Era desejo deste que vos escreve postar esta série já há muito anos, porém, pelos mais diversos motivos, acabei esquecendo, e os CDs se perderam na bagunça de meu acervo. Lembro como fiquei entusiasmado com este projeto, afinal, três jovens instrumentistas se reuniam para apresentar uma nova leitura principalmente dos Concertos para Piano e para Violoncelo, interpretados sob a ótica das interpretações historicamente informadas. Não que fosse uma novidade para mim, lembrando da gravação que Phillippe Herreweghe fez destes dois concertos com dois outros experientes nomes desta escola, Christopher Coin e Andreas Staier, CD que também postei já há mais de uma década.
Começo trazendo o primeiro CD da série, com uma de minhas violinistas favoritas, Isabelle Faust, interpretando o Concerto para Violino, que tem uma história incrível, que contarei mais abaixo. Faust se estabeleceu nos últimos anos como uma das principais violinistas da atualidade, realizando gravações altamente elogiosas, que sempre que posso, trago para os senhores. Lembro aqui dos Concertos para Violino de Mozart que já na primeira audição identifiquei como uma das melhores gravações que já escutara daquelas obras, e tanto acertei que ela ganhou diversos prêmios, entre eles, o da prestigiosa revista Gramophone. Recentemente lançou mais um volume da série de Sonatas para Violino do mesmo Mozart, ao lado de seu parceiro Alexander Melnikov, CD que pretendo trazer assim que possível. E sempre pelo selo ‘Harmonia Mundi’, o que por si só já é garantia de qualidade.
Joseph Joachin
Mas vamos contar a história do Concerto, muito curiosa, por sinal. Sabe-se que Robert Schumann era muito amigo de Joseph Joachim, o maior violinista de seu tempo, e também amigo de Brahms, mas isso é outra história. Conhecedor do talento de Robert, Joachim encomendou-lhe um Concerto para Violino, que gostaria de estrear. Eis um trecho da carta que o violinista mandou:
“Que o exemplo de Beethoven o inspire a produzir de sua ampla loja uma obra para os pobres violinistas, que, além da música de câmara, tão cruelmente carecem de composições edificantes para seu instrumento, ó maravilhoso guardião dos tesouros mais ricos!’
Schumann à época estava envolvido na composição de uma Fantasia também para Violino e Orquestra, porém aceitou a encomenda. Concluiu a respectiva Fantasia, e sua estreia foi um sucesso. E logo se envolveu na composição do Concerto, que concluiu e entregou a Joaquin, que já não demonstrava o mesmo interesse e entusiasmo anteriores. O texto abaixo foi livremente traduzido do booklet que acompanha o CD:
“Mas desta vez Joachim mostrou menos entusiasmo: embora ele tenha empreendido alguns ensaios com sua orquestra da corte de Hanover na presença do compositor, ele finalmente abandonou o projeto quando Schumann renunciou ao cargo de regente em Düsseldorf no final de outubro de 1853 em resposta à pressão da orquestra. A longa história de estigmatização fatal começou. Após a morte de Schumann, e em acordo com os desejos de sua viúva Clara, que se opôs firmemente à publicação do concerto como parte da edição completa de suas obras, o manuscrito foi transferido para a posse de Joachim. Mas ele também continuou a retê-lo, supostamente por acreditar que poderia detectar nele sinais de fraqueza composicional, que indicavam a incipiente doença psicológica de Schumann, um “certo cansaço” onde ele identificou um “contraste perturbador” com o resto da produção de seu amigo. Com a intenção, sem dúvida, bem intencionada de proteger a reputação artística de Schumann, Joachim deu um passo além e deixou instruções em seu testamento de que a peça não deveria ser executada nem publicada nos próximos cem anos. (…)”
Enfim, a obra ficou guardada com um editor, porém em 1937 foi publicada sob os auspícios de Joseph Goebbels, o temido chefe da GESTAPO, lembrando que os nazistas haviam banido o conhecidíssimo Concerto de Mendelssohn, pois esse tinha sangue judeu. A idéia era usar esse Concerto de Schumann como um elo de ligação entre o Concerto de Beethoven e o de Brahms, ignorando desta forma o de Mendelssohn. A obra foi estreada em novembro de 1937 pelo violinista Georg Kulenkampff, acompanhado pela Filarmônica de Berlim dirigida por Karl Böhm. Yehudi Menuhin a estreou em 1938, junto à Filarmônica de Nova Iorque, dirigida pelo maestro inglês John Barbirolli.
Não sou muito fã deste Concerto, o considero inconcluso, com muitas ideias esparsas, e nenhum norte, mas enfim, para quem não o conhece, ei-lo aí, nas mãos muito bem treinadas de Isabelle Faust, acompanhada pela Freiburger Barockorchester. A atitude de Joachin foi correta ao esconder a partitura? Não sei se após quase 170 anos possamos julgá-lo, nem a própria Clara, que melhor que ninguém conhecia as composições do marido. Com certeza, ao lado dos Concertos para Violoncelo e para Piano podemos considerar obra de menor qualidade.
PAra compensar, temos o Trio para Piano nº3, este sim, uma obra prima. Isabelle Faust tem como parceiros nesta obra o pianista Alexander Melnikov e o violoncelista Jean-Guilhen Queyras. Um trio de respeito, diga-se de passagem.
1. Violin Concerto in D Minor – I. In kräftigem, nicht zu schnellem Tempo
2. Violin Concerto in D Minor – II. Langsam
3. Violin Concerto in D Minor – III. Lebhaft, doch nicht schnell
4. Piano Trio No. 3 in G Minor, Op. 110 – I. Bewegt, doch nicht zu rasch
5. Piano Trio No. 3 in G Minor, Op. 110 – II. Ziemlich langsam
6. Piano Trio No. 3 in G Minor, Op. 110 – III. Rasch
7. Piano Trio No. 3 in G Minor, Op. 110 – IV. Kräftig, mit Humor
Isabele Faust – Violino
Alexander Melnikov – Piano
Jean-Guilhen Queyras – Violoncelo
Freiburger Barockorchester
Pablo Heras-Casado – Condutor
Steven Isserlis talvez seja a melhor voz de Schumann no violoncelo. Ele apresenta as obras em um modo sensível e divertido. Pena que Schumann não gostasse tanto do violoncelo, apesar de tê-lo tocado em seus primeiros anos. Algumas peças para o instrumento foram destruídas por Clara após sua morte. Várias obras deste CD são transcrições. (1) As três Fantasiestucke foram originalmente escritas para clarinete, mas o próprio Schumann produziu uma edição para violoncelo e, ironicamente, esta é provavelmente a versão agora ouvida com mais frequência. (2) A Sonata para Violino Nº 3 é uma obra reconstruída e transcrita aqui para violoncelo pelo próprio Isserlis. (3) Abendlied é uma transcrição por Joachim a partir de uma versão para dueto de piano. (4) Drei Romanzen Op. 94 eram originalmente para oboé e piano. Aqui o violoncelo leva a linha do oboé para uma oitava abaixo. Todos estes trabalhos vão muito bem no violoncelo e você fica imaginando e lamentando o que Clara destruiu.
Robert Schumann (1810-1856): Música para Violoncelo e Piano
Soiréestücke (Fantasiestücke) Op 73 (11:28)
1 Zart Und Mit Ausdruck 4:09
2 Lebhaft, Leicht 3:09
3 Rasch Und Mit Feuer 4:06
Adagio And Allegro Op 70 (8:57)
4 Adagio 4:17
5 Allegro 4:36
Violin Sonata No 3 In A Minor – Arranged By – Steven Isserlis (20:06)
6 Ziemlich Langsam – (Lebhaft) – 7:05
7 Scherzo: Lebhaft 3:12
8 Intermezzo: Bewegt, Doch Nicht Zu Schnell 3:21
9 Finale: Markiertes, Ziemlich Lebhaftes Tempo 6:20
10 Abendlied Op 85 No 12
Arranged By – Joseph Joachim, Steven Isserlis
3:04
Drei Romanzen Op 94 – Arranged By – Steven Isserlis (11:07)
11 Nicht Schnell 3:10
12 Einfach, Innig – Etwas Lebhafter 3:50
13 Nicht Schnell 4:04
Fünf Stücke Im Volkston Op 102 (15:26)
14 Mit Humor 2:48
15 Langsam 3:37
16 Nicht Schnell, Mit Viel Ton Zu Spielen 4:08
17 Nicht Zu Rasch 1:47
18 Stark Und Markiert 3:03
Cello, Liner Notes – Steven Isserlis
Piano [Steinway] – Dénes Várjon
Se a década pré-pandêmica de nossa Rainha consolidou práticas das anteriores – raras gravações em estúdio, pouquíssimas aparições solo, prolífico camerismo e generoso incentivo a jovens talentos -, os anos 10 também a viram explorar repertório novo e desempenhar papéis inéditos, alguns ligados a suas raízes bonaerenses, tais como tangueira e Luthier, e outros ainda mais insuspeitos, como acompanhista em Lieder e em cancioneiro iídiche. Notem que essa discografia argerichiana que ora concluímos, e que supomos tão completa quanto a pudemos deixar, não inclui a importante coleção de registros de Marthinha no Festival de Lugano, que nosso colega FDP Bach está a nos trazer aos poucos.
Exceto por uma já tradicional vinda a Buenos Aires na metade do ano, quando dá a seus conterrâneos o privilegiado ar de sua graça, Martha não é lá muito afeita a explorar seu continente. Uma exceção notável foi a turnê por várias capitais do Brasil em 2004, certamente instigada pelo amado amigo Nelson Freire, com quem tocou em duo e autografou um LP do patrão PQP e um CD meu lá em nossa Dogville natal. Outra foi essa breve residência na província de Santa Fe, para a qual foi persuadida por outro amigo, Daniel Rivera, um pianista nascido em Rosario e radicado na Itália há muitas décadas. Cada disco registra a íntegra de uma das noites de Martha no festival, o que explica a repetição de algumas peças. Destaco a interpretação de Scaramouche, cujo movimento Brazileira cita (e, para muitos, plagia) Ernesto Nazareth, marcando, ainda que tangencialmente, uma das muito poucas vezes que a música brasileira passou pelos dedos de nossa deusa (outra delas está aqui). Digna de nota, também, é a substancial participação no repertório de compositores argentinos contemporâneos, especialmente na última noite, na qual a Rainha fez parte dum mui hábil conjunto de tango que incluiu sua primogênita, Lyda, a tocar viola.
Wolfgang Amadeus MOZART (1756-1791) Sonata em Ré maior para piano a quatro mãos, K. 381
1 – Allegro
2 – Andante
3 – Allegro molto
Johannes BRAHMS (1833-1897) Variações sobre um tema de Joseph Haydn, para dois pianos, Op. 56b
4 – Thema: Andante
5 – Poco più animato
6 – Più vivace
7 – Con moto
8 – Andante con moto
9 – Vivace
10 – Vivace
11 – Grazioso
12 – Presto non troppo
13 – Finale: Andante
Franz LISZT (1811-1886) Les Préludes, poema sinfônico, S. 97
Transcrição para dois pianos do próprio compositor
14 – Andante maestoso
Dmitri Dmitriyevich SHOSTAKOVICH (1906-1975)
Concertino em Lá menor para dois pianos, Op. 94
1 – Adagio – Allegretto – Adagio – Allegro – Adagio – Allegretto
Sergei Vasilyevich RACHMANINOFF (1873-1943) Suíte para dois pianos no. 2 em Dó maior, Op. 17
2 – Introduction
3 – Valse
4 – Romance
5 – Tarantella
Darius MILHAUD (1892-1974) Scaramouche, suíte para dois pianos, Op. 165b 6 – Vif
7 – Modéré
8 – Brazileira
Luis Enríquez BACALOV (1933-2017)
9 – Astoreando, para dois pianos
Ástor Pantaleón PIAZZOLLA (1921-1992)
2 – “Milonga Del Angel”, para dois pianos, viola, contrabaixo e bandoneón
Aníbal Carmelo TROILO (1914-1975)
3 – “Sur” y “La Última Curda”, para bandoneón
Néstor Eude MARCONI (1942)
e Daniel MARCONI (1970)
4 – “Gris Se Ausencia” y “Robustango”, para bandoneón
Ástor PIAZZOLLA 5 – “Oblivión” del “Concierto Aconcagua” – “Tema de María” – “Verano Porteño” – Cadencia del “Concierto Aconcagua”- “La Muerte del Angel” – “Lo Que Vendrá” – “Decarísimo”, para bandoneón
Néstor MARCONI 6 – “Para El Recorrido”, para piano, viola, contrabaixo e bandoneón
7 – “Moda Tango”, para piano, viola, contrabaixo e bandoneón
Ástor PIAZZOLLA
8 – “Libertango”, para piano, viola, contrabaixo e bandoneó
9 – “Tres Minutos Con La Realidad”, para dois pianos, viola, contrabaixo e bandoneón
Néstor Marconi, bandoneón (faixas 3-9)
Enrique Fagone, contrabaixo (faixas 6-9)
Daniel Rivera, piano (faixas 1, 2 e 9)
Gabriele Baldocci, piano (faixa 6)
Martha Argerich (faixas 1, 2, 7-9)
Lyda Chen, viola (faixas 2, 6-9)
Gravado ao vivo em Rosario, Argentina, entre 19 e 25 de outubro de 2012
Se Martha também é María, e Argerich pela família catalã do pai, ela também é Heller por sua mãe Juanita, filha de judeus russos estabelecidos na província de Entre Ríos. E, se não lhes posso afirmar que o iídiche fez parte de sua infância, não tenho muitas dúvidas de que ele ajudou a aproximá-la de Ver bin Ikh! (“Quem sou eu!”), projeto da atriz e cantora Myriam Fuks. Nascida em Tel Aviv e radicada em Bruxelas, Myriam aqui resgata, com sua profunda voz de contralto, diversas canções judaicas centro-europeias, acompanhada dum prodigioso conjunto de amigos, que inclui o demoníaco Roby Lakatos, Mischa e Lily Maisky, o brilhante Evgeny Kissin (que desenvolve uma belíssima carreira paralela na composição e declamação de poemas em iídiche) e, claro, nossa Rainha, a quem cabe a honra de encerrar o álbum com a parte de piano de Der Rebe Menachem (“O Rabino Menahem”).
VER BIN IKH! – MYRIAM FUKS
1 – Vi Ahin Zol Ikh Geyn (S. Korn-Teuer [Igor S. Korntayer]/O. Strokh) Evgeny Kissin, piano
02 – Far Dir Mayne Tayer Hanele/Klezmer Csardas de “Klezmer Karma” (R. Lakatos/M. Fuks) Alissa Margulis, violino Nathan Braude, viola Polina Leschenko, piano
3 – Malkele, Schloimele (J. Rumshinsky) Sarina Cohn, voz Philip Catherine, guitarra Oscar Németh, baixo
4 – Deim Fidele (B. Witler) Lola Fuks, voz Michael Guttman, violino
5 – Yetz Darf Men Leiben (B. Witler) Paul Ambach, voz
Martha sempre teve o costume de acolher, tanto em sua vida pessoal quanto sob as suas protetoras asas artísticas, artistas mais jovens, e um seu modus operandi bem típico nas últimas décadas tem sido o das participações, por óbvio muito especiais, em álbuns de colegas que admira. O pianista russo-alemão Jura Margulis teve o privilégio de ter a Rainha a seu lado para encerrar este volume de suas próprias transcrições para piano, tocando a dois pianos a Noite no Monte Calvo, de Mussorgsky. Eu, que adoro Modest quase tanto quanto amo Marthinha, não só fiquei entusiasmado ao finalmente ouvi-la tocar uma de suas obras, como também passei a sonhar com o dia em que a escutaria a tocar os Quadros de uma Exposição, que certamente ficariam supimpas sob suas mãos. Pode parecer um pedido exagerado a quem já tem oitenta anos e um tremendo repertório, mas não perdi minhas esperanças; muito pelo contrário, eu as vi renovadas quando Martha, em 2020, aprendeu e tocou as partes de piano da maravilhosa Der Hirt auf dem Felsen de Schubert e, para minha maior alegria, de duas das Canções e Danças da Morte de Mussorgsky. Sonhar, enfim, nada custa – ainda.
Johann Sebastian BACH (1685-1750)
Da Matthäus-Passion, BWV 244
1 – Wir setzen uns mit Tränen nieder
Wolfgang Amadeus MOZART Do Requiem em Ré menor, K. 626 2 – Confutatis maledictis
3 – Lacrimosa
Giacomo PUCCINI (1858-1924)
4 – Crisantemi, SC 65
Franz LISZT 5 – Mephisto-Walzer
Robert SCHUMANN De Dichterliebe, Op. 48: 6 – No. 4: Wenn ich in deine Augen seh’
Dmitri SHOSTAKOVICH Da Sinfonia no. 8 em Dó menor, Op. 65 7 – Toccata
8 – Passacaglia
Sayat NOVA (1712-1795)
Transcrição de Arno Babadjanian (1921-1983)
9 – Melodie – Elegie
Modest Petrovich MUSSORGSKY (1839-1881)
10 –Noch′ na lysoy gore (“Noite no Monte Calvo”), para dois pianos
Jura Margulis, piano (1-10) e transcrições (exceto faixa 9)
Martha Argerich, piano II (faixa 10)
“Noite no Monte Calvo” gravada em Lugano, Suíça, junho de 2014
Uma overdose de genialidade portenha, e praticamente um esculacho de Buenos Aires para com cidades menos dotadas de talentos (i.e., quase todas as outras), foi aquela noite de agosto de 2014 em que Les Luthiers encontraram Daniel Barenboim e Martha Argerich no sacrossanto palco do Teatro Colón. Depois da habitual dose de obras do imerecidamente obscuro Johann Sebastian Mastropiero, o genial quinteto juntou-se a Barenboim para narrar A História do Soldado de Stravinsky, e os seis se somariam a Martha para o Carnaval dos Animais de Saint-Saëns. Nem o vídeo, nem o áudio do memorável encontro foram lançados comercialmente – o que nos obriga a nos contentarmos com o ensaio geral, feito na manhã do concerto, com a plateia repleta de fãs que não tinham conseguido ingressos para a noite:
Martha e Daniel voltariam a se encontrar no Colón no ano seguinte, sem Les Luthiers, para um programa de formato mais familiar a eles. À rara audição dos estudos canônicos de Schumann no arranjo improvável de Debussy, eles fizeram seguir uma obra do próprio Claude-Achille e a irresistível sonata com percussão de Bartók: repertório incomum e – em que pese a ausência de J. S. Mastropiero – nada menos que tremendo.
Robert SCHUMANN Seis estudos em forma canônica, para piano, Op. 56
Transcrição para dois pianos de Claude Debussy (1862-1918)
1 -Nicht zu schnell
2 – Mit innigem Ausdruck
3 – Andantino
4 – Innig
5 – Nicht zu schnell
6 -Adagio
Claude-Achille DEBUSSY (1862-1918) En Blanc et Noir, suíte para dois pianos, L. 134
7 – Avec Emportement (À Mon Ami A. Koussevitzky)
8 – Lent. Sombre (Au Lieutenant Jacques Charlot Tué a l’ennemi en 1915, le 3 Mars)
9 – Scherzando (À Mon Ami Igor Stravinsky)
Béla Viktor János BARTÓK (1881-1945) Sonata para dois pianos e percussão, Sz. 110
10 – Assai lento – Allegro molto
11 – Lento, ma non troppo
12 – Allegro non troppo
Daniel Barenboim, piano II
Lev Loftus e Pedro Manuel Torrejón González, percussão (faixas 10-12)
Gravado ao vivo em Buenos Aires, Argentina, agosto de 2015
Dezoito anos depois de sua primeira gravação juntos, Martha e Itzhak Perlman reecontraram-se em Paris para novas sessões em estúdio – as primeiras de Martha na década para o repertório de concerto. Às Fantasiestücke de Schumann e a sonata no. 4 de Bach, eles somaram a fatia brahmsiana da sonata F-A-E, completando o álbum com uma sonata de Schumann gravada em 1998 e ainda mantida inédita por falta de pareamento.
“Trabalhar com Martha”, disse Itzhak, “foi uma experiência única para mim… seu brilho e as cores que ela usa quando toca são reconhecíveis tão longo você as escuta – é ela, ninguém mais soa assim… Estou muito feliz com que pudemos de fato gravar novamente… quando surgiu a possibilidade de que ela tivesse um punhado de dias livres para gravar eu disse ‘eu irei a qualquer lugar!!!'”. A julgar pela cumplicidade com que tocaram e pelo olhar curioso de Martha para o bonachão Itzhak na capa do álbum, tenho certeza de que a viagem valeu a pena.
Robert SCHUMANN
Sonata para violino e piano no. 1 em Lá menor, Op. 105 1 – Mit leidenschaftlichem Ausdruck
2 – Allegretto
3 – Lebhaft
Fantasiestücke, para violino e piano, Op. 73 4 – Zart und mit Ausdruck
5 – Lebhaft, leicht
6 – Rasch und mit Feuer
Johannes BRAHMS Scherzo para violino e piano, WoO 2 (da sonata “F-A-E”, composta em colaboração com Robert Schumann e Albert Dietrich)
7 – Allegro
Johann Sebastian BACH Sonata para violino e teclado no. 4 em Dó menor, BWV 1017
8 – Siciliano. Largo
9 – Allegro
10 – Adagio
11 – Allegro
Itzhak Perlman, violino
Gravado em Saratoga, Estados Unidos, julho de 1998 (1-3) e Paris, França, março de 2016 (4-11)
Ainda que a gravação anterior de Martha para o Carnaval dos Animais – aquela com Gidon Kremer – seja mais famosa, eu prefiro essa, com Antonio Pappano no duplo papel de pianista e regente e Annie, filha de Martha com Charles Dutoit, a narrar. Se aquela com Les Luthiers é melhor que essa, jamais saberemos enquanto os detentores da preciosa gravação no Colón não a trouxerem a público. O que sabemos é que Johann Sebastian Mastropiero é um compositor muitíssimo superior a Saint-Saëns e que, por isso, nossa Rainha deveria tocá-lo mais. Fica a dica, Marthinha.
Le Carnaval des Animaux, Grande Fantaisie Zoologique 5 – Introduction et Marche Royale du Lion
6 – Poules et Coqs
7 – Hémiones
8 – Tortues
9 – L’Éléphant
10 – Kangourous
11 – Aquarium
12 – Personnages à Longues Oreilles
13 – Le Coucou au Fond des Bois
14 – Volière
15 – Pianistes
16 – Fossiles
17 – Le Cygne
18 – Finale
Annie Dutoit, narração
Gabriele Geminiani, violoncelo
Libero Lanzilotta, contrabaixo
Antonio Pappano, piano II e regência
Enquanto se desligava aos poucos do festival centrado sobre si em Lugano, Martha passou a visitar Hamburgo com cada vez mais frequência, até ver um novo festival em torno de si, realizado no mês de junho na soberba Laeiszhalle daquela cidade em que mais chove em toda Alemanha. Este Rendez-vous with Martha Argerich é o tributo fonográfico do impressionante programa do festival em 2018, reunindo um elenco cheio de figuras estelares da galáxia da Rainha – incluindo algumas literalmente familiares, como suas filhas Lyda e Annie e o ex-companheiro Kovacevich. Gosto de todos os discos, repletos que são do elã característico de Marthinha, mesmo quando ela não está de fato a tocar. Meu xodó, no entanto, é o último, com um delicioso Carnaval dos Animais narrado por Annie e uma não menos saborosa seleção de repertório ibérico e latino-americano que se encerra com uma versão tanguera de Eine kleine Nachtmusik que certamente faria Amadeus gargalhar em dois por quatro.
Claude DEBUSSY De Nocturnes, L. 91 1 – Fêtes (arranjo para dois pianos de Maurice Ravel)
Anton Gerzenberg, piano II
Sonata em Sol menor para violino e piano, L. 140 2 – Allegro vivo
3 – Intermède. Fantasque et léger
4 – Finale. Très animé
Géza Hosszu-Legocky, violino Evgeni Bozhanov, piano
5 – Prélude à l’après-midi d’un faune, L. 86
(arranjo para dois pianos do próprio compositor)
Stephen Kovacevich, piano I
Sonata em Ré menor para violoncelo e piano, L. 135
6 – Prologue: Lent, sostenuto e molto risoluto
7 – Sérénade: Modérément animé
8 – Finale: Animé, léger et nerveux
Mischa Maisky, violoncelo
Joseph Maurice RAVEL (1875-1937) 9 – La Valse, poème choreographique (arranjo para dois pianos do próprio compositor)
Nicholas Angelich, piano II
Sonata em Ré menor para violino e violoncelo, M. 73
10 – Allegro
11 – Très vif
12 – Lent
13 – Vif, avec entrain
Alexandra Conunova, violino Edgar Moreau, violoncelo
Sergey Sergeyevich PROKOFIEV (1891-1953) Sinfonia no. 1 em Ré maior, Op. 25, “Clássica”
Transcrição para dois pianos de Rikuya Terashima
1 – Allegro
2 – Larghetto
3 – Gavotta: Non troppo allegro
4 – Finale: Molto vivace
Evgeni Bozhanov e Akane Sakai, pianos
5 – Abertura sobre temas hebraicos, para piano, clarinete, dois violinos, viola e violoncelo, Op. 34
Pablo Barragán, clarinete Akiko Suwanai e Alexandra Conunova, violinos Lyda Chen, viola Edgar Moreau, violoncelo
Suíte de Cinderella (Zolushka), balé em três atos, Op. 87
Arranjo para dois pianos de Mikhail Vasilyevich Pletnev (1957)
6 – Introduction: Andante dolce
7 – Querelle: Allegretto
8 – L’Hiver: Adagio – Allegro moderato
9 – Le Printemps: Vivace con brio – Moderato – Presto
10 – Valse de Cendrillon: Andante – Allegretto – Poco più animato – Più animato – Meno mosso
Akane Sakai eAlexander Mogilevsky, pianos
11 – Gavotte: Allegretto
12 – Gallop: Presto – Andantino – Presto
13 – Valse Lente: Adagio – Poco più animato – Assai più mosso – Poco più animato – Meno mosso (più animato dell’adagio
14 – Finale: Allegro moderato – Allegro espressivo – Presto – Allegro moderato – Andante
Evgeni Bozhanov e Kasparas Uinskas, pianos
Sonata em Dó maior para dois violinos, Op. 56 15 – Andante cantabile
16 – Allegro
17 – Commodo (quasi allegretto)
18 – Allegro con brio
Dmitri Dmitriyevich SHOSTAKOVICH (1906-1975) Concerto em Dó menor para piano, trompete e orquestra de cordas, Op. 35
1 – Allegro moderato – attacca:
2 – Lento – attacca:
3 – Moderato – attacca:
4 – Allegro con brio
Sergei Nakariakov, trompete
Symphoniker Hamburg
Trio para piano, violino e violoncelo no. 2 em Mi menor, Op. 67
5 – Andante – Moderato – Poco più mosso
6 – Allegro con brio
7 – Largo
8 – Allegretto – Adagio
Guy Braunstein, violino
Alisa Weilerstein, violoncelo
Zoltán KODÁLY (1882-1967) Duo para violino e violoncelo, Op. 7 9 – Allegro serioso, non troppo
10 – Adagio – Andante 11 – Maestoso e largamente, ma non troppo lento – Presto
Guy Braunstein, violino
Alisa Weilerstein, violoncelo
Jakob Ludwig Felix MENDELSSOHN Bartholdy (1809-1847)
Trio para violino, violoncelo e piano no. 1 em Ré menor, Op. 49 (transcrição para flauta, violoncelo e piano)
1 – Molto allegro ed agitato
2 – Andante con moto tranquillo
3 – Scherzo
4 – Finale
Johannes BRAHMS
Sonata para piano e violino no. 2 em Lá maior, Op. 100 1 – Allegro amabile
2 – Andante tranquillo — Vivace — Andante — Vivace di più — Andante — Vivace
3 – Allegretto grazioso (quasi andante)
Akiko Suwanai, violino Nicholas Angelich, piano
Sergey RACHMANINOV
Sonata em Sol menor para violoncelo e piano, Op. 19 4 – Lento. Allegro moderato
5 – Allegro scherzando
6 – Andante
7 – Allegro mosso
Camille SAINT-SAËNS 1-30 – Le Carnaval des Animaux, Grande Fantaisie Zoologique
Annie Dutoit, narração Jing Zhao, violoncelo Lilya Zilberstein e Martha Argerich, pianos
Symphoniker Hamburg Ion Marin, regência
Ernesto Sixto de la Asunción LECUONA Casado (1895-1963) Quatro danças cubanas, para piano
31 – A la antigua
32 – Al fin te ví
33 – No hables más!
