.: interlúdio :. Hermeto Pascoal: Slaves Mass

.: interlúdio :. Hermeto Pascoal: Slaves Mass

IM-PER-DÍ-VEL !!!

Quem quiser piratear os meus discos, pode ficar à vontade. Desde que seja para ouvir uma boa música. (…) Mesmo o meu trabalho em gravadoras, o povo tem mais é que piratear tudo. Isso não é revolução. O que queremos é mostrar essa música universal. Porque isso não toca em rádio nem aparece na capa do jornal. Sabe o que Deus falou? Muita gente pensa que é só para transar. Mas, não. “Crescei e multiplicai-vos”. Isso é em todos os sentidos. Vamos crescer na maneira de ser e multiplicar o que tem de bom. Sem barreiras. A música é universal. Eu toco no mundo inteiro e é sempre lotado. Eu só cheguei a isso porque os meus discos são pirateados, estão à vontade na Internet.

O único motivo para Hermeto Pascoal não estar no Olimpo da humanidade – como Davis, Corea, Coleman ou Monk – é o fato de ter nascido na América do Sul. Fosse europeu ou norte-americano, seria um pilar da história da música e do jazz. Já é, mas a falta de reconhecimento, popularidade e admiração lhe tomam o lugar que deveria ocupar. Não que essas coisas preocupem, ou pareçam ter algum dia preocupado o velho bruxo. Hermeto é um artista que cabe naquela acepção tão cara a Adorno: um ungido pelos deuses e destinado a produzir sua arte sem que nada além importe, sem que nada se interponha. De muito criança já improvisava pífanos em galhos de mamona. Aprendeu a tocar o acordeão do pai aos 7. Isso em Lagoa da Canoa, um (hoje) município de 20 mil habitantes no estado de Alagoas.

Estas três últimas frases, de certa forma, podem definir muito bem a trajetória de Hermeto. Gênio inquieto, construtor de instrumentos, improvisador, extravagante. Seu estilo vocal de fazer jazz e misturá-lo a sonoridades típicas brasileiras – seja no estilo, como o choro, samba e baião, seja nos instrumentos, como o acordeão e a chaleira – pode tanto mostrar um maestro formidável quanto um ser humano que só pode haver dando vazão à tudo que sai de si como música. Quase como uma respiração ao contrário. Este Slaves Mass, de 1976, seu segundo álbum, foi quem sedimentou o nome de Hermeto no cenário do jazz mundial, onde se consagraria três anos depois, no festival de Montreaux. Além do talento imaginativo de Hermeto, notam-se influências de Wayne Shorter, Cannonball Adderley (a quem foi dedicada a faixa 4), Joe Zawinul (aqui, pode ser um exagero deste cão; mas não consigo escutar as notas brilhantes do Fender Rhodes sem pensar nele) e Miles Davis, principalmente no fusion de Star Trap. Sobre Miles e Hermeto, aliás, mais em breve.

A edição trazida aqui é a de 2004, que conta com três faixas bônus. Pela duração, é quase um outro disco-gêmeo, mais solto nas jams, generoso em harmonias cromáticas. Os arquivos estão compactados independentemente (a parte 2 contém apenas a última música).

Para quem conhece pouco do bruxo, um aviso: fique de ouvidos abertos. Que aos 72, segue lotando os lugares onde pisa, em qualquer uma das cinco formações utilizadas para se apresentar – Hermeto Pascoal e Grupo, Hermeto Pascoal e Aline Morena (sua esposa), Hermeto Pascoal Solo, Hermeto Pascoal e Big Band e Hermeto Pascoal e Orquestra Sinfônica. Quando não está viajando, mora em Curitiba. É o músico mais carismático, e grato, que já vi de verdade.

Muita gente confunde inovar com idade, com números. Muita gente pensa que, quando um menino pega um violão e sai cantando, o povo acha que aquilo é coisa nova. Tem muita gente de 18 anos tocando coisas velhas e quadradas. (…) Não é que o velho seja ruim. Mas o novo tem nascido tão velho.

Hermeto Pascoal – Slaves Mass (vbr)
Hermeto Pascoal: voz, piano, piano Rhodes, clavinet, flauta, sax soprano
David Amaro: guitarra, violão, violão 12
Alphonso Johnson: baixo, efeitos especiais
Raul de Souza: trombone
Chester Thompson: bateria
Airto Moreira: bateria, percussão, porcos
Ron Carter: contrabaixo acústico
Flora Purim: voz
Produzido por Kerry McNabb para a Warner

01 Mixing Pot 9’18
02 Slaves Mass 4’19
03 Little Cry for Him 2’11
04 Cannon 5’20
05 Just Listen 7’08
06 That Waltz 2’46
07 Cherry Jam 11’45
08 Open Field 4’25
09 Pica Pau [take 1] 14’20
10 Star Trap [part 2] 15’45

BAIXE AQUI — DOWNLOAD HERE

Se você não amar Hermeto, vai amar quem?

Boa audição!

.: interlúdio :. Vince Guaraldi Trio – A Charlie Brown Christmas

.: interlúdio :. Vince Guaraldi Trio – A Charlie Brown Christmas

Talvez em cima da hora – talvez algum leitor presenteado com um iPhone testando a conexão com seu blog favorito -, mas também lembrando de quem festeja com um almoço no dia 25, corro pra deixar aqui um dos mais populares discos de jazz de todos os tempos, The Charlie Brown Christmas. Falava em discos comerciais no post anterior? E o que dizer desse, que foi gravado sob encomenda para o especial da CBS, em 1965? Tanto que é uma das trilhas de tevê, e um dos álbuns temáticos de natal, mais vendidos de todos os tempos. Função à parte, o revezamento de trios que Vince Guaraldi propõe é excelente e funciona com perfeição, podendo inclusive ser servido à mesa.

Vince Guaraldi Trio – A Charlie Brown Christmas (192)
Vince Guaraldi: piano, arrangement
Fred Marshall/Monty Budwig: double bass
Jerry Granelli/Colin Bailey: drums

download – 57MB

01 O Tannenbaum – 5’08
02 What Child Is This? – 2’25
03 My Little Drum – 3’12
04 Linus and Lucy – 3’06
05 Christmas Time Is Here [Instrumental] – 6’05
06 Christmas Time Is Here [Vocal Version] – 2’47
07 Skating – 2’27
08 Hark! The Herald Angels Sing – 1’55
09 Christmas Is Coming – 3’25
10 Für Elise – 1’06
11 The Christmas Song – 3’17
12 Greensleeves – 5’26

Boa audição, e bom natal!

BlueDog

.: interlúdio :. Rachel Grimes: Book of leaves

.: interlúdio :. Rachel Grimes: Book of leaves

Conheci Rachel Grimes porque sou fã de sua banda, chamada Rachel’s. (A história do nome tem bem menos ego do que se pode imaginar). Sobre ela, resume bem a wikipedia: The group’s work is strongly influenced by classical music, particularly inspired by the minimalist music of the late 20th century, and its compositions reflects this. The group’s recordings and performances feature a varying ensemble of musicians, who play a range of string instruments (including viola and cello) in combination with piano, guitars, electric bass guitar, and a drum set that includes a large orchestral bass drum. Embora não esteja dito nesse trecho, Rachel’s é classificada como uma banda de post-rock — o que eu considero uma grande incorreção, apesar de não saber em que gênero enquadrá-los. A palavra “neoclássico” vem à mente, mas isso é apenas uma indicação.

Este primeiro trabalho solo da pianista e compositora Rachel vai pelo mesmo caminho. Não é jazz, mas lembra alguns momentos (os mais esparsos) de Herbie Hancock; não é música clássica, mas não soa estranho quando lhe categorizam como “contemporary classical”. Como sabemos, tudo isso faz pouca diferença — principalmente se o resultado é brilhante, e felizmente é este o caso. Rachel criou um álbum belíssimo. Os temas são curtos e entrelaçados, quase sempre bastante lentos, e com o piano a criar paisagens de tranquilidade e introspecção. E é só ele que se ouvirá no disco, além de uns passarinhos, bem no fundo, em determinados momentos. Não parece relaxante? Ao cabo de pouco mais de meia hora, fica-se com a impressão de se ter passado por um spa cerebral. Não que seja música simplista, ou fácil, ou (argh!) new age. Rachel, em solo ou com a banda, tem a virtude de criar canções que são agradáveis e ao mesmo tempo desafiam — e mais do que isso, que trazem identidade bem definida e por isso, causam saudade e fazem voltar à audição.

Rachel Grimes – Book of Leaves (2009)

download /320kbps

01 Long Before Us
02 Every Morning
03 The Corner Room
04 She Was Here
05 On The Morrow
06 My Dear Companion
07 Far Light
08 Mossgrove
09 Bloodroot
10 At the Pond
11 Starwhite
12 The Side View
13 Every Morning Birds
14 A Bed of Moss

Boa audição!
Blue Dog

.: interlúdio :. Rachel Grimes: Music for Egon Schiele / Handwriting / The Sea and the Bells / Selenography / Systems/Layers

Nos comentários do post sobre Rachel Grimes, o leitor Felipe faz menção aos discos da “banda-mãe” Rachel’s, em especial “Music for Egon Schiele”. Sendo esta uma obra tão — TÃO — bela, e dada a dificuldade em se encontrar Rachel’s em boa qualidade na internet (sem pagar), me parece que não, não fica nem um pouco deslocada a postagem da discografia do grupo aqui.

“Music for Egon Schiele” é provavelmente o disco mais indicado aos amantes de música clássica que já postei nesse blog. (Ou ainda: é o mais próximo da música clássica que já me senti.) Procuro ficar de fora dessa área porque, como é sabido entre os leitores mais antigos, este cão, além de mau ouvinte, não entende lhufas do assunto. Mas o review da Amazon me diz que não arrisco tanto assim:

Originally performed as a live accompaniment for a 1995 theater-dance production about the life of painter Egon Schiele, this is the both the exception to the Rachel’s rule and their defining moment. Though they are normally a three-headed, multiperson new-music and classical ensemble centered around Jason Noble, Christian Frederickson, and Rachel Grimes, this suite was written entirely by Grimes and performed by Grimes (on piano), Frederickson (viola), and cellist Wendy Doyle. As always, the music is spellbinding; the fact that this is classical music by –and for– people who grew up on indie rock in no way diminishes it, nor does it make the music too low-brow for those with a classical background. For a more complete picture of what the entire Rachel’s ensemble is capable of, both Handwriting and The Sea and the Bells are recommended.Randy Silver

Se a resenha acima une bem os três primeiros discos, já “Selenography” e “Systems/Layers” tem maior dose de experimentalismo (não confundir com psicodelia ou bagunça. Os Rachels são tão sérios quanto sensíveis). Meus preferidos são Music for Egon Schiele e Selenography. É música que pode ocupar meu background e me deixar mais criativo, ou que pode ocupar toda minha atenção e me deixar de queixo caído. Acho que vocês, que ainda não conhecem, deveriam tentar. Não garanto seu dinheiro de volta, mas prometo ir direto pro inferno com minhas boas intenções.

