Fim de ano, festas e retrospectivas… Eu também preparei uma retrospectiva, levando em conta as minhas postagens no blog. Antes de começar a preparar a postagem, quando a ideia ainda caraminholava em meus confusos miolos, fui checar a ‘concorrência’. O Spotify preparou uma retrospectiva onde aprendi, com um certo desmaio, confesso, que o artista mais ouvido em 2020 (no Spotify, por certo…) foi Bad Bunny (never heard of him). A música mais ouvida foi Blinding Lights (even with shades on, vou passar essa uma).
O ano começou com novidades, Parasita levando a estatueta dourada e tal, até que em 11 de março – bum – a pandemia foi oficializada. Para mim ela começou no dia 16 de março, quando as escolas se fecharam ‘por 15 dias’ e não mais reabriram.
Palavras novas ou pouco usadas ganharam grande uso nestes dias que se seguiram – home office, Meet, remoto, Apps, PIX. Na retrospectiva das notícias, que você verá no seu blog preferido para essas coisas, será mencionado – queimadas atrozes no Pantanal e outros lugares, devastação da Amazônia, a vitória do Biden, eleições municipais, segunda onda, a próxima chegada de vacinas. Não vou adentrar pela coluna de obituários, muito longa e demais dolorosa. Vamos nos ater à seara da música.
Nesta retrospectiva trataremos das postagens, essas efêmeras coisas, delicadíssimas, que me são tão caras. Eu as vejo como mensagens colocadas em garrafas que são lançadas nas correntezas da internet. Elas ficam no topo da primeira página do blog por algumas horas e depois iniciam um movimento de afundamento que eu chamo de ‘sinking into the oblivion’. É isto, vamos em frente que atrás vem gente, a fila anda…
Assim, antes de virar esta página e nos lançarmos no próximo ano, renovados (ou não) e buscando as novidades que ele nos prepara, resolvi dar uma boa olhada na lista do que está ficando e afundando no vasto esquecimento. Algumas pobrinhas alminhas-postagens, nem foram vistas e já esquecidas estão…
Por razões práticas, considerei as minhas postagens que foram ao ar entre 1 de dezembro de 2019 e 30 de novembro de 2020. Foram 151 postagens, quase três por semana. Levei um susto quando fiz as contas. Entre 29 de outubro e 24 de novembro foram ao ar 28 de minhas postagens. Eu me senti, neste período, como aquele estagiário que finalmente pode tomar conta da corporação. Só ficou faltando o telefone tocar mais vezes…
Ouvir música e pensar sobre isso tem sido parte importante de minhas atividades. Por conta do aniversário do Ludovico, mais de 30 destas postagens levaram música dele. Mas nem só do renano foi o ano. Teve Schumann e vários outros interessantes projetos ocorreram nas páginas do blog, em paralelo ao BTHVN#250. Basta lembrar da postagem do Ciclo de Cantatas de Bach, na direção de Ton Koopman, postado pelo FDP Bach, as Sinfonias de Haydn, com regência de Adam Fischer, postadas por Ammiratore. A dupla também foi responsável pela postagem de óperas, com várias possibilidades de escolha de gravações.
Cada disco que escolhi para minhas postagens me deu muito prazer ouvir, alguns muitas vezes. O pessoal aqui em casa já até assobiava junto alguns deles. Mas, com o distanciamento dado pelo tempo e a visão do conjunto, consegui escolher alguns que deram ainda mais alegria e assim acabei preparando uma ‘playlist’, uma espécie de arquivo promocional, como aqueles discos que acompanham algumas revistas sobre música. A lista destas postagens é o ‘core’ desta retrospectiva e o produto um arquivo de perto de 3h20 com as melhores do René. Blasfêmia, dirão uns, mas sinceramente, espero que você goste e que esta playlist instigue sua curiosidade para explorar mais essas atômicas partículas culturais antes que elas entrem em definitiva órbita de esquecimento no internético espaço.
Antes disso, farei uma lista de algumas postagens do blog que muito me impressionaram.
Sinfonias de Haydn – Adam Fischer
Cantatas de Bach – Ton Koopman
Sinfonias de Beethoven – Andris Nelsons
Sinfonias de Shostakovich – Bernard Haitink (reedição)
Sonatas de Schubert – Willelm Kempff
Sonatas para Piano de Beethoven – Jean-Efflam Bavouzet
Concertos para Piano de Beethoven – Jean-Efflam Bavouzet
A Arte da Fuga – Bach – Rachel Podger
As Baladas de Chopin – Stephen Hough
Peças para Piano de Schumann – Guiomar Novaes
Messias de Handel – Hervé Niquet
A Sagração da Primavera de Stravinsky – Andsnes & Hamelin
As Últimas Sonatas para Piano de Beethoven – Solomon
E a lista continuaria, sem mencionar a infindável lista de novidades que o BTHVN#250 nos promoveu. Mas, vamos à lista das minhas postagens mais queridas! Elas estão arranjadas em uma ordem diferente daquela em que foram publicadas…
O disco da Béatrice Rana com peças de Ravel e Stravinsky foi incluído de último momento. Um amigo enviou uma mensagem com a lista (as listas de fim de ano…) do Palmarès des Diapason d’or de l’année 2020 e o disco da Béatrice ganhou o prêmio na categoria ‘Piano’. Pois é, até eu havia esquecido este maravilhoso disco…
Nosso amigo FDP Bach me enviou um belo presente. Um pen drive. Dentro dele, apenas maravilhas. Está é a primeira delas. Nossa!, tenho especialíssima predileção pelas Toccatas de Bach e aqui as temos notavelmente interpretadas por Angela Hewitt, agora não mais em registro pirata mas em gloriosa gravação da Hyperion. Hewitt regravou tudo o que tinha feito de Bach. Antes utilizara um Steinway e agora usa um Fazioli. Muito melhor, segundo ela. Não discutiria depois de ouvir isto.
J.S. Bach (1685-1750): The Toccatas
1. Toccata for keyboard in C minor, BWV 911 (BC L142) (12:12)
2. Toccata for keyboard in G major, BWV 916 (BC L147) (7:27)
3. Toccata for keyboard in F sharp minor, BWV 910 (BC L146) (10:22)
4. Toccata for keyboard in E minor, BWV 914 (BC L145, 163) (6:49)
5. Toccata for keyboard in D minor, BWV 913 (BC L144) (11:41)
6. Toccata for keyboard in G minor, BWV 915 (BC L148) (9:00)
7. Toccata for keyboard in D major, BWV 912 (BC L143) (11:22)
O ano está acabando e quem não perdeu uma tia, um professor, uma cunhada ou um irmão querido, de sangue ou não, em 2020? Para homenagear tantos idosos e idosas que se foram, eu dedico uma segunda postagem ao pianista McCoy Tyner (11 de dezembro de 1938 – 6 de março de 2020).
McCoy Tyner ganhou três prêmios Grammy de melhor álbum de jazz instrumental, em 1988, 1995 e 2004, em cada um desses álbuns ele estava acompanhado de grandes músicos, como o trompetista Terence Blanchard e os saxofonistas Pharoah Sanders e Michael Brecker. Mas na opinião do aspirante a pianista que escreve essas linhas, os mais importantes álbuns de McCoy Tyner como líder são na formação de trios. Sem instrumentos de sopro, a imensa ausência de John Coltrane não pesa tanto e podemos ouvir com mais atenção um dos pianistas mais originais do último século.
Na década de 1970, McCoy gravou alguns excelentes álbuns no formato de trio, incluindo um grande disco ao vivo no Japão com o onipresente baixista Ron Carter (parceiro de Miles Davis, Chet Baker, Wayne Shorter, aliás díficil é citar alguém que não tocou com ele!) e o quase onipresente baterista Tony Williams. Há também um, chamado Supertrios por incluir duas duplas diferentes de baixistas/bateristas (Ron e Tony estão lá, é claro), com uma bela interpretação de Wave (Tom Jobim) e de outros standards. Esses dois álbuns podem ser encontrados na homenagem que McCoy recebeu logo após sua morte no blog jazz-rock-fusion-guitar, que assim como o PQP Bach, existe desde os tempos da internet discada, com algumas mudanças de endereço porque ninguém é de ferro.
No ano 2000, já com mais de 60 anos, McCoy lançou um CD em trio com dois grandes nomes um pouco mais jovens: Stanley Clarke se revezando entre o baixo acústico e o elétrico, Al Foster na bateria. Eles começam com um tema em homanegam a Coltrane (Trane-like), com os acordes um tanto percussivos de McCoy Tyner fazendo progressões harmônicas mais ou menos no estilo dos álbuns My Favorite Things e Olé Coltrane. Mas após essa homenagem o trio percorre muitos outros caminhos: um flerte animado com a música latino-americana (Carriba), momentos em que o baixo de Stanley Clarke flerta com o fusion e o funk (I want to tell you ‘bout that) e momentos mais calmos, em que o pianista, mais do que na década de 1960, se sente à vontade para improvisar em um clima mais intimista, suave, de quem não precisa mais provar nada pra ninguém e pode calmamente valorizar o swing das melodias do standard Never let me go e da autoral Memories.
Também em 2000, McCoy Tyner explicou em uma entrevista que Stanley e Al já tinham tocado com ele algumas vezes desde os anos 70, e que cada vez que se encontravam novamente a conexão era muito forte. Ele prossegue: “gosto de fornecer espaço suficiente para que a pessoa se sinta confortável para fazer o que faz. Eu não gosto de algemar pessoas. Mas, ao mesmo tempo, ele precisa entender que, quando está tocando comigo, ele também precisa ouvir. Ouvir e responder são coisas muito importantes.”
Sobre a presença do jazz no dia a dia dos EUA, ele compara:
Minha mãe sabia quem eram Billie Holiday, Count Basie e Duke Ellington. Ela sabia quem eles eram porque faziam parte da comunidade e tínhamos orgulho dessas pessoas. Esse tipo de acessibilidade não parece mais existir nesse nível – o nível em que a dona de casa, encanador ou carpinteiro comum conhece dessa música. Lembro de entrar em um ônibus em Chicago uma vez e o motorista do ônibus disse “Ah, você toca com Coltrane! Vocês estão por aqui? Eu vou assistir!” Era o motorista do ônibus! A música era acessível. Tínhamos nosso quinhão de tempo de rádio. Mas agora está tão inundado de coisas que não estão no mesmo nível de qualidade, mas vendem. Isso dá uma ideia geral do estado de espírito do público. Eu não estou descartando isso, a música comercial tem seu lugar. Naquela época havia gospel, jazz, blues, rock e pop. O jazz não era promovido como as estrelas do pop, mas o público tinha mais acesso do que hoje.
McCoy Tyner with Stanley Clarke and Al Foster (2000)
1. Trane-Like – 9:12
2. Once Upon a Time – 5:31
3. Never Let Me Go (Evans, Livingston) – 4:19
4. I Want to Tell You ‘Bout That – 5:19
5. Will You Still Be Mine? (Adair, Dennis) – 6:46
6. Goin’ ‘Way Blues – 6:31
7. In the Tradition Of (Clarke) – 7:38
8. The Night has a Thousand Eyes” (Bernier, Brainin) – 4:53
9. Carriba – 5:41
10. Memories – 3:43
11. I Want to Tell You ‘Bout That [alternate take] – 5:57
All compositions by McCoy Tyner except as indicated
“This lovely album seems to have a little bit of everything – ballads and blues, standards and originals, subtle swing and funky dance rhythms.” – Donald Elfman
O regente da apresentação de hoje sente a necessidade de fazer alguns comentários sobre a interpretação da Nona Sinfonia que, depois da mais recente experiência, não parecem ser supérfluos. Para começar, gostaria de apontar que Beethoven, através de sua perda auditiva que se tornaria surdez completa, tinha perdido o necessário contato próximo com a realidade. Isso aconteceu exatamente no período de sua vida criativa em que, através duma elevação sem precedentes de suas concepções, ele avançou na busca de meios de expressão e no sentido de um tratamento até então desconhecido e drástico da orquestra. Isso é tão bem sabido quanto o fato de que os metais daquela época não permitiam certas frequências de sons necessários para a formação da melodia. A necessidade trazida por essas carências ao longo do tempo levou a um aperfeiçoamento desses instrumentos e parece-nos quase um crime não lançar mão dessa vantagem.
Richard Wagner tentou apaixonadamente toda sua vida, em palavras e ações, tirar as interpretações das obras de Beethoven do estado de negligência realmente insuportável no qual caíram. Ele explicou suas experiências e esforços para uma interpretação dessa obra na monografia “A Propósito da Interpretação da Nona Sinfonia”, uma monografia que é aparentemente pouco conhecida e estudada. Todos regentes modernos apropriaram-se, essencialmente, de seus ensinamentos e orientação.
O regente da apresentação de hoje, em sua mais plena convicção, também seguiu esse caminho. Ele deve decididamente protestar contra a insinuação de que ele, de alguma maneira, fez mudanças arbitrárias na instrumentação. Ele, ao contrário, empenhou todo esforço para, no todo e nas individualidades, seguir até as minúcias de indicações e prescrições do mestre (Beethoven) e não deixar se perderem quaisquer de suas intenções que estão frequentemente ocultas ao olhar superficial. Ele [o regente], por outro lado, lançou mão de todas vantagens da orquestra moderna e especialmente de todos os meios de que dispomos até um grau muito mais maduro, de modo a não ocultar as intenções de Beethoven em uma massa confusa de som, e sim trazê-las à vida sonora com uma exatidão que segue o mestre até o mínimo detalhe.
Ele sente que é seu dever, considerando o conjunto dos instrumentos de corda que recentemente cresceu de modo tão tremendo, dobrar as madeiras e as trompas, mas de modo algum dar uma nova voz a esses auxiliares.
A propósito, ele pode apontar que, com isso, ele está tão só seguindo o costume de seu antecessor nessa posição. Ele rejeita de modo enfático a acusação de que agiu descuidadamente em sua interpretação e na explicação das notações de Beethoven, e ele se dispõe a provar através da partitura que com cada mais diminuto desvio da prática tradicional, ele agiu com necessidade premente e que, no todo, sua interpretação usou da moderação necessária exigida pela veneração pelo mestre e por suas vontades”.
Mahler foi tão execrado pelos seus “retoques” (“Retuschen”) na sacrossanta Nona do “imexível” Beethoven que, ainda de orelhas quentes pelo escândalo da primeira récita de sua versão editada, fez questão de redigir essa nota para que fosse impressa e entregue ao público antes da segunda. Não adiantou muito: os vienenses seguiram tiriricas e, por mais que tenham tolerado ou viessem a tolerar Retuschen em obras de Smetana e Schumann, não admitiam que se mudasse uma semifusa sequer de seu cidadão adotivo mais ilustre.
Naquele início de século XX, os regentes tomavam amplas liberdades com as partituras, sem que isso causasse muita comoção. Toscanini, por exemplo, adotava amplamente a prática, mas nunca recebeu sequer uma fração do reproche que jorrou em Mahler, que chegara ao cargo musical máximo do Império e ainda levava tomates por sua atuação como diretor da Hofoper. A tomatina não se devia ao nível artístico, certamente muito elevado, mas a celeumas entre o regente e seus músicos, por conta do perfeccionismo e ataques despóticos, e pela impaciência de Mahler com as negociações e a exigência de mesuras e bajulação inerentes ao cargo. Além disso, o antissemitismo não lhe dera trégua, mesmo que o judeu secular tivesse, ao antever o ódio com que o receberiam em Viena, se convertido ao catolicismo alguns meses antes de mudar-se para a capital imperial.
Eu acho que compreendo as intenções de Mahler. Ademais, com a carreira dividida entre a regência e seu grande xodó, a composição, ele achava natural ajustar as partituras para maximizar o efeito daquelas que, em sua nada desprezível posição de mais célebre maestro de seu tempo, pareciam subutilizar os recursos da orquestra. E, de fato, contando com algumas dúzias de instrumentistas de cordas em cada naipe, fazia sentido que ele aumentasse o número de sopristas e propusesse mais pareamentos, como é, por exemplo, muito perceptível no Scherzo da Nona. As indicações metronômicas às vezes implausíveis de Beethoven são abolidas, e os cantores – que não tiveram qualquer mudança em suas partituras – recebem algumas bem-vindas pausas para respirar, que o Mestre de Bonn, notoriamente nada empático em seu tratamento da voz humana, não achou necessário conceder-lhes.
Ouvindo essa gravação, mais de um século depois do escândalo em Viena, nada encontrei para me chocar. Muita coisa soa diferente – o que não quer dizer melhor -, mas o uso da orquestra sinfônica parece, de fato, mais efetivo. Se isso era necessário, bem, aí é outra história. Os Retuschen de Mahler, afinal, não tinham a pretensão de “corrigir” as sagradas partituras, e sim de proporcionar-lhes, como ele próprio afirmou, o pleno uso dos recursos das orquestras e salas de concerto modernas. O resultado é claramente mais volumoso, em detrimento de nuances. Se sacrílego ou louvável, deixo ao leitor-ouvinte decidir – enquanto encerro, com esta postagem, o annus horribilis em que fui arroz de festa aqui no PQP Bach, e que espero ter tornado um pouco menos medonho com o que tentei trazer a vocês.
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
Sinfonia no. 9 em Ré menor, Op. 125, “Coral” Retocada por Gustav Mahler (1860-1911)
1 – Allegro ma non troppo, un poco maestoso
2 – Molto vivace – Presto – Molto vivace – Presto
3 – Adagio molto e cantabile – Andante moderato – Andante moderato – Adagio -Lo stesso tempo
4 – Presto – Allegro assai – Presto (“O Freunde”) – Allegro assai (“Freude, schöner Götterfunken”) – Alla marcia; Allegro assai vivace (“Froh, wie seine Sonnen”) – Andante maestoso (“Seid umschlungen, Millionen!”) – Allegro energico, sempre ben marcato (“Freude, schöner Götterfunken” – “Seid umschlungen, Millionen!”) – Allegro ma non tanto (“Freude, Tochter aus Elysium!”) – Prestissimo (“Seid umschlungen, Millionen!”)