34 – En tres por cuatro
Três danças afro-cubanas, para piano 35 – La Conga de Medianoche
36 – La Comparsa
37 – Danza de los Ñañigos
Isaac Manuel Francisco ALBÉNIZ y Pascual (1860-1909)
Arranjo de Mauricio Vallina (1970)
Da Suíte España, Op. 165 38 – No. 2: Tango
Ángel Gregorio VILLOLDO Arroyo (1861- 1919)
Arranjo de Lea Petra
39 – El Choclo
Mauricio Vallina, piano
Eduardo Oscar ROVIRA (1925- 1980)
40 – A Evaristo Carriego
Ástor PIAZZOLLA 41 – Triunfal
42 – Adiós Nonino
Wolfgang Amadeus MOZART 43 – Musiquita Noturna (arranjo do Allegro da Eine Kleine Nachtmusik, K. 525)
Jing Zhao, violoncelo (faixa 40)
The Guttman Tango Quartet:
Michael Guttman, violino
Lysandre Denoso, bandoneón
Chloe Pfeiffer, piano
Ariel Eberstein, contrabaixo
Entre os protegidos de Martha Argerich, o sul-coreano Dong Hyek Lim é um dos meus favoritos: não são muitos os jovens pianistas que conseguem, na falta de melhor definição, dizer a música sem firulas egocêntricas, nem aparentar qualquer esforço, mesmo nas passagens mais cabeludas do repertório. Aqui ele doma o monstruoso Rach 2 com um som apropriadamente grande e muita precisão, para depois encarar as Danças Sinfônicas de Sergey em companhia de Sua Majestade, que lhe concede o privilégio da especialíssima participação em seu álbum: uma moral e tanto para o pibe.
Sergey RACHMANINOV Concerto para piano e orquestra no. 2 em Dó menor, Op. 18 1 – Moderato
2 – Adagio sostenuto – Più animato – Tempo I
3 -Allegro scherzando
Dong Hyek Lim, piano
BBC Symphony Orchestra
Alexander Vedernikov
Gravado em Londres, Reino Unido, setembro de 2018
Danças sinfônicas para orquestra, Op. 45
Transcrição para dois pianos do próprio compositor
4 – Non allegro
5 – Andante con moto
6 – Lento assai – Allegro vivace – Lento assai. Come prima – Allegro vivace
Mais um Rendez-vous com Martha em Hamburgo, desta vez em 2019, com resultados muito bons, ainda que tão entusiasmantes quanto os do ano anterior. Jamais escreveria isso num tom de queixume, mas a Rainha legou-nos tantas interpretações memoráveis que as revisitas aos itens de seu repertório despertam comparações com as legendárias versões anteriores, num curioso efeito colateral dos setenta anos de carreira e duma magnífica discografia. Refiro-me, principalmente, à gravação do concerto de Tchaikovsky, em que ela brilha como sempre, mas a Sinfônica de Hamburgo não tanto quanto a Royal Philharmonic sob a mesma batuta de Charles Dutoit, décadas antes. E teria havido, enfim, menos elã no notável elenco de intérpretes do que no ano anterior, ou estarei eu tão só blasé depois de tanto escutar gravações antológicas de Marthinha para lhes apresentar sua discografia integral? Só vocês me poderão dizer.
Felix MENDELSSOHN Trio para piano, violino e violoncelo no. 2 em Dó menor, Op. 66
1 – Allegro energico e con fuoco
2 – Andante espressivo
3 – Scherzo
4 – Finale. Allegro appassionato
Renaud Capuçon, violino
Edgar Moreau, violoncelo
Johannes BRAHMS
Sonata para violino e piano no. 1 em Sol maior, Op. 78 5 – Vivace ma non troppo
6 – Adagio
7 – Allegro molto moderato
Wolfgang Amadeus MOZART
Andante e variações em Sol maior para piano a quatro mãos, K. 501 1 – Thema – Variationen I-V
Stephen Kovacevich e Martha Argerich, piano
Ludwig van BEETHOVEN Sonata para violino e piano no. 9 em Lá maior, Op. 47, “Kreutzer” 2 – Adagio sostenuto — Presto
3 – Andante con variazioni
4 – Finale. Presto
Tedi Papavrami, violino
Franz Peter SCHUBERT (1797-1828) Fantasia em Fá menor para piano a quatro mãos, D. 940 5 – Allegro molto moderato
6 – Largo
7 – Scherzo. Allegro vivace
8 – Finale. Allegro molto moderato
Pyotr Ilyich TCHAIKOVSKY (1840-1893) Concerto para piano e orquestra no. 1 em Si bemol menor, Op. 23 1 – Allegro non troppo e molto maestoso
2 – Andantino semplice – Prestissimo – Tempo I
3 – Allegro con fuoco
Symphoniker Hamburg
Charles Dutoit, regência
Igor Fyodorovich STRAVINSKY (1882-1971) Les Noces, Cenas Coreográficas com Música e Vozes
4 – La tresse
5 – Chez le Marié
6 – Le Départ de la Mariée
7 – Le Repas de Noces
Nicholas Angelich, Gabriele Baldocci, Alexander Mogilevsky e Stepan Simonian, pianos
Europa Choir Akademie Görlitz
Charles Dutoit, regência
Giuseppe Domenico SCARLATTI (1685-1757) Sonatas (Esercizi) para teclado: 1 – K. 495 em Mi maior
2 – K. 20 em Mi maior
3 – K. 109 em Lá menor
4 – K. 128 em Si bemol menor
5 – K. 55 em Sol maior
6 – K. 32 em Ré menor
7 – K. 455 em Sol maior
Evgeni Bozhanov, piano
Johann Sebastian BACH Concerto em Lá menor para quatro pianos e orquestra de cordas, BWV 1065 8 – Allegro
9 – Largo
10 – Allegro
Martha Argerich, Dong Hyek Lim, Sophie Pacini e Mauricio Vallina, pianos
Symphoniker Hamburg
Adrian Iliescu, regência
Robert SCHUMANN
Kinderszenen, para piano, Op. 15 11 – Von fremden Ländern und Menschen
12 – Kuriose Geschichte
13 – Hasche-Mann
14 – Bittendes Kind
15 – Glückes genug
16 – Wichtige Begebenheit
17 – Träumerei
18 – Am Kamin
19 – Ritter vom Steckenpferd
20 – Fast zu ernst
21 – Fürchtenmachen
22 – Kind im Einschlummern
23 – Der Dichter spricht
Martha Argerich, piano
Fryderyk Francyszek CHOPIN (1810-1849) Introdução e Polonaise Brilhante em Dó maior, para violoncelo e piano, Op. 3
24 – Largo – Alla polacca
Wolfgang Amadeus MOZART Sonata em Ré maior para piano a quatro mãos, K. 381 1 – Allegro
2 – Andante
3 – Allegro molto
Martha Argerich e Akane Sakai, piano
Claude DEBUSSY
Petite Suite, para piano a quatro mãos, L. 65 4 – En bateau
5 – Cortège
6 – Menuet
7 – Ballet
Sergei Babayan e Evgeni Bozhanov, piano
Enrique GRANADOS Campiña (1862-1916)
Transcrição para violino e piano de Fritz Kreisler (1875-1962)
Das Doze danças espanholas, Op. 37 8 – No. 5: Andaluza
Friedrich “Fritz” KREISLER (1875-1962)
9 – Schön Rosmarin
Géza Hosszu-Legocky, violino
Sergei Babayan, piano
Francis Jean Marcel POULENC (1899-1963) Sonata para dois pianos, FP 165
10 – Prologue
11 – Allegro molto
12 – Andante lyrico
13 – Epilogue
Witold Roman LUTOSŁAWSKI (1913-1994)
14 – Variações sobre um tema de Paganini, para dois pianos
Karin Lechner e Sergio Tiempo, pianos
Sergey RACHMANINOV
Das Seis peças para piano a quatro mãos, Op. 11 15 – No. 4: Valsa
A gravação mais recente de Martha, já sob a égide da Covid-19, foi feita em duo com a pianista grega Theodosia Ntokou, outra de suas muito queridas protegidas. A escolha de uma transcrição da sinfonia “Pastoral” de Beethoven só não é mais curiosa do que a própria versão escolhida: em lugar da mais famosa e autoritativa, feita por Carl Czerny, aluno do próprio renano, elas escolheram o obscuro arranjo do ainda mais obscuro Selmar Bagge. A “Pastoral” foi-me uma grata surpresa, assim como lhes será a bonita leitura que Ntokou entrega da sonata “Tempestade”, depois de se despedir da Rainha. E, já que estamos a falar de despedidas, despeço-me eu aqui por terminar de oferecer-lhes, ao longo de oito capítulos e incontáveis adiamentos, a discografia completa da maior pianista de nosso tempo, num tributo aos seus oitenta anos que, concluído já no caminho de seus oitenta e dois, deseja-lhe a saúde e o fogo de sempre para oferecer ao público que tanto a ama o estupor com que ela o nutre há mais de sete décadas.
Ludwig van BEETHOVEN
Sinfonia no. 6 em Fá maior, Op. 68, “Pastoral”
Transcrição para dois pianos de Selmar Bagge (1823-1896)
1 – Erwachen heiterer Empfindungen bei der Ankunft auf dem Lande. Allegro ma non troppo
2 – Szene am Bach. Andante molto moto
3 – Lustiges Zusammensein der Landleute. Allegro
4 – Gewitter. Sturm. Allegro
5 – Hirtengesang. Frohe und dankbare Gefühle nach dem Sturm. Allegretto
Theodosia Ntokou, piano II
Gravado em Lugano, Suíça, julho de 2020
Das Três sonatas para piano, Op. 31: No. 2 em Ré menor, “Tempestade”
6 – Largo
7 – Adagio
8 – Allegretto
Se o novo milênio da Rainha teve poucas gravações em estúdio, ele abundou em registros ao vivo. O Festival de Lugano, que aconteceu entre 2002 e 2016, garantiu pelo menos um álbum triplo anual à discografia de Martha, sempre em companhias por ela escolhidas, e com muitas obras novas em seu repertório. Passaremos ao largo do legado de Lugano, no entanto, pois o colega FDP Bach já vem publicando seus discos há algum tempo e pretende prosseguir sua série. Assim, hemos de lhes alcançar o que La Diosa gravou fora do Ticino, que também privilegia a colaboração com outros artistas, particularmente aqueles bem mais jovens que ela.
A primeira gravação de estúdio da década nada tem de jovem guarda: à mui madura troika de Martha, Kremer e Maisky, veterana de tantas gravações importantes, soma-se a também calejada viola de Yuri Bashmet. O resultado, mais que a soma de solistas, é um conjunto afiado, especialmente no eletrizante Brahms que abre o disco, que desfaz os rumores não só de que Martha não gosta de Brahms, como também de que não o toca bem. Sobre o tópico, aliás, ela declarou ano passado: “quando eu toco [Brahms], eu amo, mas a música dele não é do tipo ao qual sou naturalmente inclinada. Eu estudei o concerto no. 2 com o Gulda [seu professor], mas nunca o toquei em concerto. Pode ser uma história de libido. Certas pianistas adoram sua música: Irene Russo, Hélène Grimaud, Karin Lechner… Elas são talvez mulheres atraídas por homens mais velhos. Esse nunca foi meu caso. Eu toquei sua sonata para piano no. 2 por um tempo porque ela é muito schumanniana (…) Eu gosto de Brahms. Era Gulda que não gostava muito dele”.
O álbum é encerrado pelas Fantasiestücke de Schumann para trio, que, ainda que executadas com muita competência (e talvez vibrato demais pelos cordistas), não deixam de soar um pouco frugais depois da tempestade brahmsiana daquele “Rondó à Moda Cigana” que encerra o quarteto.
Johannes BRAHMS (1833-1897) Quarteto para piano, violino, viola e violoncelo em Sol menor, Op. 25
1 – Allegro
2 – Intermezzo: Allegro ma non troppo – Trio: Animato
3 – Andante con moto
4 – Rondo alla Zingarese
Robert Alexander SCHUMANN (1810-1856) Fantasiestücke para piano, violino e violoncelo, Op. 88 5 – Romanze: Nicht schnell, mit innigem Ausdruck
6 – Humoreske: Lebhaft
7 – Duett: Langsam und mit Ausdruck
8 – Finale: Im Marschtempo
Martha é uma pianista dos pianistas, e nos perderíamos facilmente na conta dos colegas que a admiram. Mikhail Pletnev, que foi por um tempo seu vizinho na Suíça, é um de seus maiores fãs, e pôs sua admiração à obra, dedicando à Rainha uma transcrição para dois pianos da “Cinderella” de Prokofiev, estreada e gravada por ambos em 2003. A gravação, à qual se segue uma charmosa “Mamãe Gansa” de Ravel, é um deleite, e nos permite saborear os contrastes entre o estilo único de Marthinha (no piano à esquerda em Prokofiev e sentada à esquerda no Ravel) com o clássico sonzão russo de Pletnev (sentado à direita nas duas gravações).
Sergey Sergeyevich PROKOFIEV (1891-1953) Suíte de Cinderella (Zolushka), balé em três atos, Op. 87
Arranjo para dois pianos de Mikhail Vasilyevich Pletnev (1957)
1 – Introduction: Andante dolce
2 – Querelle: Allegretto
3 – L’Hiver: Adagio – Allegro moderato
4 – Le Printemps: Vivace con brio – Moderato – Presto
5 – Valse de Cendrillon: Andante – Allegretto – Poco più animato – Più animato – Meno mosso
6 – Gavotte: Allegretto
7 – Gallop: Presto – Andantino – Presto
8 – Valse Lente: Adagio – Poco più animato – Assai più mosso – Poco più animato – Meno mosso (più animato dell’adagio
9 – Finale: Allegro moderato – Allegro espressivo – Presto – Allegro moderato – Andante
Mikhail Pletnev, piano II
Joseph Maurice RAVEL (1875-1937) Ma Mère l’Oye, suíte para piano a quatro mãos, M. 62
10 – Pavane de la Belle au Bois Dormant: Lent
11 – Petit Poucet: Très modéré
12 – Laideronnette, Impératrice des Pagodes: Mouvement de Marche
13 – Les Entretiens de la Belle et de la Bête: Mouvement de Valse très modéré
14 – Le Jardin Féerique: Lent et Grave
Apesar das muitas décadas morando na Europa, de ser cidadã suíça há mais de cinquenta anos, e de ter criado filhas francófonas, Martha nunca deixou de ser argentina, tanto no passaporte, quanto, principalmente, na identidade cultural. Em seus frequentes retornos a seu país, faz breves turnês por cidades do interior, de Rosario a Córdoba, e de Salta a Tucumán, e colabora, sempre que pode, com músicos argentinos.
A colaboração mais marcante, com sobras, foi aquela que aconteceu durante o Festival Argerich, em sua Buenos Aires natal, em setembro de 2003. Na ocasião, Martha e a Camerata Bariloche acompanharam a voz mítica de Mercedes Sosa (1935-2009), que, já abalada pelos problemas de saúde que a calariam alguns anos depois, não deixou de lotar o Teatro Colón e transformar a escadaria da avenida Libertad numa cachoeira de lágrimas. A colaboração foi proposta por Martha, para a completa incredulidade de Mercedes, tesouro nacional argentino e lenda viva da música do continente, que achou estar a receber um trote:
De repente eu peguei o telefone e ouvi ‘sou Martha Argerich’ e eu não entendi nada. Perguntei: ‘Martha, é você mesma?’ A minha surpresa foi tanta que só consegui convidá-la para comer empanadas. Mas ela me disse: ‘quero que você cante comigo no Colón’. Eu pensei que era uma piada. Nunca imaginei… Meus planos iam até cantar com Mina ou com Carlos Santana… E foi a Martha quem me ofereceu isso. Apesar de conhecê-la há muitos anos, nunca imaginei que ela me chamaria para fazer algo juntas. Nunca, nunca… Ela interpreta Prokofiev e nunca se apresentou com um cantor popular. Tenho toda a coleção de Chopin da Martha, comprada na França. Agora vamos fazer juntas obras como ‘A canção da árvore do esquecimento’, de Alberto Ginastera. Isso é um sonho.”
Sonho é uma boa palavra, que também descreve a vontade minha, tiete apaixonado das duas, de virar um besouro para me embrenhar nas coxias do Colón naquela noite portenha de inverno. Para minha, e por certo também nossa alegria, se o único encontro entre La Diosa e La Negra nunca foi lançado em álbum, alguma boa alma fez-nos o favor de colocá-lo no YouTube.
MERCEDES SOSA Y MARTHA ARGERICH EN VIVO EN EL TEATRO COLÓN 1 – La tempranera (León Benarós) 00:00 2 – Como pájaros en el aire (Peteco Carabajal) 05:12
3 – El alazán (Atahualpa Yupanqui – Pablo del Cerro) 08:32 4 – Doña Ubensa (Chacho Echeñique) 13:15
5 – Allá lejos y hace tiempo (A. Tejada Gómez – Ariel Ramírez) 16:33 6 – Canción del árbol del olvido (F. Silva Valdés – A. Ginastera) 21:27 7 – Las cartas de Guadalupe (Félix.Luna – Ariel Ramirez) 23:44
8 – El alazán (Atahualpa Yupanqui – Pablo del Cerro) 27:05 9 – Alfonsina y el mar (Félix Luna – Ariel Ramirez) 31:47
Gravado ao vivo no Teatro Colón em Buenos Aires, Argentina, em 8 de setembro de 2003
Um expediente recorrente de Martha no novo milênio passou a ser o de fazer participações especiais em álbuns de jovens colegas, seus protegidos. É o caso deste, da pianista petersburguense Polina Leschenko, com quem Martha divide a saborosa transcrição da por si só deliciosa “Sinfonia Clássica” de seu xodó Prokofiev. Leschenko prossegue com boas companhias, entre as quais o legendário violinista romani Roby Lakatos, que a despeito do shape de cantor de churrascaria e de flertar com ambiências semelhantes às de André Rieu, é um instrumentista e improvisador monstruoso, dos maiores que estão presentemente a respirar nesta mesma atmosfera. Prova disso é a “Dança do Sabre” de Khachaturian que surge como surpresa após o “Vocalise” de Rachmaninov extinguir-se: pura doideira!
Sergey PROKOFIEV Sinfonia no. 1 em Ré maior, Op. 25, “Clássica”
Transcrição para dois pianos de Rikuya Terashima
1 – Allegro
2 – Larghetto
3 – Gavotta: Non troppo allegro
4 – Finale: Molto vivace
Polina Leschenko, piano II
Sonata para piano no. 7 em Si bemol maior, Op. 83 5 – Allegro inquieto
6 – Andante caloroso
7 – Precipitato
Polina Leschenko, piano
Sonata em Dó maior para violoncelo e piano, Op. 119
8 – Andante grave
9 – Moderato
10 – Allegro ma non troppo
Christian Poltéra, violoncelo
Polina Leschenko, piano
Pyotr Ilyich TCHAIKOVSKY (1840-1893)
De Souvenir d’un lieu cher, para violino e piano, Op. 42:
11 – No. 3: Mélodie
Sergey PROKOFIEV
De Lyubov k Tryom Apelsinam (“Amor das Três Laranjas”), Op. 33:
Arranjo para violino e piano de Jascha Heifetz (1901-1987)
12 – Marcha
Roby Lakatos, violino
Polina Leschenko, piano
Sergey Vasilyevich RACHMANINOFF (1873-1943)
Dos Quatorze Romances, Op. 34:
13 – No. 14: Vocalise (arranjo para piano, violino e violoncelo)
Polina Leschenko, piano
Roby Lakatos, violino
Christian Poltéra, violoncelo
BÔNUS – faixa oculta (após o Vocalise):
Aram KHACHATURIAN (1903-1978)
Arranjo para violino e piano de Roby Lakatos (1965) Dança do Sabre, do balé Gayane
Roby Lakatos, violino
Polina Leschenko, piano
Gravado em Bruxelas, Bélgica, março a abril de 2005
Da mesma maneira que colabora com jovens talentos, Martha empresta seu prestígio para impulsionar carreiras de contemporâneas sem muita projeção discográfica. Nascida no Uzbequistão soviético e educada no Conservatório de Moscou, Dora Schwarzberg imigrou para Israel para depois radicar-se em Nova York. Importante pedagoga, cuja aluna mais ilustre é a enfant terrible Patricia Kopatchinskaja, Dora começou a construir sua discografia depois que Martha colou nela e não mais a largou. Aqui, na estreia do duo em álbum próprio – pois já tinham gravado Schumann naquele pacotão que lhes alcancei na postagem passada – elas atravessam um repertório familiar a Martha, especialmente pela sonata de Franck, em que ela já acompanhou inúmeros pianistas, de Accardo a Perlman, passando por Gitlis e Kremer.
César-Auguste-Jean-Guillaume-Hubert FRANCK (1822-1890) Sonata em Lá maior para violino e piano 1 – Allegretto ben moderato
2 – Allegro
3 – Ben moderato: Recitativo-Fantasia
4 – Allegretto poco mosso
Claude-Achille DEBUSSY (1862-1918) Sonata em Sol menor para violino e piano
5 – Allegro vivo
6 – Intermède. Fantasque et léger
7 – Finale. Très animé
Robert SCHUMANN Fantasiestücke para violino e piano, Op. 73
8 – Zart und mit Ausdruck
9 – Lebhaft, leicht
10 – Rasch und mit Feuer
Martha dificilmente estará em território mais seguro que o de Schumann, seu grande amor de longuíssima data, e cujas composições seus dedos e temperamento tocam como ninguém. Poucas pessoas conseguem devorar o concerto de Robert como ela, que facilmente o toma como café da manhã, sem a menor taquicardia, nem derramar qualquer gotícula de suor. Martha, que o toca há setenta anos, nunca deixa de voltar a ele, como foi no caso da última vez que a ouvi ao vivo, ou como foi sob a batuta de outro grande schumanniano, Riccardo Chailly, na Gewandhaus da mesma Leipzig em que o compositor viveu tantos momentos fundamentais de sua breve existência. Esse registro é o meu preferido dela para essa obra, e recomendo fortemente aos que puderem assistir ao vídeo correspondente que observem o quão absoluto é o domínio de Martha sobre seu cavalo de batalha, e quão comovente é o contraste com o singelo bis (não incluso no CD) das Kinderszenen que ela toca no final.
Robert SCHUMANN
De Genoveva, ópera em quatro atos, Op. 81:
1 – Abertura
Concerto em Lá menor para piano e orquestra, Op. 54 2 – Allegro affettuoso
3 – Intermezzo: Andantino grazioso
4 – Allegro vivace
Martha reencontra Rabinovitch, e ambos reencontram Varsóvia – e a Rainha presta uma homenagem a seu mestre, Friedrich Gulda, dividindo o palco com dois dos filhos dele no concerto para três pianos de Mozart. A noite seguiu com um ótimo No. 1 de Shostakovich, uma das peças favoritas de Martha (e o verdugo dos pobres trompetistas escalados para acompanhá-la), e concluiu com uma ótima leitura de Rabinovitch para a Nona de Dmitri. Por algum motivo, talvez contingências de espaço, o Mozart não coube no álbum oficial lançado pelo Instituto Nacional Chopin de Varsóvia, mas eu dei um jeito de consegui-lo e oferecê-lo em separado.
Wolfgang Amadeus MOZART (1756-1791)
Concerto em Fá maior para três pianos e orquestra, K. 242, “Lodron” 1 – Allegro
2 – Adagio
3 – Rondo: Tempo di minuetto
Dmitri Dmitriyevich SHOSTAKOVICH (1906-1975) Concerto em Dó menor para piano, trompete e orquestra de cordas, Op. 35
1 – Allegro moderato – attacca:
2 – Lento – attacca:
3 – Moderato – attacca:
4 – Allegro con brio
5 – Allegro con brio (bis)
Jakub Waszczeniuk, trompete
Sinfonia no. 9 em Mi bemol maior, Op. 70
6 – Allegro
7 – Moderato
8 – Presto
9 – Largo
10 – Allegretto — Allegro
Gravado ao vivo em Varsóvia, Polônia, agosto de 2006
Nesta nova parceria com seu amigo letão menos hirsuto, gravada ao vivo na Grande Sala da Philharmonie de Berlim, Martha escolheu repertório familiar a ambos e, a partir dele, teceu um programa engenhoso. O álbum abre com a mais impetuosa das sonatas de Schumann, da qual o duo já nos legou uma das melhores gravações disponíveis, e prossegue com dois números solo. Com a cabeluda sonata para violino solo de Bartók, Kremer passa consideravelmente mais trabalho que Martha, que toca as Kinderszenen que já têm impregnadas no tálamo, e que são sua primeiríssima opção sempre que tem que – como sabemos, a contragosto – voltar sozinha ao palco. A dupla volta a reunir seus esforços para uma elétrica sonata no. 1 de Bartók, uma das especialidades de Gidon, após a qual surpreendentemente restam forças para oferecer os dois singelos bombons de Kreisler.
Robert SCHUMANN Sonata para violino e piano no. 2 em Ré menor, Op. 121
1 – Ziemlich langsam – Lebhaft
2 – Sehr lebhaft
3 – Leise, einfach
4 – Bewegt
Béla Viktor János BARTÓK (1881-1945) Sonata para violino solo, Sz. 117, BB 124 (1943-44)
5 – Tempo di ciaccona
6 – Fuga. Risoluto, non troppo vivo
7 – Melodia. Adagio
8 – Presto
Robert SCHUMANN
Kinderszenen, para piano, Op. 15 1 – Von fremden Ländern und Menschen
2 – Kuriose Geschichte
3 – Hasche-Mann
4 – Bittendes Kind
5 – Glückes genug
6 – Wichtige Begebenheit
7 – Träumerei
8 – Am Kamin
9 – Ritter vom Steckenpferd
10 – Fast zu ernst
11 – Fürchtenmachen
12 – Kind im Einschlummern
13 – Der Dichter spricht
Béla BARTÓK
Sonata para violino e piano no. 1, Sz. 75 14 – Allegro appassionato
15 – Adagio
16 – Allegro
Gravado ao vivo em Berlim, Alemanha, dezembro de 2006
O protagonista desde álbum, obviamente, é Vadim Repin e seu belo, nobre timbre que fazem do concerto de Beethoven uma delícia ainda maior de se ouvir, quanto mais sob a batuta de Riccardo Muti. Martha participa com uma de suas especialidades: ser a endiabrada pianista da “Kreutzer”, em contraste vivo com o som mais polido de Repin. O resultado – dir-se-ia um violino apolíneo e um teclado dionisíaco – é excelente e remete a gravações de outras duplas com o mesmo temperamento, como Oistrakh e Richter.
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827) Concerto em Ré maior para violino e orquestra, Op. 61
1 – Allegro ma non troppo
2 – Larghetto
3 – Rondo: Allegro
Vadim Repin, violino
Wiener Philharmoniker
Riccardo Muti, regência
Sonata para violino e piano em Lá maior, Op. 47, “Kreutzer”
4 – Adagio sostenuto – Presto
5 – Andante con variazioni
6 – Presto
Dmitri SHOSTAKOVICH Arranjo para violino e piano de Dmitri Tziganov (1903-1992) Dos Vinte e quatro prelúdios para piano, Op. 34 7 – No. 10 em Dó sustenido menor
Vadim Repin, violino
Gravado em Viena, Áustria, fevereiro de 2007 (concerto) e ao vivo em Lugano, Suíça, junho de 2007
Eis que Marthinha faz uma nova participação especial para dar novamente uma força (uma tremenda força) a um muito jovem colega. Pelo obscuro selo Dynamic, ela e o estiloso garoto Gabriele Baldocci – então com tenros dezoito anos – gravaram um recital de muito sumo e com repertório de vasto escopo, de Mozart a Shostakovich. Na Brazileira de Scaramouche, Milhaudcita (sem creditar) temas de Ernesto Nazareth, da mesma forma que fez, décadas antes, em Le Boeuf sur le Toit – também, avacalhadamente, sem crédito algum ao nosso gênio do Morro do Pinto.
Wolfgang Amadeus MOZART Sonata para dois pianos em Ré maior, K.448 (375a)
1 – Allegro con spirito
2 – Andante
3 – Allegro molto
Dmitri SHOSTAKOVICH
Concertino em Lá menor para dois pianos, Op. 94
4 – Adagio – Allegretto – Adagio – Allegro – Adagio – Allegretto
Sergei RACHMANINOFF Suíte para dois pianos no. 1 em Sol menor, “Fantaisie-Tableaux”, Op. 5
6 – Barcarolle
7 – La Nuit….L’Amour
8 – Les Larmes
9 – Pâques
Darius MILHAUD (1892-1974) Scaramouche, suíte para dois pianos, Op. 165b 10 – Vif
11 – Modéré
12 – Brazileira
Maurice RAVEL 13 – La Valse, poema coreográfico
Gabriele Baldocci, piano II
Gravado ao vivo em Livorno, Itália, fevereiro de 2008
O encerramento discográfico da década de Martha deu-se, como ocorrera na anterior, com Chopin. Num de seus muitos retornos a Varsóvia, ela apresentou a oferenda quase compulsória do concerto em Mi menor de Fryderyk, além de peças para violoncelo e piano na companhia de seu irmão quase siamês, Mischa Maisky. As gravações ao vivo resultantes foram realizadas no contexto do Festival “Chopin e sua Europa”, promovido pelo Instituto Nacional Fryderyk Chopin da capital polonesa, para o qual Marthinha e seus amiguinhos costumam ser arroz de festa.