Music for Egon Schiele /1996 (v0)

Rachel Grimes (piano), Christian Frederickson (viola), Wendy Doyle (cello)

download – 72MB

01 Family Portrait
02 Egon & Gertie
03 First Self-Portrait Series
04 Mime Van Osen
05 Second Self-Portrait Series
06 Wally, Egon & Models in the Studio
07 Promenade
08 Third Self-Portrait Series
09 Trio Goes to a Movie
10 Egon & Wally Embrace and Say Farewell
11 Egon & Edith
12 Second Family Portrait

Handwriting /1995 (v0)

download – 68MB

Rachel Grimes (piano); Christian Frederickson (viola); Richard Barber (contra bass); Nat Barrett (cello); Marnie Christensen (violin); Kevin Coultas (drums); Mark Greenberg (vibraphone); Gregory King (hand drums); Michael Kurth (double bass); Eve Miller (violoncello); Jason Noble (electric bass, guitars, tapes); Jeff Mueller (orator)

01 Southbound to Marion
02 M. Daguerre
03 Saccharin
04 Frida Kahlo
05 Seratonin
06 Full on Night
07 Handwriting

The Sea and the Bells /1996 (v0)

download – 92MB

Rachel Grimes (piano, vibes, linen sheet); Christian Frederickson (viola, matchbooks); John Baker (bells); Kevin Coultas (drum set, timpani); Edward Grimes (drum kit); Thomas Hatte (contrabass); Sarah Hong (cello); Ann Kim (violin); Greg King (boatswain); Jim Maciukenas (musical saw); Matthew McBride (viola); Eve Miller (violoncello, breton plotter, notepad)

01 Rhine & Courtesan
02 The Voyage of Camille
03 Tea Merchants
04 Lloyd’s Register
05 With More Air Than Words
06 All Is Calm
07 Cypress Branches
08 The Sirens
09 Night at Sea
10 Letters Home
11 To Rest Near to You
12 The Blue-Skinned Waltz
13 His Eyes

Selenography /1999 (v0)

download – 93MB

Rachel Grimes (vocals, piano, harpsichord, keyboards); Jason Noble (guitar, keyboards, bass, percussion); Eve Miller (cello); Christian Frederickson (viola, accordion, keyboards); Dominic Johnson (viola); Edward Grimes (vibraphone, drum kit); Gregory King (percussion); Kyle Crabtree (drum kit); Steve Buttleman (trumpet); Giovanna Cacciola (vocals)

01 A French Galleasse
02 On Demeter
03 The Last Night
04 Kentucky Nocturne
05 Honeysuckle Suite
06 Artemisia
07 Old Road 60
08 An Evening of Long Goodbyes
09 Cuts the Metal Cold
10 The Mysterious Disappearance of Louis LePrince
11 Forgiveness
12 Hearts and Drums

Systems/Layers /2003 (v0)

download – 98MB

Rachel Grimes (piano, keyboards); Christian Frederickson (viola, keyboards); Jason Noble (bass, guitar, drums, toolbelt, keyboards); Kyle Crabtree (drum kit); Edward Grimes (drums, keyboards); Eve Miller (cello); Matthew Annin (french horn); Wendy Doyle (cello); Doug Elmore (stand-up bass); Jane Halliday (violin); Sarah Hill (violin); Shannon Wright (vocals); Greg King (films)

01 Moscow Is in the Telephone
02 Water from the Same Source
03 Systems/Layers
04 Expect Delays
05 Arterial
06 Even/Odd
07 Wouldn’t Live Anywhere Else
08 Esperanza
09 Packet Switching
10 Where_Have_All_My_Files_Gone?
11 Reflective Surfaces
12 Unclear Channel
13 Last Things Last
14 Anytime Soon
15 Air Conditioning/A Closed Feeling
16.Singing Bridge
17.And Keep Smiling
18.4 or 5 Trees
19 NY Snow Globe

Boa audição!
Blue Dog

Erik Satie (1866-1925) / John Cage (1912-1992): Furniture Music (Ars Nova Ensemble / Scheleiemacher)

Erik Satie (1866-1925) / John Cage (1912-1992): Furniture Music (Ars Nova Ensemble / Scheleiemacher)

E eis que este insolente cão irrompe numa madrugada de terça-feira para meter-se numa seara para si desconhecida, onde nada sabe. Ainda mais, fica no quintal de CDF Bach – e mexe com uma paixão de Clara Schumann. Mas, como se sabe, no PQP postamos o que estamos ouvindo, e como eu estava ouvindo, ora, vim postar. Desde já vou deixando o espaço em aberto, para que o próprio CDF, ou Clara, o adicionem com mais pertinência, ou ao efeito de links e novidades vindos dos comentários.

O fato é que não apenas o jazz me interessa; me interessam muitas outras coisas mais, e no terreno da música, uma delas é o ambient. E em pesquisas fui descobrir que bem antes de Brian Eno criar o “Music for Airports” em 1978, quem primeiro concebeu a idéia de uma música feita para lugares, ao invés de pessoas, foi Erik Satie.

Isso em 1920.

Satie, nome nada estranho aos freqüentadores deste blog com certeza, criou a furniture music. A música do local e dos objetos que nos cercam. De curta duração e produção, resumiu-se a cinco peças – que vem a diferenciar-se, conceitualmente, do ambient atual pelo fato de que não apresentam variação. Ou seja, são curtos temas clássicos, repetidos muitas e muitas vezes, destinados primariamente a ser pano de fundo dos intervalos no teatro francês. Apesar da intenção, um entr’act de Satie não foi bem sucedido:

Allegedly, the public did not obey Satie’s intention: they kept silently in their places and listened, trained by a habit of incidental music, much to the frustration of the avant-garde musicians, who tried to save their idea by inciting the public to get up, talk, and walk around. wikipedia

No pacote lincado logo abaixo, estão três gravações das peças da furniture music, encontradas nesta página. Além delas, há também anexada a única – que eu saiba – referência direta a este trabalho: a peça Furniture Music Etcetera, uma variação livre (de quase 21 minutos) composta por John Cage, em 1980, para Curtain of a Voting Booth.

Nestas faixas ouço uma concretude que se descortina genial pela proposta, e pelo efeito que consegue.

Se eu estiver muito maluco, me mandem vacinar.

Furniture Music, Part 1: Curtain of a Voting Booth 5’56
Furniture Music, Part 2: Tapestry of Wrought Iron: for the arrival of the guests – grand reception – to be played in an entrance hall 3’00
Furniture Music, Part 3: Phonic Tiles – may be performed at a luncheon 2’25
Ars Nova Ensemble
Marius Constant: director
Michel Dalberto: piano
Pierre Thibaudm Bernard Jeannoutot: trumpets
Erato Records 4700W

Furniture Music Etcetera 20’43
Steffen Scheleiemacher: piano
John Cage: Complete Piano Music Vol. 10
diz um reviewer da amazon: “This work is barely more than a sketch for realisation by the performer: it consists of instructions on when to play fragments of Satie and when to play fragments of Cage. Schleiermacher’s reconstruction, thus, is necessarily speculative, but it entertains for its 20 minute duration.”

BAIXE AQUI — DOWNLOAD HERE

John Cage

Boa audição!
Blue Dog

.: interlúdio :. Milt Jackson at the Museum of Modern Art (1965)

.: interlúdio :. Milt Jackson at the Museum of Modern Art (1965)

Não sei bem de onde catei essa raridade, que ganhou remasterização em nova edição deste ano. Também não posso parar agora pra procurar, ou falar sobre Milt Jackson. Ainda bem que não precisa. Saibam que o disco é lindo e majestoso. E agradeçam ao internauta misterioso pelo rip em 320kbps.

Milt Jackson at the Museum of Modern Art 1965
Milt Jackson: vibraphone
Cedar Walton: piano
James Moody: reeds
Ron Carter: bass
Otis Finch: drums

download – 80MB
01 The Quota 5’10
02 Novamo 5’54
03 Enigma 3’49
04 Turquoise 5’21
05 Chyrise 3’25
06 Montelei 5’07
07 Simplicity & Beauty 2’52
08 Flying Saucer 5’09
09 Namesake 4’24

BAIXE AQUI — DOWNLOAD HERE

Milt Jackson agradeceu a volta do link que era de 2008… Sim, nosso blog é véio pra caralho.

Boa audição!
Blue Dog

.: interlúdio :. Cannonball Adderley and the Poll-Winners / John Hendricks – A Good Git-Together

.: interlúdio :. Cannonball Adderley and the Poll-Winners / John Hendricks – A Good Git-Together

Não apenas por todas as razões musicais imagináveis, o jazz me fascina também pelas histórias, lendas, imaginário, esquinas. O componente humano desgarradamente exposto, a atmosfera dos clubs de jazz de meio século atrás; é possível ouvir ignorando o contexto, mas sem dúvida a experiência fica muito mais prazerosa e completa quando se descobrem pedacinhos dessa grande narrativa. Estes aspectos dão uma sensação de infinitude que a instituição Jazz me proporciona: não é apenas um universo, são diversos deles — e lembro de como me parecia impossível conhecer o jazz, abarcá-lo e dar sentido, quando fui provocado, há tantos anos, por um bop furioso numa (vejam só) rádio FM local. Desde então venho lentamente conhecendo-o melhor, como se cortejavam moças nos namoros antigos. Talvez esteja começando a enxergar a cerca da casa dela.

Digressão à parte, aproveitava eu o recesso de fim de ano para dar uma pesquisada sobre Wes Montgomery, que tanto admiro, quando dou de cara com uma gema completamente inesperada. Como se Toquinho tivesse feito um show acústico com Ozzy Osbourne ou Bruno largasse Marrone para fazer dupla com Madonna, descubro uma colaboração entre Wes e Cannonball Adderley!

Pequena pausa para assentar minha surpresa.


O jazz é tão generoso que me dá vários herois; fico em estado de fã com frequencia. Respeito longamente Montgomery pelo que produziu com sua guitarra, por tê-la colocado tão unica e apropriadamente no jazz, e para sempre. E Cannonball me conquistou com seu carisma inigualável — primeiro tocando, e depois ao ouvi-lo conversando com a plateia, certificando-me do grande bonachão que já transparecia ao sax. Sabia que fora Cannonball quem proporcionou uma carreira a Wes, indicando-o após um show para (o lendário produtor) Orrin Keepnews, da Riverside, mas não havia imaginado-os tocando juntos; Wes sempre havia preferido pequenas formações, e como band leader (razão que fê-lo recusar um posto na banda de Coltrane no começo dos ’60). Apesar das colaborações — Milt Jackson, Jimmy Smith, Wynton Kelly Trio — sempre esteve um pouco à parte do mundo do bebop movido a sopro.

Donde descobrir Cannonball Adderley and the Poll-Winners, de 1960, me deixou feliz como criança que ganhou gibi novo.

Os “Poll-Winners” do título referem-se às votações para melhores músicos de jazz das revistas da época — Down Beat, Metronome, Playboy. Ray Brown vencia quase sempre; além da classe, tinha uma respeitada carreira de já quinze anos, desde a banda de Dizzy Gillespie. Cannonball havia arrematado o prêmio de melhor sax alto com Somethin’ Else, e Wes fora a revelação/promessa de 1959. Apesar disso, foi um encontro quase fortuito entre os três em San Francisco, na primavera de 1960, que motivou Cannonball a reuní-los para duas sessões de gravações, 21/05 e 05/06 daquele ano.