Gabriele Fontana, soprano Barbara Hölzl, contralto Arnold Bezuyen, tenor Reinhard Mayr, baixo Slovenský Filharmonický Zbor (Coro Filarmônico Eslovaco) Tonkünstler-Orchester Niederösterreich
Kristjan Järvi, regência
Nota de Gustav Mahler aos espectadores, escrita após a estreia de sua versão retocada da Nona de Beethoven, para ser lida antes da apresentação seguinte, e que lhes traduzi mais acima.
Este é um repertório de câmara absolutamente sublime. As três peças estão no coração da obra e dos admiradores de Brahms. Ax, Laredo, Ma e Stern fazem um bom trabalho, mas não são um grupo estabelecido. Há gravações melhores — de maior entrosamento, principalmente — de trios que convidaram um violista e de quartetos que desconvidaram seu segundo violino para chamar um pianista.
Brahms tinha 31 anos quando escreveu o primeiro Quarteto para Piano, Op. 25, que teve sua primeira apresentação em Hamburgo em 1861 com nada menos que a própria Clara Schumann ao piano e Joseph Joachim no violino. Ele é sensacional. O último movimento, Rondo alla Zingarese, têm ímpeto e delicadeza sem igual. Este quarteto é uma das peças de música de câmara mais inusitadas e exitosas, não só do período romântico, mas de toda a música ocidental.
Embora o segundo Quarteto para Piano, Op. 26, tenha sido escrito apenas um ano após o primeiro, ele cai em um período completamente diferente da vida do compositor, que agora já estava em Viena, onde conheceu Josef Hellmesberger. Membros do Quarteto Hellmesberger assumiram as cordas na estreia, na qual o próprio Johannes Brahms atuou como pianista. Este quarteto, influenciado por Schumann e Schubert, tem uma duração invulgarmente longa, São 50 minutos e ele acabou ficando sozinho no segundo CD deste álbum.
O terceiro quarteto de piano, o de Op. 60, foi finalizado em 1875 e é também belíssimo. No entanto, seus dois primeiros movimentos permaneceram na gaveta por 20 anos, até que Brahms encontrou coragem para terminar a obra. A razão para isso foi a confusão de sua relação com Clara Schumann, dizem. Às vezes é chamado de Quarteto Werther, em homenagem ao romance de Goethe… Brahms era furiosamente autocrítico. Então, suas obras incluem várias revisões. Por exemplo, o notável Trio para Piano, Op. 8, foi revisado mais de 30 anos depois de aparecer em 1854. Este último dos três quartetos para piano, publicado em 1875, foi na verdade sua primeira tentativa na forma, que data de meados da década de 1850, quando Brahms tinha 20 anos e se apaixonou pela pianista Clara Schumann.
Johannes Brahms (1833-1897): Todos os Quartetos para Piano (Ax, Laredo, Ma, Stern)
Piano Quartet, Op. 25 (G Minor)
1-1 I. Allegro 13:38
1-2 II. Intermezzo: Allegro, ma non troppo; Trio: Animato 8:05
1-3 III. Andante con moto 10:13
1-4 IV. Rondo alla Zingarese: Presto 8:05
Piano Quartet, Op. 60 (C Minor)
1-5 I. Allegro non troppo 10:55
1-6 II. Scherzo: Allegro 4:12
1-7 III. Andante 9:09
1-8 IV. Finale: Allegro comodo 10:57
Piano Quartet, Op. 26 (A Major)
2-1 I.. Allegro non troppo 16:46
2-2 II. Poco adagio 12:51
2-3 III. Scherzo; Trio: Poco allegro 11:40
2-4 IV. Finale: Allegro 10:55
Cello – Yo-Yo Ma
Piano – Emanuel Ax
Viola – Jaime Laredo
Violin – Isaac Stern
QUATTRO: infinita tristezza
Incentivado pelo sucesso de “Oberto”, o empresário Merelli fez um contrato de mais três óperas, uma a cada oito meses, e pediu a Verdi, como primeira, das três comprometidas no contrato, uma ópera cômica: escolheram “Il finto Stanislao o Un giorno di regno”, libreto de Felice Romani, o poeta melodramático mais estimado e em voga. Porém o compositor adoeceu com angina durante a composição e o casal, mais uma vez, ficou sem grana. Verdi pediu para Pasetti para perguntar a Merelli se poderia rolar um adiantamento do contrato, “50 scudi”. Pasetti (um engenheiro de palco influente no La Scala) esqueceu da tarefa e não faz o pedido de adiantamento ao empresário (daí provavelmente nasceu a antipatia de Verdi por Pasetti). Então como último recurso, Margherita pega os poucos objetos de ouro, que são dela, sai de casa, e consegue arrecadar a mencionada quantia, lhe entregou o dinheiro, com um sorriso de amor e confiança (isso sim é o bem mais valioso que o ouro). Porém a doença, os embaraços financeiros não eram mais que um prelúdio de uma série de desditas que, nos dias que se seguiram, se abateram com muita violência sobre o artista e o homem, que foi um milagre resistir a tanto infortúnio.
Todos as pessoas atravessam na vida um momento em que, como o aço, são submetidos à prova de fogo: ou se temperam ou se fundem, resistem a todas as dores ou se abatem e perecem. O casal em abril de 1840 ficou só. Após a recuperação de Giuseppe, foi a vez de Margherita adoecer ela chorava continuamente a falta das crianças consumindo-se em aflição. Antes de completar dois meses da passagem do pequeno Icílio ela desfaleceu, inclinando a loira e encantadora cabeleira na cama para não mais se levantar. Os médicos da época diagnosticaram a sua doença como encefalite (provavelmente a mesma doença que levara seu pequeno filho) e assim no dia 19 de julho foi se juntar aos filhos depois de dias de agonia.
Verdi ficou só, o coração despedaçado, como um robusto carvalho alvejado por um raio. “Para que trabalhar ?” – dizia aos que o cercavam. As obrigações contraídas impunham-se a conclusão da ópera cômica (!!!), cujo prazo estava a findar. Como prosseguir tendo ele visto falecer um a um todos os membros queridos de sua família? Revolta e amargura dominavam todos os seus sentimentos. E, em desespero, ele escrevia: “Fiquei só, só, só! Em apenas dois meses meus entes mais queridos abandonaram-me para sempre. Minha família está exterminada”. Mas o contrato assinado não incluía cláusulas que desculpassem o atraso da encomenda por motivo de angústia. O prazo de entrega já se esgotara e Verdi teve que concluir às pressas “Un Giorno di Regno”, estreada, após desorganizados ensaios, na noite de 9 de setembro de 1840, sob vaias e apupos.
A segunda ópera de Verdi foi escrita em grande velocidade. É provável que Bartolomeo Merelli tenha atribuído a ele o libreto apenas no final de junho de 1840; O antigo melodrama giocoso de Romani (originalmente definido por Adalbert Gyrowetz em 1818 sob o título “Il finto Stanislao”) teve então de ser substancialmente revisado para ser atualizado (embora nenhuma evidência direta tenha sobrevivido, o revisor provavelmente foi Temistocle Solera).
A ópera foi um fiasco completo, retirada do palco depois de apenas uma apresentação. A julgar pelas críticas contemporâneas e pelas lembranças posteriores de Verdi, seu fracasso teve tanto a ver com a performance quanto com a música. “Un giorno di regno” teve alguns “revivals” durante a vida de Verdi e ocasionalmente é hoje encenada em festivais.
O fiasco aumentou o abatimento moral do compositor que, sentindo-se arrasado, não acreditava mais em seu talento e decidiu a abandonar a arte “para sempre”. Pediu mesmo ao empresário Merelli que rasgasse o contrato que havia assinado, pois “não tornaria a escrever uma nota sequer”.
Convencido de que o mal que se abatera sobre Verdi era grave, ferida profunda, Merelli devolveu o contrato, informando que não o obrigaria a escrever, mas também a confiança que depositara em seu talento não estava abalada e esperaria que um dia, dominada a crise, o artista voltaria a trabalhar e lutar para vencer. Verdi agradeceu, mas não deu esperanças de mudar de atitude. Afastando-se de todos, o destroçado Giuseppe entregou-se à tristeza e à ociosidade durante algum tempo. Não escrevia a ninguém, evitava as pessoas e vivia recluso, sofrendo, sem fazer qualquer tentativa para vencer a mágoa e retomar a vida.
Enredo Un Giorno di regno (Il finto Stanislao)
Melodramma giocoso em dois atos de libreto de Felice Romani (provavelmente revisado por Temistocle Solera) após a peça de Alexandre Vincent Pineu-Duval “Le faux Stanislas”
Estréia: Milão, Teatro alla Scala, 5 de setembro de 1840.
A ação acontece perto de Brest, no castelo de Kelbar, no início do século XVIII. Belfiore (barítono) é um oficial que se apresenta como Rei Stanislao da Polônia para protegê-lo do perigo. Mas ele está apaixonado por uma jovem viúva, a marquesa del Poggio (meio-soprano), que está prestes a se casar. O interesse romântico secundário vem de um casal de jovens amantes, Edoardo (tenor) e Giulietta (soprano); cenas cômicas são fornecidas por um par de contrabaixos, o barão Kelbar (pai de Giulietta) e La Rocca, o tesoureiro do estado (tio de Edoardo), que deseja se casar com Giulietta. Depois de várias intrigas de farsa, Belfiore usa seu disfarce para realizar o casamento dos jovens amantes e então revela sua verdadeira identidade a tempo de reivindicar a marquesa como sua.
Ato 1 Cena 1: uma galeria na casa do Barão Kelbar
Belfiore, personificando o rei polonês Stanislao, é um convidado na casa do Barão Kelbar e comenta consigo mesmo sobre sua mudança de fortuna: Compagnoni di Parigi … Verrà purtroppo il giorno / “Se ao menos meus antigos camaradas em Paris pudessem me ver agora, o oficial mais dissoluto do regimento tornou-se rei filósofo.” O Barão recentemente arranjou uma aliança política ao prometer sua filha, Giulietta, a La Rocca, o tesoureiro da Bretanha, mas Giulietta prefere o sobrinho de La Rocca, Edoardo. Outro casamento indesejado envolve a sobrinha do Barão, a marquesa del Poggio, uma jovem viúva apaixonada por Belfiore. Ela ficou noiva do conde de Ivrea porque Belfiore não conseguiu se comprometer a casar com ela, apesar do fato de que ele a ama.
Sabendo da chegada iminente da marquesa e preocupado com a possibilidade de ela revelar sua falsa identidade como rei, Belfiore escreve a Stanislao e pede para ser liberado de seu compromisso. Edoardo revela sua situação ao “Rei” e implora para ser levado para a Polônia com ele para esquecer a mulher que ama. Além disso, quando a marquesa chega e, ao ser apresentada a Belfiore como “o rei”, ela finge não o reconhecer. Da mesma forma, ele finge não a reconhecer, mas ela está determinada a testá-lo, proclamando seu amor pelo Conde: Grave a core innamorato …
Cena 2: o jardim do castelo de Kelbar
Giulietta está sozinha com seus acompanhantes e expressa infelicidade por ter que se casar com um homem velho: ‘Non san quant’io nel petto … Non vo’ quel vecchio.” Quando o conde e La Rocca chegam, seguidos sucessivamente por Belfiore e Edoardo e depois a marquesa (que planejava ajudar os amantes), Belfiore atrai o conde e La Rocca a pretexto de discutir negócios de Estado, deixando os jovens amantes sozinhos com a Marchesa.
Cena 3: a galeria do castelo de Kelbar
Mantendo seu papel de rei, Belfiore faz ao tesoureiro uma oferta de promoção que incluiria o casamento com uma viúva rica. Ao aceitar, ele concorda em não se casar com Giulietta. Quando o tesoureiro diz ao Barão que se recusa a se casar com sua filha, o Barão fica afrontado e o desafia para um duelo. Para aumentar a confusão ao redor, a marquesa imediatamente propõe que Giulietta e Edoardo se casem imediatamente. No entanto, o falso Rei volta e propõe que ele decidirá sobre uma solução que irá satisfazer a todos.
Ato 2 Cena 1: a galeria do castelo de Kelbar
Após o pronunciamento do “Rei”, os criados ficam perplexos e cantam um coro despreocupado que leva Edoardo a buscar seu apoio e anunciar sua esperança de ainda poder se casar com Giulietta: Pietoso al lungo pianto … Deh lasciate a un alma amante.”
O tesoureiro Belfiore e Giulietta entram discutindo os motivos da oposição do Barão ao casamento da filha com Eduardo. Giulietta explica que a pobreza do jovem é a principal objeção e por isso Belfiore determina imediatamente que o Tesoureiro deve desistir de um de seus castelos e dar uma soma em dinheiro ao jovem, e então tudo ficará bem. Este último reluta em desobedecer seu soberano, mas busca uma saída para seu duelo com o Barão.
Cena 2: uma varanda com vista para os jardins do castelo
Belfiore e a marquesa se encontram na varanda, o primeiro ainda sem saber quem é. Isso irrita a senhora, que corajosamente afirma ser sua intenção casar-se com o conde de Ivrea. Porém, ela não entende por que Belfiore está demorando tanto para se revelar e ainda espera sua mudança de coração: Si mostri a chi l’adora …” . Quando o Conde Ivrea é anunciado, ela assume uma postura desafiadora (cabaletta): Si, scordar saprò l’infido.” Como Eduardo se comprometeu a se juntar ao “Rei” quando for para a Polônia, Giulietta está determinada a fazer com que o Rei rescinda o compromisso. O conde entra e a marquesa afirma mais uma vez que se casará com o conde. No entanto, Belfiore proíbe imediatamente o casamento por “razões de estado” e anuncia que ele e o conde devem partir para a Polônia para tratar de assuntos de estado.
Todos expressam seus sentimentos, mas as coisas param quando chega uma carta para Belfiore. É do rei Stanislao anunciando sua chegada segura a Varsóvia e liberando Belfiore de sua tarefa de se passar por ele. Em troca, o rei o criou Marechal da França. Antes de largar o disfarce, o “Rei” proclama que Giulietta e Eduardo vão se casar e, tendo recebido o consentimento do Barão, lê a carta do verdadeiro rei e revela sua verdadeira posição. Ele expressa seu amor pela marquesa e tudo termina feliz com a perspectiva de dois casamentos.
Cai o pano
Personagens e intérpretes
Tá bom, o pessoal da época não gostou por diversas razões e a principal foi que o maestro Verdi não se empenhou nos ensaios pois estava com a vida particular abalada. Para este medíocre admirador, esta segunda ópera de Verdi não é ruim, depois de algumas audições fica familiar e percebemos momentos muito bons. Tem uma amostra do vigor que caracteriza toda a obra de Verdi, mas não nos conta muito mais, apesar de estar cheia de lindas melodias de “bel canto” e números padrões do “Código Rossini”. O que ele produziu aqui foi uma obra que poderia facilmente ser confundida com as linhas estruturais de alguma obra menor de Donizetti ou de Bellini. A abertura é muito simpática e soa ótima nesta gravação.
Esta performance que tenho a imensa alegria de compartilhar com os amigos do blog é ao vivo do ótimo “Heidenheim Opera Festival” gravado em 2017. É uma bela gravação, gostei bastante do maestro Marcus Bosch que lidera a Cappella Aquileia em uma leitura animada da alegre Abertura, cujo tema principal retorna no final da ópera. Marcus Bosch é uma das figuras mais proeminentes na cena da regência alemã. Este artista alemão de ascendência ítalo-brasileira decidiu desde cedo embarcar na carreira de Kapellmeister como muitos maestros na Alemanha. O elenco é jovem e adequado, com um tenor notavelmente muito bom que é o destaque: Giuseppe Talamo como o “Edoardo” tem uma voz clássica de tenor lírico no bom estilo italiano. Gocha Abuladze canta “Belfiore” com admirável fluência, um adorável tom sombrio e com muito humor. David Fersini é um “Kelbar” encantador. David Steffens é um barítono lírico juvenil que se adapta admiravelmente à música. Ouçam o dueto buffo do primeiro ato para o “Barone” de David Fersini e “La Rocca” de Steffens é uma boa diversão e Bosch move os conjuntos com bastante dinamismo. Valda Wilson faz uma “Giulietta” charmosa, ela tem uma voz lírica rica em tons. Elisabeth Jansson é uma elegante marquesa “del Poggio” seu tom rico contribui de forma muito bonita as suas passagens.
Em suma, uma obra surpreendente e agradável, uma raridade que os amigos dificilmente encontrarão sendo encenada em palcos fora de festivais da Itália. Bom divertimento, vale a pena sim, não é uma obra prima, mas é bem animada: uma competente composição no estilo “bel canto”!!!! Que subam as cortinas e apreciem esta segunda ópera de Verdi !!!!
Cavaliere Belfiore – Gocha Abuladze Barone Kelbar – Davide Fersini Giulietta Di Kelbar – Valda Wilson Marchesa Del Poggio – Elisabeth Jansson Edoardo Di Sanval – Giuseppe Talamo La Rocca – David Steffens Conte Ivrea – Leon De La Guardia Delmonte – Daniel Dropulja
Cappella Aquileia and Czech Philharmonic Choir
Heidenheim Opera Festival – 2017
Podemos dizer que esses caras são representantes da geração entre Josquin Des Prés e Giovanni Pierluigi da Palestrina. Escreviam suaves e eufônicas polifonias e eram amigos de Roland de Lassus. O disco é agradabilíssimo de se escutar. O Cinquecento é sensacional!
