prólogo e três atos (Gencer, Gobbi, Mazzoli, Picchi e Rossi)
Cena de ”Simon Boccanegra”, 21ª ópera de Verdi, com Mirella Freni e Piero Cappuccilli – “alla Scala” – Milão, 1971.

Após estreia de “Les Vêpres siciliennes” – Paris, junho/1855, Verdi e Giuseppina permaneceram mais seis meses na França, viajando às termas de “Enghien-les-Bains”… Período de repouso, após contratempos que envolveram sua ópera francesa… 

E de volta à Parma, reassumiam as lidas em “Sant’Agata”: “abandono total da música, um pouco de leitura e ocupações leves, com agricultura e cavalos”, escreveu Verdi a um amigo… Mas, em pouco tempo, tudo mudou. Convites de Veneza, Paris, Nápoles e Rimini demandaram nova ópera, “Simon Boccanegra”; música de ballet para produção francesa de “Il Trovatore” e revisão do libreto de “Rei Lear”; além do “rifacimento de Stiffelio”…

E se a índole para o trágico era traço marcante, a partir de “Rigoletto” aflorou fluente melodismo, de imenso apelo emotivo e reconhecimento de músicos consagrados, como Gioachino Rossini, que externou sua franca admiração a Verdi: “artista que se renovava e diferenciava no cenário europeu!”

“Simon Boccanegra” combina política, pelo nacionalismo e ideais do “risorgimento”, com afetos e perdas pessoais muito dolorosas, ou sejam, da amada morta e do desaparecimento da filha. Sentimentos muito caros a Verdi, que, invariavelmente, o levavam às lágrimas, sobretudo, memória da filha – Verdi perdera a família, quando jovem, esposa e dois filhos, num lapso de dois anos… E o tema histórico resgatava divergências entre nobres e plebeus, na Gênova do sec. XIV; sinalizando à união e fortalecimento dos sentimentos fraternos, no lugar dos ódios e ressentimentos… 

Luca Salsi, barítono, em “Simon Boccanegra” – Salzburg, Áustria, 2019.

Em “Simon Boccanegra”, Verdi afastou-se da forma tradicional – dos números encadeados, optando pela melodia contínua… Tema de escolha pessoal e do mesmo dramaturgo de “Il Trovatore”, o espanhol Garcia Gutiérrez, foi pontuado por música densa e sombria, pelas vozes graves e tons pessimistas; pela amargura dos protagonistas: Fiesco e Boccanegra… No entanto, final é sublimado pelo amor de dois jovens, Amélia e Gabriele, que simbolizam a esperança e perspectiva de melhores dias – através da transigência e do perdão; da concórdia e da aceitação do outro…

E o libreto, criado por Francesco Piave; alterado por Giuseppe Montanelli; e, mais tarde, revisado por Arrigo Boito, resultou, por fim, na versão de 1881, com a grande cena da “Câmara do Conselho” – música da maturidade de Verdi, escrita após “Aída” e a grande “Messa da Requiem”, portanto, preparando caminho para as últimas obras-primas: “Otello” e “Falstaff”, que se constituíram em derradeiras e contundentes contribuições, quando o músico era atacado pela jovem vanguarda italiana…

Entre os grandes trabalhos de Verdi, “Simon Boccanegra” obteve receptividade da crítica, embora reação comedida do público, talvez, decorrentes da densidade e caráter introspectivo do drama: “da música que não produz efeito imediato”, escreveu crítico veneziano… “elaborada com sofisticada habilidade, demanda concentração, assimilação e aprofundamento”…

Giuseppe Verdi, músico italiano, ativista do “risorgimento”.

Motivações

Após dois anos e meio na França, para composição de “Les Vêpres siciliennes”, estreia em junho/55; e mais 6 meses de descanso em “Enghien-les-Bains”, norte de Paris, Verdi, de volta à “Sant’Agata”, relatou ao amigo De Sanctis: “Aqui, meus negócios reduziram-se à quase nada. Com abandono total da música, reservo tempo para leitura e ocupações leves, com agricultura e cavalos…” 

E foi à Parma, assistir “I Puritani”, de Bellini. Também sugerir, ao ducado, participação em tratado internacional sobre direitos autorais, que reunia Inglaterra, França e Piemonte… Intransigente em questões nacionais, em Londres, havia recusado outra cidadania para obter benefícios, que não fosse a “parmigiana”: “Quero permanecer o que sou, vale dizer, um camponês de ‘Le Roncole’. E prefiro pedir ao governo de ‘Parma’ que faça um acordo com a Inglaterra”…

Vista de Turim, capital do Piemonte, Itália.

Também recebeu nova honraria da Sardenha-Piemonte: “Cavaleiro da Ordem de São Maurício e São Lázaro”… Victor-Emanuelle e seu obstinado reino não esmoreciam. Pelo contrário, seguiam em preparativos, através da organização econômica e da política externa de Cavour, na perspectiva da unificação e dos ideais do “risorgimento” – após derrota na “1ª guerra de independência”, marcada pelo simbólico “Levante de Milão”, de 1848…

E desde “Luiza Miller”, com estreia em Nápoles, 1849, Verdi aprimorava caracteres dramáticos e musicais dos personagens. De um lado, renovava a ópera, como drama lírico-musical; e de outro, reverenciava a tradição. Neste sentido, escreveu ao amigo Arrivabene, citando ‘Fígaro’, do “Barbeiro de Seviglia”, de Rossini: “não se trata de melodia ou harmonia, mas de palavra declamada, exata e verdadeira – isto é música!”

Giuseppe Verdi, carta de 17/03/1882, com referência à ‘Fígaro’, no “Barbeiro de Seviglia”, de Rossini.

E certa ocasião, em Paris, o escritor Marc Monnier relatou curioso encontro, no “Théâtre-Italien”, em récita de “Otello”, de Rossini: “Verdi evitava o centro do foyer, reservado às celebridades, ficando à parte, absorvido em pensamentos. Então, indaguei-lhe sobre a ópera de Rossini, ao que comentou sobre Shakespeare”… Distante e ensimesmado, evitou opinar sobre a música de Rossini e, há tempo, dedicava-se ao libreto de “Rei Lear”, com o dramaturgo Antonio Somma, o que ainda lhe ocupava a mente e aguardava música… Também, o drama de “Otello” lhe causava profunda impressão, vindo, mais tarde, transformar-se em ópera monumental…

Giuseppe Verdi e Gioachino Rossini, músicos italianos.

Então, Verdi viajou à Veneza, março de 1856, para acompanhar montagem de “La Traviata”, novamente encenada no teatro “La Fenice” e notável sucesso, após fracasso inicial… E escreveu ao poeta Francesco Piave da intensão de revisar “Stiffelio”… Também, ao amigo e empresario De Sanctis: “de minhas óperas ‘fora de circulação’, algumas, entendo, devo esquecê-las, pelos temas equivocados. Mas, há duas que não gostaria: ‘Stiffelio’ e ‘La battaglia de Legnano”…

Em resposta, Piave sugeriu montar “I Vespri siciliani” em Veneza, ao que Verdi concordou, mas em conjunto à revisão de “Stiffelio”. A proposta não se efetivou, mas revisão de “Stiffelio” sim e foi destinada à inauguração do novo “Teatro de Rimini”, em 1857…

E tal como em “La Traviata”, Verdi convidou Piave a instalar-se em “Sant’Agata” e agilizarem o trabalho, no lugar da tradicional troca de correspondência… E escreveu: “Venha rápido e, se puder, traga um ‘leone’, o que deixará Peppina encantada…” (gíria para cão ‘poodle’, presente à Giuseppina)… No entanto, Piave trouxe um “terrier maltês”, apelidado “loulou”, que logo se tornou membro da família e direito a retrato emoldurado…

Verdi e seus cães – “Blach, Yvette e Moschino”, em Sant’ Agata – gravura de Leopoldo Meticovitz, 1901.

Neste ínterim, surgiu outro tema: “Simon Boccanegra”, do dramaturgo espanhol, Antonio García Gutiérrez, mesmo autor de “Il Trovatore”, que ensejou nova ópera, também com libreto de Piave e montagem no teatro “La Fenice”, de Veneza…

“Simon Boccanegra”

A elaboração de “Simon Boccanegra” foi rápida e durante “rifacimento de Stiffelio”, que ao contrário da expectativa de Verdi, transformava-se em “verdadeira cruzada”, desde adaptação do contexto histórico, até nova música para o último ato… Daí, numerar-se os “rifacimento” de Verdi como novas óperas, dados extensão e complexidade do trabalho – caso de “Jérusalem”, em relação à “I Lombardi”…

Ilha do Lido – Veneza, Itália.

Trabalho realizou-se em meio a viagens, pois Verdi e Giuseppina decidiram por novo período de descanso: aproveitar o verão e o mar do Lido, em Veneza, por recomendação médica à esposa… E antes de partirem, Verdi propôs a Piave o novo tema, para elaboração de esboço e avaliação dos censores de Veneza. Assim, davam início ao trabalho e convite do teatro “La Fenice”…

E de Veneza, o casal seguiu viagem à França, para venda de imóvel adquirido por Verdi, em 1848, quando iniciaram relacionamento afetivo… Também, mover ação contra empresário que pretendia encenar “Rigoletto” e “La Traviata”, a partir de edições clandestinas espanholas – no entanto, perderam o caso, dado a fragilidade da legislação autoral… Para tanto, instalaram-se novamente nas termas de “Enghien-les-Bains”, norte de Paris…

Termas de “Enghien-les-Bains”, norte de Paris.

E Piave, motivado, mas se excedendo, pretendeu elaboração de sinopse completa de “Simon Boccanegra”. Ao que Verdi, impaciente, logo advertiu: “de que adianta terminar a história antes do final do mês? Será que a polícia e direção do teatro não tem esboço suficientemente detalhado?  Que importa se está em prosa, ou em verso?… Como você bem observou, este ‘Simon’ tem algo de original. E portanto, libreto, números e tudo mais, devem ser tão originais, quanto possível… O que não pode ser feito, sem que nos reunamos…” 

Temática de “Simon Boccanegra” absorveu tanto, que Verdi, ansioso e obstinado, decidiu solicitar alterações do libreto a Giuseppe Montanelli, escritor e revolucionário toscano, exilado na França… E o processo foi tão rápido, que, ao retornar à Parma, tinha a ópera praticamente concluída. Convite a Montanelli, no entanto, gerou desconforto com Piave que, por fim, concordou em assinar o libreto…

Ato 5, Cena 3, de Rei Lear, Shakespeare, séc. XIX. “Lear lamenta morte da filha Cordelia” – artista desconhecido.

Impasse com “Rei Lear”… “Le Trouvère”, em Paris

E Verdi, que decidira nunca mais escrever para Nápoles, após atropelos na estreia de “Luisa Miller”, sua 15ª ópera, reavaliou posição e considerou novo contrato com teatro “San Carlo”. Intensão era colocar música em “Rei Lear”, cujo libreto estava avançado. Para isto, retomou diálogo com Antonio Somma: “não estou convencido do 4º ato… E sei, não se deve impor tantos recitativos ao público… Não por simples capricho do compositor… Musicaria até um jornal ou carta, mas no teatro não funciona… Não estou seguro, algo não satisfaz… Por certo, falta brevidade e, talvez, maior clareza ou verdade”…

Também escreveu ao teatro napolitano, sobre características das vozes solistas: “barítono, especialmente bom, para ‘Lear’; soprano não dramático, mas expressivo, para ‘Cordélia’; bom contralto para o bobo; dois ótimos intérpretes secundários; e um tenor dramático…” Verdi tinha em mente o soprano Maria Piccolomini, de 24 anos, sucesso em Londres, em “La Traviata”, que aceitou o convite… Mas, diretoria do “San Carlo” não fechou contrato… E propuseram Rosina Penco, que Verdi admirava, mas não julgava apropriada para “Cordélia”…

Antonio Somma, dramaturgo e libretista de “Rei Lear” e “Ballo Maschera”, de Verdi.

E por falta de consenso, “Rei Lear” foi novamente adiada, sendo projeto que nunca efetivou-se: colocar música no drama shakespeariano… E Verdi passou a cogitar outro tema para Nápoles… Em Paris, trabalhava na composição de “Simon Boccanegra”, já destinada à Veneza… E outros convites surgiram. Então, assinou contrato para produção francesa de “Il Trovatore”, agregando música de “ballet” ao 3º ato, conforme tradição da “Grand Opéra”… E “Le Trouvère” estreou no “Opéra”, em 12/01/1857… No dia seguinte, Verdi e Giuseppina retornaram à “Sant’ Agata”, com a música de “Simon Boccanegra”, praticamente, concluída…

Para o músico, que escrevera ao amigo De Sanctis sobre “ocupações leves com agricultura e cavalos”, quem sabe, revisão de óperas anteriores, em pouco tempo, tinha escrito uma nova ópera – “Simon Boccanegra”; música de ballet para “Il Trovatore”, discutido libreto de “Rei Lear”, com Antonio Somma e preparava “rifacimento de Stiffelio”, que resultou em “Aroldo”, sua 22ª ópera…

A produção de “Le Trouvère” contou com Pauline Guéymard-Lauters, cantora belga que brilhou na Paris do séc. XIX… De grande extensão vocal, soprano e mezzo, Pauline atuou em “Don Giovanni”, de Mozart; “Der Freischutz”, de Weber; “Les Huguenots”, de Meyerbeer, e outras… Então, convidada para “Le Trouvère”, interpretou ‘Léonore’; e mais tarde, 1867, fez a ‘Princesa de Eboli’, em “Don Carlo”, outra ópera francesa, de Verdi…

Pauline Guéymard-Lauters, soprano belga, em 1865.

Convite do “Opéra” veio de François-Louis Crosnier, hábil diretor da sala, que havia coordenado estreia de “Les Vêpres siciliennes” e contornado diversos percalços… Entre eles, inusual fuga da prima dona e ruptura contratual, reivindicada por Verdi… Assim, o músico concordou na versão francesa, aproveitando tradução realizada por Émilien Pacini e apresentada no teatro “La Monnaie”, de Bruxelas, 1856… Verdi decidiu rápido, sobretudo, porque estava incomodado, por questões autorais, com Toribio Calzado, diretor do “Théâtre des Italiens” – celeuma sobre edições clandestinas espanholas, de “Rigoletto” e “La Traviata”…

Peculiaridades da música de ballet de Verdi tem sido observadas por musicólogos. Alguns, comparando-a ao fluente melodismo de Tchaikowsky – livres comparações, mas que remetem à qualidade… E os ballets, sobretudo em “Jérusalem” e “Aída”, são especialmente cuidados e característicos… Apresentação de “Le Trouvère” ocorreu na “Salle Le Peletier”, à época, “l’Opéra” de Paris, em 12/01/1857. A última récita contou com presenças do Imperador Napoleão III e esposa, dona Eugénie…

“Le Trouvère”, de Verdi – cena Ballet, direção de Robert Wilson – VERDI FEST – Parma, 2018.

Giuseppina Strepponi acompanhou, praticamente, toda a trajetória de Verdi. Desde sua 1ª ópera, “Oberto, conte di San Bonifacio”, estreada por ela, quando conheceu o jovem músico – Milão, 1839… Depois, cantou obra maior, “Nabucco”, sua 3ª ópera, que marcou nacionalismo de Verdi e adoção, pelo público italiano, como símbolo do “risorgimento”… E agora, testemunhava nova fase, de lirismo, originalidade e melodismo transbordantes; fase de plena criatividade e maturidade. E muito ainda viria, até “Don Carlo”, “Aída”, “Otello” e “Falstaff”, além da monumental “Messa da Requiem”…

Giuseppina Verdi Strepponi, soprano e 2ª esposa de Verdi.

Vida no campo e afeto pelos animais

Em contraste à vida cosmopolita de compositor de óperas – Europa do sec. XIX, Verdi era afeito ao meio rural, sempre retornando à tranquilidade de “Sant’ Agata”, interior de Parma, Itália… Algo mais difícil para Giuseppina, objeto de preconceito e maus tratos pela comunidade local – Giuseppina e Giuseppe não eram casados… O afeto pelos animais, no entanto, era permanente e, quem sabe, atenuante…

E Giuseppina encantou-se com encomenda de Verdi, a Piave: “meu ‘loulou’ branco é o mais lindo e sortudo cão. Aqui, governa a todos; e todos lhe obedecem…” Também Verdi apegou-se ao bichinho, conforme registro do cartunista Melchiore Delfico… E o carinho foi tão grande, que, vindo a falecer, “loulou” ganhou lápide em “Sant’ Agata”: “À memória de um de meus amigos mais fiéis”, colocou Verdi… 

Verdi e Loulou, caricatura de Melchione Delfico, 1858.

Naquele ambiente bucólico e interiorano, “loulou” incorporou-se à variedade local, que além de equinos e bovinos, incluía pavões, gatos, papagaios, faisões e galinhas… Com destaques para o irreverente “lorito” e os festivos “blach”, “yvette” e “moschino”, ativos cães “mastin”, acostumados às lidas do campo…

E digna de nota, foi intensa e bem humorada correspondência, em mais de 200 cartas, trocadas entre “blach” e “ron-ron”, cão do dileto amigo e editor, conde Oppradino Arrivabene… E não raro, “blach” confidenciava a “ron-ron” séria suspeita da sanidade mental do estranho secretário – espécie de ‘mordomo factotun’, cujo hábito era “desenhar centenas, quem sabe, milhares de ganchos em folhas papel”…

Através das cartas, cheias de ironia e simulações entre dois cães, Verdi conversava com Arrivabene, ambos do salão da condessa Clara Maffei, amiga, intelectual e ativista milanesa do “risorgimento”… Nelas, por vezes, o saudoso “blach” solicitava presença de “ron-ron” em “Sant’Agata”: “Amado irmão”… “você está tão errado em não me visitar, pois sempre o receberei com patas e mandíbulas abertas, além da ternura que só um cão pode oferecer!”

Retratos de Verdi e “Loulou”, em Sant’ Agata.

E noutras, mais ríspido, queixava-se: “por aqui, temos número bastante grande de imbecis, aos quais, volta e meia, batemos com as patas, para tentar colocá-los na linha”… E veja, “o maior deles, sem dúvida, é o ‘mordomo factotun’, que se continuar a rabiscar aqueles ganchos em folhas de papel, vou inscrevê-lo, definitivamente, numa ‘lista de loucos!”… (evidentemente, o suposto ‘mordono factotun’ era o próprio Verdi, falando de si mesmo através de ‘blach’…).

Ao longo dos anos, o afeto pelos cães acompanhou a família. E mais tarde, Verdi lamentou evelhecimento e debilidade de “blach”: “Meu pobre ‘blach’ está doente… mal se move e não viverá muito… Inevitavelmente, encomendei outro em Bologna, pois se ocorrer de escrever outro ‘Don Carlo’, não o farei sem colaborador desta espécie”… E, por fim, disse: “blach’ está morto!! De velho, sim, mas feliz demais (excesso de ‘macaroons’, talvez?…)” ‘Macaroons’ eram doces à base de coco ralado, claras de ovos, baunilha e açúcar…

Verdi e os festivos “Blach”, “Yvette” e “Moschino”, ativos cães “mastin”, de Sant’ Agata

Salão de Clara Maffei – Milão    

No centro de Milão, sec. XIX, casal de nobres, Clara e Andrea Maffei, amigos de Verdi e Giuseppina, movimentaram importante salão literário, reunindo artistas, intelectuais e, sobretudo, ativistas do nacionalismo milanês e do “risorgimento”… Com libreto de Andrea Maffei, Verdi compôs “I Masnadieri”, sobre texto de Schiller, sua 11ª ópera; além de revisarem “Macbeth”, sua 10ª ópera. E com Clara Maffei, prestigiada escritora, jornalista e tradutora, manteve intensa correspondência – em mais de 600 cartas…

Condessa Clara Maffei (1814-1886).

O salão de Clara reunia notáveis dramaturgos e artistas românticos, como Alessandro Manzzoni, Franz Liszt, Giovani Prati e, conta-se, Honoré de Balzac frequentou e dedicou-lhe “La fausse maitresse”, além de presenteá-la com textos originais… Entre os convidados mais próximos de Verdi, estavam Oppradino Arrivabene, Luciano Manara, Giulio Carcano e Francesco Hayez…

Ironicamente, o notável salão foi meio de compensar frustrações no casamento, oportunizando à Clara, vida social, intelectual e política… E a continuidade da crise, somada às divergências ideológicas, por fim, levaram o casal Maffei à separação… Da qual, Giuseppe Verdi e Giulio Carcano compareceram, oficialmente, como testemunhas…

Carlo Tenca, jornalista e ativista no “risorgimento”.

E com passar do tempo, Clara aproximou-se afetivamente do escritor, jornalista e revolucionário, Carlo Tenca, apresentado por Verdi… Tenca defendia os ideais de Cavour e projeto da Sardenha-Piemonte, como líder da unificação. De outro, divergia de Giuseppe Mazzini, outro líder no âmbito do “risorgimento”, levando alguns ativistas afastarem-se do salão… Também dirigiu a “rivista Europea” e fundou o semanário “Il Crepuscolo”. Com a unificação e a nova ordem institucional, foi eleito para o parlamento milanês, priorizando projetos para educação…

Opositora ferrenha da presença austríaca e atuante no “levante de Milão”, de 1848, Clara integrou grupo de 50 mulheres que cuidaram dos feridos… Posteriormente, na retomada pelos austríacos e sob ameaça de prisão, exilou-se na Suiça… E em 1859, após nova campanha do “risorgimento” – “2ª guerra de independência”, com decisivo e exitoso apoio da França, retornou à Milão… Então, instaurava-se a monarquia italiana, com Victor-Emanuelle, da Sardenha-Piemonte, na regência; e através das ações militares de Garibaldi, gradualmente, consolidava-se a unificação…

Laura Mancini, poetisa e ativista no “risorgimento”.

Muitas mulheres, entre escritoras, jornalistas e poetisas destacaram-se no movimento revolucionário. Entre elas, Maria Giuseppa Guacci e Laura Beatrice Mancini, quando o Salão Maffei tornou-se sede militar e hospital… Também, a obstinada Cristina Trivulzio di Belgiojoso – “mulher de cinco vidas” – e a jornalista americana Margaret Fuller, atuaram intensamente, além de inúmeras heroínas anônimas…

E na “1ª guerra de independência”, a brasileira Anita Garibaldi lutou na tomada de Roma, quando os revolucionários expulsaram o papa Pio IX, obrigando-o a refugiar-se na Sicilia. Anita morreu grávida, na retirada das tropas, após derrotas de Garibaldi e Mazzini para austríacos, franceses e espanhois, que vieram em apoio do papa – pelos acordos firmados no “Congresso de Viena”, de 1815, após queda de Napoleão… Durante aquela efêmera república, Verdi se fez presente e estreou “La Battaglia di Legnano”, sua 14ª ópera, especialmente composta para Roma, em meio ao entusiasmo vigente, 1849…

Por fim, no 31/12/1859, após expulsão definitiva dos austríacos da Lombardia, realizou-se em Milão entusiástica e memorável celebração: “Feliz ano novo da redenção italiana! Viva Itália!” 

Comemorações no “risorgimento” – “Via Itália!”

E novos ares sopraram na península – “scapigliatura”… A partir de 1860, Clara retomou seu salão literário e passou a receber os “scapigliati” (livre tradução para “boêmios ou desalinhados”) – nova intelectualidade milanesa, entre eles, Arrigo Boito, aos quais chamava “meus queridos filhos”, que durou até cerca de 1880… Curiosamente, uma geração extremamente crítica do romantismo em voga, a que chamavam: “do conservadorismo lânguido e artificial; do provincianismo do ‘risorgimento’ e dos homens do passado”…

“Camisas vermelhas”, liderados por Garibaldi, no “risorgimento”.

Embora lutado junto aos “camisas vermelhas”, de Garibaldi, “scapigliati” defendiam renovação imediata da cultura italiana, quando ainda se consolidavam a unificação e a nova monarquia, então, resultantes de sacrifícios e esforços inauditos… Tal acolhimento à vanguarda trouxe desconfortos a Clara, que valorizou o debate com jovens intelectuais, pelos liberalismo e perspectiva futura, mesmo em detrimento do que representaram os incansáveis patriotas do “risorgimento”, em suas obstinação e heroismo…

“Scapigliatos”: Emilio Praga, Carlo Dossi e Luigi Conconi.