For in view of the emphasis to be placed on guitar and bass, Adderley had felt that instrument would most suitably round out the unusual musical coloration. Then Vic sat down at the piano to run through a new tune of his, The Chant – and all of us were immediately aware that a whole lot of hip people on the West Coast had apparently been asleep for the past couple of years. Certainly there had been no words of warning to lead any of us to expect what we were hearing : a genuinely soulful (in the very best sense of that hard-worked word), and immensely swinging, playing and composing talent. Orrin Keepnews/liner notes

O disco é brilhante, como se pode imaginar — mas vou poupar adjetivos, já que minha evidente comoção pode atrapalhar uma leitura mais técnica (que absolutamente não me interessa neste caso). Basta dizer o que lhe saltará aos ouvidos: os solos de vibrafone em “Lolita”, de sax em “Azule Serape” e “The Chant”, de guitarra em “Never Will I Marry” e “Au Privave”, e todos em “Yours is My Heart Alone”. Além disso, o trabalho gentil que Wes executa ao fundo, como base quieta ao lado do piano ou contrapondo o vibrafone, é um deleite (que se presta muito bem aos fones e à atenção, inclusive). Fico imaginando a química entre Cannonball e Wes no estúdio; ambos com histórias parecidas, de grandes esforços para chegar até ali, provindos de famílias de músicos. Evidentemente fui atrás de mais informações e, para minha felicidade completa, descobri que “The Poll-Winners” foi a segunda, e última, colaboração entre eles. A segunda!

(Fico pensando que ouvinte eu seria sem a internet.)


Encontrar a primeira foi até mais fácil, e em melhor qualidade. Foi em 1959, num álbum fronteado por um nome que não conhecia: Jon Hendricks. Logo depois fiquei sabendo que foi precursor do scat singing, recebeu a alcunha de “Poet Laureate of Jazz” e a Time chamou-o de “James Joyce of Jive” — porque foi também um pioneiro do vocalese (a substituição de um instrumento solo pela voz, mas com letras “verdadeiras”, não apenas as sílabas do scat). O time que Hendricks reuniu para seu primeiro disco solo era uma grande festa de família: Monk, Buddy e John Leslie “Wes” Montgomery, Nat e Julian “Cannonball” Adderley; além de Pony Poindexter (saxofonista com grande folha de serviços prestados, incluindo Bird e Lionel Hampton, e depois Eric Dolphy) e outros músicos.

Sem saber bem o que esperar, fui ao disco sem expectativas; a princípio não gosto de voz no jazz (embora sempre haja Louis, Ella, Billie, Sarah. Ainda bem!). A descrição de Hendricks no parágrafo acima dá bem o serviço: por cima de faixas velozes, muito animadas e abraçadas ao swing, Jon canta — seja à crooner mesmo, ou solando em scat. E como canta! E ainda escreve bem! Impossível não sorrir com as letras de “Feed Me” ou “Social Call”. E para além da performance de Hendricks, ouve-se muito bem Wes e Buddy; Cannonball, além de dobrar firmemente algumas linhas com Nat, tem seu momento na faixa-título, improvisada na hora da gravação. (Apesar de não ganhar crédito, à época; afinal já tinha contrato com a Riverside. Foi para as liner notes como “Blockbuster and his Brother”. Ou como escreveu o próprio Hendricks: “…And we got two more brothers who toil in other vineyards and who cannot be accurately mentioned, but they are “Blockbuster” and his brother and your ears will tell you who they are. They sure did warm up the studio with their alto and cornet. (You don’t know yet?)”)

Dois discos que vão além deles mesmos; são cacos das infindáveis histórias do jazz. Como poucos outros, estou ouvindo-os babando. (Querem o quê de um cachorro?)

Cannonball Adderley and the Poll-Winners /1960 (192)
download – 60MB

Cannonball Adderley, alto sax; Wes Montgomery, guitar; Victor Feldman, piano/vibes; Ray Brown, bass; Louis Hayes, drums. Produzido por Orrin Keepnews para a Riverside

01 The Chant (Feldman)
02 Lolita (Harris)
03 Azule Serape (Feldman)
04 Au Privave (Parker)
05 Yours Is My Heart Alone (Lehar)
06 Never Will I Marry (Loesser)
07 Au Privave [alt take]

John Hendricks – A Good Git-Together /1959 (V0)
download – 55MB

Jon Hendricks, vocals; Norwood “Pony” Poindexter, alto sax; Guildo Mahones, piano; Wes Montgomery, guitar; Monk Montgomery, electric bass; Buddy Montgomery, vibes; Ike Issac, bass; Walter Bolden, drums; Jimmy Wormsworth, drums; Cannonball Adderley (credited as “Blockbuster”), alto sax; Nat Adderley, cornet. Produzido por Richard Bock para a Pacific Jazz

01 Everything Started on the House of the Lord (Hendricks)
02 Music in the Air (Gryce)
03 Feed Me (Hendricks)
04 I’ll Die Happy (Hendricks)
05 Pretty Strange (Weston)
06 The Shouter (Mahones)
07 Minor Catastrophe (Hendricks)
08 Social Call (Gryce)
09 Out Of the Past (Golson)
10 A Good Git-Together (Hendricks)
11 I’m Gonna Shout (Everything Started on the House of the Lord) (Hendricks)

cannonballBoa audição!
Blue Dog

.: interlúdio :. An Evening with Herbie Hancock & Chick Corea: In Concert

.: interlúdio :. An Evening with Herbie Hancock & Chick Corea: In Concert

O que temos aqui hoje é fruto de um atraso. Deveria tê-lo postado dias atrás, mas não pude. Porque este não é bem um álbum de fim de semana. Não como vocês possam ter notado em outras oportunidades – quando procuro trazer gravações mais leves, simples e prazerosas do que desafiadoras ou introspectivas. Por outro lado, às vezes tanta reverência mais engana e confunde do que ajuda a ouvir uma obra. Só não incomoda mais do que introduções longuíssimas como essa. Adiante.

Herbert Jeffrey Hancock e Armando Anthony Corea andaram sempre muito próximos em suas carreiras. Têm quase a mesma idade (Herbie de 1940, Chick de 41), chegaram a New York em 62-63, aprimoraram sua técnica e gravaram discos fabulosos durante essa década, e se lançaram a liderar projetos ousados durante os 70 – o primeiro com seu jazz-funk, o segundo como maior expoente do fusion (no Return to Forever). Ambos alcançaram alto grau de status e popularidade, e redescobriram sua própria sonoridade sob a batuta de Miles Davis. Hancock tocou em seu grupo de 1963 a 69; e Corea, substituindo o próprio, naquele ano e no seguinte. Os dois gravaram Bitches Brew e tornaram-se apaixonados pelo avant-garde e pela experimentação rock/elétrica que então começava a se conectar ao jazz. Quando partiram para seus projetos nos anos seguintes, seriam os principais expoentes desse novo estilo, e atingiriam altíssimos graus de popularidade.

Por isso, foi com surpresa que o público recebeu a notícia de uma turnê reunindo os dois pianistas – e mais ninguém – em espetáculos acústicos. Isso já era 1978, e a crítica abençoou o que chamou de “retorno ao jazz”, dando sinais de cansaço e nostalgia pela raiz que parecia ofuscada. De quatro shows em fevereiro, foram extraídas seis faixas – desafios infinitos de improviso, feeling e conversações entre dois pianistas altamente técnicos e de vanguarda. “Someday my Prince will Come” era conhecida de ambos dos shows com Davis; em “Liza”, homenageiam Bill Evans; “Button Up” e “February Moment” são improvisos, criatividade e talento vertente. Os sucessos fecham o show – “Maiden Voyage”, de Hancock, e “La Fiesta”, de Corea. A ordem do disco é a mesma apresentada nos shows. As participações da platéia foram mantidas, o que mantém a atmosfera acolhedora de um concerto como esses. Escute Hancock no canal esquerdo e Corea no direito. Complexo e exigente, em momentos doce, latino e divertido; sejam bem vindos a um dos maiores concertos de jazz de todos os tempos.

.oOo.

An Evening with Herbie Hancock & Chick Corea: In Concert

Produzido por Herbie Hancock & David Rubinson para a Columbia

disco 1
01 Someday My Prince Will Come (Churchill, Morey) 12’39
02 Liza (All the Clouds’ll Roll Away) (Gershwin, Kahn) 9’00
03 Button Up (Corea, Hancock) 17’37

disco 2
04 Introduction of Herbie Hancock by Chick Corea 0’41
05 February Moment” (Hancock) – 15’47
06 Maiden Voyage” (Hancock) 13’31
07 La Fiesta” (Corea) 22’02

BAIXE AQUI — DOWNLOAD HERE

Boa audição, e bom final de semana!

Homens elegantes

Bluedog

.: interlúdio :. Miles Davis: In a Silent Way

Às vezes quero postar algo mais contemporâneo ou diferente, e me pego pensando – mas e aquele disco? Tão importante, que não postei ainda?

Por isso, deixo Nicholas Payton para depois e lhes trago a majestosidade de In a Silent Way.

A data da gravação é 18 de fevereiro de 1969. Os mais próximos da discografia de Miles Davis sabem o que isso significa: nada de bop. O final dos anos 60 marca a tomada de direção em rumo ao fusion – mais um estilo com sua assinatura na certidão de nascimento. Ao agregar instrumentos elétricos ao jazz, aceitou a provocação do rock; e antes de quebrar as estruturas do jazz tradicional no (estupefaciente) “Bitches Brew” (1970), Miles cimentou a base do fusion (toda fama de Dave Brubeck) neste álbum. Não somente na música, também na produção: ativo na edição, realizou um segundo trabalho de composição e arranjo para o resultado final. As frases desconexas, muitas vezes, tiveram sua atonalidade amplificada estruturalmente pelo artista.

São duas faixas; uma por lado, batendo nos vinte minutos. Na verdade, cada música é dividida em três partes – veja logo abaixo para as divisões (apenas didáticas) exatas. Notarão que o último segmento tem o mesmo nome do primeiro; propositadamente, a última parte é uma repetição da primeira. Miles compôs as peças num esquema exposição, desenvolvimento e recapitulação, com o intuito de que fossem melhor assimiladas. Exagero. Duas magníficas viagens de jazz ora harmônico e tranquilo, noutras livre e swingado como nos anos 20, em grooves que lembram o berço da raça de Davis, e em solos de virtuosismo poucas vezes reunido. Não vou precisar falar sobre os integrantes da gravação; a ficha técnica logo abaixo da capa diz tudo. (Estão perdoados por interrogações ao baterista, mas somente.) Apenas destaco que dos três pianos operados, o Fender Rhodes de Corea não é apenas uma delícia para os ouvidos, mas também um aceno do que ocorria em 1969, do lado de fora do estúdio B da Columbia, em Nova Iorque.

