Olha, eu crio problemas de graça para mim mesmo. Achei que vários mereciam ganhar o CD duplo da Arte da Fuga com o Collegium Aureum, mas só tenho dois exemplares e o outro é (era) meu. Primeiro, selecionei uns dez bons, depois fui mais severo e fiquei só com três. Re-re-relendo, dei-me conta de que havia involuntariamente escolhido “o mais inteligente”, “o mais emocionante” e “o mais engraçado”. Depois do prazo, entraram mais dois sensacionais. Não entraram na seleção. Sorte minha.
Eu não escolhi o vencedor, apenas descartei “o mais inteligente” — pois tive uma convulsão e subitamente irritei-me contra a ditadura da beleza e da inteligência — e fiquei com os outros dois. Vou dar o meu CD também. É com o coração na mão que escolho “o mais engraçado”, escrito pelo Y*, pelo simples fato de que escrevi em maiúsculas no post: …EXPLICAR DE FORMA MAIS INUSITADA (ORIGINAL, SURPREENDENTE)…
Minha namorada gosta mais de Bach do que de mim…
Ok, eu também gosto mais de Bach do que dela.
E Bach gostaria mais de si mesmo do que qualquer um de nós dois.
Estamos num consenso!
E “o mais emocionante”, escrito pelo Paulo Clemente:
Bach me salvou da vergonha, após ter mijado todo o banheiro da casa da grã-fina. Pois é, história real. Quando menino cantava em um coral, e estava em excursão em Curitiba. Nas viagens ficávamos sempre hospedados em casas de família, e daquela vez, eu e outro colega menino-cantor havíamos tirado a sorte grande (ou não): uma família rica (ou podre de rica) havia nos hospedado. Bem, eu era de família muito pobre, e no dia em que chegamos, fui ao banheiro tomar banho, e vi um bidê. Como era pobre, não sabia exatamente para que ele servia, e imaginei que fosse para mijar. Pois bem, mijei, e quando acabei, para meu desespero, o bidê estava quebrado e vi que tudo tinha ido para o chão. Tentei secar o banheiro, mas só tentei. No jantar, mesa posta, formal, me reprimiram pelo meu engano. Morri de vergonha, só escapei de coisa pior porque a dona da casa me levava pra “conversar” quando vi uma miniatura de madeira de um órgão, e a fotografia de seu Papai. Ela perguntou: Vocês sabem quem é? Eu disse, todo orgulhoso: Sim, é Bach! Acho que ela preferiria que o meu colega respondesse, mas como fui eu, pude compensar meu deslize com o amor por Bach, compartilhado entre aquela velha rica e um menino-cantor de família pobre. Com vêem, Bach me salvou da vergonha por ter mijado todo o banheiro.
Além disso, agradeço a Bach por ter me antecipado 10 anos de sensação de prazer. Quando menino, não tinha toca-discos ou toca-fitas, e o único jeito de ouvir Bach era quando cantava músicas dele. Nessa época, Bach me dava as mesmas sensações de orgasmo que os outros meninos só iriam sentir depois dos 18 anos. Não aquele orgasmo solitário, escondido, que começa em geral aos 13, mas aquele orgasmo que é o clímax do amor por outra pessoa, aquele que a gente infelizmente sente só depois de um bom tempo praticando não o sexo, mas o amor. A música de Bach é música de quem goza, de quem ama. Certamente seu Papai era muito bem amado, e a música dele nos passa isso. Não sei se a velha rica de Curitiba gozava com outra coisa, mas com Bach, ah, isso ela gozava, e justamente porque gozava e viu que eu ainda que menino também gozava junto, não me repreendeu mais.
Pessoal, muitos parabéns pelo Blog, que conheci há pouquíssimo tempo. O blog de vocês, além de uma oportunidade rara de democratizar o acesso à música de qualidade, tem textos de qualidade e divertidíssimos. Há um mês sou um visitante assíduo. Parabéns e obrigado!
PQP