Vaet escreveu nove missas completas que sobreviveram, incluindo um Réquiem. Escreveu música sacra e secular.
Jacobus Clemens non Papa foi um compositor flamengo do Renascimento. Prolífico, compôs em grande número de estilos e foi célebre principalmente por suas harmonizações polifônicas de salmos. O epíteto “non Papa” aparece da partir de 1546, notadamente na coletânea de motetos publicada por Tielman Susato. Há várias hipóteses sobre esse acréscimo ao nome do compositor: segundo uma delas, teria sido uma ideia de Susato, para distinguir o compositor do seu contemporâneo, o Papa Clemente VII. Segundo uma outra hipótese, a intenção era evitar confusão com o poeta Jacobus Papa. Especula-se também que a adição reflita simpatias pelo protestantismo.
Jacobus Vaet (1529-1567): Missa Ego Flos Campi
1 Antevenis Virides 4:49
Missa Ego Flos Campi 30:43
2 Kyrie 4:35
3 Gloria 5:59
4 Credo 7:54
5 Sanctus And Benedictus 6:57
6 Agnus Dei 8vv 5:11
7 Ecce Apparebit Dominus 4:28
8 Magnificat Octavi Toni 7:42
9 Miserere Mei, Deus 5:35
10 Filiae Jerusalem 3:04
11 Spiritus Domini 5:16
12 Musica Dei Donum 3:16
13 Salve Regina 6:41
Jacob Clemens Non Papa (1510-1555)
14 Ego Flos Campi 3:37
Bass Vocals – Simon Whiteley (tracks: 6), Ulfried Staber
Composed By – Jacob Clemens Non Papa* (tracks: 14), Jaconus Vaet* (tracks: 1 to 13)
Countertenor Vocals – Jakob Huppmann, Terry Wey
Ensemble – Cinquecento
Tenor Vocals – Bernd Oliver Fröhlich* (tracks: 6, 14), Thomas Künne, Tore Tom Denys
Há cinco anos, quando publiquei a “Hammerklavier” sob as fabulosas mãos de John O’Conor, perguntei ao respeitável público se ele tinha algum interesse em ouvi-la orquestrada. Apenas um leitor-ouvinte respondeu, e sua resposta foi não, então supus que – bem, que não.
É, assim, de maneira inteiramente não solicitada e gratuita que lhes venho oferecer essa curiosidade: a “Hammerklavier” orquestrada e regida por Felix Weingartner, numa gravação de 1930 que foi, pelo jeito, a única que se fez dela.
A empreitada de Weingartner, um dos regentes mais famosos da época, responsável pela primeira gravação integral das sinfonias de Ludwig, é hoje universalmente achincalhada. Poucas obras, afinal, clamam mais pelo teclado que esse complicadíssimo Leviatã da literatura pianística, que como alcunha, aliás, tem o próprio nome do instrumento para que Beethoven a imaginou. Lembro de ter lido, em livros antiquados, que a “Hammerklavier” seria tão transcendentalmente difícil que só uma orquestra sinfônica seria capaz de realizá-la a contento. Por trás de seus bigodes, Friedrich Nietzsche tascou algo semelhante:
Na vida de grandes artistas, existem contingências infelizes que, por exemplo, forçam o pintor a esboçar seu quadro mais significativo apenas num pensamento fugaz, ou que forçaram Beethoven a nos deixar apenas a insatisfatória redução para piano de uma sinfonia em certas grandes sonatas para piano (a “grande”, em Si bemol maior). Em tais casos, o artista que vem depois deve tentar corrigir a vida dos grandes homens depois desses fatos; por exemplo, um mestre de todos os efeitos orquestrais faria isso restaurando a sinfonia que sofreu uma aparente morte pianística (…)”
Por mais imaginativas que sejam, opiniões como essas desconsideram o imenso conhecimento que Ludwig tinha do teclado e, convenhamos, subestimam sua capacidade de escrever o que bem quisesse para a orquestra sinfônica. Ademais, não há qualquer registro de que o compositor pretendesse orquestrar a sonata e, por fim, basta ouvir a “Hammerklavier” um pouco além de seus portentosos acordes de abertura para encontrar temas e frases muito idiomáticas para o teclado, que a tornam pouquíssimo idiomática a quaisquer outros instrumentos, ou a conjuntos deles.
Por que, então, Weingartner “cometeu” essa orquestração?
A resposta passa, penso eu, por colocar essa gravação em sua devida perspectiva.
Por muito tempo, as reduções para piano de obras sinfônicas eram indispensáveis para que elas chegassem ao conhecimento das multidões que não tinham acesso a concertos sinfônicos. Foi com esse intuito que Liszt – que, em sua velhice, teve Weingartner como um de seus últimos alunos – transcreveu as sinfonias de Beethoven para o piano com uma fidelidade incomum a alguém com sua propensão a fazer firulas. Nas primeiras décadas do século XX, no entanto, o panorama era muito diferente: o número de orquestras sinfônicas aumentou muito, e a indústria fonográfica estava a registrar seu repertório a todo vapor. Em compensação, a “Hammerklavier” (que só foi estreada em público, e pelo próprio Liszt, mais de vinte anos após sua composição) seguia num limbo, respeitada como o produto talvez mais megalômano da imaginação do Beethoven maduro, mas considerada complicada demais para ser ouvida e insanamente difícil de ser tocada. Assim, ao orquestrar a obra para as mesmas forças que a Quinta Sinfonia e pressionar a Columbia a gravá-la e lançá-la no contexto de sua gravação integral das sinfonias do renano, Weingartner pretendeu divulgá-la a um público que, de outra forma, não a ouviria. E, de fato, mais alguns anos mais se passariam até que o pianista Artur Schnabel, que começou a tocar a “Hammerklavier” em recitais na década de 20, resolvesse trazê-la ao disco.
Por melhores que tenham sido suas intenções, e por maiores que sejam os descontos que concedamos às limitações técnicas das gravações dos 1930, o resultado não entusiasma. Diversos elementos marcantes da sonata, notadamente seus muitos trinados, que soam brilhantes ao teclado, perdem seu poder na orquestração. Os ataques das cordas nem de longe evocam a fúria prescrita por Beethoven nos ataques em fortissimo ao teclado, e mesmo no Adagio sostenuto, movimento em que a orquestração tem melhores resultados, o uso muito liberal do portamento, aparentemente um lugar-comum para as orquestras da época e muito natural para Weingartner, soa-nos estranho.
Ainda assim, e mesmo que não me tenha sido pedido, trago-lhes essa estranha sonata para piano sem piano para que os leitores-ouvintes a julguem e, se quiserem, a execrem com seus próprios ouvidos. Se não lhes for pedir demais, rogo-lhes que não se esqueçam de agradecer a Weingartner pela corajosa ousadia, tão própria aos grandes artistas, sem a qual – ainda que não se acerte sempre – a Música não seria a mesma.
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
Sonata para piano no. 29 em Si bemol maior, Op. 106, “Hammerklavier”
Orquestrada por Felix Weingartner (1863-1942)
1 – Allegro
2 – Scherzo: Assai vivace
3 – Adagio sostenuto
4 – Largo – Allegro risoluto
Royal Philharmonic Orchestra
Felix Weingartner, regência
Die Geschöpfe des Prometheus, música para o balé em dois atos de Salvatore Viganò, Op. 43
5 – Abertura
Sinfonia no. 5 em Dó menor, Op. 67
6 – Allegro con brio
7 – Andante con moto
8 – Allegro
9 – Allegro
London Philharmonic Orchestra Felix Weingartner, regência
Este volume da série Jazz Moods, da Legacy, mostra a big band de Duke Ellington durante suas três primeiras décadas. O CD vai desde os primeiros dias da carreira do grande band leader e compositor em 1927, até o ano de 1941. Todas as faixas aqui são clássicas de Ellington e foram gravadas muitas vezes, mas essas versões, em quase todos os casos, são as originais. Há a gravação original de It Don’t Mean a Thing (If It Ain’t Got That Swing) com a vocalista Ivie Anderson à frente da banda — o outro vocalista nessas sessões de 1932 era um cara chamado Bing Crosby. Cotton Tail, de 1940, apresenta um solo sensacional de saxofone do grande Ben Webster. Também está incluída a versão de 1928 de The Mooche. E há um belo solo de trompete de Juan Tizol na gravação de Caravan em 1937, e 11 outros clássicos “quentes” de Ellington. Embora não haja nada de novo neste disco, o som é mais do que digno e é bom ter tantos originais de um período tão fértil em um só lugar. Aproveitem!
Duke Ellington – Jazz Moods | Hot
1 Hot And Bothered 2:52
2 It Don’t Mean A Thing (If You Ain’t Got That Swing) 3:08
3 Coton Tail 3:03
4 The Mooche (78rpm Version) 3:14
5 Battle Of Swing 2:57
6 Rockin’ In Rhythm 3:14
7 Braggin’ In Brass 2:43
8 Caravan 3:05
9 Ring Dem Bells 2:48
10 Merry-Go-Round 2:57
11 East St. Louis Toodle-Do 3:04
12 In A Jam 2:58
13 Take The “A” Train 2:53
14 Tootin’ Through The Roof 2:52
O disco original não informa as várias formações das big bands de Ellington nas faixas.
Tinha separado essa gravação para publicá-la na série com a obra integral de Beethoven para, no fim, preteri-la. Gosto muito de Buchbinder, que há anos nos vem presenteando com gravações muito boas de Ludwig, de Wolfgang e de Franz Peter, mas sua nova leitura das “Diabelli”, que ocupa o primeiro disco desse álbum duplo, soou-me um tanto insossa: tecnicamente impecável, mas sem o colorido e os contrastes dinâmicos com que os grandes pianistas costumam tratar esse monumento da literatura para teclado.
O segundo disco, muito mais interessante, traz variações modernas sobre a valsa de Diabelli, dedicadas ao próprio pianista, somadas a algumas daquelas da Vaterländische Künstlerverein de que Buchbinder fez uma das primeiras gravações completas. A abordagem conservadora das variações de Beethoven, assim, acaba aumentando a surpresa com as frescas peças que abrem o segundo disco e trazem ao primeiro uma perspectiva diferente. Se isso foi ou não intencional, eu não lhes saberia dizer, mas recomendo a experiência, nem que seja só pelas obras modernas, e pela homenagem que o pianista faz ao compositor e à obra que mais marcaram sua vida.
Em suas próprias palavras,
“Nenhum compositor esteve ao meu lado com tanta intensidade quanto Ludwig van Beethoven, e nenhuma de suas obras se tornou um leitmotiv de minha vida como suas Variações Diabelli. Sessenta anos atrás, meu professor de piano Bruno Seidlhofer deu sua partitura a mim, seu aluno mais jovem na Academia de Música de Viena, a quem gostava de chamar de “Burli” (“rapazinho”). ‘Ao meu querido Rudolf Buchbinder, os melhores votos para o futuro’, escreveu ele com uma caneta esferográfica na primeira página. A ‘última valsa’ de Beethoven está comigo desde então.
Foi também Seidlhofer quem me deixou tocar as primeiras 25 de um total de 50 variações da chamada “Vaterländischer Künstlerverein” em um concerto de estudantes – variações feitas por contemporâneos de Beethoven que também haviam se baseado no tema da valsa de Diabelli. Entre eles estavam Carl Czerny, aluno de Beethoven, e seu aluno de 11 anos, Franz Liszt; o professor de Czerny, Johann Nepomuk Hummel; o filho de Mozart, Franz Xaver Wolfgang Mozart; e Franz Schubert, cuja variação em Dó menor deve ter parecido sobrenatural até para os ouvintes daquela época.
Quando, em 1973, fui aos estúdios Teldec de Berlim para gravar as Variações Diabelli de Beethoven pela primeira vez, foi-me natural registrar também as variações de seus contemporâneos. Afinal, suas peças eram um passeio musical pela Viena de Beethoven. Quando retomei o ciclo, apenas três anos depois, alguns colegas já me haviam apelidado de “Monsieur Diabelli”. Em 2007, eu, com muito gosto, contribuí com um concerto beneficente para ajudar a Beethovenhaus em Bonn a adquirir o manuscrito autógrafo desta peça, um documento que nos permite um vislumbre do meticuloso processo de trabalho de Beethoven: de ataques de raiva ilegíveis a correções cuidadosas. Tinta preta, verde e vermelha e lápis – música que Beethoven rabiscou parcialmente no papel.
E, de fato, até hoje, as Variações Diabelli continuam sendo uma das minhas peças mais executadas. Meu tio, que desde cedo reconheceu e cultivou meu talento musical, anotou minhas apresentações em uma pasta preta, um hábito que continuei, por curiosidade, após sua morte. É por isso que sei que executei o ciclo das Diabelli em público exatamente 99 vezes antes do aniversário de Beethoven em 2020. “Diabelli 2020” é, portanto, também um jubileu privado para mim e para minha relação com Beethoven.
Era, assim, natural que eu quisesse retomar o ciclo de variações no ano do jubileu, bem como minhas variações favoritas dos outros 50 compositores. Eles formam o contraste camerístico com minhas gravações dos concertos de piano de aniversário com Andris Nelsons e a Orquestra Gewandhaus, Mariss Jansons e a Symphonieorchester des Bayerischen Rundfunks, Valery Gergiev e a Filarmônica de Munique, Christian Thielemann e a Staatskapelle Dresden e com Riccardo Muti e a Filarmônica de Viena.
Anton Diabelli não era apenas um editor, mas também um empresário muito astuto. O volume com as 50 variações impressas de sua valsa era algo como as paradas de sucesso de seu tempo, obras de superestrelas musicais que podiam ser tocadas nos salões. Uma estratégia de marketing engenhosa, que Beethoven, entretanto, evitou. Isso se deveu, por um lado, ao grande número de suas 33 variações, que ultrapassaram todos os limites, e, por outro, à sua (naquela época) pura impossibilidade de serem tocadas! Somente 30 anos após sua publicação é que o Op. 120 foi executado pela primeira vez pelo pianista e maestro Hans von Bülow e, mesmo depois disso, as Variações Diabelli, que Bülow chamou de “microcosmo do gênio de Beethoven”, continuaram a serem vistas como dificuldades.
Para mim, as Variações Diabelli são talvez a obra mais emocionante de Beethoven. Eles são música sobre música. Beethoven foi evidentemente inspirado pelas “Variações Goldberg” de Bach, mas também cita outros “deuses”, como Haydn ou Mozart, a quem dedica a 22ª variação com o tema do “Don Giovanni”. No final, Beethoven volta a si mesmo, citando sua última sonata, Op.111, na 33ª variação, e revelando sua genialidade ao desmontar uma simples valsa em suas partes estruturais para remontá-las em toda a sua complexidade à sua própria imagem. Você também poderia dizer: Beethoven come a valsa de Diabelli e a digere ante nossos ouvidos.
Isso por si só já seria notável; o que é, em última análise, um golpe de gênio é que Beethoven não conduz esse processo só pelo processo em si, mas usa as etapas das variações individuais para levantar um compêndio de questões humanas fundamentais e, com base nas variações, explorar a diversidade da natureza humana. Beethoven coloca cada elemento da valsa de Diabelli contra a luz da história da Música e conscientemente o atribui ao ideal de seu presente. Para mim, a 33ª variação entra em um estado em que minhas associações sobre Beethoven, sobre tocar piano e sobre as Variações Diabelli também evanescem em outras esferas.
Ficou claro para mim: meu projeto “Diabelli 2020” iria transpor uma lacuna do tempo, e uma nova gravação do ciclo Diabelli só faria sentido se pedisse a compositores contemporâneos que contribuíssem com uma variação sobre a valsa. Claro, hoje não pensamos mais regionalmente ou nacionalmente como Diabelli, mas sabemos que, em 2020, Beethoven já chegou ao nosso mundo global.
Estou orgulhoso da gama de compositores envolvidos neste projeto: da maravilhosa Lera Auerbach a Max Richter. Também estou encantado com a participação de Tan Dun, que eu, como cinéfilo, naturalmente admiro por sua música vencedora do Oscar para o clássico de cinema de Ang Lee “O Tigre e o Dragão”. Toshio Hosokawa, provavelmente o mais importante compositor contemporâneo do Japão, apresentou-me sua partitura após um concerto em seu país: caracteres japoneses escritos a lápis na página de rosto.
O australiano Brett Dean dedicou sua variação, e essa é uma grande honra para mim, “para RB com admiração” e abre com um con fuoco louco; Toshio Hosokawa batizou sua obra de “Perda”, começa com um Adagio sostenuto e então – como é sua marca registrada – passeia pelas paisagens sonoras de Diabelli com serenidade japonesa. Não importa o quão casualmente o compositor austríaco Johannes Maria Staud intitulou sua variação “A propos … de Diabelli” e pediu ao intérprete para tocar “suavemente e obstinadamente”: ele certamente me desafiou com sua notação extremamente criativa. Já para o maestro e compositor alemão Christian Jost, a valsa de Diabelli é uma inspiração para uma performance alegre, como pode ser visto no título “Rock it, Rudi!“, que realmente me inspirou enquanto a estudava. Brad Lubman também traça um arco através da história da música em sua “Variação para RB“, assim como o compositor francês Philippe Manoury, que programaticamente chama sua peça de “Dois Séculos Depois” e prepara o palco para o metrônomo (uma ferramenta que se tornou popular no tempo de Beethoven). Ele prescreve pelo menos 12 indicações metronômicas diferentes. O compositor russo Rodion Shchedrin começa sua variação quase improvisato, e o compositor e clarinetista Jörg Widmann explora traços característicos de Beethoven em sua variação detalhada e com várias partes – fiquei particularmente encantado quando encontrei o subtítulo “Boogie Woogie“, porque é música que também gosto de associar a Beethoven.