Miles Davis – In a Silent Way (256)

01 Shhh/Peaceful (Davis) – 18’16
Shhh – 6’14
Peaceful – 5’42
Shhh – 6’20

02 In a Silent Way/It’s About That Time – 19’52
In a Silent Way (Zawinul) – 4’11
It’s About That Time (Davis) – 11’27
In a Silent Way – 4’14

Miles Davis: trumpet
Wayne Shorter: soprano saxophone
John McLaughlin: electric guitar
Herbie Hancock: electric piano
Chick Corea: electric piano
Joe Zawinul: organ
Dave Holland: bass guitar
Tony Williams: drums(muito bem) Produzido por Teo Macero para a Columbia

download AQUI

Boa audição!

Blue Dog

.: interlúdio :. Indigo Jam Unit + Quasimode :.

.: interlúdio :. Indigo Jam Unit + Quasimode :.

Apesar de algumas carrancas, fiquei especialmente feliz com o resultado do último interlúdio — o jazz supraenergético do Soil & “Pimp” Sessions. Que uma parte do público deste blog é deveras conservador, já se sabia; o que eu seguidamente me pergunto, ao preparar as postagens para cá, é quão inovadores, permeáveis e, principalmente curiosos outros grupos de leitores podem ser. E ao abraçar o Japão com o groundbreaking jazz do S&PS, as respostas que chegaram pelos comentários foram gratificantes. Como, por exemplo, tangenciou o Juan Carlos Bosco: é preciso louvar as novas iniciativas em torno do jazz. Não se trata exatamente de falar em “renovação” — palavrinha que traz um ranço indesejado, de que o antigo não presta mais —, mas de re-interesse, re-despertar. Mais do que fazer jazz de uma forma leve, arejada, os novos combos que lotam pubs de Nagoya, Tokyo e Osaka estão formando novas gerações de ouvintes de jazz; e estão mostrando que o estilo não serve apenas para ouvir em casa, ou em lounge bars de personalidade molenga.

Não sei o que vocês acham, mas este cão fica sorrindo ao imaginar que, em “botecos” japoneses, tem gente que sai para dançar jazz ao invés de dance music. Curtir ativamente um estilo que parece renegado ao easy listening, pano de fundo, ao menos em nosso país.

Nada mais justo, portanto, que continuar nosso passeio pelo Japão. O post de hoje traz outros dois sensacionais combos — que, ao contrário do S&PS, são menos “barulhentos” e caminham mais próximos ao jazz tradicional, embora sem perder as doses generosas de groove, e os toques de latinidade, que marcam este particular DNA. Aliás, que não fique dúvida: tanto o Indigo Jam Unit quanto o Quasimode tem uma formação básica que inclui bateria e percussão fixas, além de double bass e piano.

O Indigo Jam Unit não precisa de mais nada; suas faixas são calcadas principalmente no baixo, que divide a maior parte da atenção com os belos riffs de piano. Apesar de um toque de nu-jazz, sua base é bop, e com muito a dever ao jazz modal, principalmente o dos anos 60. E boas composições: além de repletas de swing, são faixas que permanecem nos ouvidos e na memória (ouça Rumble, com um solo de piano de tirar o fôlego, e Time, com sua percussão marcante, e concorde comigo). Não só isso; é um álbum bastante cinemático, com muito movimento, e uma trilha sonora grandiosa pra quem se aventura com mp3 portáteis nas ruas da cidade.

Já o Quasimode, apesar de ter a mesma formação de base, utiliza convidados nos metais; no disco presente, um par de trumpetes e um sax alto, se identifiquei bem (impossível achar a listagem completa do cd na internet. Estamos tratando de grupos ainda pouco conhecidos fora do país de origem). Havia dito que o Indigo Jam Unit tem um feeling sessentista? Pois este disco do Quasimode não é apenas o feeling, mas também homenagem. A banda, que neste ano ganhou a chancela Blue Note de qualidade, resolve fazer uma releitura de clássicos daquela década, tocando standards de artistas do catálogo de sua nova gravadora. O resultado é um disco bastante coeso de jazz contemporâneo: das três bandas japonesas apresentadas, esta é a que tem raízes mais expostas — embora as faixas puxadas no soul e nos bongôs e ton-tons deixem claro de que não se trata de um disco antigo.

Para além de um jazz muito bem feito, tenho um particular carinho ao saber que ouço música ao mesmo tempo tradicional e inovadora, gravada do outro lado do mundo, e nos dias de hoje. (Estas duas bandas, inclusive, lançaram novos álbuns no começo deste mês.) Espero que vocês sigam comigo nessa jornada!

Indigo Jam Unit – Pirates /2008 (V2)
download – 65MB

樽栄嘉哉: keyboards
笹井克彦: double bass
和佐野功: percussion
清水勇博: drums

01 Pirates
02 Rumble
03 Giant Baby
04 Arctic Circle
05 Himawari
06 Time
07 Nostalgia
08 Trailer
09 Raindrop

Quasimode – Mode of Blue /2008 [V2]
download – 86MB

Yusuke Hirado: keyboards
Takahiro Matsuoka: percussion
Sohnosuke Imaizumi: drums
Kazuhiro Sunaga: bass

01 mode of blue(新曲/ブルーノート・トリビュート曲)
02 On Children (Jack Wilson)
03 Afrodisia (Kenny Dorham)
04 Little B’s Poem feat. Valerie Etienne (Bobby Hutcherson)
05 The Loner (Donald Byrd)
06 No Room For Squares (Hank Mobley)
07 Congalegre (Horace Parlan)
08 Ghana (Donald Byrd)
09 Sayonara Blues (Horace Silver)
10 African Village (McCoy Tyner)
11 Night Dreamer (Wayne Shorer)

Boa audição!

Os japas do Quasimode
O pessoal do Quasimode

Blue Dog

.: interlúdio :. Chick Corea & Béla Fleck: The Enchantment

.: interlúdio :. Chick Corea & Béla Fleck: The Enchantment

Acostumar-se à música digital, sem o suporte físico do toque, tem dessas: ganhei este disco de presente há algumas semanas, e simplesmente acabava não lembrando de escutá-lo. O mp3 não requer manuseio e as operações vão ficando obsoletas. Até poderia tê-lo baixado da internet e mantido o cd na estante, com plástico e tudo; cada vez mais, a mídia física vira, pura e simplesmente, item de colecionador.

Mas a verdade é que quando o coloquei para rodar, me arrependi instantaneamente de não ter ouvido antes. Colaboração contemporânea de um jazz refinadíssimo, este The Enchantment, gravado no ano passado — este post é de 2008 — por Chick Corea, é um duo com Béla Fleck — um músico do qual eu jamais havia ouvido falar. Seu instrumento? O banjo.

Coçando a cabeça com a pata traseira. Banjo não é coisa de música country?

Se o amigo leitor levantou a sobrancelha como eu fiz ao descobrir a informação no encarte do cd, saiba que está proibido de ter qualquer tipo de preconceito. Escrevo ouvindo o que se repete nos meus ouvidos várias vezes por dia desde então: a faixa 3, Joban Dna Nopia. Corea, de quem não conhecia gravações mais recentes, pelos céus! — está cada vez melhor, mais sábio e mais cativante. Suas frases são carregadas de um brilho muito particular, como se estivesse sorrindo, feliz, relaxado, divertindo-se, derramando-se generosamente para o público. Enquanto isso, Béla – que é americano, mas veja seu nome completo: Béla Anton Leoš Fleck (adicione Bártok, Dvořák e Janáček para descobrir o destino que seus pais lhe desejaram no nascimento) – desenvolve com muita personalidade e domínio técnico a sonoridade curta e metálica do banjo. Seja fazendo fundo para os solos de Corea ou o inverso, o casamento entre os timbres é fascinante e hipnótico. Também por inusitado, mantém a atenção do ouvinte o tempo todo, já que são variações pouquíssimo exploradas por nossa audição. Que é tratada com muito carinho durante todo este álbum.

Belo, por vezes lúdico, revigorante e atrator de bons augúrios; espero que esta seja uma valiosa surpresa para vocês, também.

The Enchantment – Chick Corea and Béla Fleck (224)
Chick Corea: piano
Béla Fleck: banjo

Produzido por Chick Corea e Béla Fleck para a Concord

01 Señorita (Corea) 5’20
02 Spectacle (Fleck) 4’40
03 Joban Dna Nopia (Corea) 6’28
04 Mountain (Fleck) 3’53
05 Children’s Song #6 (Corea) 4’02
06 A Strange Romance (Fleck) 4’46
07 Menagerie (Fleck) 5’53
08 Waltse for Abby (Fleck) 3’02
09 Brazil (Barroso, Russell) 5’58
10 The Enchantment (Corea) 5’39
11 Sunset Road (Fleck) 4’36

BAIXE AQUI — DOWNLOAD HERE

bluedog

.: interlúdio :. John Zorn – A Dreamers Christmas

.: interlúdio :. John Zorn – A Dreamers Christmas

Não, não é preciso tirar as crianças da sala. Tio Zorn fez um disco de natal, sim, mas que é verdadeiramente cândido como um… disco de natal. Não, nada de torrentes agressivas de saxofone; na verdade nem há um saxofone nesse álbum. Mas, estranhamente, há uma guitarra havaiana, que reforça o clima de algumas canções: algo lounge, lembrando um tantinho o Beach Boys Christmas Album. Uma faixa puxa para o blues, e outras ainda são verdadeiramente peças de jazz onde se pode facilmente ignorar a temática. Apesar da mistura de estilos, o talento de Zorn se destaca exatamente na composição da banda e na sofisticação dos arranjos, que dão a uniformidade necessária. E ele ainda se sai (bem) com duas composições em meio aos standards: “Santa’s Workshop” and “Magical Sleigh Ride”.

O resultado é francamente agradável, e pra mim, uma surpresa; que quer o Zorn, judeu de quatro costados, Radical Jewish Culture series etc, tocando música de natal? Pesquisei, e deu o óbvio: lembranças de infância. A família dele celebrava o natal e esse disco é uma homenagem àqueles tempos, e uma tentativa de renovar as opções do catálogo disponível. Óbvio, justo, e possivelmente o melhor disco de natal já feito, junto com aquele do Charlie Brown.

John Zorn – A Dreamers Christmas /2011 [320]
John Zorn, producer, arranger;
Cyro Baptista, percussion;
Joey Baron, drums;
Trevor Dunn, bass;
Mike Patton, vocal;
Marc Ribot, guitars;
Jamie Saft, keyboards;
Kenny Wollesen, vibes, chimes, glockenspiel

download – 109MB

01 Winter Wonderland
02 Snowfall
03 Christmas Time is Here
04 Santa’s Workshop
05 Have Yourself a Merry Little Christmas
06 Let it Snow! Let it Snow! Let it Snow!
07 Santa Claus is Coming to Town
08 Magical Sleigh Ride
09 The Christmas Song

Feliz 2023!