O movimento se espelhava em ETA Hoffmann, Jean Paul, Heine, Allan Poe e, sobretudo, Baudelaire. E foi precursor dos naturalismo, simbolismo e do decadentismo de Gabrieli D’Annunzio, com atenções ao patológico, ao macabro e ao deformado… Outra ala, “scapigliatura democratica”, foi precursora dos movimentos anarquistas e socialistas italianos. Sem manifesto formal, o movimento se expandia por concepções afins ou semelhantes, através das obras publicadas…

Complexo e diversificado no âmbito do comportamento, os “scapigliati” cultivavam liberdade, desregramentos e uso de substâncias, que não raro levavam às depressões e suicídios; além do abandono, doenças e mortes precoces… Mais tarde, entre seus jovens artistas, Giacomo Puccini filiou-se, estimulado por Arrigo Boito, contribuindo com as óperas “Le Villi” e “Edgar”; e depois, retratando o movimento em “La Bohème”…

Franco Faccio, músico, introduziu a ópera wagneriana, na Itália.

Abertos à influência externa, os “scapigliati” introduziram as óperas de Wagner, na Itália, dirigidas por Franco Faccio. Esteticamente, rejeitaram Verdi e depois foram rejeitados pelos “veristas”, que priorizavam os personagens comuns, da pequena burguesia e da pobreza; do realismo de seus dramas e paixões, em geral, marcados pelas impulsividade, rusticidade e violência; no lugar das temáticas históricas e míticas…

Apesar ou por ser artista proeminente, sem nenhuma condescendência, Verdi foi exposto à “fritura artística”, como ícone da velha cultura, a ser esquecida e superada… Mais tarde, no entanto, o músico “deu o troco” e surpreendeu a todos, colocando a “vanguarda em apuros” – haviam subestimado, de forma apressada, o velho mestre…

E coube a Arrigo Boito, de um lado, perceber o equívoco; e à perspicácia de Verdi, de outro, em aguardar… E gradual aproximação ocorreu entre ambos, através do editor Giulio Riccordi e do maestro Franco Faccio. Inicialmente, pela revisão de “Simon Boccanegra” e, depois, pelas composições de “Otello” e “Falstaff”, comprovando-se o dito: “más sabe el diablo por viejo, que por diablo”…

Arrigo Boito e Giuseppe Verdi.

Açodamentos entre Verdi e Piave…    

A música de “Simon Boccanegra” foi praticamente concluída em Paris… E para adaptações do libreto, Verdi pediu a Giuseppe Montanelli, nacionalista toscano exilado, realizar alterações consideráveis. Então, escreveu à Piave: “Eis o libreto, abreviado e alterado… Você pode assiná-lo ou não, como lhe aprouver… Se sentir-se perturbado, também eu me encontro e, talvez, mais do que você, mas tudo que posso dizer é: foi uma necessidade!” 

Giuseppe Montanelli, advogado e escritor, colaborou em “Simon Boccanegra”.

Montanelli, advogado e escritor, atuou na revista florentina “Antologia” e fundou o jornal “L’Italia”, que pregava “reforma da nacionalidade”… Revolucionário toscano, lutou e foi preso pelos austríacos nos levantes de 1848… Libertado em 1849, voltou a conspirar, formando, com Mazzini e Guerrazi, novo governo provisório – “triúnvirus da Toscana”, aliado da recente república romana, proclamada por Mazzini e Garibaldi… Todos, movimentos reprimidos por austríacos, franceses e espanhóis, em apoio ao papa Pio IX, na malograda “1ª guerra de independência”. Então, Montanelli exilou-se na França, apoiou autogolpe de Napoleão III e colaborou com Verdi no libreto de “Simon Boccanegra”… 

Por seu lado, Verdi tornara-se símbolo do “risorgimento”, pela adesão política e popularidade de suas óperas… Sobretudo nos coros, como dos escravos hebreus, em “Nabucco”, exortava: “Va, piensero, sull’ali dorate… Oh, mia patria, si bella e perduta!” (“Voa, pensamento, em asas douradas… Oh, minha pátria, tão bela e perdida!”). Versos de Temistocle Solera eternizados na música de Verdi, que acalentavam sonhos de liberdade, cantados nos teatros e pelas ruas da Itália… Em 1859, novo e definitivo levante foi deflagrado, com apoios de França e Prússia, mudando definitivamente mapa político da península e conquistando a almejada unificação… 

Charge – Reunião de nacionalistas – “risorgimento”.

Evidentemente, a revisão de Montannelli causou desconfortos a Piave. Mas, dado a velha parceria e temperamento afável, Piave, por fim, assinou o libreto. Em fevereiro/1857, viajaram à Veneza. E Piave fora encarregado da produção e efeitos cênicos. Mas, não bastando revisão do libreto, à sua revelia, foi novamente atropelado por Verdi, que desenvolvera concepções próprias, enquanto compunha a música… E detalhou série de observações sobre cenários, iluminação e movimentos dos personagens, ignorando Piave, a quem restou, novamente, acatar…

Francesco Maria Piave, libretista de “Rigoletto”, “La Traviata”, mais oito óperas de Verdi.

Possivelmente, o afastamento imposto por Verdi, em Paris, durante a composição, impediu o libretista de acompanhar processo criativo, concepção dramática e natural troca de impressões… Após estreia, no entanto, Piave voltou a revisar o libreto a pedido de Verdi, que seguia insatisfeito… A ópera foi encenada em 12/03/1857, no “La Fenice”. E o teatro veneziano tornou-se palco de mais uma importante estreia verdiana, junto com “Rigoletto” e “La Traviata”, que também tiveram libretos de Piave…

Nascido em Murano, Piave compartilhou os ideais do “risorgimento”. E nos levantes de 1848, pegou em armas e lutou em Veneza, de onde informava o eufórico Verdi, que exclamava: “Cidadão Piave!!” Como libretista, colaborou com Giovani Pacini, Federico Ricci, Saverio Mercadante e outros… Além de poeta e libretista, foi jornalista e tradutor; também, diretor de palco do teatro “La Fenice” e, mais tarde, do teatro “alla Scala”, por indicação de Verdi… Personalidade flexível e conciliadora, ao contrário de Verdi, foi habilidoso negociador em tratativas com teatros e censores…

Mais tarde, Verdi convidou Piave para libreto de “Aída”, mas acometido por derrame, este ficou paralisado e impedido de falar… Nesta fase, Verdi ajudou na manutenção da família e, por fim, arcou com funeral, quando do falecimento do poeta, aos 65 anos… Quanto ao ativismo no “risorgimento”, Verdi não pegou em armas, mas empenhou-se, política e diplomaticamente, pelo apoio da França, além do fomento do sentimento nacional, através do simbolismo – poderoso e unificador – da música…

Amigos e parceiros antigos, Verdi acostumou-se com temperamento resiliente e submisso de Piave. Então, frequentemente, se excedia… E com Piave, praticamente, parte dos “móveis e utensílios de Sant’Agata”, foram escritas ou revisadas dez óperas: “Ernani”, “I due Foscari” e “Macbeth”, com revisão de Andrea Maffei; “Il Corsaro”, “Stiffelio”, “Rigoletto” e “La traviata”; “Simon Boccanegra”, com alterações de Montanelli e, mais tarde, de Arrigo Boito; “Aroldo” – “rifacimento de Stiffelio”; e por fim, “La forza del Destino”… Por conta disso, Piave foi libretista de imensos sucessos e quem mais colaborou com Verdi…

“Giuseppe Verdi compone lotello nella sua testa.”

Estreia de “Simon Boccanegra”

Na estreia de “Simon Boccanegra”, 12/03/1857, elenco atuou com galhardia e qualidade, formado pelo barítono Leone Giraldoni, no papel principal; soprano Luigia Bendazzi, como ‘Maria’; tenor Carlo Negrini, como ‘Gabrieli’; e o baixo Giuseppe Echeverria, como ‘Fiesco’. Mas, a ópera não empolgou a plateia, que se manteve atenta, embora, sem rasgos de euforia… E a crítica, da “Gazzetta Privilegiata di Venezia”, escreveu: “Quanto à música é do tipo que não produz efeito imediato… pois, trata-se de música elaborada, escrita com mais sofisticada habilidade, que demanda assimilação e estudo detalhado”…

Interior do teatro “La Fenice”, Veneza, Itália

Assim, percepção foi de pesada e soturna concepção musical, com ausências de variedade e brilho… O que era, precisamente, intenção de Verdi, ao propor extremas densidade e circunspecção… Também, a crítica registrou: “manifestações desabonadoras foram de estrangeiros, não da plateia veneziana…” E suspeitou-se de claque organizada contra Verdi – muito característica do ambiente competitivo e desleal dos teatros de ópera do sec. XIX, ao que Verdi, em geral, respondia com surpreendente criatividade….

Mas, ignorando tais suspeitas, Verdi deteve-se em algo que pensara do fracasso inicial de “La Traviata”, ao escrever a Vicenzo Torelli: “Pensei ter composto algo razoavelmente bom, mas aparentemente estava enganado… Veremos, com passar do tempo, quem errou…”  E pior, sobraram para Piave as críticas ao libreto, então modificado, à sua revelia, por Verdi e Montanelli….

Também circulou boato que Verdi teria escrito o libreto, deixando-o bastante irritado e confuso… E Verdi, de forma aleatória, suspeitou de Piave, cobrando do libretista, que tentou defender-se… Então, sentindo-se injusto, escreveu a Cesare Vigna: “será que os venezianos já se acalmaram? Quem poderia imaginar, esta pobre ‘Boccanegra’ provocar confusão dos diabos?… Boato de que escrevi o libreto é o fim!!… (mas, Verdi piora as coisas) … libreto que traz nome de Piave já se julga, previamente, como a pior poesia possível. Quisera eu escrever versos tão bons como ‘viene a mirar la cerula…’ ou …’delle faci jastanti al barlume’… Confesso, em minha ignorância, não seria capaz de fazê-los…” 

“Simon Boccanegra”, Ato 3 – Cenografia de Girolamo Magnani, p/ revisão de 1881

Em “Simon Boccanegra”, o músico afastou-se da forma tradicional – dos números encadeados, preferindo a melodia contínua… A ópera é marcada pelos tons escuros e pessimistas, pela amargura dos personagens, apesar do final alentador, da união de Amélia e Gabriele… E, de volta à “Sant’ Agata”, seguia insatisfeito, mas aproveitou os dias ensolarados para caminhar pelos campos e bosques; também interagir com campesinos e animais, sempre aludindo “aos de quatro patas” serem os melhores companheiros… 

E novamente chamou Piave, que retornou à “Sant’ Agata” para revisão de “Simon Boccanegra”. Também concordou em montar e dirigir a ópera em Reggio Emilia, onde obteve sucesso e adquiriu maior confiança; o mesmo sucedendo em Nápoles, no ano seguinte, 1858… Mas, na montagem de Milão, outro fracasso…

Verdi e o teatro “alla Scala” – Milão

Famoso teatro milanês foi palco da estreia do jovem Verdi, aos 26 anos. Também, de grande entusiasmo nas estreias de “Nabucco” e “I Lombardi”… Mas, da 2ª ópera, comédia “Un giorno di Regno”, Verdi guardou profunda mágoa. Não pela falta de receptividade, pois a considerava trabalho menor; mas porque era sabido, pela imprensa e por todos, da tragédia em sua vida pessoal…

Margherita Verdi Barezzi, 1ª esposa de Verdi.

Verdi perdera dois filhos e a esposa, num lapso de dois anos… Esperava, pelo menos, silêncio respeitoso na estreia de “Un giorno di Regno”, mas o público manifestou-se como sempre, aplaudir ou vaiar ao sabor do que via e ouvia… E “Un giorno di Regno” foi um fracasso. Assim, prudência e distanciamento tornavam-se aconselháveis, diante de tão impessoal e imprevisível comportamento… E da produção de “Simon Boccanegra”, em 1859, Verdi escreveu ao editor Tito Riccordi:

“O fiasco de ‘Boccanegra’, em Milão, tinha de acontecer e aconteceu. Um ‘Boccanegra’ sem ‘Boccanegra’!! Corte a cabeça de um homem e depois reconheça-o, se puder… Você está surpreso com a falta de decoro do público? Eu não estou surpreso, em absoluto. O público sempre fica feliz com um escândalo! Aos 25 anos, tinha ilusões e acreditava na cortesia da platéia; um ano depois, meus olhos se abriram. E percebi com o que tinha de lidar…”.

“As pessoas me fazem rir quando dizem, me repreendendo, que devo muito a esta ou aquela platéia! É verdade, no ‘Scala’, um dia, aplaudiram ‘Nabucco’ e ‘I Lombardi’. Mas, fosse pela orquestra, cantores, coro e produção, as récitas, em sua totalidade, não mereciam aplausos… E pouco mais de um ano antes, a mesma platéia tratou mal a ópera de um jovem pobre e doente, infeliz e com coração partido por terríveis acontecimentos… E todos sabiam, o que não os fez se comportarem com cortesia…”

Fachada do teatro “Alla Scala”, de Milão, Itália

“Ah, se ao menos o público, naquela ocasião, tivesse, não necessariamente aplaudido, mas tolerado minha ópera em silêncio, não encontraria suficientes palavras de gratidão! Mas, se agora encaram com suas boas graças minhas óperas, que já fizeram a volta ao mundo, então a questão está resolvida. Não os condeno: que sejam severos. Aceito suas vaias, na condição de não ter que pedir seus aplausos!”..

Giuseppe Verdi, nas cercanias do teatro “Alla Scala” – Milão, Itália.

“Nós, pobres ciganos, charlatões ou que quer que sejamos, vendemos nosso trabalho, nossos pensamentos e nossos sonhos, em troca de ouro… Por três liras, o público compra o direito de vaiar ou aplaudir. Nosso destino é a resignação. E isto é tudo! Mas, não importa o que digam meus amigos ou inimigos, ‘Boccanegra’ não é de forma alguma inferior a muitas de minhas óperas e que tiveram melhor sorte: talvez, precisasse de maior cuidado na interpretação e de platéia interessada em ouvi-la… Que coisa triste, o teatro!!” 

Este fracasso no “alla Scala” foi acompanhado de outra produção malsucedida, em Florença. Período em que Verdi já se ocupava de sua 23ª ópera, a bela “Un Ballo in Maschera”… E nova estreia de “Simon Boccanegra” ocorreu no “alla Scala”, em 1881, portanto, 24 anos após estreia no “La Fenice”, com revisão de Arrigo Boito e direção de Franco Faccio, então, grande sucesso, com mais dez récitas na temporada – fase em que Verdi era defenestrado pela vanguarda italiana e, ironicamente, em plena maturidade, após criações de “Aída” e da grande “Messa da Requiem”…

Após estreia em Veneza, em 12/03/1857, Verdi dedicou-se, sobretudo, ao “rifacimento de Stiffelio”, denominada “Aroldo”, sua 22ª ópera, então destinada à inauguração do “Teatro Nuovo Comunale”, de Rimini, 16/08/1857… Portanto, duas estreias num único ano e, naquele momento, estava satisfeito com sua própria e bem-sucedida montagem de “Simon Boccanegra”, em Reggio Emilia…

Antonio Garcia Gutiérrez, dramaturgo espanhol, autor de “Simon Boccanegra.”

Antonio García Gutiérrez 

Nascido em Cadiz, Espanha, no mesmo ano de Verdi – 1813, Antonio María de los Dolores García Gutiérrez estudou medicina, mas optou pelas carreiras de jornalista e escritor, mudando-se para Madrid, onde atuou como tradutor de peças francesas… Então, traduziu obras de Eugène Scribe e Alexandre Dumas, pai. E como dramaturgo, ganhou projeção com “El Trovador”, de 1836, que se transformou na conhecida ópera de Verdi. Posteriormente, também obteve sucesso com “Simon Boccanegra”, de 1843…

Verdi encantou-se com os dramas de Gutiérrez e colocou música nas duas peças… Entre os autores espanhóis do sec. XIX, destacou-se, sobretudo, pelas emoção e caráter de seus personagens femininos; pela preocupação social e exaltado ideário liberal… Também escreveu poemas e comédias – experimentando-se numa versão comédia de “El Trovador”…

“Simon Boccanegra” – Madrid, edição/1843

E nos chamados “dramas em tese”, discutiu o seu tempo, entre moralidade e costumes… Assim, em “Caminhos Opostos”, concluiu que excessivos rigor ou brandura produziam, igualmente, efeitos danosos na educação… Em “Los desposorios de Inés”, condenou o casamento por arranjo, do sec. XIX; e em “Eclipse Parcial”, posicionou-se contra o divórcio… Por fim, nas peças “A Grain of Sand”, “The Millionaires” e “The Industry Knight”, reiterou: “trapaceiros sempre acabam vítimas de suas próprias armadilhas, sejam pela incongruência dos próprios sentimentos ou pela continuidade no convívio social”….

Apesar do sucesso inicial, dificuldades financeiras levaram Gutiérrez à Cuba e, depois, ao México, onde trabalhou como jornalista, retornando à Espanha em 1850… E de volta, para sua surpresa, em pouco tempo tornou-se amplamente conhecido, graças à ópera de Verdi – “Il Trovatore”, de 1853… Coincidência ou não, a partir daí, recebeu inúmeros cargos e honrarias: “Comendador da Ordem de Carlos III”, 1856; “Supervisor da Dívida Espanhola em Londres”, 1855 – 1856; membro da “Real Academia Espanhola”, 1862; “Cônsul de Espanha em Bayonne e Génova”, 1870 – 1872; e a “Cruz de Isabel II”…

Interior do “Museu Antropológico de Madrid”, Espanha

Sem dúvida, o interesse de Verdi projetou Gutiérrez… Sendo também inegável sua extensa produção literária. Posteriormente, ainda publicou uma zarzuela, “El grumete”, 1853; o drama histórico “La Venganza catalana”, de 1864; e “Juan Lorenzo”, ambientado em Valência, em 1865… Por fim, dirigiu o “Museu arqueológico de Madrid”, vindo a falecer aos 71 anos, em 1884…

Personagem histórico, “Simon Boccanegra”, 1º doge de Gênova, cidade estado italiana, sec. XIV.

Personagem histórico – Boccanegra

De influente família, Simon Boccanegra foi rico corsário genovês, sendo eleito “1° doge” de Génova, em 1339, ao suceder os chamados tribunos do povo – “abbati”, então, escolhidos exclusivamente pela nobreza. Com a mudança e ascenção ao poder, Boccanegra sofreu dura oposição das famílias Doria, Spinola, Grimaldi e Fieschi, aliadas do papa. Por fim, obrigado a deixar o poder, 1347, exilou-se em Pisa, onde reorganizou suas forças e regressou nove anos depois, em 1356, restabelecendo a “república genovesa”…

Políticamente, a península itálica dividia-se entre os “guelfi”, partidários do papa; e os “gibelinos”, que preferiam submeter-se ao “Sacro Império Romano Germânico”. Portanto, escolhas por submissão e, quando possíveis, pelo domínio menos opressor… Tal como ocorreu na Sicília, com as “guerras das Vésperas”, que prolongaram-se de 1282 à 1372 – tema de outra ópera de Verdi…

Neste período, Boccanegra recuperou Mônaco, 1357, ao derrotar Carlos Grimaldi, almirante de França; também conquistou a ilha grega de “Chios”; e expulsou os povos tártaros da cidade de “Caffa”, antigo porto e assentamento genovês do mar Negro, península da Criméia… Provavelmente, Boccanegra morreu envenenado, em 1362. A ópera de Verdi, mesclando relações afetivas e familiares fictícias, resgatava o histórico líder genovês no contexto político do “risorgimento”… 

“Povos tártaros” – povoaram a península da Criméia.

Sinopse e libreto de “Simon Boccanegra” 

Tema original de Antonio Gutierrez tratava do “1° doge de Gênova” e despertou imediato interesse de Verdi. Libreto e circunstâncias da elaboração, no entanto, trouxeram insatisfação a Verdi. Possivelmente, em decorrência da própria ansiedade do músico, que se encontrava em Paris, quando compunha, e solicitou suporte de outro autor, a revelia de Piave, para agilizar processo criativo…

Até última revisão, 25 anos depois, realizada com Arrigo Boito, Verdi manteve entusiasmo pela ópera. Sobretudo, quando deparou-se com duas cartas, de época, do poeta Francesco Petrarca, então, dirigidas aos doges de Gênova e Veneza, no sec. XIV, escrevendo a Boito:

Francesco Petrarcca – poeta italiano (1304-1374).

“Duas cartas magníficas de Petrarca – uma endereçada ao ‘doge Boccanegra’, e outra, ao ‘doge de Veneza’, onde o poeta repreende ambos por se prepararem para uma guerra fratricida, quando eram filhos da mesma mãe – a Itália! Esse sentimento de pátria italiana, naquela época, foi sublime! Claro, tudo isso é político, não dramatúrgico, mas um homem perspicaz poderia adaptar os fatos para o palco…”

E sobre o drama de Gutierrez, a ópera apresenta dois personagens, nobre e plebeu, ricos e poderosos, Fiesco e Boccanegra, perdidos em seus próprios tempo e destino. Boccanegra, ao experimentar realidade que mudava sua existência e aspirações afetivas, apesar do sucesso político; e Fiesco, nobre derrotado politicamente, além de ressentido no âmbito familiar, com Boccanegra. Em torno deles, se desenvolvem demais personagens. Para tanto, Verdi permeou a música em tonalidades graves, da mais intensa e sombria dramaticidade, em notável contribuição à dramaturgia operística e, particularmente, ao repertório de baixo e barítono…

O enredo, um tanto complexo, mesclava personagens históricos com relações afetivas fictícias. E inicia pelo amor impossível, entre Simon Boccanegra, corsário e rico plebeu; com Maria, filha do nobre e arquirrival, Jacopo Fiesco (dito Andrea Grimaldi – nome falso, após expulsão de Gênova). Maria, no entanto, vem a falecer, mas deixa uma filha, que desaparecera misteriosamente…

Em meio à profunda dor, pela morte de Maria, Simon é eleito 1° doge de Gênova. E Fiesco, frustrado pela derrota política dos “guelfi”, cobra de Simon entrega de suposta neta, fruto do “amor impuro”, com Maria. Simon lamenta, pois procurou, incansavelmente, sua filha, mas sem sucesso… Mais tarde, no entanto, caberá a Fiesco, expulso de Gênova por Boccanegra, de forma casual, adotar uma menina, a quem chamou Amélia Grimaldi…

“Disegno per copertina di libretto, di Peter Hoffer, per ‘Simon Boccanegra’ (1955) – Archivio Storico Ricordi.”

– Os dramas de Gutierrez, tal como em “Il Trovatore”, são marcados por soluções improváveis, como esta surpreendente adoção da neta pelo avô… Também, lapso de 25 anos entre o prólogo e o 1° ato; duplicidades de nomes, como Jacopo Fiesco (Andrea Grimaldi) e Amélia Grimaldi (Maria Boccanegra); e o vilão Lorenzino, personagem oculto, dificultavam compreensão do drama… Mas, para Verdi, cujo fascínio era criar grande música dramática, apesar de situações pouco verossímeis, essencial era pontuar intensidade emotiva das cenas, tais como ensejadas pelas perdas de um pai, impossibilitado de casar-se e de conhecer a filha; e da perspectiva de encontrá-la, mais tarde…  

Assim, após alguns anos e vivendo em Gênova, Amélia Grimaldi (Maria Boccanegra) torna-se moça e conhece Gabriele Adorno, nobre genovês, a quem ama. Mas, também é cortejada por Paolo, líder plebeu e amigo dileto de Simon… Por fim, em grande e comovente encontro, Simon e Amélia se reconhecem, como pai e filha, através de retratos da mãe, que ambos carregavam no peito. Momento em que Paolo os observava, à distância, interpretando o afetuoso encontro como um caso amoroso… E de fiel amigo de Simon, mas acossado por ciúmes, passa a odiá-lo e desejar vingança…

Vista de Gênova, Itália.

