Para honrar a memória e celebrar o legado extraordinário de Arthur Moreira Lima, um dos maiores brasileiros de todos os tempos, publicamos a integral da coleção Meu Piano/Três Séculos de Música para Piano – seu testamento musical – de 16 de julho, seu 85° aniversário, até hoje, primeiro aniversário de seu falecimento. Esta é a última das onze partes de nossa eulogia ao gigante.
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Depois de escrever o maior dos capítulos da história da Música Brasileira, Arthur depôs a pena.
Entre seu primeiro cachê no Theatro da Paz em Belém e o derradeiro recital de “Um Piano pela Estrada”, passaram-se sete décadas. Do Carnegie Hall em Nova York ao coreto de Itapecuru-Mirim, vivera tudo. De Emil Gilels de Odessa a Seu Walter de Casinhas, encontrara todos.
Missão cumprida. Era hora de descansar.
O guerreiro recolheu-se a seu lar, num dos mais belos nacos do litoral brasileiro, e saboreou a vida em família.
Deixou seu repouso para pouquíssimas aparições públicas. Na mais significativa delas, em 5 de abril de 2023, fez-se acompanhar da Sinfônica de Minas Gerais, de cujo Concurso para Jovens Solistas aceitara ser padrinho. O programa era puro sumo de arthurzice: abriu com o Hino do Fluminense, em arranjo de sua lavra; prosseguiu com o Adagio do Concerto K. 488 de Mozart; e concluiu com O Despertar da Montanha, pérola de Eduardo Souto que ele sempre soube transformar em épico.
A escolha do K. 488 foi especialmente significativa, pois fora com ele que Arthurzinho, aos oito anos, vencera seu primeiro concurso de jovem solista, com a Sinfônica Brasileira sob Eleazar de Carvalho, quase setenta e cinco anos antes. Com aquele Adagio, um grande arco se fechava, depois de três quartos de um século a encantar o mundo, de suas grandes salas de concerto até as pracetas de suas mais remotas bibocas.
Seria seu canto de cisne.
Nada mais soube dele até que, em setembro do ano passado, a Escola de Música da Universidade Federal do Rio de Janeiro lhe conferiu o título de Doutor Honoris Causa. Durante a cerimônia de outorga, acompanhada remotamente pelo homenageado, desde Florianópolis, o diploma foi recebido por seu neto, o pianista Chico.
Conjurando todas as forças que lhe restavam para emitir cada uma de suas palavras, nosso herói agradeceu com os mesmos modos despretensiosos que permearam sua gloriosa jornada:
A essa altura da vida, não sei se eu sou merecedor dessa homenagem. Deixo a resposta dessa pergunta para aquelas pessoas que ouvirem meus discos”.
Espero que as quarenta e uma pistas que lhes alcancei os ajudem a responder.
Algumas semanas depois, em exatamente um ano antes do instante em que essa postagem foi ao ar, Arthur Moreira Lima Júnior partiu para as esferas. Decerto ao encontro de Frederico e de Ernesto; para reencontrar Dona Dulce e Arthur Pai; rever Lúcia, Marguerite e Rudolf; tocar com Astor e Radamés; e contar as novas a Cláudio, Sérgio e Millôr.
Em meio à comoção ante a infelizmente esperada notícia, as vozes mais audíveis eram unânimes em darem conta do quão grande ele fora e do quanto seu país lhe devia. No velório, enquanto depositava flores ao lado de muitas bandeiras do Fluminense, eu pude assim escutar:
– Um velório tão singelo para um tão grande homem! Por tudo o que ele fez, ele mereceria um funeral de Estado! Ele foi um dos maiores pianistas do mundo…

De volta para casa, depois de me despedir de Arthur, corri ao Grand Bazaar da interné e comprei os volumes que me faltavam de seu generoso testamento musical aos brasileiros. Estava desde então decidido a compartilhar a coleção “Meu Piano” com todos que a quisessem conhecer. Sentia que devia isso a Arthur, para que talvez, ainda que tardiamente, o mundo pudesse sentir algo da cratera que sua partida deixara cá em mim. Mais que isso: que os brasileiros algum dia tivessem tanto orgulho desse herói quanto ele teve de amor por eles.
Quero que jamais o esqueçam.
Como lhes prometi já na primeira postagem, essa minha homenagem nada teria de crítico: ela foi tão só carinho e saudade. Deixo a crítica para vocês, enquanto espero que minhas publicações lhes tenham dado alguma ideia do espetáculo que foi a vida desse brasileiro incomparável.
Em seus textos de apresentação aos álbuns de Arthur lançados sob seu selo, Marcus Pereira escreveu espirituosamente:
Conforme sabido e lamentado, Chopin não nasceu no Brasil, mas deveria”,
E também:
Revive também o piano, através de Arthur Moreira Lima, pianista patrício conhecido no mundo inteiro. Afinal (glosando Ferreira Gullar) o piano não foi inventado para humilhar o Brasil.
Não, e não mesmo:
Nenhum piano surrou mais nossa viralatice que o do nosso querido Chopin do Estácio.
Obrigado por tanto, Arthur.
Em memória de Arthur Moreira Lima Júnior
Rio de Janeiro, 16 de julho de 1940 – 30 de outubro de 2024, Florianópolis
ARTHUR MOREIRA LIMA – MEU PIANO/TRÊS SÉCULOS DE MÚSICA PARA PIANO
Coleção publicada pela Editora Caras entre 1998-99, em 41 volumes
Idealizada por Arthur Moreira Lima
Direção artística de Arthur Moreira Lima e Rosana Martins Moreira Lima
Fryderyk Franciszek CHOPIN (1810-1849)
Polonaises para piano, Op. Póstumo:
1 – Polonaise em Sol Menor
2 – Polonaise em Si bemol maior
3 – Polonaise em Lá bemol maior
4 – Polonaise em Sol sustenido menor
5 – Polonaise em Si bemol menor
Três Polonaises para piano, Op. 71
6 – No. 1 em Ré menor
7 – No. 2 em Si bemol maior
8 – No. 3 em Fá menor
9 – Polonaise em Sol bemol maior
Arthur Moreira Lima, piano
Gravação: American Academy Hall, Nova York, Estados Unidos, 1983.
Produção e engenharia de som: Judith Sherman
Supervisão: Jay K. Hoffman
Piano: Steinway & Sons, Nova York
Remasterização: Rosana Martins Moreira Lima
VOLUME 39 – CHOPIN XI – AS SONATAS
Fryderyk CHOPIN
Sonata para piano no. 2 em Si bemol menor, Op. 35
1 – Grave – Agitato
2 – Scherzo
3 – Marche Funèbre: Lento)
4 – Finale: Presto
Sonata para piano no. 3 em Si menor, Op. 58
5 – Allegro maestoso
6 – Scherzo: Molto Vivace
7 – Largo
8 – Finale: Presto non tanto
Arthur Moreira Lima, piano
Gravação: All Saints Church, Tooting, Londres, Reino Unido, 1999
Piano: Steinway and Sons
Engenheiro de som: Peter Nicholls
Direção Musical, produção, edição e masterização por Rosana Martins Moreira Lima, 1999.
Fryderyk CHOPIN
Quatro Baladas para piano:
1 – No. 1 em Sol menor, Op. 23
2 – No. 2 em Fá maior, Op. 38
3 – No. 3 em Lá bemol maior, Op. 47
4 – No. 4 em Fá menor, Op. 52
Quatro Mazurcas para piano, Op. 33
5 – No. 1 em Sol sustenido menor
6 – No. 2 em Ré maior
7 – No. 3 em Dó maior
8 – No. 4 em Si menor
Trois Nouvelles Études pour le “Méthode des Méthodes” de Moschelles et Fétis:
9 – No. 1 em Fá menor
10 – No. 2 em Ré bemol menor
11 – No. 3 em Lá bemol maior
Arthur Moreira Lima, piano
Gravação: All Saints Church, Tooting, Londres, Reino Unido, 1999
Piano: Steinway and Sons
Engenheiro de som: Peter Nicholls
Direção Musical, produção, edição e masterização por Rosana Martins Moreira Lima, 1999.
Nossa homenagem a Arthur deve tudo a dois mananciais.
O primeiro é O Piano e a Estrada (2009), livro-reportagem de Marcelo Mazuras, infelizmente fora de catálogo, mas facilmente disponível no Grand Bazaar da Interné. O autor, cuidadosamente, nunca o chamou de biografia, porque Arthur rechaçava o termo, que “no Brasil tem um ar solene, de testamento, de coisa definitiva”, e sua Coluna Prestes pianística ainda teria mais oito anos de estradas e rios pela frente.
Recomendamos fortemente sua aquisição e leitura, nem que seja para estimular sua reedição, talvez ampliada, dando conta dos quinze anos posteriores da jornada de nosso herói entre nós, esses sortudos.
Mazuras, que participou da Caravana Arthurzinho pelo sem-fim do Brasil, também dirigiu o documentário Um Piano para Todos (2022), disponível em várias plataformas de streaming. As imagens do caminhão-teatro sobre balsas a singrar os vastos rios amazônicos devem ter enchido Arthur de orgulho. Dir-se-ia nosso Fitzcarraldo do piano.
O outro manancial, já tantas vezes mencionado ao longo das postagens, foi o do Instituto Piano Brasileiro (IPB), para o qual Arthur generosamente enviou uma grande parte de seu acervo, com muitas gravações inéditas. O IPB digitalizou esses tesouros e os vem publicando em seus diversos canais, dentro do Projeto Arthur Moreira Lima, que visa a disponibilizar pela cyberesfera toda a discografia do gigante em vídeo-partituras. Além disso, nosso herói concedeu ao diretor do IPB, o multitalentoso Alexandre Dias, a mais extensa série de entrevistas de sua longa vida, ao longo de diversas madrugadas pandêmicas (pois Arthur, como já apontamos, sempre viveu no fuso horário de Honolulu). Reunidas em onze episódios e divulgadas no podcast Conversa de Pianista, elas ajudaram a abastecer de fatos e causos nossa homenagem.
O trabalho inestimável do IPB é inteiramente mantido por financiamento coletivo e só é possível graças ao apoio de seus assinantes. Convidamos nossos leitores-ouvintes a se juntarem a esse rol.

“Nesta última parte das entrevistas que Arthur Moreira Lima concedeu a Alexandre Dias em 2020, ele falou sobre a necessidade de um pianista desenvolver cultura geral, e os livros que o marcaram. Falou também sobre sua filosofia como intérprete, e sobre a arte de se montar programas de recitais.”


Vassily
































































































































































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Johann Sebastian BACH (1685-1750)
































