Dmitry Shostakovich (1906-1975) — Peteris Vasks (1946) — Alfred Schnittke (1934-1998): Dolorosa

Dmitry Shostakovich (1906-1975) — Peteris Vasks (1946) — Alfred Schnittke (1934-1998): Dolorosa

MI0001015895Não há nada de doloroso neste álbum, pelo contrário, só de delicioso. Primeiro temos a Sinfonia para Câmara de Shostakovich, que nada mais é do que uma transcrição do Quarteto No. 8 feita por Rudolf Barshai. Uma ótima ideia de Barshai pois deixou a coisa toda surpreendentemente mais gostosa.

Ao final do álbum temos outra transcrição: a sonata para trio de violino, viola e cello de Schnittke, transcrita também para orquestra de câmara, essa feita por Yuri Bashmet. Novamente uma ótima ideia.

Mas o destaque do álbum fica pra Musica Dolorosa de Peteris Vasks, compositor que estreia hoje no blog. Nascido na Letônia, parece utilizar vários métodos contemporâneos de composição. Sua obra neste álbum me pareceu uma mistura de dor e fúria, coisa que adoro sentir na obra de um compositor. Não sei se sou sádico, acredito que não, mas me deliciei com as “dores” desta música.

Aliás, o álbum inteiro parece conter um clima semelhante; certamente uma ótima compilação.

Shostakovich, Vasks, Schnittke: Dolorosa

Dmitry Shostakovich (1906-1975)

Chamber Symphony Op. 110a (orchestration by Rudolf Barshai)
01 I. Largo
02 II. Allegro molto
03 III. Allegretto
04 IV. Largo
05 V. Largo

Peteris Vasks (1946)

06 Musica Dolorosa

Alfred Schnittke (1934-1998)

Trio Sonata (orchestration by Yuri Bashmet)
07 Moderato
08 Adagio

Stuttgarter Kammerorchester
Dennis Russell Davies, conductor

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Vasks emocionado por estrear no PQP Bach.
Vasks emocionado por estrear no PQP Bach.

Luke

Conjunto Roberto de Regina 25 anos [1976] (excertos da série Cantos e Danças da Renascença)

Cj Roberto de Regina 25 anos http://i34.tinypic.com/2jb5ikh.jpgEm 19.08.1961 a revista Cash Box, editada em Nova York, tratava como “um dos lançamentos mais importantes do ano” o Volume 1 de Cantos e Danças da Renascença, série de LPs produzidos pelo carioca Roberto de Regina com o conjunto vocal e instrumental que vinha desenvolvendo havia dez anos.

Infelizmente não tenho os discos originais, só uma espécie de compacto feito pela CBS em 1976 em um só LP – em lugar de reeditar inteira essa que devia ser considerada umas glórias da realização musical basileira.

Exagero? Bem, o grupo tinha sido absoluto pioneiro no repertório renascentista no Brasil. Verdade que em Belo Horizonte um grupo já usava o nome “madrigal renascentista”, mas não só seu repertório não era exclusivamente renascentista, como sequer se tratava de um madrigal e sim de um coral em moldes de épocas posteriores; seu trabalho estava longe de significar uma revivência minimamente autêntica de como essa música devia ter soado.

Mas a coisa da autenticidade é mais sutil: Roberto de Regina também poderia ser acusado (como foi) de não ser autêntico por, na falta de instrumentos de época, usar oboés e fagotes modernos (só por exemplo). No entanto suas interpretações absolutamente não soavam como algo modernizado – e sobretudo tinham como que um encanto, um mel: não eram de hoje, mas soavam como música viva, fluente como a feita ali no boteco da esquina, e não em um laboratório acadêmico. Enfim, talvez se possa dizer, muito de acordo com a época, que tinham BOSSA.

Talvez o que mais ajude nesse sentido seja as vozes usarem uma impostação muito discreta, sem nenhum cacoete operístico – e além disso se permitirem um discreta nasalidade, uma malemolência… como quem realmente não pretende negar que a música está sendo feita por brasileiros (ato comparável, talvez, ou de lermos Fernando Pessoa com qualquer um dos nossos sotaques, e não como ele ‘ouviu’ a poesia quando a escreveu).

De resto, alinho algumas observações que, acredito, podem ajudar na apreciação. A primeira é me desculpar que em alguns vários pontos pontos os agudos parecem sujos ou estourados – mas não foi falha na digitalização: creio que esse vinil foi abusado com agulhas rombudas em alguma época da sua vida.

Outra, que a série original vinha dividida em discos para a França, para a Espanha, para os franco-flamengos, os vasc… – ops, perdão! – o que de certa ‘conversa’ com a minha postagem anterior (Música da Renascença para alaúdes, vielas e bandurra). Só que aqui temos uma amostragem um tanto desequilibrada: um lado inteiro em francês, outro quase inteiro para a Espanha, e três faixas divididas por três outros países.

O francês usado é quase compreensível para quem tem noção razoável dessa língua se apenas se levar em conta que oi ou oy não vêm pronunciados ‘uá’ e sim ‘oê’. E assim fica compreensível o verso que termina as estrofes de Perdre le sens devant vous (‘perder o senso diante de ti…’), para mim uma das interpretações mais encantadoras do disco: ditte le mois, ditte le mois, je vous pris (‘dize-me, dize-me, eu te suplico’).

Notabilíssima a peça ‘Os gritos de Paris’ (Les cris de Paris) de Jannequin, que pretende descrever a agitação da feira ou mercado, com os vendedores apregoando uma delirante variedade de produtos… Aqui vale comparar com a leitura mais tradicionalmente coral de Klaus-Dieter Wolf à frente do Madrigal Ars Viva de Santos, que postei há não muito – e lá vocês encontram o texto de Les cris de Paris no encarte!

Roberto executa Mit ganczen Willen, do organista cego alemão Conrad Paumann (1410-1473), num dos cravos que ele mesmo construía. A seguir o Pater Noster de Obrecht também me parece um ponto alto de interpretação. Mas logo vêm os espanhóis, que comparecem com duas peças que devem ter sido selecionadas só como amostras da sua polifonia mas, honestamente, me parecem muito chatas (Dezilde al caballero e Falai meus ollos – esta em galaico-português), uma de extraordinário lirismo (Ay luna que reluces, do Cancioneiro de Upsala – coleção de música espanhola que tem esse nome pois a única cópia conhecida foi encontrada na Universidade de Upsala, na Suécia), e três de puro espírito farrista: ao fim de cada repetição do estribilho Dale si le das uma cantora começa a dizer uma palavra que, pela rima, seria obscena, e outra a interrompe ‘consertando a coisa’. Em Besad me y abrazad me uma mulher incita o marido a agir em termos como ‘pára de fingir que está dormindo!’. E Hoy comamos y bebamos, que termina o disco, joga no lixo qualquer hipocrisia e assume ‘Vamos comer e beber, cantar e folgar, que amanhã é dia de jejum. E não vamos perder bocado, pois [para comer mais] iremos vomitando’.

Dá pra fazer uma tal música com pedantismo acadêmico? Pode-se questionar o rigor musicológico de Roberto de Regina aqui e ali, mas fez música viva – e no meu sentir isso é precisamente o melhor que se pode dizer de um musicista.

25 anos do Conjunto Roberto de Regina
LP CBS de 1976. Digitado por Ranulfus, ago. 2010

FRANÇA
A1 Bon jour, bon moys (Dufay)
A2 Je ne vis oncques la pareille (Dufay)
A3 Petite camusette (Josquin des Prez)
A4 Ou mettra l’on ung baiser favorable? (Janequin)
A5 Les cris de Paris (Janequin)
A6 Ce sont gallans (Janequin)
A7 Que vaut Catin? (Costeley)
A8 En ung chasteau (Roland de Lassus)
A9 Perdre le sens devant vous (Claude le Jeune)

ALEMANHA
B1 Mit ganczen Willen (Paumann)

FLANDRES
B2 Pater Noster (Obrecht)

ITÁLIA
B3 Due villotte dei Fiori(Azzaiollo)

ESPANHA
B4 Besad me e abraçad me (n.n., Cancioneiro de Upsala)
B5 Dezilde al caballero (N.Gombert, Cancioneiro de Upsala)
B6 Falai meus ollos (n.n., Cancioneiro de Upsala)
B7 Dale si le das (n.n., Cancioneiro del Palacio)
B8 Ay luna que reluzes (n.n., Cancioneiro de Upsala)
B9 Hoy comamos y bebamos (Juan Encina)

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Ranulfus (publicado originalmente em 08/08/2010)

Alfred Schnittke (1934-1998): Symphony No. 1 — The Ten Symphonies

Alfred Schnittke (1934-1998): Symphony No. 1 — The Ten Symphonies

coverMO-NU-MEN-TAL! . É o mínimo que se pode dizer sobre esta sinfonia. Schnittke quando a compôs estava em progressão geométrica em direção ao seu auge. Ainda não havia atingido a perfeição de seu poliestilismo, mas já tinha mais do que o necessário para chocar.

Barroco, romântico, clássico. E até algumas tendências modernas contemporâneas como aleatoriedade na música e minimalismo. Todas esses estilos são encontrados nessa sinfonia, só para citar alguns. Alex Ross, em um texto maravilhoso sobre Schnittke, chama o compositor de “conhecedor do caos”. É a melhor alcunha possível para um louco que cria uma sinfonia de tamanha magnitude.

Primeiro pela sua duração “mahleriana”, como diz Tom Service. Segundo pelo teatro embutido em sua execução: na partitura é indicado um momento para que os músicos deixem e voltem ao palco, talvez fazendo uma crítica ao ritual tradicional das salas de orquestra? Terceiro pela fusão imensa de referências diretas e indiretas, além da mescla de diferentes estilos como jazz, dodecafonismo e música aleatória.

Mais do que ouvir essa música, ela é preciso ser pensada. Existem dezenas de outras obras de Schnittke cujo material musical é muito mais agradável. Se você espera escutar isso como se escuta uma sonata de Beethoven, caia fora. Aqui devemos pensar! O que ele quer dizer com esses metais pesadíssimos? E essas palmas no meio da sinfonia? E esse tema? Etc. Puxem o filósofo de dentro de vocês.

Uma coisa que me vem à mente ao ouvir essa sinfonia é pensar como que a partir de tantas referências (Beethoven, Haydn, Tchaikovsky, Strauss, Chopin, Bach, etc.) Schnittke mistura toda a tradição clássica da música até então e, ao fazer isso, anuncia o pós-modernismo. É como se o compositor se visse sem saída, e então, para criar uma, junta todas as saídas que haviam tomado até então. Mas pensar a história da música daquele momento como sem uma nova saída, é nada mais que consequência da ideologia pós-moderna de fim da história, ou seja, como se a história do homem não tivesse mais para onde ir além de repetir mais do mesmo.

Schnittke não foi o único que padeceu desse mal. Se olharmos para as primeiras composições de Arvo Pärt, perceberemos a mesma incerteza. Mas independentemente do niilismo do homem moderno acerca de se a história acabou ou não, as sociedades continuam e continuarão a mudar enquanto existir a espécie humana. Não é a toa que Schnittke se reencontra no final da vida numa certa “espiritualidade” musical, embora conservando elementos de seu poliestilismo. Arvo Pärt faz a mesma coisa. Todo homem nas artes, na política ou na ciência que se encontrar na mesma encruzilhada, não poderá resistir ao movimento contínuo da história. Mostrarei isso à vocês em todo o movimento… digamos, dialético (em transformação) das sinfonias de Schnittke.

Schnittke: The Ten Symphonies

CD 1

Alfred Schnittke (1934-1998):

Symphony No. 1
01 1. Senza Tempo. Moderato
02 2. Allegretto
03 3. Lento
04 4. Lento. Allegro
05 5. Applause

Royal Stockholm Philharmonic Orchestra
Leif Segerstam, conductor
Åke Lännerholm, trombone
Carl-Axel Dominique, piano (jazz improvisation)
Ben Kallenberg, violin (jazz improvisation)

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Schnittke, perdido em pensamentos.
Schnittke, perdido em pensamentos.

Luke

Samuel Barber (1910-1981): ‘The School For Scandal’ Op. 5, Sinfonia No. 1 Op. 9, First Essay For Orchestra Op. 12 e Sinfonia No. 2 Op. 19

Samuel Barber (1910-1981): ‘The School For Scandal’ Op. 5, Sinfonia No. 1 Op. 9, First Essay For Orchestra Op. 12 e Sinfonia No. 2 Op. 19

A seguir, algumas informações extraídas da wikipédia: “Samuel Osborne Barber (Westchester, 9 de Março de 1910 — Nova Iorque, 23 de Janeiro de 1981) foi um compositor norte-americano de música erudita, mais conhecido pela obra “Adagio for Strings”. Começou a compor com sete anos de idade; os seus estudos formais foram feitos no “Instituto de Música Curtis”, em Philadelphia. Aos 25 anos tornou-se membro da Academia Americana em Roma. Compôs um conhecido “Concerto para Violino” e a obra “Music for a Scene from Shelley”, Opus 7, esta última baseada num poema de Percy Bysshe Shelley. É o autor de um Concerto para Piano e Orquestra e de uma Sonata para Piano. Sua ópera “Vanessa” (1957), ganhou o Prêmio Pulitzer.