Perturbado, Paolo manda sequestrar Amélia, que consegue fugir. E Gabriele Adorno, indignado pelo desaparecimento da amada, mata Lorenzino, o raptor; e passa a suspeitar de Simon, como mandante… Então, Gabriele leva denúncia ao grande conselho e desafia o doge, ameaçando matá-lo… Mas, é impedido por Maria (Amélia), que reaparece e se interpõe entre eles… Simon, por sua vez, passa a desconfiar de Paolo e o amaldiçoa. Paolo se retira, mas não esmorece na sina por vingança. Vai aos aposentos de Simon e coloca veneno num cálice; também propõe a morte de Boccanegra a Andrea Grimaldi (nome falso de Fiesco, quando retornara à Gênova), mas este se recusa…

Por fim, sob efeito do veneno e desfalecendo, Boccanegra se reconcilia com Jacopo Fiesco. Também, são esclarecidas todas as surpreendentes questões parentais… E ambos, sensibilizados, aprovam casamento de Maria (Amélia) e Gabriele, com indicação de Gabriele para sucessão do doge… Assim, o amor entre dois jovens e suas circunstâncias políticas ensejam a conciliação entre nobres e plebeus, cujos líderes, fragilizados por amarguras e ressentimentos antigos, transigem pelo convívio na diversidade. Com tal florecimento do amor e da concórdia, o desfecho, de certa forma, resgata e legitima o grande amor do passado, entre Maria Fiesco (mãe) e Simon…

Francesco Petrarcca e sua amada, Laura.

– Com final alentador, embora ao custo da morte de Boccanegra, a ópera se inseria no contexto político do “risorgimento”. E, sobretudo, na ária “Plebe! Patrizi! Popolo!” (“Plebeus! Patrícios! Povo!”), evocava os ideais proféticos do poeta Petrarca, a cerca de 500 anos, referidos por Verdi: “qual a razão de tantas guerras fratricidas, quando somos filhos da mesma mãe – a Itália!”

Na última revisão, com Arrigo Boito, ambos, compositor e libretista entenderam a concepção demasiado sombria e intimista. E acrescentaram grande cena da “Câmara do Conselho”, com solistas e coros, em maior contraste às cenas individuais e ensembles. A revisão, no entanto, não logrou uma ópera mais leve ou acessível, embora muitos a considerem melhor. Entre os grandes trabalhos de Verdi, “Simon Boccanegra”, gradualmente, ganhou os teatros do mundo, sendo regularmente encenada…

Arrigo Boito e Giuseppe Verdi.

Libreto

Ação ocorre em Gênova, sec. XIV

  • Personagens: Maria Boccanegra (Amélia Grimaldi), filha de Simon e neta de Fiesco (soprano); Gabrieli Adorno, nobre genovês (tenor); Simon Boccanegra, rico plebeu, dodge de Gênova (barítono); Jacopo Fiesco (Andrea Grimaldi), patrício (nobre) genovês e dodge anterior, avô de Maria (baixo); Paolo Albiani, plebeu e ourives, pretendente recusado por Maria (barítono); Pietro, amigo de Paolo e líder dos plebeus (baixo);
  • Coros: Conselheiros, marinheiros, artesãos, patrícios (nobres) e povo de Gênova.

Prólogo – Numa praça de Gênova

Sem abertura ou prelúdio, na versão de 1881, após breve introdução orquestral, ensejando a noite, cena abre com reunião política, numa praça de Gênova. Paolo, líder dos plebeus, e Pietro, outro membro influente, discutem próxima eleição do abate (doge). Em recitativo, Paolo defende candidatura de Boccanegra, enquanto Pietro propõe Lorenzino… Canta Paolo, “Che dicesti?… all’onor di primo abate Lorenzino, l’usuriere?…” (“Que disseste? para honorável 1° abate (doge), o usurário?…”) Pietro responde, “Altro proponi di lui più degno!” (“Proponha outro mais digno!”) E Paolo sugere, “Il prode che da’ nostri Mari cacciava l’african pirata!” (“Homem corajoso, que expulsou de nossos mares o pirata africano!”)

Capa do libreto da 1ª Edição – Revisão de 1881, Ricordi.

E Pietro responde, “Intesi… e il premio?…” (“Entendo… e o prêmio?…”) Então, canta Paolo, “Oro, possanza, onore…” (“Ouro, poder, honra…”) Pietro responde, “Vendo a tal prezzo il popolar favore” (“A tal preço, vendo o favor popular”). E finalizada a negociação, conclui Paolo, com indignação, “Aborriti patrizi! Alle cime ove alberga il vostro orgoglio, disprezzato plebeo, salire io voglio!” (“Abomináveis patrícios. Às alturas, onde habita vosso orgulho, desprezado plebeu ascenderá!”)

Entra Simon Boccanegra. E chamado à reunião, concorda em representar os plebeus contra candidato dos patrícios (nobres)… Cena desenvolve-se em duetto. Canta Simon, “Un amplesso… Che avvenne? Perché qui m’appellasti?” (“Um abraço… que acontece? porque me chamaste?”) Paolo responde, “All’alba eletto esser vuoi nuovo abate?” (“Você quer ser eleito novo abate (doge), ao amanhecer?”) E Simon mostra pouco interesse pelo poder, “Vaneggi?” (“Estás delirando?”)… Então, Paolo pergunta por Maria, filha do nobre Fiesco. Simon responde, “O vittima innocente del funesto amor mio!… Dimmi, di lei che sai? Le favellasti?…” (“Oh! vítima inocente de meu amor maldito! O que você sabe? Falou com ela?…”) Paolo responde, “Prigioniera, geme in quella magion…” (“Prisioneira, sofre naquela mansão…”). “Maria!!”… exclama Simon, dolorosamente…

Victo Maurel, barítono francês – Boccanegra, na revisão de 1881.

Então, Paolo retoma assunto da eleição, “Tutto disposi… e sol ti chiedo. Parte ai perigli e alla possanza… in vita e in morte…” (“Tudo está organizado. Exortamos que compartilhes os perigos e o poder… na vida e na morte…”) Simon exita, mas, por fim, concorda, “Sia!”. E para dirigir-se aos apoiadores, Paolo pede que Simon se retire…

E reunidos, Paolo, Pietro, marinheiros e artesãos preparam escolha do candidato, em “All’alba tutti qui verrete?” (“Todos virão aqui ao amanhecer?”). Todos anuem e afirmam estarem prontos para votar em Lorenzino. Mas, Paolo questiona, “Venduto è a’ Fieschi?”… (“Vendido à Fiesco?…”) Coro responde, “Dunque chi fia l’eletto?” (“Então, quem será o escolhido?”) Paolo propõe, “Un prode! Un popolan!” (“Um homem corajoso! Um plebeu!”) E o coro, “Ben dici… ma fra i nostri sai l’uom?” (“Então, diz… quem será o homem?”) E Paolo sugere, “Simon Boccanegra! Sì… il Corsaro all’alto scranno…” (“Simon Boccanegra! Sim… o corsário no acento mais alto…”) 

E Paolo se volta para o palácio Fieschi, “Taceranno!” (“Eles se calarão!”) E lembra presença de Maria, na escura e perversa mansão, “Una beltà infelice geme sepolta in quello; Sono i lamenti suoi la sola voce umana…” (“Infeliz beleza geme enterrada nela. Seus lamentos são a única voz humana…”) E o coro reitera, “La bella prigioniera, la misera Maria…” (“A bela prisioneira, triste Maria…”) Paolo canta, “Si schiudon quelle porte solo al patrizio altero, Che ad arte si ravvolge nell’ombre del mistero…” (“Cujas portas são abertas apenas para o arrogante patrício, que habilmente cultiva sombras e mistério…”) E o coro canta, “Par l’antro de’ fantasimi!… O qual terror!…”  (“Parece uma caverna de fantasmas… Oh, que terror!…”) E saudando eleição do novo doge, Paolo conclui: “Si caccino i demoni col segno della croce… All’alba!” (“Que os demônios sejam expulsos com o sinal da cruz… ao amanhecer!”). Então, Pietro grita palavras de ordem e exclama, “Simon!!”. E marinheiros e artesãos respondem, “Qui!!”

“Simon Boccanegra” – teatro Carlo Fenice, Gênova, 1991.

Então, avista-se tênue luz saindo do palácio. Fiesco se aproxima, em direção à praça… Orquestra inicia sombrio “andante sostenuto” e o nobre lamenta a morte da filha, Maria Fiesco, no recitativo, “A te l’estremo addio, palagio altero, freddo sepolcro dell’angiolo mio!…” (“A ti meu último adeus, orgulhoso palácio, túmulo frio de anjo meu!…”) E depois, na comovente romance, “Il lacerato spirito del mesto genitore…” (“Dilacerado espírito de um triste pai…”) Por trás da cena, ouvem-se mulheres e criados, que lentamente adentram o palco em pungente lamento, “È morta!… È morta!… a lei s’apron le sfere!… Mai più!… mai più non la vedremo in terra!…” (“Está morta! Está morta!… as esfereras se abrem para ela!… Nunca mais!… nunca mais a veremos na terra!…”) E o coro masculino responde, “Miserere!… miserere!…” – momento de grande comoção, pontuado por música fúnebre…

Edouard de Reszke, baixo polonês – Fiesco, na revisão de 1881.

E escolhido candidato, Simon Boccanegra reaparece, exultante e na esperança de casar-se com Maria, ainda ignorando sua morte… Mas, encontra Fiesco e travam amargo diálogo, onde lamentam a perda de Maria e destino de suposta filha com Simon, portanto, neta de Fiesco… Seguem, dramáticos recitativo e duetto. E diante de irreparável perda, Simon implora por misericórdia, mas Fiesco, irredutível, expressa toda sua ira, “Qual cieco fato, a oltraggiarmi ti traea?…” (“Qual destino cego, foste levado a me ultrajar?…”)

E canta Simon, “Sopra l’ali della gloria, strappai serti alla vittoria per l’altare dell’amor!” (“Nas asas da glória, rasguei coroas de flores da vitória pelo altar do amor!”). E Fiesco responde, “Io fea plauso al tuo valore, ma le offese non perdono… Te vedessi asceso in trono…” (“Aplaudo tua coragem, mas tuas ofensas não tem perdão… Vais ascender ao trono…”). E segue, “No! pace non fora, se pria l’un di noi non mora!” (“Não haverá paz, sem que um de nós morra!”). E Simon, em profunda dor pela morte da amada, canta, “Vuoi col sangue mio placarti? (Gli presenta il petto) Qui ferisci!…” (“Queres apaziguar-te com meu sangue? aqui podes me atingir!…”) e mostra o peito a Fiesco….

Mas Fiesco, acossado pela existência de suposta neta, responde: “Assassinarti?!… Ascolta: Se concedermi vorrai linnocente sventurata, che nascea d’impuro amor, Io, che ancor non la mirai, giuro renderla beata e tu avrai perdono allor.” (“Assassinar-te?!… Escuta: se me devolveres a inocente infeliz, que nasceu de amor impuro e que ainda não conheço, juro fazê-la feliz e estarás perdoado”) Simon responde, “Non poss’io! Sorte lei rapi…” (“Não posso! Ela desapareceu…”)

Riccardo Zanellato e Mika Pohjonen – cooprodução “Novo Teatro Nacional de Tóquio”, “Ópera e Ballet Nacional Finlandês” e “Teatro Real Madrid”, 2024.

E relata: “Del mar sul lido tra gente ostile crescea nell’ombra quella gentile” (“À beira-mar e em meio hostil, a gentil criança cresceu”)… “Di là una notte varcando, solo dalla mia nave scesi a quel suolo” (“Certa noite, navegando solitário, pisei naquele chão”)… “Corsi alla casa… n’era la porta, serrata, muta!” (“Corri até uma casa, fechada e silenciosa!”)… “Misera, trista, tre giorni pianse, tre giorni errò; scomparve poscia, né fu, più vista… D’allora indarno cercata io l’ho” (“Miserável e triste, por três dias vagueei; mas, a menina desapareceu e nunca mais foi vista… Desde então, a procuro em vão…”). E intransigente, Fiesco reage: “Se il mio desire compir non puoi, pace non puote esser tra noi! Addio, Simone…” (“Se não podes cumprir meu desejo, paz não haverá entre nós! Adeus, Simon…”). E vira as costas…

“Simon Boccanegra” – Opernhaus Zurique, 2021.

Atormentado pelo encontro com Fiesco e desejando despedir-se da amada, Simon canta, “Oh de’ Fieschi implacata, orrida razza! E tra cotesti rettili nascea Quella pùra beltà?… Vederla io voglio… Coraggio!” (“Oh! Fieschi, raça implacável e horrível! Como nasceu, desses répteis, beleza tão pura?… Quero vê-la… Coragem!”) Simon vai ao palácio, bate à porta e a encontra aberta, “Nessuno!… qui sempre, silenzio e tenebra…” (“Ninguém!… como sempre, silêncio e escuridão…”). E ao tomar uma lanterna, depara-se com o corpo. E não se contendo, grita: “Maria!… Maria!!”. Ao ouvir Simon, Fiesco vocifera: “L’ora suonò del tuo castigo…” (“A hora de teu castigo chegou…”)

Aterrorizado, Simon deixa o castelo, “È sogno!… Sì, spaventoso, atroce sogno il mio!” (“É sonho!… Sim, um assustador e atroz sonho!”) Ao mesmo tempo, da praça, escutam-se gritos: “Boccanegra!! Boccanegra!!”. Mas, atordoado e delirante, Simon reage: “Eco d’inferno è questo!…” (“Ecos do inferno!…”)… Simon não percebe que fora eleito doge de Gênova!

Chegam Paolo e Pietro, “Doge! il popol t’acclama!” (“Doge! o povo te aclama!”). Mas, sofrendo e confuso, Simon canta, “Via fantasmi! Paolo!… Ah!… una tomba…” (“Fora, fantasmas! Paolo!… Ah… um túmulo…”) Paolo insiste, “Un trono!”. E Fiesco, de outro, lamenta a vitória, “Doge Simon… m’arde l’inferno in petto!…” (“Doge Simon… o inferno queima em meu peito!…”) Enquanto o povo de Gênova exulta: “Viva Simon, del popolo l’eletto!!” (“Viva Simon, escolhido pelo povo!!”) Prólogo se encerra com tal dualidade: de um lado, Simon em profunda dor pela perda de Maria; de outro, regozijo da multidão, que o saúda “1° doge de Gênova!”

“Simon Boccanegra”, teatro “Allá Scala”, Milão, 2024

1° Ato – Nos jardins do Palácio Grimaldi, em Gênova (25 anos depois…)

Frente ao mar, nos jardins do Palácio Grimaldi e evocando o amanhecer, uma delicada introdução orquestral abre 1° ato. Cena ocorre 25 anos depois e Simon Boccanegra permanecia doge de Gênova, amealhando grande poder. Neste interregno, Fiesco fora banido por atividade subsersiva. E fugira para Pisa, onde adotou falso nome, Andrea Grimaldi… Com este nome, Fiesco retornou à Gênova e trouxe uma filha adotiva, agora jovem mulher, a quem chamou Amélia Grimaldi… Seus filhos, no entanto, seguiam banidos…

Após introdução instrumental, entra a bela Amélia Grimaldi e canta seu amor por Gabriele Adorno, um jovem patrício, na ária “Come in quest’ora bruna, sorridon gli astri e il mare!” (“Nesta hora escura, os astros e o mar sorriem!”). Também reflete sobre a solidão e sua condição de orfã, “Ma gli astri e la marina. Che dicono alla mente dell’orfana meschina?…” (“Mas, e as estrelas e a marina, o que dizem à mente de miserável órfã?…”) Abandonada quando menina, Amélia fora cuidada por uma anciã, que a acolheu. E certa noite, novamente, teve que fugir sem rumo: “La notte atra, crudel, quando la pia morente sclamò: ‘ti guardi il ciel'” (“A noite era alta, cruel, quando a mulher moribunda exclamou: ‘que o céu te proteja”)… Sobrevivente de triste destino, Amélia, de forma casual, fora adotada por Andrea Grimaldi (nome falso de seu avô, Jacopo Fiesco, que desconhecia tal grau de parentesco)…

“Simon Boccanegra” – teatro Carlo Fenice, Gênova, 1991.

Então, à distância, ouve-se Gabriele Adorno, que chegava ao palácio, em “Cielo di stelle orbato, di fior vedovo prato, è l’alma senza amor” (“Céu sem estrelas, prado sem flores, são a alma sem amor”). A música se agita e Amélia exulta, “Ciel!… la sua voce!… È desso!… Ei s’avvicina!… oh gioia!… Tutto m’arride l’universo adesso!…” (“Céus!… a voz dele!… se avizinha!… Oh alegria!… Universo inteiro sorri para mim!…”). E iniciam apaixonado dueto, “Anima mia!” (“Alma minha!”)

Apesar do encontro apaixonado e do grande amor entre eles, Amélia tinha outras preocupações. E o duetto evolui para tensão e desconfiança… Amélia percebia presenças e movimentações estranhas no palácio, inclusive a mando do doge Boccanegra, que a deixavam apreensiva e angustiada. E extravasa, “Pavento…” (“Tenho medo…”) “L’arcano tuo conobbi… A me il sepolcro appresti, il patibolo a te!” (“Sei do teu segredo… preparas meu túmulo… e a forca para ti!”). Gabriele, surpreso, canta, “Che pensi?”… (“Que pensas?”)… Amélia continua, “Io amo Andrea qual padre, il sai!” (“Amo Andrea como pai, ele sabe!”) “Pur m’atterrisce… in cupa notte, sotte le tetre volte errar sovente pensosi, irrequieti” (“Mas, me apavora… à noite escura, te vejo muitas vezes vagando sob as abóbodas sombrias, pensativo, irrequieto”). Gabriele indaga, “Chi?…” (“Quem?…”). Amélia segue, “Tu, Andrea, Lorenzin e gli altri…” (“Tu, Andrea, Lorenzino e outros…”)

“Simon Boccanegra” – duetto Amélia e Gabriele – Teatro Mariinsky, 2016.

Num sobressalto, Gabriele pede que Amélia se cale, “Ah,  taci… il vento ai tiranni potria recar tai voci! Parlan le mura… un delator s’asconde ad ogni passo…” (“Ah, cala-te… o vento pode levar tuas palavras ao tirano! As paredes falam… espiões se escondem a cada passo…”). E Amélia observa, “Tu tremi?” (“Estás tremendo?”)… E duetto segue em certa resignação. Amélia canta, “Fantasmi dicesti?… vieni a mirar la cerula; Là Genova torreggia sul talamo spumante; là i tuoi nemici imperano, Vincerli indarno speri… ripara i tuoi pensieri al porto dell’amor” (“Fantasmas, disseste?… vem e contempla o azul celeste; Gênova se ergue sobre cintilante câmara nupcial; alí, reinam teus inimigos; em vão, esperas derrotá-los; volta teus pensamentos no porto do amor”) Ao que Gabriele responde, “Angiol che dall’empireo piegasti a terra l’ale; non ricercar dell’odio i funebri misteri; ripara i tuoi pensieri al porto dell’amor” (“Anjo que do empíreo pousaste asas sobre a terra, não te acerques de funestos mistérios; volta teus pensamentos ao porto do amor”)…

Então, percebem chegada de um estranho. Amélia canta, “Vedi quell’uom?… qual ombra, ogni dì appar” (“Vês aquele homem?… como uma sombra, aparece todos os dias”). E um serviçal anuncia, “Del doge, un messaggier di te chiede” (“Mensageiro do doge pergunta sobre Amélia”). Entra Pietro, plebeu e amigo de Paolo – juntos, organizaram eleição do doge, há 25 anos, e canta: “Il Doge, dalle caccie tornando di Savona, questa magion visitar brama!” (“Doge, retornando da caça em Savona, deseja visitar este palácio!”)

Luigia Bendazzi, soprano italiano – Amelia, 1857.

Gabriele indaga, “Il Doge qui?”… (“Doge, aqui?”)… Amélia responde, “Mia destra a chieder viene” (“Por minha mão vem perguntar”). Gabriele, “Per chi?”. Amélia, “Pel favorito suo. D’Andrea vola in cerca… T’affretta… va… prepara Il rito nuzial… mi guida all’ara!” (“Pelo seu favorito. Vai em busca de Andrea… Te apressa… vai… cuida do rito nupcial… me guia até o altar!”) Na conclusão do duetto, ritmo se intensifica, em “streta – allegro brilante”, e ambos cantam: “Sì, sì dell’ara il giubilo contrasti il fato avverso!” (“Sim! a alegria do altar contra destino adverso!”) “E tutto l’universo Io sfiderò con te!” (“E todo universo desafiarei contigo!”) “Innamorato anelito è del destin più forte!” (“No desejo do amor, destino maior!”) “Amanti oltre la morte! Sempre vivrai con me!” (“Amantes além da morte! Sempre viverás comigo!!”). Amélia e Gabriele se abraçam e Amélia se retira…

Chega Andrea Grimaldi… Gabriele se apraz da oportunidade. Andrea indaga, “Sì mattutino, qui?…” (Tão cedo, por aqui?…”). Gabriele ensaia, “A dirti…”, mas Andrea emenda, “Che ami Amelia” (“Que amas Amélia”) E Gabriele indaga, “Tu che lei vegli con paterna cura, a nostre nozze assenti?” (“Tu que a zelas como pai, estarias ausente de nosso casamento?”). Segue Andrea, “Se parlo, forse tu più non l’amerai” (“Se eu falar, talvez deixes de amá-la”). Gabriele responde, “Non teme ombra d’arcani l’amor mio! T’ascolto” (“Meu amor não teme segredos sombrios! Te escuto”). Segue Andrea, “Amelia tua d’umile stirpe nacque” (“Amélia nasceu de origem umilde”). Portanto, era uma plebeia; enquanto Gabriele, um patrício (nobre) – um “guelfi”, partidário do papa…

Carlo Negrini, tenor spinto italiano – Gabriele, 1857.

Gabriele pergunta, “Ma come de’ Grimaldi, anco il nome prendea?…” (“Mas, como adotou nome dos Grimaldi?…”). Andrea responde, “De’ fuorusciti…” (“Dos exilados…”) Então, Gabriele reafirma seu amor, “L’orfana adoro!” (“Adoro a orfã!”) E Andrea conclui, “Di lei se’ degno” (“Então, és digno dela”) E Gabrieli indaga, “A me fia dunque unita?” (“Então, ela estará unida a mim?”)… Andrea consente, “In terra e in ciel!” e abençoa Gabriele, “Vieni a me, ti benedico nella pace di quest’ora. Lieto vivi e fido adora l’angiol tuo, la patria, il ciel!” (“Vem até mim, te abençoo na paz desta hora. Viva feliz e adore fielmente teu anjo, tua pátria, teu céu!”) Gabrieli enaltece a grandeza de sentimentos de Andrea, “Eco pio del tempo antico, la tua voce è un casto incanto; Serberà ricordo santo de’ tuoi detti il cor fedel” (“Eco piedoso de tempos antigos, tua voz é puro encantamento; meu coração fiel guardará lembrança sagrada de tuas palavras”) Música adquiri caráter grave e solene – “sostenuto religioso”, encerrando duetto…

E toques de trompetes, em breve fanfarra de metais, anunciam chegada do doge! Gabriele e Andrea se retiram e Andrea exorta pelo dia da vingança, “Ah! presto il dì della vendetta sorga!” (“Ah! Que o dia da vingança logo chegue!”) Entram, o doge Boccanegra seguido por Paolo, Pietro, caçadores e guardas. Amélia também entra, acompanhada por damas de honra… Doge observa, “Ci spronano gli eventi, di qua partir convien” (“Acontecimentos exigem nossa presença, logo deveremos partir”) E Paolo, à chegada de Amélia, observa sua imensa beleza. Todos se retiram, enquanto Amélia e Doge permanecem. Então, iniciam grande duetto…

Ambos se apresentam. Doge indaga pelos irmãos exilados de Amélia e comenta, “A me inchinarsi sdegnano i Grimaldi…” (“Os Grimaldi se curvariam diante do doge…”) e entrega um documento à Amélia, que lê, “Che veggo!… il lor perdono?” (“Que vejo!… perdão a eles?”). Doge segue, “Dinne, perché in quest’eremo tanta beltà chiudesti? Del mondo mai le fulgide Lusinghe non piangesti? Il tuo rossor mel dice…” (“Diz-me, porque escondes tanta beleza neste claustro?”) “Del mondo mai le fulgide lusinghe non piangesti?” (“Nunca lamentaste as brilhantes lisonjas do mundo?”) E conclue, “Il tuo rossor mel dice…” (“Teu rubor me diz…”)

“Simon Boccanegra” – “teatro Carlo Felice”, Gênova, 1991.