Blue Dog

.: interlúdio :. Tigran Hamasyan + Areni Agbabian

Não gosto de começar uma resenha de música pelas credenciais do protagonista; parece um apelo à autoridade, um canetaço ineficaz (adianta carteirinha de virtuose se a obra não fala por si?), e um habeas corpus preventivo da resenhista em questão. Mas vejam bem, por favor me permitam notar, que o pequeno Tigran tocou piano em um palco pela primeira vez aos TRÊS ANOS de idade. Não, não sei qual palco, nem de que tamanho, nem se tocou Mozart ou a versão local de Atirei o pau no gato; não especificaram. De toda forma, em 2006 ele conquistou o 1º lugar no prêmio do Thelonious Monk Institute of Jazz, então taí a prova de que aquele talento infantil floresceu e se concretizou. (Se é que prêmio prova alguma coisa. Não, não sei se o instituto de jazz é quente, mas sob o nome do Monk, vale botar fé; ainda que confusamente tenha sido renomeado pra Herbie Hancock Institute of Jazz em 2019. Achei deselegante. Nada contra o Hancock, mas… enfim, essa é outra conversa.)

Hamasyan foi pra escola de jazz aos 9, e continuou os estudos de música na adolescência, quando sua família se mudou para a Califórnia. Mais tarde, retornou à Armênia, e fixou residência em Yerevan. Esse movimento é claro em sua música, que não somente tem influência do jazz west coast americano (e do prog rock), mas também da tradição do folk armênio, incorporando suas escalas e tonalidades. Da mais de dezena de álbuns lançados desde 2006, Shadow Theater, seu segundo para a Verve, é o que mais permanece comigo; em especial pela faixa abaixo, “The Poet”, uma deliciosa e sensível jornada de sofisticado jazz-pop que gruda no ouvido e narra melancolicamente noites tristes e solitárias.

Mas não fica por isso; Tigran demonstra um vocabulário bastante variado, que vai de momentos jazz-trio tradicional e baladas neoclássicas a composições sincopadas que remetem ao zeuhl, como “Alternative Universe”, também nesse álbum. Mas é só dar uma pesquisada no youtube pra perceber que, enquanto bom jazzista, o bicho brilha mesmo é ao vivo — como nessa versão de solos empolgantes da faixa acima, e que bate nos 20 minutos. Outro ponto forte desse álbum é a banda que lhe acompanha, e chama a atenção imediatamente o etéreo canto feminino que divide os vocais.

Não fui só eu que notei; depois de gravar e fazer tournées com Hamasyan, e lançar um disco independente, a sempre antenada ECM foi lá e pescou Areni Agbabian. A americana, que segue a carreira de seu pai, um folclorista armênio, desenvolve sua música calcada na linguagem musical de seus ancestrais, também tomando o piano como instrumento principal, complementando sua voz. O resultado surgiu em Bloom, de 2019; um álbum de canções leves, esparsas, de qualidade quase espectral. “Sereno e surreal na mesma medida“, como bem definiu a AllAboutJazz. Tendo a seu lado um percussionista, que se mantém respeitosamente tímido e, de forma brilhante, se contenta em meramente pontuar e acentuar os devaneios sonoros de Areni, o disco se revela frágil, intimista, e definitivamente belo. Mas não apenas; entre as canções, pequenas vinhetas visitam o avant-garde e trazem experimentações cinemáticas e desconcertantes, demonstrando a curiosidade e as pretensões da jovem artista.

Tigran Hamasyan – Shadow Theater (2013). Aqui.
Areni Agbabian – Bloom (2019). Aqui.

— Blue Dog
bjinos pro Caxo pela dica do Tigran~

.: interlúdio :. Kaori Muraji

.: interlúdio :. Kaori Muraji

Considere o vídeo abaixo:

Seguindo o caminho do interlúdio anterior, continuamos ouvindo violões, por que não. E sobre Kaori, bem; é jovem, linda, e toca de olhos fechados. Que dizer mais? Era daquelas crianças-prodígio, aprendeu a tocar violão com o pai aos três anos, e dali em diante foi conquistando competições e prêmios internacionais — até ser a primeira artista japonesa a assinar um contrato internacional com a Decca.

Credenciais à parte, os ouvidos notam que Kaori leva tudo muito a sério. Tem uma técnica impecável, e suas escolhas nos arranjos não costumam ser bem comportadas. Dos quatro álbuns desde post — talvez 1/5 de sua discografia — , três são de repertório erudito, e se o próprio Joaquín Rodrigo, pouco antes de sua morte, elegeu-a como sua voz no século XXI, a resenha do AMG para “Plays Bach” é bem menos elogiosa. (Este cão, que sabidamente não entende lhufas de música erudita, gostou bastante da segunda parte do cd, em que ela toca sozinha.) O último disco do post é de repertório popular, bem ao estilo balaio de gatos, misturando West Side Story à International Socialista — e se eu prefiro mastigar vidro a ouvir Tears in Heaven outra vez nesta ou em qualquer outra vida, há momentos realmente sublimes, como Jongo, Sunburst e até Merry Christmas Mr. Lawrence (no vídeo abaixo, numa parceria muito bem concatenada com o próprio Saka).

Dito isto, aos álbuns? Blue Dog recomenda a ordem cronológia/de postagem mesmo; Lumières é fabuloso.

P.S.: Atendendo a pedidos, e não tão longe do contexto, participamos que o post de Wes Montgomery para “Full House” foi atualizado com um rip em V0. E no mesmo post foi adicionado um outro álbum — que você também deveria ouvir. Ctrl+clique o link acima pra não esquecer.


Kaori Muraji – Lumières /2005 [V0]
Kaori Muraji: guitar
download / 107MB

01 Gymnopedie No. 1 (Satie)
02 Gymnopedie No. 3 (Satie)
03 La fille aux cheveux de lin (Debussy)
04 Pavane Pour Une Infante Defunte (Ravel)
05 Saudade No. 3 (From Trois Saudades): I Rituel (Dyens)
06 Saudade No. 3 (From Trois Saudades): II Danse (Dyens)
07 Saudade No. 3 (From Trois Saudades): III Fete Et Final (Dyens)
08 2 Barcarolles, Op.60: I Lent, Calme, Dans Une Quietude Expressive (Kleynjans)
09 2 Barcarolles, Op.60: II Allegro (Kleynjans)
10 Fantasie Pour Guitare: I Resolu (De Breville)
11 Fantasie Pour Guitare: II Lent (De Breville)
12 Fantasie Pour Guitare: III Trés Vite (De Breville)
13 Gnossienne No 1 (Satie)
14 Water Color Scalor: I Prelude (Yoshimatsu)
15 Water Color Scalor: II Intermezzo A (Yoshimatsu)
16 Water Color Scalor: III Dance (Yoshimatsu)
17 Water Color Scalor: IV Intermezzo B (Yoshimatsu)
18 Water Color Scalor: V Rondo (Yoshimatsu)
19 Claire de Lune from Suite Bergamasque (Debussy)
20 Summer Knows Theme from “The Summer of ’42” (Legrand)


Kaori Muraji – Viva! Rodrigo /2007 [V0]
Kaori Muraji, guitar; Orquesta Sinfónica de Galícia, reg. Viktor Pablo Pérez. Música de Joaquín Rodrigo
download / 97MB

01 Concierto de Aranjuez – Allegro con spirito
02 Concierto de Aranjuez – Adagio
03 Concierto de Aranjuez – Allegro gentile
04 Sones en la Giralda
05 Concierto para una fiesta – Allegro deciso
06 Concierto para una fiesta – Andante calmo
07 Concierto para una fiesta – Allegro moderato


Kaori Muraji – Plays Bach /2008 [V0]
Kaori Muraji, guitar; Leipzig Bachorchester, reg. Christian Funke
download / 113MB

01 Cembalo Concerto No.2 in E major, BWV 1053 – I. Allegro
02 Cembalo Concerto No.2 in E major, BWV 1053 – II. Siciliano
03 Cembalo Concerto No.2 in E major, BWV 1053 – III. Allegro
04 BWV 1068 Air on the G string
05 Cembalo Concerto No.5 in F minor, BWV 1056 – I. Allegro
06 Cembalo Concerto No.5 in F minor, BWV 1056 – II. Largo
07 Cembalo Concerto No.5 in F minor, BWV 1056 – III. Presto
08 BWV 147 Choral Jesus bleibet meine Freude
09 Partita No.2 in D minor, BWV 1004 – I. Allmanda
10 Partita No.2 in D minor, BWV 1004 – II. Corrente
11 Partita No.2 in D minor, BWV 1004 – III. Sarabanda
12 Partita No.2 in D minor, BWV 1004 – IV. Giga
13 Partita No.2 in D minor, BWV 1004 – V. Ciaconna
14 Menuet, BWV Anh. 114 & 115


Kaori Muraji – Portraits /2009 [320]
Kaori Muraji, guitar
download / 156MB

01 Merry Christmas Mr. Lawrence (Sakamoto)
02 Tango en Skai (Dyens)
03 Tears In Heaven (Clapton)
04 Jongo for guitar(Bellinatti)
05 Energy Flow (Sakamoto)
06 What a Friend We Have in Jesus(Converse)
07 Internationale (De Geyter)
08 Amours Perdues (Kosma)
09 Secret Love (Fain)
10 Porgy and Bess – Summertime (Gershwin)
11 West Side Story – I Feel Pretty (Bernstein)
12 West Side Story – Maria (Bernstein)
13 West Side Story – America (Bernstein)
14 Nocturne No.2 in E flat, Op.9 No.2 (Chopin)
15 Thousands of Prayers (Tanikawa)
16 Träumerei (Schumann)
17 Love Waltz (Neumann)
18 Introduction To Sunburst/Sunburst (York)
19 In My Life (Lennon / McCartney)

Boa audição!
Blue Dog

.: interlúdio :. Human Feel: Galore / John Zorn & Masada String Trio: Haborym — The Book Of Angels Vol 16 / Trio of Doom: Trio of Doom

.: interlúdio :. Human Feel: Galore / John Zorn & Masada String Trio: Haborym — The Book Of Angels Vol 16 / Trio of Doom: Trio of Doom

Bem mais Blue do que Dog, este seu Blue Dog foi acometido por uma belíssima crise de tendinite nos últimos tempos. Parcialmente imobilizado, venho mantendo distância do computador; por sorte ainda sobrou a mão esquerda para apertar o botão de play, o que me tem garantido a sanidade. Mas nada temam, que já vou quase novo. Como ainda me recupero, que tal um post papo curto, com alguns dos discos que eu pretendia ter trazido nesse meio tempo?