DAQUI

Samuel Barber (1910-1981): ‘The School For Scandal’ Overture, Op. 5, Sinfonia No. 1, Op. 9, First Essay For Orchestra, Op. 12 e Sinfonia No. 2, Op. 19

‘The School For Scandal’ Overture, Op. 5
01. ‘The School For Scandal’ Overture

Sinfonia No. 1, Op. 9
02. Allegro Ma Non Troppo
03. Allegro Molto
04. Andante Tranquillo

First Essay For Orchestra, Op. 12
05. First Essay For Orchestra

Sinfonia No. 2, Op. 19
06. Allegro Ma Non Troppo
07. Andante, Un Poco Mosso
08. Presto, Senza Battuto – Allegro Risoluto

Royal Scottish National Orchestra
Marin Alsop, regente

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Samuel Barber na dúvida: escrevo uma sinfonia ou dou uma volta de bicicleta
Samuel Barber na dúvida: escrevo uma sinfonia ou dou uma volta de bicicleta?

Carlinus

L’Arpeggiata e Phillipe Jaroussky, contratenor: Icônes du Seicento – ao vivo (2009)

Icones du SeicentoEntrei em contato com o grupo L’Arpeggiata aos poucos, através de postagens esparsas dos colegas do blog, como esta, esta, e esta.

Gostei de imediato, mas foi só a partir da terceira que me percebi em risco de ficar viciado. Comecei a ver tudo que é vídeo do grupo no YouTube, e foi aí que viciei mesmo: a paixão contida porém visível com que os músicos tocam, o bom humor e discreta teatralidade aqui e ali, e sobretudo o encanto visual dos instrumentos fazem do L’Arpeggiata algo ainda mais rico quando se vê, além de ouvir.

Talvez seja por isso que este lindo trabalho com peças italianas dos anos 1600 nem foi lançado em CD, apenas em vídeo. As faixas disponibilizadas aqui foram extraídas do vídeo. – Mas então por que postar no PQP, se já está no YouTube? – alguém poderá perguntar… e eu responderei: há abundância de ocasiões em que não se pode ver mas se gostaria de ouvir – e nessas ocasiões é prático ter o material dividido em faixas, não é?

Falando de faixas… das cantadas pelo extraordinário contratenor que é Jaroussky, minhas preferidas são a 07 (onde faz valer o sentido das palavras ‘Oh gloriosa senhora!), 09, 11 (Stabat Mater) e 13 (um setting por Monteverdi do tratado de instrumentação da antiguidade que é o Salmo 150). Jaroussky também é magnífico na faixa tratada com mais liberdade estilística, que é a versão jazzy de outra peça de Monteverdi (faixa 15), onde me encantam especialmente os efeitos à Louis Armstrong extraídos do cornetto pelo californiano Doron Sherwin – que, de resto, empresta brilho a quase todas as faixas. Mas quem compete seriamente com Jaroussky pelo estrelato máximo do show é o violinista Alessandro Tampieri, sobretudo nas faixas 06, 08 e 12. E não se deve deixar de mencionar a bela toccata de G. Kapsberger, à qual o grupo deve seu nome, solada à tiorba por sua diretora, a austríaca Christina Pluhar (faixa 10). Espiem lá!

Palhinha: um bis de Monteverdi em versão jazzy (faixa 15)

Philippe Jaroussky com L’Arpeggiata
ICONES DU SEICENTO – ao vivo / live

01 Abertura do vídeo: vinheta da faixa 10 (instrumental) – 01’00
02 Anônimo – Ninna nanna al bambino Gesù – 05’34
03 Maurizio Cazzati – Ciaccona (instrumental) – 03’36
04 Benedetto Ferrari – Queste pungenti spine – 03’16
05 Maurizio Cazzati – Passacaglia (instrumental) – 03’32
06 Pandolfo Mealli – La vinciolina (instrumental) – 02’12
07 Ignazio Donati – O gloriosa domina – 04’00
08 Marco Uccellini – La Luciminia contenta (instrumental) – 04’02
09 Luigi Rossi – Lasciate averno – 06’07
10 Girolamo Kapsberger – Toccata l’Arpeggiata (instrumental) – 02’35
11 Giovanni Felice Sances – Stabat mater dolorosa – 07’00
12 Antonio Bertali – Ciaccona (instrumental) – 04’32
13 Claudio Monteverdi – Laudate Dominum (Salmo 150) – 04’17
14 Anônimo – Ciaccona di paradiso et dell’Inferno – 03’36
15 Claudio Monteverdi – Ohimè, ch’io cado – versão jazzy – 04’19
16 Domenico Maria Melli – Dispiegate, guance amate – 02’05
17 Claudio Monteverdi – Sì dolce è’l tormento – 04’38
__

Philippe Jaroussky – contratenor

L’Arpeggiata
Christina Pluhar, tiorba e direção
• Alessandro Tampieri, violino
• Doron Sherwin, corneto
• Eero Palviainen, arquialaúde e guitarra barroca
• Charles Edouard Fantin, alaúde, guitarra barroca
• Margit Übellacker, saltério
• Haru Kitamika, órgão, cravo
• Richard Myron, violone
• Michèle Claude, percussão

Gravado na Abadia de Ambronay, França, em 18 de setembro de 2008,
dentro do 29º Festival de Ambronay

Website do conjunto: http://www.arpeggiata.com

Material não lançado em CD
Áudio extraído do vídeo disponível no YouTube, código ?v=KFRMwgQLHLk
Directed by Olivier Simonnet © Broadcast by Mezzo, 2008

.  .  .  .  .  .  BAIXE AQUI – download here

Ranulfus

“Renaissance Brass” – Scheidt (1578-1654), Weelkes (1576-1623) etc.: canzone, madrigais etc. em quinteto de metais

RenaissanceBrass CAPA-FRENTEGosto demais deste disco! É verdade que o nome e a imagem da capa são enganosos: os instrumentos de metal que temos aqui não são renascentistas: são dois trompetes, uma trompa, um trombone e uma tuba, todos modernos, que constituem o quinteto da Eastman School of Music, de Rochester, estado de New York.

Mas ao dizer que a capa não corresponde ao conteúdo, não estou dizendo que o conteúdo seja de má qualidade: dentro de sua proposta, é impecável!

Transcrevendo das notas de Joel Israel Cohen na capa deste vinil de 1967:

   Para os puritanos de meados do século XX, a ideia de transcrever música de um meio para outro é definitivamente suspeita: a memória de um passado recente em que orquestras de bandolins tocavam rondós de Mozart e pianolas martelavam a Nona de Beethoven ainda persiste e causa estremecimentos embaraçados. Queremos nossa música pura e precisa, com os legatos do segundo oboé exatamente como o compositor os escreveu.

   Outras épocas, no entanto, foram decididamente indiferentes a isso. Durante a Idade Média, Renascimento e Barroco inicial a troca (interchangeability) dos meios de execução era antes a regra do que exceção. Uma composição podia ser cantada, soprada, dedilhada ou friccionada, dependendo das forças que houvesse à mão; nem parece ter existido a ideia da coloração sonora real, verdadeira e autêntica para uma determinada peça. Os madrigais de Thomas Weelkes, por exemplo: embora tenham sido escritos como música vocal, podiam ser e provavelmente eram executados também por instrumentos, e embora o compositor não fosse familiarizado com o timbre dos instrumentos de metal modernos, é improvável que ele fizesse objeção à presente reencarnação de suas obras.

Enfim: o monge Ranulfus acha isso extraordinariamente bonito, e sente algo assim como um efeito tranquilizante, consolador, ao ouvir essas frases com esses timbres. E espera que entre nossos leitores também haja quem venha a gostar!

“Renaissance Brass”
German and English music of the late renaissance “for brass”

  • MÚSICA ALEMÃ: Samuel Scheidt (1587-1654)
    A01 Canzona Gallicam 04’45
    A02 Benedicamus Domino 5’12
    A03 Galliard Battaglia 01’32
    A04 Wendet euch um ihr Äderlein 02’00
    A05 Canzona Aethiopicam 04’36
    A06 Canzona Bergamasca 04’35
  • MÚSICA INGLESA: Thomas Weelkes (1576-1623)
    B01 In Pride of May 01’58
    B02 O Care, Thou Wilt Despatch Me 02’15
    B03 Sit Down and Sing 01’09
    B04 Death Hath Deprived Me 04’43
    B05 As Wanton Birds 01’24
  • MÚSICA INGLESA: diversos
    B06 William Simmes (1575-1625): Fantasie 02’08
    B07 Alphonso Ferrabosco Jr (1575-1628): Four Note Pavan 02’12
    B08 Anthony Holborne (1545-1602): Galliard 01’54
    B09 John O’Koever (?-?): Fantasie 02’28
    B10 Orlado Gibbons (1583-1625): In Nomine 03’34

EASTMAN BRASS QUINTET
Daniel Patrylak and Philip Collins, trompetes
Verne Reynolds, trompa
Donald Knaub, trombone
Cherry Beauregard, tuba

Gravado em Nova York em setembro de 1967
Digitalizado por Ranulfus em junho de 2016

. . . . . . . BAIXE AQUI (download here) – FLAC

. . . . . . . BAIXE AQUI (download here) – MP3 320 kbps

Ranulfus

De Falla (1876-1946): Concierto para Clave – Orbón (1925-1991): 3 Cantigas del Rey; Partitas – Arauxo (1584-1654): Tiento – Selma y Salaverde (1595-1636): canzone, danze. Rafael Puyana, Heather Harper.

BISCOITO FINO, senhores! Fino e incomum. É até difícil escolher por qual aspecto começar a falar deste que talvez seja o mais ciumentamente conservado entre os vinis do Monge Ranulfus – então comecemos justamente pelo desafio que foi a digitalização.

É espantoso, antes de mais nada, que tão tremendo material nunca tenha sido relançado em formato digital, com remasterização profissional. Nossa luta para recuperar o conteúdo foi inglória: toda tentativa de reduzir o rumble de fundo resultou em distorção grotesca dos timbres, e até sumiço de notas essenciais. O que os senhores têm em mãos é portanto apenas uma “fotografia” de uma audição de vinil, onde há uma discreta porém contínua nota que os compositores não escreveram, introduzida pela mecânica do equipamento – além de algumas fantasmagorias eletroeletrônicas, que sequestrariam integralmente o som do cravo caso fossem removidas, especialmente na bela faixa 14. Espero que me perdoem porque poderia ser pior: poderíamos não ter essa música ao alcance!

A capa proclama orgulhosamente que, exceto o concerto de De Falla, todas as faixas são “primeiras gravações mundiais”. É uma produção complexa, envolvendo diferentes grupos de músicos, inclusive dois regentes de renome, tendo em comum apenas o cravista Rafael Puyana – por isso espanta que a Philips holandesa não tenha registrado local nem data das gravações, nem do lançamento. Podemos apostar em 1963 ou 64 apenas porque as “Partitas” de Julián Orbón aparecem sem numeração – e em sua lista de obras se encontram “Partitas nº 1” de 1963, e “Partitas nº 2” já de 1964.

Rafael Puyana, de certa forma o star da produção – não sem razão, mesmo se em boa parte do disco o cravo não é solista -, nasceu na Colômbia em 1931. Estreou como pianista aos 13 anos, foi estudar em Boston aos 16, e aos 19 estava em Paris, como aluno de cravo de ninguém menos que Wanda Landowska, e de composição da onipresente Nadia Boulanger.

O disco se abre com o paradoxal monumento que é o Concerto para Cravo, Flauta, Oboé, Clarinete, Violino e Violoncelo – composto por de Falla em 1926 e dedicado precisamente a Madame Landowska. Paradoxal porque atinge o lirismo através de aspereza e energia frenética, quase a patadas, e a monumentalidade em meros 13 minutos – e justamente por isso é um monumento. Se, como disse José Miguel Wisnik, A Sagração da Primavera for “heavy metal de luxo”, pra mim isto será “heavy metal de luxo de câmara, cool e cult” – algo assim.

Em contraste, o lado B traz música espanhola da renascença ou barroco inicial: um Tiento de Francisco Correa de Arauxo para teclado solo, e o resto são “canções” e danças instrumentais compostas ou arranjadas em contraponto pelo frei Bartolomé de Selma y Salaverde. Pense 1963, e verá que esse foi um trabalho pioneiro, anterior à prevalência dos instrumentos de época, mas feito com suficiente garra e bossa para não me soar inautêntico. O destaque vai para a faixa 14 (com perdão dos seus ruídos inexorcizáveis), onde os ‘due tenori’ que dialogam são feitos por um fagote moderno e por uma dulciana – de mesma tessitura, porém de timbre mais recolhido – num possível símbolo da passagem de bastão que se daria na abordagem à música antiga nas décadas seguintes.

Finalmente, Julián Orbón: nascido na Espanha, fez o trajeto inverso a Puyana: aos 18 anos veio morar em Cuba, com a família também de músicos. Depois terminou se instalando nos EUA, onde foi alvo de altos elogios de Copland, com quem teve aulas. Nas Tres Cantigas del Rey o cravo e um quarteto de cordas dialogam de modo contemporâneo com as Cantigas de Santa Maria atribuídas a Dom Alfonso X, “el sabio”, rei de Castela, sendo os textos, no entanto, não em castelhano e sim em galego-português arcaico – dos mais antigos documentos da nossa língua, portanto. O resultado? Ouçam vocês mesmos. Comento apenas que minha preferida é a segunda.