Fryderyk Francyszek CHOPIN (1810-1849) Concerto para piano e orquestra no. 1 em Mi menor, Op. 11
1 – Allegro maestoso
2 – Romance. Larghetto
3 – Rondo. Vivace
Sinfonia Varsovia
Jacek Kaspszyk, regência
Sonata em Sol menor para violoncelo e piano, Op. 65
4 – Allegro moderato
5 – Scherzo
6 – Largo in B-flat major
7 – Finale. Allegro
Introdução e Polonaise Brilhante em Dó maior, para violoncelo e piano, Op. 3 8 – Introduction: Lento – Alla polacca: Allegro con spirito
A década de 90 foi, para Martha, desgraçadamente assombrada pela morte. Além de perder sua mãe, Juanita, e sua melhor amiga, Diane, para o câncer, ela própria viu-se acometida pelo flagelo. Desde o diagnóstico de melanoma, no início da década, até que a declararam curada, no final dela, a Rainha foi submetida a tratamentos dolorosos e duras escolhas. A mais difícil delas deu-se na recidiva, em meados da década, quando o tumor metastatizou para os pulmões e linfonodos. Foi-lhe sugerida uma cirurgia no tórax que poderia salvar a mulher, mas certamente mataria a pianista, cortando vários músculos fundamentais para sua arte. Martha escolheu submeter-se a um tratamento experimental a base de vacinas, que lhe permitiu uma operação menos radical. Deu certo e, num gesto de gratidão ao Instituto de Câncer John Wayne em Santa Mônica, Estados Unidos, onde recebeu o bem-sucedido tratamento, a Rainha voltou a subir sozinha ao palco, depois de quase vinte anos, para dar um recital em prol do Instituto para um Carnegie Hall lotado:
Naturalmente, a luta pela vida repercutiu na carreira de Martha. Sua discografia na década reflete essas imensas dificuldades pessoais – alguns anos passaram completamente em branco, sem gravações – e consolidou as tendências da década anterior: nenhum registro solo, muitas gravações de música de câmara com os velhos parceiros de sempre. Entre as novidades, a exploração de repertório novo e a colaboração estreita com Alexandre Rabinovitch em duos para piano, tocando sob sua regência, e gravando suas composições.
Não me lembro onde, mas tenho impressão de já ter lido que Martha não é muito fã de Rachmaninov. Se isso pode surpreender quem, como eu e o resto do Universo, fica de queixo caído com sua gravação do concerto no. 3 sob Chailly, também parece meio óbvio pela virtual ausência das peças solo de Rach do repertório da Rainha. Em seus recitais em duo, em compensação, Sergei Vasilyevich é figurinha fácil – e tem esse disco todinho dedicado a ele, com a primeira das muitas aparições de Alexandre Rabinovitch na discografia marthinhiana da década de 90, e a primeira das capas da Teldec em que nossa deusa parece estar no meio dum climão com quem era então su guapo.
Sergei Vasilyevich RACHMANINOFF (1873-1943) Suíte para dois pianos no. 1 em Sol menor, “Fantaisie-Tableaux”, Op. 5
1 – Barcarolle
2 – La Nuit….L’Amour
3 – Les Larmes
4 – Pâques
Suíte para dois pianos no. 2 em Dó maior, Op. 17
5 – Introduction
6 – Valse
7 – Romance
8 – Tarantella
Danças Sinfônicas, para orquestra, Op. 45
Transcrição para piano do próprio compositor
9 – Non allegro
10 – Andante con moto
11 – Lento assai
As composições de Alexandre Rabinovitch mereceriam uma postagem à parte, mas, enquanto eu os afogo com melífluas torrentes de Martha, deixo-lhes algumas amostras do que o pibe criou. Nascido e educado na União Soviética, aluno de Dmitry Kabalevsky, Rabinovitch destacou-se como pianista, tocando muita música contemporânea enquanto buscava rumo como compositor. Sua dedicação inicial à música serial, banida pelo regime soviético, foi abandonada depois que Alexei Lubimov lhe apresentou a música dos minimalistas dos Estados Unidos. Deixou o país de origem, por completa falta de perspectivas, para encontrar menos perspectivas ainda em Paris, onde Boulez reinava absoluto e deixava pouca coisa crescer a seu redor. Mudanças para Bruxelas e Genebra acabaram por colocá-lo no caminho de Martha Argerich, com quem dividiu palcos e estúdios, cigarros e dentifrícios – e que é o motivo maior para o moço aparecer por aqui. Sua música é muito interessante, sobretudo por nutrir-se de diversas referências, como poderão perceber pela obra que abre o álbum duplo a seguir, e porque seu estilo contrasta com a música “estática” que desinformados como eu muitas vezes esperam de obras minimalistas. A participação da Rainha na coletânea resume-se à gravação ao vivo da Musique Populaire, assim chamada por basear-se em temas de música popular, notória por ser, depois de meio século de vida e quase isso tanto a tocar pianos acústicos, sua primeira num instrumento plugado.
Alexandre RABINOVITCH Barakovsky (1945)
Six États Intermediaires (1998), sinfonia baseada no livro tibetano dos mortos, “Bardo Thödol” 1 – La Vie
2 – Le Rêve
3 – La Transe
4 – Le Moment de la Mort
5 – La Réalité
6 – L’Existence
Beogradska Filharmonija (Filarmônica de Belgrado)
Alexandre Rabinovitch, regência
7 – Musique Populaire (1980), para dois pianos amplificados
“Musique Populaire” gravada em Varsóvia, Polônia, abril de 1992
Num dos raros retornos a Varsóvia sem tocar Chopin, Martha não esqueceu de trazer a tiracolo seu amigo e vizinho inseparável, Mischa Maisky. A dupla ofereceu um programa inteiramente dedicado a Haydn, com o bônus de uma das poucas gravações lançadas da famosa sonatinha de Scarlatti que nossa deusa costuma tocar como bis – e como ninguém mais entre os terráqueos – para o pasmo das plateias mundo afora.
Joseph HAYDN (1732-1809) Concerto em Ré maior para piano e orquestra, Hob. XVIII:11
1 – Vivace
2 – Un poco adagio
3 – Rondo all’Ungarese: Allegro assai
Orkiestra Kameralna Polskiego Radia Amadeus
Agnieszka Duczmal, regência
Giuseppe Domenico SCARLATTI (1685-1757) Sonata em Ré menor, K. 141
4 – Allegro Joseph HAYDN
Concerto para violoncelo e orquestra no. 1 em Dó Maior, Hob. VIIb/1 5 – Moderato
6 – Adagio
7 – Allegro molto
Mischa Maisky, violoncelo
Orkiestra Kameralna Polskiego Radia Amadeus
Agnieszka Duczmal, regência
Johann Sebastian BACH (1685-1750)
Da Suíte para violoncelo no. 2 em Ré menor, BWV 1008 8 – Sarabande
Da Suíte para violoncelo no. 3 em Dó maior, BWV 1009 9-10 – Bourrée I & II
Da Suíte para violoncelo no. 5 em Dó menor, BWV 1011 11-12 – Sarabande
Mischa Maisky, violoncelo
Gravado ao vivo em Varsóvia, Polônia, abril de 1992
Para alguém que idolatrava Horowitz a ponto de se mudar de mala e cuia para Nova Iorque para tentar tornar-se sua aluna, é curioso que Scriabin, um dos xodós de Volodya, estivesse fora do repertório e da discografia de Martha até o lançamento desse álbum, dedicado integralmente a obras que tangem o mito de Prometeu. Acompanhada por Claudio Abbado e os filarmônicos de Berlim, a Rainha executa a parte de piano obbligato do “Poema do Fogo” de Scriabin, somando-se às forças orquestrais, a um coro e a uma iluminação colorida prescrita pelo compositor e originalmente destinada a um clavier à lumières inventado por ele. Apesar da baixa qualidade da imagem, vale a pena conferir o vídeo da performance para ter uma ideia aproximada do que tramou Alexander.
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827) Suíte de Die Geschöpfe Des Prometheus, Op. 43
1 – Introduction. Allegro non Troppo
2 – No. 1: Poco adagio – Allegro con brio
3 – No. 9: Adagio – Allegro molto
4 – No. 10: Pastorale. Allegro
5 – No. 14: Allegretto
6 – No. 15: Adagio – Allegro
7 – No. 16: Finale. Allegretto
Franz LISZT (1811-1886) Prometheus, poema sinfônico, S. 99
8 – Allegro energico ed adagio assai – Allegro molto appassionato
Aleksandr Nikolayevich SKRIABIN (1871-1915)
9 – Promethée, Le Poème du Feu, Op. 60
Martha Argerich, piano
Berliner Singakademie
Luigi NONO (1924-1990) Suíte de Prometeo, Tragedia dell’Ascolto
10 – 3 Voci (baseado em texto de Walter Benjamin)
11 – Isola Seconda (baseado em Hyperions Schicksalslied, de Friedrich Hölderlin)
Mathias Schadock e Ulrike Krumbiegel, narradores
Ingrid-Ade Jesemann e Monika Bair-Ivenz, sopranos
Susanne Otto, contralto
Peter Hall, tenor
Michael Hasel, flauta baixo
Manfred Preis, clarinete contrabaixo
Christhard Gössling, eufônio e tuba Solistenchor Freiburg
Peça final de seu triunfo no Concurso Chopin de 1965, o concerto em Mi menor do Frederico é uma das figurinhas mais fáceis na discografia e nos programas dos concertos de Martha mundo afora: difícil, enfim, é que ela volte a Varsóvia e deixe de tocá-lo. O CD a seguir registra um desses retornos, curiosamente pareado com Rossini e Mendelssohn, sob a batuta de Grzegorz Nowak, que mais tarde se tornaria regente associado da Royal Philharmonic em Londres, e com a Sinfonia Varsovia, orquestra fundada e apadrinhada pelo grande Yehudi Menuhin.
Gioachino Antonio ROSSINI (1792-1868) L’italiana in Algeri, drama jocoso em dois atos 1 – Sinfonia
Fryderyk Francyszek CHOPIN (1810-1849) Concerto para piano e orquestra no. 1 em Mi menor, Op. 11
2 – Allegro maestoso
3 – Romance. Larghetto
4 – Rondo. Vivace
Jakob Ludwig Felix MENDELSSOHN Bartholdy (1809-1847) Sinfonia no. 4 em Lá maior, Op. 90, “Italiana”
5 – Allegro vivace
6 – Andante con moto
7 – Con moto moderato
8 – Presto e finale: Saltarello
Sinfonia Varsovia
Grzegorz Nowak, regência
Gravado ao vivo em Varsóvia, Polônia, dezembro de 1992
O velho amigo Abbado, lá em 1992, devia estar afiadíssimo na difícil arte de persuadir a nada persuadível Martha a aprender novo repertório: depois do primeiro (e policromático) Scriabin da carreira da distinta senhora, Claudio a pôs para tocar seu primeiro Strauss. Vá lá que a Burleske, composta mais ou menos na época em que Richard atingiu a maioridade penal, seja fichinha para suas hábeis mãos, mas ainda sim deve-se notar sua proeza em dotar essa estranha cria concertística, renegada tanto pelo seu dedicatário, Hans von Bülow, quanto por muito tempo pelo próprio compositor, de um interesse que passa ao largo da maioria das gravações da obra.
Richard Georg STRAUSS (1864-1949)
1 – Don Juan, poema sinfônico, Op. 20
Toru Yasunaga, violino
2 – Burleske em Ré menor, para piano e orquestra
Martha Argerich, piano
3 – Till Eulenspiegels Lustige Streiche, poema sinfônico, Op. 28
Da ópera Der Rosenkavalier, Op. 59 4 – Ato III: Trio e Finale
Kathleen Battle e Renée Fleming, sopranos
Frederica von Stade, mezzo-soprano
Andreas Schmidt, barítono
Berliner Philharmoniker
Claudio Abbado, regência
Gravado em Berlim, Alemanha, em 31 de dezembro de 1992
Um xodó tardio na carreira de Martha é o primeiro concerto de Shosta, uma composição ebuliente e hiperativa, bem no estilo do nicotinado compositor e muito afeita a quem toca o terceiro de Prokofiev como ninguém. Sempre que volta à obra, a Rainha parece se divertir ao fazer um racha com o pobre solista de trompete, que invariavelmente passa por maus lençóis ao tentar acompanhar a velocidade lúbrica dos deditos de Marthinha, que, por sua vez, despacha a obra numa lepidez comparável à do próprio Shosta. Aqui, o trompetista sai-se muito bem – Guy Trouvon é feríssima, fruto mui digno da brilhante escola francesa de seu instrumento – e o registro resultante é um marco tanto na carreira de Martha quanto na discografia da obra, só superado pelo embate épico, de décadas depois, entre a deusa portenha do piano e Sergei Nakariakov, que é chamado de “Paganini do trompete” e não sem bons motivos.
Dmitri Dmitriyevich SHOSTAKOVICH (1906-1975) Concerto em Dó menor para piano, trompete e orquestra de cordas, Op. 35
1 – Allegro moderato – attacca:
2 – Lento – attacca:
3 – Moderato – attacca:
4 – Allegro con brio
Guy Touvron, trompete
Joseph HAYDN Concerto em Ré maior para piano e orquestra, Hob. XVIII:11
4 – Vivace
5 – Un poco adagio (cadenza: Wanda Landowska)
6 – Rondo all’Ungarese: Allegro assai
Esta gravação do inseparável duo Marthita/Nelsito traz aquela peça de resistência de seu repertório – a sensacional Sonata para dois pianos e percussão de Béla Viktor János – acrescida de composições de Ravel para dois pianos… e percussão. A atraente contribuição da carinhosamente chamada “cozinha” aos cordofones solistas foi acrescentada por Peter Sadlo (1962-2016), um tremendo percussionista que também participa desse registro de seus arranjos.
Béla Viktor János BARTÓK (1881-1945) Sonata para dois pianos e percussão, Sz. 110
1 – Assai lento – Allegro molto
2 – Lento, ma non troppo
3 – Allegro non troppo
Joseph Maurice RAVEL (1875-1937) Ma Mère l’Oye, suíte para piano a quatro mãos, M. 62
Transcrição para dois pianos: Gaston Choisnel (1857-1921)
Arranjo para dois pianos e percussão: Peter Sadlo (1962-2016)
4 – Pavane de la Belle au Bois Dormant: Lent
5 – Petit Poucet: Très modéré
6 – Laideronnette, Impératrice des Pagodes: Mouvement de Marche
7 – Les Entretiens de la Belle et de la Bête: Mouvement de Valse très modéré
8 – Le Jardin Féerique: Lent et Grave
Rapsodie Espagnole, para orquestra, M. 54
Transcrição para dois pianos do próprio compositor
Arranjo para dois pianos e percussão de Peter Sadlo
9 – Prélude à la Nuit. Modéré
10 – Malagueña. Assez vif
11 – Habanera. En demi-teinte et d’un rythme las
12 – Feria. Assez vif
Nelson Freire, piano II
Edgar Guggeis e Peter Sadlo, percussão
Gravado em Nijmegen, Países Baixos, fevereiro de 1993
Se há qualquer um entre vós outros que sonhou em ouvir Martha tocar algo que não fosse piano, eu ora anuncio com júbilo:
– Regozijai!
Em mais um álbum dedicado a obras de Rabinovitch, a Rainha não só toca celesta – tanto acústica quanto amplificada – como divide o palco possivelmente pela primeira vez com uma guitarra elétrica, além dum bocado de marimbas e vibrafones. Sua contribuição pianística e desplugada, a quatro mãos com o próprio compositor, é a Liebliches Lied (“Adorável Canção”), baseada em temas de Brahms e de Schubert (a cuja identificação desafio os atentos leitores-ouvintes).
Alexandre RABINOVITCH 1 – Incantations (1996)
Martha Argerich, piano amplificado e celesta
Daisuke Suzuki, guitarra elétrica
Hidemi Nurase, Mitsuyo Wada, Momoko Kamiya e Naoaki Kobayashi, marimbas e vibrafones Hibiki String Orchestra
Alexandre Rabinovitch, regência
2 – Schwanengesang an Apollo (1996)
Yayoi Toda, violino
Martha Argerich, celesta amplificada
Alexandre Rabinovitch, piano
3 – La Belle Musique no. 3 (1977) Budapesti Rádió Szimfonikus Zenekara (Orquestra Sinfônica da Rádio de Budapeste)
György Lehel, regência
4 – Liebliches Lied Alexandre Rabinovitch e Martha Argerich, piano
Gravado em Berna, Suíça, novembro de 1993 (Liebliches Lied) e em Tóquio, Japão, maio de 1998 (Incantations)
A integral das sonatas de Beethoven com Gidon Kremer foi retomada, duma forma surpreendemente ordeira para a carreira de nossa errática Marthinha, na exata ordem de publicação das obras. As três sonatas do Op. 30, em que os dois instrumentos ensaiam a igualdade de tratamento que receberão na “Kreutzer” e na Op. 96, são claramente conduzidas por ela, e dum jeito que nos faz imaginar, uma vez mais, o que ela teria sido capaz de ter feito se tivesse tocado, além de tão só esta, essa e aquela, algumas das outras vinte e nove sonatas para piano do renano.
Ludwig van BEETHOVEN Três sonatas para violino e piano, Op. 30
No. 1 em Lá maior
1 – Allegro
2 – Adagio molto espressivo
3 – Allegretto con variazioni
No. 2 em Dó menor
4 – Allegro con brio
5 – Adagio cantabile
6 – Scherzo: Allegro
7 – Finale: Allegro – Presto
No. 3 em Sol maior
8 – Allegro assai
9 – Tempo di minuetto, ma molto moderato e grazioso
10 – Allegro vivace
A julgar pela capa, as coisas andavam às mil maravilhas entre a pareja Martha & Alexandre durante a gravação desse álbum. O que nele se escuta corrobora a impressão: Rabinovitch é excelente pianista, muito bom intérprete de Mozart, e certamente ajudou a Rainha a sentir-se à vontade com este compositor que, a despeito da farta dose vienense de sua formação pianística, confessamente nunca foi muito seu chão.
Wolfgang Amadeus MOZART (1756-1791) Sonata para dois pianos em Ré maior, K.448 (375a)
1 – Allegro con spirito
2 – Andante
3 – Allegro molto
Andante e variações para piano a quatro mãos em Sol maior, K.501 4 – Andante – Variações I-V
Sonata para piano a quatro mãos em Dó maior, K.521
5 – Allegro
6 – Andante
7 – Allegretto
Sonata para piano a quatro mãos em Ré maior, K.381 (123a)
8 – Allegro
9 – Andante
10 – Allegro molto
Martha nunca foi muito de dar alegria aos completistas: só para ficar em Beethoven, levou a público apenas três entre as trinta e duas sonatas para piano, e gravou somente os três primeiros entre os cinco concertos (tocou o “Imperador” apenas duas vezes, e “mal”, e recusou-se a vida toda, e duma maneira quase fóbica, a aprender o concerto no. 4, em função duma epifania que experimentou ao ouvi-lo com Arrau, e arrepiar-se, aos seis anos de idade: “tenho medo do que aconteceria; é muito importante para mim”). Assim, é muito significativo que ela tenha se disposto a gravar, e de fato concluir, a integral das sonatas para violino ao lado do amigo Gidon Kremer. O disco final da série tem, na “Kreutzer”, tudo o que se pode esperar de temperamento argerichiano, embora o ponto alto para mim seja a tão subestimada Op. 96, escrita no limiar do período criativo transcendental do mestre de Bonn, em que o diálogo entre os instrumentos de Martha e Gidon transparece a mesma cumplicidade que suas caras preparadas na capa do álbum.
Ludwig van BEETHOVEN
Sonata para violino e piano em Lá, Op. 47, “Kreutzer”
1 – Adagio sostenuto – Presto
2 – Andante con variazioni
3 – Presto
Sonata para violino e piano em Sol maior, Op. 96 4 – Allegro moderato
5 – Adagio espressivo
6 – Scherzo: Allegro – Trio
7 – Poco allegretto
Falando em completistas, essa soirée schumanniana gravada por Martha e outras estrelas nos Países Baixos traz quase a integral da música de câmara de Robert Alexander para três ou mais instrumentos. No estrelado elenco, destaco Natalia Gutman, professora do Conservatório de Moscou, que, apesar de muito grata a seu professor Rostropovich, teve como maior mentor um pianista, o gigante Sviatoslav Richter, e se dá muito bem no dueto com Martha. Chamo a atenção também para o Op. 46, que nunca tinha ouvido antes, com sua incomum instrumentação para dois pianos, dois violoncelos e trompa (!), e para a maior obra-prima do álbum, o belíssimo quinteto com piano, ao qual Martha empresta decisivamente seu inigualável élan.
Robert Alexander SCHUMANN (1810-1856 Quinteto em Mi bemol maior para piano, dois violinos, viola e violoncelo, Op. 44
1 – Allegro brillante
2 – In modo d’una marcia (un poco largamente – agitato – a tempo)
3 – Scherzo (molto vivace) & trio
4 – Allegro ma non troppo
Andante e variações em Si bemol maior para dois pianos, dois violoncelos e trompa, Op.46 5 – Sostenuto – Andante espressivo – Un poco piu animato – Più animato – Più lento – Un poco più lento
6 – Più lento – Animato
7 – Doppio movimento – Tempo primo – Più adagio
Alexander Rabinovitch, piano II
Mischa Maisky e Natalla Gutman, violoncelos
Marie-Luise Neunecker, trompa
Quarteto em Mi bemol maior para violino, viola, violoncelo e piano, Op. 47
8 – Sostenuto assai- Allegro ma non troppo
9 – Scherzo (Molto vivace) & Trio
10 – Andante cantabile
11 – Finale (Vivace)
Dora Schwarzberg, violino
Nobuko Imai, viola
Natalia Gutman, violoncelo
Alexander Rabinovitch, piano
Fantasiestücke para violoncelo e piano, Op. 73
1 – Zart und mit Ausdruck
2 – Lebhaft, leicht
3 – Rasch und mit Feuer
Natalia Gutman, violoncelo
Adagio e Allegro em Lá bemol maior para trompa e piano, Op. 70
4 – Langsam, mit innigem Ausdruck
5 – Rasch und feurig
Marie-Luise Neunecker, trompa
Alexandre Rabinovitch, piano
Märchenbilder para viola e piano, Op. 113
6 – Nicht schnell
7 – Lebhaft
8 – Rasch
9 – Langsam, mit melancholischem Ausdruck
Nobuko Imai, viola
Sonata em Ré maior para violino e piano, Op. 121
10 – Zeimlich langsam – Lebhaft
11 – Sehr lebhaft
12 – Leise, einfach
13 – Bewegt
Dora Schwarzberg, violino
Gravado ao vivo em Nijmegen, Países Baixos, setembro de 1994
E dessa capa, o que acham vocês? Martha e Rabinovitch parecem não só num climão meio tenso, como também as últimas pessoas capazes de tocar Mozart em dueto. Felizmente, o álbum é bem melhor que a capa (afirmação quase sempre verdadeira, quando se trata da Teldec): Martha volta ao concerto no. 20, que tocou muitas vezes quando menina e garota, Rabinovitch toca e conduz o de no. 19, e os pombinhos voltam a se reunir no concerto para dois pianos. Seguirão a arrulhar juntos? Resposta no álbum seguinte.
Wolfgang Amadeus MOZART
Concerto para piano e orquestra no. 20 em Ré maior, K. 466 Cadenze: Ludwig van Beethoven
1 – Allegro
2 – Romance
3 – Allegro assai
Orchestra di Padova e del Veneto Alexandre Rabinovitch, regência
Concerto para piano e orquestra no. 19 em Fá maior, K. 459 Cadenze do próprio compositor
4 – Allegro
5 – Allegretto
6 – Allegro assai
Orchestra di Padova e del Veneto Alexandre Rabinovitch, piano e regência
Concerto em Mi bemol maior para dois pianos e orquestra, K. 365 Cadenze do próprio compositor
7 – Allegro
8 – Andante
9 – Rondo. Allegro
Württenbergisches Kammerorchestra Heilbronn
Alexandre Rabinovich, piano I e regência
Gravado em Stuttgart, Alemanha, janeiro de 1995 (K. 365) e em Pádua, Itália, setembro de 1998 (K. 459 e K. 466)
Sim: os pombinhos seguiram juntos e, a julgar pela capa, os tacapes pararam de voar numa certa casa em Genebra. Uma vez mais Martha arrisca repertório novo, e o que há neste disco é muito curioso. Esperava, admito, um pouco mais do “Aprendiz de Feiticeiro”, certamente por estar acostumado ao original e sua espirituosa orquestração, mas reconheço a competência do arranjo de Rabinovitch e a qualidade da execução, adequadamente temperamental. A grande surpresa, sem dúvidas, é o arranjo da “Sinfonia Doméstica” de Strauss, uma obra que nunca me despertou qualquer interesse na versão original, e que cintila sob os vinte talentosos dedinhos do casal. Se duvidam, ouçam a Wiegenlied (“Canção de Ninar”) e o Adagio e depois me contem se não estão entre as melhores coisas que Martha já tocou em duo!
Paul Abraham DUKAS (1865-1935)
Transcrição para dois pianos de Alexandre Rabinovitch
1 – L’Apprenti Sorcier
Richard STRAUSS Transcrição para dois pianos de Otto Singer (1863-1931) Symphonia Domestica, poema sinfônico, Op. 53 2 – Bewegt – Ⅰ. Thema: Sehr lebhaft – Ⅱ. Thema: Ruhig – Ⅲ. Thema
3 – Scherzo: Munter
4 – Wiegenlied: Mäßig langsam
5 – Adagio: Langsam
6 – Finale: Sehr lebhaft
Os quase três anos que separam este álbum do anterior tiveram, para Martha, o emblema do câncer que lhe voltou, que ela enfrentou, e do qual se curou. É bastante significativo, portanto, que, ao retomar sua discografia, ela tenha incorporado peças novas a seu repertório, escolhido a companhia segura de queridos parceiros de palco e da vida, e tocado ante uma plateia no Japão que ela tanto adora. As duas obras-primas incluídas no álbum – o segundo trio de Shostakovich e seu congênere, dedicado por Tchaikovsky à memória de Nikolai Rubinstein – receberam leituras inesquecíveis. Não tenho qualquer prurido em declarar essa interpretação do trio no. 2 de Shosta a melhor que já ouvi dessa obra, nem em reconhecer que o som ultrarromântico e sentimental de Mischa Maisky aqui se encaixa à perfeição com a melancolia da peça de Tchaikovsky, e que Martha e Kremer lhe somam à altura.
1 – Aplauso
Dmitri SHOSTAKOVICH Trio para piano, violino e violoncelo no. 2 em Mi menor, Op. 67
2 – Andante – Moderato – Poco più mosso
3 – Allegro con brio
4 – Largo
5 – Allegretto – Adagio
Pyotr TCHAIKOVSKY Trio em Lá menor para piano, violino e violoncelo, Op. 50
6 – Pezzo Elegiaco: Moderato assai – Allegro giusto – In tempo molto sostenuto – Adagio con duolo e ben sostenuto – Moderato assai – Allegro giusto
7 – Tema con variazioni: Andante con moto
8 – Variazione I
9 – Variazione II: Più mosso
10 -Variazione III: Allegro moderato
11 – Variazione IV: L’istesso tempo (Allegro moderato)
12 – Variazione V: L’istesso tempo
13 – Variazione VI: Tempo di valse
14 – Variazione VII: Allegro moderato
15 – Variazione VIII: Fuga (Allegro moderato)
16 – Variazione IX: Andante flebile, ma non tanto
17 – Variazione X: Tempo di mazurka
18 – Variazione XI: Moderato
19 – Variazione finale e coda: Allegro risoluto e con f
20 – Coda: Andante con moto – Lugubre
Peter KIESEWETTER (1945-2012)
21 – Tango Pathétique
Ao assinar com a EMI, Martha foi prontamente convidada a gravar com outra grande estrela da gravadora, o israelense Itzhak Perlman. A admiração entre ambos, sempre mútua e imensa, teve que esperar até o verão de 1998 para virar parceria nos palcos, durante o Festival de Saratoga Springs, nos Estados Unidos. O repertório não fugiu do habitual: a sonata de Franck, em que a Rainha já acompanhou tantos violinistas, e a “Kreutzer” de Beethoven, para a qual é difícil imaginar pianista melhor. O recital é uma deleite tão grande quanto devem ter sido seus bastidores: Martha é declaradamente viciada em conversar, que é sua droga favorita, e o bonachão Itzhak, com seu vozeirão de barítono, um tremendo contador de histórias.