Segue Amélia, “T’inganni, io son felice…” (“Estás enganado, eu sou feliz…”) Doge responde, “Agli anni tuoi l’amore…” (“Em todos estes anos, você amou…”) Segue Amélia, “Ah mi leggesti in core! Amo uno spirto angelico che ardente mi riama… Ma di me acceso, un perfido, l’orror dei Grimaldi brama…” (“Ah, leste meu coração! Amo um espírito angelical, que ardentemente me ama… Mas, a mim, um pérfido, horror dos Grimaldi, deseja…”) Doge afirma, “Paolo!”. E Amélia, “Quel vil nomasti!…” (“O ser vil que nominaste!…”) E Amélia segue, “E poiché tanta Pietà ti muove dei destini miei, Vo’ svelarti il segreto che mi ammanta… Non sono una Grimaldi…” (“Se tens tanta piedade pelo meu destino, vou te revelar um segredo… Não sou uma Grimaldi…”)

Surpreso, Doge indaga, “Oh! ciel… chi sei?…” (“Oh! céus… quem é você?”) Amélia responde, “Orfanella il tetto umile, m’accogliea d’una meschina; Dove presso alla marina Sorge Pisa…” (“Orfã de umilde teto, que acolheu uma menina pobre; perto do mar, onde se ergue Pisa”) Doge se surpreende, “In Pisa, tu?” (“Em Pisa, tu?”) Segue Amélia, “Grave d’anni, quella pia era solo a me sostegno” (“Naqueles anos difíceis, uma mulher pura foi único apoio”) “Io provai del ciel lo sdegno. Colla tremola sua mano, involata ella mi fu. Pinta effigie mi porgea” (“Experimentei a ira do céu. Com as mãos trêmulas, ela me foi roubada. E me deixou uma efígie pintada”) E segue, “Mi baciò, mi benedisse, levò al ciel, pregando, i rai…” (“Então, me abraçou, abençoou e elevou suas preces ao céu, rezando…”)

Leone Giraldoni, baritono italiano – Boccanegra, em 1857.

Impossível para o doge, que perdera a filha naquele mar, próximo de Pisa, não associar o destino relatado por Amélia…  E para si mesmo, reflete, “Se la speme, o ciel clemente, fosse sogno!… estinto io sia, ch’or sorride all’alma mia, della larva al disparir!” (“Se há esperança, o céu é misericordioso, como um sonho!… que sorri para minha alma, extinguindo a chaga do desaparecimento!”) E Amélia lamenta, “Come tetro a me dolente s’appressava l’avvenir…” (“Que triste e sombrio futuro se aproximava de mim…”)

Doge indaga, “Dinne… alcun là non vedesti?…” (“Diga… e viste alguém?…”) Amélia responde, “Uom di mar noi visitava…” (“Um homem do mar nos visitou…”) Segue Boccanegra, “E Giovanna si nomava lei che i fati a te rapîr?…” (“E se chamava Giovanna, aquela que o destino te tirou?…”) Surpresa, Amélia respode, “Si!”… Então, doge mostra uma efígie, “E l’effigie non somiglia questa?” (“E a efígie não se parece com esta?”), tirando um retrato do peito e mostrando a Amélia, que faz o mesmo com retrato idêntico, que carregava… Amélia exclama, “Uguali son!…” (“São iguais!…”) Doge grita, “Maria!”. Amélia exclama, ” Il mio nome!”. Doge, “Sei mia figlia!” (“És minha filha!”) E Amélia reluta, “Io…” Doge, radiante e comovido, extravasa amor contido, “M’abbraccia, o figlia mia!!” (“Abraça-me, filha minha!!”) Então, ambos se reconhecem e Amélia exulta de alegria, “Padre, padre il cor ti chiama! Stringi al sen Maria che t’ama!” (“Pai! pai, meu coração te chama! Abraça Maria, que te ama!”)

Climax musical acentua dimensão do encontro. E ambos exprimem toda felicidade, após angústia e frustrações guardadas, há muito tempo. Em “Allegro giusto”, Doge canta, “Figlia!… a tal nome palpito qual se m’aprisse i cieli…” (“Filha!… ao dizer esta palavra tremo como os céus estivessem se abrindo para mim…”). E Amélia responde, “Padre, vedrai la vigile figlia a te sempre accanto” (“Pai, terás filha sempre vigilante ao teu lado”). Então, Boccanegra acompanha Amélia, que se dirige ao palácio; e depois a contempla, à distância, extasiado: “O figlia!!”, concluindo jubilosamente o duetto…

“Simon Boccanegra”, duetto Amelia e Simon – “Teatro Mariinsky”, 2016.

Doge permanece e Paolo, que aguardava pelo diálogo com Amélia, se aproxima. “Che rispose?” (“O que ela respondeu?”) indaga Paolo, na expectativa de desposar Amélia. Doge responde, “Rinunzia ogni speranza” (“Desista de qualquer esperança”) A música se agita e Paolo reage, “Doge, nol posso!…” (“Doge, eu não posso!…”) E o Doge reitera, “Il voglio” (“Eu desejo isto”) Paolo se surpreende e apela à lealdade política, “Il vuoi!… scordasti che mi devi il soglio?” (“Você deseja!… esqueceu que me deve o trono?”) Mas, irredutível ao pedido, doge se retira e entra Pietro, amigo de Paolo e também aliado do doge…

– A partir de então, conflitos políticos e afetivos estão colocados. De uma lado, Boccanegra fragiliza sua base de apoio entre os plebeus, ao desencorajar união desejada por Paolo, com Amélia – Paolo sentiu-se traído por Simon… De outro, Andrea Grimaldi (Fiesco), embora confessado ao nobre pretendente, Gabriele Adorno, que Amélia, sua filha adotiva, era plebeia, ainda desconhecia, pelos descaminhos do destino, que tratava de sua neta, filha de Boccanegra e Maria Fiesco – portanto, surpreendente ligação sanguínea entre dois rivais políticos… E seguem os desdobramentos: 

“Simon Boccanegra” – Paolo e Pietro planejam rapto de Amélia – “teatro Reggio di Parma”, 2010.

Inconformado, pela negativa de Boccanegra, Paolo propõe a Pietro sequestro de Amélia. E decide, “Rapirla!” (“Sequestrá-la!”)… Pietro responde, “Come?”… E Paolo, “Sul lido, a sera, la troverai solinga. Si tragga al mio naviglio. Di Lorenzin si rechi alla magion…” (“Na praia, à noite, ela estará sozinha. Traga-a para meu navio. Para isto, vá à mansão de Lorenzino…”) E Pietro, “S’ei nega?” (“E se ele negar?”) Então, canta Paolo, “Digli che so sue trame e presterammi aita… Tu gran mercede avrai…” (“Diga que conheço suas pretensões e que, ao colaborar, será bem recompensado…”) Pietro acata, “Ella sarà rapita!” (“Ela será raptada!”)… Na ópera, Lorenzino é personagem oculto, afeito à corrupção e toda sorte de malfeitos em troca de vantagens… 

Cena seguinte abre em reunião na Cãmara do Conselho. No Palácio, ao centro, Doge com doze conselheiros nobres, de um lado, e outros doze conselheiros plebeus, de outro; além de quatro cônsules do mar e dois condestáveis, Paolo e Pietro… Boccanegra inicia pauta com votação de questões comerciais, “Messeri, il re di Tartaria vi porge Pegni di pace e ricchi doni e annunzia schiuso l’Eusin alle liguri prore” (“Senhores, rei da Tartária oferece-lhes promessas de paz, ricos presentes e anuncia que Euxino está aberto às proas da Ligúria”). “Euxino”, antiga denominação do mar Negro e Liguria, região italiana onde se situa Gênova. Então, pergunta o doge, “Acconsentite?” (“Como votam?”). Conselho delibera, “Si!”

Outro ponto, anuncia o doge, “Ma d’altro voto più generoso io vi richiedo” (“Neste ponto, peço voto mais generoso”) “La stessa voce che tuonò su Rienzi; vaticinio di gloria e poi di morte, or su Genova tuona” (“Mesma voz que dirigiu-se à Rienzi, com ameaças de morte e glória, agora ameaça Gênova”). E nesta questão, ferozmente, todos respondem, “Guerra a Venezia!”. Mas, doge pondera, “E con quest’urlo atroce, fra due liti d’Italia, erge Caino la sua clava cruenta! – Adria e Liguria, hanno patria comune” (“Com este grito atroz, entre as duas costas da Itália, Caim levanta sua maldita clava! Adria e Ligúria são a mesma pátria…”). Libreto alude às cartas de Petrarca, dirigidas aos doges de Gênova e Veneza, certa ocasião – “Itália, mãe e pátria única!”

“Simon Boccanegra” – “teatro Carlo Felice”, Gênova, 1991.

Então, solidários e confiantes, todos reiteram, “È nostra patria Genova!” (“Gênova é nossa pátria!”). E em meio à reunião, instala-se grande tumulto… Assembleia se agita, “D’onde tai grida?” (“De onde vem os gritos?”) Paolo vai ao balcão e observa, “Dalla piazza de’ Fieschi!” (“Da praça dos Fieschi!”). E todos exclamam, “Una sommossa!” (“Uma revolta!”); outros gritam,”Morte! Morte!”… Em meio ao tumulto, Paolo e Pietro reconhecem Gabriele Adorno! E Doge exclama, “Ciel! Gabrieli Adorno dalla plebe assalito… accanto ad esso combatte un guelfo – a me un araldo!” (“Céus! Gabriele Adorno atacado pela plebe… ao lado dele, um ‘guelfo’ luta – chamem um aralto!”) E tal confusão era causada pelo desaparecimento de Amélia!

Pietro alerta Paolo, “Paolo, fuggi o sei côlto…” (“Paolo, fuja ou serás preso…”) Doge percebe Paolo se afastando e ordena, “Consoli del mare, custodite le soglie! Olà, chi fugge è un traditor” (“Cônsules do mar, guardem os muros! Cuidado, quem está fugindo é traidor”) Paolo, confuso, se detém… E a multidão, na praça, intensifica os gritos: “Morte ai patrizi!” (“Morte aos patrícios!”). Então, conselheiros nobres reagem, “All’armi!” (“Às armas!”). E na praça, plebeus gritam,”Viva il popolo!”. Enquanto, do palácio, conselheiros plebeus reiteram, “Evviva!” (“Viva!”)…

Cidade estado de Gênova – Itália, 1493.

Então, Boccanegra adverte a todos, “E che? voi pure? Voi, qui!! vi provocate?” (“O que? Vocês estão todos se provocando?…”) E quando exortam, da praça, “Morte al Doge!”… Boccanegra reage energicamente, “Morte al Doge? sta ben, tu, araldo, schiudi le porte del palagio e annuncia al volgo gentilesco e plebeo ch’io non lo temo!” (“Morte ao doge? está bem… aralto, abre as portas do palácio e anuncia à multidão gentílica e plebeia que não os temo!”) “Che le minaccie udii, che qui li attendo…” (“Pelas ameaças que ouvi, eu os aguardo aqui…”). E por fim, ordena aos conselheiros, “Nelle guaine i brandi!” (“Guardem as espadas!”). E de pronto, todos obedecem!

Da praça, desordem aumenta e a turba grita, “Armi! Saccheggio! Fuoco alle case!” (“Armas! Saques! Fogo nas casas!”). E outros respondem, “Alla gogna!” (“Ao pelourinho!”). Soa a trombeta e o arauto fala! Todos silenciam… Então, o doge é ovacionado pelos plebeus: “Evviva il Doge!”. Boccanegra responde, “Ecco le plebi!” (“Aqui estão os plebeus!”). E a multidão adentra o palácio, ficando ao lado dos conselheiros plebeus; enquanto conselheiros nobres colocam-se à parte… Multidão clama por vingança, “Vendetta! vendetta! Spargasi il sangue del fiero uccisor!” (“Vingança! Vingança!! Que o sangue do assassino seja derramado!”) Doge ironiza, “Quest’è dunque del popolo la voce? Da lungi tuono d’uragan, da presso, gridio di donne e di fanciulli…” (“Então, esta é a voz do povo? De longe, estrondos de um furação, de perto, gritos de mulheres e crianças…”)

“Simon Boccanegra” – “teatro Carlo Felice”, Gênova, 1991.

Então, doge indaga a Gabriele Adorno: “Adorno, perché impugni l’acciar?” (“Adorno, porque impunhas a espada?”) Adorno responde, ” Ho trucidato Lorenzino…” (“Eu matei Lorenzino…”). Multidão reage, “Assassin!”. Mas, Adorno denuncia Lorenzino, “Ei la Grimaldi Aveva rapita” (“Ele sequestrou a Grimaldi”) E o povo reage, “Menti!” (“Mentiroso!”)… Gabriele segue, “Quel vile Pria di morir disse che un uom possente al crimine l’ha spinto” (“Aquele covarde, antes de morrer, confessou que foi empurrado ao crime por gente poderosa!”)… E Pietro adverte Paolo, “Ah! sei scoperto!” (“Você está exposto!”) E o doge exige, “E il nome suo?” (“E o nome dele?”)…

Olhando, ironicamente, para o doge, Gabriele responde, “T’acqueta! il reo si spense pria di svelarlo” (“Se isto te acalma! Culpado morreu antes de revelar o nome”). Gabriele insinua que sequestro foi ordem do doge Boccanegra, “Pel cielo! Uom possente tu se’!…” (“Pelos céus! És um homem poderoso!…”) Ao que Boccanegra repele com ódio, “Ribaldo!” (“Canalha!”) Adorno reage e reafirma, “Audace rapitor di fanciulle!” (“Ousado sequestrador de meninas!”) “Empio corsaro incoronato! muori!” (“Perverso corsário coroado! Vais morrer!”). E avança, impulsivamente, na direção de Simon para desferir golpe de espada!

“Simon Boccanegra” – Simon, Amelia e Gabriele – “Teatro Mariinsky”, 2016.

Sob tamanha tensão, de súbito, Amélia adentra “Câmara do Conselho”, interpondo-se entre os dois… Amélia conseguira fugir de seus raptores e correu até o palácio… Juntos, Boccanegra, Fiesco e Gabriele rejubilam, “Amelia!!”… E todos repetem, “Amelia!!” Então, ela exorta ao doge, “O Doge… ah salva… Salva l’Adorno tu!” (“Oh, doge… salva… salva Adorno!) Boccanegra ordena aos guardas que continham Gabriele, “Nessun l’offenda” (“Ninguém o ofenda”) E segue, “Cade l’orgoglio e al suon del suo dolore tutta l’anima mia parla d’amore…” (“Orgulho desmorona diante da tua dor e toda minha alma fala de amor…”) “Amelia, di’ come tu fosti rapita e come al periglio potesti campar” (“Amelia, conte-nos como foste raptada e como escapaste do perigo”)…

Amélia relata, “Nell’ora soave che all’estasi invita, soletta men givo sul lido del mar” (“Em tranquila hora, que convida ao êxtase, caminho sozinha pela praia”) “Mi cingon tre sgherri, m’accoglie un naviglio” (“Então, três capangas me cercaram e me levaram a um navio”). Povo presente exclama, “Orror!”… Segue Amélia, “Soffocati non valsero i gridi… Io svenni e al novello dischiuder del ciglio, Lorenzo in sue stanze presente mi vidi…” (“Meus gritos, sufocados, nada adiantaram… desmaiei e, ao abrir os olhos, vi Lorenzino…”) Outra vez, povo exclama, “Lorenzino!”… Nobres reagem, “Abbasso le scuri!” (“Abaixem os machados!”). Amélia suplica, “Pietà!” (“Compaixão!”)…

Leone Giraldoni, barítono italiano – Boccanegra, 1857.

E Simon, indignado, grita: “Fratricidi!!!…” E canta famosa ária, “Plebe! Patrizi! Popolo!” (“Plebeus! Patrícios! Povo!”), onde lamenta as cisões e as rivalidades, “Dalla feroce storia! Erede sol dell’odio, mentre v’invita estatico Il regno ampio dei mari” (“De feroz história, somos herdeiros apenas do ódio, enquanto vasto reino dos mares nos convida ao êxtase”) “Piango su voi, sul placido raggio del vostro clivo, là dove invan germoglia Il ramo dell’ulivo. Piango sulla mendace festa dei vostri fior… E vo gridando: pace! E vo gridando: amor!” (“Choro por tudo, pelo raio plácido da encosta, onde o ramo da oliveira brota em vão… Choro pela celebração mentirosa das flores… E sigo gritando: Paz! Amor!…”) 

Então, Amélia se dirige a Fiesco, “Pace! lo sdegno immenso raffrena per pietà! Pace! t’ispiri un senso di patria carità!” (“Paz! contenha sua imensa indignação com piedade!… Paz! que te inspire o senso da caridade patriótica!”) E Pietro segue alertando Paolo, “Tutto fallì, la fuga sia tua salvezza almen” (“Tudo falhou, a fuga será tua salvação”) Paolo responde, “No, l’angue che mi fruga è gonfio di velen” (“Não, o verme que me procura está cheio de veneno”)… E Gabriele se dirige a Amélia, “Amelia è salva, e m’ama! Sia ringraziato il ciel! Disdegna ogni altra brama l’animo mio fedel” (“Amelia está segura e me ama! Graças a Deus! Minha alma fiel desdenha qualquer outro desejo”)…

“Simon Boccanegra” – Amélia e Fiesco – “teatro_Reggio_di Parma”, 2010.

E Fiesco, incomodado pela liderança de Simon e aferrado às rivalidades políticas, canta, “O patria! a qual mi serba vergogna il mio sperar! Sta la città superba nel pugno d’un corsar!” (“Oh, Pátria! para a qual minha esperança é vergonha! A cidade orgulhosa está no punho de um corsário!”). Mas, os presentes respondem ainda sensibilizados pelas palavras do doge, “Il suo commosso accento sa l’ira in noi calmar; vol di soave vento che rasserena il mar…” (“Seu tom comovente acalma nossa raiva; assim como a brisa suave acalma o mar…”)

Então, Gabriele oferece sua espada ao doge, “Ecco la spada!” (“Eis minha espada!”) Doge ordena a Gabriele, “Questa notte sola qui prigione sarai, finché la trama tutta si scopra; No, l’altera lama serba, non voglio che la tua parola!” (“Esta noite estarás prisioneiro, até que a trama seja esclarecida. Não, tua orgulhosa lâmina não apreendo, me basta tua palavra!”) E Gabriele acata, respeitosamente, “E sia!” (“Que assim seja!”)…

Mas, a Paolo, doge dirige-se energicamente, “Paolo!”… Atônito em meio aos demais, Paolo responde, “Mio Duce!” (“Meu doge!”). E o doge, com tremenda autoridade, energia crescente e desconfiando de Paolo, canta, “In te risiede l’austero dritto popolar; è accolto l’onore cittadin nella tua fede: bramo l’ausiglio tuo…” (“Em ti reside o direito austero do povo; e a honra da cidade é acolhida em tua fé: assim, anseio por tua ajuda…”) “V’è in queste mura un vil che m’ode e impallidisce in volto. Già la mia man l0 afferra per le chiome! Io so il suo nome… È nella sua paura. Tu al cospetto del ciel e al mio cospetto sei testimon. Sul manigoldo impuro piombi il tuon del mio detto: Sia maledetto! e tu ripeti il giuro” (“Há dentro destas muralhas um homem vil que me ouve e empalidece. Minha mão já o agarra pelos cabelos! Eu sei o nome dele… Está no medo dele. Você é uma testemunha diante do céu e diante de mim. Que o trovão de minhas palavras caia sobre canalha impuro: Maldito seja!”) Paolo, aterrorizado e trêmulo, sussurra, “Sia maledetto… Orror!” (“Maldito sejas… Horror!”) E ferozmente, todos hostilizam Paolo, “Sia maledetto!!! Sia maledetto!!!” (“Maldito sejas!!! maldito sejas!!!”), concluindo 1° ato!  

“Simon Boccanegra” – final do 1º ato, Simon acusa Paolo – “teatro Reggio di Parma”, 2010.

2° Ato – Aposentos do doge, no Palácio Ducal de Gênova 

Breve introdução orquestral – “allegro agitato”, sugere ansiedade e insegurança, preparando entrada de Paolo, secundado por Pietro, nos aposentos do doge. Da varanda, Paolo orienta Pietro, “Quei due vedesti?Li traggi tosto dal carcer loro per l’andito ascoso, che questa chiave schiuderà” (“Vés aqueles dois? Traga-os como prisioneiros, liberte-os com esta chave, da passagem escondida na prisão”)… Pietro obedece e se retira… 

Ressentido e vingativo, Paolo canta, “Me stesso ho maledetto! E l’anatéma m’insegue ancor… e l’aura ancor ne trema! Vilipeso… reietto dal Senato e da Genova, qui vibro l’ultimo strai pria di fuggir; qui libro la sorte tua, Doge, in quest’ansia estrema. Tu, che m’offendi e che mi devi il trono, qui t’abbandono al tuo destino in questa ora fatale…” (“Ele me amaldiçoou! E o que disse ainda me assombra… minha respiração treme! Vilipendiado… rejeitado pelo Senado e por Gênova, aqui, último momento antes da fuga; aqui reservo teu destino, doge, nesta extrema ansiedade. Tu, que me ofendeste e me deves o trono, agora te abandono, aqui, ao destino e hora fatal…”) 

“Simon Boccanegra” – Paolo nos aposentos de Simon – “teatro Reggio di Parma”, 2010.

Então, Paolo toma um frasco e esvazia conteúdo num cálice: “Qui ti stillo una lenta, atra agonia…” (“Aqui, te destilo uma agonia lenta e sombria…”) “Là t’armo un assassino. Scelga morte sua via fra il tosco ed il pugnale” (“Vou te tratar como criminoso. Deixemos que a morte escolha teu destino, entre o veneno e o punhal”)…

Entram Fiesco e Gabriele, acompanhados por Pietro, que retorna… Fiesco indaga, “Prigioniero, in qual loco m’adduci?”(“Prisioneiro, em que lugar estou?”) E Paolo responde, “Nelle stanze del Doge; e favella a te Paolo” (“Nos aposentos do doge; e Paolo fala com você”) Fiesco segue, “I tuoi sguardi son truci…” (“Tua aparência é sombria…”) E canta Paolo, “Io so l’odio che celasi in te. Tu m’ascolta…” (“Conheço o ódio dentro de você. Me escute…”) Paolo fala do exército “guelfo” para enfrentar o doge, mas Fiesco alerta: “Ma vano fia tanto ardimento! Questo Doge, abborrito da me quanto voi l’abborrite, v’appresta nuovo scempio…” (“Tal ousadia será em vão! Este doge, que abomino tanto quanto você, está preparando novo massacre…”)

E Fiesco, surpreendido com proposta de Paolo, canta, “Mi tendi un agguato!” (“Uma emboscada!”) E Paolo reitera, “Un agguato?… Io t’insegno vittoria!” (“Uma emboscada?… eu te proponho uma vitória!”) “Trucidarlo qui, mentre egli dorme…” (“Matá-lo aqui, equanto ele dorme…”). Mas, lider honrado, apesar da rivalidade com Boccanegra, Fiesco se nega, “Osi a Fiesco proporre un misfatto?” (“Ousas propor a Fiesco um atentado?”)… E diante da negativa de Fisesco, Paolo, incisivo, determina, “Al carcer ten va!” (“Então, voltes ao cárcere!”)

“Simon Boccanegra” – Paolo, Fiesco, Pietro e Gabrieli – “teatro Reggio di Parma”, 2010.

Fiesco se retira e Gabriele tenta segui-lo, mas é detido por Paolo, que indaga, “Amelia dunque mai tu non amasti?” (“Então, você nunca deixou de amar Amélia?”). Surpreso, Gabriele responde, “Che dici?…” (“Que dizes?…”) Paolo segue, “È qui” (“Ela está aqui”) E Gabriele, surpreso, canta, “Qui, Amelia!” (“Aqui, Amélia!”) E Paolo conta da desconfiaça, ao confundir encontro afetuoso entre Simon e Amélia, pai e filha, como um caso amoroso, guardando profunda decepção… E vocifera, “E del vegliardo segno è alle infami dilettanze” (“Do velhaco, ela é motivo de prazeres infames”)… Indignado, Gabrile adverte, “Astuto dimon, cessa…” (“Diabo astuto, pare…”) Então, Paolo se apressa em fechar as portas e ameaça Gabriele: “Da qui ogni varco t’è conteso. – Ardisci Il colpo… O sepoltura avrai fra queste mura!” (“A partir de agora, cada passagem está fechada para ti. Atreva-se… e serás enterrado entre estes muros!”)… E parte às pressas!

Sozinho e perturbado, Gabriele amarga as desconfiaças reveladas por Paolo… “O inferno! Amelia qui! L’ama il vegliardo!…” (“Oh, inferno! Amélia aqui! O velhaco a ama!…”) “E il furor che m’accende m’è conteso sfogar!…” (“A fúria que me inflama, preciso conter!…”) “Tu m’uccidesti il padre… tu m’involi il mio tesoro…” (“Você matou meu pai… você levou meu tesouro…”) “Trema, iniquo… già troppa era un’offesa, doppia vendetta hai sul tuo capo accesa” (“Treme, vilão… fui por demais ofendido, dupla vingança paira sobre tua cabeça”)… E segue grande ária, onde Gabriele canta, “Sento avvampar nell’anima furente gelosia!” (“Ciúme furioso queima em minha alma!”) “Piango!… pietà, gran Dio, del mio martiro!… Pietoso cielo, rendilà, rendila a questo core!” (“Clamo!… piedade, grande Deus, pelo meu martírio!… Piedoso céu, devolva-a, devolva-a a este coração!”)

“Simon Boccanegra” – Gabriele e Amélia – “Teatro Mariinsky”, 2016.

Subitamente, entra Amélia e encontra Gabriele. Ambos se perguntam como chegaram ao palácio. Gabriele fora preso, trazido por Paolo e Pietro, então, insinua, “Il tiranno ferale… Egli t’ama?…” (“O tirano selvagem… Ele te ama?…”) E Amelia responde, “D’amor santo… l’amo al pari…” (“De amor sagrado… e eu o amo igualmente…”). Segue Amélia, “Infelice!… mel credi, pura io sono…” (“Infeliz!… creia, eu sou pura…”) “Concedi che il segreto non aprasi ancor” (“Comprometa-se que o segredo não seja revelado”) Gabriele reage, “Parla – Il tuo silenzio è funebre vel che su me distendi” (“Fala – teu silêncio é véu fúnebre, que se estende sobre mim”) E Amélia canta, “Sgombra dall’alma il dubbio… Santa nel petto mio l’immagin tua s’accoglie come nel tempio Iddio” (“Limpe sua alma de dúvidas… pois, acolho uma imagem no peito como num templo de Deus”), aludindo ao retrato da mãe…

Neste momento, percebem a chegada do doge e Amélia pede que Gabriele se esconda… Gabriele se nega e Amelia adverte, “Il patibol t’aspetta” (“O cadafalso te espera”) “Nell’ora stessa teco avrò morte…” (“E no mesmo momento, terei morrido com você…”). Então, Amélia convence Gabriele a se esconder… Entra Boccanegra, “Figlia!…”. Amelia responde, “Sì afflitto, o padre mio?” (“Você está triste, meu pai?”) E o doge, ‘Inganni… ma tu piangevi?…” (“Me engano… ou estavas chorando?…”) E segue o doge, “La cagion m’è nota delle lagrime tue… Già mel dicesti… Ami; e se degno fia dite l’eletto del tuo core…” (“A razão das lágrimas eu sei… você já me disse… tu amas; e se ele for digno, revela o escolhido do seu coração…”) Amélia canta, “Adorno”. E o doge reage, “Il mio nemico!… congiura coi Guelfi…” (“Meu inimigo!… que conspira com os guelfos…”)

“Simon Boccanegra” – teatro “alla Scala”, Milão, 2024.

Amélia segue, “Ciel!… perdonagli!…” (“Céus!… perdoa-lhe!…”) Doge responde, “Nol posso!”. E Amélia adverte, “Con lui morrò…” (“Então, morrerei com ele…”) Doge indaga, “L’ami cotanto?” (“Vovê o ama tanto assim?”) Amélia exclama, “Io l’amo d’ardente, d’infinito amor. O al tempio con lui mi guida, o sopra entrambi cada la scure del carnefice…” (“Amo com amor ardente e infinito. Ou me levem ao templo com ele, ou que o machado do carrasco caia sobre nós dois…”)

Canta Simon, “O crudele destino! O dileguate mie speranze! Una figlia ritrovo; ed un nemico a me la invola… Ascolta: s’ei ravveduto… forse il perdono” (“Oh, cruel destino! Oh, minhas esperanças perdidas! reencontro minha filha e um inimigo a leva… Escuta: se ele se arrepender… talvez o perdoe…”) Amélia exulta, “Padre adorato!…” (“Pai adorado!…”) E Simon ordena, “Ti ritraggi!” (“Então, saia!”) Amélia tenta permanecer, mas Simon insiste. E receosa por Gabriele, ainda escondido, sai sussurrando, “Gran Dio! come salvarlo?…” (“Grande Deus, como salvá-lo?…”) 

Gabriele segue escondido, a pedido de Amelia. E o doge, que permanece em cena, reflete, “Doge! ancor proveran la tua clemenza I traditori? Di paura segno fora il castigo. – M’ardono le fauci” (“Doge! Traidores ainda testarão tua clemência? Medo será sinal para a punição… meus maxilares queimam”) Então, Simon pega uma taça e bebe conteúdo (envenenado por Paolo…) E canta, “Perfin l’onda del fonte è amara al labbro dell’uom che regna… O duol… la mente è oppressa… (“Até água da fonte é amarga aos lábios de quem reina… Oh, dor… tenho a mente oprimida…”) E exausto, senta-se, “Stanche le membra… ahimè… mi vince il sonno” (“Meus membros estão cansados… ah… o sono me vence…”) E reflete, “Oh! Amelia… ami… un nemico…” (Oh! Amélia… ama… um inimigo…”). Então, se deita e adormece…

Renato Bruson, barítono italiano – grande intérprete verdiano.

E escondido, cautelosamente, Gabriele aparece, se aproxima e contempla o doge… “Ei dorme!… quale sento ritegno?… E riverenza o tema?… vacilla il mio voler?… (“Está dormindo… sinto-me contido?… por reverência ou medo?… minha vontade vacila?…) “Th dormi, o veglio, del padre mio carnefice, tu mio rival… Figlio d’Adorno!… la paterna ombra ti chiama vindice…” (“Dorme, oh! velho carrasco de meu pai, agora, meu rival… Como filho de Adorno! sombra paterna clama por vingança…”) E Adorno toma um punhal, pronto para esfaquear o doge… Mas, Amélia, que havia se retirado, retorna e de novo se interpõe…

Anna d’Angeri, por Carl Bergamasco, soprano austriaco – “Amelia”, na revisão de 1881.

Canta Amélia, “Insensato! Vecchio inerme il tuo braccio colpisce!” (“Insensato! Teu braço ataca um velho indefeso!”) Gabriele reage, “Tua difesa mio sdegno raccende!” (“Tua defesa reacende minha raiva!”) E Amélia insiste, “Santo, il giuro, è l’amor che ci unisce, né alle nostre speranze contende” (“Santo, eu juro, o amor que nos une, não compete com nossas esperanças”)… E Gabriele, “Che favelli?…” (“Que dizes?…”). Doge começa a acordar… E Amélia segue, “Nascondi il pugnale, vien… ch’ei t’oda…” (“Guarda o punhal, vem… deixe-o te ouvir…”) E Gabriele, estarrecido e indignado, canta “Prostrarmi al suo piede?” (“Prostrar-me aos pés dele?”)…

Repentinamente, doge se levanta e novamente oferece o peito ao ódio de Gabriele, “Ecco il petto… colpisci, sleale!” (“Aqui está meu peito… golpeie-o, traidor!”) Simon era um guerreiro, velho e inabalável; de muitas lutas, em terra e nos mares… Então, indaga, “Chi t’aprì queste porte?” (“Quem te abriu a porta?”)… Amélia nega ter sido ela. E Gabriele responde, “Niun quest’arcano saprà” (“Ninguem saberá”) E Doge repreende, “Il dirai fra tormenti…” (“Então, responderás em tormento…”) Amélia clama, “Ah pietà!” (“Ah! Misericórdia!”) E segue o doge, “Ah, quel padre tu ben vendicasti, che da me contristato già fu… Un celeste tesor m’involasti… La mia figlia…” (“Ah! teu pai vingaste bem, pela tristeza que causei… Tesouro celestial me roubaste… a minha filha!”)

“Simon Boccanegra” – Gabrieli, Amelia e Simon – “teatro Reggio di Parma”, 2010.

Espantado, Gabriele canta, “Suo padre, sei tu!!… Suo padre, sei tu!!” E atordoado, mas confortado, segue, “Perdono, Amelia – Indomito geloso amor fu il mio…” (“Perdão, Amélia – Indômito foi meu amor ciumento…”) “Doge, il velame squarciasi… Un assassin son io… dammi la morte; il ciglio A te non oso alzar” (“Doge, o véu está rasgado… Sou um assassino… condena-me à morte; não ouso mais te levantar meu olhar”) Gabriele havia assassinado Lorenzino, que sequestrara Amélia em conluio com Paolo… E Amélia, sussurrando, clama por sua mãe, “Madre, che dall’empireo proteggi la tua figlia” (“Mãe, do epíreo, protege tua filha”) “Del genitor all’anima meco pietà consiglia…” (“Ao genitor, aconselha piedade pela minha alma…”) “Ei si rendea colpevole solo per troppo amor…” (“Ele – Gabriele – é culpado apenas por amar demais…”)

Doge reflete, “Deggio salvarlo e stendere la mano all’inimico?…” (“Devo salvá-lo e estender a mão ao inimigo?…”) E segue,”Sì – pace splenda ai Liguri, si plachi l’odio antico; sia d’amistanze italiche Il mio sepolcro altar!” (“Sim – que a brilhe a paz entre os lígures, que o antigo ódio seja aplacado; que meu túmulo torne-se altar da fraternidade italiana!”), em clara alusão às rivalidades e desunião vividas na penísnsula, sobretudo, referindo-se aos ideais do sec. XIX, que brandiam pela unificação! 

“Simon Boccanegra” – Gabriele e Simon – “Teatro Mariinsky”, 2016.

Mas, grande revolta estourava em Gênova. Da praça, ouvem-se gritos, pelo coro interno, “All’armi, all’armi, o Liguri, patrio dover v’appella – Scoppiò dell’ira il folgore” (“Às armas, às armas, Oh, ligurianos, dever patrótico vos chama – Relâmpago da raiva irrompeu!”) “E notte di procella. Le guelfe spade cingano di tirannia lo spalto – del coronato veglio, su, alla magion, l’assalto!” (“A noite será tempestuosa. Espadas guelfi, cerquem o bastião da tirania – do velho coroado, avancem, mansão acima, em assalto!”).

Amélia corre para o balcão, “Quai gridi?…” (“Quem grita?…”) Gabriele se dirige ao Doge, “I tuoi nemici…” (“Teus inimigos…”) Doge acente, “Il so” (“Eu sei”) E Amélia alerta, “S’addensa Il popolo” (“Multidão se adensa”) Doge ordena a Gabriele, “T’unisci a’ tuoi…” (“Vá juntar-se aos seus…”) E Gabriele responde, “Mai più…” (“Nunca mais…”) Doge insiste e escreve um bilhete, “Dunque messaggio, ti reca lor di pace. E il sole di domani non sorga a rischiarar fraterne stragi!” (“Leve esta mensagem, ofereça-lhes a paz… Não permitam que o sol do amanhecer nasça para iluminar outro massacre fraterno!”)

Gabriele concorda e afirma sua lealdade a Simon, “Teco a pugnar ritorno, se la clemenza tua non li disarmi!” (“Se tua misericórdia não os desarmar, voltarei para lutar ao teu lado!”) E, acenando para Amélia, doge canta, “Sarà costei tuo premio!” (“Ela – Amélia – será teu destino!”) E Gabriele exulta, “O inaspettata gioia!” (“Oh, suprema alegria!”). Assim, doge autoriza união de ambos e Amélia exclama, “O padre!”, concluindo magnífico e comovedor tercetto… E com a multidão ao fundo, em polvorosa, doge e Gabrieli reafirmam suas lealdade e decisão de lutarem juntos – sacam as espadas e todos cantam, “All’armi!! All’armi!!…” – finalizando o 2° ato!  

“Simon Boccanegra” – teatro “alla Scala”, Milão, 2024.

3° Ato – No grande salão do Palácio Ducal, com vista para Gênova e pro mar 

Após confronto entre os partidários guelfi e as forças do doge, ouvem-se gritos: no interior do Palácio Ducal, “Evviva il Doge!”; e externamente, pelo coro interno, “Vittoria! Vittoria!”. Um capitão, comandante das forças palacianas, entrega a Fiesco sua espada, libertando-o. E Fiesco indaga sobre a batalha, “E i Guelfi?” (“E os guelfos?”) Capitão informa, “Sconfitti…” (“Derrotados…”) Fiesco lamenta, “O triste libertà…” (“Oh, triste liberdade…”) E entre os derrotados, reconhece Paolo, “Che?… Paolo?! – Dove sei tratto?” (“Você?… Paolo? – De onde você veio?”) Paolo se aproxima e responde, “All’estremo supplizio…” (“Do extremo suplício…”) “Il mio demonio mi cacciò fra l’armi dei rivoltosi e là fui colto; ed ora mi condanna Simon; ma da me prima fu il Boccanegra condannato a morte…” (“Meus demônios me empurraram para os braços dos deuses rebeldes e fui preso; agora, Simon me condena; mas antes de mim, Boccanegra foi condenado à morte…”)

“Simon Boccanegra” – teatro “alla Scala”, Milão, 2024.

Fiesco indaga, “Che vuoi dir?” (“Que queres dizer?”) Paolo responde, “Un velen… più nulla io temo, gli divora la vita” (“Um veneno… lhe devora a vida e nada mais temo”) Fiesco grita, “Infame!”. E Paolo reage, “Ei forse già mi precede nell’avel!…” (“Talvez ele me preceda no túmulo!…”). Em meio a tais vendetas e ódios, grande coro interno, em contraponto, clama pela paz e canta a união de Amélia e Gabriele, “Dal sommo delle sfere proteggili, o Signor; di pace sien foriere Le nozze dell’amor!” (“Do cume das esferas, protege-os, Senhor; que as bodas de amor sejam prenúncios de paz!”)

Frustrado, Paolo reage, “Ah! orrore!! Quel canto nuzial, che mi persegue, l’odi?… in quel tempio Gabriello Adorno sposa colei ch’io trafugava…” (Ah! Horror!! um canto nupcial que me assombra, ouves?… No templo, Gabriele Adorno desposa aquela que eu sequestrei…”) E novamente espantado, Fiesco reage, “Amelia?! Tu fosti il rapitor?! Mostro!!” (“Amélia?! Foste o raptor?! Monstro!!”). E chegam alguns guardas, que prendem e arrastam Paolo…

“Simon Boccanegra” – Metropolitan Opera, New York, USA.

Canta Fiesco, “Inorridisco!… no, Simon non questa vendetta chiesi, d’altra meta degno (“Estou horrorizado!… não, Simon, não tramei tal vingança, que ofende minha dignidade”) “Eccolo… il Doge. Alfine è giunta l’ora di trovarci a fronte!” (“Chega… o Doge. Finalmente, a hora de nos encontrarmos”). E, à entrada do doge, Fiesco escolhe local discreto e pouco iluminado…

Solenemente, entram o Doge, acompanhado por um capitão mais um trompetista. Da varanda, após a vitória, capitão anuncia as novas ordens: “Cittadini! per ordine del Doge S’estinguano le faci e non s’offenda col clamor del trionfo i prodi estinti” (“Cidadãos! por ordem do doge, que as tochas sejam apagadas e que os heróis falecidos não sejam ofendidos com o clamor do triunfo”). E o capitão se retira…

“Simon Boccanegra” – teatro “alla Scala”, Milão, 2024.

Doge inicia com uma reflexão, “M’ardon le tempia… Ah! ch’io respiri L’aura beata del libero cielo! Oh, refrigerio!… la marina brezza!… Il mare!… il mare!… quale in rimirarlo di glorie e di sublimi rapimenti. Mi si affaccian ricordi! – Il mare!… il mare!… perché in suo grembo non trovai la tomba?… (“Minhas têmporas queimam… Ah! deixe-me respirar o ar feliz do céu livre! Oh, frescor!… a brisa do mar!… O mar!… o mar!… enquanto o contemplo, memórias de glórias e sublimes arrebatamentos me invadem! O mar!… o mar!… por que não encontrei o túmulo em teu colo?…”) 

Canta Fiesco, com profundo ressentimento, “Delle faci festanti al barlume cifre arcane, funebri vedrai – Tua sentenza la mano del nume sopra queste pareti vergò. Di tua stella s’eclissano i rai; La tua porpora in brani già cade; Vincitor fra le larve morrai!” (“Das tochas que celebram figuras arcanas, fúnebres as verá – A mão de Deus escreveu tua sentença nestas paredes. Os raios de tua estrela estão eclipsados; tua púrpura já cai em pedaços; vitorioso entre as larvas, você morrerá!”)

“Simon Boccanegra” – teatro “alla Scala”, Milão, 2024.

Estranhando a presença, doge canta, “Quale accento?” (“Que sotaque?”) “Fia ver? – Risorgon dalle tombe i morti?…” (“Isto é verdade? – mortos ressucitam dos túmulos?…”) E Fiesco desafia, “Non mi ravvisi tu?” (“Você não me reconhece?”) Então, Doge se surpreende, “Fiesco!…”. E ironicamente, o outro responde, “Simon!… I morti ti salutano!…” (“Simon!… os mortos te saudam!…”) Doge canta, “Gran Dio!… compiuto alfin di quest’alma è il desio!” (“Grande Deus!… desejo desta alma, finalmente, realizado!”) Mas, extremamente rancoroso, Fiesco segue, “Come fantasima Fiesco t’appar, antico oltraggio a vendicar” (“Como fantasma, Fiesco aparece para vingar antiga insolência”)…

E ao ódio de Fiesco, Simon contrapõe desejo de concórdia, “Di pace nunzio Fiesco sarà. Suggella un angelo nostra amistà” (“Da paz, Fiesco será o anunciador. Pois um anjo selará nossa amizade”) Fiesco ainda não sabe de Amélia, sua neta, filha de Simon e Maria… Da menina plebeia, que outrora adotou… E indaga, “Che dici?” (“Que dizes?”) Então, Simon canta, “Se a te l’orfanella concedea che perduta per sempre allor piangea; in Amelia Grimaldi a me fu resa e il nome porta della madre estinta…” (“Se a ti foi concedida a órfã que chorava, perdida para sempre; em Amélia Grimaldi, a mim ela foi devolvida e leva o nome de sua falecida mãe…”)

“Simon Boccanegra” – Simon e Fiesco – “Teatro_Mariinsky”, 2016.

Fiesco exclama, “Cielo!… perché mi splende il ver sì tardi?” (“Céus!… porque a verdade brilhou tão tarde, para mim?”) Então, Fiesco se comove, enquanto Simon canta, “Piangi?… perché da me volgi gli sguardi?…” (“Choras?… porque desvias os olhos de mim?…”) E Fiesco segue, “Piango, perché mi parla In te del ciel la voce; sento rampogna atroce fin nella tua pietà…” (“Choro porque voz celestial fala em você; ouço reprovações atrozes, mesmo em sua piedade…”) Acolhedor e buscando a concórdia, Simon canta, “Vien, ch’io ti stringa al petto, o padre di Maria; balsamo all’alma mia il tuo perdon sarà” (“Vem, deixa te abraçar em meu peito, oh! pai de Maria; seu perdão será um bálsamo para minha alma”). Acolhendo Simon e solidário, Fiesco alerta do veneno, que Paolo colocou nos aposentos ducais, “Ahimè! morte sovrasta… un traditore il velen t’apprestò!” (“Ai de mim! tua morte se aproxima… traidor te preparou um veneno!”)

Doge canta, “Tutto favella, il sento, a me d’eternità…” (“Tudo que dizes, eu sinto, da eternidade…”) Fiesco reage, “Crudele Fato!” (“Cruel destino!”). Maria se aproxima e doge pede a Fiesco, “Taci, non dirle… anco una volta benedirla voglio…” (“Quieto, não conte a ela… quero abençoá-la mais uma vez…”) E abandona-se numa cadeira, enfraquecido…

“Simon Boccanegra” – teatro “alla Scala”, Milão, 2024.

Entram Maria (Amélia), Gabriele, senadores nobres e plebeus, além de pagens, com algumas tochas… Maria exclama, “Chi veggo!…” (“Quem vejo!…”) Simon canta, “Deponi la meraviglia – in Fiesco, il padre vedi dell’ignota Maria, che ti die’ vita” (“Deixe admiração de lado – em Fiesco vês o pai da desconhecida Maria, que te deu a vida”) E Maria canta, “Egli?… Fia ver?…” (“Ele?… verdade?…”) Fiesco exclama, “Maria!!”, que responde, “Oh gioia! Dunque gli odii funesti han fine!…” (“Oh, alegria! Então, os ódios fatais acabaram!…”) Doge acente, “Tutto finisce, o figlia…” (“Tudo acabado, oh! filha…”) “Per me l’estrema ora suonò!” (“Mas, para mim, a hora final chegou!”) 

Exitante, Maria indaga, “Qual ferale pensier t’attrista sì sereni istanti?” (“Que pensamente cruel te entristece, em momento tão sereno?”) Doge canta, “Maria, coraggio… A gran dolor t’appresta…” (“Coragem Maria… prepara-te para grande dor…”) Maria e Gabriele indagam, “Che parli?… ” (” Do que falas?…”) e caem aos pés do doge, suplicantes… Doge canta, “Gran Dio, li benedici pietoso dall’empiro; a lor del mio martiro cangia le spine in fior” (“Grande Deus, abençoe-os do teu piedoso império; por eles, espinhos de meu martírio se transformam em flores”) Maria canta, “No, non morrai, l’amore vinca di morte il gelo” (“Não, não morra, deixe o amor vencer a gélida morte”) “Risponderà dal cielo petade al mio dolor!” (“Sinal celestial responderá à minha dor!”)

“Simon Boccanegra” – “teatro Carlo Felice”, Gênova, 1991.

E Gabriele lamenta, “O padre, o padre, il seno furia mi squarcia atroce… come passò veloce l’ora del lieto amor!” (“Oh pai, oh pai, meu peito dilacera com fúria atroz… tão depressa passou a hora feliz do amor!”) E Fiesco responde, “Ogni letizia in terra è menzognero incanto. D’interminato pianto fonte è l’umano cor…” (“Toda alegria na terra é encantamento mentiroso. O coração humano é fonte de choro sem fim…”) E Simon canta, “T’appressa, o figlia… io spiro… stringi… il morente… al cor!…” (“Te aproxima, oh! filha… estou morrendo… segura… este moribundo… em teu coração!…”)

Coro canta, “Sì – piange, piange… s’avvolge la natura in manto di dolor!” (“Sim – chora, chora… a natureza se envolve em manto de dor!”) Agonizando, doge determina aos senadores que se aproximem: “Senatori, sancite il voto estremo… questo serto ducal la fronte cinga di Gabriele Adorno! Tu, Fiesco, compi il mio voler…” (“Senadores, sancionem voto derradeiro… que a coroa ducal envolva cabeça de Gabriele Adorno! E tu, Fiesco, cumpre minha vontade…”) E, em último suspiro, Simon clama pela eterna amada, “Maria…” Então, desfalece e morre…

“Simon Boccanegra” – “teatro Carlo Felice”, Gênova, 1991.

Comovidos, Maria e Gabriele ajoelham-se diante do corpo, “O padre!!”… E Fiesco, atendendo última vontade do Doge, dirige-se ao balcão, acompanhado por senadores e pajens, e anuncia: “Genovesi!… In Gabriele Adorno il vostro Doge or acclamate!” (“Genoveses!… Aclamem Gabriele Adorno, seu novo doge!”) O povo, indignado e confuso, reage: “No – Boccanegra!!!”… E Fiesco segue, “È morto… Pace per lui pregate!!…” (“Está morto… paz por ele, rogai!!…”) Sinos anunciam morte do grande líder plebeu – todos se compadecem e rogam: “Pace per lui…”

– Cai o pano –

Entre os grandes trabalhos de Verdi, “Simon Boccanegra” privilegia as vozes graves, entre barítonos e baixos. E após estreia em Veneza, 12/03/1857, gradualmente ganhou os palcos do mundo… Em obra densa, composta aos 44 anos, Verdi adotou a música contínua, evitando os números isolados… E a revisão com Arrigo Boito, de 1881, ensejou cena da “Câmara do Conselho”, com nova música e de extremo vigor; música da maturidade de Verdi, composta após “Aída” e a grande “Messa da Requiem”…

Giuseppe Verdi, músico e ativista do “Risorgimento”.

De outro, a estreia, em Veneza, antecedia de dois anos a deflagração da “2ª guerra de independência”, com apoios da França e Prússia. E em dez anos, austríacos foram definitivamente derrotados e proclamada a monarquia italiana. Assim, temática política e apelo à unificação são marcantes. Também a relação pai e filha, algo extremamente sensível para Verdi, pois lhe evocava perda da família, quando jovem, entre 24 e 26 anos – esposa e dois filhos… Lembranças que, invariavelmente, o levavam às lágrimas, especialmente, a memória da filha… Assim, música de Amélia, único personagem feminino no drama, é pungente e marcante…

Além disto, parceria com Arrigo Boito reafirmava grandeza e talento do músico, quando era alvo de escárnio e agressivos ataques da vaguarda italiana. Assim, até os 80 anos, Verdi aceitou desafios e renovou-se, surpreendendo o mundo artístico com respostas, sobejamente, maiores que as críticas e rotulações recebidas…

Giuseppina e Giuseppe Verdi, desenho.

Neste sentido, revisão de “Simon Boccanegra” teve caráter experimental. E, bem-sucedida, possibilitou, nos 12 anos seguintes, 1881/93, mergulho nas últimas obras-primas: “Otello” e “Falstaff”. Imenso percurso criativo, acompanhado por Giuseppina desde a 1ª ópera – “Oberto, conte di San Bonifacio”… E após a morte da esposa, aos 82 anos, 1897, Verdi não mais compôs para o teatro… Falecido aos 88 anos e adentrando o sec. XX, 1901, tornou-se autor de óperas mais encenado no mundo…

Após estreia em Veneza, no “La Fenice”, 12/03/1857, seguiram-se apresentações com sucesso em Reggio Emilia e Nápoles, 1858; em seguida, fracasso no “alla Scala”, em 1859, reiterando frustração de Verdi com o teatro milanês… No entanto, revisão com Boito ensejou nova montagem no “alla Scala”, em 1881, então, grande sucesso; depois, “Simon Boccanegra” foi retomada em Viena, em 1930; no “Metropolitan Opera”, New York, 1932; e novamente no “alla Scala”, em 1933. E seguiram-se, “Maggio musicale Fiorentino”, Florença, 1938; “Teatro Municipal”, Rio de Janeiro, 1942; “Sandler’s Wells Theatre”, Londres, 1948, e outras; gradualmente, consolidando-se no repertório…

“Teatro Municipal do Rio de Janeiro”.

Gravações de “Simon Boccanegra”

Vigésima primeira ópera de Verdi, considerando “Jerusalém – rifacimento de I Lombardi”, “Simon Boccanegra” ganhou os palcos do mundo. Entre os grandes trabalhos de Verdi, destacam-se os papéis masculinos, embora, papel de Amélia tenha particular importância dramática, brilhando nos ensembles e grandes concertatos. Seguem algumas gravações em CDs e DVDs:

  • Gravação em CD – Une Music, 1939

“The Metropolitan Opera House Orchestra and Chorus”, direção Ettore Panizza
Solistas: Elisabeth Rethberg (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Lawrence Tibbett (Simon Boccanegra) – Ezio Pinza (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Giovanni Martinelli (Gabrieli Adorno) – Leonard Warren (Paolo Albiani) – Louis D’Angelo (Pietro)
New York, USA

  • Gravação em LP/CD – CETRA, 1951

“Orchestra e Coro del Teatro dell’Opera di Roma della RAI”, direção Molinari-Pradelli
Solistas: Antonietta Stella (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Paolo Silveri (Simon Boccanegra) – Mario Petri (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Carlo Bergonzi (Gabrieli Adorno) – Walter Monachesi (Paolo Albiani) – Giorgio Giorgetti (Pietro)
Roma, Itália

Obs: Excelente produção, dado nível dos solistas, coro e orquestra!

  • Gravação em CD – Naxos/EMI/Angel/Virgin/Imports, 1957

“Orchestra e Coro del Teatro dell’Opera di Roma”, direção Gabrieli Santini
Solistas: Victoria de los Angeles (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Tito Gobbi (Simon Boccanegra) – Boris Christoff (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Giuseppe Campora (Gabrieli Adorno) – Walter Monachesi (Paolo Albiani) – Paolo Dari (Pietro)
Roma, Itália

Version 1.0.0
  • Gravação em LP/CD – IDIS, Instituto Discográfico Italiano, 1958

“Orquestra e Coro do teatro San Carlo”, direção Mario Rossi
Solistas: Leyla Gencer (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Tito Gobbi (Simon Boccanegra) – Ferruccio Mazzoli (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Mirto Picchi (Gabrieli Adorno) – Walter Monachesi (Paolo Albiani) – Giovanni Omodeo (Pietro)
Nápoles, Itália

Obs: Excepcional produção, dado nível dos solistas, coro e orquestra!

  • Gravação em LP/CD – Walhall, 1961

“Metropolitan Opera Chorus and Orchastra”, direção Nino Verchi
Solistas: Renata Tebaldi (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Frank Guarrera (Simon Boccanegra) – Giogio Tozzi (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Richard Tucker (Gabrieli Adorno) – Ezio Flagello (Paolo Albiani) – Norman Scott (Pietro)
Nova York, USA

  • Gravação em LP/CD – Gala, 1961

“Wiener Philharmoniker”, direção Gianandrea Gavazzeni
Solistas: Leyla Gencer (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Tito Gobbi (Simon Boccanegra) – Giogio Tozzi (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Giuseppe Zampieri (Gabrieli Adorno) – Rolando Panerai (Paolo Albiani) – Vittorio Susca (Pietro)
“Chor der Wiener Staatsoper”, Salzburg, Áustria

  • Vídeo youtube – Teatro Colón, 1964

“Orquestra e Coro do Teatro Colón”, direção Bruno Bartoletti
Solistas: Leyla Gencer (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Cornell MacNeil (Simon Boccanegra) – William Wilderman (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Carlo Cossutta (Gabrieli Adorno) – Gian-Piero Mastromei (Paolo Albiani) – Tulio Gagliardo (Pietro)
Buenos Aires, Argentina

  • Gravação em CD/LP – Myto Records, 1969

“Wiener Philharmoniker”, direção Josef Krips
Solistas: Gundula Janowitz (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Eberhard Wächter (Simon Boccanegra) – Nicolai Ghiaurov (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Carlo Cossutta (Gabrieli Adorno) – Robert Kerns (Paolo Albiani) – Tulio Gagliardo (Pietro)
“Chor der Wiener Staatsoper”, Viena, Áustria

Version 1.0.0
  • Gravação em CD – OPD/Opera d’Oro, 1972

“Orquestra e Coro do Teatro Alla Scala”, direção Claudio Abbado
Solistas: Mirella Freni (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Piero Cappuccilli (Simon Boccanegra) – Nicolai Ghiaurov (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Gianni Raimondi (Gabrieli Adorno) – Felice Schiavi (Paolo Albiani) – Giovanni Foiani (Pietro)
“Teatro Alla Scala”, Milão, Itália

  • Video youtube – “San Francisco Opera”, 1975

“San Francisco Opera Orchestra and Chorus”, direção Paolo Peloso
Solistas: Kiri Te Kanawa (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Ingvar Wixell (Simon Boccanegra) – Martti Talvela (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Giorgio Merighi (Gabrieli Adorno) – Allan Monk (Paolo Albiani) – James Courtney (Pietro)
San Francisco, USA

  • Vídeo youtube, 1976

“Orquestra do Teatro Alla Scala”, direção Claudio Abbado
Solistas: Katia Ricciarelli (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Piero Cappuccilli (Simon Boccanegra) – Ruggero Raimondi (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Veriano Luchetti (Gabrieli Adorno) – Felipe Schiavi (Paolo Albiani) – Konstantin Sfiris (Pietro)
“Coro do Teatro Alla Scala”, direção Romano Gandolfi
“Teatro Alla Scala”, Milão, Itália

  • Gravação em DVD – VAI, 1976

“NHK Symphony Orchestra”, direção Oliviero de Fabritis
Solistas: Katia Ricciarelli (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Piero Cappuccilli (Simon Boccanegra) – Nicolai Ghiaurov (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Giorgiu Merighi (Gabrieli Adorno) – Lorenzo Sacomani (Paolo Albiani) – Paolo Mazzotta (Pietro).

  • Vídeo youtube, 1978

“Orquestra do Teatro Alla Scala”, direção Claudio Abbado
Solistas: Mirella Freni (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Piero Cappuccilli (Simon Boccanegra) – Nicolai Ghiaurov (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Veriano Luchetti (Gabrieli Adorno) – Felice Schiavi (Paolo Albiani) – Giovanni Foiani (Pietro)
“Coro do Teatro Alla Scala”, direção Romano Gandolfi
“Teatro Alla Scala”, Milão, Itália

Obs: Produção nas comemorações do bicentenário do teatro “Alla Scala” (1778-1978).

  • Gravação em CD/LP – Deutsche Grammophon, 1979

“Orquestra do Teatro Alla Scala”, direção Claudio Abbado
Solistas: Mirella Freni (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Piero Cappuccilli (Simon Boccanegra) – Nicolai Ghiaurov (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Jose Carreras (Gabrieli Adorno) – José van Dam (Paolo Albiani) – Giovanni Foiani (Pietro)
“Coro do Teatro Alla Scala”, direção Romano Gandolfi
“Teatro Alla Scala”, Milão, Itália

Obs: Reconhecida produção, dado nível dos solistas, direção, coro e orquestra.

  • Gravação em DVD – Video, 1984

“Metropolitan Opera Chorus & Orchestra”, direção James Levine
Solistas: Anna Tomowa-Sintow (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Sherrill Milnes (Simon Boccanegra) – Paul Plishka (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Vasile Moldoveanu (Gabrieli Adorno) – Richard J. Clark (Paolo Albiani) – James Courtney (Pietro)
Nova York, USA

  • Gravação em CD/LP – Decca, 1989

“Orquestra do Teatro Alla Scala”, direção George Solti
Solistas: Kiri Te Kanawa (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Leo Nucci (Simon Boccanegra) – Paata Burchuladze (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Giacomo Aragall (Gabrieli Adorno) – Paolo Coni (Paolo Albiani) – Carlo Colomabara (Pietro)
“Coro do Teatro Alla Scala”, direção Giuliu Bertola
“Teatro Alla Scala”, Milão, Itália

  • Gravação em DVD – Deutsche Grammophon, 1995

“Metropolitan Opera Orchestra and Chorus”, direção James Levine
Solistas: Kiri Te Kanawa (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Vladimir Chernov (Simon Boccanegra) – Robert Lloyd (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Placido Domingo (Gabrieli Adorno) – Bruno Pola (Paolo Albiani) – Hao Jiang Tian (Pietro) 
Nova York, USA

  • Gravação em LP/CD – RCA Red Seal, BMG Classics, ORF, 1998

“Wiener Philharmoniker”, direção Claudio Abbado
Solistas: Katia Ricciarelli (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Renato Bruson (Simon Boccanegra) – Ruggero Raimondi (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Veriano Luchetti (Gabrieli Adorno) – Felipe Schiavi (Paolo Albiani) – Konstantin Sfiris (Pietro)
“Chor der Wiener Staatsoper”, Viena, Áustria

  • Video youtube – “San Francisco Opera”, 2001

“San Francisco Opera Orchestra and Chorus”, direção Donald Runnicles
Solistas: Carol Vaness (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Paolo Gavanelli (Simon Boccanegra) – Samuel Ramey (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Carlo Ventre (Gabrieli Adorno) – Nikolai Putilin (Paolo Albiani) – Raymond Aceto (Pietro)
San Francisco, USA

– Download no PQP Bach

Para download e compartilhamento da música de Verdi em “Simon Boccanegra”, sugerimos gravação da “Orquestra e Coro do teatro San Carlo”, de Nápoles, direção Mario Rossi, com Leyla Gencer, Tito Gobbi, Ferrucio Mazzoli, Mirto Picchi e outros – registro pelo selo “IDIS, Instituto Discográfico Italiano”, de 1958:

Leyla Gencer, soprano dramático – “La diva turca”.

Interpretando “Amélia Grimaldi (Maria Boccanegra)”, grande soprano turca, Leyla Gencer, nascida nos arredores de Istambul, estudou com o soprano italiano Giannina Arangi-Lombardi. Então, cantou no “Coro Estatal da Turquia” e estreou como “Santuzza”, em “Cavalleria Rusticana”, de Mascagni, 1950…

Seu repertório incluiu mais de 70 personagens e a estreia internacional ocorreu no teatro “San Carlo”, de Nápoles, em “Madamma Butterfly”, de Puccini; depois, em “Eugene Onegin”, de Tchaikovsky. Então, estreou no “alla Scala”, de Milão, em “Diálogos das Carmelitas”, de Francis Poulenc, 1957…

Tito Gobbi, grande barítono italiano.

Conhecida como “La diva turca” ou “La regina”, notabilizou-se pela cor, extensão e amplos recursos vocais; ao que agregou talento de atriz, sendo considerada “uma das vozes mais arrebatadoras de todos tempos” – conforme nota do teatro “alla Scala”, quando de seu falecimento, em 2008… Da mesma geração de Maria Callas e Renata Tebaldi, deixou poucos registros fonográficos, apesar da longa carreira – mais de 40 anos… Pela intensa carga dramática, notabilizou-se em interpretações de Donizetti e Verdi… 

Além de Gencer, a produção conta com renomados intérpretes. E realizando papel de “Boccanegra”, Tito Gobbi, barítono italiano, nascido em Bassano del Grappa. Ainda jovem, Tito Gobbi abandonou os estudos de direito para dedicar-se, inteiramente, ao canto lírico e, ao longo da carreira, realizou mais de cem papéis, incluindo obras raras e contemporâneas, como “Wozzeck”, de Alban Berg; além do repertório permanente e tradicional, com óperas de Rossini, Verdi e Puccini…

Ferruccio Mazolli, baixo operístico italiano.

Gobbi também deixou registros para o cinema e dividiu o palco inúmeras vezes com Maria Callas, cujas amizade e parceria resultaram na derradeira gravação da diva greco-americana – cena do 2° ato da ópera “Tosca”, de Puccini, “morte de Scarpia”…

E como “Jacopo Fiesco (Andrea Grimaldi)”, personagem complexo e ferrenho opositor político de “Simon Boccanegra”, o talentoso baixo italiano, Ferruccio Mazzoli, nascido em Budrico. De grandes recursos vocais e ampla carreira internacional, Mazzoli realizou muitos dos principais papéis líricos, em óperas de Rossini, Bellini, Verdi e Boito….

Mirto Picchi, tenor dramático italiano.

Interpretando “Gabriele Adorno”, notável tenor dramático italiano, Mirto Picchi, nascido em San Mauro, perto de Florença. Mirto Picchi estudou em Milão, onde estreou como “Radamés”, em “Aída. E após, seguiram-se “Andrea Chenier”, de Giordano, “Fidelio”, de Beethoven, “Lucrezia Borgia”, de Donizetti, “The Rake’s Progress”, Stravinsky, “Carmen”, de Bizet, e muitas outras. Mirto Picchi destacou-se em óperas de Verdi e Puccini. E atuando com grandes solistas e diretores de seu tempo, realizou maior parte da carreira na Itália… 

Na direção da “Orquestra do teatro San Carlo”, Mario Rossi, credenciado maestro italiano, nascido em Biletto. Formado em composição, com Ottorino Respighi, destacou-se tanto no repertório padrão, quanto no resgate de óperas antigas, como “Il ritorno d’Ulisse in Patria”, de Monteverdi; “Il filosofo de Campagna”, de Galuppi; e “La buona Figliona”, de Piccini; além de concertos sinfônicos com prestigiados solistas internacionais, como Sviatoslav Richter e Arturo Benedetti Michelangeli…

Mario Rossi, renomado maestro italiano.

Em obras do sec. XX, dirigiu estreia de “Antonio e Cleópatra”, de Malipiero… E na Itália, Rossi esteve à frente do “Maggio musicale Fiorentino”, 1937/46; e por 23 anos, regeu a “Orquestra RAI”, de Turin, no Piemonte, elevando-a em nível internacional. Nesta gravação, pelo selo IDIS, realiza notável registro, tanto pela densidade dramática, quanto pela qualidade sonora… 

Por fim, além dos notáveis solistas e direção, cumprimentamos e aplaudimos os excelentes “Coro e orquestra do teatro San Carlo”, de Nápoles, Itália, que realizaram esta primorosa gravação, de 1958, e permitiram seguirmos apreciando e celebrando a música de Verdi!

Capa CD – IDIS, Instituto Discográfico Italiano, 1958.

Sugerimos também:

Gravação youtube – “Orchestra e Coro del Teatro dell’Opera di Roma della RAI”, direção Molinari-Pradelli, com Antonietta Stella (soprano) – Paolo Silveri (barítono) – Mario Petri (baixo) – Carlo Bergonzi (tenor) – Walter Monachesi (barítono) – Giorgio Giorgetti (baixo). Roma, 1951: (BAIXAR AQUI)

Gravação youtube – “Orquestra do Teatro Alla Scala”, direção Claudio Abbado, com Katia Ricciarelli (soprano) – Piero Cappuccilli (barítono) – Ruggero Raimondi (baixo-barítono) – Veriano Luchetti (tenor) – Felipe Schiavi (barítono) – Konstantin Sfiris (baixo). “Teatro Alla Scala”, Milão, 1976: (BAIXAR AQUI)

~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~

“In memoriam de dois grandes amigos”

“Queridos Nick e Yasmim”

Alex DeLarge

~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~

Dmitri Shostakovich (1906-1975): Sinfonia Nº 13, Op. 113, Babi Yar (Slóvak)

Dmitri Shostakovich (1906-1975): Sinfonia Nº 13, Op. 113, Babi Yar (Slóvak)

Já falei 30 vezes sobre esta obra-prima de inigualável carga humana, então vamos falar lá de sua gênese. A seguir, vocês lerão algo pra lá de INUSITADO. Preparem-se.

A autoimolação de Valéri Kosolápov ao publicar Babi Yar

Por Vadim Málev, em 10 de junho de 2020
Texto de Milton Ribeiro a partir de tradução oral de Elena Romanov

Hoje é o dia dos 110 anos do nascimento de Valéri Kosolápov. Mas quem é esse Valéri Kosolápov? Por que deveria escrever sobre ele e você deveria ler? Valéri Kosolápov tornou-se um grande homem em uma noite e, se não fosse assim, talvez não conhecêssemos o poema de Yevgeny Yevtushenko (Ievguêni Ievtuchenko) Babi Yar. Kosolápov era então editor do Jornal de Literatura (Literatúrnii Jurnál), o qual publicou corajosamente o poema em 19 de setembro de 1961. Foi um feito civil real.

Afinal, o próprio Yevtushenko admitiu que esses versos eram mais fáceis de escrever do que de publicar naquela época. Tudo se deve ao fato de o jovem poeta ter conhecido o escritor Anatoly Kuznetsov, autor do romance Babi Yar, que contou verbalmente a Yevtushenko sobre a tragédia acontecida naquela assim chamada ravina (ou barranco). Por consequência, Yevtushenko pediu a Kuznetsov que o levasse até o local e ele ficou chocado com o que viu.

“Eu sabia que não havia monumento lá, mas esperava ver algum tipo de placa in memorian ou ao menos algo que mostrasse que o local era de alguma forma respeitado. E de repente me vi num aterro sanitário comum, que era como imenso sanduíche podre. E era ali que dezenas de milhares de pessoas inocentes — principalmente crianças, idosos e mulheres — estavam enterradas. Diante de nossos olhos, no momento em que estava lá com Kuznetsov, caminhões chegaram e despejaram seu conteúdo fedorento bem no local onde essas vítimas estavam. Jogaram mais e mais pilhas de lixo sobre os corpos”, disse Yevtushenko.

Ele questionou Kuznetsov sobre porque parecia haver uma vil conspiração de silêncio sobre os fatos ocorridos em Babi Yar? Kuznetsov respondeu que 70% das pessoas que participaram dessas atrocidades foram policiais ucranianos que colaboraram com os nazistas. Os alemães lhes ofereceram o pior e mais sujo dos trabalhos, o de matar judeus inocentes.

Yevtushenko ficou estupefato. Ou, como disse, ficou tão “envergonhado” com o que viu que naquela noite compôs seu poema. De manhã, foi visitado por alguns poetas liderados por Korotich e leu alguns novos poemas para eles, incluindo Babi Yar… Claro que um dedo-duro ligou para as autoridades de Kiev e estas tentaram cancelar a leitura pública que Yevtushenko faria à noite. Mas ele não desistiu, ameaçou com escândalo e, no dia seguinte ao que fora escrito, Babi Yar foi ouvido publicamente pela primeira vez.

Yevtushenko lê seus poemas. Nos anos sessenta, os poetas podiam reunir milhares de pessoas…

Passemos a palavra a Yevtushenko: “Depois da leitura, houve um momento de silêncio que me pareceu interminável. Uma velhinha saiu da plateia mancando, apoiando-se em uma bengala, e encaminhou-se lentamente até o palco onde eu me encontrava. Ela disse que estivera em Babi Yar, que fora uma das poucas sobreviventes que conseguiu rastejar entre os cadáveres para se salvar. Ela fez uma reverência para mim e beijou minha mão. Nunca antes alguém beijara minha mão”.

Então Yevtushenko foi ao Jornal de Literatura. Seu editor era Valéri Kosolápov, que substituiu o célebre Aleksandr Tvardovsky no posto. Kosolápov era conhecido como uma pessoa muito decente e liberal, naturalmente dentro de certos limites. Tinha ficha no Partido, claro, caso contrário, nunca acabaria na cadeira de editor-chefe. Kosolápov leu Babi Yar e imediatamente disse que os versos eram muito fortes e necessários.

— O que vamos fazer com eles? — pensou Kosolápov em voz alta.

— Como assim? — Yevtushenko respondeu, fingindo que não tinha entendido — Vamos publicar!

Yevtushenko sabia muito bem que, quando alguém dizia “versos fortes”, logo depois vinha “mas, eu não posso publicar isso”. Mas Kosolápov olhou para Yevtushenko com tristeza e até com alguma ternura. Como se esta não fosse sua decisão.

— Sim.

Depois pensou mais um pouco e disse:

— Bem, você vai ter que esperar, sente-se no corredor. Eu tenho que chamar minha esposa.

Yevtushenko ficou surpreso e o editor continuou:

— Por que devo chamar minha esposa? Porque esta deve ser uma decisão de família.

— Por que de família?

— Bem, eles vão me demitir do meu cargo quando o poema for publicado e eu tenho que consultá-la. Aguarde, por favor. Enquanto isso, já vamos mandando o poema para a tipografia.

Kosolápov sabia com certeza que seria demitido. E isso não significava simplesmente a perda de um emprego. Isso significava perda de status, perda de privilégios, de tapinhas nas costas de poderosos, de jantares, de viagens a resorts de prestígio …

Yevtushenko ficou preocupado. Sentou no corredor e esperou. A espera foi longa e insuportável. O poema se espalhou instantaneamente pela redação e pela gráfica. Operários da gráfica se aproximaram dele, deram-lhe parabéns, apertaram suas mãos. Um velho tipógrafo veio. “Ele me trouxe um pouco de vodka, um pepino salgado e um pedaço de pão”, contou o poeta. E este velho disse: — “Espere, espere, eles imprimirão, você verá.”

E então chegou a esposa de Kosolápov e se trancou com o marido em seu escritório por quase uma hora. Ela era uma mulher grande. Na Guerra, ela fora uma enfermeira que carregara muitos corpos nos ombros. Essa rocha saiu da reunião, aproximando-se de Yevtushenko: “Eu não diria que ela estava chorando, mas seus olhos estavam úmidos. Ela olhou para mim com atenção e sorriu. E disse: ‘Não se preocupe, Jenia, decidimos ser demitidos’.”