Quanto às suas Partitas para cravo solo, tomei a liberdade de deslocar do final do lado A para o final geral do programa – pois para mim isso é música pra lá de séria. De uma profundidade introspectiva que exige silêncio depois, e não danças saltitantes. E afirma Orbón, para mim, como um compositor maiúsculo, substancial, que não era pra estar entre os “etcétera”, como se encontra agora. Quer dizer: qualquer pista para mais de Julián Orbón será bem-vinda!

Manuel de Falla (1876-1946): Concierto para Clave y cinco instrumentos (1926)
01 Allegro  03’15
02 Lento (giubiloso ed energico)  05’53
03 Vivace (fessibile, scherzando)  04’04

Julián Orbón (1925-1991): Tres Cantigas del Rey (1960)
04 A creer devemos que todo pecado (cantiga 65)  02’09
05 A Virgen en que é toda santidade (cantiga 134)  03’44
06 Resurgir pode et fazel os seus vivel (cantiga 133)  01’23

Fray Bartolomé de Selma y Salaverde (~1595 – ~1636)
07 Canzona a 4 (sopra Bataglia)  04’37

Francisco Correa de Arauxo (1584-1654)
08 Quinto Tiento de séptimo tono (cravo solo)  04’00

Fray Bartolomé de Selma y Salaverde (~1595 – ~1636)
09 Gagliarda a 2  01’40
10 Canzona per soprano solo  03’11
11 Balletto a 2 e a 3  01’57
12 Corrente a 3  00’35
13 Corrente a 4  01’00
14 Canzona a 3 (due tenori e basso)  04’06

Julián Orbón (1925-1991)
15 Partitas nº 1 (cravo solo) (1963)  09’37

  • Rafael Puyana, cravo
  • David Sandeman, Neil Black, Thea King, Raymond Cohen, Terence Weil, com direção de Charles Mackerras (faixas 01 a 03)
  • Heather Harper, soprano; London Symphony String Quartet; direção de Antal Dorati (faixas 04 a 06)
  • David Munrow, flauta doce e dulciana. Deirdre Dundas-Grant, fagote. Raymond Cohen, Nona Liddell, violinos. Patrick Ireland, viola. Terence Weil, violoncelo. Oliver Brookes, violone. Stephen Whittaker, percussão (faixas 07 a 14)

.  .  .  .  .  .  BAIXE AQUI – download here (MP3 320 kbps)

Ranulfus

Friedrich Gulda (1930-2000): Jazz Works – com J.J.Johnson, Freddie Hubbard, Sahib Shihab e Eurojazz Orchestra

IMG_20160602_080123bNão se enganem: isto não é uma “curiosidade” que “talvez valha a pena baixar”… É Música com M Maiúsculo.

Não se costuma pensar em Gulda como compositor e sim como pianista – e muitas vezes como um pianista questionável por suas ousadias heterodoxas, mesmo tendo sido professor de gente como Marta Argerich e Claudio Abbado – mas aqui Gulda comparece não só como pianista, mas também como band leader e autor das três composições, cuja proposta vamos deixar que ele mesmo explique:

    Music for Four Solists and Band No. 1 é uma nova obra em uma série de composições em que venho tentando abrir para o jazz as formas clássicas maiores (sonata, sinfonia, concerto etc.). Creio que até agora o jazz se confinou em formas muito estritas e esquemáticas – quase só a da canção ou balada de 32 compassos e do blues de 12 compassos. Hoje muitos músicos jovens vêm se dando conta da limitação dessas formas, e tentam libertar-se delas de golpe, abrindo mão de toda e qualquer forma e jogando fora tudo o que foi legado pela tradição (free jazz).

    Eu acredito que há outra saída: não é apenas explodindo as formas que o jazz teve até agora que seus limites podem ser dilatados, mas também mediante o seu enriquecimento através das grandes formas clássicas. Europeu que sou, este último caminho me parece o mais frutífero. Tenho a sensação de que simplesmente ainda não foram percebidas as possibilidades que nossa grande tradição musical oferece ao jazz. Longe de esgotadas, essas possibilidades são novas e vigorosas. Os jazzistas europeus se miram em New Orleans, Harlem ou no South Side de Chicago, mas nem assim conseguem assimilar a tradição do negro americano em sua plenitude. Nunca entendi por que não recorrem mais intensamente à sua própria tradição!

    A Music for Four Solists and Band é uma obra para quatro solistas – trompete, trombone, sax barítono alternado com flauta, e piano – na forma clássica de concerto em três movimentos: 1º: Forma-de-sonata com uma introdução lenta, exposição, desenvolvimento, reexposição e coda. – 2º: Balada com um e meio “choruses” (variações), com introdução e cadência do piano. – 3º: Rondó. […]  (Traduzido por Ranulfus)

Ou seja: a cooperação entre tradição clássica e jazz que Gulda propõe e realiza não é um maneirismo: uma descaracterização de composições clássicas interpretando-as à maneira de jazz, nem uma descaracterização do jazz interpretando-o à maneira clássica (p.ex. em arranjos para orquestra sinfônica): trata-se de “jazz de verdade” – em suas características harmônicas, melódicas, rítmicas, tímbricas, prosódicas, etc. – que apenas faz uso complementar de técnicas composicionais originárias da tradição europeia. E a isso este monge só pode voltar o entusiasmo devido a uma realização intelectual do mais alto nível!

Nas duas outras peças do disco vemos um caminho misto: o “Minueto” não se restringe a um uso de forma: este mescla, sim, materiais melódicos, rítmicos, harmônicos, bem como estilos de interpretação, de origem europeia e jazzística. Que cada um avalie como lhe aprouver; da minha parte, não deixo de achar uma peça encantadora.

Já no “Prelúdio e Fuga”, peça para piano solo que conclui o disco, temos um prelúdio (forma livre) em que predomina a vertente europeia, e uma fuga (forma fortemente regrada) onde predomina o jazz: bem o contrário do que seria de esperar, no que talvez possamos ver mais um exemplo da verve intelectual do Sr Friedrich. (Vale ainda notar que mais tarde esta Fuga foi gravada mais de uma vez pelo recém-falecido Keith Emerson – inclusive no álbum ao vivo Welcome back, my friends, to the show that never ends, postado aqui recentemente pelo colega FDP, onde mesmo um fã de E.L.& P., como eu, tem que reconhecer que Keith não se saiu muito bem).

Digno de nota, ainda, que colaborem com Gulda neste seu projeto cinco dos maiores jazzistas estadunidenses da segunda metade do século XX – quatro deles negros: além dos solistas nomeados logo abaixo, Ron Carter foi o baixista e Mel Lewis o baterista da “Eurojazz Band”, ao lado de nove jazzistas nascidos de fato na Europa.

Finalmente: esta postagem marca a volta do “monge Ranulfus” à arte da digitalização do vinil, que aprendeu em 2010 com o colega Avicenna e chegou a praticar até outubro daquele ano, tendo aí que deixá-la de lado devido a contingências da vida. Restabelecidas agora as condições mínimas, Ranulfus ainda não sabe com que frequência conseguirá praticá-la, mas mesmo assim informa que tem cerca de 50 LPs (ou vinis) à espera. Por essa e por muitas outras razões esta postagem vai carinhosamente dedicada ao “decano do PQP”, nosso querido Avicenna!

Friedrich Gulda:
M
USIC FOR 4 SOLOISTS AND BAND No.1   [M4SB1] 
01 Primeiro movimento  9’38”
02 Segundo movimento  8’25”
03 Terceiro movimento  6’44”

04 MINUET (da suíte Les Hommages) 6’47”

05 PRELUDE AND FUGUE 4’11”

Freddie Hubbard (1938-2008), trompete
J. J. Johnson (1924-2001), trombone
Sahib Shihab (Edmond Gregory) (1925-1989), sax barítono e flauta
Friedrich Gulda (1930-2000): piano, composição e direção
Eurojazz Orchestra
Gravado na Áustria em 1965
Digitalizado em 2016 por Ranulfus, com assistência de Daniel S.,
a partir do LP remasterizado em estéreo lançado na Alemanha nos anos 70.

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Ranulfus

George Enescu (1881-1955): Poema Romeno, Op. 1 e Rapsódias Romenas Nº 1 e 2, Op. 11

George Enescu (1881-1955): Poema Romeno, Op. 1 e Rapsódias Romenas Nº 1 e 2, Op. 11

IM-PER-DÍ-VEL !!!

O compositor romeno George Enescu não é tão conhecido em nosso país. Não é fácil encontrar material sobre este grande compositor do leste europeu. Lembro-me que os primeiros contatos que tive com o compositor se deu há alguns anos atrás num programa de rádio que é transmitido aqui em Brasília e se chama Clássicos de Todos os Tempos. É um extraordinário programa diário. Duas horas de música erudita – das 20 horas às 22 horas. Neste programa entrei em contato com as rapsódias romenas, que são majestosas. É música folclórica. Enescu nasceu em 1881 e morreu em 1955. Aos quatro anos já tocava violino. Com 12 anos era uma sensação nas salas de concerto da Europa. Estreou como compositor ao 17 anos (Poema Romeno, Op. 1). As suas famosas rapsódias romenas foram escritas em 1901-02. Com a extensão do seu trabalho, Enescu chegou a se tornar o diretor de orquestras americanas – Nova York e Filadélfia. No que tange às composições deste CD que ora posto, já tive oportunidade de ouvir por várias vezes durante a semana. O Poema Romeno para orquestra e coro, Op. 1 é maravilhoso e demonstra toda a precocidade de um gênio. Há a participação de um coro. Já a Rapsódia Romena no. 1 é a mais conhecida e de melodia doce e agradável. E aparece ainda a Rapsódia Romena no. 2 de fulgurante leveza orquestral. É de uma beleza silenciosa. Faz lembrar Sibelius. Acredito que este CD impressione. É uma oportunidade positiva para se conhecer George Enescu que há muito deveria ter aparecido aqui no PQP Bach. Boa apreciação!

George Enescu (1881-1955) – Poema Romeno, Op. 1 e Rapsódias Romenas nos. 1 e 2, op. 11 no. 1 e 2

01 – Romanian Poem Op.1 – Moderato – Adagio – Allegro vivo – Adagio – Moderato – Presto [30:06]
02 – Romanian Rhapsody No.1 in A major Op.11 No.1 [12:22]
03 – Romanian Rhapsody No.2 in D major Op.11 No.2 [11:48]

Coro e Orquestra da Rádio e Televisão Romena
Iosif Conta, regente

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Enescu: mais um nascido em 19 de agosto
Enescu: mais um nascido em 19 de agosto

Carlinus

J.S.Bach (1685-1750): Cantatas 78 e 106 (Actus Mysticus, ou Tragicus) com Felix Prohaska

J.S.Bach (1685-1750): Cantatas 78 e 106 (Actus Mysticus, ou Tragicus) com Felix Prohaska

Publicado originalmente em 10.06.2010

Sim, claro que o nome atribuído tradicionalmente à Cantata 106 é Actus Tragicus, não Mysticus. Acontece que, não importa quem botou esse apelido, é uma baita traição às intenções de Bach.

Além disso, em junho de 2010 nosso blog já tem 4 outras versões da 106, então pra que postar mais esta? Ainda mais que o único arquivo que encontramos não é em mp3 de alta qualidade? Bem, acontece que um dia meu amigo Nahum – o mesmo da minha primeira postagem de órgão de Pachelbel – me escreveu dizendo que tem um amor especial por esta versão por ser a menos ‘operística’ que conhece; a menos com intenções de concerto e mais de ato propriamente religioso. Coincidiu que esta foi também a primeira 106 que ouvi, décadas atrás, e tendo a concordar.

Prohaska não é Harnoncourt mas foi um passo importante na direção. Já nos anos 50 começou a usar grupos menores e instrumentos mais autênticos do que, digamos, um Richter – embora tantas vezes tenha continuado exagerando nas lentidões e legatos. Mas como negar, por outro lado, que o gênio da musicologia que é Harnoncourt, na hora da realização às vezes exagera irritantemente no sentido oposto, o da saltitância? Enfim: eu acho que Prohaska merece respeito, vamos ver o que vocês vão achar.

No disco a Cantata 78 vinha primeiro, mas inverti. Dela prefiro mesmo outras gravações, esta me soa pesada e convencional… a não ser pelo segundo movimento, um dueto soprano-contralto que deve estar entre as páginas mais risonhas do pai do PQP, quase bandinha de festa popular… e pelo que andei vendo na net há quase uma seita de curtidores dessa peça justo nesta versão do Prohaska!

Mas a 106 é realmente muito especial
entre as cantatas de Bach, a começar por muito da sua grandeza se dever à – digamos – inexperiência: Bach tinha só 22-23 anos quando a compôs, e os jovens costumam ousar mais na invenção de formas pessoais para dizer o que querem. Mais tarde… sabem como é, a exigência de produzir rápido e muito, o leite das crianças… o jeito é recorrer a modelos de estrutura que já deram certo, ainda que preenchendo com conteúdos novos e genais.

E aqui nosso jovem ousou nada menos que… uma representação do momento da morte em primeira pessoa, inserida num rápido porém incisivo ensaio teológico.

Daí ser tão ridículo o apelido ‘tragicus’, pois toda a intenção a obra é afirmar que a morte não é tragédia e sim um encontro amoroso. Logo à frente está o texto completo com tradução interlinear pra vocês mesmo acompanharem e verem se não – mas ‘entrego’ antes alguns detalhes não tão óbvios.

Um, que a música é cheia de figurações do texto, p.ex: a sílaba alongada em ’so laaaaaaaange’ (’por taaaanto tempo’), ou os instrumentos que se calam para deixar soar a palavra stille (silêncio, quietude) – enquanto a instrumentação e tonalidade dita pastoral – fá maior, só flautas doces, violas da gamba e contínuo, sem violinos – visa ambientar esse pequeno estudo da morte num clima de (juro!) música de ninar.

Dois coros de escritura livre emolduram a ‘representação’: o inicial antecedido por uma ’sonatina’ instrumental, o final seguido por uma única cadência dos instrumentos que não é só um eco do amém, mas também uma espécie de conclusão da sonatina inicial, com um tom de brincadeira e ao mesmo tempo afirmação séria da unidade do conjunto.

De entremeio, dois ‘atos’ de solos e coros encadeados que correspondem de certa forma ao Velho e ao Novo Testamento: no primeiro afirma-se a morte como lei inescapável – mas ainda no meio dessa afirmação a alma humana (em forma de voz de soprano) começa a chamar pelo vencedor da morte: ‘vem, Senhor Jesus, vem!’ Tudo vai se calando, ficando só a voz e o pulsar do seu coração. O pulsar para… e a voz conclui a palavra ‘Je-su’ depois, ‘apoiada em nada’: nada menos que a afirmação da sua continuidade independente do corpo, que é precisamente o que a fé espera dessa invocação.

Mas parece que todas as tradições falam de um trajeto entre o momento da morte e o mundo definitivo do além (ver p.ex. no balé ‘300 anos de Zumbi’, de Gilberto Gil, que também já postei aqui): o ‘Novo Testamento’ se abre com a alma (que virou contralto) dizendo ‘estou enviando às tuas mãos o meu espírito, ao que Cristo – agora presente, não só invocado – responde ‘ainda hoje estarás comigo no paraíso’ – e de repente já é todo um grupo de contraltos que vai em frente cantando com uma… serenidade segura: ‘é com paz e alegria que eu viajo para lá’. E aí o coro final é louvor e afirmação de fé – mas sem se aventurar a oferecer nenhuma representação do estado final: afinal, na teologia aceita por Bach, ‘nem um olho viu, nem um ouvido ouviu o que Deus tem preparado para os seus’.

O antropólogo Gilbert Durand fala de três vertentes do imaginário humano; a do meio não importa agora, mas as duas extremas seriam a Heroica, de caráter diurno e derivada do esforço de conquista da posição vertical pela criança, e a Mística, de caráter noturno, derivada da busca da intimidade dos braços e do colo da mãe, anseio de descansar do esforço e riscos da existência separada reintegrando-se com o todo de onde se saiu. Quem sabe assim fique mais claro o porquê da minha traição ao título tradicional!

J.S. Bach: duas cantatas regidas por Felix Prohaska
01-04 Cantata 106, ‘Gottes Zeit ist die allerbeste Zeit’
06-12 Cantata 78, ‘Jesu, der du, meine Seele’

Coro e orquestra “The Bach Guild” (projeto N.York-Viena da Vanguard Records)
Tereza Stich-Randall, soprano – Dagmar Hermann, contralto
Anton Dermota, tenor – Hans Braun, baixo – Anton Heiller, órgão

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FAIXAS E TEXTO DA CANTATA 106

01 “SONATINA” INSTRUMENTAL

02 [MOVIMENTO ARTICULANDO 6 ELEMENTOS SUCESSIVOS OU SIMULTÂNEOS]

CORO
Gottes Zeit ist die allerbeste Zeit.
A hora de Deus é a melhor de todas.
In Ihm leben, weben und sind wir, solange Er will,
N’Ele vivemos, “tecemos” e estamos, enquanto Ele quer,
In Ihm sterben wir zur rechten Zeit, wenn Er will.
N’Ele morremos na hora certa: quando Ele quer.

TENOR SOLO
Mein Herr! (Ach, Herr!)
Meu Senhor! (Oh Senhor!)
Herr, lehre uns bedenken, dass wir sterben müssen,
Senhor, ensina-nos a considerar que temos que morrer,
auf dass wir klug werden.
para ganharmos juízo.

BAIXO SOLO
Bestelle dein Haus!
Encomenda tua morada!
Denn du wirst sterben und nicht lebendig bleiben.
Pois tu irás morrer, e não permanecer em vida.

CORO (FUGATO)
Es ist der alte Bund: Mensch, du musst sterben.
Esse é o antigo pacto: ó humano, tu tens que morrer.

SOPRANO SOLO
Ja, komm, ja komm, Herr Jesu, komm!
Sim, vem, sim vem Senhor Jesus! Vem!

HINO: INSTRUMENTAL (texto implícito para os ouvintes)
Ich hab’ mein’ Sach’ Gott heimgestellt …
Entreguei minha causa a Deus …

IV. [MOVIMENTO ARTICULANDO 3 ELEMENTOS]

CONTRALTO SOLO
In deine Hände befehl ich meinen Geist;
A tuas mãos envio o meu espírito;
Du hast mich erlöset, Herr, Du getreuer Gott!
Tu me libertaste, ó Senhor, Deus fidedigno que és.

BAIXO SOLO
Heute, heute wirst du mit mir im Paradies sein.
Hoje, ainda hoje, comigo no paraíso hás de estar.

HINO: CONTRALTOS EM UNÍSSONO
Mit Fried’ und Freud’ ich fahr dahin
Com paz e alegria eu viajo para lá
in Gottes Willen.
na vontade de Deus.
Getrost ist mir mein Herz und Sinn,
Confortados estão para mim o coração e tino,
sanft und stille.
em brandura e quietude.
Wie Gott mir verheissen hat:
Como Deus me prometeu:
der Tod ist mein Schlaf worden.
a morte se tornou meu sono.

V. CORO
Glorie, Lob, Ehr und Herrlichkeit
Glória, louvor, honra e majestade
Sei dir, Gott Vater und Sohn bereit,
sejam preparados para Ti, ó Deus ‘Pai e Filho
Dem heil’gen Geist mit Namen!
e Espírito Santo’ nomeado.
Die göttlich Kraft
O poder divino
mach uns sieghaft
nos faça vitoriosos
durch Jesum Christum – amen.
através de Jesus Cristo – amém.

Felix Prohaska

Ranulfus

Poulenc, Roussel, Françaix, Ibert para quinteto de sopros (com ou sem piano)

20th Century Wind Music http://i49.tinypic.com/33kc1sh.jpgPostado originalmente em junho 2010

Sempre achei este um dos discos mais malucamente, esquisitamente encantadores entre os mais de mil vinis que cheguei a ter – tanto que foi logo o segundo vinil a que apliquei as artes de ripagem ensinadas pelo mestre Avicenna.

Infelizmente boa parte dele está também entre o pior do que tenho em matéria de ruídos indevidos, e nem mesmo com essas artes consegui eliminar um ruído grave, surdo, regular, que atravessa a primeira faixa do Quinteto de Françaix e avança um pouco pela segunda. Aliás: consegui eliminá-lo totalmente em várias tentativas, mas sempre ao custo de fazer dos timbres da trompa e do fagote uma caricatura irreconhecível.

Ora, direis, a peça de Françaix já é mesmo toda caricatural – antes de conhecê-la nunca imaginei que uma trompa podia produzir semelhantes gargalhadas roucas e zombeteiras… Mas é uma caricatura encorpada, consistente, e com o ruído eliminado tinha virado uma espécie de trilha de game japonês… Não, senhores, desculpem, mas aposto que é melhor agüentar um ruído estranho a mais, de entremeio aos arrulhos fantasmagóricos iniciais daquela trompa, do que ainda ouvir tal timbre se decompondo como uma lesma em que se jogou sal!

Enfim: mesmo em seus momentos mais meditativos ou sentimentais, este disco inteiro me parece pura alegria – o verdadeiro sentido da palavra divertimento, como o PQP disse há algum tempo de outro disco. Portanto, me apresso a deixar vocês com a música!

20th Century Wind Music for Wind Instruments
The Vienna Symphony Woodwinds

Kamillo Wanausek (flauta), Friedrich Wächter (oboé), Richard Schönhofer (clarinete), Ernest Mühlbacher (trompa), Leo Cermak (fagote) – com Hans Graf, piano

Francis Poulenc (1899-1963): SEXTUOR
A1  Allegro vivace
A2 Divertissement: Andantino
A3 Prestissimo

Albert Roussel (1869-1937):
A4 DIVERTISSEMENT op.6

Jean Françaix (1912-1997): QUINTET
B1 Andante tranquillo
B2 Presto
B3 Tema (andante) – variations
B4 Marcia francese

Jacques Ibert (1890-1962):TROIS PIECES BREVES
B5  Allegro
B6  Andante
B7  Assez lent – Allegro scherzando

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Ranulfus

Orquestra Sinfônica do Recife – dois CDs com premières mundiais

239

Originalmente postado por CVL, e repostado pelo Avicenna.

Essas duas pérolas ora postadas nunca foram comercializadas, ficaram apenas como registro formal e institucional de duas iniciativas louváveis da Orquestra Sinfônica do Recife acontecidas há dez anos: a gravação das três primeiras colocadas em um concurso de composição em função dos 500 anos do Descobrimento, o único promovido por conta da data, e o resgate de uma obra ignorada do catálogo de Francisco Mignone, o balé Quincas Berro d’Água, sobre o livro quase homônimo de Jorge Amado.

No primeiro CD, destaco a consistência da peça do cearense Liduíno Pitombeira, que ganhou merecidamente o primeiro lugar: bem orquestrada, bem estruturada, bem encadeada.. enfim, houve justiça. No segundo, não esperem mais do que uma partitura naïf, embora muito agradável, de Mignone – o Lamento e Dança Brasileira, de Clóvis Pereira, vem de brinde mas não tem nenhum grande atrativo.

***

500-anosSinfonia dos 500 anos

1. Uma lenda indígena brasileira – Liduíno Pitombeira
2. Sinfonia brasileira em três movimentos – Rodrigo Celso Vitta
3. A sinfonia dos 500 anos – Ronaldo Cadeu de Oliveira

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berro1. Quincas Berro d’Água – Francisco Mignone
2. Lamento e Dança Brasileira – Clóvis Pereira

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Em ambos os CDs: Orquestra Sinfônica do Recife, regida por Carlos Veiga

CVL

A ‘jam session’ de Beethoven com o violinista negro Bridgetower (Op.47) e seu ‘jazz 120 anos antes’ (Op.111)

Publicado originalmente em 02.07.2010

Juro que tentei fazer mais curto, isto que o Grão-Mestre PQP, o Filho de Bach, chamou de ‘post-tese’… mas acho que a história a seguir é saborosa demais pra ser escondida, e outra chance não haverá. Só espero que vocês concordem! Trata-se do encontro entre Beethoven e o outro violinista negro com George no nome, mencionado de passagem na nossa primeira postagem sobre o Cavaleiro de Jorge francês (Chevalier de Saint-George).

John Frederick Bridgetower era um valete negro numa residência polonesa dos príncipes Esterházy do Império Austro-Húngaro. Lê-se que provavelmente havia fugido da escravidão em Barbados (novamente o Caribe), mas também que alegava ser um príncipe de seu próprio povo.

Sabemos por outros casos que isso não seria impossível, e, verdade ou não, John parece ter vivido nas cortes como um peixe n’água. Ainda na Polônia casou-se com Marianna Ursula – que uns creem suábia, outros polonesa – e aí mesmo, em 1778, nasceu-lhes George Augustus Polgreen Bridgetower – o que definitivamente não parece nome de filho de alguém que se considerasse servo.

George Bridgetower jovem http://i47.tinypic.com/112a0ic.jpg

Quanto a ‘George’, de certa forma também presente no nome daquele outro mestiço, Joseph Bologne, Chevalier de Saint-George – será mera coincidência? Pode ser, mas… um ano antes Mozart havia encontrado a vida musical de Paris dominada pela figura do violinista mestiço. Os Bridgetower viviam dentro da corte austríaca – e muito, muito cedo o pequeno Geoge Bridgetower também estava com o violino nas mãos. Nunca encontrei uma linha sobre isso, mas acho difícil não especular uma relação!

Mesmo se com o nome não houve mais que coincidência, é de fato improvável que não tenham sabido um do outro mais tarde: logo a família passou a servir no próprio Castelo Esterházy, onde atuava ninguém menos que Haydn – tão empregado dos Esterházy quanto os pais de George – e segundo algumas fontes, este logo teve o privilégio de aulas com o gigante.

Ora, se é verdade que Saint-George foi pessoalmente à Áustria encomendar as seis Sinfonias Parisienses (oferecendo por elas um valor que o pobre Haydn jamais havia sonhado), pode ter encontrado aí o pequeno George com 6 ou 7 anos. E mesmo se não foi pessoalmente, não deixou de haver correspondência entre o compositor de Paris e o austríaco que ele evidentemente admirava – pois empenhou-se em promovê-lo numa Paris que ainda não se havia dado conta da sua importância, como se vê no surpreso encantamento registrado nos jornais após essa estréia sêxtupla regida por Saint-George.

Para completar, aos 11 anos George Bridgetower faz seu début como virtuose do violino justamente no Concert Spirituel de Paris – do qual Saint-George havia sido diretor, se é que já havia deixado de ser.

A esta altura o pai aparentemente já não servia aos Esterházy, pois pelas cortes da Europa se comentava da finesse e desenvoltura em cinco idiomas com que empresariava os concertos do filho-prodígio – e este aos 13 anos cai nas graças de mais um George: o Príncipe de Gales, futuro George IV da Inglaterra e Hannover. Este lhe banca estudos de violino, teclado e composição com os maiores mestres da Londres da época – em troca, obviamente, do “passe” do menino.

Aos 25 anos, em licença, George chega a Viena, onde Beethoven, com 33, já pontificava. A amizade parece ter sido imediata, informal e entusiástica: Beethoven retoma alguns esboços, e em uma semana conclui a nona e mais importante das suas sonatas para violino e piano. Vão estreá-la juntos em 25/05/1803, com Bridgetower – acreditem ou não – tocando boa parte à primeira vista, e ainda lendo por sobre o ombro do compositor, pois nem tinha havido tempo para copiar a parte do violino.

Mas o melhor da história vem no segundo movimento, quando o piano reapresentava sozinho uma idéia exposta antes pelo violino – e Bridgetower ousou improvisar comentários uma oitava acima em vez de aguardar. Beethoven teria saltado do piano e… ao contrário do que se poderia esperar do seu gênio, teria abraçado o violinista com palavras que se traduzem perfeitamente por “Mais, camaradinha, mais!” – o que me faz perguntar: terá sido essa a primeira jam session da história?

Que o clima era de divertimento, atesta-o também o título que aparece no manuscrito original: nada menos que “Sonata mulattica, composta per il mulatto Brischdauer [grafia jocosa do nome], gran pazzo [grande maluco] e conpositore mulattico” – havendo referência ainda à anotação “Sonata per un mulattico lunatico”.

Tão informal, porém… que segundo um relato da época os dois teriam comemorado a estréia com uma bebedeira homérica, no meio da qual Beethoven teria se dado por ofendido por uma observação de Bridgetower sobre determinada mulher… A amizade teria terminado aí, e seria por isso que pouco tempo depois Beethoven enviou a sonata com dedicatória ao francês Rodolphe Kreutzer, violinista mais famoso da época.

Outros veem uma razão mais pragmática: com brigas ou não, Beethoven planejava uma temporada em Paris e pensou que dedicar a sonata a Kreutzer podia ajudar no projeto. O fato é que a viagem não se concretizou, e Kreutzer, por sua vez, apenas passou os olhos e disse que a obra era um nonsense inexecutável, e que de resto não lhe interessava porque ‘nem era virgem’ (a expressão é minha)… Nunca tocou a peça que imortalizou seu nome injustamente, enquanto o de Bridgetower só recentemente vem sendo recuperado.

Mas não pensem que para este a briga com Beethoven – se é que houve – tenha sido o fim: em 1811 bacharelou-se em Música em Cambridge ‘defendendo’ um anthem para coro e orquestra (e eu fiquei extremamente surpreso de saber que já existia isso em música na época); deixou ainda peças para piano, canções, suítes de arranjos de danças, e ao que parece dois concertos e uma sinfonia desaparecidos (nunca encontrei referência a nenhuma gravação de suas peças, infelizmente). Foi membro das associações profissionais mais importantes, e parece ter tido considerável papel como professor, do que é documento uma carta de Vincent Novello, pioneiro do revival de Bach na Inglaterra, assinada como “seu antigo aluno e admirador profissional sempre”. Bridgetower viveu ainda alguns períodos em Roma e fez diversas viagens pela Europa, até morrer em Londres com 82 anos, em 1860.

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Quanto à música, é de notar que esta Sonata op.47 tenha sido composta no mesmo ano que a Eroica, tida por um marco no estabelecimento do romantismo em música. As duas têm praticamente o dobro da duração das obras anteriores do mesmo gênero, e são saltos definitivos no sentido da pessoalidade da linguagem. (Quanto ao fato de anteriormente Beethoven já ter publicado 8 sonatas para violino e só 2 sinfonias, me faz pensar numa imensa preparação interior para revolucionar esta forma antes de poder adotá-la como seu campo privilegiado de expressão pessoal).

Este blog já tem outra gravação da Sonata “a Kreutzer” (argh!), e com ninguém menos que Yehudi Menuhin – mas fui ouvi-la e achei um tanto fria, e sobretudo daquela solenidade pedante que se costumava atribuir a Beethoven, mas que – como vimos – não tem nada a ver com o clima da criação da obra. Preferi esta gravação recente do austro-canadense Corey Cerovsek com o finlandês Paavali Jumppanen – apesar de a qualidade de som deixar a desejar, nesta versão ao vivo (que não é a mesma do CD acima).

Mas a postagem ainda me parecia incompleta, e aí lembrei daquela outra obra de Beethoven, onde, incompreensivelmente, sua experimentação resultou em cinco minutos que soam literalmente como o mais legítimo jazz pianístico de 120-150 anos depois: sua última sonata para piano, a famosa Opus 111. Para isso escolhi mais uma gravação ao vivo recente, a do inglês Paul Lewis (e, mais uma vez, o selo da Amazon se refere à versão de estúdio. Lewis, a propósito, já fez a integral das sonatas).

Beethoven muitas vezes abriu mão do processo clássico de desenvolvimento de idéias musicais em favor da forma tema-e-variações, tida pela musicologia como de origem espanhola. Uma das vezes foi no 2.º movimento da sonata estreada com Bridgetower. Outra, no 2.º e (de modo incomum) último movimento da op. 111, o que lá pelas tantas ‘vira jazz’.

Também em muito de Saint-Georges parecemos encontrar uma opção pela apresentação de um tema e sua variação, em lugar de um desenvolvimento propriamente dito.

Haverá algo de uma ‘sensibilidade negra’ nessa opção pela variação – que, afinal, é o próprio processo estrutural do jazz? E teria Beethoven sido tocado de algum modo por essa sensibilidade negra através do seu encontro com Bridgetower, ou mesmo de um nada impossível contato com obras de Saint-George?

Talvez não – mas também não seria impossível. E se é certo que nunca teremos certeza, também me parece extremamente estimulante mantê-lo como hipótese em aberto, ‘talvez não, talvez sim…’ Afinal, não se tratando de questões de sobrevivência, a certeza é tanto desnecessária quanto empobrecedora – e sobretudo anti-poética, incompatível com a natureza da arte!

Faixa 1
Sonata para violino e piano n.º 9, op. 47 – ‘Mullatica’, ‘Kreutzer’ (1803)
. . 00:00 Adagio sostenuto – Presto
. . 13:40 Andante con variazioni
. . 28:50 Presto
Corey Cerovsek, violino – Paavali Jumppanen, piano
Gravação ao vivo disponibilizada na internet.
Gravação de estúdio pelos mesmos artistas: Claves Records, 2007

Faixa 2
Sonata para piano n.º 32, op. 111 (1822)
. . 00:00 Maestoso – Allegro con brio ed appassionato
. . 08:45 Arietta – Adagio molto semplice e cantabile
. . . . (‘jazz’ de 13:59 a 17:40)
Paul Lewis (Inglaterra), piano
Gravação ao vivo disponibilizada na internet.
Gravação de estúdio pelo mesmo artista: Harmonia Mundi, 2008

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Ranulfus

Mais do violinista-espadachim negro que influenciou Mozart: Joseph Bologne, Chevalier de Saint-George (1745?-1799) – CDs AVENIRA 1 e 2 de 5

Publicado originalmente em 23.06.2010

Emil F. Smidak parece ter sido um sujeito inquieto e versátil: escreveu de teoria política a poesia e a biografias de músicos. Vivia na Suíça, mas ao que parece era tcheco – infelizmente não consegui dados biográficos diretos. Em algum momento apaixonou-se pela história do Chevalier de Saint-George, saiu pesquisando arquivos Europa afora, e escreveu uma das suas principais biografias. Em 1986 a publicou em francês e em inglês pela Avenira Foundation, sediada em Lucerna – também criação sua, ao que parece – e para ilustrar a biografia produziu nada menos que cinco CDs com artistas da cidade tcheca de Plzeň, ou Pilsen (adivinhões – foi lá que inventaram aquela variedade daquela coisa de beber, sim…).

Esses 5 CDs de 1996-97 contêm 12 dos 25 concertos para violino conhecidos, 6 “sinfonias concertantes” de dois movimentos, e uma “sinfonia” em três movimentos que corresponde à abertura do balé L’Amant Anonyme.

Mais recentemente (2006?) a Avenira utilizou parte desse material numa integral dos concertos, mas o material que começo a postar aqui é o dos anos 90, não o mais recente.

Devo avisar que a realização não tem a mesma energia incisiva das de Jean-Jacques Kantorow (do meu post anterior), nem das estupendas realizações do grupo canadense The Tafelmusik Baroque Orchestra, que se vêem e ouvem no documentário Le Mozart Noir (disponível em 5 partes no YouTube, em inglês sem legendas). Soam um pouco mais sinfônicas e convencionais – mas ainda assim convencem, impõem respeito, e são capazes de emocionar profundamente.

Acho importante mencionar logo a existência de um sujeito controverso: Alain Guédé. Gaba-se de ter sido o primeiro a dar visibilidade a Saint-George com sua biografia de 1999 (bicentenário da morte). No seu site apresenta uma discografia de 18 CDs sem sequer mencionar a existência dos da Avenira. Bem, deve ter suas razões: tem sido acusado de ter copiado extensamente da biografia de Smidak sem dar-lhe nenhum crédito. Em tudo, soa superficial e sensacionalista – mas tem a virtude de haver criado, finalmente, um catálogo das obras identificadas de Saint-George, qua agora são numeradas de G 1 a G 215 (adivinhem de onde vem o G?).

Você ficou pensando “puxa, eu gostaria tanto de ver esse catálogo”? Ora, Pai Ranulfus previu que você ia pensar assim e já tomou as providências: você acessa o catálogo em PDF AQUI!

Quero terminar contando que o CD 2 foi o que me chamou mais atenção, por diversas razões, mas acima de todas pela faixa 05, o Adágio do Concerto op. 4: me pareceu absolutamente espantoso, quase inconcebível que tenha sido composto em 1774 (Smidak) ou 75 (Guédé). Mandei sem identificação a um amigo com bastante noção das coisas, e ele, além de ficar encantado, me disse: “é um romântico; um romântico anacrônico, pode ser, mas certamente romântico; sem maiores análises, me lembrou Mendelssohn…”

Eu disse que meu amigo tem noção das coisas em música… e tem. Não falou bobagem nenhuma, pelo que se ouve. E, sabendo da história do compositor, eu ousei ainda um pouco mais na minha tentativa de análise. Mas não quero influenciar a audição de vocês: nada melhor que ouvir de ouvidos limpos, sem expectativa nenhuma, e só ler comentários depois – e por isso incluí essa tentativa num arquivo .DOC junto com o CD 2. Se tiverem vontade, dêem seu feedback aqui: comentem, aprovem, malhem… mas só quem tiver ouvido a peça antes de ler, combinado?

Joseph Bologne, Chevalier de Saint-Georges
Concertos para violino e orquestra e “sinfonias”

Orquestra Sinfônica da Rádio de Plzeň
Regência: František Preisler Jr. (1996-97)
Violino solo e cadências: Miroslav Vilímec

CD 1/5
01-03 Sinfonia op. 11 nº 2 em Ré, “L’Amant Anonyme” – G 074
04-06 Concerto para violino op. 3 nº 1 em Ré – G 027
07-09 Concerto para violino op. 1 nº 1 em Ré – G 010
10-12 Concerto para violino op. 2 nº 2 em Ré – G 026

CD 2/5
10-03 Concerto para violino op. 8 em Sol – G 050
04-06 Concerto para violino op. 4 em Ré – G 029
07-09 Concerto para violino op. 2 nº 1 em Sol – G 025
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Ranulfus

Mais do compositor negro que influenciou Mozart: 6 concertos e 6 sinfonias concertantes do ‘Cavaleiro de Jorge’ Joseph Boulogne (CDs AVENIRA 3+4+5)

Publicado originalmente em 29.06.2010

 

Landais nos contou de St-George, de Paris, um mulato. St-George é o n.º 1 na Europa em equitação, corrida, tiro, esgrima, dança, música. Atinge [com a espada] o botão – qualquer botão – da capa ou do colete dos maiores mestres. Acerta com a pistola uma moeda de 1 coroa no ar. (Do diário de John Adams, 2.º presidente dos Estados Unidos, em 17/05/1779)

Além de uma característica atenção às capacidades bélicas e não às artísticas, pelo que se lê em outras fontes faltou a esse presidente dos EUA mencionar a natação, a patinação no gelo e – se me permitem chamá-lo de esporte – o arrebatamento de paixões femininas.

Já se falou de Liszt como o primeiro pop star, mas considerando as datas e a variedade das frentes de destaque, duvido que surja um candidato mais forte que Joseph Bologne de Saint-George. Nem estranho certa irritação no que alguns têm escrito sobre ele: faz pensar no ‘moleque indigesto’ de Lamartine Babo, que ‘pisca o olho e cai no samba’, ‘faz o footing lá no Leblon’, ‘toca trombone na banda’, ‘já foi vaqueiro numa fazenda’ mas ‘tem um defeito: come demais; come, come, não deixa resto – ó que moleque indigesto’.