Ludwig van BEETHOVEN
Sonata para violino e piano em Lá, Op. 47, “Kreutzer”
1 – Adagio sostenuto – Presto
2 – Andante con variazioni
3 – Presto
César-Auguste-Jean-Guillaume-Hubert FRANCK (1822-1890) Sonata em Lá maior para violino e piano 4 – Allegretto ben moderato
5 – Allegro
6 – Ben moderato: Recitativo-Fantasia
7 – Allegretto poco mosso
Itzhak Perlman, violino
Gravado ao vivo em Saratoga Springs, Estados Unidos, julho de 1998
A participação de Martha no Festival de Saratoga também incluiu uma parceria com sua alma gêmea, Nelson Freire, no Concerto Pathétique de Liszt, uma interessante peça para dois pianos que antecipa, em muitos aspectos, a revolucionária forma cíclica e mesmo algum material temático de sua obra-prima, a Sonata em Si menor. Antes dele, fez uma vigorosa leitura dos Contrastes de Bartók, tocando a parte que coube ao próprio compositor na primeira gravação da obra, acompanhada do excelente clarinetista Michael Collins e pela violinista Chantal Juillet, amiga de Martha e atual esposa de Charles Dutoit, ex-Don Argerich.
Zoltán KODÁLY (1882-1967) Duo para violino e violoncelo, Op. 7 1 – Allegro serioso, non troppo
2 – Adagio – Andante – Tempo I
3 – Maestoso e largamente, na non troppo lento – Presto
Chantal Juillet, violino
Truls Mørk, violoncelo
Béla BARTÓK
Contrasts, para violino, clarinete e piano, Sz. 111
4 – Verbunkos
5 – Pihenö
6 – Sebes
Chantal Juillet, violino
Michael Collins, clarinete
Franz LISZT
7 – Concerto Pathétique em Mi menor, para dois pianos e orquestra, S. 258
Nelson Freire, piano II
Gravado ao vivo em Saratoga Springs, Estados Unidos, julho de 1998
Se a instabilidade e o temperamento terrível de Martha sempre garantiram emoções fortes durante seus relacionamentos, tudo indica também que nossa Rainha é uma excelente ex-esposa. Prova disso é que que ela continua não só muito amiga de Charles Dutoit, com quem foi casada entre 1969 e 1973, como segue a gravar e tocar com ele (não sem faíscas, claro, algumas repletas de bom humor). Dutoit é ótimo regente e sabe, como talvez nenhum outro, envolver o indomável som de Martha com a orquestra. Seu período à frente da Sinfônica de Montreal foi um dos melhores de sua carreira e certamente o mais brilhante que esse conjunto já viveu, e acabou coroado com essa soberba gravação dos concertos de Chopin, na qual destaco aquele em Fá menor, que Martha tocou tão raras vezes, e que aqui recria com seu estilo inimitável, quase improvisatório, que torna sua leitura do Larghetto tão especial.
Fryderyk CHOPIN
Concerto para piano e orquestra no. 1 em Mi menor, Op. 11
1 – Allegro maestoso
2 – Romance. Larghetto
3 – Rondo. Vivace
Concerto para piano e orquestra no. 2 em Fá menor, Op. 21
4 – Maestoso
5 – Larghetto
6 – Allegro vivace
Orchestre Symphonique de Montréal
Charles Dutoit, regência
Entre os tantos discos que lhes trouxe para celebrar as idades de Marthinha, foi este o mais difícil de conseguir. Lançado somente no Japão, ele celebra a estreia do Festival Argerich na cidade de Beppu, uma estação termal localizada em Kyushu, a mais meridional das grandes ilhas do arquipélago japonês. O parceiro da Rainha no recital de abertura é o velho amigo Ivry Gitlis, e o programa – nenhuma surpresa – traz o tradicional combo Franck-Kreutzer. A surpresa genuína é o quanto Gitlis, um intérprete bastante idiossincrático (para dizer o mínimo) segura sua onda improvisatória na “Kreutzer”: se duvidam, comparem o registro de Beppu com esta outra gravação do duo que vocês me entenderão.
Ludwig van BEETHOVEN
Sonata para violino e piano em Lá maior, Op. 47, “Kreutzer”
1 – Adagio sostenuto – Presto
2 – Andante con variazioni
3 – Presto
César FRANCK Sonata em Lá maior para violino e piano 4 – Allegretto ben moderato
5 – Allegro
6 – Ben moderato: Recitativo-Fantasia
7 – Allegretto poco mosso
Ivry Gitlis, violino
Gravado em Beppu, Japão, novembro de 1998 (Beethoven) e novembro de 1999 (Franck)
Assim como o Japão, a Polônia é um dos locais a que Martha mais gosta de voltar. Não surpreende, pois, que ela tenha celebrado a notícia de sua cura, em 1999, com uma série de concertos em Varsóvia, cidade donde foi catapultada para a fama mundial mais de três décadas antes. Este CD, gravado ao vivo, registra uma das poucas noites em que Martha ofereceu dois concertos para piano no mesmo programa: antes de encerrar com seu tradicional cavalo de batalha, o primeiro concerto de Chopin, que ela nunca deixa de tocar quando volta à capital polonesa, a Rainha conduz a plateia por uma alucinante travessia do primeiro concerto de Liszt. La re putissima madre, Marthinha.
Wolfgang Amadeus MOZART
Sinfonia no. 35 em Ré maior, K. 385, “Haffner” 1 – Allegro con spirito
2 – Andante
3 – Menuetto
4 – Presto
Franz LISZT
Concerto para piano e orquestra nº 1 em Mi bemol maior, S.124 5 – Allegro maestoso
6 – Quasi adagio
7 – Allegretto vivace – Allegro animato
8 – Allegro marziale animato
Fryderyk CHOPIN Concerto para piano e orquestra no. 1 em Mi menor, Op. 11
9 – Allegro maestoso
10 – Romance. Larghetto
11 – Rondo. Vivace
Sinfonia Varsovia
Alexandre Rabinovitch, regência
Gravado ao vivo em Varsóvia, Polônia, maio de 1999
A sexta década da discografia de Martha encerrou em território amigo: tocando Schumann com o vizinho Mischa Maisky – que sempre cresce nas parcerias com sua vizinha – e fotografada para a capa pela caçula Stéphanie, responsável pela maior janela que já tivemos ao palácio interior de nossa Rainha. Este álbum bonito, ainda que sem grandes surpresas, é encerrado por uma ótima gravação do concerto de Robert por Maisky e pela Orpheus.
Robert SCHUMANN
Adagio e Allegro em Lá bemol menor para violoncelo e piano, Op. 70
1 – Langsam, mit innigem Ausdruck
2 – Rasch und feurig
Fantasiestücke para violoncelo e piano, Op. 73 3 – Zart und mit Ausdruck
4 – Lebhaft, leicht
5 – Rasch und mit Feuer
Dos Três Romanzen, Op. 94
6 – No. 1: Nicht schnell
Fünf Stücke im Volkston, Op. 102 7 – “Vanitas Vanitatum”, mit Humor
8 – Langsam
9 – Nicht schnell, mit viel Ton zu spielen
10 – Nicht zu rasch
11 – Stark und Markiert
De Märchenbilder, para viola e piano, Op. 113 Transcrição de Mischa Maisky para violoncelo e piano
12 – No. 1: Nicht schnell
Mischa Maisky, violoncelo
Concerto em Lá menor para violoncelo e orquestra, Op. 129
13 – Nicht zu schnell
14 – Langsam
15 – Sehr lebhaft
Martha chegou aos quarenta com a reputação consolidada: uma das maiores pianistas do seu tempo, um fenômeno que abarrotava todas as salas de concerto, e tão célebre pelos recitais que dava quanto por aqueles que cancelava. Sua aversão tanto à cultura do espetáculo quanto ao estrelato levou-a, ao longo da década, a evitar a imprensa e os holofotes. Pouco a pouco, também, trocou as aparições solo por colaborações com amigos que, como veríamos nas décadas seguintes, seriam mantidas por toda a vida. Isso, naturalmente, refletiu-se em seu legado discográfico nos anos 80: muitos duos, alguns concertos, apenas um (e derradeiro) álbum solo – e, o mais incrível, nenhum Chopin.
Um dos mais fieis escudeiros de Martha, o leto-israelense Mischa Maisky (1948) é tão próximo da Rainha que ela escolheu ser sua vizinha quando mudou-se para Bruxelas. Maisky é, claro, um ótimo violoncelista, mas tende sempre a romantizar bastante as coisas, embora sua vizinha, felizmente, quase sempre lhe sirva de antídoto aos excessos de sacarose. O arranjo para violoncelo da sonata de Franck – um dos xodós de Martha, que a gravou tantas vezes, sempre com parceiros diferentes – é muito atraente, e as obras de Debussy que fecham o disco me fazem lamentar, como já fizera quando comentei a gravação com Gitlis, que a Rainha não tenha gravado mais coisas do pai da Chouchou.
César-Auguste-Jean-Guillaume-Hubert FRANCK (1822-1890)
Arranjo de Jules Delsart (1844-1900) Sonata em Lá maior para violoncelo e piano 1 – Allegretto ben moderato
2 – Allegro
3 – Ben moderato: Recitativo-Fantasia
4 – Allegretto poco mosso
Claude-Achille DEBUSSY (1862-1918) Sonata em Ré menor para violoncelo e piano
5 – Prologue: Lent – Sostenuto e molto risoluto
6 – Sérénade et Final (Modérément animé – Animé)
La Plus que Lente, valsa para piano
Arranjo para violoncelo e piano de Mischa Maisky (1948)
7 – Molto rubato con morbidezza
Dos Prelúdios para piano, Livro I: 8 – No. 12: Minstrels: Modéré (arranjo de Mischa Maisky para violoncelo e piano)
Martha e Nelson Freire (1944-2021) eram amigos desde os tempos de estudantes em Viena. Sobretudo, e com o devido perdão pelo lugar-comum, eram almas gêmeas e o demonstravam sobejamente quando tocavam em duo. Eu jurava que este disco, que inaugurou a parceria deles em estúdios de gravação, já fazia parte do acervo do PQP Bach. Enganei-me: ele só foi, em verdade, citado pelo patrão numa outra postagem com os dois, em que ele contou de seu breve encontro com a deusa para um autógrafo em Porto Alegre, e da espirituosa mensagem que ela deixou em seu LP.
Sergey Vasilyevich RACHMANINOFF (1873-1943)
Suíte para dois pianos no. 2 em Dó maior, Op. 17 1 – Introduction
2 – Valse
3 – Romance
4 – Tarantella
Joseph Maurice RAVEL (1875-1937) La valse, Poème Chorégraphique pour Orchestre Transcrição para dois pianos do próprio compositor
5 – Mouvement de valse viénnoise
Witold Roman LUTOSŁAWSKI (1913-1994)
Variações sobre um tema de Paganini, para dois pianos 6 – Tema – Variações I-XII – Coda
Nelson Freire, piano
Gravado em La Chaux-de-Fonds, Suíça, em agosto de 1982
Grande amigo de Martha, o cipriota Nicolas Economou (1953-1993) certamente estaria a dividir os palcos com ela até hoje, não tivesse sucumbido jovem ao alcoolismo e, por fim, a uma desgraça automobilística. O destaque dessa gravação, a única que fizeram, é a hábil transcrição de Economou para a suíte de “O Quebra-Nozes” de Tchaikovsky, dedicada a Stéphanie e Semele, as caçulas da dupla.
Sergey RACHMANINOFF Danças Sinfônicas, Op. 45, para dois pianos
1 – Non allegro
2 – Andante con moto
3 – Lento assai – Allegro vivace – Lento assai. Come prima – Allegro vivace
Pyotr Ilyich TCHAIKOVSKY (1840-1893) Suíte do balé “O Quebra-Nozes”, Op. 71a
Transcrição para dois pianos de Nicolas Economou (1953-1993)
4 – Ouverture-miniature: Allegro giusto
5 – Danses Caractéristiques – Marche: Tempo di Marcia viva
6 – Danses Caractéristiques – Danse de la Fée Dragée: Andante non troppo
7 – Danses Caractéristiques – Danse Russe – Trépak: Tempo di Trepak, molto vivace
8 – Danses Caractéristiques – Danse Arabe: Allegretto
9 – Danses Caractéristiques – Danse Chinoise: Allegro moderato
10 – Danses Caractéristiques – Danse des Mirlitons: Moderato assai
11 – Valse Des Fleurs: Tempo de Valse
Nicolas Economou, piano
Gravado em Munique, Alemanha Ocidental, em março de 1983
Martha sequer completara quarenta e dois anos quando nos legou seu último registro solo em estúdio. Enfastiada do processo de gravação, e num resmungo crescente quanto a solidão nos recitais e sessões (e eu acho que sua expressão amuada na capa diz-lhes mais do que eu seria capaz de lhes contar), deixou-nos um Schumann emblemático antes de se calar para sempre como recitalista em discos. Horowitz, com quem ela quisera ter aulas, ficaria faceiro com a jamais-aluna se ouvisse a endiabrada “Kreisleriana” e as “Cenas Infantis” tocadas assim, com a verve e o colorido que lhe eram tão característicos.
Robert Alexander SCHUMANN (1810-1856) Kinderszenen, para piano, Op. 15 1 – Von fremden Ländern und Menschen
2 – Kuriose Geschichte
3 – Hasche-Mann
4 – Bittendes Kind
5 – Glückes genug
6 – Wichtige Begebenheit
7 – Träumerei
8 – Am Kamin
9 – Ritter vom Steckenpferd
10 – Fast zu ernst
11 – Fürchtenmachen
12 – Kind im Einschlummern
13 – Der Dichter spricht
Kreisleriana, Fantasias para piano, Op. 16 14 – Äußerst bewegt
15 – Sehr innig und nicht zu rasch
16 – Sehr aufgeregt
17 – Sehr langsam
18 – Sehr lebhaft
19 – Sehr langsam
20 – Sehr rasch
21 – Schnell und spielend
Gravado em Munique, Alemanha Ocidental, em abril de 1983
Beethoven é, confessadamente, o compositor favorito de Martha, mas, em vivo contraste com seu amado Schumann, não o gravou muito quanto diz gostar dele. Se ela não tivesse abandonado as gravações solo, talvez encarasse a empreitada de registrar algumas sonatas do renano, como sói acontecer com os pianistas em maturidade artística. Por outro lado, os dois primeiros concertos para piano de Ludwig, seus cavalos de batalha como compositor-pianista recém-chegado a Viena, são figurinhas fáceis nos concertos da Rainha e em suas gravações ao vivo. Essa aqui, com a orquestra do Concertgebouw sob o patriarca dos Järvi, é uma das melhores, à qual se segue uma bonita “Patética” de Tchaikovsky, conduzida por aquele discreto gigante que atendia por Antal Doráti.
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
Concerto para piano e orquestra no. 2 em Si bemol maior, Op. 19 1 – Allegro con brio
2 – Adagio
3 – Rondò. Molto allegro
Koninklijk Concertgebouworkest Neeme Järvi, regência
Gravado em Amsterdã, Países Baixos, em novembro de 1983
Pyotr TCHAIKOVSKY
Sinfonia no. 6 em Si menor, Op. 74, “Patética”
4 – Adagio – Allegro non troppo
5 – Allegro con grazia
6 – Allegro molto vivace
7 – Finale — Adagio lamentoso
Koninklijk Concertgebouworkest Antal Doráti, regência
Gravado em Amsterdã, Países Baixos, em novembro de 1983
Não é todo mundo que tem dois parças letões. Mas Martha não é todo mundo e tem, além de Mischa Maisky, um outro nativo de Riga como parceiro musical de toda vida. Gidon Kremer (1947) ganhou rápida notoriedade depois de deixar a União Soviética e, com imenso repertório e interpretações muito originais, transformou-se num queridinho de plateias e gravadoras. Gosto dele, apesar de não ser seu fã incondicional, mas, assim como acontece com Maisky, acho que Martha consegue lhe domar os arroubos mercuriais, de modo que as parcerias com ela estão entre suas melhores gravações. Este é o primeiro dos quatro discos com a integral das sonatas de Beethoven, e essas gravações das sonatas da juventude do renano deixam muito óbvio que os dois estão tão entrosados e à vontade quanto os vemos na capa do disco.
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827) Três sonatas para violino e piano, Op. 12
Sonata no. 1 em Ré maior 1 – Allegro con brio
2 – Tema con variazioni: Andante con moto
3 – Rondo: Allegro
Sonata no. 2 em Lá maior 4 – Allegro vivace
5 – Andante, più tosto allegretto
6 – Allegro piacevole
Sonata no. 3 em Mi bemol maior 7 – Allegro con spirito
8 – Adagio con molta espressione
9 – Rondo: Allegro molto
Gidon Kremer, violino
Gravado em Munique, Alemanha Ocidental, em novembro de 1984
Martha voltou a unir-se a Maisky para este registro das sonatas para gamba e cravo de Sebastião Ribeiro, e o resultado é surpreendente. Não pela qualidade dos intérpretes, que é notória – embora Martha aqui dome uma vez mais os esguichos de sacarose do vizinho -, e sim pelo quão convincentes estas sonatas soam sob mãos tão pouco barrocas. A transparência e clareza do Bach da Rainha permeiam toda a gravação, e acho Maisky perfeito, quase gambístico, nos movimentos rápidos da sonata em Sol menor.
Johann Sebastian BACH (1685-1750) Três sonatas para viola da gamba e cravo obbligato, BWV 1027-29
Sonata no. 1 em Sol maior, BWV 1027
1 – Adagio
2 – Allegro ma non tanto
3 – Andante
4 – Allegro moderato
Este disco pode ser descrito como uma “baguncinha entre amigos”: Martha trouxe Nelson e Mischa, e Kremer trouxe Isabelle van Keulen e Elena Bashkirova, sua ex-esposa e então recém-mãe dos dois filhos de Daniel Barenboim, que, por sua vez, ainda era casado com Jacqueline du Pré. Antes que isso vire a “Quadrilha” de Drummond, afirmo-lhes que o resultado é bem divertido: Martha e Nelson se esbaldam na idiomática escrita pianística de Saint-Saëns, Maisky aproveita a chance de confeitar o belíssimo Le Cygne, e Kremer e Bashkirova, alternando-se entre seus instrumentos e narração, trazem interesse às pouco gravadas peças que completam o disco (e se a história do touro Ferdinand lhes parecer familiar, certamente será porque vocês já a viram aqui)
Charles-Camille SAINT-SAËNS (1835-1921)
O Carnaval dos Animais, Grande Fantasia Zoológica 1 – Introdução e Marcha Real do Leão
2 – Galinhas e Galos
3 – Hémiones (asnos selvagens da Mongólia) – Animais velozes
4 – Tartarugas
5 – O Elefante
6 – Cangurus
7 – Aquário
8 – Personagens de orelhas compridas
9 – O cuco nas profundezas dos bosques
10 – Aviário
11 – Pianistas
12 – Fósseis
13 – O Cisne
14 – Final
Martha Argerich e Nelson Freire, pianos
Gidon Kremer e Isabelle van Keulen, violinos
Tabea Zimmermann, viola
Mischa Maisky, violoncelo
Georg Hörtnagel, contrabaixo
Irena Grafenauer, flauta
Eduard Brunner, clarinete
Edith Salmen-Weber, glockenspiel Markus Steckeler, xilofone
Alan RIDOUT (1934-1996), texto de Munro Leaf
15 – Ferdinand the Bull, para narrador e violino solo
Elena Bashkirova, narração
Gidon Kremer, violino
Frieder MESCHWITZ (1936) Tier-Gebete (“Preces dos Animais”), para narrador e piano Texto: “Prières Dans L’Arche”, de Carmen Bernos de Gasztold, traduzido para o alemão por A. Kassing e A. Stöcklei
16 – A Prece do Boi
17 – A Prece do Rato
18 – A Prece do Gato
19 – A Prece do Cão
20 – A Prece da Formiga
21 – A Prece do Elefante
22 – A Prece da Tartaruga
23 – A Prece da Girafa
24 – A Prece do Macaco
25 – A Prece do Galo
26 – A Prece do Velho Cavalo
27 – A Prece da Borboleta
Gidon Kremer, narração
Elena Bashkirova, piano
Alan RIDOUT, texto de David Delve 28 – Little Sad Sound
Gidon Kremer, narração
Alois Posch, contrabaixo
Gravado em Munique, Alemanha Ocidental, em abril de 1985
O segundo ato em disco da longa parceria entre Martha e nosso saudoso Nelson foi esta gravação da versão de concerto da sonata para dois pianos e percussão de Béla Viktor János, que a tocou pela primeira e única vez em público, com a esposa Ditta e sob a regência do compatriota Fritz Reiner, em sua última aparição como concertista, em 1943. Se Nelson e Martha nunca juntaram as escovas de dentes, a impressão que se tem ao escutar esse registro com a Concertgebouw sob o ótimo David Zinman é bem diferente: Ditta e Béla ficariam com inveja da liga que los sudamericanos dão ao originalíssimo tecido sonoro criado pelo magiar genial.
Béla Viktor János BARTÓK (1881-1945) Concerto para dois pianos, percussão e orquestra 1 – Assai lento – Allegro molto
2 – Lento, ma non troppo
3 – Allegro ma non troppo
Nelson Freire, piano II
Jan Labordus e Jan Pustjens, percussão
Zoltán KODÁLY (1882-1967)
4 – Danças de Galanta (Galántai táncok), para orquestra
Koninklijk Concertgebouworkest
David Zinman, regência
Gravado em Amsterdã, Países Baixos, em agosto de 1985
Martha devora aqui, como é costumeiro, aquele seu outro cavalo de batalha – o Concerto em Sol de Ravel – num disco dedicado a Maurice e ao israelense Gary Bertini (1927-2005), um ótimo regente que nos legou um excelente ciclo de sinfonias de Mahler – do qual vocês poderão ter boa ideia pelo capricho com que ele burila a sensacional segunda suíte de Daphnis et Chloé.
Maurice RAVEL
Suíte no. 2 do balé Daphnis et Chloé 1 – Lever du jour
2 – Pantomime 3 – Danse générale
Concerto para piano e orquestra em Sol maior 4 – Allegramente
5 – Adagio assai
6 – Presto
7 – La Valse, poema coreográfico para orquestra
Kölner Rundfunk-Sinfonie-Orchester
Gary Bertini, regência
Gravado ao vivo em Colônia, Alemanha Ocidental, em dezembro de 1985
Marthita e Danielito foram as duas mais famosas Wunderkinder portenhas nos anos 40. A emigração dos Barenboim para Israel e os diferentes rumos que os prodígios tomaram em suas carreiras fizeram com que se revissem e gravassem só já consagrados e maduros. Essa gravação de Noches em los Jardines de España é minha favorita, pelo que Martha traz de colorido e, surpreendentemente, de sobriedade à parte pianística, integrando seu piano à massa orquestral como se dela fosse só uma parte, e não a briosa solista de costume. Completa o disco um registro da mais efetiva das orquestrações da suíte Iberia de Albéniz, que, apesar de muitas belezas, não é muito minha praia, fã que sou do pianismo magistral da obra original.
Manuel de FALLA y Matheu (1876-1946) Noches en los Jardines de España, para piano e orquestra 1 – En el Generalife: Allegretto tranquillo e misterioso
2 – Dansa Lejana: Allegretto giusto – En los Jardines de la Sierra de Córdoba: Vivo
Isaac Manuel Francisco ALBÉNIZ y Pascual (1860-1909)
De Iberia, suíte para piano (orquestração de Enrique Fernández Arbós)
3 – Evocación
4 – El Puerto
5 – El Albaicin
6 – Fête-Dieu à Séville
7 – Triana
Em mais um álbum que reflete sua risonha capa, Martha e Kremer divertem-se em suas leituras dessas sonatas-irmãs de Beethoven, paridas em números de opus separados tão só por uma mundana questão de papel. O letão e a argentina, intérpretes tão originais quanto impulsivos, emprestam uma bem-vinda inquietude aos tantos gestos temperamentais de Ludwig, sempre o nervosinho. Acima de tudo, o que Martha faz desses discos instiga a imaginação, quando nela pomos a Rainha a tocar algumas das quase trinta sonatas do renano que jamais trouxe a público.
Ludwig van BEETHOVEN
Sonata em Lá menor para violino e piano, Op. 23
1 – Presto
2 – Andante scherzoso, più allegretto
3 – Allegro molto
Sonata em Fá maior para violino e piano, Op. 24, “Primavera” 4 – Allegro
5 – Adagio molto espressivo
6 – Scherzo: Allegro molto
7 – Rondo: Allegro ma non troppo
Mais Kremer, e ainda mais sorrisos. À curiosa escolha do repertório – dois concertos compostos por um Mendelssohn adolescente – soma-se a distinta companhia da Orpheus, uma orquestra de câmara notória por ser conduzida não por regentes, mas por seus próprios músicos, através dum original e participativo processo criativo. A Orpheus, que não é muito afeita a superestrelas, parece ter aberto uma exceção à turma de Martha (pois também gravou com Mischa Maisky), com bons resultados. Aqui, a temperamental dupla de solistas está quase irreconhecível em sua dedicação à transparência e ao equilíbrio clássico dessas peças que só surpreenderão quem desconhece o considerável compositor que Felix já era quando moleque.
Jakob Ludwig Felix MENDELSSOHN Bartholdy (1809-1847) Concerto para piano, violino e orquestra de cordas em Ré menor, MWV O4 1 – Allegro
2 – Adagio
3 – Allegro molto
Concerto para violino e orquestra de cordas em Ré menor, MWV O3 4 – Allegro
5 – Andante
6 – Allegro
O status de superestrela garantiu a Martha gravidade suficiente para atrair outros astros à sua órbita e promover festivais centrados em sua presença, como os de Beppu (Japão) e Lugano (Suíça), bem como em sua Buenos Aires natal. Aqui, ela é parte duma constelação granjeada por Gidon Kremer para o festival de Lockenhaus, na Áustria, capitaneado por ele. A participação de Martha resumir-se-ia ao duo que abre o disco, com a participação de Alexandre Rabinovitch (mais – mas MUITO mais – sobre ele em breve), mas resolvi encerrá-lo com uma breve peça de Kreisler tocada com o capitão Kremer, transplantada de outro disco. O recheio é muito, e muito bom Schubert, com destaque para dois pouco ouvidos trios.
Franz Peter SCHUBERT (1797-1828) Rondó em Ré maior para piano a quatro mãos, D. 608
1 – Allegretto
Martha Argerich e Alexandre Rabinovitch, piano
2 – 25 Winterreise, ciclo de canções sobre poemas de Wilhelm Müller, D. 911
Robert Holl, baixo
Oleg Maisenberg, piano
Trio em Mi bemol maior para piano, violino e violoncelo, D. 897, “Notturno”
26 – Adagio
Oleg Maisenberg, piano
Gidon Kremer, violino
Clemens Hagen, violoncelo
Trio em Si bemol maior para violino, viola e violoncelo, D. 581
27 – Allegro moderato
28 – Andante
29 – Menuetto: Allegretto
30 – Rondo: Allegretto
Natural de Baku, no Azerbaijão, mas educado na Rússia e radicado na Suíça, o pianista, compositor e regente Alexandre Rabinovitch será figurinha fácil na próxima década de vida artística de nossa Rainha. Nessa gravação, eles encaram a travessia da monumental suíte “Visões do Amém”, de Olivier Messiaen, composta durante a ocupação nazista da França (e depois de sua indesejável temporada em Görlitz) e destinada à interpretação do próprio compositor e de sua esposa, Yvonne Loriod. Messiaen criou as partes para piano especificamente para os temperamentos dos dois, destinando ao piano de Yvonne as “dificuldades rítmicas, os clusters, tudo que tem velocidade, charme e qualidade de som” e a seu próprio “a melodia principal, elementos temáticos, tudo o que demanda emoção e força”. A descrição de Yvonne lhes pareceu familiar? Pois escutem a gravação e me contem quem tocou a parte de Mme. Loriod.
Olivier Eugène Prosper Charles MESSIAEN (1908-1992) Visions de l’Amen, para dois pianos (1943)
1 – Amen de la Création
2- Amen des étoiles, de la planète à l’anneau
3 – Amen de l’agonie de Jésus
4 – Amen du Désir
5 – Amen des Anges, des Saints, du chant des oiseaux
6 – Amen du Jugement
7 – Amen de la Consommation
Alexandre Rabinovitch, piano II
Gravado em Londres, Reino Unido, em dezembro de 1989
Um de meus discos para uma ilha deserta: a maravilhosa gravação do Concerto em Sol de Ravel (1984), pareada com o no. 3 de Prokofiev. Duas das especialidades da Rainha, sob a batuta de um de seus bruxos, Claudio Abbado.
Numa outra empreitada com Gidon Kremer, gravada em 1985, Martha encara peças contemporâneas que, se já foram interpretadas com mais “sotaque”, são tão boas que sempre merecem a audição. Minha favorita entre as gravações desse álbum é a de Messiaen.
Dois cavalos de batalha argerichianos, interpretados com o brilho de sempre pela Rainha, a despeito do som orquestral cavernoso e pouco congenial (1985)
Minha gravação favorita das sonatas para violoncelo e piano de Beethoven deve quase tudo a Martha: foi seu brilho no finale daquela obra-prima, a sonata Op. 69, que primeiro me chamou a atenção para seu nome, quando eu era um garoto de poucos fios de barba a escutar a gravação, no mesmo 1990 em que foi lançada.
Nicolas Economou toca “Martha My Dear”, dos Beatles, para a própria, no início dos anos 80.