Muitas vezes me perguntam o que se passa em minha mente enquanto toco uma obra como as Variações Diabelli. Minha resposta é simples: não muito! O processo de pensar e se envolver com Beethoven deve ser concluído muito antes de a primeira nota ser tocada. Durante um concerto, Beethoven convida o pianista a se deixar levar. Não quero dizer nadar sem rumo nas ondas de som. Deixar-se flutuar com Beethoven exige saber onde se está o tempo todo, conhecer a navegação musical, o céu estrelado, os ventos e os pontos cardeais do cosmos de Beethoven.
Qualquer pessoa que tenha estudado a música para piano de Beethoven intensamente sabe que Beethoven conhecia-nos, pianistas, assustadoramente bem, e nossas fraquezas e impaciência quando se trata de obter efeitos baratos, tomar o tempo em nossas próprias mãos ou impressionar o público com um design dinâmico idiossincrático. Vamos considerar a 10ª variação: ela começa com as palavras sempre staccato, ma leggiermente. Então, Beethoven quer ouvir um staccato leve. Com a indicação dinâmica pp, ou seja, pianíssimo, ele descreve o nada de que se origina essa variação. Apenas oito compassos depois, ele já parece não confiar mais em nós. Só assim se pode explicar porque levanta o dedo e volta a escrever na partitura: sempre staccato e pianissimo. Como Beethoven não forneceu nenhuma nova marcação dinâmica até este ponto, não deveria ser preciso dizer que ainda estamos em pianíssimo no oitavo compasso. Mas Beethoven suspeita que a velocidade da variação, associada ao staccato, pode nos seduzir a tocar mais alto. Ele poderia ter escrito: ‘Caro pianista, mesmo que você queira tocar mais alto aqui, controle-se e fique em pianíssimo um pouco mais!’
Tudo isso só é revelado quando você compara as edições individuais, porque absurdamente, algumas editoras eliminaram essas duplicações da impressão como erros. É importante se manter próximo ao texto original de Beethoven. Porque quanto mais alguém está preparado para curvar sua própria vontade ante a vontade do compositor, mais certo é que atingirá o tom que Beethoven pretendia. Para encurtar a história: é tarde demais para começar a pensar antes de tocar a primeira nota das Variações Diabelli. No momento do concerto, o que importa é confiar em Beethoven e deixar-se levar pela enorme criatividade de suas variações”
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
Trinta e três variações em Dó maior para piano sobre uma valsa de Anton Diabelli, Op. 120 Compostas entre 1819–23 Publicadas em 1823 Dedicadas a Antonie Brentano
1 – Thema: Vivace
2 – Variation 1: Alla marcia maestoso
3 – Variation 2: Poco allegro
4 – Variation 3: L’istesso tempo
5 – Variation 4: Un poco più vivace
6 – Variation 5: Allegro vivace
7 – Variation 6: Allegro ma non troppo e serioso
8 – Variation 7: Un poco più allegro
9 – Variation 8: Poco vivace
10 – Variation 9: Allegro pesante e risoluto
11 – Variation 10: Presto
12 – Variation 11: Allegretto
13 – Variation 12: Un poco più moto
14 – Variation 13: Vivace
15 – Variation 14: Grave e maestoso
16 – Variation 15: Presto scherzando
17 – Variation 16: Allegro
18 – Variation 17: Allegro
19 – Variation 18: Poco moderato
20 – Variation 19: Presto
21 – Variation 20: Andante
22 – Variation 21: Allegro con brio – Meno allegro – Tempo primo
23 – Variation 22: Allegro molto, alla « Notte e giorno faticar » di Mozart
24 – Variation 23: Allegro assai
25 – Variation 24: Fughetta (Andante)
26 – Variation 25: Allegro
27 – Variation 26: (Piacevole)
28 – Variation 27: Vivace
29 – Variation 28: Allegro
30 – Variation 29: Adagio ma non troppo
31 – Variation 30: Andante, sempre cantabile
32 – Variation 31: Largo, molto espressivo
33 – Variation 32: Fuga: Allegro
34 – Variation 33: Tempo di Menuetto moderato
Lera AUERBACH (1973)
35 – Diabellical Waltz
Brett DEAN (1961)
36 – Variation For Rudi
Toshio HOSOKAWA (1955)
37 – Verlust
Christian JOST (1963)
38 – Rock It, Rudi!
Brad LUBMAN
39 – Variation For RB
Philippe MANOURY (1952)
40 – Zwei Jahrhunderte Später…
Max RICHTER (1966)
41 – Diabelli
Rodion Konstantinovich SHCHEDRIN (1932)
42 – Variation On A Theme Of Diabelli
Johannes MariaSTAUD (1974)
43 – À propos de… Diabelli
Tan DUN (1957)
44 – Blue Orchid
Jörg WIDMANN (1973)
45 – Diabelli-Variation
Da parte II da Vaterländischer Künstlerverein (“Associação Patriótica de Artistas”)
Johann Nepomuk HUMMEL (1778–1837)
46 – Variação XVI [Sem indicação de andamento]
Friedrich KALKBRENNER (1785–1849)
47 – Variação XVIII: Allegro non troppo
Apesar de suas ótimas orquestras, a Suécia tem apenas Berwald e Roman como bons compositores. Alfvén é romântico de dar nó nas tripas — mesmo tendo sua vida ativa no século XX — e os outros bons compositores escandinavos são noruegueses, finlandeses e dinamarqueses. Azar, né? Alfvén também é muito ufanista e nacionalista. Não é nada vulgar, mas também não é bom. Nasceu em Estocolmo, estudou no Conservatório de Música de 1887 a 1891, com o violino como seu principal instrumento. Tocou violino na Ópera Real de Estocolmo. Morreu em 1960 em Falun (Suécia), aos 88 anos. Foi também escritor e pintor. Sua música é ultrarromântica e, neste CD, a influência do folclore sueco está em primeiro plano nas cinco obras: nas três rapsódias suecas, na Lenda de Skerries e na Elegia. A Orquestra Sinfônica da Islândia, comandada por Petri Sakari, é exuberante. O som da Chandos é caloroso e todas as vozes da orquestra falam muito claramente.
Hugo Alfvén (1872-1960): Rapsódias Suecas – Uma lenda de Skerries – Elegia de ‘Rei Gustavo Adolfo II’ (Sakari)
1 Swedish Rhapsody No. 1, Op. 19 ‘Midsommarvaka’ 13:31
2 Swedish Rhapsody No. 2 , Op. 24 ‘Uppsalarapsodi’ 10:41
3 Swedish Rhapsody No. 3, Op. 47 ‘Dalarapsodi’ 21:51
4 A Legend Of The Skerries, Op. 20 18:23
5 Elegy From ‘King Gustav Adolf II’, Op. 49 5:31
Makar (plural: makaris): originalmente o nome dos bardos da corte real escocesa nos séculos XV e XVI, posteriormente atribuído aos gigantes literários do Iluminismo de Edinburgh no século XVIII, e hoje um termo para se referir a um menestrel ou poeta escocês”
A primeira viagem de Haydn a Londres, em 1791, rendeu-lhe um encontro com o editor William Napier, que tinha o plano de publicar coleções de canções escocesas arranjadas por grandes compositores do continente. Napier, claro, sonhava contar com Haydn, mas as dívidas em que chafurdava tornavam altamente improvável remunerar à altura o maior mestre vivo da nobre Arte. Ainda assim, devia ter a cara bastante dura, pois fez a proposta ao Mestre de Rohrau e, para sua surpresa, não só ela foi aceita, como Haydn declinou qualquer pagamento antecipado. Acabou por arranjar-lhe cento e cinquenta canções, que salvaram o editor da prisão por insolvência e abriram um rico filão.
Em Edinburgh, como já lhes contei noutra postagem, George Thomson resolveu explorar a vereda aberta por Napier, editando arranjos para voz e conjunto de câmara para numerosas canções de diversas nacionalidades. Para refinar as letras, em sua maioria em dialetos considerados chucros, Thomson contou com a valiosa assistência de seu amigo Robert Burns, o poeta nacional da Escócia. Para os arranjos, recrutou a crème de la crème da Música continental, incluindo o próprio Haydn e, como vimos há alguns meses, aquela fonte de enxaqueca de nome Beethoven. Entre bloqueios continentais napoleônicos e a genuína teimosia beethoveniana, o tráfico de música através da Mancha floresceu e rendeu algumas boas centenas de publicações, a maioria das quais hoje jaz em esquecimento.
Quando publiquei os arranjos de Beethoven, há alguns meses, vários leitores-ouvintes, ao manifestarem sua grata surpresa com o evidente zelo que o renano dedicou à tarefa, estranharam nas interpretações a falta de um sotaque mais apropriado às canções e suas origens que, se não de todo folclóricas, são por demais plebeias para que, na voz impostada de cantores líricos, não soem constritas.
Creio, pois, que esses leitores-ouvintes gostarão dessa gravação que ora lhes trago. Com exceção da primeira e da penúltima faixas, todas as outras foram adaptadas por notáveis compositores alemães e austríacos, e aqui aparecem em seus arranjos autênticos. O conjunto Makaris interpreta-as com um gracioso equilíbrio de precisão clássica e espontaneidade popular. A soprano Fiona Gillespie, que vem duma família com longa tradição em música celta, tem a voz sob medida para o repertório, e seu bonito timbre, aplicado a inflexões escocesas e livre de vibrato, garante o encanto do começo ao fim. Os demais músicos também são extraordinários, e o clima geral é de frescor e espontaneidade, como se estivéssemos a acompanhar o animado sarau de talentosos amigos. De lambujem, para alegria dos completistas compulsivos, duas premières mundiais (faixas 12 e 18), de versões preliminares de arranjos de Beethoven que nosso herói acabou por reescrever porque Thomson as achou difíceis demais para o seu público-alvo (o que o fez levar, como já lhes contei, um senhor sabão do mestre). Aos brasileiros, há a curiosidade do arranjo de Sigismund von Neukomm (faixa 11), que morou no Rio de Janeiro entre 1816 e 1821: por muitos anos atribuído a seu professor Haydn, sabe-se hoje que foi feito pelo então aluno.
Wisps in the Dell será um deleite aos ouvidos menos ortodoxos, e o belíssimo som dos Makaris fica fortemente recomendado para quem quiser começar o dia a sorrir – do que, sinceramente, estamos todos precisando demais.
MAKARIS: WISPS IN THE DELL
ANÔNIMO
1 – The Burning of Auchindoun (arranjo para vozes)
Carl Maria Friedrich Ernst Freiherr von WEBER (1786-1826)
2 – Canções populares escocesas – No. 4, True-hearted Was He, J. 298
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
3 – Canções irlandesas, WoO 152 – No. 14, Dermot & Shelah
Franz Joseph HAYDN (1732-1809)
4 – I Do Confess Thou Art Sae Fair, Hob.XXXIa:110
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
5 – Canções irlandesas, WoO 152 – No. 8, Come Draw We Round a Cheerful Ring
Franz Peter SCHUBERT (1797-1828)
6 – An Old Scottish Ballad, D. 923
Joseph HAYDN
7 – My Love She’s but a Lassie Yet, Hob.XXXIa:194
Ludwig van BEETHOVEN
8 – Vinte e cinco canções escocesas, Op. 108 – No. 2, Sunset
Ignaz Josef PLEYEL (1757-1831)
9 – Trinta e duas canções escocesas – No. 13, The Ewe Bughts, B. 719
Johann Nepomuk HUMMEL (1778-1837)
10 – Arranjos de canções escocesas para Thomson, S. 169: Jock o’ Hazeldean
Sigismund Ritter von NEUKOMM (1778-1858)
11 – Jenny Dang the Weaver, Hob.XXXIa:240 (atribuído anteriormente a Joseph Haydn)
Ludwig van BEETHOVEN 12 – On the Massacre of Glencoe, Hess 192 – PRIMEIRA GRAVAÇÃO
Carl Maria von WEBER 13 – Dez canções escocesas: No. 6, Pho Pox o’ This Nonsense, J. 300
Friedrich Daniel Rudolf KUHLAU (1786-1832)
Sete variações sobre uma canção escocesa, Op. 105
14 – Tema – Variação 1 – Variação 5 – Variação 6 – Variação 7
Joseph HAYDN 15 – My Boy Tammy, Hob.XXXIa:18
Ignaz PLEYEL
16 – Trinta e duas canções escocesas – No. 17, Sweet Annie, B. 723
Carl Maria von WEBER 17 – Dez canções escocesas: No. 1, The Soothing Shade of Gloaming, J. 295
Ludwig van BEETHOVEN
18 – Bonny Laddie, Highland Laddie, Hess 201 – PRIMEIRA GRAVAÇÃO
Ignaz PLEYEL
19 – Trinta e duas canções escocesas – No. 10, From Thee Eliza I Must Go, B. 716
Leopold KOŽELUH (1747-1818)
20 – Vinte canções escocesas, irlandesas e galesas, P. XXII:1 – Should Auld Acquaintance Be Forgot
Ganhei este disco de brinde em uma outra vida que tive e por vários Natais ele serviu de trilha sonora. Ele já tocou aqui em casa em dias que lá fora fazia muito frio e nevava. Depois, passou um tempo sumido entre as coisas que misteriosamente somem, por um tempo, da vida da gente. Quando chegaram as crianças, ele reapareceu e foi tocado em Natais nos quais fazia muito calor lá fora e dentro da casa.
A capa rachou, o folder soltou uma parte e as crianças o rabiscaram um pouco. Depois ele sumiu de novo. Quando aprendi a ripar CDs, eu (por sorte) o reencontrei e fiz uma cópia digital. Desta forma é que ele passou a ser ouvido. Hoje eu o ofereço para vocês, neste dia de Natal.
O CD é uma coleção promocional de músicas de Natal, coisa bem brega. Mas eu aposto que você vai gostar. Há 24 faixas, uma para cada hora do dia. Eu certamente tenho as minhas preferidas, entre elas Simple Gifts e (é claro) Silent Night. Depois me escreva dizendo quais são as suas…
A DDD Christmas
We Wish You a Merry Christmas (Trad. arr. John Rutter)
Here We Come a-Wassailing (Trad. arr. Robert Chilcott)
Marche des rois (Anon.)
The Babe of Bethlehem (Anon.)
Verbum caro – Y la Virgen (Anon.)
O Come, O Come, Emmanuel (Gregorian Chant arr. Alice Parker & Robert Shaw)
In dulci jubilo (Trad.)
O Come, All Ye Faithful (Trad. arr. David Wilcocks)
The Little Drummer Boy (Davis-Onorati-Simeone arr. John McCarthy)
The Gift (Simple Gifts) (Isaacs-Trad., arr. Robert Chilcott)
Quem pastores laudavere (Anon.)
Quanno nascete ninno (Anon.)
Messiah (Handel) – He shall feed His flock
– For unto us a Child is born
The First Nowell (Trad. arr. Frank Denson)
Joy to the World (Trad. arr. Frank Denson)
Deck the Hall (Trad. arr. Gordon Langford)
The Wexford Carol (Trad. arr. Robert Chilcott)
What Child Is This? (Trad. arr. Michael Gibson)
Away in a Manger (Trad. arr. Michael Gibson)
Rise Up, Shepherd (Trad. arr. Robert Sadin)
Bring a Torch, Jeanette, Isabella (Trad. arr. Joseph Flummerfelt)
Silent Night (Franz Gruber)
God Rest You Merry, Gentlemen (Trad. arr. David Willcocks)
1, 2, 9, 10, 17, 18 – The King’s Singers e City of London Sinfonia – Richard Hickox
I purchased this CD in the early 90’s and it has earned a place in my heart that no other cd has earned. The King’s Singers, Kathleen Battle, and others, provide a breadth of beauty from renditions from Handel’s Messiah, to English traditional Christmas music. This is no album featuring obnoxious Christmas music, which we hear blaring in countless stores in the season. It is an expression of true joy!
O Coro de Meninos de Viena é um coro de meninos sopranos e contraltos sediado em Viena, Áustria. É um dos corais de meninos mais conhecidos do mundo. Os meninos são selecionados principalmente da Áustria, mas também de muitos outros países. O coro é uma organização privada sem fins lucrativos. Existem aproximadamente 100 coristas com idades entre nove e quatorze anos. Cada grupo faz turnês por cerca de nove a onze semanas. Algumas peças incluem “Good Morning” e “Merry Christmas from Vienna Boys”.
Esta postagem é dedicada a todos os ouvintes que enfrentaram este difícil ano ao nosso lado, assim como é dedicada aos meus fiéis companheiros pequepianos que nunca desistem, numa clara demonstração de alta resiliência! Um Feliz Natal !! Paz e Saude !!
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Feliz Natal, apesar de tudo… ou especialmente por isso!
É Natal e eu vos ofereço outro Messias. Este oratório trata do nascimento de Cristo, depois falará sobre a morte – a redenção pelo sacrifício – e da Vitória do Messias sobre a morte. Termina com hino de louvores como uma torcida alegre pela vitória. De qualquer forma, é música ótima para se ouvir nestes dias.
Esta gravação é anterior ao movimento HIP, de uso de instrumentos antigos e práticas historicamente informadas. Raymond Leppard, que faleceu faz pouco mais do que um ano, era uma referência para música barroca. Gravava com a English Chamber Orchestra para os grandes selos, principalmente para a Philips, e sempre dispunha de ótimos cantores. Colaborou especialmente com Dame Janet Baker.
Esta gravação do Messias, agora que o movimento HIP já não é mais novidade e muitas de suas práticas foram incorporadas pelos outros grupos musicais, pode parecer um pouco lenta ou antiquada. Mas, na época em que foi lançada fazia um contraste enorme com as gravações de então, com coros e orquestras enormes e andamentos bem mais lentos ainda. Acho que esta gravação envelheceu graciosamente e tive muito prazer em ouvi-la novamente e preparar tudo para oferecê-la para vocês.