Mas a figura de Saint-George parece ser imensamente mais complexa que isso. Mereciam tradução integral os sensíveis textos de Emil Smidak para os encartes desta série de CDs (de onde vêm a citação de John Adams acima). Além disso, as contradições no conjunto de dados que se encontram na net em inglês e francês mostram o quanto ainda falta descobrir, mas sobretudo deixam evidente que nem tudo nessa vida foram flores.

Houve a carta de duas cantoras e uma bailarina à rainha declarando que sua honra e consciência (!) jamais lhes permitiriam trabalhar sob as ordens de um mulato, o que terminou por impedir que ele assumisse a direção da Academia Real de Música. Houve traições e agressões públicas tanto em sua vida civil como na militar. Havia sobretudo a lei (o ‘Code Noir’) pela qual o filho de uma escrava jamais seria herdeiro natural dos títulos e das posses do pai aristocrata; se era chamado de Chevalier, era pelo papel que ocupava de fato na sociedade: legalmente não lhe cabia nenhum título, apesar de sua meio-irmã branca-inteira ser Marquesa de Clairfontaine.

Não é de estranhar, então, ter-se engajado de corpo e mente na causa da Revolução – para também aí se ver traído depois de algum tempo, aguardando a guilhotina preso por cerca de um ano, sendo liberto por um triz em um mundo onde muitos de seus melhores amigos haviam sido executados.

Há controvérsia sobre ele ainda ter estado no Caribe depois disso, envolvido nos processos que levaram à independência do Haiti; os defensores dessa tese dizem que teria voltado profundamente abalado – com certeza por ter visto que a barbaridade do mundo ia ainda bem mais longe que o pior que tivesse conhecido em Paris.

Como a data de nascimento continua controversa, não sabemos a idade exata com que morreu – na faixa dos 51 aos 59 – porém talvez tenha sido uma felicidade ter escapado, por três anos, de ver Napoleão restaurando a escravidão.

Não sei quando encontrarei mais gravações de Saint-Georges para postar, e então quero encerrar esta série de três com algumas das palavras finais do texto de Smidak – depois das quais virão os links de download dos CDs e ainda os do documentário canadense O Mozart Negro no YouTube (em inglês sem legendas – infelizmente não incorporável a partir do endereço atual):

“Na Europa do século 18 houve musicistas maiores que Saint-Georges pelo ponto de vista musicológico. Mas terá havido algum maior pelo ponto de vista humano? […] Como conclusão poderíamos nos perguntar: a quem Saint-George realmente pertence? À África, à América negra ou à Europa? Não pretendemos perpetuar o conflito que dilacerou Saint-George no final da sua vida, dando uma dessas respostas em prejuízo das outras. Antes, responderemos: pertence a cada uma dessas e a todos os povos, pois a grande epopeia humana da qual sua vida foi parte não conhece fronteiras nacionais nem raciais.”
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Emil F. Smidak

Joseph Bologne, Chevalier de Saint-Georges
Concertos para violino e orquestra e ‘sinfonias’

Orquestra Sinfônica da Rádio de Plzeň
Regência: František Preisler Jr. (1996-97)
Violino solo e cadências: Miroslav Vilímec

CD 3/5
Sinfonia Concertante Op. 9 No.2 em lá maior – G 066
Concerto para violino Op. 5 No.1 em dó maior – G 031
Sinfonia Concertante em ré bemol maior – G 023
Concerto para violino Op. 7 No.2 em si bemolmaior – G 040

CD 4/5
Sinfonia Concertante Op. 10 No.1 em fá maior – G 064
Concerto para violino Op. 5 No.2 em lá maior – G 032
Sinfonia Concertante em sol maior – G 024
Concerto para violino Op. 1 No.10 em ré maior – G 021

CD 5/5
Sinfonia Concertante Op. 9 No.1 em dó maior – G 065
Concerto para violino Op. 3 No.2 em lá menor – G 028
Sinfonia Concertante Op. 10 No.2 em lá maior – G 049
Concerto para violino Op. 1 No.11 em sol maior – G 022

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Brinde: DOCUMENTÁRIO CANADENSE “LE MOZART NOIR”
com The Tafelmusik Baroque Orchestra – em inglês, sem legendas.
(Antes em cinco partes, agora consolidado, ~48 min. Recomendo!)

Ranulfus

Gilberto Mendes (1922-2016): Alegres Trópicos

Gilberto Mendes (1922-2016): Alegres Trópicos

SeloDigital-GilbertoMendes-capa-2Gilberto Mendes se foi deste mundo para o reino de Hades no última dia primeiro. Apesar de com certeza ser uma grande perda, não devemos ficar lamentando sua morte, mas sim, dentro do possível, comemorar sua vida. A morte sempre vem, e quando vem, devemos aprender a aceitá-la, e mais que isso, honrá-la.

Quero honrar sua vida e obra discutindo um pouco de duas obras muito divertidas e interessantes de sua carreira: Beba Coca Cola e Santos Football Music.

A primeira foi baseada no pequeno texto do poeta Décio Pgnatari:

Beba Coca Cola (1957)
Beba Coca Cola (1957)

O texto por si só já é interessante. Simples, fazendo uma utilização das artes visuais, lembra até de outros artistas que também fazem uso das artes visuais com poemas como Arnaldo Antunes. Na música Gilberto Mendes continua a brincadeira do poema e coloca até um arroto na música:

 

Em Santos Futebol Music, entram vários elementos, desde os aspectos técnicos da música pura até aspectos outros como a aleatoriedade. Aqui, aleatoriedade não só da execução de um instrumento, mas também da interação com o próprio público que assiste.

Não tem como não rir vendo isso. Rir não de zombaria, mas de satisfação, de alegria, de diversão. Segundo Cacá Machado, Gilberto Mendes se via bastante em Villa-Lobos, não pelo aspecto nacionalista da música de Villa, mas sim pelo caráter inovador e único. Talvez o maior feito de Gilberto Mendes tenha sido criar um caráter único com sua música que acabou abarcando também aspectos da cultura brasileira, como o futebol. Caráter esse que, chamado de Música Teatro, conseguiu trazer um aspecto mais interativo da música com o público.

Estive ouvindo o álbum que a Fundação OSESP disponibilizou em comemoração dos 90 anos da vida do compositor para download gratuito, o link está na imagem do álbum acima. “Alegres Trópicos”, parece ser uma clara referência a “Tristes Trópicos” de Claude Lévi-Strauss, antropólogo francês que fez muitas pesquisas aqui no Brasil e ajudou a fundar a Universidade de São Paulo. Se ouvimos e vemos as obras de Gilberto Mendes, acabamos por concordar com o nome de sua obra, nossos trópicos são alegres, e cheios de esperança. E isso também graças aos artistas como ele.

Fico imaginado o tipo de brincalhão que deveria ser Gilberto Mendes, com certeza seria um enorme prazer tomar umas cervejas com ele num bar na praia de Santos ou então assistir um jogo de Futebol entre Corinthians e Santos. (Ou por que não as duas coisas juntas?)

Que seja bem recebido nos Campos Elísios.

gilbertomendes
Gilberto Mendes

Luke

Madrigal ARS VIVA (1971): 1ªs gravações de Gilberto Mendes (1922-2016) e Willy Corrêa de Oliveira (1936) + Idade Média e Renascença

Gilberto Mendes 13/10/1922 a 01/01/2016Publicado originalmente em 11.07.2010. Revalidado in memoriam Gilberto Mendes.

Santos se diferencia das outras cidades importantes do estado de São Paulo por ser mais antiga e durante uns três séculos mais importante que a capital. A distância entre as duas é de apenas 75 Km, mas talvez o desnível abrupto de 700 metros tenha ajudado a preservar na cidade-porto uma identidade cultural própria, até um sotaque e caráter de povo diferente. Em alguns momentos isso se refletiu não só no futebol mas também numa vida musical digna de nota –

capa-peq… sobretudo nas décadas de 1960 e 70, com os compositores Gilberto Mendes (Santos, 1922), Willy Corrêa de Oliveira (Recife, 1936), e em parte também Almeida Prado (Santos, 1943) fazendo da cidade uma referência mundial com os Festivais de Música Nova.

Esses festivais ainda acontecem, mas infelizmente, é preciso dizer, não com a mesma vitalidade e impacto de antes. Como outras cidades do mesmo porte, Santos parece ter a sina de ser berço de gente que vai brilhar em outros lugares. De todo aquele movimento, só Gilberto Mendes permanece lá [escrito em 2010], ao que parece ainda insuperado em irreverência e espírito jovem – aos 88 anos!

Outro dos protagonistas que deve ter feito muita falta ao movimento foi o regente Klaus-Dieter Wolff – este por sua morte prematura. Klaus nasceu em 1926 em Frankfurt mas viveu no Brasil desde os 10 anos. Em 1951 fundou o Conjunto Coral de Câmara de São Paulo; em 1961 o Madrigal Ars Viva de Santos. Em 1968 colaborou com Roberto Schnorrenberg – três anos mais jovem e que em 1964 fundara o Collegium Musicum de São Paulo – na primeira realização brasileira das Vésperas de Monteverdi. Em 1971 gravou este disco, pioneiro em muitos sentidos – mas já em 1974 veio a falecer, com meros 48 anos. (Clique AQUI para mais informações sobre a formação e atuação dos dois).

Tanto Klaus quanto Roberto trabalhavam com o ideal declarado de ampliar o repertório conhecido no Brasil, e ao que parece foi esse ideal que presidiu a escolha das peças deste disco, que contém alguns verdadeiros standards do repertório medieval (como Alle psallite cum luya) e renascentista (como Mille regretz de vous abandonner – “mil mágoas por vos deixar” -, canção que inspirou muitíssimos instrumentistas e outros compositores ao longo dos séculos seguintes), ou então exemplos de compositores de primeira grandeza desses 4 séculos (Machault, Josquin des Près, Lassus, Jannequin).

Nem sempre acho felizes as opções do regente Wolff: ainda é compreensível que Alle psallite apareça tão lenta, pois se trata de um canto de cortejo, de procissão, mas um Rodrigo Martínez assim tão duro e quadrado? (Em breve posto o de Roberto de Regina, e vocês terão oportunidade de ver quase que o exagero oposto).

Mas nas peças mais introvertidas Klaus me parece conseguir uma combinação belíssima de concentração, intensidade e delicadeza (Ave Maria, Todos duermen corazón, Pámpano verde, Mille regretz, etc). É pena que os meus meios técnicos atuais não dêem conta de eliminar 100% do ruído que aparece nas frases finais de Mille regretz, um dos momentos mais delicados do disco.

As três peças ‘de vanguarda’ são de 1962, 66 e 69, todas inspiradas em poemas concretos (de Décio Pignatari e de José Lino Grünewald). Beba Coca-Cola é hoje uma peça consagrada, com muitas gravações no Brasil e no exterior – mas esta foi a primeira.

Na contracapa e no encarte há ricos textos informativos de Gilberto Mendes, e também os textos de todas as peças (muitas vezes naquelas esdrúxulas misturas lingüísticas características do renascimento) – e então acho que já posso entregar a bola a vocês!

Madrigal Ars Viva (Santos, SP)
Regência: Klaus-Dieter Wolff
(1926-1974)
Gravação: 1971 (independente)

A01  Alle psalite cum luya – anônimo séc.13
A02 Nel mezzo a sei paone – madrigal de Johannes/Giovanni de Florentia, séc.14
A03 Lasse! Comment oublieray / Se j’aim mon loyal ami / Pour quoy me bat mes maris
– motete (3 textos simultâneos) de Guillaume de Machault, séc.14
A04  Alma Redemptoris Mater – Johannes Ockeghem, séc.15
A05  Ave Maria – ‘carol’ anônimo, séc.15
A06 Nowell sing we – ‘carol’ anônimo, séc.15
A07  Todos duermen, corazón – Baena, séc.15-16
A08 Rodrigo Martínez – anônimo, séc.15-16
A09 Pámpano verde – Francisco de Torre, séc.15-16
A10 Mille regretz de vous abandonner – Josquin des Prez/Près, séc.15

B01 Bonjour, mon coeur – Roland de Lassus (1532-1594)
B02 Les cris de Paris – Clement Jannequin, séc.16
B03 Um movimento vivo (1962) – Willy Corrêa de Oliveira (*1936)
B04 Beba Coca-Cola (1966) – Gilberto Mendes (*1922)
B05 Vai e Vem (1969) – Gilberto Mendes

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Ranulfus

Respighi (1879-1936): Trittico Botticelliano (2 versões); Gli Ucelli; Antiche Danze ed Arie per Liuto suítes 1 e 3

Publicado originalmente em 21/05/2010

Ao pensar em uma postagem que ajudasse a in-augurar 2016 convenientemente, o Monge Ranulfus logo se decidiu pela revalidação desta aqui, pois a sente como luminosa, leve e equilibrada em alegria e poesia. Isso apesar de uma vez o Grão-Mestre PQP ter observado que acha Respighi chato – e eu não chego a discordar: também acho chato no que tange os poemas sinfônicos de intenção impressionista ‘Fontes de Roma’ e ‘Pinheiros de Roma’. Já tentei ouvir essas obras com boa-vontade, mas foi em vão.

E no entanto, acreditem: é de Respighi uma das peças que mais me fizeram gosto até hoje – seguramente uma das 10 que eu levaria para o exílio em outro planeta: o Trittico ou Tríptico Botticelliano (ou ainda ‘Três Quadros de Botticelli’, seguindo o costume inglês de referir-se à obra como ‘Three Pictures of Botticelli’ – o que teria a vantagem de fazê-la “conversar” com os ‘Três Afrescos de Piero della Francesca’, de Martinu – outra postagem à espera de revalidação!).

Respighi começou o estudo da música pelo violino e por sua irmã mais gorda, a viola, e aos 21 anos foi parar como primeiro violista de orquestra em São Petersburgo, numa temporada de ópera italiana. Já tinha estudado também um pouco de composição, e não perdeu a oportunidade de agarrar 5 meses de aula com Rimsky-Korsakoff, então com 56 anos – mesma idade com que ele, Respighi, morreria na década de 30.

De volta à Itália uma de suas principais frentes de atividade foi a de musicólogo: hoje parece banal conhecer a música da Renascença, mas no começo do século XX isso era atividade de garimpo, e nosso amigo foi um dos pioneiros. Editou e publicou diversas coleções de madrigais e também seu tanto de barroco – e aparentemente amou essa música com tanta intensidade que quis fazê-la sua: ao lado dos referidos poemas sinfônicos, suas obras mais famosas são as 3 suítes Antigas Danças e Árias para Alaúde, formadas por arranjos orquestrais de 4 peças renascentistas cada uma; e o curioso é que esses arranjos do alheio parecem soar mais autênticos, mais como uma voz própria, que aqueles poemas sinfônicos que são propriamente composições.

Já a suíte As Aves (Gli Ucelli) fica numa posição intermediária: aqui são um pouco mais que arranjos de peças barrocas para cravo; o artesanato de texturas, cores, ambiências, chega a momentos de expressividade intensa – ou de deliciosa comédia, como na recriação de ‘La Poule’, a famosa Galinha de Rameau.

E aí chegamos ao que é efetivamente uma composição – o Trittico Botticelliano -, mesmo se também com evidente uso de temas antigos – embora desses eu só identifique com certeza a melodia gregoriana Veni veni Emmanuel, que emerge aos 1:10 de ‘A adoração dos Magos’. Talvez também haja material original que apenas evoque danças e cantos antigos e/ou populares, não sei. Seja o que for, os temas são definitivamente desenvolvidos em um discurso próprio – muito mais do que, digamos, o bem mais famoso Carl Orff consegue desenvolver o que quer que seja.

A palavra ‘discurso’, aliás, é bastante apropriada, pois não temos aqui a menor pretensão de ‘pintar com sons’ como nas ‘Fontane’, ou no Debussy de ‘La Mer’. O que temos são, eu diria, relatos de encenações interiores dos episódios que os quadros evocam.

E, querem saber? Não me importa a mínima se isto não for uma obra-prima em técnica composicional: eu a vejo como absoluta obra-prima do afeto, da máxima amabilidade ou delicadeza (não ‘frescura’) que o ser humano consegue alcançar. E, com isso, inversão total do estereótipo do italiano como especialista do exagero, vulgaridade e barulheira – no que a comparo com outra obra-prima italiana, lamentavelmente inincontrável: o filme de Franco Brusati ‘Dimenticare Venezia’, de 1979, jamais lançado em vídeo ou DVD.

Quase da mesma época (1977) foi o vinil em que conheci essa obra, com uma realização magnífica da Orquestra de Câmara de Praga. Como prêmio de consolação por não poder postá-lo, nosso amigo José Eduardo me conseguiu duas versões – vejam abaixo de quem – que coloquei uma abrindo, outra fechando o programa.

Comparação com a obra análoga de Martinu? Não, gente, eu ainda a ouvi muito pouco para me atrever. Só digo que não me pareceu impressionista – como alguém já a caracterizou – e sim francamente neo-romântica. E que sua linguagem abertamente sinfônica torna ainda mais difícil a comparação com esta aqui, quase camerística. E agora é com vocês…

Ottorino Respighi (1879-1936), obras para pequena orquestra

Trittico Botticelliano (Three Botticelli Pictures) p. orquestra (1927)
01 La Primavera
La Primavera http://www.tropis.org/imagext/botticelli-primavera-peq.jpg
02 L’Adorazione dei Magi (a adoração dos magos)
L'adorazione dei Magi http://www.tropis.org/imagext/botticelli-magi-peq.jpg
03 La nascita di Venere (o nascimento de Vênus)
La nascita di Venere

Gli Uccelli (As Aves) p. pequena orquestra, sobre peças barrocas p. cravo (1927)
04 Preludio (Bernardo Pasquini)
05 La Colomba (a pomba) (Jacques de Gallot)
06 La Galina (a galinha) (J.P. Rameau)
07 L’Usignuolo (o rouxinol) (anônimo inglês)
08 Il Cuccù (o cuco) (Bernardo Pasquini)

Antiche Danze ed Arie (antigas danças e árias), suite 1, p. orquestra (1917)
sobre peças p. alaúde de S. Molinaro, Vicenzo Galilei (pai de Galileo!) e anônimas
09 Baletto detto ‘Il Conte Orlando’
10 Gagliarda
11 Villanella
12 Passo Mezzo e Mascherada

Antiche Danze ed Arie (antigas danças e canções), suite 3, p. cordas (1932)
sobre peças p. alaúde e violão de Besard, L.Roncalli, Santino Garsi da Parma e anônimo
13 Italiana
14 Aria di Corte
15 Siciliana
16 Passacaglia

Orpheus Chamber Orchestra (N.York) (DG 1993)

17 BÔNUS: Trittico Botticelliano I, II e III (1927)
Bournemouth Sinfonietta, reg. Tamás Vásáry (Chandos 1992)

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Ranulfus

Einojuhani Rautavaara (1928): Integral dos concertos

Einojuhani Rautavaara (1928): Integral dos concertos

IM-PER-DÍ-VEL !!!

(Antes do texto do CVL, um recado de PQP: gostei muito dos concertos de Rautavaara, mas não dos para Piano. Então, em minha humilde opinião, temos três CDs muito bons e um apenas aceitável no arquivo… É gosto ou mania pessoal, mas tem gente que aprecia “minha curadoria”…).

Rautavaara é um dos meus compositores contemporâneos prediletos e o mais proeminante compositor vivo da Finlândia até a década passada, quando Kaija Saariaho começou a despontar e levou o Grawemayer em 2003 e o Léonie Sonning agora em 2010 (os dois maiores prêmios da música erudita mundial, nunca concedidos a Rautavaara).

O que aprecio bastante no finlandês é a capacidade de ele não escrever uma única nota que possa ser desperdiçada, além de competência para estruturar um movimento inteiro a partir de um pequeno motivo (o que vocês podem atestar logo no Concerto para violino, nos dois acordes da harpa). Este box que ora vos oferto traz a integral dos concertos e peças concertantes – de outra vez postarei a integral das sinfonias.

É complicado persuadi-los a ouvir música contemporânea. O que posso dizer a mais é que Rautavaara não tem nada de excêntrico ou agressivo; ele transita pelas linguagens orquestrais tradicionais (com alguma intervenção de música concreta, muito bem colocada conceitualmente, em Cantus Arcticus) para imprimir seu misticismo – a obra de Rautavaara é muito inspirada por lendas e visões de anjos – ou seu naturalismo.

***

Einojuhani Rautavaara: 12 Concertos

Disc 1
1. Violin Concerto: I. Tranquillo 1a
2. Violin Concerto: II. Energico 1a
3. Cello Concerto, Op. 41: I. Allegro ma non troppo 2b
4. Cello Concerto, Op. 41: II. Largo 2b
5. Cello Concerto, Op. 41: III. Vivace 2b
6. Angel of Dusk: I. His First Appearance 3c
7. Angel of Dusk: II. His Monologue 3c
8. Angel of Dusk: III. His Last Appearance 3c

Disc 2
1. Ballad Juha Kangas 4d
2. Harp Concerto: I. Pesante 1e
3. Harp Concerto: II. Adagietto 1e
4. Harp Concerto: III. Solenne 1e
5. Cantus arcticus, Op. 61, “Concerto for Birds and Orchestra”: I. The Bog 1
6. Cantus arcticus, Op. 61, “Concerto for Birds and Orchestra”: III. Swans Migrating 1
7. Cantus arcticus, Op. 61, “Concerto for Birds and Orchestra”: II. Melancholy 1

Disc 3
1. Flute Concerto, Op. 63, “Dances with the Winds”: I. Andantino1f
2. Flute Concerto, Op. 63, “Dances with the Winds”: II. Vivace 1f
3. Flute Concerto, Op. 63, “Dances with the Winds”: III. Andante moderato 1f
4. Flute Concerto, Op. 63, “Dances with the Winds”: IV. Allegro 1f
5. Clarinet Concerto: I. Drammatico ma flessibile 1g
6. Clarinet Concerto: II. Adagio assai 1g
7. Clarinet Concerto: III. Vivace 1g
8. Annunciations 1h

Disc 4
1. Piano Concerto No. 1, Op. 45: I. Con grandezza 1i
2. Piano Concerto No. 1, Op. 45: II. Andante 1i
3. Piano Concerto No. 1, Op. 45: III. Molto vivace 1i
4. Piano Concerto No. 2: I. In viaggio 6i
5. Piano Concerto No. 2: II. Sognando e libero 6i
6. Piano Concerto No. 2: III. Uccelli sulle passioni 6i
7. Piano Concerto No. 3, “Gift of Dreams”: I. Tranquillo 7j
8. Piano Concerto No. 3, “Gift of Dreams”: II. Adagio assai 7j
9. Piano Concerto No. 3, “Gift of Dreams”: III. Energico 7j

a Elmar Oliveira, violin
b Marko Ylönen, cello
c Esko Laine, double bass
d Reija Bister, harp
e Marielle Nordmann, harp
f Patrick Gallois, piccolo, alto & bass flute
g Richard Stoltzman, clarinet
h Kari Jussila, organ
i Ralf Gothóni, piano
j Vladimir Ashkenazy, piano
1 Helsinki Philharmonic Orchestra/Leif Segerstam
2 Helsinki Philharmonic Orchestra/Max Pommer
3 Tapiola Sinfonietta/Jean-Jacques Kantorow
4 Ostrobothnian Chamber Orchestra/Juha Kangas
5 Leipzig Radio Symphony Orchestra/Max Pommer
6 Bavarian Radio Symphony Orchestra/Jukka-Pekka Saraste
7 Helsinki Philharmonic Orchestra/Vladimir Ashkenazy

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Rautavaara envelheceu, mas não perdeu o topete.
Rautavaara envelheceu, mas não perdeu o topete.

CVL

Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791): Piano Concertos nº 22, 23, 24, 25, 26 e 27 — CDs 8, 9 e 10 de 10 (Immerseel, Anima Eterna)

Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791): Piano Concertos nº 22, 23, 24, 25, 26 e 27 — CDs 8, 9 e 10 de 10 (Immerseel, Anima Eterna)

Conversando com o mano PQP dia desses por telefone, ele sugeriu que eu fizesse um pacotaço para liberar espaço no meu hd, e terminasse de postar a integral dos concertos de piano de Mozart com o Immerseel. Pois bem, aí estão os 3 cds que faltavam. E vamos partir para a próxima. Confesso, e creio que o mano PQP também concorda, é chato ficar postando estas integrais. Darei um tempo nestas loucuras. Vamos continuar, pois, com o feijão com arroz básico, que até pouco tempo atrás era a nossa especialidade.

Não preciso também comentar mais nada a respeito destes concertos aqui postados, afinal, são conhecidos do grande público, digamos assim. Então, aproveitem.

E não se fala mais nisso.

Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791): Piano Concertos nº 22, 23, 24, 25, 26 e 27 — CDs 8, 9 e 10 de 10 (Immerseel, Anima Eterna)

1. Concerto for Piano no 22 in E flat major, K 482: 1st movement, Allegro
2. Concerto for Piano no 22 in E flat major, K 482: 2nd movement, Andante
3. Concerto for Piano no 22 in E flat major, K 482: 3rd movement, Allegro

4. Concerto for Piano no 23 in A major, K 488: 1st movement, Allegro
5. Concerto for Piano n0 23 in A major, K. 488: 2nd movement, Adagio
6. Concerto for Piano n0 23 in A major, K. 488: 3rd movement, Presto

Disco 9

01 Clavier-Concerte 24 KV 491 I – Allegro Maestoso
02 Clavier-Concerte 24 KV 491 II – Larghetto
03 Clavier-Concerte 24 KV 491 III – Allegretto

04 Clavier-Concerte 25 KV 503 I – Allegro Maestoso
05 Clavier-Concerte 25 KV 503 II – Andante
06 Clavier-Concerte 25 KV 503 III – Allegretto

Disco 10

1. Clavier-Concerte 26 in D, K. 537: I. Allegro
2. Clavier-Concerte 26 in D, K. 537: II. Larghetto
3. Clavier-Concerte 26 in D, K. 537: III. Allegretto

4. Clavier-Concerte 27 in B Flat, K. 595: I. Allegro
5. Clavier-Concerte 27 in B Flat, K. 595: II. Larghetto
6. Clavier-Concerte 27 in B Flat, K. 595: III. Allegro

Jos van Immerseel – Pianoforte & Conductor
Conjunto Anima Eterna

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE

Sei lá, mas pra mim esse Immerseel tem cara de vegano.

FDP  (link revalidado por PQP)

Agustín Barrios Mangoré (1885-1944) interpretado por Turíbio Santos – Link Revalidado

Postagem original de CVL em 6 de março de 2009, revalidado por Carlinus em 12 de agosto de 2012, com links restaurados por Vassily em 28 de novembro de 2015, atendendo a pedido de um leitor-ouvinte. Ah, e o codinome “Nitsuga”, que tão indígena soou aos contemporâneos, nada mais é que “Agustín” ao contrário!

Agustín Pío Barrios, que se apresentava como Agustín Barríos Mangoré (ou ainda Nitsuga Mangoré), foi o Villa-Lobos do Paraguai, inclusive na invenção de mitos de convivência com os índios. A diferença é que ele tinha sangue guarani nas artérias e falava bem o segundo idioma de seu país – o sobrenome artístico que adotou e as roupas típicas que usava em concertos completavam o universo simbólico que encarnava.

Barrios, que entrou na universidade aos 13 anos, andava muito pelo Brasil. Foi amigo de meu pai (me viu pirralho) e de João Pernambuco, entre outros. O melhor de seu repertório – que abrange formas barrocas, inspiração sacra ou folclórica e virtuosismo romântico – está aqui neste CD-tributo produzido por Turíbio Santos, músico que dispensa palavras. Não poderia faltar o monumento sonoro que é A catedral.

Vale a pena dar uma lida na vida de Barrios no verbete da Wikipédia em espanhol. Foi lá onde fiquei sabendo que o pseudônimo de Nitsuga Mangoré foi usado pela primeira vez num concerto em Salvador-BA, em 1932; que Barrios tentou tocar nos EUA (grande sonho dele) mas não o pôde porque foi negado o visto para sua mulher; e que ele foi o primeiro intérprete a gravar uma obra para violão em disco (78 rpm).

Também matei minha curiosidade de saber porque Barrios havia morrido em El Salvador: após ter um enfarte no México, o presidente salvadorenho o convidou a se recuperar em San Salvador e deu-lhe depois um posto de professor no conservatório principal do país. Anos depois, o violonista veio a falecer de outro ataque cardíaco.

Enfim, isso é só uma amostra da figura mítica que foi Agustín Barrios.

***

Deu no Valor Econômico de hoje: Café do Rato Preto vendido por 228 milhões de dólares para grupo norteamericano. Vou ver se crio uma fundação de preservação de memória da música clássica brasileira com esse dinheiro todo (eu poderia ter faturado o dobro antes da crise).

***

Turíbio Santos interpreta Agustín Barrios

1 Estudo de Concerto em Lá Maior
2 Junto a tú corazón
3 Dança Paraguaia
4 Las Abejas
5 Chôro de saudade
6 Estudo em Si Menor
7 Aconquija
8 Luz Mala
9 Oración
10 Página D´Álbum
11 Prelúdio em Sol Maior
12 Valsa op 8 nº 4
13 A Catedral

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CVL (revalidado pelo Carlinus e, depois, por Vassily)

Pyotr Ilyich Tchaikovsky (1840-1893) – Liturgia de São João Crisóstomo, Op. 41 – NOVOS LINKS


POSTAGEM ORIGINAL DE CARLINUS EM 8/5/2010, NOVOS LINKS FORNECIDOS POR VASSILY E AVICENNA EM 27/8/2015

Dia desses, nosso SAC recebeu um pedido para revalidar a linda Liturgia de São João Crisóstomo, de Tchaikovsky. Não tinha a gravação postada pelo Carlinus, então tive que recorrer a uma das duas de que dispunha. A de melhor som é aquela moderna da Hyperion, com os Corydon Singers, mas achei que o sotaque russo desta envolvente gravação soviética da Melodiya lhe conceda uma vantagem considerável.

 

Vassily Genrikhovich

POSTAGEM ORIGINAL DE CARLINUS EM 8/5/2010

O segundo post em homenagem a Tchaikovsky é a – não muito conhecida – Liturgia de São João Crisóstomo. Trata-se de uma obra de beleza incomum.  A audição desta liturgia nos remete aos desertos, aos monastérios do início da era cristã. Segundo a História, Crisóstomo (cognominado “o boca de ouro”, pelo poder de sua oratória), um dos pais da igreja cristã do oriente, teria elaborado esta liturgia a partir da Liturgia de São Basílio. Esta liturgia compõe, juntamente com a Liturgia dos Dons Pré-Santificados, as formas de celebração eucarística do rito bizantino. A Liturgia de São João Crisóstomo é usada na maior parte do ano litúrtgico das igrejas orientais. A grande questão é que este CD imprime profundos efeitos na alma do ouvinte. A última vez que senti efeitos tão marcantes em minha interioridade foi quando comecei a ver ao filme São Jerônimo, do diretor brasileiro Júlio Bressane. A película de Bressane é cheia de arrebatamentos místicos, de simbolismos metafísicos. Não é brincadeira ouvir uma peça destas. A alma  necessariamente solitária gravita em busca de paisagens idílicas.  Não deixe de ouvir este CD e se transformar num eremita, num ermitão, que não se corrompe com o ouro e com a prata oferecida pelo mundo. Mas se volta para os valores etéreos, de possibilidades arrebatoras. Minha nossa! Hoje eu estou impossível. Chega!

Quem quiser conhecer a LITURGIA

Carlinus

 

51AvKAaqFiLPyotr Ilyich Tchaikovsky (1840-1893) – Liturgia de São João Crisóstomo, Op. 41

1 – Amin. Gospodi pomilui
2 – Slava: Edinorodniy Syne
3 – Priidite, poklonimsya
4 – Alliluiya
5 – Slava tyebe gospodi
6 – Kheruvimskaya pyesn
7 – Gospodi pomilui
8 – Veruyu vo Yedinago Boga Otsa
9 – Milost mira
10 – Tyebe poyem
11 – Dostoino yest
12 – Amin. I so dukhom tvoyim, Gospodi, pomilui
13 – Otche nash
14 – Khvalitye Gospoda s nebyes
15 – Blagoslovyen gryadiy vo imya Gospodnye

Coro de Câmara do Ministério da Cultura da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
Valery Polyansky, regente

BAIXAR AQUI (link de Vassily)

Franz Liszt (1811-1886) – Années de pèlerinage – Nicholas Angelich – REVALIDADO

51Ay94V1d5LPOSTAGEM ORIGINAL DE FDP BACH EM 8/9/2007, REVALIDADA POR VASSILY EM 25/8/2015

Alguém solicitou a um tempo atrás mais obras de Liszt. Já havíamos postado os concertos para piano com o Richter, porém, reclamaram que faltavam mais obras.
Pois bem, sensível ao apelo, FDP Bach resolveu cobrir uma das falhas do blog, a saber, mais obras pianísticas do sogro de Wagner. E vai jogar pesado, dessa vez… trata-se de uma coleção de 3 cds, interpretados pelo excelente Nicholas Angelich, da enorme série “Années de pèlerinage

FRANZ LISZT (1811-1886)

ANNEES DE PELERINAGE

Nicholas Angelich, piano

CD 1 – Première année: Suisse

01. Chapelle de Guillaume Tell
02. Au lac de Wallenstadt
03. Pastorale
04. Au bord d’une source
05. Orage
06. Vallée d’Oberman
07. Eglogue
08. Le mal du pays
09. Les cloches de Genève

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CD 2 – Deuxième année: L’Italie

01. Sposalizio
02. Il penseroso
03. Canzonetta del Salvator Rosa
04. Sonetto 47 del Petrarca
05. Sonetto 104 del Petrarca
06. Sonetto 123 del Petrarca
07. Après une lecture de Dante, Fantasia quasi Sonata
08. Venezia e Napoli – Gondoliera
09. Venezia e Napoli – Canzone
10. Venezia e Napoli – Tarentella

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CD 3 – Troisième année

01. Angelus ! Prière aux anges gardiens
02. Aux cyprès de la Villa d’Este, Thrénodie no. 1
03. Aux cyprès de la Villa d’Este, Thrénodie no. 2
04. Les jeux d’eau de la Villa d’Este
05. Sunt lacrymae rerum – en mode hongrois
06. Marche funèbre
07. Sursum corda

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Antonio Salieri (1750-1825) – Concerto para pianoforte em Si bemol maior, Concerto para flauta e oboé em Dó maior (REVALIDADO)

617birm6BaLREVALIDADO POR VASSILY  EM 4/8/2015

Em mais uma ação surpreendentemente ágil de nosso SAC, eis o CD com obras de Antonio Salieri cujos links tinham sido perdidos no naufrágio do Megaupload. A verve de Claudio Scimone e seus Solisti Veneti valoriza as obras desse bom compositor. Paul Badura-Skoda, como esperado, brilha ao pianoforte e mostra que merece outras aparições aqui no PQP Bach. Lembro, aliás, duma aparição sua com a Orquestra Sinfônica de Dogville, nos idos anos 80: uma ave-do-paraíso solando com javalis.

Ah, o tal Francesco Salieri que compõs a Tempesta del Mare que completa o álbum foi o irmão mais velho de Antonio e, também, seu primeiro professor.

Vassily

POSTAGEM ORIGINAL DE CARLINUS EM 30/8/2010

Salieri foi um importante músico à sua época. Cabe ainda ao compositor a honra de ter sido professor de Liszt, de Schubert e Beethoven. Reinou absoluto em seus dias. Suas peças tomaram os salões da Europa. Foram reverenciadas, apreciadas. Era o compositor oficial da Corte do príncipe José II da Áustria. Hoje, não se dá o mesmo crédito a Salieri como se dá a Mozart ou a Haydn, por exemplo. Em torno do compositor gravitam as mais questionáveis fábulas. Após o filme Amadeus (1984), que ganhou 7 oscares, há a retratação de um Salieri invejoso do génio de Mozart e medíocre musicalmente. Tal imagem é resultante da liberdade ficcional dos realizadores do filme, não correspondendo à figura histórica do compositor. Potocas à parte, o fato é que ainda não conhecia as obras deste delicioso CD. Aparece ainda o desconhecido Francesco Salieri. Boa apreciação!

Antonio Salieri (1750-1825) – Concerto para pianoforte e Orquestra in B flat major, Concerto para flauta, oboé e orquestra em C maior

Concerto for Fortepiano and Orchestra, B-flat major
1. Allegro moderato
2. Adagio
3. Tempo di Minuetto

Concerto for Flute, Oboe, and Orchestra, C major
4. Allegro spirituoso
5. Largo
6. Allegretto

Francesco Salieri (1741-?) – Sinfonia “Tempesta di Mare” em B flat maior

Sinfonia “La Tempesta di Mare”, B-flat major

7. Allegro
8. Andante
9. Allegro assai

I Solisti Veneti & Claudio Scimone, Director
Paul Badura-Skoda, pianoforte
Clementine Hoogendoorn, flute
Pietro Borgonovo, oboe

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Carlinus

Sacra Vox – Música coral sacra contemporânea brasileira

Sacra Vox – Música coral sacra contemporânea brasileira

sacra voxPelo título do CD, percebe-se o nicho de repertório no qual o grupo coral carioca Sacra Vox é especializado. Estive no concerto de lançamento deste álbum – em junho de 2007, na Casa de Rui Barbosa, Rio de Janeiro – e fiquei contentei por um segmento tão específico ter conseguido fazer florescer obras tão boas quanto as deste disco. Se seus ouvidos são abertos às linguagens contemporâneas, quando bem utilizadas, eis uma boa experiência à qual você pode se lançar sem receios.

Porém, se você acha que tudo que se faz aqui no Brasil é reciclagem do que se faz no resto do mundo, que as gravações sempre deixam a desejar, que as interpretações idem etc. etc. não discordo totalmente – apenas lamento que isso seja muitas vezes um ponto de partida para não se experimentar a música clássica brasileira. Fiz esse adendo porque, por exemplo, ainda me surpreendo com a relativamente baixa quantidade de downloads dos concertos para violino de Guarnieri ou das obras de Amaral Vieira em geral (ainda que este tenha uma claque fiel no blog). Se não consigo ser persuasivo o suficiente pra quebrar uma resistência irracional ou pelo menos para fazer alguém experimentar e me dizer “não gostei” (no caso do Concerto para piano de Hekel Tavares), só me resta forjar dados nas próximas postagens, tal qual: José Siqueira com a Filarmônica de Berlim, Radamés Gnatalli por Maurizio Pollini ou Francisco Mignone nas mãos de Martha Argerich (risos).

***

Sacra Vox – Música coral sacra contemporânea brasileira

1-2. Kyrie & Gloria – Rodrigo Cicchelli
3. Árvore da vida – Eduardo Biato
4-7. Atalanta Fugiens II – Pauxy Gentil Nunes
8. Buscando a Cristo – Marcos Vinicio Nogueira
9-12. Missa Brevis in honorem Sancti Francisci Assisiensis – Ernani Aguiar
13. Glória – Roberto Macedo Ribeiro
14-18. Sacra Cantilena – João Guilherme Ripper
19. Ave Maria – Jorge Armando

BAIXE AQUI — DOWNLOAD HERE

Sacra Vox: alto nível de interpretação
Sacra Vox: alto nível de interpretação

CVL