Martha chegou aos trinta anos com a carreira já consolidada, após o triunfo no VII Concurso Internacional Chopin. Baseada na Suíça Romanda e casada com o regente Charles Dutoit, via-se bastante requisitada pelos estúdios e em turnês pela Europa, Américas e Japão. Restava pouco tempo para a família que crescia: além da genebrina Lyda e da bernesa Anne-Catherine, filha de Dutoit, a década ainda veria o nascimento de outra menina, Stéphanie, fruto de seu breve relacionamento com o pianista Stephen Kovacevich – e que, após um frugal cara e coroa, recebeu o sobrenome da mãe.
Passaremos ao largo da colorida, dir-se-ia rocambolesca vida pessoal de nossa deusa, uma porque jamais conseguiríamos contá-la de maneira tão deliciosa quanto a do documentário que Stéphanie lhe dedicou, outra porque, no que tange ao nosso interesse maior, que é a grande música que faz a Rainha, sua década foi por demais prolífica para perdermos tempo com ninharias que envolvam fraldas e ruidosos compartilhamentos de lençóis.
Vamos, pois, à música:
A primeira gravação da quarta década de Martha inclui aquela que é, talvez, a mais sensacional leitura jamais feita da sonata de Liszt. Sei que muitos preferem a atenção ao detalhe à pirotecnia, mas, claramente inspirada no legendário registro de seu ídolo Horowitz, a Rainha aqui entrega puro frenesi. Muitas vezes vejo-me em saturação sensorial após ouvir essa sonata, mas sempre vale a pena. Completa o disco a sonata em Sol menor de Schumann, uma obra menos visitada desse compositor que é, confessadamente, o xodó da vovó.
Franz LISZT (1811-1886) Sonata para piano em Si menor, S. 178 1 – Lento assai – Allegro energico
2 – Grandioso
3 – Cantando espressivo
4 – Pesante – Recitativo
5 – Andante Sostenuto
6 – Quasi adagio
7 – Allegro energico
8 – Più mosso
9 – Cantando espressivo senza slentare
10 – Stretta quasi presto – Presto – Prestissimo
11 – Andante Sostenuto – Allegro Moderato – Lento Assai
Robert Alexander SCHUMANN (1810-1856) Sonata para piano no. 2 em Sol menor, Op. 22
12 – So rasch wie möglich
13 – Andantino
14 – Scherzo. Sehr rasch und markiert
15 – Satz: Rondo. Presto – Etwas langsamer – Prestissimo
Gravado em Munique, Alemanha Ocidental, em junho de 1971
É curioso que, numa discografia relativamente pequena como a de Martha, haja duas gravações tocando uma das quatro partes para piano da “cantata dançada” Les Noces, de Stravinsky. Nesta, que é a primeira delas, ela colabora com o então esposo, Charles Dutoit, e inaugura em disco a parceria com Nelson Freire, seu velho amigo desde os tempos de estudantes em Viena (a segunda gravação de Les Noces, sob Bernstein e na distinta companhia de Krystian Zimerman, já apareceu antes por aqui)
Igor Fyodorovich STRAVINSKY (1882-1971) Les Noces, Cenas Coreográficas com Música e Vozes
1 – La tresse
2 – Chez le Marié
3 – Le Départ de la Mariée
4 – Le Repas de Noces
Basia Retchitzka, soprano
Arlette Chedel, contralto
Eric Tappy, tenor
Philippe Huttenlocher, baixo
Chœur Universitaire de Lausanne
Michel Corboz, regente do coro
Harald Glamsch, Jean-Claude Forestier, Markus Ernst, Rafael Zambrano, Roland Manigley e Urs Herdi, percussão
Edward Auer, Nelson Freire e Suzanne Husson, pianos
Charles Dutoit, regência
Os raros registros seguintes, jamais lançados em mídia digital, são provavelmente os primeiros testemunhos de três vertentes que viriam a ter importância crescente na carreira da Rainha: sua participação em festivais, muitas vezes centrados nela; a colaboração com outros virtuoses em música de câmara; e as gravações ao vivo. Dignos de nota são os belíssimos quintetos com piano de Dvořák e de Schumann, em colaboração com Salvatore Accardo, diretor do Festival Internazionale di Musica d’Insieme, durante o qual foram feitas as gravações. Note-se também, ainda que sem a participação de Martha, a primeira gravação de que se tem registro do Quartettsatz, a única obra que Mahler deixou para um conjunto de câmara.
Antonín Leopold DVOŘÁK (1841-1904)
Quinteto para piano, dois violinos, viola e violoncelo em Lá maior, Op. 81
1 – Allegro, ma non tanto
2 – Dumka: Andante con moto
3 – Scherzo (Furiant): Molto vivace
4 – Finale: Allegro
Salvatore Accardo e Pierre Amoyal, violinos
Luigi Alberto Bianchi, viola
Klaus Kanngiesser, violoncelo
Robert SCHUMANN Quinteto para piano, dois violinos, viola e violoncelo em Mi bemol maior, Op. 44
1 – Allegro brillante
2 – In modo d’una marcia
3 – Scherzo: Molto vivace. Trio
4 – Allegro ma non troppo
Salvatore Accardo e Felice Cusano, violinos
Dino Asciolla, viola
Klaus Kanngiesser, violoncelo BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE
César-Auguste-Jean-Guillaume-Hubert FRANCK (1822-1890) Sonata em Lá maior para violino e piano 1 – Allegretto ben moderato
2 – Allegro
3 – Ben moderato: Recitativo-Fantasia
4 – Allegretto poco mosso
Salvatore Accardo, violino
Gustav MAHLER (1860-1911) Quartettsatz em Lá menor para piano, violino, viola e violoncelo 5 – Nicht zu schnell
Claude Levoix, piano
Salvatore Accardo, violino
Pasquale Pellegrino, viola
Klaus Kanngiesser, violoncelo
Evidente que não faltaria Chopin a essa década, e Martha capricha neste álbum: a sonata em Si bemol menor tem uma marcha fúnebre impressionante e o mais líquido e tempestuoso de todos seus finales. Completam o disco um scherzo – talvez o gênero na obra do polonês mais afeito à personalidade artística da Rainha – e uma Grande Polonaise realmente brilhante, antecedida dum Andante spianato tão delicado que a gente chega quase a duvidar de que os dedos que o fizeram foram os mesmos que causaram a torrente da faixa anterior.
Fryderyk Francyszek CHOPIN (1810-1849) Sonata para piano no. 2 em Si bemol maior, Op. 35
1 – Grave – Doppio movimento
2 – Scherzo
3 – Marche Funèbre. Lento
4 – Finale. Presto
Grande Polonaise Brillante para piano em Mi bemol maior, precedida de um Andante spianato, Op. 22
5 – Andante spianato: Tranquillo – Polonaise: Allegro molto
Scherzo para piano no. 2 em Si bemol menor, Op. 31
6 – Presto
Gravado em Munique, Alemanha Ocidental, em julho de 1974
Ravel é outro xodó a quem Martha dedicou gravações insuperáveis. Este é possivelmente o melhor Gaspard de la Nuit jamais gravado e, uma vez que se o escuta, torna-se impossível confundi-lo com qualquer outro: somente a Rainha, afinal, seria capaz de fazer um Scarbo tão veloz, soturno e grotesco (muito embora, como bem lembrou um amigo, Martha tenha declarado que quis morrer ao ouvir o produto dessa gravação, pois estava grávida e achou que tocara “muito devagar” (!))
Joseph Maurice RAVEL (1875-1937) Gaspard de la nuit, três poemas para piano após Aloysius Bertrand, M. 55 1 – Ondine
2 – Le gibet
3 – Scarbo
Sonatina para piano
4 – Modéré
5 – Mouvement de Menuet
6 – Animé
Valses Nobles et Sentimentales, para piano
7 – Modéré – Très franc
8 – Assez lent – Avec une expression intense
9 – Modéré
10 – Assez animé
11 – Presque lent – Dans un sentiment intime
12 – Vif
13 – Moins vif
14 – Epilogue. Lent
Gravado em Berlim Ocidental, Alemanha Ocidental, em novembro de 1974
Se foram os prelúdios que começaram a mudar a história de Martha no VII Concurso Internacional Chopin, aqui se tem uma ótima prova: o Op. 28, com suas miniaturas concisas e expressivas, é perfeitamente afeito ao toque da Rainha. A curiosa inclusão dos pouquíssimo gravados prelúdios Op. 45 e Op. póstumo sugere que esta gravação fizesse parte dos planos de uma integral chopiniana, que jamais foi adiante.
Fryderyk CHOPIN Vinte e quatro prelúdios para piano, Op. 28
1 – No. 1 em Dó maior: Agitato
2 -No. 2 em Lá menor: Lento
3 – No. 3 em So maior: Vivace
4 – No. 4 em Mi menor: Largo
5 – No. 5 em Ré maior: Molto allegro
6 – No. 6 em Si menor: Lento assai
7 – No. 7 em Lá maior: Andantino
8 – No. 8 em Fá sustenido menor: Molto agitato
9 – No. 9 em Mi maior: Largo
10 – No. 10 em Dó sustenido menor: Molto allegro
11 – No. 11 em Si maior: Vivace
12 – No. 12 em Sol sustenido menor: Presto
13 – No. 13 em Fá sustenido maior: Lento
14 – No. 14 em Mi bemol menor: Allegro
15 – No. 15 em Ré bemol maior: Sostenuto
16 – No. 16 em Si bemol menor: Presto con fuoco
17 – No. 17 em Lá bemol maior: Allegretto
18 – No. 18 em Fá menor: Molto allegro
19 – No. 19 em Mi bemol maior: Vivace
20 – No. 20 em Dó menor: Largo
21 – No. 21 em Si bemol maior: Cantabile
22 – No. 22 em Sol menor: Molto agitato
23 – No. 23 em Fá maior: Moderato
24 – No. 24 em Ré menor: Allegro appassionato
Prelúdio para piano em Dó sustenido menor, Op. 45
25 – Sostenuto
Prelúdio para piano em Lá bemol maior, Op. Posth.
26 – Presto con leggierezza
Gravado em Munique, Alemanha Ocidental, em outubro de 1975 (Op. 28) e Watford, Reino Unido, em fevereiro de 1977 (Op. 45, Op. Posth.)
O violinista israelo-francês Ivry Gitlis (1922-2020) foi amigo de Martha por mais de seis décadas e com ela tocou em muitos festivais, sobretudo a sonata de Franck. Esta é a única gravação que fizeram em estúdio e, embora eu não seja fã nem do timbre, nem do rubato de Gitlis, ela vale para imaginar o que a Rainha seria capaz de fazer se tocasse mais Debussy.
César FRANCK Sonata em Lá maior para violino e piano 1 – Allegretto ben moderato
2 – Allegro
3 – Ben moderato: Recitativo-Fantasia
4 – Allegretto poco mosso
Claude-Achille DEBUSSY (1862-1918) Sonata em Sol menor para violino e piano
5 – Allegro vivo
6 – Intermède. Fantasque et léger
7 – Finale. Très animé
Ainda que realizadas no final dos anos 70, estas gravações ao vivo naquele templo da perfeita acústica que é o Concertgebouw de Amsterdã foram lançadas somente em nosso século. Nelas pode-se apreciar uma parte do vasto repertório que a Rainha jamais trouxe aos estúdios e perceber que seu temperamento artístico em performances ao vivo é ainda mais ebuliente. Martha não teme correr riscos – poucos se animam a encarar o Gaspard de la Nuit ante uma plateia, ainda mais com tanta agilidade – e tampouco liga para as eventuais esbarradas. Se o Scherzo de Chopin certamente não é o seu melhor, as seleções de Bartók e Prokofiev seguramente estão entre seus mais sensacionais momentos. Ouvi-la in natura é, enfim, expor-se a um fenômeno da Natureza, sem abrigos, nem truques, e com absoluta certeza do estupor: já tive esse privilégio duas vezes, e ainda quererei tê-lo outra vez, enquanto a deusa quiser dar os ares de sua imensa graça num palco que eu possa visitar.
Johann Sebastian BACH (1685-1750) Partita no. 2 em Dó menor, BWV 826
1 – Sinfonia — Grave. Adagio
2 – Sinfonia – Andante
3 – Allemande
4 – Courante
5 – Sarabande
6 – Rondeau – Capriccio
Fryderyk CHOPIN Dos Dois noturnos para piano, Op. 48:
7 – No. 1 em Dó menor: Lento
Scherzo para piano no. 3 em Dó sustenido menor, Op. 39 8 – Presto con fuoco
Béla Viktor János BARTÓK (1881-1945) Sonata para piano, Sz. 80
9 – Allegro moderato
10 – Sostenuto e pesante
11 – Allegro molto
Alberto Evaristo GINASTERA (1916-1983) Danzas Argentinas, para piano, Op. 2 12 – Danza del Viejo Boyero
13 – Danza de la Moza Donosa
14 – Danza del Gaucho Matrero
Sergey Sergeyevich PROKOFIEV (1891-1953) Sonata para piano no. 7 em Si bemol maior, Op. 83 15 – Allegro inquieto — Andantino
16 – Andante caloroso
17 – Precipitato
Giuseppe Domenico SCARLATTI (1685-1757) Sonata em Ré menor, K. 141/L. 422 18 – Allegro
Johann Sebastian BACH
Da Suíte Inglesa no. 2 em Lá menor, BWV 807:
19 – Bourrée
Gravado em Amsterdã, Países Baixos em maio de 1978 (7-14, 18-19) e abril de 1979 (1-6, 15-17)
Se a Rainha tem os seus xodós musicais, ela também tem seus países favoritos. Um deles é a Polônia, onde venceu o concurso que lhe foi a catapulta para o superestrelato, e para a qual volta com muita frequência. Nessa gravação, ela se faz acompanhar da mesma orquestra com que tocou na fase final do VII Concurso Chopin, ainda que curiosamente passe ao largo das obras do polonês em prol de dois de seus outros cavalos de batalha: o concerto no. 1 de Tchaikovsky, do qual ela fez gravações famosas com Kondrashin e Dutoit, e o concerto de Schumann, que ela toca praticamente desde o ovo.
Pyotr Ilyich TCHAIKOVSKY (1840-1893) Concerto para piano e orquestra no. 1 em Si bemol menor, Op. 23 1 – Allegro non troppo e molto maestoso – Allegro con spirito
2 – Andantino semplice – Prestissimo – Tempo Ⅰ
3 – Allegro con fuoco
Robert SCHUMANN Concerto para piano e orquestra em Lá menor, Op. 54
4 – Allegro affetuoso
5 – Intermezzo. Andante grazioso – attacca:
6 – Allegro vivace
Orkiestra Filharmonii Narodowej w Warszawie
Kazimierz Kord, regência
Johann Sebastian Bach
Da Suíte Inglesa no. 2 em Lá menor, BWV 807: 7 – Bourrée
Fryderyk Chopin Das Três mazurcas para piano, Op. 63:
8 – No. 2 em Fá menor
Domenico SCARLATTI Sonata em Ré menor, K. 141/L. 422
9 – Allegro
Alberto Ginastera
Das Danzas argentinas, Op. 2
10 – No. 2: Danza de la Moza Donosa
Por fim, uma gravação pouco conhecida em que Martha não só nos encanta ao teclado, como também dirige a orquestra. Em seu único registro fonográfico como regente, o concerto de Haydn – o gênio que ela gravou tão pouco – com a London Sinfonietta é especialmente delicioso.
Ludwig van BEETHOVEN
Concerto para piano e orquestra no. 2 em Si bemol maior, Op. 19
1 – Allegro con brio
2 – Adagio
3 – Rondò. Molto allegro
Joseph HAYDN (1732-1809) Concerto para piano em Ré maior, Hob. ⅩⅧ-11 4 – Vivace
5 – Un poco adagio
6 – Rondo all’ungherese. Allegro assai London Sinfonietta
Nona Liddell, spalla
Martha Argerich, regência
Os conturbados anos sessenta foram um turbilhão para Martha. Depois dum breve período a morar sozinha, longe do jugo da mãe, a viver la vida loca em Viena, desiludiu-se com a carreira de concertista e cogitou de tudo, até estudar Medicina (!). Insegura sobre sua capacidade como artista, resolveu dar um tempo ao piano e mudou-se para Nova York.
Martha soube que sua gravação da Rapsódia Húngara no. 6 impressionara Volodya e achou que isso seria credencial bastante para tornar-se aluna do ídolo. Enganou-se: nunca se encontraram e, para desnortear ainda mais seus rumos, ela viu-se grávida de sua primeira filha, Lyda.
Depois de três anos sem tocar, Martha retornou ao piano. Seu objetivo é o Concurso Internacional Chopin, em Varsóvia, em 1965.
Logo na primeira etapa da competição, ficou óbvio que seu maior concorrente seria o brasileiro Arthur Moreira Lima, aluno do Conservatório de Moscou, que conquistou o público com suas interpretações e com sua semelhança física com o próprio Chopin, de quem se tornaria um dos mais distintos intérpretes. Arthur venceu a primeira etapa, Martha, as duas seguintes, e na grande final, com sua interpretação do concerto em Mi menor, ela acabou por conquistar o primeiro prêmio.
Ei-los
O resto, como dizem, é história.
ooOoo
A década de Martha, no entanto, começou numa posição até então inédita: a de camerista. Como nada em sua carreira indicara, até então, a importância que a música de câmara teria para os anos de sua maturidade, presumo que foram as prementes necessidades de juntar dinheiro e de afastar-se das saias de Juanita, sua mãe, que a levaram à União Soviética para duas apresentações em Leningrado (atual São Petersburgo). Ainda mais inusitado que o local foi seu parceiro de palco: o violinista Ruggiero Ricci (1918-2012), nascido Woodrow Wilson Rich (!) na Califórnia e, vinte e três anos mais velho que Martha, já mundialmente famoso. Quem não o soubesse percebê-lo-ia rapidamente pelo predomínio de peças repletas de pirotecnias para violino, algumas delas a dispensarem o piano – incluindo as cabeludíssimas variações de Paganini sobre “Nel cor non più me sento”, que estão entre as coisas mais difíceis jamais escritas para o instrumento. Exceto pelas duas sonatas do jovem Beethoven e por aquela de Franck – que ela viria a tocar com praticamente todo violinista com que fizesse duo -, o papel da Rainha resume-se a acompanhar o astro do arco em partes frugais, como a da peça de Sarasate ou a célebre sonata de Tartini. A dupla improvável, no entanto, deu liga tanto no palco quanto fora deles: Ricci não só seria seu amigo por toda longa vida (ei-los em 2009, nos noventa anos do mestre!), como também demonstrou inúmeras vezes orgulho de ter proporcionado à futura estrela seus primeiros passos fora da germanosfera.
1 – Anúncio (em russo)
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
Das Três sonatas para violino e piano, Op. 12: Sonata no. 3 em Mi bemol maior 2 – Allegro con spirito
3 – Adagio con molta espressione
4 – Rondo: Allegro molto
Sergey Sergeyevich PROKOFIEV (1891-1953) Sonata em Ré maior para violino solo, Op. 115 5 – Moderato
6 – Andante dolce. Tema con variazioni
7 – Con brio. Allegro precipitato
Béla Viktor János BARTÓK (1881-1945) Sonata em Ré maior para violino e piano sobre canções folclóricas da Transilvânia
Arranjo da sonatina para piano, Sz. 55 (1915) por André Gertler (1907-1998)
8 – Dudások (gaitas de foles). Allegretto
9 – Medvetánc (dança do urso). Moderato
10 – Finale. Allegro vivace
Sonata para violino solo, Sz. 117
11 – Tempo di ciaccona
12 – Fuga: Risoluto, non troppo vivo
13 – Melodia: Adagio
14 – Presto
Pablo Martín Melitón de SARASATE y Navascués (1844-1908) Introdução e tarantela para violino e piano, Op. 43
15 – Introduction: Moderato – Tarantella: Allegro vivace
Ruggiero Ricci, violino
Gravado ao vivo em Leningrado, União Soviética, em 21 de abril de 1961
Johann Sebastian BACH (1685-1750)
Da Partita para violino solo no. 2 em Ré menor, BWV 1004: 1 – Ciaconna
Ludwig van BEETHOVEN Das Três sonatas para violino e piano, Op. 12:
Sonata no. 1 em Ré maior 2 – Allegro con brio
3 – Tema con variazioni: Andante con moto
4 – Rondo: Allegro
César-Auguste-Jean-Guillaume-Hubert FRANCK (1822-1890) Sonata em Lá maior para violino e piano 5 – Allegretto ben moderato
6 – Allegro
7 – Ben moderato: Recitativo-Fantasia
8 – Allegretto poco mosso
Béla BARTÓK
Danças folclóricas romenas, para violino e piano
Transcrição do original para piano (Sz. 56) por Zoltán Székely (1903-2001)
9 – Jocul cu bâtă (Allegro moderato) – Brâul (Allegro) – Pe loc (Andante) – Buciumeana (Moderato) – Poarga Românească (Allegro) – Mărunțel
Niccolò PAGANINI (1782-1840)
10 – Introdução e variações sobre “Nel cor non più me sento”, de “L’amor contrastato”, de Giovanni Paisiello, para violino solo, Op. 38
Giuseppe TARTINI (1692-1770) Sonata para violino em Sol menor, “O Trilo do Diabo” (arranjo para violino e piano)
11 – Larghetto – Affettuoso
12 – Allegro
13 – Grave – Allegro assai
Gravado ao vivo em Leningrado, União Soviética, em 21 de abril de 1961
Tomo a liberdade de quebrar a ordem mormente cronológica dessa discografia para, com um salto de dezoito anos, mostrar-lhes o lugar especial que Ruggiero e Martha mantiveram na vida um do outro. Por ocasião do jubileu de ouro da carreira de Ricci, ele apresentou-se no mesmo Carnegie Hall em que estreara aos onze anos, e convidou a velha amiga – agora consagrada como a deusa maior do piano – para dividir o palco consigo. Em alusão, talvez, aos recitais de Leningrado, eles tocaram novamente a sonata de Franck e concluíram a colaboração com o arranjo para violino da bela sonata para flauta de Prokofiev, que Martha já gravara com James Galway. Como sobremesa, o sessentão Ruggiero serviu dois números cabeludos – a mais exigente das sonatas de Ysaÿe e as impressionantes variações de Paganini sobre o hino britânico – e encerrou a noite com uma refrescante gavota de Sebastião Ribeiro.
César FRANCK
1-4 – Sonata em Lá maior para violino e piano
Sergey PROKOFIEV Sonata em Ré maior para violino e piano, Op. 94a
5 – Moderato
6 – Scherzo: Presto
7 – Andante
8 – Allegro con brio
Eugène-Auguste YSAŸE (1858-1931) Das Seis sonatas para violino solo, Op. 27 9 – No. 3 em Ré menor, “Ballade”
Niccolò PAGANINI
10 – Variações sobre “God Save The King”, para violino solo, Op. 9
Johann Sebastian BACH
Da Partita para violino solo no. 3 em Mi maior, BWV 1006 11 – Gavotte en rondeau
Ruggiero Ricci, violino
Gravado ao vivo em Nova York, Estados Unidos, em 20 de outubro de 1979
Voltamos para a década de 60, e quase quatro anos depois de Martha voltar da turnê soviética com Ricci. Três deles foram passados completamente longe de qualquer teclado, boa parte deles em Nova York, tentando encontrar Horowitz e achar um novo rumo para sua vida, e outro bom naco desse tempo na Suíça, onde nasceria Lyda, sua primogênita. O entrevero entre nossa Rainha e seu instrumento – ou, mais acuradamente, entre ela e a vida de pianista – acabou graças à participação decisiva de Stefan Askenase, que lhe deu aulas e restituiu sua autoconfiança, e da esposa dele, Anny, que estimulou Marthinha a preparar-se para o Concurso Internacional Chopin de 1965. As Kinderszenen que abrem o upload seguinte, gravadas ao vivo em Colônia, são o primeiro registro de que se tem notícia da Rainha a tocar dessa coleção que lhe é tão cara que, hoje em dia, é praticamente a única coisa que ela toca sozinha no palco. Completam o arquivo um Gaspard de la Nuit despachado da costumeira e assombrosa maneira, aquela gravação do scherzo de Chopin que muitos de vocês já viram, feita para a televisão polonesa imediatamente após o triunfo no Concurso Chopin, e o primeiro registro de Martha a tocar aquele seu familiar cavalo de batalha, o terceiro concerto de Prokofiev.
Robert Alexander SCHUMANN (1810-1856)
1 – Kinderszenen, para piano, Op. 15
Joseph Maurice RAVEL (1875-1937) Gaspard de la nuit, três poemas para piano após Aloysius Bertrand), M. 55 2 – Ondine
3 – Le Gibet
4 – Scarbo
Gravado ao vivo em Colônia, Alemanha Ocidental, em 27 de janeiro de 1965
Fryderyk Francyszek CHOPIN (1810-1849)
5 – Scherzo para piano no. 3 em Dó sustenido menor, Op. 39
Gravado em Varsóvia, Polônia, em março de 1965
Sergey PROKOFIEV Concerto para piano e orquestra no. 3 em Dó maior, Op. 26 6 – Andante – Allegro
7 – Tema con variazioni
8 – Allegro ma non troppo
WDR Sinfonieorchester Köln
Karl Melles, regência
Gravado ao vivo em Colônia, Alemanha Ocidental, em 10 de dezembro de 1965
Apresento-lhes agora todas as gravações que consegui recolher da trajetória de Martha no VII Concurso Internacional Chopin, em 1965 (e, a despeito de muito vasculhar a cyberesfera, nunca encontrei o estudo do Op. 25 que dizem que ela tocou). Elas deixam óbvio por que nossa Rainha conquistou o júri, atacando o teclado com a fúria e a paixão habituais, sem medo de correr riscos (ao que abdicam muitos participantes de concursos pianísticos). O mais impressionante, talvez, é que não fosse a qualidade medíocre do som, poderíamos jurar que as performances são de anteontem, tamanha era a maturidade da artista, então com 23 anos, e tão espetacular que é sua técnica hoje, depois dos oitenta.
PRIMEIRA ETAPA – 22 de fevereiro de 1965
1 – Apresentação (em polonês)
Fryderyk CHOPIN
Dos Três noturnos para piano, Op. 15
2 – No. 1 em Fá maior
Dos Doze estudos para piano, Op. 10:
3 – No. 1 em Dó maior
4 – No. 4 em Dó sustenido menor
Polonaise para piano em Lá bemol maior, Op. 53, “Heroica” 5 – Maestoso
Dos Vinte e quatro prelúdios para piano, Op. 28
6 – No. 19 em Mi bemol maior
7 – No. 20 em Dó menor
8 – No. 21 em Si bemol maior
9 – No. 22 em Sol menor
10 – No. 23 em Fá maior
11 – No. 24 em Ré menor
Para a grande final, Arthur e Martha escolheram concertos diferentes – ambos, felizmente, lançados pela primeira vez numa remasterização decente, publicada pelo Instituto Fryderyk Chopin, e que ora lhes apresento, tanto para lembrar o triunfo da Rainha, como também para homenagear nosso compatriota, um magnífico chopinista. A título de curiosidade, aponto que quase todos os vencedores do Concurso tocaram na final o concerto em Mi menor – o último a triunfar com o concerto em Fá menor foi Đặng Thái Sơn em 1980, edição que se celebrizou pela intempestiva saída de nossa deusa do júri, em protesto à eliminação a seu ver injustificada de Ivo Pogorelić, a quem chamou de “gênio”.
Fryderyk CHOPIN
Concerto para piano e orquestra no. 1 em Mi menor, Op. 11
1 – Allegro maestoso
2 – Romance. Larghetto
3 – Rondo. Vivace
Martha Argerich, piano
Concerto para piano e orquestra no. 2 em Fá menor, Op. 21
4 – Maestoso
5 – Larghetto
6 – Allegro vivace
Arthur Moreira Lima, piano
Orkiestra Filharmonii Narodowej w Warszawie (Orquestra Filarmônica Nacional de Varsóvia) Witold Rowicki, regência
Gravações feitas ao vivo na Sala Filarmônica de Varsóvia, Polônia, durante o VII Concurso Internacional Fryderyk Chopin
Trailer do documentário “Martha Argerich in Warsaw 1965”, que aborda o marco zero do nascimento da superestrela. Notem a participação de Arthur Moreira Lima, um excelente artista que, convenhamos, teve pouca sorte de disputar a primazia na competição com uma das melhores pianistas de todos os tempos.
Programa original da participação de Martha no VII Concurso Internacional Chopin, em 1965. Notem que há diferenças entre o programa previsto e aquele realmente executado, mais notavelmente o concerto da etapa final.