Human Feel – Galore /2007 [V0]

Comigo, esse foi um daqueles álbuns que a gente pega sem qualquer pretensão, e meia hora depois se pergunta “mas como é que eu não conhecia isso?” Quarteto sem baixo, com dois sax, guitarra e bateria, nesse disco não começa promissor, até que entra a deliciosamente modal Fuss; a hermepascalínica Cat Heaven; a jazz-metálica Improve. Pra além dessas três, que valem o disco, há muita beleza, inclusive cacofônica, pra ser encontrada.
download – 90MB

01 Tap Master
02 After the Fact
03 Fuss
04 Cat Heaven
05 Improve
06 Fuck the Development of You
07 Serenade
08 Apch Ro Ha
09 Allegiance

John Zorn / Masada String Trio – Haborym: The Book Of Angels Vol 16 /2010 [V0]

Quem sabe, já clicou no link; quem não sabe, que se aventure pelos sabores judaicos do jazz. Como de praxe, os arranjos de Zorn são fabulosos, e a mixagem é fantástica.
download – 78MB

01 Turel
02 Tychagara
03 Carniel
04 Bat Qol
05 Gamrial
06 Elimiel
07 Techial
08 Umikol
09 Malkiel
10 Raamiel
11 Gergot

Trio of Doom – Trio of Doom /2007 [V0]

John McLaughlin na guitarra, Jaco Pastorius no bass, e Tony Williams na bateria. Faixas 1 a 5 gravadas em 3 de março de 1979, no Teatro Karl Marx de Havana, Cuba. Faixas 6 a 10 gravadas cinco dias depois, em Nova Iorque. Edição de 2007 da Legacy. Grande abraço.
download – 75MB

01 Drum Improvisation (Williams)
02 Dark Prince (McLaughlin)
03 Continuum (Pastorius)
04 Para Oriente (Williams)
05 Are You the One, Are You the One? (McLaughlin)
06 Dark Prince
07 Continuum
08 Para Oriente [alt take one]
09 Para Oriente [alt take two]
10 Para Oriente

Boa audição!
Blue Dog

.oOo.

PQP acaba de ouvir os 3 CDs e vai meter sua colher torta: o primeiro é bom, o segundo é esplêndido e o terceiro são três craques com o mesmo resultado de Edmundo, Romário e Sávio no ataque do Flamengo. Ou seja, achei fraquíssimo. Mas é apenas a minha opinião, não vá atrás.

.: interlúdio :. Cannonball & Coltrane

Ainda esses tempos falávamos dos álbuns memoráveis do finalzinho da década de 50. Venho engrossar a lista: gravado em Chicago no dia 3 de fevereiro de 1959, Cannonball & Coltrane é uma sessão do Miles Davis Sextet – sem o líder, claro. Com o chefe longe, Julian Adderley comandou uma bela e descontraída (no feeling, jamais na execução) tarde/noite de perfeito hard bop. Não que tenha deixado Trane em segundo plano; pelo contrário, deu espaços e valorizou, inclusive, suas composições. O trio Kelly / Cobb / Chambers dá o show usual. Talvez quem se sobressaia na cozinha seja este último, que galga incansavelmente o braço de seu baixo durante toda a gravação.

Nos saxofones sincopados em estéreo (Adderley está na esquerda, Trane na direita) de Limehouse Blues, no riff épico e pré-sessentista de Stars Fell On Alabama (belíssimo solo de Coltrane) ou na altíssima velocidade de Grand Central, nota-se um disco tão polido, tão bem executado, que se entende porque o bop estava sumindo do cenário. O que fazer depois de um disco como esse, por exemplo? Qualquer coisa, menos hard bop. Se nada é definitivo, esse álbum é, ao menos, verbete de enciclopédia. Aproveitem a remasterização cristalina – mixagem sutil e inteligente para todos os instrumentos soarem como que captados na semana passada.

Cannonball & Coltrane (320)

Cannonball Adderley: alto sax
John Coltrane: tenor sax
Wynton Kelly: piano
Jimmy Cobb: drums
Paul Chambers: bass
produzido por Jack Tracy para a Mercury

01 Limehouse Blues (Braham, Furber) 4’39
02 Stars Fell on Alabama (Parish, Perkins) 6’15
03 Wabash (Adderley) 5’44
04 Grand Central (Coltrane) 4’33
05 You’re a Weaver of Dreams (Young, Elliott) 5’31
06 The Sleeper (Coltrane) 7’15

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE

Boa audição!

.: interlúdio :. John Coltrane: A Love Supreme

.: interlúdio :. John Coltrane: A Love Supreme

IM-PER-DÍ-VEL !!!

A Love Supreme — 50 anos

(Já começo desvirtuando a regra do blog: não indico o nome do compositor no início do título do post. Como fui convidado a ocupar algumas arestas por aqui — e não dividir a casa ao meio, diferencio para facilitar a navegação dos leitores que preferirem a programação normal.)

Fiquei pensando em de que forma começar desde que aceitei participar do PQP Bach. Depois de considerar algumas opções – querendo fazer uma assertiva inicial dessa escolha -, optei pela primeira idéia. Verdade: começar a falar sobre jazz com “A Love Supreme”, de John Coltrane, é arriscar demais cair num clichê. Mas o ouvinte qualificado – e o é certamente o leitor deste blog – jamais qualificaria este disco como qualquer coisa próxima a datado.

“A Love Supreme” foi gravado em uma única sessão direta, executada na ordem em que as músicas aparecem no disco, no dia 9 de dezembro de 1964. Desde lá, tem sido responsável por 33 minutos que frequentemente o definem como uma das maiores gravações de jazz de todos os tempos. Um álbum que qualificou Coltrane como um deus do jazz – uma suíte dividida em quatro partes, dedicada… a Deus.

During the year 1957, I experienced by the grace of God, a spiritual awakening which was to lead me to a richer, fuller, more productive life. At that time, in gratitude, I humbly asked to be given the means and privilege to make others happy through music. [original liner notes]

Em 57 Coltrane havia sido deixado pelas mudanças de direção musical do quinteto de Miles Davis, e estava em péssimo estado, físico e mental, debilitando pelo vício em heroína. 7 anos depois ele estava limpo, havia tocado com Monk, liderado seu próprio quarteto, aceitado as influências das religiões orientais em sua concepção de divino – e pronto para compor sua obra-prima.

A versão aqui apresentada de “A Love Supreme” só não vai agradar aos já veteranos do assunto: é a [última] edição de luxo, que além da gravação original, traz o registro ao vivo da única noite em que a suíte completa foi interpretada. Coltrane, no entanto, teria ficado pouco satisfeito com a qualidade do áudio — o que é fato. Apesar disso é um show que mostra, 6 meses depois do álbum, que o quarteto tomava a firme direção do free jazz.

Além disso, estão incluídos takes alternativos de Resolution e Acknowledgement – estes últimos, objetos de anos e anos de espera de aficcionados por contar com mais dois músicos na formação: o sax tenor de Archie Shepp e Art Davis num segundo baixo. Os takes foram gravados no dia seguinte, 10/12/64.

A Love Supreme (320 kbps)
John Coltrane: tenor saxophone, bandleader
McCoy Tyner: piano
Jimmy Garrison: bass
Elvin Jones: drums
Produzido por Bob Thiele para a Impulse!

DISC ONE | Original Album
A1999 Part 1 – Acknowledgement 999 7:43
A2 Part 2 – Resolution 7:20
B Part 3 – Pursuance 10:42
Part 4 – Psalm 7:05

DISC TWO | Bonus
01 Introduction by André Francis 1:13
02 Part 1 – Acknowledgement (Live Version) 6:12
03 Part 2 – Resolution (Live Version) 11:37
04 Part 3 – Pursuance (Live Version) 21:30
05 Part 4 – Psalm (Live Version) 8:49
06 Part 2 – Resolution (Alternative Take) 7:25
07 Part 2 – Resolution (Breakdown) 2:13
08 Part 1 – Acknowledgement (Alternative Take) 9:09
09 Part 1 – Acknowledgement (Alternative Take) 9:23

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John Coltrane, um clássico aos 50 anos
John Coltrane, um clássico aos 50 anos

Blue Dog

.: interlúdio :. Allan Holdsworth

Quando pensamos ou lemos sobre guitarristas influentes, é raro ver Allan Holdsworth mencionado. É um crime! E eu não entendo bem o motivo. Talvez a descrição da Wiki dê uma pista:

Holdsworth é conhecido por seu uso esotérico e idiossincrático de conceitos avançados de teoria musical, especialmente no que se refere à melodias e harmonias. Sua música incorpora um amplo campo de progressões complexas de acordes, frequentemente utilizando acordes inusitados de maneiras abstratas, e intrincados solos improvisados através da variação de centros tonais. Sua técnica particular de solos em legato vêm de seu desejo original de tocar saxofone. Sem dinheiro para comprar um, ele buscou usar a guitarra para criar linhas suaves de notas semelhantes às do sax. Ele também é associado a uma forma de sintetizador de guitarra chamada SynthAxe.

Muito complicado? Sendo completamente tapada em teoria musical, eu não identifico nada disso. Sim, ele soa diferente, o que é o seu charme e talento — mas não me parece difícil, distante ou acadêmico. Pelo contrário: é o que faz dele extremamente interessante, e o levou a ser referência não só no jazz fusion, mas também no rock e no metal. Além de ser citado como ídolo por pintas como Eddie Van Halen, Joe Satriani e Yngwie Malmsteen, Zappa dizia que era o guitarrista mais interessante do planeta. Além de sua influência marcante no prog metal, todo um subgênero basicamente deve seu desenvolvimento à mistura de metal técnico às abordagens dissonantes de Holdsworth. De fato, já vi dizerem que era um guitarrista de rock tocando jazz; eu não concordo, mas entendo o ângulo. Um bom exemplo é a faixa abaixo: o riff de abertura é hard rock, sem qualquer dúvida, antes do solo fluente (e inegavelmente fusion) iniciar.

(Os dois discos da The New Tony Williams Lifetime são um espetáculo à parte, aliás.)

Holdsworth gravou com meio mundo, além de uma série de discos solo. Parte da cena britânica do fim dos 1960/início dos 1970, estreou em 1969 com a ‘Igginbottom, uma banda de soft fusion onde também ofereceu seus vocais; prometeu jamais cantar de novo, o que é uma pena. Foi guitarrista de bandas menos conhecidas de prog/fusion, como Nucleus e Tempest; gravou Bundles com a genial Soft Machine, e três álbuns com a Gong; trouxe seu talento para jazzistas como Bill Brufford, Stanley Clarke e Gordon Beck, e está presente no meu disco preferido do Jean Luc-Ponty. E isso é só uma amostra; tocou com mais uma pá de gente que eu (ainda) não conheço. Holdsworth não se dava a estrelismos e, por isso, era bastante prolífico, pra nossa sorte.

Pra essa postagem, trago os dois primeiros lançamentos oficiais da sua discografia solo, meus favoritos. “Water on the Brain Pt. 2”, minha faixa preferida, é uma boa amostra do que se pode encontrar:

A partir de Atavachron, de 1986, passou a incorporar o uso do SynthAxe, a guitarra controladora de sintetizador, que expande a abordagem que já realizava: timbres suaves enfatizando texturas e com reverb generoso. Seus solos são vigorosos, inspirados, singulares. Navegar pelos seus álbuns exige alguma dedicação (dica: além dos que citei, cate The Sixteen Men of Tain, de 2000), mas o retorno é demais prazeroso. Apesar da apreciação irrestrita de seus pares, Holdsworth ainda merece maior aclamação popular. Generoso sobre sua técnica, deixando três livros e alguns vídeos onde explica sua abordagem, o guitarrista faleceu em 2017, aos 70 anos, ainda na ativa, e deixou um legado a ser descoberto e apreciado.

Allan Holdsworth – Road Games (1983). Aqui.
Allan Holdsworth – I.O.U. (1985). Aqui.