Handel compôs música para reis e rainhas de carne e osso e aqui oferece toda a sua experiência e talento para o Rei dos reis!
O Natal é a festa do nascimento de Deus, feito menino e depois homem. Ele fez isso para trazer uma mensagem que ainda hoje soa revolucionária – amar o próximo como a si mesmo. Nestes dias de tantas atribulações e sofrimentos, mesmo para os não religiosos, esta mensagem de amor pode trazer um recado atual e oferecer um momento de consolo e de conforto. Que traga também esperança para que tantos sacrifícios não sejam vãos e que possamos realmente renascer melhores destes dias.
A obra é muito conhecida e é possível que você já a tenha ouvido, mesmo que seja alguns trechos. De qualquer forma, enumero aqui alguns momentos que você não pode perder.
– Logo após a abertura, temos um recitativo – Comfort ye, my people, seguido da ária para tenor – Ev’ry valley shall be exalted, onde se anuncia a vinda do Deus-Menino. As frases ‘The voice of him, that crieth in the wilderness: Prepare the way of the Lord … … the crooked straight, and the rough places plain’ falam do Batista, que anuncia a chegada do Senhor. Os caminhos devem ser aplainados!!
– O Messias é uma obra na qual o coro é um dos protagonistas. Eu nunca deixo de me emocionar em diversos números corais e For unto us a child is born é um deles. Todos os nomes e títulos atribuídos ao Messias são declamados, terminando com o mais bonito de todos – o Príncipe da Paz.
– O nascimento de Cristo é geralmente associado à simplicidade e ao mundo de pastores e pessoas simples. Não é diferente aqui e Pifa – Pastoral, um número orquestral inicia uma sequência que trata exatamente de anjos e pastores.
– A primeira parte do oratório se encerra com o lindo coral His yoke is easy.
– A segunda parte trata do sofrimento de Cristo e a ária para contralto, He was despised and rejected of man! É bem forte. A letra inclui as impressionantes palavras ‘a man of sorrows and acquainted with grief’.
– Alguns números corais merecem atenção aqui. All we like sheep, nesta gravação ganha um acompanhamento de órgão, tocado por Leslie Pearson, para um efeito divertido, espalhando as ovelhinhas – gone astray – para todos os lados. He trusted in God e Lift up your heads também são bem inspiradores.
– A segunda parte se encerra com o mais famoso coral de todos, Hallelujah. Contagiante! Prepare a caixa de lenços…
A terceira parte do oratório é mais curta, mas não deixe de notar a ária para soprano, I know my Redeemer liveth, o recitativo e ária para baixo The trumpet shall sound e o dueto para tenor e contralto, O death, where is thy sting, permitindo assim que os solistas se despeçam da audiência. Todos estes números celebram a vitória do Messias sobre a morte. E tudo termina com dois corais, um seguido ao outro – Worthy is the Lamb e Amen!
George Frideric Handel (1685 – 1750)
Messiah
Felicity Palmer, soprano
Helen Watts, contralto
Ryland Davies, tenor
John Shirley-Quirk, baixo
English Chamber Orchestra & Choir
Raymond Leppard
Nos arquivos anexados você encontrará muitas informações sobre as faixas e tudo o mais, inclusive o libreto.
Jean-Philippe Rameau (1683-1764), um dos maiores compositores franceses de todos os tempos, foi contratado como organista por cerca de 30 anos em igrejas em Dijon, Avignon, Clermont-Ferrand, Lyon e Paris. É surpreendente que ele não tenha publicado uma única página de música para órgão, se destacando como compositor para o cravo e sobretudo em obras para o palco: óperas cômicas, tragédias e outros gêneros como ballet bouffon, pastorale héroïque…
Ainda assim, chegou até nossos tempos uma série de obras que testemunham sobre como era a arte do órgão francês nesses tempos contemporâneos de J.S. Bach, de Luís XIV (idoso) e de Luís XV.
As missas instrumentais de François Couperin (1668-1733) e as suítes de Louis-Nicolas Clérambault (1676-1749) e de Jean-François Dandrieu (c. 1682-1739) mostram como os organistas franceses costumavam compor cada movimento de forma muito idiomática para registros como plein jeu (pleno – aquele som mais grandiloquente de órgão), basse de trompette (baixo de trompete), flûtes (flautas), basse de cromorne (baixo de cromorno, um instrumento com palheta, semelhante ao oboé, típico do renascimento).
Dandrieu também é famoso por seus Noëls, obras para o Natal, publicadas postumamente em 1759 e que ainda hoje são ouvidos em dezembro em algumas igrejas francesas. Baseados em canções populares, eles também utilizam amplamente o colorido instrumental do órgão em variações curtas e frequentemente de um caráter pastoral, que combina com a festa do Natal.
J.F. Dandrieu – Pieces d’orgue, Noëls
1. Noël – “Une bergère jolie”
2. Suite en ré mineur: Plein jeu, Fugue sur Ave Maris Stella, Duo, Trio, Basse de trompette, Flûtes, Basse de cromorne, Offertoire
3. Noël – “Chantons de voix hautaine”
4. Suite en sol: Offertoire, Fugue, Cromorne en taille, Récit de Nazard, Tierce en taille, Basse de cromorne, Dialogue
5. Noël – “Chantons je vous prie”
6. Suite en La: Plein jeu, Duo, Fugue, Basse et dessus de trompette, Musette, Dialogue
7. Noël – “Or nous dites Marie”
8. Suite en ré majeur: Plein jeu, Trio, Duo sur la trompette, Trio avec la pédale, Flûtes, Duo en cors de chasse sur la trompette
9. Noël – “Joseph est bien marié”
André Isoir – organista
Órgão de Saint-Michel-en-Thiérarche (construído em 1714)
A Missa de Pergolesi é uma obra de exuberante fantasia. A de Scarlatti é uma obra de beleza e mistério insondáveis. Se eu tivesse que escolher uma peça de Alessandro Scarlatti para dar provas de sua estatura como compositor no mesmo nível de Vivaldi e Handel, ficaria entre Il Primo Omicidio e esta Messa per il Natale.
Alessandro Scarlatti (1660-1725) compôs apenas dez missas. O conservadorismo litúrgico de sua época evitou a moda das massas inovadoras, postas de lado pelas formas quase operísticas da cantata e do oratório, nas quais Scarlatti se destacou. Por volta de 1707, no entanto, em razão dos gosto dos patrões de Scarlatti, especialmente os cardeais da Academia Arcadiana, Scarlatti mudou para uma espécie de simplicidade pastoral, estilo que aperfeiçoou em sua Cantata per la Notte di Natale de 1705. Em 1707, no entanto, Scarlatti já era ‘maestro di capella’ — capo di all capo, por assim dizer — na basílica de Santa Maria Maggiore em Roma. Como tal, ele poderia escrever o que quisesse, e é claro que o que ele queria uma obra que exibisse toda sua habilidade em polifonia e inovação harmônica,
A missa de Natal de Scarlatti foi uma dessas composições, escrita para coros totalmente independentes, mais dois violinos obligatti que embelezam a polifonia independentemente de qualquer coro. O clima dessa missa é serenamente comemorativo — uma música como a que um coro de anjos poderia ter cantado. Mesmo o Agnus Dei é menos um apelo por misericórdia do que uma canção de afeto para o Santo Menino. O tratamento de Scarlatti do espaço acústico entre os dois coros é espetacular; certifique-se de configurar seu sistema de som para maximizar a separação e sentar-se com atenção entre os alto-falantes, balançando a cabeça para a esquerda e para a direita como se estivesse assistindo a uma partida de tênis.
Giovanni Battista Pergolesi (1710-1736) foi contratado para escrever sua Missa pelos padres da cidade de Nápoles, após o terrível terremoto em 1731, para solicitar a atenção de Santo Emigdius, “para que ele pudesse protegê-los de tais flagelos no futuro, fazendo intercessão com Deus”. Aparentemente, os terremotos têm o poder de inspirar uma criatividade bizarra na música; a missa do terremoto de 12 vozes de Antoine Brumel vem à mente, além desta fantasticamente colorida ‘missa breve’ de Pergolesi, em que o Kyrie dura apenas 4 minutos, mas o Gloria representa as maravilhas da natureza por 24 minutos completos. Este também é um trabalho cheio de artifícios acústicos espaciais, com fragmentos de música e texto explodindo à esquerda e à direita e, aparentemente acima, atrás, abaixo e dentro de seus ouvidos. Os patronos devem ter ficado encantados com ele, já que o trabalho foi apresentado três vezes, cada uma com orquestras maiores. Posteriormente, a Missa foi apresentada anualmente em setembro em Nápoles e em Roma — “com todos os músicos e violinistas de Roma”, segundo um memorialista contemporâneo — em homenagem a São João Nepomuceno, o santo favorito dos Habsburgos.
Pergolesi viveu apenas 26 anos, o que o tornou uma perda precoce para a música tão trágica quanto Mozart. Esta missa e seu famoso Stabat Mater são músicas de suprema arte e beleza.
O Concerto Italiano, liderado por Rinaldo Alessandrini, canta e toca essas duas músicas incríveis da maneira que merecem. Isso é um grande elogio. O CD mereceu o Diapason d`Or.
—-> ATENÇÃO: No nome do arquivo está Palestrina em vez de Pergolesi. Mas é Pergolesi, tá? Tive um surtinho de Alzheimer, só isso.
.oOo.
Giovanni Battista Pergolesi: Messa Romana / Alessandro Scarlatti: Messa per il Natale
Messa Di S. Emidio (Missa Romana)
Composed By – Giovanni Battista Pergolesi
1 I. Kyrie Eleison 0:41
2 II. Christe Eleison 2:41
3 III. Kyrie Eleison 0:58
4 IV. Gloria In Excelsis Deo 2:35
5 V. Laudamus Te 2:00
6 VI. Gratias Agimus Tibi 3:55
7 VII. Dominus Deus 4:07
8 VIII. Qui Tollis Peccata Mundi 2:30
9 IX. Qui Tollis Peccata Mundi 4:07
10 X. Qui Sedes Ad Dexteram Patris 2:28
11 XI. Quoniam Tu Solus Sanctus 1:59
12 XII. Cum Sancto Spirito 2:33
Messa Per Il Santissimo Natale
Composed By – Alessandro Scarlatti
13 I. Kyrie eleison 4:08
14 II. Gloria In Excelsis Deo 10:30
15 III. Credo 7:38
16 IV. Sanctus 1:10
17 V. Agnus Dei 4:28
Conductor – Rinaldo Alessandrini
Orchestra, Choir – Concerto Italiano
TRE: la prima opera
O retorno do casal Giuseppe e Margherita para Busseto, certamente marcou um período de agitação particular, a cidade e os recursos eram muito aquém das pretensões do compositor. Os dois jovens disseram com firmeza para o papa Barezzi que eles queriam se mudar definitivamente para Milão. Margherita deve ter sido muito firme com os pais. Afinal, a jovem já fazia algum tempo declarou publicamente que seu Giuseppe pretendia seguir uma carreira teatral. Papa Barezzi deve ter engolido a decisão “de atravessado” e com relutância esta decisão, mas afinal o futuro que tanto sonhara para Verdi não poderia ser interrompido quando começou a se tornar realidade. Quanto para Verdi devemos acreditar que em Milão recebeu por sua vez, se não garantias, pelo menos promessas sérias de que seu trabalho iria ao palco do La Scala ainda na próxima temporada. Dignamente Verdi redigiu uma carta de demissão, arrependimento sincero, até um pouco de ironia pelo seu parco salário. Ele não recebeu uma boa resposta dos conterrâneos, quase que eles conseguiram que ele ficasse por “gratidão” aos anos de estudo subsidiados pela Sociedade Filarmônica e por alguns amigos. Eles surgem desses exageros possessivos, depois de anos Verdi mesmo em idade madura, famoso e livre, continuou ouvindo as fofocas de alguns conterrâneos sobre ele no condado de Busseto, foram poucos mais ruidosos, afinal Verdi tinha família e amigos em Busseto e assim permaneceram por muito tempo.
Por fim a pequena família, Giuseppe, Margherita e Icilio, pusram o pé na estrada e partiram para a grande Milão em 6 de fevereiro de 1839. Em Milão, Verdi trabalhou muito para colocar preto no branco seu propósito no importante acordo de elaborar uma nova ópera. Não tendo ainda contrato, o dinheiro ficou escasso. Ele tinha trazido a pontuação completa e partes separadas dos cantores; não sabemos se ele já havia esboçado a partitura orquestral, mas é improvável, porque este trabalho foi feito quando os ensaios começaram. Além disso, o trabalho precisava de retoques: antes de tudo o libreto teve que ser refeito, e, portanto, também certas cenas. Aparentemente as mudanças tinham sido sugeridas pelo grande cérebro de toda a operação, o empresário
Merelli. A questão mais importante foi o libreto, a revisão e transformação foi confiada para um poeta, músico e romancista Temistocles Solera (o primeiro libretista de Verdi). Começando as alterações pelo nome da ópera que agora se chamaria “Oberto [conte] di S.Bonifacio” ainda foi ajustado e ampliado por Solera sobre um libreto intitulado “Lord Hamilton” de Antonio Piazza. Mas, além das qualidades de escrita e do conhecimento do ofício melodramático, Solera era um personagem do teatro e um ótimo contador de histórias reconhecido até hoje, tinha ótimo prestígio e trabalhava como uma espécie de “libretista residente” do La Scala.
Libreto revisado, “Oberto, Conde de San Bonifacio” entrou na fase definitiva depois do dia 20 de abril com o começo dos ensaios. Na companhia de canto havia grandes nomes que vão voltar fatalmente na biografia de Verdi: o barítono Giorgio Ronconi, o tenor Napoleone Moriani e a soprano Giuseppina Strepponi. Moriani, era o astro da época “il tenore della bella morte” (no palco), uma estrela para o público feminino, parece que ele era o amante da soprano e pai de seus dois filhos. Moriani adoeceu durante os ensaios, e uma recomendação de Strepponi ao empresário Merelli para que o trabalho fosse adiado. No entanto Verdi dependia dos rendimentos da bilheteria, novamente passou por um período difícil. Em setembro, foi obrigado a encontrar moradia em apartamentos populares na Via San Simone (hoje Cesare Currents) para não ter que pagar mais o aluguel , escreve ao sogro pedindo ajuda financeira para poderem viver até que o teatro lhe pagasse pela ópera.
Finalmente a primeira ópera de Verdi fez sua estreia no La Scala dia 17 de novembro de 1839 com outros cantores. Parentes e amigos vieram de Busseto: o sogro Barezzi e filho Giovanni, além de Finola, com um grupo de músicos da filarmônica. Porém sua amada esposa não teve forças para ir ao concerto, por outro infortúnio cruel que atingira o casal no mês anterior. O pequeno Icilio estava morto. Verdi e seu cunhado Giovanni correram até ela durante o intervalo para relatar o resultado, que foi “muito bom”, embora não “excelente”, por fim a ópera foi bem aceita e repetida treze vezes. Ricordi comprou os direitos da partitura por 2.000 liras austríacas, Merelli ofereceu ao novato um contrato para mais três obras a serem produzidas, uma a cada oito meses, por um contrato de 4.000 liras austríacas cada uma, e mais a ser obtido com a venda de partituras.
Embora Verdi tivesse 26 anos quando “Oberto” foi ao palco pela primeira vez, a ópera é, de certa forma, um trabalho de aprendiz. Algumas das peças líricas têm uma soltura formal reminiscente de Bellini e claramente, com Rossini, a principal influência estilística. Os jovens compositores mergulhavam no que ficou conhecido como o “Código de Rossini” – Rossini dominou o repertório da década de 1820 ele elaborou uma matriz de padrões formais que iria influenciar as várias décadas seguintes na Itália. Essa fórmula, ou código, evitava aventuras frustrantes e agradava bastante às plateias. A ária solista, principal elemento, era composta tipicamente por um recitativo introdutório seguido por três movimentos: (1) um movimento lírico, em geral de andamento lento e com frequência chamado de “cantabile”; (2) uma passagem movimentada de ligação, estimulada por algum acontecimento em cena e chamada de “tempo di mezzo”; e (3) uma “cabaletta” de conclusão, geralmente mais rápida do que o primeiro movimento e exigindo agilidade por parte do cantor. O foco era a canção, as áreas, e não a orquestração complexa – por outro lado, o jovem Verdi mostra que há fortes indícios do seu futuro: uma poderosa escrita em uníssono para o refrão, em algumas peças de conjunto dramaticamente marcantes e, talvez acima de tudo, na impetuosa vitalidade rítmica de muitos episódios. O movimento Adagio do quarteto do Ato 2, ‘La vergogna’, provavelmente a última peça a ser escrita antes da estreia, é em muitos aspectos o mais impressionante. Embora, como em outras partes da ópera, o cromático ousado da abertura seja bastante instável, o controle em grande escala do ritmo musical oferece um testemunho convincente do que seria o ponto forte do jovem Verdi. No entanto, apesar de tais sucessos na época, é improvável que “Oberto” se torne algo mais do que uma curiosidade ocasional no repertório operístico, é bem pouco representado hoje nas grandes casas de ópera.