Ao triunfo no Concurso Chopin só poderia, naturalmente, se seguir demanda por mais Chopin. A EMI agiu rápido e trouxe a Rainha a Londres, onde colocou a serviço de Sua Majestade Marthínhica seus ótimos estúdios e excelentes engenheiros de som. Para profunda decepção dos ingleses, no entanto, um contrato que se descobriu vigente com a Polygram impossibilitou o lançamento da gravação, que só veio a público em 1999. Como atesta o depoimento a seguir, de Suvi Raj Grubb, que produziu o álbum, a espera valeu a pena:
“’Argerich foi, entre todos músicos, a mais formidável que já encontramos’, escreve o produtor do álbum, Suvi Raj Grubb, ‘Nada estava fora do alcance dessa mulher’ (…)”
“Quando comecei a me interessar por música, levei algum tempo para me acostumar com o piano. Mas, quando entrei na EMI (agora Warner Classics), eu já adorava música para piano e tinha muito conhecimento sobre ela. Assim, sempre que um novo pianista aparecia, eu era a primeira escolha como produtor.”
“Em 1966, eu já produzira um punhado de discos de piano, um dos melhores dos quais nunca viu a luz do dia. Quando Martha Argerich entrou no estúdio, foram seus olhares sombrios e ardentes que me impressionaram pela primeira vez. Assim que chegou, pediu café; quando lhe ofereci uma xícara, ela a engoliu de uma só vez e pediu mais. Sentei-a no estúdio com um grande bule de café e entrei na sala de controle.”
“No início, suas mãos se moviam despreocupadamente sobre o teclado enquanto ela testava o piano. Então ela despejou a Polonaise [Op.53] de Chopin. Sentei-me na minha cadeira com um longo ‘Jee-sus’ – e o engenheiro de som disse ‘Uau!'”
“Se isso fora uma amostra de seu pianismo, então Argerich era a pianista mais formidável que já encontráramos. Os grandes acordes soaram enormes, as passagens entre eles, limpas; no trio, um grande espetáculo, as difíceis passagens em oitava à esquerda eram equilibradas, e o crescendo, controlado. Dei uma espiada no estúdio para ter certeza de que essa torrente de som era realmente originária do toque de uma garota sentada ao piano. Foi verdadeiramente inacreditável.”
“Sorri ao lembrar do comentário de Clara Schumann a Brahms sobre as ‘Variações Paganini’, lamentando que estivesse além da capacidade de uma pianista. Nada estaria fora do alcance daquela mulher.”
“Ela entrou na sala de controle, olhou para mim e sorriu, pois sabia que tivera um impacto devastador sobre mim. Nos dias seguintes, energizada por galões de café preto e forte, ela terminou um recital de Chopin que incluía a terceira sonata, o terceiro scherzo e, modelados como joias em miniatura, um grupo de mazurcas e noturnos. O último movimento da sonata foi feito num só take impecável. Ela disse que gostou das sessões; que gostou do som do piano no disco e que estava ansiosa para trabalhar comigo novamente.”
“Para minha amarga decepção, soubemos algumas semanas depois que seu compromisso com outra empresa não nos permitiria publicar o disco e, nem pela primeira nem pela última vez, desejei que não houvesse cláusulas de exclusividade. No devido tempo, um disco com o mesmo repertório foi lançado pelos nossos rivais – quando o ouvi, soube que nossa Argerich era a melhor das duas.”
Certeza de que era.
Fryderyk CHOPIN
Sonata para piano no. 3 em Si menor, Op. 58
1 – Allegro maestoso
2 – Scherzo: Molto vivace
3 – Largo
4 – Finale: Presto non tanto
Três mazurcas para piano, Op. 59 5 – No. 1 em Lá menor
6 – No. 2 em Lá bemol maior
7 – No. 3 em Fá sustenido menor
Dos Três noturnos para piano, Op. 15
8 – No. 1 em Fá maior
Scherzo para piano no. 3 em Dó sustenido menor, Op. 39 9 – Presto con fuoco
Polonaise para piano em Lá bemol maior, Op. 53, “Heroica” 10 – Maestoso
A alta demanda do planeta por sua nova superestrela do piano deu poucas oportunidades a Martha para ampliar seu repertório. Assim, às peças que ela preparara para o concurso Chopin, somaram-se aquelas que ela já aprendera antes de seus três anos sabáticos. O rol de obras resultante repete-se em quase todas as gravações até o final da década, que hemos de apresentar a seguir, e sem maiores comentários, que resultariam necessariamente repetitivos. Limitamo-nos a apontar, como adições mais notáveis ao repertório da Rainha, a impressionante Fantasia de seu queridinho Schumann, a toccata em Dó menor de J. S. Bach e, de Chopin, o outro queridinho, o segundo scherzo e a transcendental Polonaise-Fantaisie – além do já citado terceiro concerto de Prokofiev e dos primeiros concertos de Tchaikovsky e Liszt, já publicados anteriormente aqui no PQP Bach.
Sergey PROKOFIEV Sonata para piano no. 7 em Si bemol maior, Op. 83 1 – Allegro inquieto – Poco meno – Andantino
2 – Andante caloroso – Poco più animato – più largamente – Un poco agitato
3 – Precipitato
Franz LISZT (1811-1886)
Dos Três estudos de concerto para piano, S. 144:
4 – No. 2 em Fá menor, “La leggierezza”
Fryderyk CHOPIN
Dos Doze estudos para piano, Op. 10:
5 – No. 4 em Dó sustenido menor
Dos Três noturnos para piano, Op. 15
6 – No. 1 em Fá maior
Barcarola em Fá sustenido maior, Op. 60 7 – Allegretto
Três mazurcas para piano, Op. 59 8 – No. 1 em Lá menor
9 – No. 2 em Lá bemol maior
10 – No. 3 em Fá sustenido menor
Scherzo para piano no. 3 em Dó sustenido menor, Op. 39 11 – Presto con fuoco
Robert SCHUMANN Fantasia em Dó maior para piano, Op. 17 12 – Durchaus fantastisch und leidenschaftlich vorzutragen; Im Legenden-Ton
13 – Mäßig. Durchaus energisch
14 – Langsam getragen. Durchweg leise zu halten
Gravado ao vivo no Carnegie Hall, Nova York, Estados Unidos, em 16 de janeiro de 1966
Fryderyk CHOPIN 1-3 –Três mazurcas para piano, Op. 59
Sergey PROKOFIEV
4-6 – Sonata para piano no. 7 em Si bemol maior, Op. 83
Toccata para piano em Ré menor, Op. 11
7 – Allegro marcato
Maurice RAVEL
8-10 – Gaspard de la nuit, três poemas para piano após Aloysius Bertrand, M. 55
Sergey PROKOFIEV Sonata para piano no. 3 em Lá menor, Op. 28
11 – Allegro tempestoso – Moderato – Allegro tempestoso – Moderato – Più lento – Più animato – Allegro I – Poco più mosso
Maurice RAVEL
Sonatina para piano em Fá sustenido menor, M. 40 12 – Modéré
13 – Mouvement de Menuet
14 – Animé
Gravado em Colônia, Alemanha Ocidental, outubro de 1967
Os ebulientes concertos em Sol de Ravel e o no. 3 de Prokofiev, naquelas que são talvez suas gravações definitivas, sob a batuta de Claudio Abbado (1967)
Logo que ficou ficou óbvio que não haveria professores no Hemisfério Sul capazes de darem conta da pequena María Martha (porque eu tinha HOJE anos de idade quando descobri que Martha também é María), começaram as tratativas para que a niña precoz fosse estudar na Europa. A escolha de María era clara: queria ir para Viena estudar com Friedrich Gulda, um pianista brilhante que já granjeara fama de excêntrico e anticonvencional, e cujo antiacademicismo mui provocativo o tornava o mais improvável dos professores.
E isso tudo antes de adotar o visual que, a partir dos anos 70, fê-lo ser mimosamente comparado a um “cafetão sérvio”.
Como os Argerich não nadavam em recursos, a mãe de María resolveu tomar providências. A (assim a chamemos) mui assertiva Juanita, com quem Martha sempre teria uma relação complicada, resolveu as coisas com ninguém menos que Juan Domingo Perón. Nas palavras da filha:
Eu tinha pouco mais de 12 anos, tinha tocado no Teatro Colón e o Perón tinha me convidado para um encontro na residência presidencial. Mamãe perguntou se ela poderia vir comigo, e eles disseram que sim, é claro. Eu não era muito peronista; lembro-me que estava sempre colando pedacinhos de papel em todos os lugares que diziam “Balbín-Frondizi” [antiperonistas ferrenhos e candidatos da oposição às eleições de 1951]. Perón nos recebeu e me perguntou: “E para onde você quer ir, ñatita?” E eu queria ir para Viena, estudar com Friedrich Gulda. Ele gostou de eu não querer ir para os Estados Unidos. O mais engraçado foi que minha mãe, para bajulá-lo, disse a ele que eu adoraria fazer um show na UES [União dos Alunos do Ensino Médio]. E devo ter feito uma cara um tanto reveladora de que não gostei da ideia, pois o Perón começou a concordar com mamãe, dizendo “claro senhora, vamos organizar”, enquanto piscava para mim e, por baixo da mesa, fazia com um dedo que não. Ele estava contendo mamãe e isso me acalmou – percebeu que eu não queria. Fantástico, não é? E ele deu um emprego ao meu pai. Ele o nomeou adido econômico em Viena. E disse à mamãe que a achava também muito inteligente, empreendedora e capaz, e que conseguiu outro cargo para ela na embaixada.
Naqueles tempos, o que Perón mandava, o governo fazia: no ano seguinte, os Argerich deixariam Buenos Aires com mala e cuias, rumo a Viena e ao encontro de Gulda.
Martha e Gulda em Viena, sob o olhar atento do filho mais ilustre de Aracati, o grande Jacques Klein (à esquerda). Foto do acervo de Nelson Freire, disponibilizada pelo Instituto Piano Brasileiro.
Foram apenas dezoito meses de estudo, durante os quais Martha foi a única aluna de Gulda, um mestre apenas onze anos mais velho que ela e de ademais pouquíssimos alunos. Ainda que viesse a receber lições de outros pianistas (sobre os quais o colega Pleyel gentilmente versou no primeiro comentário dessa postagem), Gulda foi a mais decisiva influência na carreira de nossa Rainha. Ela, que sempre o idolatrou, frequentemente o cita em suas entrevistas. O austríaco, no entanto, não se impressionou com o estrelato posterior de sua aluna, aparentemente por achá-lo convencional demais para seus heterodoxos parâmetros. E a vida pessoal de Martha, também, parecia bater recordes mesmo para os caóticos padrões guldanianos: ao encontrá-la num camarim, décadas depois, depois de um recital, Gulda – que ficaria notório por divulgar a notícia de sua morte um ano antes de morrer de fato, e que intitulou seu concerto seguinte “Festa da Ressurreição” – tascou:
O que fizeste da tua vida???
O que fazer da vida é a preocupação de todas as ex-crianças prodígio, e Martha, egressa dos estudos com Gulda, não sabia o que fazer da. Estava longe da bajulação que tinha na Argentina, mas ainda controlada a cabresto pela mãe, e no coração dum continente onde saíam enxames de pianistas promissores debaixo de qualquer pedra que se levantasse. A saída mais óbvia eram as láureas em concursos de piano, e ela conseguiu duas em menos de um mês, em 1957: no Concurso Internacional Busoni em Bolzano (Itália), e no Concurso Internacional de Genebra (Suíça), o qual Gulda também vencera com 16 anos.
Enquanto botava as manguinhas de fora para morar sozinha, Martha excursionava extensamente pelo continente e, antes dos vinte anos, fez sua estreia discográfica oficial pela prestigiosa Deutsche Grammophon, ostentando na capa os cabelos cacheados e o olhar tristonho típicos daquela década:
MARTHA ARGERICH – PIANO
Fryderyk Francyszek CHOPIN (1810-1849)
Scherzo para piano no. 3 em Dó sustenido menor, Op. 39
1 – Presto con fuoco
Johannes BRAHMS (1833-1897) Duas rapsódias para piano, Op. 79
2 – Agitato, em Si menor
3 – Molto passionato, ma non troppo allegro, em Sol menor
Sergey Sergeyevich PROKOFIEV (1891-1953) Toccata para piano em Ré menor, Op. 11 4 – Allegro marcato
Joseph Maurice RAVEL (1875-1937) Jeux d’eau, para piano, M. 30
5 – Très doux
Fryderyk CHOPIN Barcarola em Fá sustenido maior para piano, Op. 60 6 – Allegretto
Franz LISZT Rapsódia Húngara no. 6 em Ré bemol maior, para piano, S. 244 7 – Introduction (Tempo giusto – Presto) – Lassan (Andante) – Friska (Allegro)
Gravado em Hannover, Alemanha Ocidental, de 4 a 8 de julho de 1960
A relação da promissora jovem com seu instrumento, enfim, sempre tivera profundas rachaduras e muito poucas alegrias. Num dos trechos mais tocantes do documentário assinado por sua filha, Stéphanie, Martha está a olhar álbuns da infância e estimar sua idade nas fotos pela presença do sorriso – sinal de que o piano ainda não entrara em sua vida.
Esse difícil período de transição entre ex-criança prodígio e superestrela do teclado será ilustrado pelas gravações seguintes, que mostram nossa Rainha como uma artista consumada antes mesmo de completar 20 anos. Em diversos registros ao vivo de qualidade variável, principalmente para rádios alemãs, são óbvias as qualidades que até hoje, mais de sessenta anos depois, nos deixam boquiabertos. Perceba-se também que, com a notável exceção de Mozart, cujo espaço diminuiria um tanto em seu repertório na maturidade, já estava escalado o time de compositores a que ela mais se dedicaria: Beethoven; Chopin e Schumann; Prokofiev e Ravel.
Como o sucesso universal de Martha, sobretudo após o triunfo do Concurso Internacional Chopin de 1965, reavivou o interesse em suas gravações antigas, elas acabaram relançadas num sem-número de discos, sempre com os mesmos fonogramas, em ordens sortidas. Para facilitar a vida dos leitores-ouvintes, resolvi fazer uma compilação das melhores fontes disponíveis e organizá-las em ordem cronológica, com a exceção de dois álbuns com orquestra, que virão na sequência
Fryderyk CHOPIN
Dos Doze estudos para piano, Op. 10:
1 – No. 1 em Dó maior Gravado em 1955 em Buenos Aires
Franz LISZT Dos Três estudos de concerto, S. 144: 2 – No. 2: La Leggerezza Gravado ao vivo em Bolzano, Itália, agosto de 1957, durante o Concurso Internacional Busoni
Sergey PROKOFIEV Toccata para piano em Ré menor, Op. 11 3 – Allegro marcato Gravada ao vivo em Bolzano, Itália, agosto de 1957, durante o Concurso Internacional Busoni
Franz LISZT Rapsódia Húngara no. 6 em Ré bemol maior, para piano, S. 244 4 – Introduction (Tempo giusto – Presto) – Lassan (Andante) – Friska (Allegro) Gravada ao vivo em Genebra, Suíça, setembro de 1957, durante o Concurso Internacional de Genebra
Robert Alexander SCHUMANN (1810-1956)
Do Concerto para piano e orquestra em Lá menor, Op. 54: 5 – Allegro affettuoso
Orchestre de la Suisse Romande Samuel Baud-Bovy, regência Gravado ao vivo em Genebra, Suíça, setembro de 1957, durante o Concurso Internacional de Genebra
Fryderyk CHOPIN Balada para piano no. 1 em Sol menor, Op. 23 6 – Largo – Lento – Moderato – Presto in coda Gravada em Berlim Ocidental, janeiro de 1959
Wolfgang Amadeus MOZART (1756-1791) Sonata para piano no. 18 em Ré maior, K. 576 7 – Allegro
8 – Andante cantabile
9 – Allegretto grazioso
Gravada em Colônia, Alemanha Ocidental, janeiro de 1960
Fryderyk CHOPIN
Balada para piano no. 4 em Fá menor, Op. 52 10 – Andante con moto Gravada em Colônia, Alemanha Ocidental, janeiro de 1960
Joseph Maurice RAVEL (1875-1937) Gaspard de la Nuit, três poemas para piano após Aloysius Bertrand, M. 55
1 – Ondine
2 – Le Gibet
3 – Scarbo
Sergey PROKOFIEV Toccata para piano em Ré menor, Op. 11 4 – Allegro marcato
Sonata para piano no. 3 em Lá menor, Op. 28 5 – Allegro tempestoso – Moderato – Allegro tempestoso – Moderato – Più lento – Più animato – Allegro I – Poco più mosso
Sonata para piano no. 7 em Si bemol maior, Op. 83 6 – Allegro inquieto
7 – Andante caloroso
8 – Precipitato
Gravados em Hamburgo, Alemanha Ocidental, março de 1960
Wolfgang Amadeus MOZART
Sonata para piano no. 8 em Lá menor, K. 310 9 – Allegro maestoso
10 – Andante cantabile con espressione
11 – Presto Gravada em Munique, Alemanha Ocidental, abril de 1960
Wolfgang Amadeus MOZART
Sonata para piano no. 13 em Si bemol maior, K. 333, “Linz” 1 – Allegro
2 – Andante cantabile
3 – Allegretto grazioso
Gravada em Munique, Alemanha Ocidental, abril de 1960
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
Das Três sonatas para piano, Op. 10: No. 3 em Ré maior
4 – Presto
5 – Largo e Mesto
6 – Menuetto. Allegro
7 – Rondo. Allegro
Maurice RAVEL
Sonatina para piano em Fá sustenido menor, M. 40 8 – Modéré
9 – Mouvement de Menuet
10 – Animé
Robert SCHUMANN Toccata em Dó maior para piano, Op. 7
11 – Allegro
Wolfgang Amadeus MOZART Sonata para piano no. 18 em Ré maior, K. 576 12 – Allegro
13 – Andante cantabile
14 – Allegretto grazioso
Gravadas em Colônia, Alemanha Ocidental, setembro de 1960
Completam a discografia da segunda década de Marthinha esses dois álbuns com gravações ao vivo, feitas durante transmissões radiofônicas. O primeiro é notório tanto por conter os mais antigos registros de nossa deusa tocando dois de seus mais famosos cavalos de batalha- o Concerto em Sol de Ravel e o Mi menor de Chopin – quanto por marcar a primeira parceria dela com seu amigo de toda a vida e futuro marido, Charles Dutoit, que a acompanha no Ravel. O segundo, feito com orquestras alemãs, alinha o concerto de Ravel com o no. 21 de Mozart, que Martha tocou muito em sua juventude e, parece, abandonou na maturidade. Maurice RAVEL Concerto em Sol maior para piano e orquestra, M. 83
1 – Allegramente
2 – Allegro assai
3 – Presto
Orchestre de Chambre de Lausanne
Charles Dutoit, regência
Gravado em Lausanne, Suíça, em 19 de janeiro de 1959
Fryderyk CHOPIN
Concerto para piano e orquestra no. 1 em Mi menor, Op. 11 4 – Allegro maestoso
5 – Romanze – Larghetto
6 – Rondo – Vivace
Orchestre de la Suisse Romande
Louis Martin, regência
Gravado em Genebra, Suíça, em 25 de setembro de 1959
Maurice RAVEL 1 – 3 Concerto em Sol maior para piano e orquestra, M. 83 Südwestfunk-Sinfonieorchester Baden-Baden
Ernest Bour, regência
Gravado em Baden-Baden, Alemanha Ocidental, em 4 de fevereiro de 1960
Wolfgang Amadeus MOZART Concerto para piano e orquestra no. 21 em Dó maior, K. 467 4 – Allegro maestoso
5 – Andante
6 – Allegro vivace assai
Kölner Rundfunk-Sinfonieorchester
Peter Maag, regência
Marthinha, nossa Rainha, começou a tocar piano aos três anos.
Três anos!
Ela foi tão escandalosamente bem que, ao cinco, arranjaram-lhe aulas com o mais famoso professor de Buenos Aires, o calabrês Scaramuzza.
Cinco anos!
Scaramuzza era austero e feroz, mas bom pedagogo, e alguns anos sob sua tutela foram bastantes para que a menina virasse, juntamente com o garoto Daniel, a mais célebre Wunderkind portenha. Daí para que ela estreasse nos palcos foi um tapinha:
Programa da estreia de Marthita sob a regência de seu professor, Scaramuzza, em setembro de 1949. Notem que, a despeito dela ter completado oito anos em junho, atribuem-lhe sete anos.
Seus programas, além do concerto em Ré menor de Mozart, incluíam duas obras que seriam pedras angulares de seu repertório: o concerto no. 1 de Beethoven, e o concerto em Lá menor de Schumann – exatamente aqueles que, pelo resto da vida, seriam seus compositores favoritos. As gravações a seguir, restauradas a partir de registros de rádios argentinas, mostram a pequena notável já em grande forma, devorando os concertos com a naturalidade que lhe é tão peculiar.
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827) Concerto para piano e orquestra no. 1 em Dó maior, Op. 15
1 – Allegro con brio
2 – Largo
3 – Rondo: Allegro
Martha Argerich, piano (aos oito anos) Orquesta Sinfónica de Radio El Mundo Alberto Castellanos, regência
Robert Alexander SCHUMANN (1810-1856) Concerto em Lá menor para piano e orquestra, Op. 54
4 – Allegro affettuoso
5 – Intermezzo: Andantino grazioso
6 – Allegro vivace
Johann Sebastian BACH (1685-1750)
Da Toccata em Sol maior, BWV 916: 7 – Presto
Jakob Ludwig Felix MENDELSSOHN Bartholdy (1809-1847)
Dos Três Caprichos para piano, Op. 33: 8 – No. 1 em Lá menor
Martha Argerich, piano (aos onze anos) Orquesta Sinfónica de la Ciudad de Buenos Aires Washington Castro, regência
BÔNUS: o concerto em Ré menor de Mozart, numa transmissão radiofônica cujo locutor, curiosamente, atribui sete anos à solista de oito (o que, obviamente, não diminui meu pasmo com a precocidade de nossa Rainha)
1 – Introdução em espanhol (excerto)
Wolfgang Amadeus MOZART (1756-1791) Concerto para piano e orquestra no. 20 em Ré maior, K. 466
2 – Allegro
3 – Romanze
4 – Rondo: Allegro assai
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827) Concerto para piano e orquestra no. 1 em Dó maior, Op. 15 4 – Allegro con brio
5 – Largo
6 – Rondo: Allegro
Martha Argerich, piano (aos oito anos) Gran Orquesta Clásica de LR1 Alberto Castellanos, regência
Um maravilhoso álbum triplo cheio de música de câmara romântica de primeira linha. Mudando constantemente da exuberância mais impulsiva para a meditação mais contida, da paixão mais intensa para a ternura mais inocente, este programa forma um panorama representativo da música de câmara de Schumann. Indo além dos trios de piano, que já nos fornecem um relato completo de Schumann, o Trio Wanderer convidou alguns amigos para se juntarem a eles na interpretação de duas obras-primas supremas – o Quarteto para Piano e o Quinteto para Piano. Bem, todos aqui sabem que o segundo movimento — Modo d’una Marcia — do Quinteto foi utilizado por Ingmar Bergman como tema principal de Fanny & Alexander. E que há uma cena de indescritível beleza em A Patriota, de Alexander Kluge, que usa o terceiro movimento do Quarteto. O filme de Kluge não se compara às alturas de Bergman, mas esta cena é foda. Mas tudo é bom aqui, sem interessar o que foi ou não para o cinema. O Trio Nº 2, por exemplo, é de se ouvir de joelhos.
O Trio Wanderer parece ser mesmo o sucessor do Beux Arts Trio. Os caras tocam de forma sublime.
Robert Schumann (1810-1856): Complete Piano Trios, Quartet & Quintet
Disc 1 (53:51)
1. Trio Wanderer & Christophe Gaugué – Piano Quartet in E-Flat Major, Op. 47: I. Sostenuto assai – Allegro ma non troppo (08:35)
2. Trio Wanderer & Christophe Gaugué – Piano Quartet in E-Flat Major, Op. 47: II. Scherzo. Molto vivace (03:24)
3. Trio Wanderer & Christophe Gaugué – Piano Quartet in E-Flat Major, Op. 47: III. Andante cantabile (06:04)
4. Trio Wanderer & Christophe Gaugué – Piano Quartet in E-Flat Major, Op. 47: IV. Finale. Vivace (07:08)
5. Trio Wanderer, Christophe Gaugué & Catherine Montier – Piano Quintet in E-Flat Major, Op. 44: I. Allegro brillante (09:05)
6. Trio Wanderer, Christophe Gaugué & Catherine Montier – Piano Quintet in E-Flat Major, Op. 44: II. In Modo d’una Marcia. Un poco largamente (08:04)
7. Trio Wanderer, Christophe Gaugué & Catherine Montier – Piano Quintet in E-Flat Major, Op. 44: III. Scherzo. Molto vivace (04:32)
8. Trio Wanderer, Christophe Gaugué & Catherine Montier – Piano Quintet in E-Flat Major, Op. 44: IV. Allegro ma non troppo (06:59)
Disc 2 (54:23)
1. Trio Wanderer – Piano Trio No. 1 in D Minor, Op. 63: I. Mit Energie und Leidenschaft (11:28)
2. Trio Wanderer – Piano Trio No. 1 in D Minor, Op. 63: II. Lebhaft, doch nicht zu rasch (04:32)
3. Trio Wanderer – Piano Trio No. 1 in D Minor, Op. 63: III. Langsam, mit inniger Empfindung (05:23)
4. Trio Wanderer – Piano Trio No. 1 in D Minor, Op. 63: IV. Mit Feuer (07:30)
5. Trio Wanderer – Piano Trio No. 2 in F Major, Op. 80: I. Sehr lebhaft (07:28)
6. Trio Wanderer – Piano Trio No. 2 in F Major, Op. 80: II. Mit innigem Ausdruck – Lebhaft (07:21)
7. Trio Wanderer – Piano Trio No. 2 in F Major, Op. 80: III. In mässiger Bewegung (05:19)
8. Trio Wanderer – Piano Trio No. 2 in F Major, Op. 80: IV. Nicht zu rasch (05:22)
Disc 3 (51:49)
1. Trio Wanderer – Piano Trio No. 3 in G Minor, Op. 110: I. Bewegt, doch nicht zu rasch (09:31)
2. Trio Wanderer – Piano Trio No. 3 in G Minor, Op. 110: II. Ziemlich langsam (05:29)
3. Trio Wanderer – Piano Trio No. 3 in G Minor, Op. 110: III. Rasch – Etwas Zuruckhaltend bis zum langsameren Tempo (04:01)
4. Trio Wanderer – Piano Trio No. 3 in G Minor, Op. 110: IV. Kräftig, mit Humor (07:18)
5. Trio Wanderer – Phantasiestücke in A Minor, Op. 88: I. Romance. Nicht schnell, mit innigem Ausdruck (07:28)
6. Trio Wanderer – Phantasiestücke in A Minor, Op. 88: II. Humoreske. Lebhaft (07:21)
7. Trio Wanderer – Phantasiestücke in A Minor, Op. 88: III. Duett. Langsam und mit Ausdruck (03:19)
8. Trio Wanderer – Phantasiestücke in A Minor, Op. 88: IV. Finale. Im Marschtempo (05:37)
Um dos mais curiosos subprodutos da treta envolvendo o finale original do Quarteto Op. 130, doravante denominado “Grande Fuga”, foi esta transcrição para piano feita, no que a tornaria por si só muito especial, pelo próprio Beethoven.
No início de 1826, o editor Artaria preparava em suas oficinas a publicação do Op. 130, estreado no ano anterior com boa acolhida para cinco de seus seis movimentos, exceto a gigantesca e largamente incompreendida fuga final. A ideia de substituí-la por um final mais convencional não tinha sequer sido trazida à tona quando Artaria perguntou a Beethoven se poderia fazer-lhe um arranjo da fuga para piano a quatro mãos. Arranjos assim eram de praxe para a divulgação de música orquestral e de câmara, que assim poderia ser ouvida em qualquer lugar onde houvesse um piano e dois pianistas, e eram lançados pouco depois das obras de referência. A alegação do editor era de lhe tinham manifestado interesse, mas a proposta não veio acompanhada de remuneração interessante, então Beethoven lhe deu de ombros e Artaria solicitou pediu a outro compositor que lhe fizesse a empreitada. Quando a transcrição foi mostrada a Beethoven, este indignou-se com o que considerou simplificações e concessões a amadores e resolveu ele próprio fazer, em tempo recorde, sua transcrição bastante literal da obra, que acabou publicada após sua morte sob o Op.134 e com o mesmo dedicatário da “Grande Fuga” para quarteto de cordas – o arquiduque Rudolph.
Essa história toda é muito esquisita, pois seria improvável que uma obra tão unanimemente detestada por seus contemporâneos fosse suscitar solicitações de seus arranjos ao editor, se nem hoje, em tempos que veem a “Grande Fuga” ser considerada um dos pináculos da Música de concerto do Ocidente, nós ouvimos o Op. 134 executado com frequência, e muito menos neste ano de jubileu de Beethoven. Houve sugestões de que essa fosse tão só a estratégia de Artaria para, comendo pelas bordas e evitando confrontos diretos com o irascível compositor, tentar convencê-lo a publicar a “Grande Fuga” em separado.
Se foi isso mesmo, funcionou: Beethoven fez seu arranjo com evidente zelo, sem nada facilitar para os executantes (e ele não poderia se preocupar menos com isso) e, pelo jeito, constatou que aquele finale monumental poderia ter, sim, vida própria. Não se sabe ao certo quem estreou o arranjo, nem quando isso aconteceu. O fato é que ele é pouquíssimo tocado e gravado, salvo na proximidade de jubileus como o de agora. Entre o punhado de gravações novas que ouvi do Op. 134, uma das que mais me atraiu foi a do duo húngaro Izabella Simon-Denes Várjon. Neste álbum, a “Grande Fuga” encerra uma procissão de obras bem diversas para duo pianístico, começando pelos estudos que Schumann escreveu para o piano com pedaleira, no surpreendente arranjo de Debussy, passando pelo grande duo “Lebenssturme” de Schubert e por um dos mais óbvios frutos do devotado estudo que Mozart fez da obra de Bach, a Fuga K. 401. Embora prefira a versão original, com seus ataques furiosos às cordas e todo colorido tonal de quatro instrumentos incandescentes, reconheço que o arranjo de Beethoven lhe dá mais clareza e transparência. Simon e Várjon – que, a julgar pela pose arrulhante na capa do álbum, devem dividir além do teclado também os lençóis – saem-se muito bem, quase a ponto de agradecermos a Artaria por sua convoluta tentativa de manipulação.
Ponto para Artaria, e parabéns aos músicos. Merecem os lençóis.
Robert Alexander SCHUMANN (1810-1856) Seis estudos canônicos para piano de pedaleira, Op. 56 Arranjo para dois pianos por Claude-Achille DEBUSSY (1862-1918)
1 – Pas trop vite
2 – Avec beaucoup d’expression
3 – Andantino
4 – Espressivo
5 – Pas trop vite
6 – Adagio
Franz Peter SCHUBERT (1797-1828)
Allegro em Lá menor para piano a quatro mãos, Op. Posth. 144, D. 947, ‘Lebenssturme’
7 – Allegro
Wolfgang Amadeus MOZART (1756-1791)
Fuga em Sol menor, K. 401 (375e) para piano a quatro mãos
8 – [sem indicação de andamento]
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
Grande Fuga em Si bemol maior, para piano a quatro mãos, Op. 134 Composta em 1826 Publicada em 1827 Dedicada ao arquiduque Rudolph da Áustria 8 – Overtura. Allegro – Fuga. Allegro – Meno mosso e moderato – Allegro – Allegro molto e con brio – Allegro molto e con brio
Discos com música de um único compositor costuma ser o normal, mas há também aqueles discos nos quais o artista apresenta um recital escolhendo peças de vários compositores que mais se adequam às suas características ou habilidades. Estes discos podem ser apenas montados pelas gravadoras para homenagear o artista ou para fins comerciais mesmo.
Que foi? Nunca viu um par de jarros?
Entre estes extremos temos aqueles discos que reúnem duas obras que se tornaram ‘dobradinhas’ ao longo da história das gravações. As duplas mais famosas são os quartetos de cordas de Debussy e Ravel e os concertos para piano de Schumann e Grieg.
Digo Schumann e Grieg pois Schumann é mais velho e compôs o seu concerto primeiro, que serviu de inspiração para o mais jovem compositor. Mas as prevalências acabam aqui, pois que os dois concertos são obras espetaculares e, a menos que você seja um absoluto negacionista do romantismo, deve amar estas obras.
Seguindo, portanto, a linha de apresentar obras representativas do repertório clássico para o Desafio PQP, escolhi estes dois concertos para esta que já é a quarta rodada.
Conta a história que em 1845 Clara Schumann estreou o Concerto do maridão como solista em uma apresentação em Dresden. Alguns anos depois, em outro concerto que fez em Leipzig, esteve presente o então jovem norueguês Edvard Grieg, que ficou encantado com a obra do compositor mais velho e inspirado pela sua beleza e romantismo logo deitou mãos à obra. E então, como diz o adágio, o resto é história.
Para tornar o desafio ainda mais interessante, temos aqui não uma gravação, mas duas gravações deste par de ‘cavalos de batalha’. Doravante elas serão tratadas por Desafio A e Desafio B.
Para ganhar o nome inscrito em um tijolo na virtual calçada da fama do PQP Bach, você precisará nomear os artistas das duas gravações.
E mais não digo pois que os nossos argutos e dedicados Sherlockes musicais são capazes de farejar mesmo nos mais rarefeitos bites digitais dos arquivos postados.
Vamos, aproveitem estas duas gravações dos lindos concertos e digam-me sem demora os nomes e sobrenomes dos intérpretes!
Robert Schumann (1810 – 1856)
Concerto para Piano em lá menor, Op. 54
I. Allegro affetuoso
II. Intermezzo: Andantino grazioso e III. Allegro vivace
Neste ambiente foi descoberta a solução do último desafio – verdadeiro trabalho de Sherlock!
Reafirmo aqui a questão motivadora desta espécie de ‘coluna’ do PQP Bach… Como se fosse a Seção de Palavras Cruzadas:
O quanto o conhecimento antecipado do intérprete afeta nossa apreciação de um disco?
Nossos ouvidos podem ser levados a apreciar com mais condescendência aqueles intérpretes que amamos ou ficarem de sobrepostos para as escorregadelas daqueles com os quais não simpatizamos. Isto sem contar com as muitas gravações que não nos chamam particularmente a atenção. Pois aqui você tem a oportunidade de ouvir uma boa música sem pré-julgamentos de qualquer tipo… Pelo menos até que o desafio não seja resolvido!
Aproveite!
René Denon
PS: Se você se interessou pelos desafios, poderá encontrar os anteriores clicando nos links a seguir.
A música de Schumann apareceu por aqui no período de seu aniversário de 210 anos, deu até trabalho apagar tantas velas sobre o imenso bolo e depois sumiu. Assim, pretendemos reparar tamanha falta com nosso romântico compositor. Minimizar também é uma palavra que poderia ser usada… Se bem que, por pouco, não era só Schumann que sumiria, foi-se por uns dias o blog todo.
François-Xavier fazendo sua imitação de Jack Nicholson para o pessoal do PQP Bach…
Este disco traz uma combinação bem típica dos álbuns atuais e, por isso, é tão bom desfrutá-lo. François-Xavier Roth é um maestro com experiência em reger orquestras que usam instrumentos e práticas de época. Aqui ele coloca esta experiência para dirigir uma orquestra tradicional, a Gürzenich-Orchester Köln, que leva este nome por apresentar-se no Gürzenich Concert Hall, em Colônia (sim, eu sei que Köln é Colônia) e é ativa desde 1827. François-Xavier Roth é o Gürzenith-Kapellmeister, o seu diretor, desde 2015.
Gurzenich, Colônia
Neste álbum eles tocam as Sinfonias Nos. 1 e 4 de Schumann, que são distantes apenas na numeração, pois foram ambas compostas em 1841. A Primeira Sinfonia, chamada ‘Primavera’, foi um sucesso, agradou até o sogro de Robert. Mas, a outra sinfonia, em ré menor, com seus aspectos mais inovadores, confundiu um pouco as audiências e Schumann a deixou um tempo na geladeira. Seu número de opus é mais alto devido a ter sido reapresentada em 1851, com algumas modificações. A versão de 1851 é que normalmente ouvimos, mas aqui Roth apresenta a versão original, que recebe um tratamento de primeira e as duas sinfonias vão muito bem juntas, assim. Os ritmos são vivos, os timbres da orquestra são leves e a agilidade está presente em todo o disco. A produção é excelente, apesar da gravação ter sido feita ao vivo. Eu notei mais as diferenças desta versão mais antiga da Quarta Sinfonia no último movimento. Espero que você aprecie o trabalho deste conjunto excelente e desfrute desta música tão cheia de vida do romântico Robert.
Robert Schumann (1810 – 1856)
Sinfonia No. 1 em si bemol maior, Op. 38 – ‘Primavera’
Andante un poco maestoso – Allegro molto vivace
Larghetto
Scherzo. Molto vivace
Allegro animato e grazioso
Sinfonia No. 4 em ré menor, Op. 120 (Versão Original – 1841)
No momento ‘The book is on the table’, um trecho de uma crítica do disco: ‘If it [Symphony Nr. 4] had received as persuasive a performance as this at its premiere, Schumann may well have left the score alone. Coupled with that joyous First, it adds up to one of the most exciting Schumann discs in years, a triumph for Roth and his musicians’.
Um CD arrasta-corações! Tem muita música aqui, apesar da capa genérica da Lawo! Este disco de Nils Anders Mortensen e do Engegård Quartet é dedicado ao quarteto e quinteto de Schumann para piano e cordas, sem dúvida duas das mais belas obras de Bob. Robert Schumann produziu um grande número de obras de música de câmara em 1842, entre elas o Quinteto Op. 44 e o Quarteto Op. 47, ambos na mesma tonalidade. Os trabalhos foram compostos ao mesmo tempo, lado a lado, e o vocês poderão ouvir semelhanças claras entre eles, tanto na estrutura quanto no humor.
Ambas as obras contêm movimentos externos vigorosos e expressivos, nos quais a vitalidade de Mozart e o contraponto de Bach são combinados à imaginação de Schumann em trechos sonhadores e dramáticos. Os scherzi dos dois trabalhos são virtuosos, com seções intermediárias nitidamente contrastantes. Mas o quinteto contém um célebre movimento, in modo d’una marcia, que tanto é suficientemente solene para ser uma marcha fúnebre, como tem de natureza poética e ardente. Este movimento foi maravilhosamente bem utilizado por Ingmar Bergman em Fanny e Alexander. Quanto ao quarteto, possui um movimento cantabile com uma melodia imortal levada pelo violoncelo. Um CD arrasta-corações.
Robert Schumann (1810-1856): Quarteto para Piano, Op. 47 e Quinteto para Piano, Op. 44
01. Piano Quintet, Op. 44 I. Allegro brillante
02. Piano Quintet, Op. 44 II. In modo d’una Marcia. Un poco largamente
03. Piano Quintet, Op. 44 III. Scherzo. Molto vivace
04. Piano Quintet, Op. 44 IV. Finale. Allegro, ma non troppo
05. Piano Quartet, Op. 47 I. Sostenuto assai. Allegro, ma non troppo
06. Piano Quartet, Op. 47 II. Scherzo. Molto vivace
07. Piano Quartet, Op. 47 III. Andante cantabile
08. Piano Quartet, Op. 47 IV. Finale. Vivace
“Música Clássica para Leigos” (“Classical Music For Dummies”) é uma série de lançamentos projetados pela Deutsche Grammophon para oferecer aos leigos recém-chegados uma introdução perfeita ao mundo da música clássica.
A série é composta por 50 CDs de música clássica dedicados a diferentes compositores, maestros, pianistas, violinistas e cantores, a maioria contratados ou ex-contratados pela gravadora.
Dietrich Fischer-Dieskau – The Essentials
Dietrich Fischer-Dieskau (28 de maio de 1925 – 18 de maio de 2012) foi um barítono lírico alemão e maestro da música clássica, um dos mais famosos artistas de Lieder do período pós-guerra (Lied é uma palavra da língua alemã, que significa “canção”. É um termo tipicamente usado para classificar arranjos musicais para piano e cantor solo, com letras geralmente em alemão, utilizado para expressar em sons os sentimentos descritos nas letras), mais conhecido como cantor de Lieder, de Franz Schubert, particularmente os 24 poemas de “Winterreise”, cujas gravações com o acompanhante Gerald Moore e Jörg Demus ainda são aclamadas pela crítica meio século após seu lançamento.
Gravando uma série de repertórios (abrangendo séculos), como afirmou o musicólogo Alan Blyth: “Nenhum cantor de nossa época, ou provavelmente qualquer outro, conseguiu o alcance e a versatilidade do repertório alcançado por Dietrich Fischer-Dieskau. Ópera, Lieder e oratório em alemão, italiano ou inglês parecia ter sido feito para ele, e ele trouxe a cada um uma precisão e individualidade que revelavam suas percepções sobre o idioma em questão “. Além disso, ele gravou em francês, russo, hebraico, latim e húngaro. Ele foi descrito como “um dos artistas vocais supremos do século 20” e “o cantor mais influente do século 20”.
Fischer-Dieskau foi classificado como o segundo maior cantor do século (depois de Jussi Björling) pelo Classic CD (Reino Unido), ‘Top Singers of the Century” Critics Poll (junho de 1999). Os franceses o apelidaram de “O milagre Fischer-Dieskau” e Dame Elisabeth Schwarzkopf chamou-o de “um deus nascido que tem tudo”. No seu auge, ele era muito admirado por suas idéias interpretativas e controle excepcional de sua suave e bela voz. Apesar do pequeno tamanho de sua voz lírica / de barítono de câmara, Fischer-Dieskau também apresentou e gravou muitos papéis operísticos. Ele dominou a plataforma de ópera e concerto por mais de trinta anos.
Fischer-Dieskau: Essentials Franz Schubert (Austria, 1797-1828) 01. An die Musik, D. 547 (Op. 88/4) Wolfgang Amadeus Mozart (Austria, 1756-1791) 02. Don Giovanni, K. 527 : “Fin ch’han dal vino” Christoph Willibald Gluck (Alemanha, 1714 – Áustria, 1787) 03. Orfeo ed Euridice, Wq. 30 : No. 43 Aria: “Ach, ich habe sie verloren” (Arr. Alfred Doerffel) Robert Schumann (Alemanha, 1810-1856) 04. Dichterliebe, Op. 48 : No. 1 Im wunderschönen Monat Mai Franz Schubert (Austria, 1797-1828) 05. Der Musensohn, Op. 92, No. 1, D. 764 Wolfgang Amadeus Mozart (Austria, 1756-1791) 06. Die Zauberflöte, K. 620 : “Der Vogelfänger bin ich ja” Giuseppe Verdi (Itália, 1813 – 1901) 07. La Traviata : “Di Provenza il mar, il suol” Gustav Mahler (República Tcheca, 1860 – Viena, 1911) 08. Rückert-Lieder, Op. 44 : Ich atmet’ einen linden Duft Wolfgang Amadeus Mozart (Austria, 1756-1791) 09. Le nozze di Figaro, K. 492 : “Vedro mentr’io sospiro” Franz Schubert (Austria, 1797-1828) 10. Im Frühling, D. 882 11. Winterreise, D. 911 : No. 5 Der Lindenbaum Robert Schumann (Alemanha, 1810-1856) 12. Dichterliebe, Op. 48 : No. 3 Die Rose, die Lilie, die Taube, die Sonne Georges Bizet (França, 1838 – 1875) 13. Carmen, WD 31 : “Votre toast, je peux vous le rendre” – “Toréador, en garde” Franz Schubert (Austria, 1797-1828) 14. Schwanengesang, D. 957 : Ständchen “Leise flehen meine Lieder” Richard Strauss (Alemmanha, 1864 – 1949) 15. Ständchen, Op. 17, No. 2 Giuseppe Verdi (Itália, 1813 – 1901) 16. Don Carlo : “Dio, che nell’alma infodere” Richard Wagner (Alemanha, 1813 – Itália, 1883) 17. Tannhäuser, WWV 70 : Wie Todesahnung… O du mein holder Abendstern (Wolfram) Franz Schubert (Austria, 1797-1828) 18. Winterreise, D. 911 : No. 4 Erstarrung Robert Schumann (Alemanha, 1810-1856) 19. Liederkreis, Op. 39 : Mondnacht Richard Wagner (Alemanha, 1813 – Itália, 1883) 20. Die Meistersinger von Nürnberg, WWV 96 : “Was duftet doch der Flieder” Ludwig van Beethoven (Alemanha, 1770-Áustria, 1827) 21. Fidelio, Op. 72 : “Ha! Welch ein Augenblick!” Hugo Wolf (Eslovênia, 1860 – Áustria, 1903) 22. Italienisches Liederbuch : Ein Ständchen euch zu bringen Claude Debussy (França 1862 – 1918) 23. Mandoline Gustav Mahler (República Tcheca, 1860 – Viena, 1911) 24. Lieder eines fahrenden Gesellen : No. 3 Ich hab’ ein glühend Messer Carl Orff (Alemanha, 1895 – 1982) 25. Carmina Burana / No. 2 In Taberna : “Estuans interius”
Palhinha –18. Winterreise, D. 911 : No. 4 Erstarrung
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Boa audição!
Avicenna
PS. Nosso colega René Denon adicionou um comentário de valor-
Olá, Avicenna! A coleção vai de vento em popa! DFD é figurinha carimbada! Nesta coleção há muitas beleza que podem levar a futuras explorações ao resto da obra, bastando alguns cliques! As canções de Schubert fazem uma parte substancial do repertório do Dietrich, como An Die Musik e Der Musenhohn. Para explorar mais esta vertente aqui tem uma coleção de lindas canções de Schubert: https://pqpbach.ars.blog.br/2019/03/03/schubert-lieder-dietrich-fischer-dieskau-gerald-moore/
“Música Clássica para Leigos” (“Classical Music For Dummies”) é uma série de lançamentos projetados pela Deutsche Grammophon para oferecer aos leigos recém-chegados uma introdução perfeita ao mundo da música clássica.
A série é composta por 50 CDs de música clássica dedicados a diferentes compositores, maestros, pianistas, violinistas e cantores, a maioria contratados ou ex-contratados pela gravadora.
Vladimir Horowitz – The Essentials
Vladimir Samoylovych Horowitz, Kiev, 1 de outubro de 1903 – Nova Iorque, 5 de novembro de 1989) foi um pianista russo-americano. É considerado como um dos mais brilhantes pianistas de todos os tempos, devido à sua excepcional técnica aliada às suas performances contagiantes. (1) Destacou-se pelo seu toucher sem igual, pelo controle dinâmico excepcional e pela sua mecânica única. As suas interpretações mais conhecidas e tidas como inigualáveis se referem às obras que variam do barroco Domenico Scarlatti, passando pelos românticos Chopin, Schumann, Liszt e chegando ao moderno Prokofiev. É considerado por muitos o indiscutível mestre em Scriabin e Rachmaninoff.
Horowitz diz que nasceu em Kiev, Império Russo, mas algumas fontes indicam que ele nasceu em Berdichev. Sua prima Natasha Saitzoff, em uma entrevista concedida em 1991, confirma que Horowitz nasceu em Kiev; no entanto, a esposa de Horowitz, Wanda Toscanini diz que o nascimento em Berdichev é possível.
Ele nasceu em 1903, mas para evitar o serviço militar e assim evitar lesionar suas mãos, seu pai declarava que seu filho nascera em 1904 (este fictício ano de nascimento ainda é encontrado em algumas fontes de referência, mas de fato Horowitz nasceu em 1903, como ele mesmo depois declarou).
Seu talento se destacou e foi reconhecido rapidamente, e então começou a fazer apresentações pela Rússia, onde frequentemente era pago com pão, manteiga e chocolate em vez de dinheiro, devido à miséria econômica vivida no país. Durante o período de 1922 a 1923, ele fez apresentações de 23 concertos de onze diferentes repertórios em Leningrado.
Em 1925, recebeu permissão para sair da Rússia a pretexto de estudar com o pianista austríaco Artur Schnabel. Mas já estava decidido a não voltar.
Horowitz tornou-se um cidadão americano em 1945. (ex-Wikipedia)
Vladimir Horowitz – The essentials Robert Schumann (Alemanha, 1810-1856) 01. Kinderszenen, Op. 15 : 7. Träumerei Fransz List (Áustria, 1811 – Alemanha, 1886) 02. chwanengesang, S.560 : No. 4 Ständchen Johann Sebastian Bach (Alemanha, 1685-1750) 03. Nun komm, der Heiden Heiland, BWV 659 (Transcr. for Piano By Ferruccio Busoni) Wolfgang Amadeus Mozart (Austria, 1756-1791) 04. Piano Sonata No. 3 in B-Flat Major, K. 281 : 1. Allegro 05. Piano Sonata No. 3 in B-Flat Major, K. 281 : 2. Andante amoroso 06. Piano Sonata No. 3 in B-Flat Major, K. 281 : 3. Rondeau. Allegro Franz Schubert (Austria, 1797-1828) 07. 6 Moments musicaux, Op. 94, D. 780 : No. 3 in F Minor. Allegro moderato Wolfgang Amadeus Mozart (Austria, 1756-1791) 08. Adagio in B Minor, K.540 Robert Schumann (Alemanha, 1810-1856) 09. Noveletten, Op. 21 : No. 1 in F (markiert und kräftig) Wolfgang Amadeus Mozart (Austria, 1756-1791) 10. Rondo in D Major, K.485 11. Piano Sonata No.13 in B Flat Major, K.333 : 1. Allegro 12. Piano Sonata No.13 in B Flat Major, K.333 : 2. Andante cantabile 13. Piano Sonata No.13 in B Flat Major, K.333 : 3. Allegretto grazioso Franz Schubert (Austria, 1797-1828) 14. Piano Sonata No. 21 in B-Flat Major, D. 960 : 1. Molto moderato 15. Piano Sonata No. 21 in B-Flat Major, D. 960 : 2. Andante sostenuto 16. Piano Sonata No. 21 in B-Flat Major, D. 960 : 3. Scherzo. Allegro vivace con delicatezza Fransz List (Áustria, 1811 – Alemanha, 1886) 17. Impromptu “Nocturne”, S.191 Fryderyk Francyszek Chopin (Polônia, 1810 – França, 1849) 18. Scherzo No. 1 in B Minor, Op. 20 Robert Schumann (Alemanha, 1810-1856) 19. Kreisleriana, Op. 16 : 2. Sehr innig und nicht zu rasch – Intermezzo I (Sehr lebhaft) – Tempo I – Intermezzo II (Etwas bewegter) – Tempo I Wolfgang Amadeus Mozart (Austria, 1756-1791) 20. Piano Concerto No. 23 in A Major, K. 488 : 2. Adagio Domenico Scarlatti (Nápoles, 1685 – Espanha, 1757) 21. Sonata in B Minor, K.87 Franz Schubert (Austria, 1797-1828) 22. Impromptu in B-Flat Major, D.935 No.3 23. 3 marches militaires, D.733 (Op.51) : No. 1 in D-Flat Major Fryderyk Francyszek Chopin (Polônia, 1810 – França, 1849) 24. Mazurka No. 13 in A Minor, Op. 17 No. 4 25. Polonaise No. 6 in A-Flat Major, Op. 53 “Heroic”
(1) Horowitz aos 85 anos explicando o que significa “Destacou-se pelo seu toucher sem igual, pelo controle dinâmico excepcional e pela sua mecânica única.”
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Vocês me permitem só mais uma gravação de Martha tocando o concerto em Dó maior de Ludwig?
Só mais uminha?
Pois bem: ela é a minha favorita, a mais brilhante, fluida e à vontade que ela já fez dessa obra que toca quase desde a mórula. O ambiente certamente ajuda: o magnífico Teatro Colón, onde ela estreou há mais de setenta anos, em sua Buenos Aires natal, na qual passa uma aclamada temporada por ano e é merecidamente tratada como divindade terrena. A companhia, seguramente também: nenhum parceiro artístico a conhece há tanto tempo quanto seu conterrâneo Daniel Barenboim, com o qual formou a mais notória dupla portenha de crianças-prodígio e brincava de esconde-esconde sob os pianos das soirées em que tocaram juntos, antes das carreiras os levarem para distintas plagas e se reencontrarem tantas vezes pelo mundo. Daniel é extremamente reverente a Martha, e isso fica claro nessa interpretação do concerto: a solista parece tocar com total liberdade, e o regente a segue impecavelmente. O restante da gravação, feita ao vivo, traz a abertura de “As Bodas de Fígaro”, aquele clássico pontapé inicial dos concertos em matinês, e uma seleção considerável da obra de Maurice Ravel para seu instrumento favorito, a orquestra sinfônica. Barenboim e sua West-Eastern Divan estão tão confortáveis nesse repertório que lhes sobra energia para um extenso bis, com uma das suítes de excertos orquestrais da “Carmen” de Bizet e um tango de Mariano Mores – Martha, mantendo seu costume, dá um rápido bis com Schumann antes de sumir para as coxias para mais um de seus compulsórios cigarrillos. Apesar da sempre tussígena e algo alvoroçada plateia do Colón, a gravação do selo Peral (“Pereira” em espanhol, que é “Birnbaum” em alemão e “Barenboim” em iídiche) consegue captar bem o que deve ter sido uma noite e tanto naquela banda do rio da Prata.
Wolfgang Amadeus MOZART (1756-1791)
Le Nozze di Figaro, K. 491
01 – Abertura
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
Concerto em Dó maior para piano e orquestra, Op. 15 02 – Allegro con brio
03 – Largo
04 – Rondo. Allegro scherzando
Robert Alexander SCHUMANN (1810-1856) Fantasiestücke, Op. 12 05 – No. 7: Traumes-Wirren
Joseph Maurice RAVEL (1875-1937)
Rapsodie Espagnole, M. 54 06 – Prélude à la Nuit
07 – Malagueña
08 – Habanera
09 – Feria
Alborada del Gracioso, M. 43 10 – Assez vif
Pavane pour une Infante Défunte, M. 19
11 – Assez doux, mais avec d’une sonorité large
Encerramos nosso “Festival Schumann” com sua composição de mais largo escopo, a mais ambiciosa e talvez – mesmo imperfeita e desigual como é – sua obra-prima.
O imenso “Fausto” de Goethe, o ponto mais alto da literatura alemã, instigou desde sua publicação a imaginação de compositores. O próprio autor reconheceu, em sua correspondência, que muitas partes de sua obra “clamavam por música”. A primeira parte do “Fausto”, publicada em 1806, prestava-se bem para isso e, com algumas podas aqui e ali, tinha uma narrativa linear e recheada de heróis e antagonistas o bastante para ser levada aos palcos, como o fizeram Berlioz e Gounod em suas óperas. Já a esotérica segunda parte, publicada em 1831, foi solenemente ignorada por músicos e, embora instantaneamente considerada a obra-prima de Goethe, também ganhou uma reputação de pouco acessível em seu enorme escopo, narrativa não linear e personagens místicos.
Schumann – a quem nunca poderíamos acusar de falta de ousadia artística – resolveu encarar o himalaico desafio e começou, claro, pelo mais difícil. Assim, em 1844, compôs as cenas da transfiguração de Fausto, do final da segunda parte, numa imensa cantata que conjura todos os personagens das partes anteriores e que reúne algumas das páginas mais belas que escreveu. Seu feito é ainda mais notável quando nos damos conta de que, com a exceção da abordagem bem ligeira de Liszt em sua “Sinfonia Fausto”, essas palavras só seriam postas novamente em música por Gustav Mahler, já no século XX.
Na década que lhe restaria de carreira, Schumann voltaria ao texto no começo de 1849 para compor as cenas de 1 a 3 (os únicos trechos da primeira parte do “Fausto” que musicaria), a cena 4 no final do mesmo ano e, em 1850, as cenas 5 e 6. A abertura foi escrita por último e concluída em 1853, um ano antes do colapso que o levaria ao hospício. Não sabemos, pelos seus diários e correspondência, se ele planejava colocar a obra toda em música. Ao que tudo indica, no entanto, ele próprio não concebia essas cenas todas, escritas em diferentes momentos de sua vida, como partes de uma só grande obra, nem que as pretendesse escutar assim. A execução do todo, uma tradição que só se consolidou no século XX, não deixa de soar como uma vasta colcha de belíssimos retalhos. Da angustiada e algo crua abertura, no estilo bem típico de seus últimos anos, passando por trechos que soam como operetas (como o dueto no jardim de Martha), grande ópera (a aterrorizante cena na catedral), ópera romântica (a cena à meia-noite, que tem todo drama que faltou a “Genoveva”, sua única ópera), intercalando melodias ora de sabor folclórico, ora reminiscentes de seus melhores Lieder, e culminando com a supracitada cantata final, que a um só tempo mostra sua reverência a Bach como também que não seria possível sem a Missa Solemnis de Beethoven, essa coleção de instantâneos da segunda metade da carreira do compositor forma uma imensa rapsódia que é, acredito, seu melhor testamento musical. E com essa leitura de Philippe Herreweghe, sempre elegante e atenta ao detalhe, e um belo time vocal, no qual destaco o maravilhoso baixo islandês Kristinn Sigmundsson como Mefistófeles, espero que ela encontre o lugar que creio merecer no carinho dos leitores-ouvintes, enquanto agradeço a atenção que dedicaram à individualíssima música de Schumann ao longo dessas três últimas semanas.
Robert Alexander SCHUMANN (1810-1856)
Szenen aus Goethes “Faust” (“Cenas do ‘Fausto’ de Goethe”), para solistas, coro e orquestra, WoO 3
1 – Abertura
PRIMEIRA PARTE
2 – No. 1: Szene im Garten (Gretchen, Faust, Mephistopheles, Marthe) – “Du kanntest mich, o kleiner Engel, wieder”
3 – No. 2: Gretchen vor dem Bild der Mater Dolorosa (Gretchen) – “Ach neige, du Schmerzensreiche”
4 – No. 3: Szene in Dom (Böser Geist, Gretchen, Chor) – “Wie anders, Gretchen, war dir’s”
SEGUNDA PARTE
5 – No. 4: Sonnenaufgang (Ariel, Faust, Chor) – “Die ihr dies Haupt umschwebt im luft’gen Kreise”
6 – No. 5: Mitternacht (Mangel, Schuld, Sorge, Not, Faust) – “Ich heiße der Mangel”
7 – No. 6: Fausts Tod (Mephistopheles, Lemuren, Faust, Chor) – “Herbei, herbei! Herein, herein!”
Camilla Nylund, soprano (Gretchen, Not, Una Poenitentium) Simone Nold, soprano (Sorge, Magna Peccatrix) Ingeborg Danz, contralto (Mangel, Mater Gloriosa, Mulier Samaritana) Louise Mott, contralto (Marthe, Schuld, Maria Aegyptiaca) Hans-Peter Blochwitz, tenor (Ariel) Christian Voigt, tenor (Pater Ecstaticus)
William Dazeley, barítono (Faust, Doktor Marianus, Pater Seraphicus) Kristinn Sigmundsson, baixo (Mephistopheles, Böser Geist, Pater Profundus)
Collegium Vocale La Chapelle Royale RIAS-Kammerchor Orchestre des Champs-Élysées Philippe Herreweghe, regência
“Sentimos em certas obras de Schumann a ausência de certa razão soberana. Ao menor desvio, a ideia escapa ao compositor e, quando ele consegue reencontrá-la, é depois de uma corrida contra mil obstáculos” Camille Bellaigue (1885)
Se Beethoven, para alguns, era uma divindade soberana, Schumann era humano, demasiado humano. Seus ciclos estão sempre refletindo os sentimentos do ser humano: a solidão, a alegria, a melancolia… A Kreisleriana, fantasia para piano em oito movimentos, é um dos melhores exemplos: além das diferenças entre os movimentos, cada um deles também apresenta várias mudanças. É uma estética curiosamente parecida com os nossos tempos em que ouvimos canções curtas de 2 minutos ou damos risadas com memes de 3 segundos… Como vocês sabem, as tecnologias trouxeram o encurtamento do que em inglês se chama attention span (nos explica a wikipedia: quantidade de tempo em que uma pessoa consegue se concentrar em uma tarefa sem se distrair).
O título da obra é inspirado no personagem Johannes Kreisler, criado pelo autor romântico alemão E. T. A. Hoffmann (1776-1822), personagem também marcado por uma sensibilidade exagerada e por mudanças de humor.
A Kreisleriana foi dedicada a Frédéric Chopin, por quem Schumann tinha uma forte admiração. A admiração, ao que parece, não foi muito correspondida. Já que comecei com os perfis psicológicos de botequim, vou continuar com eles: Schumann era famoso por seu humor instável, mas por outro lado foi um crítico musical com vasta cultura e um gosto estável e influente: foi um dos responsáveis pela entronização de J.S.Bach e Beethoven no panteão germânico e um hábil cultivador de relações, elogiando a música de Chopin, Mendelssohn, Berlioz e Brahms. Já Chopin, socialmente, parece ter sido muito mais tímido: suas principais relações intelectuais (escândalo na época!) aparentemente foram com mulheres: suas alunas na alta sociedade parisiense e a escritora George Sand. Ao contrário de Schumann, nunca atuou como maestro. Tocou muito mais vezes em salões aristocráticos do que em salas de concerto. O polonês era, em suma, um sonhador recluso, enquanto seu contemporâneo alemão era um sonhador extremamente sociável, com episódios de delírios ou depressão aqui e ali, mas sempre ajudando os amigos.
A pianista Linda Bustani nasceu em Rondônia, estudou com Arnaldo Estrella e Antonio Guedes Barbosa no Rio de Janeiro – onde vive até hoje – e com Elisso Virsaladze em Moscou. Estreou no Brasil alguns concertos pouco tocados, como o 4º de Prokofiev, para a mão equerda. Suas interpretações dos compositores românticos – Chopin, Schumann, Tchaikovsky – são celebradas, sobretudo as de Schumann, compositor com o qual ela tem forte ligação desde a juventude. Tem tocado a música de câmara de Schumann por todo o Brasil, principalmente o quinteto e o quarteto para piano e cordas. Também é parceira do Quinteto Villa-Lobos, extraordinário grupo de sopros fundado em 1962, o mais antigo em atuação ininterrupta no Brasil (os músicos foram passando o bastão). Já que estamos falando de flutuações emocionais, de instabilidade e estabilidade, finalizo tirando o chapéu para Linda e seus parceiros de música de câmara, que representam há décadas uma estabilidade rara na música de nosso país, tão cheia de voos de galinha.
R. Schumann (1810–1856): Kreisleriana, opus 16 – Phantasien für das Pianoforte
1. Äußerst bewegt (Extremely animated), D minor
2. Sehr innig und nicht zu rasch (Very inwardly and not too quickly), B♭ major.
3. Sehr aufgeregt (Very agitated), G minor
4. Sehr langsam (Very slowly), B♭ major/G minor
5. Sehr lebhaft (Very lively), G minor
6. Sehr langsam (Very slowly), B♭ major
7. Sehr rasch (Very fast), C minor/E♭ major
8. Schnell und spielend (Fast and playful), G minor
F. Chopin (1810-1849):
9. Nocturne opus 27 n° 2 en ré dièse mineur
10. Nocturne opus 48 n° 1 en ut mineur
11. Fantaisie opus 49 en fa mineur
12. Scherzo N° 3 opus 39 en ut dièse mineur
Mais duas obras corais de Schumann resgatadas das trevas.
A primeira é a missa, obra curiosa vinda dum compositor nada devoto e ademais sem qualquer interesse pela música sacra. Composta dois anos antes do surto que o levaria à tentativa de suicídio no Reno e a internação no hospício, teve seus dois primeiros movimentos estreados juntamente com a sinfonia no. 4. Schumann jamais a escutaria completa, e a primeira audição integral aconteceria em Aachen, cinco anos depois de sua morte, com algum sucesso e – talvez seu maior triunfo – levando Clara a mudar seus planos de deixá-la inédita para sempre. Imagino o quão despojada ela deve ter soado para ouvidos acostumados a retumbâncias como as da Missa Solemnis de Beethoven ou mesmo da Grande Missa de Mozart, que não devem ter percebido que sua inspiração jazesse num passado mais remoto, nas missas de Palestrina, cujas partituras corais Robert adorava e ensaiava com frequência em Leipzig e Dresden. Alternando partes entusiasmantes, sobretudo o Kyrie e o Agnus Dei, com outras meramente formulaicas, a missa de Schumann chama também a atenção pelas diminutas partes atribuídas aos solistas que pouco abrem suas bocas. A exceção é o Offertorium – uma elaborada ária para soprano com acompanhamento de órgão e violoncelo, que já ouvimos aqui e foi adicionada a posteriori, provavelmente com alguma cantora específica em mente. A gravação dessa raridade, feita ao vivo em 1977 na Philharmonie da então Berlim Ocidental, conta com a soprano nipo-alemã Mitsuko Shirai, que recentemente vencera um concurso em Zwickau, cidade natal do compositor, e a condução magistral de Wolfgang Sawallisch, que ajuda a manter o interesse mesmo nos momentos menos inspirados e faz justiça às belezas da desgraçada obra.
Na mesma caixa da EMI – conhecida pelos combos-bastantões com obras sem-cerimoniosamente atrolhadas em dois CDs – ainda estavam, além da gravação de Der Rose Pilgerfahrt com Rafael Frühbeck, que já lhes alcancei ontem, também a Missa de Réquiem, Op. 148, e o Requiem für Mignon, que já ouvimos com Gardiner. Este último estava incongruentemente colocado no final do disco da gravação com Frühbeck, como um poslúdio soturno à singela historieta da rosa que vira Rosa, de modo que resolvi trazê-lo para junto do outro Réquiem, não tanto pelo título em comum, pois as obras têm pouquíssimas semelhanças, e sim porque ambos estão aqui a cargo do mesmo intérprete.
Bernhard Klee faz uma leitura emocionante da missa dos mortos de Schumann, que estranhamente deixou de lado quaisquer tinturas apocalípticas e fortíssimos a esvurmarem enxofre, para oferecer-nos um curso intensivo de serena aceitação da morte. Nada há aqui da fúria dos réquiens de Verdi e Berlioz, nem dos ostinati e coros ameaçadores daquele de Mozart. Até a doce contraparte de Fauré parece tempestuosa em comparação com esta obra, composta na etérea, rara tonalidade de Ré bemol maior, que faz muito sentido para os pianistas, mas deve fazer todos coros que a encaram amaldiçoarem uma pobre tumba num cemitério de Bonn.
Além dum time de solistas com Nicolai Gedda e Dietrich Fischer-Dieskau, Klee conduz forças que nada seriam estranhas a Schumann. Os conjuntos de Düsseldorf – tanto sua orquestra sinfônica quanto o coro – têm suas raízes na mesma Musikverein cujo comando o compositor assumiu como mestre de capela (Kapellmeister), muito para seu desgosto. Além da instabilidade de seu humor e do que hoje confortavelmente se admite como incompetência com a batuta, havia seu pouco tino para funções oficiais, parca habilidade para lidar com questões burocráticas e nenhum cacoete para dar conta das complicadas interações sociais e políticas inerentes a um cargo dessa importância. Suas desavenças crônicas com os músicos e com seus superiores, que retribuíam o caos trazido pela escolha infeliz de seu Kapellmeister com hostilidade e troça, possivelmente contribuíram com alguns empurrõezinhos para com o desesperado gesto que o levaria à tentativa de morte ao atirar-se nas águas do Reno e à morte em vida no hospício. Num dos últimos cadernos de diários, um de seus poucos apontamentos acerca do Requiem tascava: “compõe-se um réquiem para si mesmo”. Assim, nada mais apropriado que esses conjuntos renanos ofereçam-lhe, com esta bela gravação, reparo e tributo.
Robert Alexander SCHUMANN (1810-1856)
Missa em Dó menor para solistas, coro e orquestra, Op. 148
1 – Kyrie
2 – Gloria
3 – Credo
4 – Offertorium: Tota pulchra es, Maria
5 – Sanctus
6 – Agnus Dei
Mitsuko Shirai, soprano Peter Seiffert, tenor Jan-Hendrik Rootering, baixo Chor des Städtischen Musikvereins zu Düsseldorf Berliner Philharmoniker Wolfgang Sawallisch, regência
Requiem em Ré bemol maior para solistas, coro e orquestra, Op. 148
1 – Requiem Aeternam
2 – Te Decet Hymnus
3 – Dies Irae
4 – Liber Scriptus Proferetur
5 – Qui Mariam Absolvisti
6 – Domine Jesu Christe
7 – Hostias
8 – Sanctus
9 – Benedictus
Réquiem para Mignon, do “Wilhelm Meister” de Goethe, para solistas, coro e orquestra, Op. 98b
10 – No. 1: “Wen bringt ihr uns zur stillen Gesellschaft?” – No. 2: “Ach! Wie ungern brachten wir ihn her!” – No. 3: “Seht die mächtigen Flügel doch an!” – No. 4: “In euch Lebe die bildende Kraft” – No. 5: “Kinder! Kehret ins Leben zurück!” – No. 6: “Kinder! Eilet ins Leben hinan!”
Helen Donath, soprano Doris Soffel, mezzo-soprano Nicolai Gedda, tenor Dietrich Fischer-Dieskau, barítono Chor des Städtischen Musikvereins zu Düsseldorf Düsseldorfer Symphoniker Bernhard Klee, regência
Dentro da obscuridade em que jaz a obra coral de Schumann, talvez as maiores trevas estejam a cair sobre Der Rose Pilgerfahrt (“A Peregrinação da Rosa”), seu oratório de sabor decididamente folclórico, a primeira obra significativa que compôs depois da mudança para Düsseldorf, sua escala final antes do colapso mental que o levaria ao asilo. É uma pena, pois a obra toda – mais uma coleção engenhosamente alinhavada de coros e canções que um oratório no pomposo, dramático sentido do termo até então – é uma delícia de se escutar. As semelhanças com Die Paradis und die Peri, sua experiência anterior no gênero, são notórias e certamente não uma coincidência: o autor do libreto, Moritz Horn, impressionara-se com o oratório anterior e escreveu o texto sob sua instigação. O enredo é simplérrimo: uma rosa roga à Rainha dos Elfos para vir ao mundo na forma humana, para ser amada tanto quando os humanos se amam; a Rainha concede-lhe o desejo e a rosa vem ao mundo na forma de uma linda moça chamada, adivinhem? – Rosa; ela carrega sempre consigo uma flor – que vocês já adivinharam qual é – que serve como repositório de sua alegria; após algumas dificuldades em se integrar aos humanos, ela sente pena – seu primeiro sentimento humano – ao ver um sepultamento; o coveiro a abriga enquanto os elfos tentam chamá-la de volta; um moleiro que perdera sua filha, vítima dum coração partido, reconhece-a no semblante de Rosa e a convida para viver no vilarejo; Rosa casa-se com Max, um aldeão, e tem um filho com ele; quando o bebê nasce, Rosa deixa a flor em sua mão e, numa “morte cheia de amanhecer”, volta para seu mundo, onde é recebida por um coro angélico.
A música despretensiosa, ainda que cuidadosamente burilada, é talvez uma das maiores provas contra os detratores de Schumann, ligeiros em dizerem que tudo que ele escreveu em Düsseldorf foi impulsivo e descuidado. O compositor pretendia que oratório fosse ouvido em sua forma original, com pequeno coro e acompanhamento de piano, e foi nessa forma que ele foi estreado em sua casa por um coro de amigos e, naturalmente, Clara ao piano. Em seguida, dedicou-se à orquestração, uma tarefa que lhe foi muito árdua, talvez porque dividida com a atribulada atividade de Kapellmeister que tanto odiava, ainda que lhe fosse o caminho para suturar os brios cronicamente feridos pela celebridade da esposa, sempre o arrimo da família. Quem escuta a versão orquestral, no entanto, não percebe qualquer sinal de tanto desgosto e da crescente instabilidade que o levaria, alguns anos depois, a encontrar as águas do Reno numa tentativa de aniquilar-se.
Na minha desimportante opinião, as duas versões merecem ser ouvidas, e por isso ofereço-lhes ambas. Sugiro escutarem primeiro a versão com piano, aqui interpretada por um coro impecavelmente ensaiado, se possível na companhia do libreto – a singeleza das melodias e o tom folclórico podem tornar monótona a audição desatenta. Depois, escutem a versão com orquestra e perguntem-se por que um regente do porte Rafael Frühbeck (porque o “de Burgos” foi acrescentado a pedido de Franco, para que tivesse um sobrenome menos alemão) aparece recém pela primeira vez em minhas postagens – porque, se me perguntarem, eu não lhes saberei responder.
Robert Alexander SCHUMANN (1810-1856)
Der Rose Pilgerfahrt, Op. 112, sobre textos de Moritz Horn
Link para o libreto
Parte I
1 – “Die Frühlingslüfte bringen”
2 – “Johannis war gekommen”
3 – Elfenreigen. “Wir tanzen, wir tanzen”
4 – “Und wie sie sangen”
5 – “So sangen sie”
6 – “Bin ein armes Waisenkind”
7 – “Es war der Rose erster Schmerz!”
8 – “Wie Blätter am Baum”
9 – “Die letzte Scholl’ hinunterrollt”
10 – “Dank, Herr, dir dort im Sternenland”
Parte II
11 – “Ins Haus des Totengräbers”
12 – “Zwischen grünen Bäumen”
13 – “Von dem Greis geleitet”
14 – “Bald hat das neue Töchterlein”
15 – “Bist du im Wald gewandelt”
16 – “Im Wald, gelehnt am Stamme”
17 – “Der Abendschlummer”
18 – “O sel’ge Zeit”
19 – “Wer kommt am Sonntagsmorgen”
20 – “Ei Mühle, liebe Mühle”
21 – “Was klingen denn die Hörner”
22 – “Im Hause des Müllers”
23 – “Und wie ein Jahr verronnen ist”
24 – “Röslein!”
Versão para solistas, coro e orquestra
Helen Donath e Kari Lövaas, sopranos Julia Hamari, contralto Theo Altmeyer, tenor Bruno Pola, barítono Hans Sotin, baixo Chor des Städtischen Musikvereins e.V. Düsseldorf Düsseldorfer Symphoniker
Rafael Frühbeck de Burgos, regência
Christiane Oelze, soprano Birgit Remmert, contralto Werner Güra, tenor Klaus Thiem, barítono Hanno Müller-Brachmann, baixo Philip Mayers, piano RIAS-Kammerchor
Marcus Creed, regência
Gardiner acerta em cheio nesse álbum duplo dedicado a obra coral de Schumann, e o resultado é um dos melhores discos de música coral entre os tantos que tenho, inda mais ouro puro desse Midas da Música.
Os trabalhos começam com o breve (e o primeiro mandamento de nosso guia schumanniano é exatamente esse: quanto mais breve, melhor) “Requiem für Mignon”, baseado na triste menina do “Wilhelm Meister” de Goethe. Apesar do título, e da lamúria do coro de meninos, o tom é menos funesto do que a promessa, muito por conta dos “In euch lebe das bildende Kraft” (“Em vós vive a força formativa”) entoados pelo coro masculino, e o resultado é muito mais um convite a conformar-se e a tocar a vida do que a carpir a garota morta. A peça seguinte, “Nachtlied”, é tanto uma belíssima descrição da imponência da noite e do céu estrelado quanto um sentido embate entre o medo da morte e a resignação ante a mesma, representada por um sono eterno. Este rico arco sonoro, muito evocativo do anoitecer, é uma obra-prima consumada e pouquíssimo conhecida, realizada à perfeição pelo Coro Monteverdi.
Por fim, o imponente e raramente executado oratório “Das Paradies und die Peri” (“O Paraíso e a Peri”), que conseguiu tanto a proeza (rara na vida do compositor) de ser um imenso sucesso quando de sua estreia, como uma outra, ainda maior, de promover a reconciliação de Schumann e seu sogro, Friedrich Wieck, que despendeu tanta energia para impedir o casamento de Clara quanto investira para torná-la uma das melhores pianistas da Europa. Baseado num dos segmentos de “Lalla-Rokh”, um poema do irlandês Thomas Moore (não confundir com Sir Thomas More, o grande filósofo e desgraçado chanceler de Henry VIII), ele narra a história da redenção duma peri – criatura alada da mitologia persa – que, expulsa do Paraíso, tenta a ele regressar trazendo um bem precioso: a lágrima dum pecador arrependido que viu uma criança a rezar. Surfando na onda do orientalismo muito em voga da época (e o “Divã Oriento-Ocidental” de Goethe estava na biblioteca de Schumann), o exotismo está muito mais na rebuscada prosa do que em clichês musicais. O oratório é arrasadoramente lindo, e a leitura de Gardiner e seus músicos é maravilhosa. Destaco a etérea voz de Barbara Bonney, no papel da peri, que embarca com delicadeza na jornada da criatura que busca se redimir ante o Paraíso, sem que lhe falte potência para ouvir-se sobre todos os tutti orquestrais. Se há algum disco de Schumann entre esses tantos que venho publicando que escolheria para vocês não perderem, sem dúvidas é esse: asseguro-lhes de que não se arrependerão por ouvi-lo
Robert Alexander SCHUMANN (1810-1856)
Réquiem para Mignon, do “Wilhelm Meister” de Goethe, para solistas, coro e orquestra, Op. 98b
1 – No. 1: “Wen bringt ihr uns zur stillen Gesellschaft?” – No. 2: “Ach! Wie ungern brachten wir ihn her!” – No. 3: “Seht die mächtigen Flügel doch an!” – No. 4: “In euch Lebe die bildende Kraft” – No. 5: “Kinder! Kehret ins Leben zurück!” – No. 6: “Kinder! Eilet ins Leben hinan!”
William Dazeley, barítono
Membros do Knabenchor Hannover The Monteverdi Choir Orchestre Révolutionnaire et Romantique John Eliot Gardiner, regência
Nachtlied, para coro e orquestra, sobre um poema de Friedrich Hebbel, Op. 108 2 – “Quellende, schwellende Nacht”
The Monteverdi Choir Orchestre Révolutionnaire et Romantique John Eliot Gardiner, regência
Das Paradies und die Peri, oratório para solistas, coro e orquestra, Op. 50 Libreto do compositor e de Emil Flechsig, baseado em “Lalla-Rokh”, de Thomas Moore
Primeira Parte
3 – No. 1: “Vor Edens Tor im Morgenprangen”
4 – No. 2: “Wie glücklich sie wandeln, die sel’gen Geister”
5 – No. 3: “Der hehre Engel … Dir, Kind des Stamms”
6 – No. 4: “Wo find’ ich sie? Wo blüht, wo liegt die Gabe”
7 – No. 5: “So sann sie nach … O süßes Land!”
8 – No. 6: “Doch seine Ströme sind jetzt rot”
9 – No. 7: “Und einsam … Komm,kühner Held …Du schlugst”
10 – No. 8: “Weh, weh, weh, er fehlte das Ziel”
11 – No. 9 “Die Peri sah das Mal …Sei dies,mein Geschenk”
1 – No. 10: “Die Peri tritt mit … Gern grüßen wir”
2 – No. 11: “Ihr erstes Himmelshoffen … Hervor aus den”
3 – No. 12: “Fort streift von hier … Für euren ersten”
4 – No. 13: “Die Peri weint”
5 – No. 14: “Im Waldesgrün am … Ach, einen Tropfen nur”
6 – No. 15: “Verlassener Jüngling… Doch sieh… Du hier?”
7 – No. 16: “O laß mich von der Luft… Sie wankt – sie sinkt”
8 – No. 17: “Schlaf nun und ruhe in Träumen voll Duft”
9 – No. 18: “Schmücket die… Auch der Geliebten… Seht da”
Terceira parte
10 – No. 19: “Dem Sang von Ferne… Noch nicht! Treu war”
11 – No. 20: “Verstoßen! Verschlossen aufs neu das Goldportal”
12 – No. 21: “Jetzt sank des Abends goldner Schein”
13 – No. 22: “Und wie sie… Peri, ist’s wahr… Mit ihrer”
14 – No. 23: “Hinab zu… Sie schwebt… Doch horch… Und was”
15 – No. 24: “O heil’ge Tränen inn’ger Reue”
Há muito queria alcançar esse disco a vocês, mas ora me faltava a oportunidade, ora completamente o elã. Essa celebração do aniversário de Schumann, que já está na terceira semana, deu-me o pretexto que faltava. Ei-lo!
Imenso músico, cidadão do mundo, incrível figura humana: difícil falar mal de Mstislav Rostropovich, a quem a família e as multidões chamavam de Slava. Isso, claro, se tu não dessem ouvidos ao Politburo soviético, sempre reticente em permitir as turnês do grande homem pelo Exterior, onde encontrava-se abertamente com dissidentes do regime e nunca deixava de expressar sua opinião em prol da abertura de seu país.
Nunca lhe faltaram amigos, e estes lhe foram essenciais no início de seu exílio, depois que – muito por conta de suas ações cada vez mais francas de apoio à dissidência, que incluíram acolher em sua casa o desgraçado escritor Aleksandr Solzhenitsyn – teve que fugir da União Soviética com a roupa do corpo e buscar guarida nos Estados Unidos. Um de seus mais leais colaboradores no Ocidente era Benjamin Britten, que não só lhe dedicou o considerável conjunto de uma sonata para violoncelo e piano, três suítes para violoncelo solo e uma sinfonia para violoncelo e orquestra, como também o acompanhou ao piano e na regência em muitas de suas apresentações. Nesta gravação, os dois juntam forças numa apaixonada leitura do concerto de Schumann e numa breve peça de Tchaikovsky que, apesar do título caprichoso, conjura suas dores pela perda de um amigo. Apesar da qualidade da gravação deixar bastante a desejar – são, afinal, registros de rádio e televisão, coletados e lançados pela BBC -, o “som Rostropovich” e a afinação de sua parceria com Britten valem a audição.
Parceiros no palco…… amigos na vida
A gravação mais notável do disco – e uma das mais eletrizantes de todos os tempos – é a do concerto de Dvořák, uma obra-prima apreciada mesmo por quem detesta o compositor. Realizada ao vivo em Londres durante o festival The BBC Proms em 21 de agosto de 1968, tornou-se notória por acontecer exatamente no dia em que as forças do Pacto de Varsóvia, lideradas pela União Soviética, invadiram a Tchecoslováquia para esmagar os movimentos de reforma liderados por Alexander Dubček, conhecidos pela posteridade como a Primavera de Praga. Rostropovich, que amava a magnífica capital da Boêmia – onde tocava com frequência, tinha muitos amigos e, o mais especial para ele, conhecera Galina, sua esposa – ouviu impotente as notícias da invasão, enquanto colocava-se na terrível situação de a um só tempo desejar alcançar apoio e solidariedade aos tchecoslovacos enquanto personificava, como cidadão soviético, o detestado agressor ante o engajado público londrino. A ironia de estar escalado para tocar exatamente uma obra do compositor mais célebre do país invadido não colaborou para melhorar o clima da acolhida, e protestos muito pervasivos ocorreram dentro e fora do Royal Albert Hall, tanto de quem pretendia impedir os soviéticos de tocarem, quanto daqueles que defendiam seu direito de escutá-los. Slava, enfim, decidiu tocar. A Orquestra Sinfônica Estatal da União Soviética foi recebida no palco com muita hostilidade, que só aumentou quando solista e regente – o legendário Evgeny Svetlanov – entraram em cena. Os protestos continuaram – ouvem-se gritos e apupos logo no começo da gravação – e, não obstante, o concerto continuou. O que aconteceu em seguida as senhoras e os senhores poderão bem ouvir, se não quiserem em minhas palavras fúteis: uma interpretação elétrica, emocionada, incomparável da obra-prima. Conta-se que Rostropovich chorava a terminar o Adagio e que passou o resto da peça a morder os lábios. Quando terminou e veio a chuva de aplausos, Slava ergueu sobre a cabeça uma partitura com o nome do compositor, dando uma demonstração clara de sua solidariedade aos tchecoslovacos e de seu amor pelo país e por sua cultura. Mesmo temendo pelos entes que estavam na União Soviética e pela própria segurança, ele – um corajoso inimigo da injustiça – não poderia deixar de se posicionar. Fê-lo com o gesto, fê-lo com a música – e esse registro do concerto de Dvořák, especialmente seu Adagio, nunca deixará de me emocionar como uma das mais incríveis gravações jamais realizadas.
Robert Alexander SCHUMANN (1810-1856)
Concerto em Lá menor para violoncelo e orquestra, Op. 129
1 – Nicht zu schnell
2 – Langsam
3 – Sehr lebhaft
Mstislav Rostropovich, violoncelo London Symphony Orchestra Benjamin Britten, regência
Antonín Leopold DVOŘÁK (1841-1904)
Concerto em Si menor para violoncelo e orquestra, Op. 104
4 – Allegro
5 – Adagio, ma non troppo
6 – Finale: Allegro moderato — Andante — Allegro vivo
Mstislav Rostropovich, violoncelo Orquestra Sinfônica Estatal da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas Evgeny Svetlanov, regência
Pyotr Ilyich TCHAIKOVSKY (1840-1893)
Pezzo capriccioso em Si menor para violoncelo e orquestra, Op. 62
07 – Andante con moto
Mstislav Rostropovich, violoncelo English Chamber Orchestra Benjamin Britten, regência
Sim, eu sei, estou chegando um pouco atrasado nestas comemorações aos 210 anos de aniversário de Robert Schumann. Estive enrolado em outros projetos, e o dia a dia no serviço também me estressa bastante, por isso me afastei um pouco.
Minha contribuição será bem simples, mas de coração: Claudio Arrau tocando a Fantasia op. 17, dentre outras obras do mesmo compositor, senhores, que coisa mais linda. Não é a toa que é considerado um dos maiores pianistas do século XX. Esse registro é lá dos anos 60, a gravação ainda não é digital, mas mesmo assim, é impecável, um grande trabalho dos engenheiros da PHILIPS. Facilmente classificável com o selo de ‘IM-PER-DÍ-VEL’ do PQPBach.
01. Variations sur le nom d’Abegg, op. 1 – Thema
02. Variations sur le nom d’Abegg, op. 1 – Var. I
03. Variations sur le nom d’Abegg, op. 1 – Var. Il
04. Variations sur le nom d’Abegg, op. 1 – Var.Ill
05. Variations sur le nom d’Abegg, op. 1 – Cantabile
06. Variations sur le nom d’Abegg, op. 1 – Finale alla Fantasia
07. Papillons, op. 2
08. Fantaisie en ut majeur, op.17 – Il tutto fantastico ed appasionato
09. Fantaisie en ut majeur, op.17 – Moderato con energia
10. Fantaisie en ut majeur, op.17 – Lento sostenuo
11. Nachstücke, op. 23 – Mehr langsam, oft zur ck haltend
12. Nachstücke, op. 23 – Markiert und lebhaft
13. Nachstücke, op. 23 – Mit grosser Lebhaftigkeit
14. Nachstücke, op. 23 – Einfach