—Blue Dog

.: interlúdio :. Max Roach – Jazz In 3/4 Time + Contemporary Noise Quartet – Theatre Play Music

Embora não tenha sido a primeira vez em que valsas foram vertidas para o jazz, Jazz in 3/4 Time talvez tenha sido o obelisco que a ideia necessitava para ser visitada e revisitada com mais frequencia. A proposta do álbum não foi de Max Roach; na verdade, ele ficou bem pouco entusiasmado com o pedido da EmArcy. Mas a partir do resultado, é possível afirmar que um Max Roach de má vontade continua valendo por uns doze virtuoses modernos da bateria, todos altamente motivados e encharcados de energético. E no fim, a gravadora tinha razão — quem melhor poderia comandar as sessões deste disco?

E não fica por aí, porque logo à frente está o saxofone de Sonny Rollins, e um nada tímido Kenny Dorham assume com personalidade o lugar de Clifford Brown, morto um ano antes, no quinteto de Roach. Das sessões originais (15 a 18 de março de 1957, em Nova Iorque) saíram quatro faixas, sendo “Valse Hot”, composição de Rollins, o grande momento do disco. É uma longa jam de 14 minutos — bem mais do que as valsas costumam ser permitidas, mesmo no jazz. O solo do pianista Billy Wallace é delicioso. Na reedição de 2005 que vem nesse post, há ainda outras duas músicas, gravadas um pouco mais tarde, dentro do mesmo conceito. Leve, com andamento e clima transparecendo certa qualidade cinemática, Jazz in 3/4 Time tanto é um estudo de possibilidades quanto um disco de audição extremamente agradável, e pela doçura que geralmente acompanha as valsas, é recomendado para todos os públicos.

Falava em qualidade cinemática? Ano passado descobri um álbum que me remeteu imediatamente a este Jazz in 3/4 Time. Theatre Play Music, como o próprio nome indica, brinca ser trilha incidental; e executa em valsas e tangos um leitmotif menor, tristonho, mas determinadamente belo. O Contemporary Noise Quintet — nome que em nada remete a um grupo de jazz da crescente cena polonesa — tem diversas encarnações (como -Quartet ou -Sextet) e é destas bandas que estão fazendo a ponte entre o jazz tradicional e o século XXI, mundo onde a guitarra ganhou o centro e o rock foi revirando em si até esgotar o post-rock e virar chamber music (há mais elos em Rachel’s do que o ouvido facilmente demonstra). Álbum curto e preciso, Theatre Play Music proporciona pequenas viagens e não nega ter saído do leste europeu; não é ambicioso, mas complementa certeiro, e em belo contraste, o legado valsístico (?) registrado por Roach, 50 anos antes.


Max Roach – Jazz In 3/4 Time /1957 [320]
Max Roach (drums), Sonny Rollins (tenor sax), Kenny Dorham (trumpet), George Morrow (bass), Billy Wallace (piano)
download – 98MB

01 Blues Waltz (Roach)
02 Valse Hot (Rollins)
03 I’ll Take Romance (Oakland)
04 Little Folks (Roach)
05 Lover (Rodgers)
06 Most Beautiful Girl in the World (Rodgers)


Contemporary Noise Quartet – Theatre Play Music /2008 [192]
Kuba Kapsa (piano), Bartek Kapsa (drums), Kamil Pater (guitar), Patryk Węcławek (double bass)
download – 40MB

01 Main Tune
02 Bitches Tune
03 Tango Lesson
04 Main Tune II
05 Gramophone
06 Chinese Customer
07 Chilly Tango
08 Bitches Tune II
09 Main Tune (Waltz version)

Boa audição!
Blue Dog

.: interlúdio :. Elina Duni

Atenção: este post pode levá-lo pra dentro da toca do coelho.

Fosse pressionada a apontar minha maior descoberta nesses anos afastada do PQP Bach, hesitaria pouco antes de apontar Elina Duni. Não apenas por seu estilo único de jazz contemporâneo, mas por ter me arrastado a uma jornada inesquecível e pela qual sou imensamente grata.

Elina nasceu na Albânia em 1981, e aos cinco de idade já estreava em cima de um palco. Mudou-se aos 11, levada pela mãe para a Suíça, fugindo da instabilidade pós-queda do regime comunista. Provinda de uma família artística, não encontrou obstáculos à decisão de estudar jazz, canto e composição. Depois de emprestar seus vocais para a banda de rock kosovar Retrovizorja em 2004, estreou propriamente em 2008, com o belíssimo Baresha, e estabeleceu seu quarteto a partir de 2010, com Lume Lume. Foi o suficiente para que fosse absorvida no elenco da prestigiosa ECM, para quem gravou quatro álbuns desde então.

Se deixou geograficamente a Albânia, não se livrou da paixão que tornou-se sua maior influência e estilo: as canções folclóricas dos Bálcãs. Em seus discos, Elina registra as músicas, muitas vezes anônimas e arraigadas na cultura local, e as traduz para a linguagem do jazz, incorporando elementos como o andamento “irregular” e as danças percussivas, e dando-lhes uma inefável sofisticação que jamais soa esnobe ou distante. Poderia ser uma ponte entre os mundos, mas seu talento não se basta: é também a correnteza desse rio imaginário que separa as Europas — a ocidental, rica e desenvolvida, e a oriental, combalida e de sofrências, mas cujos enclaves repletos de história recusam calar-se.

Elina canta em albanês, búlgaro, grego, romeno, francês; e essa é uma lista resumida. Em quarteto, com piano, baixo e bateria, em dupla com guitarra, ou solo com seu violão, vai construindo uma carreira brilhante, mas cujas peculiaridades — rítmicas, linguísticas — a mantêm um pouco abaixo dos radares. Prefiro assim. O underground faz bem à criatividade, e torna as descobertas ainda mais saborosas.

“Kaval Sviri”, a canção do vídeo acima, é um excelente exemplo do que Elina é capaz. Forte o suficiente para iniciar a canção com um scat de três minutos e meio, mas generosa com seus instrumentistas — o solo do pianista Colin Vallon é excepcional. Sua versão dessa canção tradicional búlgara paga tributo e revive com energia a inventividade e a tensão emocional dessas músicas, potencializando seus efeitos. Minha paixão me levou a cavar e decorar a letra da faixa; a descobrir que o kaval é uma flauta tradicional da região, junto à gaita de foles kaba gaida, e a gadulka, prima da rabeca. Me arremessou a investigar a música ethno búlgara; encontrar o trabalho dos musifolcloristas no pós-Segunda Guerra, que viajavam pelo interior recolhendo as canções e dando-lhes arranjos e memória; compreender o papel fundamental da Balkanton, gravadora estatal que registrava tais trabalhos; embasbacar com a vocalização conversada e rebelde dos corais típicos; decifrar blogs-repositórios cujo cirílico me confunde tanto quanto fascina; cair de quatro pelo alcance e pelas modulações de musas secretas como Olga Borisova e Kalinka Valcheva; descobrir novos grupos de jazz urbano que também valorizam a herança musical da região. (E nem vou começar a falar da Albânia, porque senão esse post não termina.) Há artistas envolventes, e há Elina, que não pede licença para provocar esses afetos e transtornar qualquer trajetória linear. Kaval sviri, mamo, gore dole. Gore dole, mamo, pod seloto. Ja shte ida, mamo, da go vidja. Da go vidya, mamo, da go chuja. Eu concordo: ouço o kaval sendo tocado na cidade, mamãe, e estou indo dançar.

Escolher um dos álbuns de Elina para compartilhar foi terrivelmente difícil, mas optei por Lume Lume por ser composto de 90% versões dos Bálcãs, e especialmente cativante. O encarte incluso no pacote informa as origens e reconta as letras — quase sempre pungentes e doloridas. Acredito desnecessário sugerir que, em caso de curiosidade e qualquer pequeno encantamento, se vá atrás de seus outros álbuns. Intimistas, de difícil tradução, mas de imediato carisma, provocam uma audição altamente gratificante — e cheia de pequenas surpresas e apaixonamentos. Ou, ocasionalmente, a tradução é fácil mesmo: antes do link, deixo vocês com essa versão cortante de Amália Rodrigues, registrada no disco solo Partir, de 2018.

Elina Duni Quartet – Lume Lume (2010). Aqui.

E se eu não for expulsa de vez do PQP por furar a fila de postagens e ainda cometer um duplo interlúdio, logo mais eu volto.

—Blue Dog

.: interlúdio [em caixinhas de música] :. Yuko Ikoma & Cécile “Colleen” Schott

.: interlúdio [em caixinhas de música] :. Yuko Ikoma & Cécile “Colleen” Schott

(Acontece seguido, me pararem na rua para perguntar: como vocês do PQP conseguem manter o fluxo de postagens excelentes, uma atrás da outra? Eu respondo contando um segredinho: ouvimos tanta música boa que precisamos organizar escalas para publicar um post, e frequentemente nos arremessamos à jugular um do outro por um lugar na fila. É assim que hoje, nesta madrugada, eu encaixo um interlúdio furtivo, enquanto espio nas postagens agendadas uma pérola do Avicenna esperando a manhã chegar para tomar seu justo lugar no topo do blog.

E é assim que eu imaginei o par de discos que trouxe hoje: quietos, noturnos, querendo passar despercebidos. Por um lado, sua natureza: (muito) mais próximos à musique concrète do que o costumeiro jazz dessa coluna. Por outro, pelo próprio clima das composições: as leituras para caixinha de música que Yuko Ikoma, a acordeonista que vimos logo ali, fez de Erik Satie, ressoam claras nas frequências agudas, e crocantes nas médias; com simplicidade, cortam a noite trazendo um conforto paradoxal, evocando imagens circenses e, claro, alguma infância.

E se a palavra é simplicidade, bem, que a reforcemos: tanto os temas escolhidos quanto os arranjos em si não primam por invenções de qualquer espécie. São composições conhecidas, e daí parte do prazer que o álbum proporciona: reassimilar estas versões suaves, macias, e no entanto de notas bem definidas, de um cuidado maior do que o aparente.

Dois anos antes, em Paris, uma artista realizou um experimento semelhante; Cécile “Colleen” Schott gravou um disco de composições suas para caixinha de música. Nesse caso, e como é de seu perfil, Colleen explora mais; utiliza pedais de loop e edição em computador para criar atmosferas mais complexas. Às vezes em vinhetas simples, passáveis; noutras em melodias brilhantes e determinadamente angélicas. (Blue Dog é um grande fã de Colleen e tem sonhos com Your Heart is So Loud como trilha sonora, porque é um sortudo.)

Não é um par de discos que se vai ouvir a toda hora, de cabo a rabo; no entanto podem relocalizar qualquer situação. É uma música que serve para fundo de longos olhares, e que acalma a noite dos insones; e que como toda boa música, se escutada de perto, traz alguma inquietação. E ainda por cima mostra que, com um único e medieval elemento, se pode fazer música contemporânea experimental de grande sensibilidade.)