A ação da primeira ópera de Verdi se passa em 1228 no norte da Itália em Bassano. Já no primeiro trabalho Verdi empatou com Oberto um personagem típico de seu mundo operístico, isto é a figura do pai, que terá seu ápice em “Rigoletto”. Aqui também, como em “Rigoletto”, Oberto é o pai que tem como função defender a reputação familiar, um defensor a todo custo. A tragédia é baseado somente neste elemento; o outro, que seria previsível, ou seja, a rivalidade entre duas mulheres por culpa do mesmo homem, não ocorre, uma vez que Cuniza e Leonora vão se tornar freiras. E se isso é nobre do ponto de vista humana, não “orna” em peças teatrais da primeira metade do século XIX, onde principalmente as paixões são desencadeadas em dramalhões. Por outro lado, todo o trabalho é formado em linhas diretas e claras, brevidade e síntese com base na prevalência da melodia e ritmo. Até a orquestração, bastante simplificada é funcional. Verdi oferece muita música boa para acompanhar um libreto que contém romance, infidelidade e vingança violenta, todos ingredientes atraentes no mundo da ópera. “Oberto” teve uma gestação longa e frustrante, mas como vimos os acontecimentos na vida pessoal do compositor pouco antes de sua encenação foram mais do que provadores: os dois filhos de Verdi morreram, o primeiro em agosto de 1838, o segundo apenas um mês antes da estreia de 17 de novembro de 1839. A resposta geralmente positiva à ópera tanto da crítica quanto do público, entretanto, ofereceu pelo menos algum consolo ao desolado Verdi.
O Enredo Oberto, conte di San Bonifacio.
Dramma em dois atos de giuseppe Verdi a um libreto de antonio Piazza e temistocle Solera;
Estréia: Milão, Teatro alla Scala, 17 de novembro de 1839.
Norte da Itália, século XIII.
1º ato, Cena 1
Linda paisagem perto do castelo de Bassano: cavaleiros, damas da corte e vassalos vêm cumprimentar Riccardo. De seu casamento iminente com a princesa Cuniza, a irmã Ezzelinos, esperava-se a paz (Coro d’introduzione, “Di vermiglia, amabil luce”). Para Riccardo, a conexão com Cuniza também significa maior poder, que ele gostaria de usar para derrubar seus inimigos (Cavatina, “Son fra voi! -Gia sorto e il giorno”). Leonora, que foi abandonada por Riccardo apesar de uma promessa de casamento, se aproxima de Bassano para se vingar dele (Cavatina, “Sotto il paterno tetto”). Seu pai Oberto, que acusa Leonora de profanar sua honra, também voltou pelo mesmo motivo (Scena e duetto, “Guardami! -Sul mio ciglio”). Cena 2
Esplêndido salão no palácio Ezzelinos em Bassano: cortesãos cumprimentam a noiva Cuniza (Coro, “Fidanzata avventurosa”), que Riccardo revela que um estranho medo se mistura com sua alegria. Ele consegue dissipar suas preocupações (Scena e duetto, “Il pensier d’un amore felice”). Enquanto isso, Leonora e Oberto chegaram secretamente ao castelo. Leonora revela a Cuniza que Riccardo jurou seu amor eterno. Cuniza, que agora também quer se vingar de Riccardo, implora a Oberto que controle sua raiva para não se colocar em perigo (Scena e terzetto, “Su quella, fronte impressa”). Quando confrontado no tribunal, Riccardo afirma que Leonora o traiu. Oberto então o desafia para um duelo (Finale primo, “A me gli amici! Mira!”).
2º ato, Cena 1
Quarto de Cuniza: damas da corte lamentam a infeliz Cuniza. Ela determina que o perjurado Riccardo volte para Léonora (Coro, scena ed ária, “Oh, chi torna I’ardente pensiero”). Cena 2
Um lugar remoto perto dos jardins do palácio: cavaleiros cantam (Coro di cavalieri, “Dov’e l’astro ehe nel cielo”). Oberto espera Riccardo para um duelo (Scena ed aria, “L’orror del tradi-mento”), mas Riccardo se recusa a lutar com o velho e só desembainha sua espada após as provocações excessivas de Oberto. Cuniza ainda impede o duelo e exige que Riccardo se case com Leonora. Este se submete, mas ao mesmo tempo organiza secretamente outro duelo com Oberto para defender sua honra (Scena e quartetto, “La vergogna ed il di-spetto”). Os cavaleiros duvidam que a briga entre Oberto e Riccardo tenha acabado, e de fato eles ouvem de repente o choque de espadas na floresta (Secondo coro di cavalieri, “Li vedeste. Ah si! La mano”). Riccardo aparece com a espada ensanguentada na mão e, enquanto o gemido de Oberto mortalmente ferido pode ser ouvido ao fundo, implora perdão a Deus (Romanza, “Ciel ehe feci! … Di quel sangue …”). Enquanto isso, Cuniza procura em vão por Riccardo e Oberto quando a sociedade da corte traz a ela a notícia do resultado fatal do duelo. Um pouco mais tarde, a horrorizada Leonora, que se culpa pela morte de seu pai, é trazida (Scena ed adagio, “Vieni, o misera, cresciuta”). Embora Riccardo peça perdão a ela em uma carta e dê-lhe seus bens, ela quer passar o resto de sua vida no mosteiro (Scena e rondo finale, “Cela il foglio insanguinato”).
Cai o pano
Personagens e intérpretes.
Esta é uma gravação muito boa e animada que merece destaque. Samuel Ramey está no auge sua voz tem uma sonoridade que este mero admirador acha soberba, como de fato todos os outros protagonistas, e a condução de Marriner é rápida e firmemente controlada. Se você ainda não conhece essa ópera, recomendo fortemente esta gravação como uma excelente introdução. Comprei esta gravação para completar minha
coleção “Verdi” no início do século. Esta gravação deixará os amigos fascinados por esta primeira ópera de Verdi. Às vezes temos a sensação de que estamos ouvindo Donizetti ou Rossini ou seja o jovem Verdi estava se entrosando ainda com o “código Rossini”. Na primeira parte há um grande dueto entre Samuel Ramey e Maria Guleghina. A música e o canto lembram muito o “Nabucco”. A música em Oberto é maravilhosa, ária segue ária bem dinâmicas. Existem duetos maravilhosos. É uma música muito colorida e melodiosa. A abertura e o final da ópera merecem menção especial. A ópera termina com uma linda ária de soprano de Maria Guleghina e, em seguida, um maravilhoso dueto entre tenor e soprano. Adoro a Maria Guleghina que interpreta um Verdi magnífico, claro e luminoso. É um prazer ouvir sua bela voz. Violetta Urmana é igualmente excelente e tem um mezzo quente adorável. Neill também está fantástico. No conjunto são cantores ótimos com lindas vozes e dão a seus papéis o adequado perfil que impressiona muito bem quem nunca ouviu esta obra, um elenco de alta qualidade que merece ser ouvido.
Tenho certeza de que os amigos do blog e de Verdi irão apreciar. Sobem as cortinas desfrutem desta primeira ópera do mestre Verdi !
Oberto – Samuel Ramey Leonora – Maria Guleghina Cuniza – Violeta Urmana Riccardo – Stuart Neill Imelda – Sara Fulgoni
Academy of St Martin in the Fields, London Voices Sir Neville Marriner
Recording Venue: St. John’s Smith Square, London in 15-08-1996
Em março de 2012 o pianista Jeremy Denk escreveu um artigo intitulado ‘Porque Eu Odeio As Variações Goldberg’ – ‘Why I Hate The Goldberg Variations’.
Ele inicia o artigo dizendo que a melhor razão para odiar as Variações Goldberg – além da óbvia razão de todo o mundo perguntar o tempo todo qual das duas gravações do Glenn Gould você prefere – é que todo o mundo ama as variações. Eu muito me simpatizei com o Jeremy. Eu também tenho assim uma certa tendência a evitar, a enfastiar daquilo que todo o mundo ama, especialmente em música. Até hoje não vi ‘A Casa de Papel’…
E como ele observou, não há uma semana que passe sem que uma nova gravação das tais variações surja seguida de comentários e críticas. O próprio Jeremy Denk se rendeu e gravou a obra e naquele período produziu alguns conteúdos para a NPR – National Public Radio, o serviço público de rádio americano. No artigo de Denk, que você pode ler aqui, ele explica as razões pelas quais claramente a série de variações sobre a tal ária estão fadadas ao fracasso: 80 minutos de música essencialmente em sol maior! Teria sido este o desafio para o mestre maior da composição, fazer com que amemos algo impensável?
Eu mesmo já postei uma gravação feita pela Zhu Xiao-Mei, que fez outra gravação posteriormente. Angela Hewitt também gravou duas vezes as VG para a Hyperion, o mesmo selo da gravação desta postagem. Um famosíssimo pianista asiático (excelente pianista, mas talvez um pouco midiático) acaba de lançar uma… na verdade, duas gravações das Goldberg – uma feita em estúdio e outra feita ao vivo.
Assim, quando um pianista se senta para gravar mais uma interpretação destas multivariadas peças, precisa estar certo de ter algo a dizer, mas sem cair em truques de ser diferente apenas. E se o artista é jovem, o desafio é ainda maior.
Na minha opinião (e na de alguns críticos que consegui ler), Pavel Kolesnikov venceu todas as armadilhas e apresentou uma gravação que prima pela simplicidade, mas também com bastante personalidade.
O que me chamou a atenção de imediato foi o som do disco. O piano é moderno (ele escolheu um piano da Yamaha, está lá no livreto) mas produz um som macio, aveludado, que empresta uma boa dose de intimidade à música que, afinal, foi composta para embalar as horas insones de um conde. Basta dizer que a excelente produção estava a cargo de Andrew Keener, um bamba dos estúdios.
Outro fator que acredito tenha contribuído para o sucesso desta beleza de disco está na maneira como Pavel incorporou a peça a seu repertório. Ele teria se esquivado da música de Bach até ser convidado a colaborar com a coreógrafa e dançarina Anne Theresa De Keersmaeker num projeto que usa as Variações Goldberg. O resultado desta colaboração (de 2018) resultou em uma série de espetáculos nos quais Anne Theresa dançava enquanto Pavel tocava ao vivo as Goldberg. Creio que esta aproximação com a dança certamente acrescentou uma outra dimensão à preparação deste disco e sugiro a você imediata investigação. Ouça a Variação 26, logo depois da Pérola Negra. Veja como o intérprete inicia sutilmente e como as duas vozes, a mais alta primeiro e logo depois a mais grave se perseguem e se buscam até o final. Eu gostei muito. Ouça e depois diga lá se o meu entusiasmo todo se justifica. Não deixe de ouvir também as Variações 11, 14, 16 e 23….
Kolesnikov’s Goldbergs are softly spoken, but they are also extraordinarily eloquent.
Produced by Andrew Keener, I regard this Hyperion issue as significant—with a strong claim equally on the dedicated Goldberg collector and the listener feeling his/her way through this monumental masterpiece.
… but my new favourite arrived this week from pianist Pavel Kolesnikov … in some ways I think it’s the antithesis of Lang Lang’s Goldbergs—a different kind of introspection, a natural rather than forced intimacy, ornamentation that’s delicately applied and feels organic, and a hushed, gentle pianism that draws you effortlessly inside the music and Bach’s imagination …
Há exatos 212 anos [grato, Daniel!], acontecia em Viena um mastodôntico concerto de mais de quatro horas de duração, sob temperaturas polares e com resultado artístico pífio. A precariedade da execução das várias obras, quase todas inéditas, acabou amplamente execrada, a despeito da grande reputação do compositor de todas elas – que, aliás, também atuou como pianista e regente.
O compositor-pianista, claro, era Beethoven, e a compilação de tantas obras icônicas estreadas numa mesma ocasião fez com que o concerto, mesmo desastroso, seja lembrado até hoje. E, como estamos terminando o ano do jubileu de nosso herói, resolvi aproveitar o 22 de dezembro para apresentar-lhes o repertório do célebre naufrágio e relembrar as circunstâncias em que ele aconteceu.
ooOoo
Naquela Viena do começo do século XIX, Akademie era o nome dado ao que hoje chamamos de concerto sinfônico. As Akademien eram oferecidas a um público pagante e anônimo, e seu lucro revertia para um beneficiário específico, normalmente o próprio compositor. Apesar da ideia ser muito atraente aos músicos, essas ocasiões acabavam por ser infrequentes. Os ingressos eram caros e estavam ao alcance apenas da aristocracia e parte da pequena burguesia, mas o maior problema, pelo menos em Viena, era conseguir um teatro. A alta temporada artística, que correspondia ao outono e ao inverno, era preenchida pelas lucrativas encenações de óperas. No verão, o público em potencial fugia da escaldante capital para os Alpes, de modo que as poucas datas disponíveis para Akademien eram a Quaresma e o Advento, quando a encenação de óperas era proibida. Ainda assim, como eram poucos os teatros em condições de receber músicos e público bastantes para que o evento se pagasse, garantir uma data requeria uma boa dose de habilidade política. No caso de Beethoven, péssimo político e horroroso negociador, o processo era bem mais trabalhoso e normalmente envolvia a cessão de suas obras (muitas das quais, como sabemos, ele resgatava do passado e recauchutava às pressas) para concertos beneficentes.
Os problemas em organizar uma Akademie não paravam por aí: era necessário preparar o repertório, granjear músicos e conduzir os ensaios. Como as datas eram poucas, e as oportunidades, muito disputadas, acabava havendo um pregão encarniçado pelos músicos. Ao garantir o Theater an der Wien para sua Akademie em 22 de dezembro de 1808, Beethoven teve o azar de seus planos colidirem com a de outro músico famoso: o Kapellmeister Antonio Salieri, que fora seu professor e organizava os concertos da Tonkünstler-Societät (“Sociedade de Músicos”). O italiano faria uma Akademie beneficente naquela mesma data, em prol das viúvas e dos órfãos dos membros da Sociedade, e, pior ainda, ameaçou dela banir os músicos que tocassem para Beethoven.
É fácil imaginar que muitos dos músicos que Ludwig arregimentou não eram de primeira linha, o que, somado ao pouco tempo de ensaios, acarretava um risco considerável de que a qualidade artística fosse para o brejo. Para complicar ainda mais, Beethoven estrearia obras que são complexas mesmo para as orquestras estáveis e profissionais de nossos tempos, e traçara um ambicioso plano de apresentar orquestra, coro e pianista (ele próprio), para depois reuni-los todos num apoteótico grand finale.
Para variar, o sempre desorganizado gênio da Música e da Procrastinação atrapalhou-se com os prazos. As partituras para os músicos tiveram que ser copiadas às pressas, e uma boa parte delas ficou pronta só na tarde da apresentação. O maior problema estava no tal grand finale, que foi estreado inacabado, tendo o compositor-pianista que improvisar as partes que faltavam. Não obstante, e com a corda simbólica no pescoço apertando, fez publicar no Wiener Zeitung o seguinte anúncio:
GRANDE AKADEMIE NO THEATER AN DER WIEN
(…)
por Herr v. Beethoven
(…)
em benefício do próprio Herr v. Beethoven
(…)
Todas as peças são (…) inteiramente novas, e ainda não ouvidas em público.
Primeira parte:
1. Uma sinfonia, intitulada ‘Reminiscências da Vida no Campo’, em Fá maior
2. Ária.
3. Hino com texto latino, composto no estilo eclesiástico com coro e solos.
4. Concerto para piano tocado por ele mesmo.
Segunda parte:
1. Grande Sinfonia em Dó menor
2. Sanctus, com texto em latim, no estilo de igreja, com coro e solos.
3. Fantasia apenas para piano.
4. Fantasia para pianoforte que termina com a entrada gradual de toda a orquestra e a introdução de coros como finale”
A publicidade, como o leitor-ouvinte mais atento já percebeu, era ligeiramente enganosa. “Ah! perfido” já tinha sido estreada em Leipzig doze anos antes, e o “Hino” (Gloria) e o Sanctus, partes da Missa em Dó maior, tinham recebido sua primeira audição na propriedade de seu encomendante, o príncipe Esterházy, no ano anterior. A descrição um tanto elusiva das peças sacras foi provavelmente proposital, pois a execução de música litúrgica em contextos seculares era normalmente proibida na carolíssima Viena.
Os apressados ensaios, claro, foram permeados pelo caos. Consta que Beethoven enfezou-se de tal maneira com a soprano solista, Frau Milder, que esta lhe deu um adiós para siempre e o obrigou a recrutar à penúltima hora uma inexperiente jovem de 17 anos. Não que isso tivesse sido decisivo: nosso irascível herói brigou com diversos instrumentistas e cantores, e há relatos de que eles se recusaram a ensaiar sob seu comando. Se algum regente alternativo foi recrutado, não sabemos, embora isso seja improvável, tanto pela personalidade de Beethoven, que não admitiria comandos de outrem, quanto porque não era a praxe, na época, dispor de um músico exclusivamente dedicado à condução da obra durante as performances. Assim, podemos presumir que os ensaios duraram apenas o bastante para que a famosa cólera renana irrompesse e os músicos ficassem tiriricas com o cidadão cujas obras tentariam interpretar.
O concerto começou às 18h30 duma quinta-feira (thanks, Mr. Google), que foi provavelmente o dia mais frio do ano na capital imperial. Ela abriu com a sinfonia “Pastoral”, que curiosamente foi apresentada antes de sua gêmea bivitelina, a Quinta. Isso levou os contemporâneos, por muito tempo, a considerá-la como a quinta, e não a sexta sinfonia de Beethoven. Seguiram-se a ária e cena “Ah! perfido”, com a tal mocinha de 17 anos que, por todos relatos, estava apavorada e não conseguiu projetar a voz. Depois, o Gloria da Missa em Dó e, para arrematar a primeira parte, o concerto em Sol maior, com o compositor como solista.