Olha, é simplesmente lindo: “Decidimos ser demitidos”. Foi quase um ato heroico. Somente uma mulher que foi para a front sob balas podia não ter medo.

Na manhã seguinte, chegou um grupo do Comitê Central, aos berros: “Quem deixou passar, quem aprovou isto?”. Mas já era tarde demais — o jornal estava à venda em todos os quiosques. E vendia muito.

“Durante a semana, recebi dez mil cartas, telegramas e radiogramas. O poema se espalhou como um raio. Foi transmitido por telefone a fim de ser publicado em locais mais distantes. Eles ligavam, liam, gravavam. Me ligaram de Kamchatka. Perguntei como tinham lido lá, porque o jornal ainda não tinha chegado. “Não chegou, mas pessoas nos leram pelo telefone, nós anotamos”, contou Yevtushenko.

Claro que as autoridades não gostaram e trataram de se vingar. Artigos aos montes foram escritos contra Yevtushenko. Kosolápov foi demitido.

O que salvou Yevtushenko foi a reação mundial. Em uma semana, o poema foi traduzido para 72 idiomas e publicado nas primeiras páginas de todos os principais jornais, incluindo os norte-americanos. Em pouco tempo, Yevtushenko recebeu outras 10 mil cartas agora de diferentes partes do mundo. E, é claro, não apenas judeus escreveram cartas de agradecimento, o poema fisgou muita gente. Mas houve muitas ações hostis contra o poeta. A palavra “judeu” foi riscada em seu carro e, pior, ele foi ameaçado e criticado em várias oportunidades.

“Vieram até meu edifício uns universitários enormes, do tamanho de jogadores da basquete. Eles se comprometeram a me proteger voluntariamente, embora não houvesse casos de agressão física. Mas poderia acontecer. Eles passavam a noite nas escadarias do meu prédio. Minha mãe os viu. As pessoas realmente me apoiaram ”, lembrou Yevtushenko.

— E, o milagre mais importante, Dmitri Shostakovich me telefonou. Minha esposa e eu não acreditamos, pensamos que era mais um gênero de intimidação ou que estavam aplicando um trote em nós. Mas Shostakovich apenas me perguntou se eu daria permissão para escrever música sobre meu poema.

Esta história tem um belo final. Kosolápov aceitou tão dignamente sua demissão que o pessoal do Partido ficou assustado. Eles decidiram que se ele estava tão calmo era porque tinha proteção de alguém muito importante e superior… Depois de algum tempo, ele foi chamado para ser editor-chefe da revista Novy Mir. “E apenas a consciência o protegia”, resumiu Yevtushenko. “Era um Verdadeiro Homem.”

Dmitri Shostakovich (1906-1975): Sinfonia Nº 13, Op. 113, Babi Yar (Slóvak)

1 I. Babi Yar 14:54
2 II. Yumor (Humor) 07:39
3 III. V Magazine (At the Store) 12:22
4 IV. Strachi (Fears) 12:13
5 V. Kariera (Career) 11:35

Baixo: Mikuláš, Peter
Orquestra: Slovak Radio Symphony Orchestra
Coro de baixos: Slovak Philharmonic Chorus
Regente: Slovák, Ladislav

BAIXE AQUI — DOWNLOAD HERE

Dmitri Shostakovich e Yevgeny Yevtushenko no palco, logo após a estreia da Sinfonia Babi Yar.

PQP

Chopin (1810 – 1849): Concertos para Piano • Sonatas para Piano Nos. 2 & 3 • Benjamin Grosvenor (piano) • Royal Scottish National Orchestra • Elim Chan ֍

Chopin (1810 – 1849): Concertos para Piano • Sonatas para Piano Nos. 2 & 3 • Benjamin Grosvenor (piano) • Royal Scottish National Orchestra • Elim Chan ֍
‘When Benjamin Grosvenor finally makes his first entrance, it proves well worth the wait, and his playing beguiles from the off; as the dynamics sink, his lines are full of poetry but they unfold with utter naturalness.’

[Gramophone, sobre o disco com os concertos]

A música de Chopin pode ser bem mal compreendida. Algumas de suas peças sofrem de superexposição – todos os pianistas, profissionais e (especialmente) amadores, experimentam nela as suas mãos, nem sempre com bons resultados. Assisti a um documentário sobre o que já não mais lembro (perdoem-me, isso definitivamente foi no século passado) no qual a trilha sonora eram valsas de Chopin, tão maltratadas, que precisei dar uma voltinha até o filme principal começar.

Um dos riscos é a banalização, como foi o caso a que me referi, ou pode ser o excesso de ‘interpretação’, derramamento de doçuras ou romantismo desmesurado. Mesmo assim, a lista de gravações dos concertos para piano, como poderia dizer Leporello, ‘ma in CDs son già mille tre!’. Eu mesmo tive em CD apenas uma gravação, Perahia / Orquestra de Israel / Mehta.

O Noturno em mi bemol maior, Op. 9, 2 foi tanto usado em comerciais que se fosse um sapato estaria em estado lastimável.

Mesmo assim, com todos esses riscos, sou fã da música de Chopin de carteirinha e investigo sempre as novas gravações de suas peças. O primeiro disco de suas peças que ouvi à exaustão foi gravação de Arturo Benedetti Michelangeli com algumas mazurcas, um prelúdio, a Balada que eu mais gosto e o segundo Scherzo.

Ouvi tantas coisas boas sobre a gravação dos concertos pelo Benjamim Grosvenor, o primeiro dos discos da postagem, que acabei ouvindo-o um bom número de vezes. Se não o havia postado antes, não foi por falta de insistência do pessoal da repartição. Há aqui quem ame essas obras de paixão. Quando me deparei com esse outro recente disco, com as duas sonatas e mais algumas coisas, inclusive a balada que eu amo, entendi que a hora havia chegado. Assim, aqui está um pacote de Chopin para ninguém botar defeito. Como diria o Alf…

“Seu” Chopin, não vá ficar

Zangado e ressentido

Pela divertida união

Que fiz de… desses dois discos.

Frédéric Chopin (1810 – 1849)

Piano Concerto No. 1 in E minor, Op. 11
  1. Allegro maestoso
  2. Romance. Larghetto
  3. Rondo. Vivace
Piano Concerto No. 2 in F minor, Op. 21
  1. Maestoso
  2. Larghetto
  3. Allegro vivace

Benjamin Grosvenor (piano)

Royal Scottish National Orchestra

Elim Chan

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE

MP3 | 320 KBPS | 161 MB

Caso você tenha acesso às plataformas de distribuição de músicas, aqui está uma possibilidade para a audição:

Tidal

[Grosvenor’s] lines are full of poetry but they unfold with utter naturalness. Chan follows his every gesture unerringly – there’s no doubting the musical chemistry at play here…Grosvenor has also been blessed with a very fine instrument and a fabulous recording. It’s the kind of disc that makes you rethink these works and appreciate them all over again. And let’s hope that this is the start of a wonderful recording partnership with Elim Chan.                   Gramophone 2020

Frédéric Chopin (1810 – 1849)

Piano Sonata No. 2 in B flat minor, Op. 35 ‘Marche funèbre’
  1. Grave – Doppio movimento
  2. Scherzo – Più lento
  3. Marche funèbre. Lento
  4. Finale. Presto
Berceuse in D flat major, Op. 57
  1. Berceuse
Ballade No. 1 in G minor, Op. 23
  1. Ballade
Nocturne No. 15 in F minor, Op. 55 No. 1
  1. Nocturne
Nocturne No. 16 in E flat major, Op. 55 No. 2
  1. Nocturne
Piano Sonata No. 3 in B minor, Op. 58
  1. Allegro maestoso
  2. Scherzo. Molto vivace
  3. Largo
  4. Finale. Presto non tanto

Benjamin Grosvenor (piano)

Recorded: 2024-09-26

Recording Venue: Lady Stringer Studio, Garsington Opera, Buckinghamshire

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE

MP3 | 320 KBPS | 174 MB

Caso você tenha acesso às plataformas de distribuição de músicas, aqui está uma possibilidade para a audição:

Tidal

Benjamin Grosvenor explores the depths of Chopin with new album featuring Piano sonatas 2 & 3. Benjamin’s ninth album for Decca classics features two of Chopin’s most profound and contrasting works. Written nearly a decade apart, these masterpieces showcase the range of Chopin’s emotional and musical brilliance. Alongside the sonatas are three shorter works: the dramatic Ballade No.1, the peaceful lullaby Berceuse, and two Nocturnes.

Benjamin Grosvenor explora as profundezas de Chopin em um novo álbum com as sonatas para piano 2 e 3. O nono álbum de Benjamin para clássicos da Decca apresenta duas das obras mais profundas e contrastantes de Chopin. Escritas com quase uma década de diferença, essas obras-primas demonstram a amplitude do brilhantismo emocional e musical de Chopin. Além das sonatas, há três obras mais curtas: a dramática Balada nº 1, a serena canção de ninar Berceuse e dois Noturnos.

Aproveite!

René Denon

 

.: interlúdio :. The Moscow Symphony Orchestra — The Music of Deep Purple

.: interlúdio :. The Moscow Symphony Orchestra  — The Music of Deep Purple

Eu fui um adolescente que ouvia a música erudita de meu pai TODAS AS NOITES e rock durante o dia. Eu e minha irmã gostávamos de rock. Ela amava os Beatles e eu os Beatles e todo o resto. Imaginem, em 1969, eu tinha 12 anos. Peguei vários discos hoje clássicos quando de seus lançamentos. Tenho-os em vinil, perfeitamente conservados. Comprei-os, digamos, na primeira edição. Então, discos como Machine Head, In Rock, Burn, Fireball e Who do we think we are, do Deep Purple, são meus íntimos. Quase não os ouço mais, mas eles estão na minha discoteca. O que temos aqui? Ora, um baita disco de crossover conduzido por Constantine Krimets e arranjado por Stephen Reeve e Martin Riley. Foi gravado em estúdio em 1992. Não há bateria nem guitarra — não há, de fato, nenhum instrumento de rock, apenas uma orquestra sinfônica. Todas as faixas foram cuidadosamente rearranjadas, e umas soam mais fieis que outras aos originais. Child in Time é particularmente bem sucedida, The Mule e Pictures of Home idem, muito graças às belas melodias. Gostei também de Highway Star… Não pude evitar. Krimets disse que quase toda a orquestra conhecia a fundo os temas, de tanto ouvi-los em casa.

Se compararmos estes arranjos com o que ouvimos nos crossover das orquestras brasileiras, nossa, isso aqui é Stockhausen de tão complexo. Mas penso que este disco apenas possa interessar aos nostálgicos que conhecem cada original. Em resumo, um crossover é uma curiosidade boba. E kitsch.

The Moscow Symphony Orchestra – The Music of Deep Purple

01. Smoke On The Water
02. Space Trucking
03. Child In Time
04. Black Night
05. Lazy
06. The Mule
07. Pictures Of Home
08. Strange Kind Of Woman
09. Burn
10. Highway Star
11. Fireball
12. Coda And Reprise

Moscow Symphony Orchestra
Constantine Krimets

BAIXE AQUI — DOWNLOAD HERE

A formação clássica do Deep Purple: Gillan, Blackmore, Paice, Glover e Lord.
A formação clássica do Deep Purple: Gillan, Blackmore, Paice, Glover e Lord.

PQP

.: interlúdio :. O Fino da Bossa : show Teatro Paramount, 1964 : noneto Oscar Castro Neves & outros

o-fino-da-bossa-1964 CAPA-LP-1989(Postagem do Ranulfus em 2016, revalidada por Pleyel em 2025 in memoriam ao nosso amigo Ranulfus e também aos 45 anos de morte de Vinicius de Moraes)

Dia desses, garimpeiros que encontraram no blog uma postagem antiga do colega Bluedog reabriram a conversa sobre a extraordinária música instrumental que tomou forma no Brasil na década de 1960 – o que nos motivou a revalidar aqui aquela postagem, do Quarteto Novo.

E a audição do Quarteto Novo me remeteu inevitavelmente a este outro disco, que eu já vinha planejando digitalizar e postar: ele contém um terço do que foi apresentado no histórico show de 25 de maio de 1964 no antigo Teatro Paramount em São Paulo (hoje Teatro Renault), inaugurando o nome “O Fino da Bossa”, que de 1965 a 67 seria aplicado ao programa comandado por Elis Regina e Jair Rodrigues, transmitido ao vivo desse mesmo teatro pela TV Record.

Como (quase) todo mundo sabe, a bossa nova emergiu entre 1957 e 59 (ao mesmo tempo que o rock’n’roll nos EUA, e este que vos escreve naquele faroeste que era então o Paraná) de todo o caldo de cultura dos anos 50, sobretudo por obra de um bruxo chamado João Gilberto, e foi imediatamente amplificada por uma juventude universitária antenada no que rolava “lá fora” mas suficientemente inteligente pra perceber a imensa riqueza e valor da herança cultural brasileira, e ater-se a ela como fundamento da sua criação, por multi-informada que fosse.

O famoso show no Carnegie Hall (NY, 21.11.1962) ficou como marco da explosão internacional da bossa, que se tornou um dos estilos mais ouvidos no mundo pelo resto da década. Complexados que somos, só depois disso a bossa ganhou um grande teatro no Brasil – ainda por meio de uma juventude universitária suficientemente abastada para abrir suas portas de cristal (Faculdade de Direito do Largo São Francisco – quem sabe um pouco sobre São Paulo entende).

O show aconteceu mês e meio depois do golpe de 64. O sucesso estrondoso fez a bossa ganhar espaço privilegiado na tevê pelos anos seguintes, virando trincheira de resistência nacionalista e de esquerda ao mesmo tempo em que tensionava sua base carioca-boa-vida com o influxo nordestino (vide faixa 8) – com surpreendente penetração e ressonância popular até nos interiores distantes (acreditem: eu vi), mesmo com a promoção paralela da Jovem Guarda como estratégia de despolitização da juventude – até que foi varrida da tevê por obra do golpe-dentro-do-golpe (1969), altura em que já tinha se transformado no campo multiforme e complexo que ganhou o rótulo MPB.

Foi no meio disso tudo que ainda floresceu uma espantosa safra de instrumentistas e arranjadores, como os que ouvimos no Quarteto Novo e ouviremos neste disco aqui, dominado por um sujeito chamado Oscar Castro Neves.

Pra mim essa riqueza é descoberta recente: em 1964 eu tinha só 7 anos; passei a adolescência pensando que bossa era música fútil de sala de espera – o que realmente chegou a ser na sua diluição internacional. Até hoje tendo a ver a bossa pura como uma espécie de piso Haydn-Mozart a partir dos qual se ergueria uma ousadia beethoveniana, no caso a da santíssima trindade Caetano-Chico-Mílton e outros deuses em torno… E talvez tenha sido justamente o encontro com os 10 minutos de timbres e texturas que este Oscar Castro Neves arranca com seu noneto de Berimbau, de Baden e Vinícius (faixa 9), o que me fez finalmente entender a declaração solene do próprio Caetano: “o Brasil ainda precisa merecer a Bossa Nova”.

Só que, estranhamente, pouco depois grande parte desses instrumentistas e arranjadores – como o Airto Moreira do Quarteto Novo, Eumir Deodato, Sérgio Mendes, o próprio Oscar Castro Neves – foram parar na Califórnia, onde vieram a fazer parte do clube dos arranjadores mais bem pagos dos EUA – mas aí sua produção musical logo deixou de ser convincente para ouvidos brasileiros. Suas tentativas de referência ao Brasil foram ficando constrangedoramente inautênticas.

O que no meu ver pode colocar em questão a tese do colega Bluedog naquela outra postagem: a de que o “jazz nordestino” poderia ter ganho o mundo: em certa medida ele até ganhou, mas… de repente pareço ouvir uma ressonância irônica e lúgubre da frase dos evangelhos: de que adianta ao homem ganhar o mundo e perder sua alma?

Enfim: o disco que vocês vão ouvir tem meninas que cantavam com charme mas com vozes pequenas e pouco seguras – como muitas que surgiram na última década, me fazendo pensar se isso pode ser característico de momentos de transição estilística… Tem Paulinho Nogueira mostrando impecavelmente que a geração bossa não necessariamente rejeitava a tradição… Tem Jorge Ben(jor) ainda lutando pra cantar com o R de língua, não carioca, que era exigido pelo rádio (!) até começo dos anos 60 (herança do estado Novo?). E tem Rosinha de Valença extraindo tamanha ginga e intensidade de seu violão, que eu tendo a considerar a faixa 5 o ponto alto do disco – mais ainda que os já mencionados dez minutos do Oscar.

E por falar no Oscar (Castro Neves), por mais que tenha procurado, não consegui encontrar os nomes dos integrantes do seu noneto. Será que algum dos leitores pode ajudar a matar a charada?

O FINO DA BOSSA
LP de 1964, contendo cerca de 1/3 da gravação ao vivo do show
“O Fino da Bossa”, promovido pelo Centro Acadêmico XI de Agosto (da faculdade de direito da USP) no Teatro Paramount de São Paulo, na noite de 25 de maio de 1964.

  • 01 Onde Está Você? (Luvercy Fiorini / Oscar Castro Neves)
    Alaíde Costa, voz; Oscar Castro Neves Noneto – 03’51
  • 02 Garota De Ipanema (Tom Jobim / Vinicius de Moraes)
    Zimbo Trio = Amilton Godoy, piano;
    Luiz Chaves, contrabaixo; Rubens Barsotti, bateria – 04’18
  • 03 Pot-pourri:
    – Gosto Que Me Enrosco (Sinhô = José Barbosa da Silva)
    – Agora É Cinza (Bide = Alcebíades Maia Barcellos /
    Marçal = Armando Vieira Marçal)
    – Duas Contas (Garoto = Aníbal Augusto Sardinha)
    – Bossa Na Praia (Geraldo Cunha / Pery Ribeiro)
    Paulinho Nogueira, violão – 04’07
  • 04 Tem Dó (Baden Powell / Vinicius de Moraes)
    Ana Lúcia, voz; Oscar Castro Neves Noneto – 02’57
  • 05 Consolação (Baden Powell / Vinicius de Moraes)
    Rosinha de Valença, violão; Oscar Castro Neves Noneto? – 06’26
  • 06 Chove Chuva (Jorge Ben / Benjor)
    Jorge Ben (Benjor) – 03’39
  • 07 Desafinado (Newton Mendonça / Tom Jobim)
    Wanda Sá, voz; Oscar Castro Neves Noneto – 03’38
  • 08 Maria Moita (Carlos Lyra / Vinicius de Moraes)
    Nara Leão – 01’59
  • 09 Berimbau (Baden Powell / Vinicius de Moraes)
    Oscar Castro Neves Noneto – 10’18

Lançamento original em vinil: 1964.
Digitalizado em 2016 por Ranulfus & Daniel the Prophet
a partir do relançamento de 1989 em vinil,
comemorativo de 30 anos de Bossa Nova

.  .  .  .  .  .  .  BAIXE AQUI – download here – MP3

Alaide Costa (nasc. 1935, faz 90 este ano) e Jorge Ben (nasc. 1945, diz ele, mas a biógrafa diz que foi em 1939), foto de 1964

Ranulfus

.: interlúdio :. Terry Riley (nasc. 1935): Shri Camel (1980)

Riley foi um dos pioneiros do que hoje chamamos minimalismo, mas também sempre esteve próximo do jazz e do improviso, de forma que é difícil saber se o álbum de hoje é um .:interlúdio:. ou não. E isso é só um detalhe, o que importa mesmo é a música, né?

Após ganhar uma certa notoriedade nos anos 1960, Terry Riley fez muitos shows solo tocando teclados em efeitos de overdubs e loops semelhantes aos do álbum A Rainbow in Curved Air (1968). Em alguns casos, com participações especiais notáveis, como a do trompetista Don Cherry (aqui). Gravado em estúdio em 1978, Shri Camel é um álbum que mostra os caminhos pelos quais os improvisos de Riley costumavam passear. Há momentos mais lentos, outros com sons pululando por todos os lados e, em todos os casos, as paisagens sonoras são profundamente originais e seriam copiadas por gente menos talentosa nos anos seguintes.

Terry Riley (nasc. 1935): Shri Camel
listing
1. Anthem of the Trinity – 9:25
2. Celestial Valley – 11:32
3. Across the Lake of the Ancient World – 7:26
4. Desert of Ice – 15:13

Riley – “modified Yamaha YC-45D combo organ tuned in just intonation and augmented with studio digital delay”

BAIXE AQUI — DOWNLOAD HERE

Pleyel

César FRANCK (1822-1890) & Johannes BRAHMS (1833-97): Sonatas para Violino • Fumiaki Miura (violin) • Nobuyuki Tsujii (piano) ֍

César FRANCK (1822-1890) & Johannes BRAHMS (1833-97): Sonatas para Violino • Fumiaki Miura (violin) • Nobuyuki Tsujii (piano) ֍

“A beautiful performance with a bright musicality was born.”

eBravo digital magazine

Miura testando um exemplar da coleção de arcos do acervo do PQP Bach

Caso eu fosse músico profissional ou mesmo razoável amador, pianista ou violinista, teria a Sonata para violino e piano de César Franck em meu repertório. É uma dessas obras que nos cativa desde a primeira audição. E para completar o programa do disco, outra sonata espetacular, a Primeira Sonata de Brahms. Johannes atuou muito, desde a sua juventude, como pianista acompanhante, especialmente de violinistas, e sabia de tudo sobre o ofício – o repertório, os truques, as técnicas. Mas isso miles de compositores sabiam, além disso, ele tinha o dom, era Brahms e terrivelmente auto-crítico.

Nobu é uma simpatia…

Aqui temos um disco lançado recentemente pela Deutsche Grammophon, que contratou o virtuose pianista Nobu Tsujii e também adquiriu os direitos sobre suas antigas gravações e esse disco é um desses casos. A gravação foi feita no Teldex Studio, Berlim, por volta de 2017, pela Avex Classics. Nestes dias a dupla de jovens músicos, Miura e Tsujii andavam pelas cidades do Japão dando recitais. Você vai encontrar vários vídeos deles tocando trechos de sonatas no YouTube.

Eu só conheci o disco agora, ponto positivo para o relançamento, afinal de contas, nada como ouvir linda música executada tão primorosamente como é o caso aqui.

César FRANCK (1822-1890)

Sonata para Violino em lá maior (1886)

  1. Allegretto ben moderato
  2. Allegro
  3. Recitativo-Fantasia. Ben moderato – Molto lento
  4. Allegretto poco mosso

Johannes BRAHMS (1833-97)

Sonata para Violino No. 1 em sol maior, Op. 78 (1878-79)

  1. Vivace ma non troppo
  2. Adagio
  3. Allegro molto moderato

Fumiaki Miura, violin

Nobuyuki Tsujii, piano

Gravação.  2017-18, Teldex Studio, Berlin
AVEX CLASSICS AVCL25991 [56:02]

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE

MP3 | 320 KBPS | 128 MB

Nobu e Fumiaki pousando para o papparazzi do PQP Bach

Caso você tenha acesso às plataformas de distribuição de músicas, aqui está uma possibilidade para a audição:

 Tidal

Trechos de uma crítica que pode ser lida integralmente aqui: Despite the stiff competition […], this newcomer can hold its head high. In the opening movement, Miura and Tsujii contour the ebb and flow of the narrative, confidently negotiating the harmonic shifts and tempo variants. The second movement is turbulent and impressively virtuosic. I’m particular taken by the heartfelt anguish of the Recitativo, and the sheer joy and elation with which they approach the finale.

The inclusion of the Brahms Violin Sonata No. 1 is apposite, as beguiling lyricism likewise permeates the score. Miura’s warm, burnished tone is ideal for this music. The opening movement’s gentle, bucolic charm is eloquently conveyed. The Adagio, which follows, is played with unfeigned sincerity and radiant fragility, and there’s nobility of gesture in the passionate moments of the ‘Regenlied’ finale.

Fumiaki Miura plays a 1704 Stradivarius loaned by the Munetsugu Foundation.

Apesar da forte concorrência […], este novo lançamento pode orgulhar-se dos resultados. No movimento de abertura, Miura e Tsujii contornam o fluxo e refluxo da narrativa, entretrocando com confiança as mudanças harmônicas e as variações de andamento. O segundo movimento é turbulento e impressionantemente virtuoso. Fiquei particularmente impressionado com a angústia profunda do Recitativo e com a pura alegria e euforia com que abordam o final.

A inclusão da Sonata para Violino nº 1 de Brahms é oportuna, visto que um lirismo sedutor também permeia a partitura. O timbre quente e polido de Miura é ideal para esta música. O charme suave e bucólico do movimento de abertura é transmitido com eloquência. O Adagio, que se segue, é tocado com sinceridade genuína e fragilidade radiante, e há nobreza de gestos nos momentos apaixonados do final de “Regenlied”.

Fumiaki Miura toca um Stradivarius de 1704 emprestado pela Fundação Munetsugu.

Aproveite!

René Denon

O prestativo Departamento de Artes do PQP Bach Corp. Enviou essa ilustração do Miura tocando um violino

Francis Poulenc (1899-1963): Complete Chamber Music Vol. 2 (Tharaud e outros)

Francis Poulenc (1899-1963): Complete Chamber Music Vol. 2 (Tharaud e outros)

Esse disco é muito bom, e seu destaque é a Sonata para Clarinete e Piano, certo? A Sonata para Clarinete e Piano de Francis Poulenc, escrita em 1962, é uma das últimas obras do compositor e um dos pilares do repertório de câmara para clarinete. Foi composta em memória de Arthur Honegger, colega de Poulenc no grupo Les Six. Estava destinada a ser estreada por Benny Goodman (sim, o lendário clarinetista de jazz) com Poulenc ao piano, mas o compositor morreu antes da estreia. A primeira apresentação foi feita por Goodman e Leonard Bernstein. É mole? Poulenc combina clareza, humor, lirismo e melancolia. Sua escrita para clarinete aproveita a expressividade do instrumento, seu calor, sua agilidade e seu senso de humor. Apesar de ser uma homenagem, né? fúnebre, a sonata nunca se afunda em tragédia. Ela é elegante na dor, contida, como um suspiro que prefere o pudor.

Francis Poulenc (1899-1963): Complete Chamber Music Vol. 2 (Tharaud e outros)

Sonata For Violin And Piano (18:26)
1 Allegro Con Fuoco 6:34
2 Intermezzo: Très Lent Et Calme 5:45
3 Presto Tragico 6:01
4 Bagatelle In D Minor For Violin And Piano 2:17

Sonata For Clarinet In B Flat And Piano (13:24)
5 Allegro Tristamente: Allegretto – Très Calme – Tempo Allegretto 5:14
6 Romanza: Très Calme 4:55
7 Allegro Con Fuoco: Très Animé 3:11

Sonata For Piano And Cello (21:51)
8 Allegro – Tempo Di Marcia: Sans Traîner 5:41
9 Cavatine: Très Calme 6:21
10 Ballabile: Très Animé Et Gai 3:18
11 Finale: Largo, Très Librement – Presto Subito 6:22

Cello – Françoise Groben (tracks: 8 to 11)
Clarinet – Ronald Van Spaendonck (tracks: 5 to 7)
Piano – Alexandre Tharaud
Violin – Graf Mourja* (tracks: 1 to 4)

BAIXE AQUI — DOWNLOAD HERE

Alexandre Tharaud testando um dos pianos da Arapiraca Royal Chamber Music Hall.

PQP

Gustav Mahler (1860-1911): Sinfonia Nº 1 (Svetlanov)

Conheci algumas das gravações de Mahler pelas postagens de PQP Bach alguns anos atrás e, ao perceber que faltavam três sinfonias para termos aqui o ciclo completo, resolvi preencher esta lacuna em nosso acervo. São gravações de peso realizadas nos anos 1990 pelo maestro com sua orquestra de nome recém alterado após o fim da União Soviética.

As orquestras russas regidas por Svetlanov, Rozhdestvensky e Mravinsky na segunda metade do século XX tinham frequentemente uma sonoridade bem característica com intensidade emocional sem cair para o romantismo cafona, além do som de certos instrumentos sutilmente diferentes de seus equivalentes ocidentais, me parece que principalmente os metais.

Esse tipo de intensidade emocional é importante nas sinfonias de Mahler, marcadas pelos contrastes. Mahler alterna entre momentos monumentais com grande orquestra típica do fim do século XIX seguidos por momentos suaves e íntimos. Talvez devido aos seus longos anos de experiência como maestro (portanto, como alguém que sabia o que “funcionava” com o público, no mesmo sentido em que um humorista com anos de teatro sabe as piadas que mais “funcionam”), ele brinca com as quebras de expectativas, ao contrário da música de Bruckner em que esperamos grandiosidade e temos exatamente o que esperamos. É bom lembrar também que Mahler conheceu Bruckner em Viena e tinha grande respeito por ele, então esse diferença, mesmo que radical e profunda, não significa desprezo.

Mais um detalhe sobre a interpretação dos russos: no 3º movimento, uma reconstrução lenta e triste da canção infantil “Frère Jacques” (ou “Bruder Jacob”), alguns maestros e orquestras levam o negócio mais na brincadeira e com andamentos mais rápidos, mas Svetlanov aqui leva mais a sério, embora com trechos contrastantes de tranquilidade.

Gustav Mahler (1860-1911): Sinfonia Nº 1 (1889)
1. Langsam, schleppend (Slowly, dragging)
2. Kräftig bewegt, doch nicht zu schnell (Moving strongly, but not too quickly)
3. Feierlich und gemessen, ohne zu schleppen (Solemnly and measured, without dragging)
4. Stürmisch bewegt – Energisch (Stormily agitated – Energetic)

Russian State Symphony Orchestra
Evgeny Svetlanov, conductor
Recording: Moscow, Large Hall of the Conservatory, 1992

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE
Pleyel

Enrique Granados (1867-1916): Goyescas (Larrocha, Magaloff)

Postagem de 2022, links consertados. Foi com surpresa que constatei que neste blog, ativo desde 2006, jamais tinha sido postado o ciclo para piano Goyescas, composto pelo catalão Enrique Granados entre 1909 e 1911, com um post-scriptum (El Pelele) de 1914. Granados evoca a atmosfera das pinturas do também espanhol Francisco Goya (1746-1828). Para dar um jeito nisso, trago hoje não uma, mas duas gravações antológicas dessa obra, por dois respeitados pianistas da geração dos nossos pais e avós, para vocês fazerem suas comparações.

Goya: El amor y la muerte (1797)

A gravação de Nikita Magaloff (1912-1992), que ficou um tempo esquecida e foi relançada há poucos anos pela Decca, é um tesouro apesar do som que mostra sua idade. Assim como comentamos recentemente sobre o Ernesto Nazareth gravado por Proença e Moreira Lima, grandes intérpretes de Chopin, aqui também temos um chopinista de primeira linha se aventurando por esse repertório espanhol. O resultado é um Granados com um romantismo bem mais elegante, dançando de sapato social em um salão à luz de velas, com ritmos muito originais mas sem perder a pose, como quem diz: eu só transgrido e inovo porque me adequo. Não é só a minha impressão, mas também a dos americanos do Record Guide em 1955: ‘The Goyescas are an exhibition of fine manners, and it is as such that Nikita Magaloff plays them. His dexterity, the clarity of his decorations, the subtle variety of his rhythms, are a delight to listen to.’

E com uma concepção geral totalmente diferente, temos a gravação de Alicia de Larrocha (1923-2009), a terceira, pois ela já tinha gravado duas vezes esse ciclo, nas décadas de 1950 e 70. Se Magaloff trazia um Granados, digamos, de terno e gravata, Alicia traz outras cores, vestidos coloridos e flores no cabelo, podemos dizer que é uma interpretação mais solta, dançante, com os pés no chão de terra como algumas das cenas ao ar livre pintadas por Goya.

Enrique Granados (1867-1916), interpretado por Nikita Magaloff
1-6. Goyescas (Los Majos Enamorados) (1909-1911)
I. Los Requiebros, II. Coloquio en la reja, III. El Fandango de candil, IV. Quejas ó la maja y el ruiseñor, V. El amor y la muerte: Balada, VI. Epílogo: Serenata del espectro
7. El pelele: Escena Goyesca (1914)

Nikita Magaloff, piano
Recording: Victoria Hall, Geneva, Switzerland, November 1952 (Goyescas: Book I, El pelele), October-November 1954 (Goyescas: Book II)

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE

Enrique Granados (1867-1916), interpretado por Alicia de Larrocha
1. Allegro de concierto (1904)
2. Danza lenta (1915)
3-8. Goyescas (Los Majos Enamorados) (1909-1911)
I. Los Requiebros, II. Coloquio en la reja, III. El Fandango de candil, IV. Quejas ó la maja y el ruiseñor, V. El amor y la muerte: Balada, VI. Epílogo: Serenata del espectro
9. El pelele: Escena Goyesca (1914)

Alicia de Larrocha, piano
Recording: New York City, USA, December 4-6, 1989; April 11, 1990.

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE

Goya: El Pelele (1792) – O Pelele espanhol é um espantalho, mas utilizado em danças, procissões e em janelas, não é daqueles que espantam pássaros

Pleyel

J. S. Bach (1685-1750): Fantasia in C minor; Two-Part Inventions; Three-Part Inventions; Chromatic Fantasia & Fugue

J. S. Bach (1685-1750): Fantasia in C minor; Two-Part Inventions; Three-Part Inventions; Chromatic Fantasia & Fugue

Pois é, mais um desta série que irá longe. Não sou um apaixonado pelas curtas Invenções em duas e três partes para teclado, mas a Fantasia que abre o CD e a Fantasia e Fuga Cromática que o fecha são absolutamente matadoras, de absurda beleza. Vocês podem pensar que somos doidos varridos, mas eu e minha mulher dançamos a Fantasia BWV 906 aqui na sala de casa. Nada nos impedia e não havia ninguém nos filmando para depois colocar no YouTube… Então, tudo bem! Vocês podem tentar, afinal o domingo é um bom dia para loucuras.

J. S. Bach (1685-1750):
Fantasia in C minor; Two-Part Inventions; Three-Part Inventions;
Chromatic Fantasia & Fugue

1. Fantasia In C Minor, BWV906
2. Fifteen Two-Part Inventions, BWV772-786: Invention 1 In C Major
3. Fifteen Two-Part Inventions, BWV772-786: Invention 2 In C Minor
4. Fifteen Two-Part Inventions, BWV772-786: Invention 3 In D Major
5. Fifteen Two-Part Inventions, BWV772-786: Invention 4 In D Minor
6. Fifteen Two-Part Inventions, BWV772-786: Invention 5 In E Flat Major
7. Fifteen Two-Part Inventions, BWV772-786: Invention 6 In E Major
8. Fifteen Two-Part Inventions, BWV772-786: Invention 7 In E Minor
9. Fifteen Two-Part Inventions, BWV772-786: Invention 8 In F Major
10. Fifteen Two-Part Inventions, BWV772-786: Invention 9 In F Minor
11. Fifteen Two-Part Inventions, BWV772-786: Invention 10 In G Major
12. Fifteen Two-Part Inventions, BWV772-786: Invention 11 In G Minor
13. Fifteen Two-Part Inventions, BWV772-786: Invention 12 In A Major
14. Fifteen Two-Part Inventions, BWV772-786: Invention 13 In A Minor
15. Fifteen Two-Part Inventions, BWV772-786: Invention 14 In B Flat Major
16. Fifteen Two-Part Inventions, BWV772-786: Invention 15 In B Minor
17. Fifteen Three-Part Sinfonias (Inventions), BWV787-801: Sinfonia 1 In C Major
18. Fifteen Three-Part Sinfonias (Inventions), BWV787-801: Sinfonia 2 In C Minor
19. Fifteen Three-Part Sinfonias (Inventions), BWV787-801: Sinfonia 3 In D Major
20. Fifteen Three-Part Sinfonias (Inventions), BWV787-801: Sinfonia 4 In D Minor
21. Fifteen Three-Part Sinfonias (Inventions), BWV787-801: Sinfonia 5 In E Flat Major
22. Fifteen Three-Part Sinfonias (Inventions), BWV787-801: Sinfonia 6 In E Major
23. Fifteen Three-Part Sinfonias (Inventions), BWV787-801: Sinfonia 7 In E Minor
24. Fifteen Three-Part Sinfonias (Inventions), BWV787-801: Sinfonia 8 In F Major
25. Fifteen Three-Part Sinfonias (Inventions), BWV787-801: Sinfonia 9 In F Minor
26. Fifteen Three-Part Sinfonias (Inventions), BWV787-801: Sinfonia 10 In G Major
27. Fifteen Three-Part Sinfonias (Inventions), BWV787-801: Sinfonia 11 In G Minor
28. Fifteen Three-Part Sinfonias (Inventions), BWV787-801: Sinfonia 12 In A Major
29. Fifteen Three-Part Sinfonias (Inventions), BWV787-801: Sinfonia 13 In A Minor
30. Fifteen Three-Part Sinfonias (Inventions), BWV787-801: Sinfonia 14 In B Flat Major
31. Fifteen Three-Part Sinfonias (Inventions), BWV787-801: Sinfonia 15 In B Minor
32. Chromatic Fantasia And Fugue In D Minor, BWV903: Fantasia
33. Chromatic Fantasia And Fugue In D Minor, BWV903: Fugue

Angela Hewitt, piano

BAIXE AQUI — DOWNLOAD HERE

Um super show, Angie.
Um super show, Angie.

PQP (postagem original de 2017)

Dmitri Shostakovich (1906-1975): Sinfonia Nº 5, Op. 47 (Concertgebouw, Haitink)

Dmitri Shostakovich (1906-1975): Sinfonia Nº 5, Op. 47 (Concertgebouw, Haitink)

Eu, PQP Bach, perdi os links de minhas postagens desde agosto de 2016. Claro que esta versão já foi postada, mas é boa que vamos de novo. A Sinfonia Nº 5, Op. 47, de Dmitri Shostakovich, é uma das obras mais emblemáticas do século XX — ao mesmo tempo uma obra-prima musical e um documento histórico codificado. Composta em 1937, durante o auge do terror stalinista, a obra foi oficialmente anunciada como “a resposta criativa de um artista a críticas justas” — uma referência às severas críticas que o compositor havia sofrido por parte do regime, especialmente após sua ópera Lady Macbeth de Mtsensk ter sido condenada como “formalista” no jornal Pravda. Mas a Sinfonia nº 5 é tudo menos submissa. A Quinta é como uma máscara — por fora, conformidade e heroísmo soviético, por dentro, crítica sutil, melancolia e coragem.

Dmitri Shostakovich (1906-1975): Sinfonia Nº 5, Op. 47 (Concertgebouw, Haitink)
I Moderato 17:59
II Allegretto 5:23
III Largo 15:36
IV Allegro Non Troppo 10:32

Concertgebouw Orchestra
Bernard Haitink

BAIXE AQUI — DOWNLOAD HERE

Um Shosta adulto rindo? Coisa rara!

PQP

Stravinsky (1882 – 1971): Le Sacre du printemps • L’Oiseau de feu • Jeu de cartes • Petrouchka • Pulcinella • London Symphony Orchestra • Claudio Abbado ֍

Stravinsky (1882 – 1971): Le Sacre du printemps • L’Oiseau de feu • Jeu de cartes • Petrouchka • Pulcinella • London Symphony Orchestra • Claudio Abbado ֍

“For me, listening is the most important thing: to listen to each other, to listen to what people say, to listen to music.”     

C. Abbado

Petrouchka

Claudio Abbado teve papel importante no cenário da música clássica ao divulgar e ampliar os repertórios das orquestras com as quais trabalhou interpretando com esmero e altíssimo nível técnico e artístico obras do século XX. Ele ganhou posições de destaque na década de 1960 e, à partir de 1967, assinou contrato de gravações com o selo amarelo, na época (e de certa forma até agora) sinônimo de ótima música e excelentes produções.

O álbum dessa postagem reúne gravações que Abbado fez regendo a London Symphony Orchestra de obras de Stravinsky, que nasceu no século XIX, mas viveu seu apogeu como compositor no século XX.

Claudio Abbado teve uma estreita relação com a LSO, da qual foi o regente principal de 1979 até 1987. Estas gravações foram lançadas em diversas ocasiões, no formato de CD, como na série Abbado-Edition, em comemoração dos 25 anos da relação Abbado-DG. Na forma como os arquivos estão reunidos aparecem na série 2CD, cuja linda capa coloquei na abertura da postagem, spin-off da série Philips Duo, que reuniam gravações afins em dois CDs, vendidos à ‘medium-price’ e também numa enorme coleção de 46 CDs, reunindo as gravações do regente com a London Symphony Orchestra. Nesta coleção esses são os disco 38 e 39.

Temos no pacote a gravação da Sagração da Primavera, uma suíte de Concerto d’O Pássaro de Fogo, Jogos de Cartas, isso no primeira parte do pacote. Na segunda, quatro cenas de Petrouchka, na versão original de 1911, e Pulcinella. Minha motivação principal para a postagem é exatamente essa gravação de Pulcinella, peça que eu gosto muitíssimo. Aqui temos a gravação com as partes cantadas – os cantores são excelentes. A mezzo-soprano Teresa Berganza, com quem Abbaddo e a LSO gravaram o Barbeiro de Sevilha, de Rossini, o tenor Ryland Davies e o baixo John Shirley-Quirk.

Igor Stravinsky (1882 – 1971)

CD1

Le Sacre du printemps (Version 1947)
L’Oiseau de feu -Suite (Version 1919)
Jeu de cartes

London Symphony Orchestra

Claudio Abbado

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE

MP3 | 320 KBPS | 184 MB

CD2

Petrouchka – Scènes burlesques (Version originale 1911)
Pulcinella – Ballet em um acte

Leslie Howard, piano (Petrouchka)

Teresa Berganza, mezzo-soprano (Pulcinella)

Ryland Davies, tenor (Pulcinella)

John Shirley-Quirk, baixo (Pulcinella)

London Symphony Orchestra

Claudio Abbado

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE

MP3 | 320 KBPS | 174 MB

Caso você seja usuário de plataformas de distribuição de músicas, aqui está uma possibilidade para a audição:

 Tidal

 

Pulcinella

A edição dessas peças na forma 2CD (com a capa no alto da postagem) foi escolhida como uma entre as Top 20 Recordings da obra de Stravinsky pela Gramophone: Claudio Abbado succeeds in conveying the kaleidoscopic brilliance of Stravinsky’s [Petrushka] score and secures from the LSO playing of real dramatic intensity. Phrases are shaped with far more care and rhythms articulated with greater vitality than on Dorati’s record, and throughout the score there is a powerful sense of dramatic atmosphere. (Robert Layton, November 1981)

Aproveite!

René Denon

Foto do libreto da edição com 46 CDs. Claudio estava bem feliz com a LSO

Carlos Drummond de Andrade ‎(1902-1987): Antologia Poética

Carlos Drummond de Andrade ‎(1902-1987): Antologia Poética

IM-PER-DÍ-VEL !!!

Hoje é Dia de Aniversário de nosso poeta maior. Não é data redonda, são os 118 anos do nascimento do homem que morreu aos 85 por não suportar ver a única filha morta. (O primeiro filho durou-lhe apenas meia hora). Da mesma maneira de Machado, Rosa, Tom e Chico, é meu brasileiro preferido. Como fala muito da difícil convivência familiar, como é um cara que vai do cotidiano ao metafísico, é quase impossível de não se identificar com alguma faceta do poeta, tão rico. Sempre com brilhantismo, Drummond foi lírico, social, filosófico e humorista. Levou uma existência aparentemente modesta e avessa aos holofotes, tanto que nunca quis o fardão da Academia Brasileira de Letras. A fama de Drummond não veio somente da venda de livros, mas porque foi sempre destacado pelos intelectuais e por movimentos como a tropicália e a bossa nova. Nunca foi censurado porque os governos não achavam que o povo iria entendê-lo. Foi moderno e escreveu sonetos, foi irreverente e clássico, escreveu lindamente poesia e prosa. Sua enorme obra é dividida em 5 fases — modernista, política, filosófica, memorialista e, sim, erótica. Esta última fase não está presente neste esplêndido álbum duplo de 1978, pois ela veio depois.

Neste álbum duplo de vinil, aqui transposto para mp3, ouve-se o próprio Drummond lendo 38 de seus principais poemas. A voz do homem de 76 anos é rouca e fraca, três vezes ele tosse ou limpa a garganta durante a leitura… E daí, minha gente? E daí que temos o próprio autor a nos prodigalizar momentos únicos de audição de poemas GENIAIS. O que me emociona, além dos poemas, é a profunda musicalidade do velho Drummond — no texto e na leitura. Este post tem muita música, pequepianos. É um Sarau da melhor qualidade! Repito, é IM-PER-DÍ-VEL !!!

Carlos Drummond de Andrade ‎(1902-1987): Antologia Poética

1 Infância
2 No Meio Do Caminho
3 Confidência De Itabirano
4 Quadrilha
5 Os Ombros Suportam O Mundo
6 Mãos Dadas
7 Mundo Grande
8 José
9 Viagem Na Família
10 Procura Da Poesia
11 O Mito
12 O Lutador
13 Memória
14 Morte Do Leiteiro
15 Confissão
16 Consolo Na Praia
17 Oficina Irritada
18 Fazenda
19 Caso Do Vestido
20 Estrambote Melancólico
21 O Enterrado Vivo
22 Destruição
23 Intimação
24 Alta Cirurgia
25 Para Sempre
26 Canto Do Rio Em Sol
27 Boitempo
28 Cantiguinha
29 Os Pacifistas
30 Cultura Francesa
31 Falta Um Disco
32 Amor E Seu Tempo
33 Obrigado
34 Lira Romantiquinha
35 O Homem, As Viagens
36 Essas Coisas
37 Parolagem Da Vida
38 Declaração De Amor

Carlos Drummond de Andrade, voz

BAIXE AQUI — DOWNLOAD HERE

PQP

Francis Poulenc (1899-1963): Complete Chamber Music Vol. 1 (Tharaud e outros)

Francis Poulenc (1899-1963): Complete Chamber Music Vol. 1 (Tharaud e outros)

A música de câmara de Francis Poulenc é uma joia do repertório modernista, combinando elegância francesa, humor irreverente e profundidade emocional. Poulenc, membro do grupo Les Six (*), tinha um estilo único que misturava leveza neoclássica com toques de ironia e lirismo tocante. Sua música de câmara é acessível, mas nunca superficial. Se você gosta de Debussy ou Stravinsky, vai encontrar em Poulenc um meio-termo delicioso. Poulenc explora contrastes, consegue passar da graça à melancolia em poucas notas, vai do music-hall parisiense ao canto gregoriano. Eu adoro! E o Sexteto é uma obra-prima!

(*) O Grupo Les Six (“Os Seis”) foi um coletivo de compositores franceses que se uniu na década de 1920, influenciado por Erik Satie e Jean Cocteau, em oposição ao romantismo pesado e ao impressionismo excessivo. Eles buscavam uma música mais leve, clara e, por vezes, irreverente, incorporando elementos do jazz, do music-hall e do neoclassicismo. Eram eles: Poulenc, Honegger, Milhaud, Tailleferre, Auric e Durey.

Francis Poulenc (1899-1963): Complete Chamber Music Vol. 1 (Tharaud e outros)

Sextet for piano, flute, oboe, clarinet, basson and horn, FP 100
1 I. Allegro vivace: Tres vite et emporte 07:46
2 II. Divertissement: Andantino 04:15
3 III. Finale: Prestissimo 05:30

Oboe Sonata, FP 185
4 I. Élégie: Paisiblement 05:05
5 II. Scherzo: Très animé 04:01
6 III. Déploration: Très calme 04:43

Trio for Oboe, Bassoon and Piano
7 I. Presto: Lent-presto 05:28
8 II. Andante: Andante con moto 03:49
9 III. Rondo: Tres vif 03:21

Flute Sonata
10 Allegro malinconico 04:29
11 Cantilena: Assez lent 03:50
12 Presto giocoso 03:32

Villanelle
13 Villanelle 01:35

Bassoon – Laurent Lefèvre (faixas: 1-3, 7-9)
Clarinet – Ronald Van Spaendonck (faixas: 1-3)
Flute, Recorder – Philippe Bernold (faixas: 1-3, 10-13)
Horn – Hervé Joulain (faixas: 1-3)
Oboe – Olivier Doise (faixas: 1-9)
Piano – Alexandre Tharaud

BAIXE AQUI — DOWNLOAD HERE

Tharaud pensando na vida

PQP