Yuko Ikoma – Moisture with Music Box /2008 [192]

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01 1ére Gymnopédie
02 2éme Gymnopédie
03 3éme Gymnopédie
04 Je te veux
05 Menues Propos Enfantins – Chant guerrier du roi des haricots
06 Menues Propos Enfantins – Ce que dit la petite princesse des Tulipes
07 Menues Propos Enfantins – Valse du Chocolat aux amandes
08 Prestidigitateur Chinois
09 Rêverie du Paurve
10 1ére Gnossienne
11 4éme Gnossienne
12 Berceuse

Colleen – Et les Boîtes à Musique /2006 [V2]

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01 John Levers the Ratchet
02 What is a Componium? (Part 1)
03 Charles’s Birthday Card
04 Will You Gamelan for Me?
05 The Sad Panther
06 Under the Roof
07 What is a Componium? (Part 2)
08 A Bear is Trapped
09 Please Gamelan Again
10 Your Heart is so Loud
11 Calypso in a Box
12 Bicycle Bells
13 Happiness Nuggets
14 I’ll Read You a Story

Boa audição!

Yuko Ikoma: brincando lindamente com Satie. E longe do acordeon.

Blue Dog

.: interlúdio :. Wes Montgomery: Smokin’ at the Half Note

.: interlúdio :. Wes Montgomery: Smokin’ at the Half Note

Sim, é verdade: Blue Dog esteve numa jornada ao centro da Terra e voltou pra contar a história. No entanto, foi constatado mais uma vez que ninguém presta atenção no que diz um cachorro — principalmente quando ele trata de si na terceira pessoa — , e como PQP encerrou o assunto com um peremptório “passa já pra dentro!”, o melhor que ele faz é retomar logo suas antigas atribuições.

Antes de trazer à tona novidades e avantgardismos resultantes das escavações, este post não precisa fazer qualquer esforço para agradar: chega logo propondo um disco de fácil consenso e clara influência. Trata-se de Wes Montgomery e a seção rítmica clássica de Miles Davis. Wes é gentil, faz jazz com aquele acento de blues, pode ser servido à mesa. O ouvinte se pega várias vezes prestando mais atenção na bateria do que no instrumento principal. Estamos todos em casa, felizes? Então bueno, que bueno.


Wes Montgomery – Smokin’ at the Half Note /1965 [V0]
—-> download – 68MB
Wes Montgomery (guitar),
Wynton Kelly (piano),
Paul Chambers (bass),
Jimmy Cobb (drums)
.

Faixas 1 e 2 gravadas ao vivo em junho de 1965. Faixas 3 a 5 gravadas em estúdio, em 22/07/1965. Produzido por Creed Taylor para a Verve

01 No Blues (Davis) 13′
02 If You Could See Me Now (Dameron, Sigman) 6’45
03 Unit 7 (Jones) 7’30
04 Four on Six (Montgomery) 6’45
05 What’s New? (Haggart, Burke) 6’00

Boa audição!
Blue Dog

.: interlúdio :. John Coltrane Quartet – My Favorite Things (1961)

O pianista McCoy Tyner morreu no dia 6 de março de 2020, aos 81 anos. Dos membros do mais famoso quarteto de Coltrane, era o último entre nós. A causa da morte não foi divulgada.

Tyner era mais conhecido por seus anos como membro do John Coltrane Quartet, um dos grupos mais icônicos e revolucionários do jazz. Foi com Coltrane, de 1960 a 65, que Tyner reescreveu as regras do piano de jazz com seus acordes percussivos e cheios de notas.

O primeiro disco dessa formação do quarteto de Coltrane, My Favorite Things, foi lançado em 1961 e teve grande sucesso, especialmente a faixa-título. O pianista atacou a música de Rodgers & Hammerstein com ondas marteladas de acordes modais e repetitivas, porém atraentes, que eram tão proeminentes quanto o saxofone soprano de Coltrane. A música se tornou o cartão de visitas de Coltrane, tocada todas as noites – mas era igualmente importante, se não mais, para Tyner. (Pleyel, com trechos copiados de JazzTimes)

Queria postar Mingus (e o farei em breve) – mas não tenho ouvidos pra ele ultimamente; tenho passado as horas a reencontrar meu disco preferido de jazz. My Favorite Things, gravado entre 24 e 26 de outubro de 1960 por Coltrane, é uma aula de música envolta em uma aura de simplicidade e candura. Não obstante, a faixa-título é uma valsa – de The Sound of Music, o musical. Coltrane (e McCoy Tyner, ao piano) abraçam o ouvinte pelas orelhas e o fazem girar em notas mais do que perfeitas e jamais excedentes. O quarteto mostra mais do que coesão – também generosidade de Trane, que em seus arranjos favorece a construção sonora mais do que a própria voz (o sax). São as sheets of sound que formaram sua identidade musical. Puro deleite de jazz modal, indicado inclusive para iniciantes que se sentem oprimidos pelo bop mas desejam um pouco mais de complexidade. Aproveitem o rip em alta definição e não tenham medo de usar os fones de ouvido. (Bluedog)

John Coltrane – My Favorite Things
01 My Favorite Things (Rodgers, Hammerstein) – 13’47
02 Everytime We Say Goodbye (Porter) – 5’54
03 Summertime (G. Gershwin, Heyward) – 11’37
04 But Not for Me (G. Gershwin, I. Gershwin) – 9’35

John Coltrane: soprano saxophone (1, 2), tenor saxophone (3, 4)
McCoy Tyner: piano
Steve Davis: bass
Elvin Jones: drums
Produzido por Nesuhi Ertegun para a Atlantic

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HEREou AQUI (or here) (mp3 320kbps)

McCoy Tyner e John Coltrane em 1963

Bluedog (2007) / Pleyel (2020, repostagem e homenagem e McCoy Tyner)

.: interlúdio :. Joni Mitchell: Mingus

.: interlúdio :. Joni Mitchell: Mingus

(PQP garante: este é um dos melhores discos que ele já ouviu).

IM-PER-DÍ-VEL !!!

Tropeçava em latas de lixo quando encontrei a capa abaixo, e imediatamente me vi cheio de interrogações.

Joni Mitchell? Mingus? Que diabos. Ou, que diabos Mitchell está fazendo com Mingus? Por aí já podem notar minha desconfiança em relação à cantora. Mas eu prefiro ficar surdo a desistir antes de tentar. E lá fui, farejando, descobrir que Joni foi criticadíssima à época do disco, 1979; apontaram-na como decadente, esnobe por tentar dar verve ao pop, tentando pegar uma carona na então recente morte do underdog.

Mas quando se cava mais um pouco, se descobre que Mingus havia chamado Joni para ajudá-lo a musicar o Four Quartets de T. S. Eliot alguns meses antes, o baixista já imobilizado pela doença que o mataria em seguida. E que, fruto disso, cresceu a amizade – e mesmo Joni pôde sair de um bloqueio criativo que a consumia durante longo tempo. Donde o disco-homenagem, que ela não imaginava que seria póstumo. Tanto que Mingus só não chegou a escutar uma das faixas, a primeira, composição totalmente dela – ao invés das outras, versões de Mingus, com letras por Joni escritas, e abençoadas pelo mestre.

Não apenas na aura criada pelo duo; Joni, que não era boba, cercou-se de um pequeno grupo de pilares do jazz para gravar o álbum. Em Mingus, a base é a do Weather Report – confira a nominata logo abaixo. (Ame ou odeie o fusion, todos sabemos dos pedigrees.) Aqui só adianto que é um dos mais brilhantes, e por vezes experimental, trabalhos de Jaco Pastorius. Seu baixo é o condutor dessas faixas de um jazz relaxante, espaçado, cheio de respiros – e sim, sob bela e macia voz, bem colocada, discreta. Os detratores estavam errados. Ou com ciúmes. Ainda: um atrativo a mais são os “raps” que entremeiam as canções – vinhetas com gravações de Mingus em conversas, cenas cotidianas, até um scat em duo com Joni. (O que, inclusive, faz deste um disco curto, de apenas seis músicas.)

Joni Mitchell – Mingus (1979)
Joni Mitchell: guitar, vocals
Jaco Pastorius: bass
Wayne Shorter: soprano saxophone
Herbie Hancock: electric piano
Peter Erskine: drums
Don Alias: congas
Emil Richards: percussion

produzido por Joni Mitchell para a Asylum

01 Happy Birthday 1975 (Rap) 0’57
02 God Must Be A Boogie Man (Mitchell) 4’35
03 Funeral (Rap) 1’07
04 A Chair in the Sky (Mingus) 6’42
05 The Wolf That Lives in Lindsey (Mingus) 6’35
06 I’s a Muggin’ (Rap) 0’07
07 Sweet Sucker Dance (Mingus) 8’04
08 Coin in the Pocket (Rap) 0’11
09 The Dry Cleaner from Des Moines (Mingus) 3’21
10 Lucky (Rap) 0’04
11 Goodbye Pork Pie Hat (Mingus) 5’37

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE

Joni & Mingus em linda foto
Joni & Mingus em linda foto 2
Vejam só quem está no disco. Erskine, Mitchell, Pastorius e Hancock. Poderia dar errado?

Boa audição!
Blue Dog

.: interlúdio :. The Necks: Chemist

.: interlúdio :. The Necks: Chemist

“This is apparently the thirteenth release by the Necks, and this reviewer is ashamed to admit that it’s the first one he’s heard, especially when the music is singular enough to satisfy the average iconoclast status to which this reviewer would make no claim, incidentally.”

Faço minha a confissão de Nic Jones, do All About Jazz — até me sinto melhor por ter chegado atrasado. Estou postando este disco de supetão: descobri-o hoje cedo e não pude parar de ouvi-lo desde então, e estou louco pra chegar em casa e escutá-lo com a devida atenção, nas minhas queridas e pesadas caixas de som, ao invés desses fones de ouvido vazando o entrecortado ambiente de trabalho.

O The Necks é um trio australiano cuja exploração se dá num espectro bastante específico, e pouco revisto, do jazz: o minimalismo. “Chemist” evoca os drone blues de La Monte Young, as texturas de Steve Reich e os espaços acústicos dos discos de Miles Davis entre 1969 e 1970; um jazz que evolui muito lentamente, hipnotizando. Não há canções, e os temas desenvolvem-se sem objetivo que não o de observar a própria trajetória — mas, ao contrário do que se poderia esperar, não é enfadonho, nem carece de um melhor arranjo. Inclusive recebe bem ouvintes de jazz de quaisquer vertentes — que não tenham transtorno de déficit de atenção, preferencialmente, para encarar as faixas de mais de 20 minutos — , pois é um disco límpido, suave e bem-articulado.

E já que eu afanei a introdução da resenha do Nic Jones, roubo o fecho também.

“Ultimately, the chasm between being genuinely creative and simply going over the same old ground is arguably as wide as it’s ever been, and this group comes down firmly on the side of the former.

Now, these ears have got some catching up to do.”

The Necks – Chemist /2006 [V0]
Chris Abrahams: piano, keyboards
Lloyd Swanton: bass
Tony Buck: drums, percussion, guitar

download – 98MB

01 Fatal
02 Buoyant
03 Abillera

The Necks
The Necks

Boa audição!
Blue Dog