Beethoven tinha, na época, firmemente consolidada a reputação de melhor pianista de seu tempo, seguido de perto talvez só por Hummel, então era natural que o público esperasse muito dele quando se sentou ao teclado. O longo rol de falhas, no entanto, logo descambaria para o pastelão. Segundo o compositor Ignaz von Seyfried, um dos que pagaram para congelar no An der Wien naquela noite, ocorreu o seguinte:
… esquecendo que era solista, [Beethoven] começou a pular para cima e para baixo e a reger de sua própria maneira peculiar. No primeiro sforzando, ele arremessou seus braços para os lados tão amplamente que derrubou ambas as lamparinas do piano. A plateia gargalhou, e Beethoven ficou tão descontrolado que parou a orquestra e a fez começar de novo. Dois meninos do coro seguravam as lâmpadas, dessa vez. Quando o sforzando fatal irrompeu, um dos meninos recebeu um tapa tão forte da mão direita de Beethoven que, aterrorizado, derrubou a lamparina no chão. O outro menino conseguiu evitar a pancada esquivando-se a tempo. Se a plateia rira da primeira vez, ela agora divertia-se numa verdadeira balbúrdia bacanalesca. Beethoven enfureceu-se de tal maneira que, quando tocou o primeiro acorde do solo, quebrou seis cordas do piano”
[sempre que leio essa descrição, imagino Beethoven regesse como Friedrich Gulda – sem, claro, o elaborado visual que foi carinhosamente descrito por um crítico como “um gigolô sérvio”]
Veio o intervalo, que deve ter permitido à plateia parar de rir e congelar em silêncio. Na volta, nada menos que a Quinta Sinfonia, uma obra icônica que, infelizmente, acabou oferecida a um público já em extremo desconforto. Apesar de conhecida, entre tantas outras coisas, por marcar a estreia dos trombones na orquestra sinfônica, quando ela foi de fato ouvida os trombones já tinham estreado… na sinfonia “Pastoral”, uma hora e meia antes! Após outro trecho – o Sanctus – da Missa em Dó, Beethoven voltou ao piano para improvisar. Sua capacidade de improvisação era ainda mais reconhecida do que a de pianista, então suponho que ela tenha ajudado a mitigar um pouco da pilha de papelões até então acumulados. Embora não se tenha certeza, a descrição de algumas testemunhas – que deram conta de uma melodia cantável entremeada por repetidas escalas descendentes – faz pensar que Beethoven tenha tocado algo parecido com a sua Fantasia para piano, Op. 77, que tem um caráter muito livre e improvisatório, e seria publicada três anos depois.
Como grand finale, e fechando com chave de papelão a gélida soirée, a tal Fantasia mal ensaiada para piano, orquestra e coro. Como já lhes contamos, ela não estava pronta quando de sua estreia, o que obrigou Beethoven a improvisar o solo de abertura. Apesar dos relatos diferirem, é certo que num dado momento a orquestra e o pianista se perderam completamente. Uma das fontes diz que um clarinetista se atrapalhou e foi imediatamente achincalhado pelo compositor, e em tão altos brados que todo o teatro o ouviu. Outra diz que Beethoven, que combinara tocar as variações sem repetições, acabou repetindo a primeira variação enquanto a orquestra acompanhava a segunda, o que o obrigou a interromper a execução e começar de novo. Qualquer que tenha sido a gafe, o final cometeu a proeza de ser o ponto mais baixo duma noite que, convenhamos, nada tinha para acabar bem.
A perspectiva de quatro horas de música com o mais famoso artista de Viena não deixou de atrair admiradores, muitos dos quais amigos de Beethoven. Ainda assim, ao descreverem sua experiência, eles usaram a mais pura forma da sinceridade: aquela que eu chamo de “sinceridade-sinceridade”, que muito difere da “sinceridade de amigo”. O compositor Johann Friedrich Reichart, que acompanhou a função do camarote príncipe Lobkowsky, bem perto do palco, tascou: “nós resistimos no frio mais cortante, das seis e meia às dez e meia, e confirmamos para nós mesmos a máxima de que se pode sofrer com o excesso duma coisa boa – e ainda mais se poderosa. Muitas falhas na execução testaram nossa paciência ao mais alto grau”. Um jornal deu veredito semelhante: “Julgar todas essas peças após uma e única audição, especialmente considerando a linguagem das obras de Beethoven, em que tantas foram executadas uma após a outra, e que a maioria delas são tão grandes e longas, é absolutamente impossível”. Ferdinand Ries, aluno e amigo de Beethoven, disse que os músicos estavam tão furiosos com o compositor que prometeram que “nunca mais tocariam se Beethoven estivesse na orquestra ”. Ludwig, ao que parece, pediu-lhes desculpas, sem saber que jamais voltaria a tocar com orquestra, e que aquela Akademie marcaria sua despedida dos palcos como solista de piano, graças à sua crescente surdez.
A audição que lhes proponho a seguir tenta reconstituir as condições daquela legendária noite de música. Quase todas as obras são executadas pelos mesmos intérpretes – Robert Levin ao piano, e John Eliot Gardiner conduzindo a Orchestre Révolutionnaire et Romantique e o coro Monteverdi -, com instrumentos de época. A única exceção é a Fantasia, Op. 77, da qual não há gravação de Levin, o que me obrigou a convocar para a seleção o ótimo Ronald Brautigam. Em compensação, Levin oferece, ao final, duas improvisações alternativas para a abertura da Fantasia Coral, num estilo que considera semelhante ao que Beethoven adotaria em suas próprias. Mesmo com interpretações tão competentes e redondinhas, a experiência pode atordoar, pela saturação sensorial envolvida. Ainda assim, considere-se privilegiado por escutá-la em temperaturas acima de zero, com a possibilidade de pausá-la e, principalmente, longe do alcance da ira do renano.
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
GRANDE “AKADEMIE” DE 22 DE DEZEMBRO DE 1808 NO THEATER AN DER WIEN
Músicos na estreia: Josephine Schulz, soprano (Op. 65) Orquestra e coroad hoc Ludwig van Beethoven, piano e regência
PRIMEIRA PARTE
I – Sinfonia no. 6 em Fá maior, Op. 68, “Pastoral” (apresentada na ocasião como “no. 5”) Composta entre 1802-1808 Publicada em 1809 Dedicada ao príncipe Lobkowitz e ao conde Andreas Razumovsky
1 – Allegro ma non troppo – Erwachen heiterer Empfindungen bei der Ankunft auf dem Lande (“Despertar de sentimentos alegres com a chegada ao campo”)
2 – Andante molto mosso – Szene am Bach (“Cena à beira de um regato”)
3 – Allegro – Lustiges Zusammensein der Landleute (“Alegre reunião de camponeses”)
4 – Allegro – Gewitter, Sturm (“Trovões, tempestade”)
5 – Allegretto – Hirtengesang. Frohe und dankbare Gefühle nach dem Sturm (“Canção de pastores. Sentimentos alegres e gratos, após a tempestade”)
Orchestre Révolutionnaire et Romantique John Eliot Gardiner, regência
II – “Ah, perfido!“, recitativo e ária para soprano e orquestra, Op. 65 Compostos em 1796
Publicados em 1805
Dedicados a condessa Josephine von Clary-Aldringen 6 – Recitativo: “Ah, perfido!” (Dó maior) – Ária: “Per pietà, non dirmi addio” (Mi bemol maior)
Charlotte Margiono, soprano Orchestre Révolutionnaire et Romantique John Eliot Gardiner, regência
III – Da Missa em Dó maior para solistas, coro e orquestra, Op. 86: Composta em 1807 Publicada em 1812 Dedicada ao conde Ferdinand Kinsky
7 – Gloria
Charlotte Margiono, soprano Catherine Robbin, mezzo-soprano William Kendall, tenor Alastair Miles, baixo The Monteverdi Choir Orchestre Révolutionnaire et Romantique John Eliot Gardiner, regência
IV – Concerto para piano e orquestra no. 4 em Sol maior, Op. 58 Composto entre 1804-1807 Publicado em 1808 Dedicado ao arquiduque Rudolph da Áustria
I – Sinfonia no. 5 em Dó menor, Op. 67 (apresentada na ocasião como “no. 6”) Composta entre 1804-8 Publicada em 1809 Dedicada ao príncipe Lobkowitz e ao conde Andreas Razumovsky
1 – Allegro con brio
2 – Andante con moto
3 – Scherzo. Allegro
4 – Allegro
Orchestre Révolutionnaire et Romantique John Eliot Gardiner, regência
II – Da Missa em Dó maior, Op. 86:
5 – Sanctus
Charlotte Margiono, soprano Catherine Robbin, mezzo-soprano William Kendall, tenor Alastair Miles, baixo The Monteverdi Choir Orchestre Révolutionnaire et Romantique John Eliot Gardiner, regência
III – Uma fantasia improvisada ao piano por Herr van Beethoven, possivelmente a
Fantasia para piano, Op. 77 Composta em 1809 Publicada em 1810 Dedicada ao conde Franz von Brunsvik
6 – Allegro – Poco adagio
Ronald Brautigam, piano
IV – Fantasia em Dó menor para piano, coro e orquestra, Op. 80, “Fantasia Coral” Composta em 1808 Publicada em 1810 Dedicada a Maximilian Joseph, Rei da Baviera
7 – Adagio
8 – Finale: Allegro – Meno allegro (Allegretto) – Allegro molto – Adagio ma non troppo – Marcia, assai vivace – Allegro – Allegretto ma non troppo, quasi andante con moto (»Schmeichelnd hold und lieblich klingen«) – Presto
Ao longo de 2020, alguns conjuntos tentaram emular a experiência da Akademie de 1808. Aqui, Philippe Jordan (adoro a cara dele na imagem de capa) e a Wiener Symphoniker encaram o Leviatã, que requer capacidade, resistência e, convenhamos, bexigas de 10 L
Um bom disco do pouco divulgado Mattheson, com a luminosa presença do excelente Pablo Valetti. Mattheson era amigo próximo de Handel, embora quase tenha-o matado numa repentina briga, após uma apresentação da ópera Cleópatra de Mattheson em 1704. Handel foi salvo apenas por um grande botão de metal que serviu de escudo para a espada de Mattheson. Os dois depois reconciliaram-se. Filho de um cobrador de impostos, Johann Mattheson recebeu ampla educação em artes liberais no Johanneum, estudando inglês, francês e italiano e receber instruções gerais de música do cantor Joachim Gerstenbüttel. Aos 6 anos, ele teve aulas particulares em instrumentos de teclado e composição, bem como de canto e violino lições de um músico local. Aos nove anos de idade ele era um prodígio, cantando e tocando órgão em igrejas de Hamburgo, bem como atuava no coro da ópera de Hamburgo. Depois de se formar no Johanneum em 1693, Johann Mattheson serviu com pajem na corte do Graf von Güldenlöw, em seguida, fez sua estreia solo com a ópera de o Hamburgo em 1696 em papéis femininos. Depois de sua voz mudou, ele atuou como tenor de ópera. Ele conheceu G.F. Handel em 1703 e os dois tornaram-se amigos, viajando juntos para Lübeck naquele ano para se candidatar ao cargo de organista na Marienkirche desocupado pela aposentadoria de Dietrich Buxtehude, mas ambos recusaram o cargo. Os dois permaneceram próximos, apesar de uma violenta discussão em 1704, que levou a um duelo. A principal ocupação de Johann Mattheson em 1706 foi como um diplomata profissional. Ele tinha estudado inglês na escola e falava-o fluentemente. Em 1704 tornou-se tutor de Cyrill Wich, filho do embaixador britânico em Hamburgo, Sir John Wich. Sir John nomeou Mattheson seu secretário pessoal em 1706, uma posição de estatuto e salário considerável, o qual que ocupou durante a maior parte de sua vida, servindo Cyrill quando este sucedeu seu pai em 1715. Ele participou de missões diplomáticas no exterior representando o embaixador. Em 1709, casou com uma inglesa. Em 1718 Mattheson se tornou diretor musical da Hamburg Catedral, para o qual ele compôs a música sacra, mas ele desistiu do cargo em 1728 por causa da surdez. Em 1719 ele foi nomeado mestre de capela do duque de Holstein, mais tarde tornando-se secretário de legação (1741) e advogado (1744) para o duque. Johann Mattheson é principalmente famoso como um teórico da música. Ele foi o escritor mais completo sobre a performance prática, estilo teatral, e harmonia do barroco alemão. Além de algum trabalho original — especialmente sobre a relação das disciplinas de retórica e música — ele era um compilador da maior parte das ideias correntes na época. Seus escritos literários constituem um grande corpo de trabalho, que comenta sobre quase todos os aspectos de composição do seu tempo.
Johann Mattheson (1681-1764): Der Brauchbare Virtuoso (12 Sonate Per Violono Overo Flauto Solo Col Continuo)
Sonate I, Ré Majeur (11:29)
1-1 Intrada 3:02
1-2 Tempo Di Gavotta 0:37
1-3 Adagio 0:35
1-4 Allegro 2:46
1-5 Adagio 1:57
1-6 Aria 2:32
Sonate II, Sol Majeur (7:58)
1-7 (A Tempo) 1:59
1-8 Allegro 2:18
1-9 Tempo Di Corrente 1:37
1-10 Tempo Di Giga 2:04
Sonate III, La Majeur (6:32)
1-11 Adagio 1:19
1-12 Allegro 1:33
1-13 Grave 1:42
1-14 Giga 1:58
Sonate IV, Ré Majeur (6:55)
1-15 Adagio 0:51
1-16 Allegro 0:52
1-17 Aria 0:58
1-18 Premier Double 0:52
1-19 Deuxième Double 0:54
1-20 Troisième Double 0:57
1-21 Giga 1:30
Um dos efeitos colaterais mais previsíveis do jubileu de Beethoven em 2020 foi o aumento de sua já considerável participação no repertório das salas de concerto. Não conheço muitas pessoas capazes de contestar sua importância para a Música, nem de discutir a justiça de celebrar a efeméride. No entanto, era bastante óbvio, natural até, que esse destaque hipertrófico para a obra do renano aconteceria em detrimento de outros repertórios – inclusive, como puderam ver, aqui no PQP Bach. Somem-se a isso as restrições trazidas pela pandemia, e uma tendência a pouco ousar nas programações, e o resultado foi um Ano Beethoven que, bem, foi quase só Beethoven.
Não quero com isso me desculpar por ter publicado tanto Beethoven, e, sim, saudar iniciativas a que lhes apresento a seguir:
“Começa nessa sexta [18/12/2020] a mostra MÚSICA RARA BRASILEIRA – o mais novo projeto do ZENON Instituto Cultural – trazendo a estreia mundial de Pós-Aboio a Três (2020), trio de cordas de Paulo Costa Lima, gravado em Moscou por Daria Dvernik, Darya Filippenko e Yulia Vendeland. Rara porque pouco executada, desconhecida, mas também porque brilhante e inusual, fruto de uma criatividade que precisa ser desvendada. É certo que com a internet temos dado belos passos para conhecer a música brasileira de concerto, mas ainda há muito o que fazer para desembaçar nossa compreensão desse repertório. Ao menos, parece que o estigma, muito corrente algumas décadas atrás, de uma música deslocada no país, que copiaria a Europa e mostraria uma faceta colonizada do Brasil, vai rapidamente perdendo força e abrindo alas para uma realidade mais divertida, rica e cheia de matizes. Ainda assim, mesmo compositores teoricamente consagrados, como Francisco Mignone, César Guerra-Peixe, Claudio Santoro, Alberto Nepomuceno ainda penam para que diversas de suas obras de fôlego sejam tocadas e publicadas. E de muitos outros não conhecemos nem a qualidade nem a variedade da sua produção. A mostra Música Rara Brasileira procura contribuir para a divulgação dessa música, apresentando um repertório de câmara pouco tocado, quase sempre inédito em gravações e/ou inacessível para o público interessado. Em tempos de pandemia e na urgência de dar a conhecer um pouco mais da música brasileira, o Zenon Instituto Cultural se propôs a usar todos os meios disponíveis e uma ampla gama de parcerias para organizar esta mostra. No decorrer dos próximos meses, será apresentado um vídeo por semana, às sextas, no canal do YouTube do instituto, de obras brasileiras dos séculos XX e XXI para pequenas formações — solos, duos, trios e quartetos de instrumentação diversa — gravados nas mais diversas condições: de concertos ao vivo a performances em casa. As peças são interpretadas por brasileiros e estrangeiros, no Brasil, EUA, Rússia, Bulgária e Azerbaijão. Dentre as inúmeras primeiras gravações mundiais realizadas, abrimos com o trio de cordas de Paulo Costa Lima, intitulado Pós-Aboio a Três (2020) e gravado em Moscou por Daria Dvernik, Darya Filippenko e Yulia Vendeland”
“É com enorme alegria que a mostra “Música Rara Brasileira” abre hoje com a obra Pós-Aboio a Três (2020), de Paulo Costa Lima, já que esse trio de cordas foi escrito especialmente para o projeto. Seguem as palavras do próprio compositor acerca dessa criação: ‘O gesto que abre e sustenta a peça vem do campo da violência – a violência como ferramenta de afastamento de um certo ninho de possibilidades expressivas (o canto nordestino do aboio, a música que se diz brasileira, o modo mixolídio e lídio-mixolídio). Todavia, esse afastamento não visa destruir e sim recompor o que foi abandonado, enxergá-lo de longe, por uma fresta. De um discurso original escrito para violoncelo solo (Pós-Aboio) surgiu por decalque (projeção desse discurso nos outros instrumentos) a presente obra, um tanto tensa em sua linearidade, porém fiel ao campo expressivo que persegue, sua ideia motriz.’ A obra foi estreada em concerto, em Moscou, no dia 1° de novembro, por um trio formado pelas russas Daria Svernik (violino) e Yulia Vendeland (cello) e pela violista bielorrussa Darya Filippenko, que tem feito um extenso trabalho de divulgação da música brasileira. Boa audição!”
Para assistir a Pós-Aboio a Três (2020), de Paulo Costa Lima, clique na imagem abaixo:
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Para saber mais sobre o ZENON Instituto Cultural, clique em seu logo:
A minha concepção de Lied sempre foi de uma canção com acompanhamento de piano. Mahler expandiu este modelo colocando uma orquestra como a acompanhamento da voz. Quando vi este disco gostei bastante da seleção das canções, todas muito representativas da arte de Schubert e uma mais bonita do que a outra. Mas fiquei um pouco preocupado com o tal do acompanhamento com o violão. Mas a preocupação logo se desfez nas primeiras canções. O álbum é excelente.
O libreto lembra a frugalidade da vida de Schubert, que em muitas ocasiões dividiu a morada com amigos e nem sempre tinha um piano a sua disposição, um luxo com o qual nem sempre podia contar. O autor menciona que Schubert aprendeu a tocar violão ainda bem jovem e que ao longo da vida possuiu vários destes instrumentos, que eram bem populares em Viena. Assim, não é difícil imaginar a visita de amigos e uma nova canção sendo apresentada com o acompanhamento de um violão.
As canções deste disco foram preparadas e arranjadas para acompanhamento de violão pelo ótimo violonista John Charles Britton, que nasceu no Texas e estudou em São Francisco com Sérgio Assad. Ele tem colaborado com o canadense Philippe Sly já há alguns anos e creio que boa parte da beleza deste álbum vem desta vivência. O violão certamente ajuda a criar um ambiente bastante intimista e lírico. Isto não quer dizer que os momentos mais arrojados sejam diminuídos, muito pelo contrário.
Mas a coleção de canções é definitivamente espetacular. Seis delas são dos três grandes ciclos, duas de cada um deles – Die Schöne Müllerin, Winterreise e Schwanengesang. Estas canções e mais as outras dez formam um ótimo painel que exprime o quanto se desenvolveu com Schubert a arte da canção.
Auf dem Wasser zu singen e Der Müller und der Bach fazem alusão à água corrente, ao riacho que dita o ritmo e sempre dava grande inspiração a Schubert.
Erlkönig e Der Tod und das Mädchen são baladas cheias de tons fantasmagóricos nas quais o cantor precisa interpretar diferentes vozes. São duas das canções mais conhecidas de Schubert.
Ständchen (Serenata) e Der Lindenbaum são canções dos ciclos Schwanengesang e Winterreise que se destacam dos ciclos e certamente tem suas melodias reconhecidas em todas as partes.
Wohin, a segunda canção do Die Schöne Müllerin trata de um tema caro à cultura germânica, que reúne o amor pela natureza e a compulsão por seguir caminhando – Para onde?
Du bist die Ruh, Du liebst mich nicht e Der Jüngling an der Quelle são lindas canções de amor e de um pouco de dor de cotovelo. Afinal, o Franz sabia dessas coisas. O tema da água está aí de novo, na Quelle. Aqui, a dificuldade apresentada ao cantor(a) é manter um legato e produzir um som, assim, que traga paz…
Der Leiermann, Der Doppelgänger e Des Fischers Liebesglück são canções compostas no fim da vida e atingem uma profundidade especialmente tocante e com tons bastante sombrios. São canções bem sérias.
An die Musik só poderia ter sido composta por alguém que tinha uma intimidade enorme com a música. Os versos são simples, mas a arte de Schubert os eleva muito, muito.
Du holde Kunst, ich danke dir dafür,
Du holde Kunst, ich danke dir!
As duas canções que ainda não mencionei têm nomes de mulheres. An Sylvia é uma tradução para o alemão de um texto de Shakespeare, que cria assim uma conexão entre as canções de Schubert e de Dowland. Conexão esta que fica reforçada nesta interpretação com acompanhamento de violão. Finalmente a canção que eu gostei mais no disco, Alinde! Esta é a segunda faixa do disco e como ficou bonito o acompanhamento do violão. Esta merece bis, quando terminares de ouvir o álbum.
Coloquei na pasta uma faixa extra, uma gravação bastante antiga desta canção, na voz do ótimo Hans Hotter, com acompanhamento de piano. Fica aí uma possibilidade de comparar.
Ouça tudo umas quatro ou cinco vezes e depois me conte se não é mesmo uma beleza de disco. Este vai para a minha retrospectiva deste ano que começa a desenhar seu fim, mas ainda com muitíssimas preocupações e angústias.
Franz Schubert (1797 – 1828)
Auf dem Wasser zu singen, D774
Alinde, D904
Du bist die Ruh D776
An Sylvia, D89
Erlkönig, D328
An die Musik D547
Ständchen ‘Leise flehen meine Lieder’, (No. 4 do Schwanengesang, D957)
Wohin (No. 2 do Die schöne Müllerin, D795)
Der Müller und der Bach (No. 19 do Die schöne Müllerin, D795)
“Philip Sly possesses a fine, velvet bass-baritone voice, clear diction and splendid, true intonation.” – Gramophone Magazine 2014
This is an amazing collection of Schubert for guitar and low voice. Phillipe and John compliment each other well and the blend they achieve is superb.
Philippe Sly hat eine phantastisch klare Stimme, gute Diktion, einen guten Gitarrenbegleiter… und trifft, wie ich meine, genau das, was Schubert ausdrücken wollte: Romantik pur. Bin begeistert.
DUE: Amico e suocero Barezzi
Em pouco tempo Busseto não oferecia condições para o desenvolvimento de um talentoso músico jovem e brilhante como Giuseppe Verdi. Seu grande protetor dom Barezzi fixou-lhe um subsídio anual dando condições financeiras, pelo período de três anos, para se aperfeiçoar em Milão. Estava em curso o ano de 1832. Acostumado à vida serena de uma região rural, Verdi assombrou-se com o movimento e a agitação da grande cidade. Mas seu encantamento por Milão durou pouco. Ao tentar obter matrícula no Conservatório, recebeu uma recusa terminante. Os estatutos determinavam que os alunos deviam ter menos de catorze anos e ele já completara dezoito, não era um virtuose instrumental nem demonstrava excepcionalidade como compositor. Não havia, portanto, razões que justificassem a abertura de uma exceção. A derrota o deixou mal por pelo menos um mês, ele era jovem e fora “rejeitado” ficou muito triste, e ao longo de sua vida não esqueceu nunca o que ele considerou uma afronta.
Já que o Conservatório se mostrava inacessível, Verdi arranjou um professor particular por intermédio do professor Saletti, membro da banca que o reprovara. O mestre Vincenzo Lavigna professor de cravo e músico da orquestra do Teatro Scala, com ele o rapaz aprofundou-se em harmonia e contraponto, analisando as obras de seus autores prediletos — Bach, Haydn, Mozart e Beethoven além dos trabalhos de Palestina e Benedetto Marcello. Contudo, o ensino de Lavigna foi particularmente valioso a Verdi pelo fato de iniciá-lo no gênero operístico. O velho músico era um profundo conhecedor da ópera e seu discípulo aprendeu com ele tanto quanto era possível aprender. Lavigna facilitou o acesso as partituras de operas para que as estudasse, orientou o aluno que devesse ir a todos concertos do Scala. O professor lhe deu muitos conselhos ao passar dos anos e revisando várias partituras de ópera com ele e especialmente Don Giovanni de Mozart. Os três anos subvencionados pelo povo de Busseto passaram depressa. E a notícia da morte do seu amigo Fernando Provesi fez com que o rapaz não aguardasse o término da sua temporada de estudos em Milão.
Antes de expirar, Provesi manifestara a vontade de que Verdi voltasse a ocupar os cargos de Mestre de Capela, organista da Catedral e Regente da Banda. Para cumprir o último desejo do companheiro falecido e por sentir uma saudade insuportável da linda Margarida Barezzi, Giuseppe voltou à cidade de Busseto. Tornar-se sucessor de Provesi não foi tão simples quanto Verdi imaginara. A vida musical da comunidade era perturbada por um acirrado conflito político. O partido clerical favorecia um músico chamado Ferrari, defendendo ferrenhamente o seu direito aos cargos. O partido anticlerical e os músicos cerraram fileiras para nomear Verdi, mas foi inútil. Graças à influência de dois bispos, Ferrari saiu vitorioso. O fato gerou um conflito ainda maior, pois toda a população da cidade se envolveu na questão, dividida em dois partidos: verdianistas e ferrarianistas. Os primeiros, admiradores de Verdi e defensores da justiça, eram liderados por Barezzi, que, valendo-se do seu prestígio, desencadeou uma série de represálias. A primeira delas foi suspender o subsídio de Ferrari, transferindo-o para Verdi. Os ferrarianistas, constituídos pelo grupo clerical, responderam com um aumento de salário para o seu protegido. Mas a disputa não ficou aí. Os verdianistas em peso passaram a frequentar a igreja dos frades franciscanos. Estes acolheram Verdi como organista, dando-lhe a oportunidade de confirmar sua superioridade a Ferrari e seus partidários, que se desesperavam quando o jovem maestro se deslocava com a Banda de Busseto para os povoados vizinhos, sendo recebido em todos eles com verdadeiros delírios populares. Durante toda essa batalha político-musical, Margarida Barezzi esteve ao lado de Verdi, auxiliando-o na estratégia e revelando-se a sua mais fervorosa admiradora.
A ideia de casar-se com ela havia muito tempo agitado o espírito de Giuseppe, que, aos poucos, adquiriu coragem e um dia apresentou-se em casa da moça, nervosíssimo e quase sem poder falar, para fazer o pedido formal a seu pai. O velho Barezzi, que sabia perfeitamente da afeição mútua entre Giuseppe e Margarida, divertiu-se com o empertigamento do seu amigo e abraçou-o jovialmente. Não poderia imaginar melhor marido para sua filha. O casamento realizou-se em maio de 1836. Toda a cidade participou da alegria de Verdi e Margarida, em cuja homenagem se promoveram diversos concertos.
A existência de Verdi na província é melhor vista como um atraso irritante em sua carreira profissional, e há evidências de que ele estava buscando ativamente planos mais ambiciosos. Em meados do ano de 1836, ele confidenciou a Massini em carta a sua própria angústia: “Saiba então que eu cansei de ficar em Busseto, porque você sabe que em uma pequena cidade não há recursos para quem quer fazer profissão de músico, não há esperança de avanço longe da cidade, então veja que estou passando minha juventude em vão”.
Em março de 1837 os dois recém-casados tiveram a alegria de uma filhinha, Virginia Maria Luigia. Até para o trabalho do maestro parecia chegar, em setembro, uma boa oportunidade, a única capaz de quebrar a situação estagnada da província. O Teatro Ducale di Parma, declarou sua intenção de representar uma obra, libreto de Piazza, intitulado de “Rochester”, que Giuseppe já tinha quase terminado em setembro do ano anterior. O jovem o compositor tinha vários amigos em Parma, admiradores e apoiadores, entre a aristocracia da corte, na orquestra e na comissão de teatro. O gerente da temporada Luigi Granci de Lucca, recebeu Verdi ouviu algumas passagens da obra. Porém não deve ter prestado muita atenção ao jovem e sua obra, acabou recusando. Em uma carta ao amigo Massini, desiludido e com raiva, desabafa: “…. O empresário, a quem me apresentei cordialmente e sem muitos preâmbulos, respondeu que não lhe convinha expor-se a uma ópera de resultado incerto…. Cheguei em casa com raiva e muito sentido sem ter nenhuma esperança com Parma. Conte-me; não seria possível para você falar com o Sr. Bartolomeo Merelli ( Gerente e empresário do La Scala ) para ver se poderíamos apresentar a ópera em algum teatro em Milão ? Você me faria um favor muito bom. Eu seria eternamente grato.”
Neste mesmo período sairiam as primeiras publicações de obras de Verdi: seis romances. São composições modestas e bem que marcam o fim de um período de aprendizagem, exercícios e tentativas. Em suas memórias o maestro lembra desta época da seguinte forma: “…. eu escrevi muitas peças soltas: marchas, algumas pequenas sinfonias que foram usados nos trabalhos da Igreja e Teatros…. Lembro-me de um “Stabat Mater”, três ou quatro “Tantum ergo” e outras peças sagradas que não me lembro. A maioria se perdeu.” Na verdade, como alguns estudiosos apontam não sobrou muita coisa, é possível que Verdi as tenha destruído. O editor Ricordi, inclinado a publicar trabalhos de autores de várias notoriedades, incluindo iniciantes, publicou os seis Romances de Verdi, e imediatamente se provaram ser muito bem aceitos.
Temos insistido um pouco em focar o início da vida de Verdi e espero que o leitor-ovinte não se desinteresse, são os primeiros compassos de uma existência. São muito importantes para entender a natureza de um artista, as forças que agitam, enfraquecem ou fortalecem.
Verdi foi para Milão entre final de abril e início de maio de 1838 para entregar alguns manuscritos de sua música para Ricordi. No mesmo ano, em 11 de julho, uma segunda criança nasceu, um menino desta vez, Icilio Romano Carlo Antonio. O feliz acontecimento foi entristecido pela morte da pequena Viginia, um mês depois do nascimento de Icilio, ela tinha apenas um ano e seis meses. O golpe para o casal, especialmente para Margherita, deve ter sido grande (a mortalidade infantil na época era bem alta), ela estava bastante abatida e cansada também por causa do recente parto. Os cônjuges então, aproveitando as férias de setembro na escola, foram para Milão lá o maestro entra em contato com os membros do la Scala e foi recebido de forma cordial recebendo um “talvez” para as suas obras serem representadas no mais importante teatro de Milão.
Verdi – Obras da Juventude 02 (1837-1839)
1837: Credo For Tenor, Bass, Male Chorus And Orchestra [Doubtful]
Fausto Tenzi
Antonio Abete
Rino Vernizzi
Alberto Negroni
Orchestra e Coro “Giuseppe Verdi” di Busseto
Fausto Pedretti (2001)
1837: Orchestration Of Giacomo Mori Canto Di Virginia Variations For Oboe
Orchestra sinfonica di Milano Giuseppe Verdi
Ricardo Chailly (2003)
1837: Variazioni On A Theme Of Morlacchi’s Tebaldo E Isolina For Piano And Orchestra [Reconstructed Fortunato Ort]
Orchestra sinfonica di Milano Giuseppe Verdi
Ricardo Chailly (2003)
1838: 6 Romanze Canzoni [Jacopo Andrea Vittorelli]
Michele Pertusi – bass
Mariella Devia – soprano
Sergei Larin – tenor
Parma Opera Ensemble (2006)
1838: Adagio For Trumpet And Orchestra
Orchestra sinfonica di Milano Giuseppe Verdi
Ricardo Chailly (2003)
1838: Capriccio For Bassoon And Orchestra [Doubtful]
Orchestra sinfonica di Milano Giuseppe Verdi
Ricardo Chailly (2003)
1838: Notturno (Guarda Che Bianca Luna) For Soprano, Tenor, Bass, Flute And Piano [Vittorelli]
Michele Pertusi – bass
Mariella Devia – soprano
Sergei Larin – tenor
Parma Opera Ensemble (2006)
1838: Sinfonia For Orchestra In C Major
Orchestra sinfonica di Milano Giuseppe Verdi
Ricardo Chailly (2003)
1839: La Seduzione For Voice And Piano [Balestra]
Michele Pertusi – bass
Mariella Devia – soprano
Sergei Larin – tenor
Parma Opera Ensemble (2006)
1839: L’Esule For Tenor And Piano [Temistocle Solera]
Michele Pertusi – bass
Mariella Devia – soprano
Sergei Larin – tenor
Parma Opera Ensemble (2006)
Além de Noites nos Jardins de Espanha e Dança Ritual do Fogo, pouca ou coisa alguma eu conhecia de Manuel de Falla. Assim, quando me dei com a capa ensolarada deste álbum, decidi investigá-lo. A Fantasia Bética quase me derrubou, mas a insistência encorajada pelas Peças Espanholas que abrem o disco valeu a pena. As danças dos balés que completam o disco são ótimas!
Manuel de Falla nasceu em Cádiz e era um esquisitão – católico estremado, hipocondríaco e cheio de manias. Foi celibatário (dizem as minhas fontes) e como Bruckner, passou boa parte da vida sob os cuidados de uma irmã, que era chamada María del Carmen. Muito reservado e introvertido, no entanto, sempre foi muito amigo de seus amigos.
O disco começa com as Cuatro piezas españolas que ele compôs entre 1907 e 1908, com influência do amigo Isaac Albéniz. Em 1907 foi para a França a convite de um empresário para uma tournée de concertos. É claro, era propaganda enganosa. Mesmo assim ele ficou por lá até 1914, principalmente em Paris. Neste período produziu pouco (seu processo de composição era lento e ele muito crítico e exigente), mas aprendeu muito. Conviveu com Dukas, Debussy, Ravel e Albéniz.
Sua primeira obra a fazer sucesso foi a ópera A Vida Breve, que custou, mas estreou bem em Nice, em abril de 1913 e passou a lhe render algum dinheiro. Além disso, o editor Max Eschig o contratou para a publicação de Noites nos Jardins de Espanha, que só ficaria pronta em 1915.
A Fantasia Bética, assim como A Vida Breve e o balé El Amor Brujo se destacam pelo uso de melodias do cante hondo, da Andaluzia.
Completam o disco três danças do balé El sombrero de tres Picos, resultado do encontro em 1916 com Diaghilev quando o empresário passou pela Espanha com sua companhia. A pedido dele, de Falla se ocupou da composição do balé até quando foi estreado em Londres, em 1919, com figurinos e cenários de Pablo Picasso. E com sucesso. Além dessas três danças, temos uma suíte do balé El Amor Brujo, com a famosíssima Dança Ritual do Foge.
A faixa 6, que abre a sequência de peças de El sombrero de tres picos é como a capa deste disco – ensolarada! A interpretação de Alicia de Larrocha é garantia de extremo bom gosto na interpretação, além da qualidade técnica e autenticidade. Quer mais?
Aproveite!
René Denon
PS: Se ainda tiver um tempinho, veja esta postagem: