Em homenagem ao dia natalício de Johann Sebastian Bach! (Postagem original de 21 de março de 2012)
Os Concertos de Brandenburgo são uma das páginas mais famosas e importantes da música barroca, além do que é uma da obras mais populares do vasto material de Johann Sebastian Bach. Estes concertos foram compostos no período que vai de 1718 a 1721 e ficaram esquecidos após o ano de 1734. Somente no século XIX é que voltaram a ser explorados e tocados. São uma das obras mais belas de todos os tempos. Vale a pena ouvir e se entusiasmar. Existe várias outras gravações aqui no blog. Dessa vez, vamos com o holandês ton Koopman, um especialista em Bach. Não deixe de ouvir. Boa apreciação!
Johann Sebastian Bach (1685-1750): Concertos de Brandenburgo / Concerto Triplo / Concerto para Órgão BWV 1059 (Koopman / ABO)
CD1
Brandenburg concerto No. 1 in F major, BWV 1046
01. 1 (Without tempo indication)
02. 2 Adagio
03. 3. Allegro
04. 4. Menuetto – Trio I – Polacca – Trio II
Brandenburg concerto No. 3 in G major, BWV 1048
05. 1. (Without tempo indication)
06. 2. Adagio
07. 3. Allegro
Brandenburg concerto No. 2 in F major, BWV 1047
08. 1. (Without tempo indication)
09. 2. Andante
10. 3. Allegro assai
Triple Concerto, BWV 1044
11. I. Allegro
12. II. Adagio ma non tanto e dolce
13. III. Alla breve
CD2
Brandenburg concerto No. 4 in G major, BWV 1049
01. 1. Allegro
02. 2. Andante
03. 3. Presto
Brandenburg concerto No. 5 in D major, BWV 1050
04. 1. Allegro
05. 2. Affetuoso
06. 3. Allegro
Brandenburg concerto No. 6 in B flat major, BWV 1051
07. 1. (Without tempo indication)
08. 2. Adagio ma non tanto
09. 3. Allegro
Organ Concerto No. 8 in D minor, BWV 1059
10. I. Sinfonia
11. II. Aria
12. III. Sinfonia, presto
The Amsterdam Baroque Orchestra
Ton Koopman, condutor
Peças únicas no repertório para órgão, esses concertos de Soler nunca soaram tão deliciosamente saborosos quanto nessa gravação nos dois órgãos da Catedral de Salamanca. Construídos no século 18, esses órgãos têm timbres realmente muito típicos daquele século e daquela região do mundo.
Antonio Soler nasceu na Catalunha, foi ordenado padre aos 23 anos em 1752 e se mudou para o Monasterio de San Lorenzo del Escorial, próximo a Madri, onde se tornou um pupilo do velho Domenico Scarlatti até a morte deste em 1757. Scarlatti provavelmente teve um surto de criatividade na velhice, compondo centenas de suas curtas sonatas em seus últimos anos de vida, com Soler ajudando como copista… as datas são incertas, assim como as das sonatas de Soler, que de certa forma têm as do italiano como modelo.
Além de compor essas sonatas, Soler compôs missas e dezenas de villancicos – música vocal não litúrgica, tradicional na Espanha. Anos depois, a partir de 1766, ele se tornou tutor musical do infante Don Gabriel de Borbón (1752-1788), filho caçula do rei Carlos III que, por não estar na linha de sucessão do trono, podia dedicar sua atenção ao órgão, cravo e piano. Lembremos ainda que a rainha anterior, Maria Bárbara, tia do infante Don Gabriel, foi a grande mecenas e protetora de Scarlatti. Ou seja, havia na casa real espanhola uma grande predileção pela música para instrumentos de teclado.
Por outro lado, a Espanha daquele tempo não contava com casas de edição de partituras, o que em parte podemos creditar ao rígido controle da Inquisição ibérica sobre a circulação de ideias… A censura prévia era bem rígida e, embora naquela época já não queimassem tantas bruxas, a Inquisição só terminaria com a invasão de Napoleão! Assim, as obras de Soler ficaram restritas às bibliotecas privadas e de monastérios e igrejas espanholas, com a raríssima exceção de uma coleção de 27 sonatas impressas na Inglaterra, levadas para aquele país pelo Lord Fitzwilliam após uma visita à Espanha em 1772.
Tudo leva a crer, portanto, que Soler não tinha vontade de ser conhecido por melômanos franceses, italianos ou alemães, bastando para ele o reconhecimento local. Mas voltemos ao seu pupilo, o infante Don Gabriel: para ele foram dedicados os Seis Quintetos para teclado e cordas (obra pioneira nessa formação que depois seria ilustrada por obras-primas de Schumann, Brahms e Fauré) e os Seis Concertos para dois órgãos, provavelmente compostos por volta de 1780. Feitos para serem tocados pela dupla Antonio Soler / Gabriel de Borbón, esses concertos fogem do modelo italiano em três movimentos: a forma básica é um movimento lento seguido de um minueto. E os minuetos, com temas simples e dançantes, são ricos em variações que mostram a erudição do Padre Soler.
Padre Antonio Soler (1729-1783):
Six Concertos for two organs
Concerto No. 1 in C
1. Andante 4’11
2. Minué 3’36
Concerto No.2 in A minor
3. Andante 4’17
4. Allegro 2’34
5. Tempo de minué 5’33
Concerto No.3 in G
6. Andantino 4’22
7. Minué 4’45
Concerto No.4 in F
8. Afectuoso – Andante non largo 3’10
9. Minué 4’42
Concerto No.5 in A
10. Cantabile 3’46
11. Minué 5’39
Concerto No.6 in D
12. Allegro – Andante – Allegro – Andante 4’42
13. Minué 5’41
Quando ouço esta sonata de Cesar Franck sinto um total e completo relaxamento. Ela me transporta para um ambiente idílico, com muitas flores, perfumes, e verde. Me faz esquecer da rotina do dia a dia, do estresse, acalma minhas crises de ansiedade, enfim, serve como um poderoso calmante, mas um calmante que não tem contra-indicações.
O colega Pleyel acaba nos presentear com um ‘pacotaço’ em homenagem a Cesar Franck, cujo aniversário dos 200 anos de nascimento foi ontem, dia 10 de dezembro. Minha modesta colaboração é este registro bem recente, 2019, com a versão para violoncelo da belíssima Sonata para Violino, com esta incendiária dupla, Gautier Capuçon e Yuja Wang, que vem arrebatando corações com suas performances nos últimos anos. Detalhe: este registro foi realizado ao vivo, em 2019, em Toronto. Então não se assustem se ouvirem a respiração dos músicos como se eles estivessem ao seu lado, é uma sensação estranha, mas faz parte da emoção de ouvir um registro ao vivo.
Espero que apreciem, eu gostei muito dessa gravação, principalmente o terceiro movimento, uma Fantasia tocada com muita emoção e personalidade. Difícil conciliar técnica e sensibilidade nestes momentos.
A parte do disco dedicada a Chopin começa com uma peça de juventude do mestre polonês, uma Polonaise, mas o que se destaca é a famosa Sonata Para Violoncelo, em Sol Menor, que pode não ser a maior das obras de Chopin mas tem suas qualidades, e uma delas é conseguir fazer que ambos instrumentos tenham voz própria. E isso não é problema para estes solistas, que conseguem um entrosamento com total cumplicidade durante a execução das obras.
Aliás, Parabéns Monsieur César Franck …!!!
01. Franck: Cello Sonata in A major, FWV 8 – I. Allegro ben moderato
02. Franck: Cello Sonata in A major, FWV 8 – II. Allegro
03. Franck: Cello Sonata in A major, FWV 8 – III. Recitativo – Fantasia ben moderato
04. Franck: Cello Sonata in A major, FWV 8 – IV. Allegretto poco mosso
05. Chopin: Introduction and Polonaise brillante in C major, Op.3
06. Chopin: Cello Sonata in G minor, Op.65 – I. Allegro moderato
07. Chopin: Cello Sonata in G minor, Op.65 – II. Scherzo
08. Chopin: Cello Sonata in G minor, Op.65 – III. Largo
09. Chopin: Cello Sonata in G minor, Op.65 – IV. Finale Allegro
10. Piazzolla: Le Grand Tango
Como eu e Ranulfus estamos num empreendimento franckiano, apresento mais uma versão da famosa Sinfonia em Ré. Surge ainda neste post outro francês, Vincent d’Indy. Seguem alguns dados dos dois compositores. César-Auguste-Jean-Guillaume-Hubert Franck foi um organista e compositor belga. Com quinze anos, após os estudos em sua cidade natal, foi para Paris onde passou a freqüentar o conservatório. Suas primeiras composições datam desta época e incluem quatro trios para piano e cordas (Trios op.1), além de peças para piano. Já separei os 4 trios para postar. Rute, uma cantata bíblica, foi composta com sucesso no conservatório em 1846. Deixou inacabada a ópera Le Valet de Ferme, iniciada em 1851. Durante muitos anos, Franck levou uma vida retirada, dedicando-se ao ensino e a seus deveres de organista, adquirindo renome como improvisador. Escreveu também uma missa, motetos, peças para órgão e outros trabalhos de cunho religioso. Professor do Conservatório de Paris em 1872, naturalizou-se francês no ano seguinte. Sua primeira obra-prima é o poema sinfônico Les Béatitudes (1879). Foi recebida, no entanto, com frieza na única execução pública durante a vida do autor. Outros poemas sinfônicos de Franck são Les Éolides, de 1876, Le Chasseur Maudit, de 1883 e Psyche, de 1888, sendo que os dois primeiros já foram postados aqui e o último ainda será postado. A Sinfonia em ré menor, em três movimentos, é sua única obra nesse formato e tem aqui uma interpretação cheia de sentimentos românticos por Pierre Monteux (1875 – 1964).
Já, por sua vez, Vincent d’Indy (1851 – 1931) foi um compositor e professor francês. Aluno e discípulo de Franck ele seria o principal fundador da “Schola Cantorum” em Paris, onde deu aula para nomes como Roussel, Honegger e também para o americano Cole Porter. Compôs três sinfonias, as Variações Sinfônicas Istar, três óperas, canções, música de câmara, aberturas, e algumas peças para piano. (Carlinus. Textos com adaptações extraídos daqui e daqui)
A revista inglesa Gramophone (dezembro/2022) lista como gravações clássicas dessa Sinfonia de Franck as dos maestros Pierre Monteux, Charles Munch, Thomas Beecham e Vladimir Ashkenazy. São escolhas que dependem do gosto do freguês, é claro, mas são nomes de peso. (Pleyel)
Cesar Franck (1822-1890) – Sinfonia em Ré menor
1 – Lento – Allegro non troppo
2 – Allegretto
3 – Allegro non troppo
Chicago Symphony Orchestra
Pierre Monteux, regente (recorded: 1961)
Cesar Franck (1822-1890) – das ‘3 Peças para Grande Órgão’
4 – Pièce Heroïque (versão orquestral)
San Francisco Symphony
Pierre Monteux, regente (recorded: 1941)
Vincent d’Indy (1851-1931) – Variações Sinfônicas Istar, Op. 42
5 – I. Très lent
6 – II. Un peu plus animé
7 – III. Très animé
8 – IV. Le double plus vite
San Francisco Symphony
Pierre Monteux, regente (recorded: 1945)
200 anos de César Franck (Liège, 10 de dezembro de 1822 — Paris, 8 de novembro de 1890)
César Franck teve um papel importante na ressurreição do órgão francês. Admirada e imitada nos séculos 18 e 19 com compositores como Clérambault e a família Couperin, essa prestigiosa escola de compositores para órgão já estava enfraquecida quando a Revolução de 1789 e as guerras subsequentes levaram à ruína as igrejas e seus órgãos. César Franck, com a ajuda do construtor de órgãos Aristide Cavaillé-Coll (1811-1899), acordou do sono um instrumento cujo papel tinha sido reduzido ao de acompanhamento litúrgico ou exibicionismo desprovido de substância musical.
O órgão (construído em 1880) da Catedral Sainte-Croix de Orléans, onde foram gravadas essas obras de Franck pelo organista Pétur Sakari, é um dos mais bem preservados instrumentos da firma Cavaillé-Coll, responsável também pelo órgão (1859) que Franck tocava na igreja Sainte-Clotilde in Paris. “Meu novo órgão? É uma orquestra!”, disse Franck quando tocou pela primeira vez em um instrumento feito por Cavaillé-Coll. Também levam a assinatura Cavaillé-Coll o órgão (1869) da igreja Trinité onde tocava Messiaen, o da Madeleine (1846) onde tocava Saint-Saëns e muitos outros órgãos franceses, além de alguns outros pelo mundo (Moscou, Buenos Aires, Rio de Janeiro…)
Das obras de César Franck, quase todas as que ainda são lembradas hoje em dia foram escritas quando o compositor tinha mais de 50 anos, em um caso extremo de compositor com uma “última fase” de destaque. É o caso da Sonata para piano e violino (1886), da Sinfonia em ré menor (1889) e das principais obras para órgão. Os Três Corais foram escritos no seu último ano de vida (1890). A ideia de “corais para órgão” foi inspirada em J.S. Bach, mas Franck pensou os seus com uma diferença considerável: ao invés de utilizar hinos tradicionais e conhecidos dos frequentadores de igrejas, ele utilizou melodias originais, que se revelam apenas gradualmente “com grande imaginação”, como o próprio César Franck escreveu em uma carta para seu editor. Esses três corais fazem parte do repertório da maior parte dos grandes organistas desde então.
César Franck (1822–1890): Trois Pièces pour grand orgue, FWV 35-37 (1878)
1 Fantaisie. Andantino 16’16
2 Cantabile. Non troppo lento 6’50
3 Pièce héroïque. Allegro maestoso 9’39 Trois Chorals pour grand orgue, FWV 38-40 (1890)
4 Chorale No. 1 in E major. Moderato 15’37
5 Chorale No. 2 in B minor. Maestoso 15’32
6 Chorale No. 3 in A minor. Quasi allegro 15’20
Pétur Sakari, organist
Recording: January 2020 at the Cavaillé-Coll Organ (1880) of the Cathédrale Sainte-Croix, Orléans, France
200 anos de César Franck (Liège, 10 de dezembro de 1822 — Paris, 8 de novembro de 1890)
César Franck é um compositor com algumas características muito curiosas. Quase todas as suas obras que ainda são tocadas são as que ele escreveu quando tinha mais de 50 anos de idade e a Sonata para piano e violino é sem dúvida a que mais ouvimos por aí hoje em dia, tanto em gravações como ao vivo. Embora suas obras para piano sejam poucas, Franck entendia muito de piano – e também de órgão, claro, como veremos na postagem de amanhã. De violino, ele entendia menos: em sua famosa sonata, ele não usa técnicas como o pizicatto ou outras mais raras, de forma que o tom do violino é quase sempre cantante, melódico, e se é fácil para o violinista tocar todas as notas, o difícil é expressar a ampla palheta de sentimentos dos quatro movimentos, ao mesmo tempo que se deve manter a compostura pois é música cheia de diálogos de tipo contrapontístico, de variações sobre alguns poucos temas que vão reaparecendo ao longo dos movimentos. Para o pianista, por outro lado, há algumas passagens mais carregadas de notas, com o tema dando as caras no teclado junto a sofisticadas harmonias em arpejos e graves profundos.
Temos tantas gravações antológicas dessa sonata aqui no PQP Bach que na postagem de hoje, em comemoração ao seu aniversário, vou listar nada menos que sete interpretações notáveis, trazidas aqui ao longo dos anos por meus colegas de blog, sobretudo por FDP Bach que é talvez o mais romântico entre nós. Então vamos, em ordem cronológica, para evitarmos um tipo de competição nem sempre saudável…
Batiashvili e Gigashvili (2022)
Uma extraordinária violinista georgiana. O Franck deles me impressionou demais. Sua admirada Sonata para Violino traz um diálogo íntimo entre violino e piano, que vai do encanto terno à paixão fascinante. O momento introdutório do Allegretto ben moderato já mostra as muitas nuances de Batiashvili: sua qualidade de tom vibrante e fraseado fluido lembram vividamente a voz humana. As primeiras notas são um sussurro e um prenúncio do que está por vir. Bela interpretação! O desempenho de Gigashvili também é sólido: além de se alinhar perfeitamente às linhas do violino, ele adiciona profundidade aos grandes momentos e responde com sensibilidade às mudanças de cores harmônicas de Franck. (PQP Bach)
Faust e Melnikov (2017)
Única postagem de hoje no meio das outras recicladas. Isabelle Faust usa um violino Stradivarius de 1710 com cordas de tripas de boi ou de carneiro, Alexander Melnikov usa um piano Érard, circa 1885, ou seja, se enquadram na corrente das interpretações historicamente informadas (nome que pressupõe que as outras todas são ingênuas sobre aspectos históricos… mas aqui não é o momento para essa discussão espinhosa). Faust usa menos vibrato do que a média dos violinistas aqui listados, mas não pensem que ela faz um com totalmente seco e sem vibrato: ela solta suas emoções com equilíbrio e ponderação, virtudes importante ao se tocar Franck. O disco tem, no que seria o lado B, o Concerto para piano, violino e quarteto de cordas de Chausson (1855-1899), aluno e amigo de Franck. (Pleyel)
Ehnes e Armstrong (2015)
Poucas obras me emocionam tanto quanto esta Sonata de Cesar Franck. E nas mãos deste excepcional músico chamado James Ehnes ela se torna ainda mais emocionante. Li em algum lugar que Ehnes é o Heifetz do século XXI. Ele imprime na sua interpretação aquilo que sempre procuramos, e que encontramos apenas nos grandes mestres: clareza, objetividade, sem subterfúgios, fazendo parecer fácil o que não é. (FDP Bach)
Perlman e Argerich (1998)
A admiração entre ambos, sempre mútua e imensa, teve que esperar até o verão de 1998 para virar parceria nos palcos. O repertório não fugiu do habitual: a sonata de Franck, em que a Rainha já acompanhou tantos violinistas, e a “Kreutzer” de Beethoven, para a qual é difícil imaginar pianista melhor. O recital é uma deleite tão grande quanto devem ter sido seus bastidores. (Vassily)
Dumay e Pires (1993)
Gosto muito da sonata de Franck. Considero-a de extrema sensibilidade e delicadeza. Imagino sempre, ao ouvi-la, que estou deitado na relva, ao lado de um regato tranqüilo, com uma leve brisa soprando. (FDP Bach)
Gostei imensamente deste grande trabalho da portuguesa Pires e de seu estranho violinista francês Dumay. (PQP Bach)
Chung e Lupu (1977)
A cumplicidade entre os dois músicos está presente em todos os momentos, e o destaque novamente fica para a sonata de Franck, uma das melhores gravações que já ouvi desta obra. O Ravel e o Debussy só confirmam a qualidade, mesmo sendo obras pouco gravadas. (FDP Bach)
Ferras e Barbizet (1966)
Violino e piano cantam naturalmente, sem nunca tentar qualquer hegemonia. Pouquíssimos conseguiram tirar do violino sonoridades tão melancólicas, atormentadas e ao mesmo tempo elegantes. (Pleyel)
São muitas as nuances, muitas as formas de se agarrar as frases fugidias de Franck que escorrem pelas mãos como água… E isso porque não citamos os arranjos: para piano e flauta, para piano solo ou ou mais gravado, para piano e violoncelo. Após esse monte de interpretações possíveis de uma obra com um pé nos perfumes e fraseados românticos e outro pé firmemente plantado em um procedimento muito erudito de variações sobre curtos temas, um pouco de literatura, por que não? Ao descrever a Sonata de Vinteuil (personagem fictício com características de Franck, de Saint-Saëns, talvez de Fauré e Debussy), o escritor francês Marcel Proust (1871-1922) fala sobre um tema bem no estilo dos de Franck, com reaparições misteriosas. Em uma longa descrição de duas audições de música de câmara, ele compara a frase daquela sonata com uma pessoa desconhecida que Swann encontra sem saber seu nome, o que não impede uma profunda afinidade de se estabelecer, afinidade que reaparece apenas um ano depois por obra do destino.
No ano anterior, numa reunião, ouvira uma obra para piano e violino. Primeiro, só lhe agradara a qualidade material dos sons empregados pelos instrumentos. (…) Mas em um dado momento, sem que se pudesse distinguir nitidamente um contorno, dar um nome ao que lhe agradava, subitamente fascinado, procurava recolher a frase ou a harmonia – não sabia ele próprio – que passava e que lhe abria mais amplamente a alma, como certos perfumes de rosas, circulando no ar úmido da noite, tem a propriedade de dilatar as narinas. [… Depois,] distinguira nitidamente uma frase que se elevava durante alguns instantes acima das ondas sonoras. Ela logo lhe insinuara peculiares volúpias, que nunca lhe ocorreram antes de ouvi-la, que só ela lhe poderia ensinar, e sentiu por aquela frase como que um amor desconhecido.
Num lento ritmo ela o encaminhava primeiro por um lado, depois por outro, depois mais além, para uma felicidade nobre, ininteligível e precisa. E de repente, no ponto aonde ela chegara e onde ele se preparava para segui-la, depois da pausa de um instante, ei-la que bruscamente mudava de direção e num movimento novo, mais rápido, miúdo, melancólico, incessante e suave, arrastava-o consigo para perspectivas desconhecidas. Depois desapareceu. Ele desejou apaixonadamente revê-la uma terceira vez. E ela com efeito reapareceu, mas sem falar mais claramente, e causando-lhe uma volúpia menos profunda. Mas, chegando em casa, sentiu necessidade dela, como um homem que, ao ver passar uma mulher entrevista num momento na rua, sente que lhe entra na vida a imagem de uma beleza nova que dá maior valor à sua sensibilidade, sem que ao menos saiba se poderá algum dia rever aquela a quem já ama e da qual até o nome ignora.
(…) Mas, não conseguindo saber de quem era a obra que ouvira, não a pudera procurar e acabou esquecendo-a. Encontrara na mesma semana algumas pessoas que também se achavam naquela reunião e as interrogara; mas várias tinham chegado depois da música ou partido antes; algumas no entanto lá se achavam durante a execução, mas tinham ido conversar noutra sala, e outras que ficaram a escutar não tinham ouvido mais que o começo. Quanto aos donos da casa, sabiam que era uma obra nova que os artistas contratados tinham pedido para tocar: como estes haviam partido em turnê, Swann não pôde saber mais nada. Tinha muitos amigos músicos, mas, embora relembrasse o prazer especial e intraduzível que lhe causara a frase, vendo diante dos olhos as formas que ela desenhava, era, no entanto, incapaz de a cantar para eles. Depois deixou de pensar no assunto.
Ora, apenas alguns minutos depois que o pequeno pianista começara a tocar em casa da sra. Verdurin, eis que de súbito, após uma nota alta longamente sustida durante dois compassos, ele viu aproximar-se, escapando de sob aquela sonoridade prolongada e tensa como uma cortina sonora para ocultar o mistério de sua incubação, ele reconheceu, secreta, sussurrante e fragmentada, a frase aérea e odorante que o enamorara. E ela era tão particular, tinha um encanto tão individual que nenhum outro poderia substituir, que foi para Swann como se tivesse encontrado num salão amigo uma pessoa a quem admirara na rua e que desesperava de jamais tornar a ver. Afinal, ela afastou-se, guiadora, diligente, entre as ramificações de seu perfume, deixando no rosto de Swann o reflexo de seu sorriso. Mas agora podia perguntar o nome de sua desconhecida (disseram-lhe que era o andante da Sonata para piano e violino de Vinteuil), tinha-a segura, podia tê-la consigo quantas vezes quisesse e tentar aprender a sua linguagem e o seu segredo.
(…) O pintor ouvira dizer que Vinteuil estava ameaçado de alienação mental. E acrescentava que a gente o podia perceber em certas passagens da sua sonata. A Swann não pareceu absurda a observação, mas perturbou-o muito; pois, como uma obra de música pura não contém nenhuma dessas relações lógicas cuja alteração na linguagem denuncia a loucura, a loucura reconhecida numa sonata lhe parecia algo de tão misterioso como a loucura de uma cachorra, a loucura de um cavalo, que no entanto se observam realmente.
(No Caminho de Swann, tradução de Mario Quintana)
A princípio, não fiquei muito impressionado com as escolhas de Abbado aqui, mas, depois de ouvir mais atentamente, ele me conquistou completamente, com todas as sutilezas e nuances não audíveis em outros lugares, todinhas colocadas em seu devido lugar. Os excelentes músicos de Berlim realmente trazem outra dimensão ao trabalho, captado de maneira muito agradável pelos abençoados engenheiros da DG… Temos aqui uma grande versão da Sinfonietta e um excelente Diário. A Sinfonietta é uma obra prima. Trata-se de uma obra tardia, de 1926. Janáček pretendia expressar “o homem livre contemporâneo, sua beleza espiritual e alegria, sua força, coragem e determinação para lutar”. Tudo começou com Janáček ouvindo uma banda de metais, inspirando-se a escrever algumas fanfarras. Mais tarde, ele retirou a “coisa militar” da obra. O Diário é executado com base em uma orquestração de 1943 escrita por Ota Zitek (o original é para acompanhamento de piano). A partitura é muito fiel ao original sem tentar imitá-lo servilmente. Funciona muito bem! Recomendo a audição!
Leoš Janáček (1854-1928): Diário de um Desaparecido • Sinfonietta (Langridge, Balleys, Berliner Philharmoniker, Abbado)
Tagebuch Eines Verschollenen (Zápisník Zmizelého) Für Tenor, Alt, Drei Frauenstimmen Und Klavier
Orchestrated By – Ota Zítek, Václav Sedláček
(35:11)
1 I. Potkal Jsem Mladou Cigánki • Ich Traf Eine Junge Zigeunerin (Tenor) 1:13
2 II. Ta Černá Cigánka • Die Schwarze Zigeunerin (Tenor) 1:18
3 III. Svatojanské Mušky Tančíja • Die Johanniskäfer Tanzen (Tenor) 1:47
4 IV. Už Mladé Vlaštúvky • Es Zwitschern Die Jungen Schwalben (Tenor) 0:55
5 V. Tĕžko Sa Mi Oře • Das Pflügen Geht So Schwer (Tenor) 0:46
6 VI. Hajsi, Vy Siví Volci • Heia, Ihr Grauen Ochsen (Tenor) 1:28
7 VII. Ztratil Sem Količek • Ich Verlor Den Pflock (Tenor) 0:52
8 VIII. Nehled’te, Volečci • Schaut Nicht, Ihr Lieben Ochsen (Tenor) 1:12
9 IX. Vítaj, Janičku • Sei Willkommen, Janiček (Alt, Tenor, Chor) 2:31
10 X. Bože Dálný, Nesmrtelný • Du Ferner, Unsterblicher Gott (Alt, Chor) 4:23
11 XI. Táhne Vuňa K Lesu • Ein Duft Durchzieht Den Wald (Tenor, Alt) 3:10
12 XII. Tmavá Olšinka, Chladná Stidénka • Dunkles Erlengehölz, Kühles Brünnlein (Tenor) 1:02
13 XIII. * * * (Orchester) 2:58
14 XIV. Slnéčko Sa Zdvihá • Die Sonne Geht Auf (Tenor) 1:03
15 XV. Moji Sivi Volci • Meine Grauen Ochsen (Tenor) 0:56
16 XVI. Co Sem To Udĕlal? • Was Hab Ich Bloß Getan? (Tenor) 1:18
17 XVII. Co Komu Súzeno • Was Einem Bestimmt Ist, Dem Entkommt Man Nie (Tenor) 1:43
18 XVIII. Bedbám Já Včil O Nic • Das Einzige, Was Mich Noch Kümmert (Tenor) 1:04
19 XIX. Letí Straka • Es Fliegt Die Elster (Tenor) 1:16
20 XX. Mám Já Panenku • Ich Habe Ein Mädchen (Tenor) 0:44
21 XXI. Muj Drahý Tatíčku • Mein Teures Väterchen (Tenor) 0:49
22 XXII. S Bohem, Rodný Kraju • Ade, Mein Heimatland (Tenor) 2:18
Sinfonietta
(23:05)
23 I. Allegretto 2:16
24 II. Andante 5:45
25 III. Moderato 5:05
26 IV. Allegretto 2:58
27 V. Andante Con Moto 6:55
Chorus – Damen des RIAS Kammerchors* (faixas: 9, 10)
Chorus Master – Marcus Creed
Chorus Master [Language Coach] – Dr. Elisabeth Rajter
Composed By – Leoš Janáček
Conductor – Claudio Abbado
Contralto Vocals – Brigitte Balleys (faixas: 10, 11)
Orchestra – Berliner Philharmoniker
Orchestrated By – Ota Zítek (faixas: 1 to 22), Václav Sedláček (faixas: 1 to 22)
Tenor Vocals – Philip Langridge (faixas: 1 to 9, 11, 12, 14 to 22)
Beethoven – The Late Sonatas Op. 101 e 106 marca a conclusão da revisão de Maurizio Pollini sobre as cinco últimas sonatas do compositor. Suas gravações marcantes dessas obras na década de 1970 foram reconhecidas na época com o Prêmio Gramophone. Há alguns anos o pianista decidiu revisitar as cinco sonatas, e em 2019 fez uma aclamada segunda gravação das três finais no Herkulessaal em Munique. Agora ele voltou ao mesmo salão para gravar Op. 101 e 106 – entre as obras tecnicamente mais desafiadoras e aventureiras do repertório de concertos.
A natureza quixotesca da Sonata em lá maior de Beethoven, Op. 101, e as complexidades da Sonata “Hammerklavier”, Op. 106, oferecem possibilidades infinitas de interpretação. “Cada sonata para piano de Beethoven é um mundo diferente”, observa Maurizio Pollini. “Ele encontra um personagem diferente em cada uma, da primeira à última. Cada uma é única.” A Sonata Op. 101 é muito livre. Elaborada no verão de 1815 e concluída no ano seguinte, seus quatro movimentos são marcadamente diferentes em estilo e substância das sonatas anteriores do compositor. “É um grande desafio entendê-la e tocá-la”, diz Pollini. A escala de desafio, no entanto, empalidece ao lado do estabelecido por Beethoven na Sonata “Hammerklavier”. A obra é tão difícil que permaneceu sem ser executada em público após sua publicação em 1819, até que o jovem Franz Liszt mostrou o caminho dezessete anos depois na Salle Érard de Paris. Pollini a descreve como a “maior sonata de Beethoven”. Seu movimento lento sozinho é quase tão longo quanto todos os quatro movimentos de sua companheira de álbum. “Você pode pensar na Marcha Fúnebre da Sinfonia ‘Eroica’ – esses são talvez os dois maiores movimentos que Beethoven já compôs”, sugere o pianista. A transição para a fuga do quarto e último movimento, um Largo sublime, dissolve as percepções comuns de tempo e espaço, é como se fosse aberta uma porta para uma dimensão espiritual inacessível. Ele prepara o caminho para uma fuga a três vozes. “Às vezes, considera-se que Beethoven voltou ao espírito da música antiga em suas últimas obras, mas isso está completamente errado”, conclui Pollini. “Ele usa velhas técnicas para renovar sua música.”
Maurizio Pollini é um capítulo à parte. Meu. Deus. Aos 80 anos, tio Maurizio resolveu regravar umas coisinhas, pois segue descobrindo e descobrindo. E vocês sabem que tocar a Hammer na idade dele é um considerável desafio físico, né? E ele o faz ao vivo, tolerando errinhos, de forma mais atirada e muito menos clínica que nas gravações mais antigas. Disse um amigo que esta gravação seria uma desleitura de Schnabel, que Pollini sempre mencionou como um modelo. Imperdível mesmo!
Ludwig van Beethoven (1770-1827): Sonatas para Piano Op. 101 e 106 (Pollini, 2022)
1. Sonata para Piano No. 28 em Lá Maior, Op. 101 – I. Etwas lebhaft und mit der innigsten Empfindung. Allegretto ma non troppo (3:21)
2. Sonata para piano nº 28 em lá maior, op. 101 -II. Lebhaft, marschmäßig. Vivace alla marcia (5:48)
3. Sonata para piano nº 28 em lá maior, op. 101 – III. Langsam und sehnsuchtsvoll. Adagio ma non troppo, con affetto (2:20)
4. Sonata para piano nº 28 em lá maior, op. 101 – IV. Geschwind, doch nicht zu sehr und mit Entschlossenheit. Allegro (6:59)
5. Sonata para piano nº 29 em si bemol maior, op. 106 “Hammerklavier” – I. Allegro (9:31)
6. Sonata para piano nº 29 em si bemol maior, op. 106 “Hammerklavier” – II. Scherzo. Assai vivace (2:23)
7. Sonata para piano nº 29 em si bemol maior, op. 106 “Hammerklavier” – III. Adagio sostenuto (15:13)
8. Sonata para piano nº 29 em si bemol maior, op. 106 “Hammerklavier” – IV. Largo – Allegro risoluto (11:05)
Mais um CD recente com obras de Brahms, e que CD, senhores !!! Sempre é bom sangue novo se aventurando por estas plagas.
Impossível ouvir esse CD sem um sorriso, esse repertório é único, quase perfeito, eu diria. Juntar as Sonatas para Violoncelo de Brahms e de Rachmaninov e o Trio para Clarinete do mesmo Brahms resultou em um CD lindíssimo, romântico até as veias. A parceria da pianista Yuja Wang com o violoncelista Gautier Capuçon novamente rendeu belos frutos, e temos aqui uma interpretação enxuta, correta, e principalmente em se tratando desse repertório, nada de excessos.
A Sonata nº1 de Brahms, para Violoncelo e Piano é uma de minhas obras favoritas desse compositor, e exige dos musicos muita concentração. Ela é intensa, dramática, por vezes temos a impressão de que o violoncelo está quase chorando, em um lamento. Ambos instrumentos tem voz própria, em uma espécie de diálogo, e nenhum deixa o outro ‘falando sozinho’. Já ouvi essa obra dezenas de vezes, e a cada audição descubro novos detalhes, nuances, nada ali é por acaso, como é característica na obra de Brahms.
A segunda obra que temos nesse CD é a Sonata para Violoncelo de Rachmaninov. Uma curiosidade aqui é que é a segunda vez que Capuçon grava essa obra, a primeira foi acompanhando sua então esposa, a pianista Gabriela Montero. E assim como no CD anterior da dupla Wang / Capuçon, onde interpretam Chopin e Franck, a química entre eles continua forte, seja no Brahms, seja no Rachmaninov. Com certeza são dois dos maiores intérpretes de seus instrumentos na atualidade.
O Trio para Clarinete dispensa apresentações, é uma das obras principais de Brahms, uma obra prima indiscutível. Tenho muitas boas lembranças relacionadas a essa obra. Uma delas é a de uma ensolarada tarde de um sábado ou domingo, em um verão de minha juventude, morando sozinho na selva de concreto paulistana. Nos fundos da casa que dividia com outra pessoa havia uma varanda, e dali eu tinha uma bela visão do Bairro da Aclimação. Eu tinha um belo panorama do bairro, e a lembrança que me vem é de estar ali sentado, em um final de tarde, ouvindo esse Trio e vendo a noite chegar, e as luzes irem se acendendo nas casas e prédios da vizinhança. Foi uma época difícil de minha vida, amores mal resolvidos e a vontade de largar tudo e voltar para a sombra familiar, o que acabou acontecendo. A sensação de solidão que me invadia nessa época era compensada pela música, principalmente a de Brahms. Hoje, passados trinta anos, posso dizer que foi um período de transição na minha vida, tomadas de decisão são difíceis quando temos pouco mais de vinte anos de idade, e as incertezas são muitas. E a música de Brahms foi com certeza a trilha sonora daquela época.
Cello Sonata No. 1 In E Minor, Op. 38
Composed By – Johannes Brahms
1 I. Allegro Non Troppo
2 II. Allegretto Quasi Menuetto
3 III. Allegro. Piu Presto
Cello Sonata In G Minor, Op. 19
Composed By – Sergei Vasilyevich Rachmaninoff
4 I. Lento. Allegro Moderato
5 II. Allegro Scherzando
6 III. Andante
7 IV. Allegro Mosso
Clarinet Trio in A Minor, Op. 114
Composed By – Johannes Brahms
8 I. Allegro
9 II. Adagio
10 III. Andantino Grazioso
11 IV. Allegro
Yuja Wang – Piano
Gautier Capuçon – Cello
Andreas Ottensamer – Clarinet
Jazz por Shostakovich? E recebeu uma Gramophone’s Choice e relançamento anos depois na série The Originals? Bem, este maravilhoso CD não bem isso. As incursões animadas e cativantes de Shostakovich na música popular de seu tempo estavam muito longe de Jelly Roll Morton ou Duke Ellington. como vocês poderão comparar. Essas coloridas suítes de jazz chaplinescas ficam mais próximas de Gershwin, Milhaud e outros. Aqui, Shostakovich faz uma espécie de paródia — aliás, suas maiores obras também possuem episódios assim. Além disso, o jazz “real” era tratado com desconfiança na Rússia soviética e, portanto, a exposição de Shostakovich a ele era limitada. Chailly e a RCO trazem linda música, lindamente tocada e gravada. Tudo cheio de valsas e polcas. Realmente mostra a versatilidade de Shostakovich — muitas vezes nem soa como ele. É leve, arejado, divertido, harmonicamente ousado em alguns momentos, mas sempre muito gostoso de ouvir. Ah, e tem uma baita versão do belo Concerto Nº 1 para Piano e Orquestra. Ouça e divirta-se.
Dmitri Shostakovich (1906-1975): The Jazz Album (RCO, Chailly)
Jazz Suite No. 1
1 Waltz 2:37
2 Polka 1:41
3 Foxtrot 3:38
Piano Concerto No. 1 In C Minor, Op. 35 (Concert For Piano, Trumpet And Strings)
4 Allegretto 5:36
5 Lento 8:04
6 Moderato 1:44
7 Allegro Con Brio 6:28
Jazz Suite No. 2 (Suite For Promenade Orchestra)
8 March 3:04
9 Lyric Waltz 2:35
10 Dance 1 2:57
11 Waltz 1 3:19
12 Little Polka 2:32
13 Waltz 2 3:41
14 Dance 2 3:34
15 Finale 2:19
16 Tahiti Trot (Tea For Two) 3:33
Piano – Ronald Brautigam
Trumpet – Peter Masseurs
Royal Concertgebouw Orchestra
Riccardo Chailly
Nos últimos anos, não tenho perdido ocasião de ouvir András Schiff, seja o dos anos 1970 e 80 (aqui), seja o deste disco de hoje gravado em 2010, seja o senhor de cabelos brancos que rapidamente se adaptou às lives dos anos 2020, generosamente permitindo que gente de todo o mundo o assistisse durante a pandemia de COVID-19, quando ele fez seus recitais ao vivo no Wigmore Hall para públicos presenciais muito reduzidos (mas ao vivo no YouTube) tocando Schubert com Mozart, Bach com Beethoven, Schumann com Janáček, Trios de Haydn…
Pela lista acima, dá pra notar que Schiff é um especialista no repertório germânico e da Europa Central. Sua gravações de Bartók também são imperdíveis. No disco de hoje, Schiff aborda várias obras de Schumann, a maioria delas compostas quando ele tinha menos de 30 anos, mas também as Cenas da Floresta (Waldszenen), de quando o compositor já se aproximava dos 40, e as Variações-Fantasma (Geistervariationen), sua última obra, que teria sido ditada por vozes que ele ouvia em seus difíceis últimos anos: em um momento ele disse que era a voz de anjos, em outro, garantia que era o espírito de Schubert.
O pianista e professor francês Alfred Cortot costumava dizer sobre Schumann: “O que torna sua arte tão emocionante, tão próxima de nós, tão fraternal, é que antes de sentir a sua genialidade, sentimos os batimentos de um coração parecido com o nosso. Com Schumann, não pensamos nos problemas composicionais que ele resolveu, só temos ouvidos para as emoções que surgem de sua música. Como se se tratasse de um constante estado de improvisação, do qual jorram maravilhosas melodias, cada uma delas contando segredos – incluindo os nossos.” Há outras interpretações de Schumann em que todas essas emoções queimam com um fogo mais quente (aqui e aqui), outras com mais delicadeza (aqui e aqui), mas o que Schiff traz de forma muito única é um certo sarcasmo, um senso de humor que coloca Schumann como um improvável precursor de Bartók, Prokofiev e outros compositores que expressam um amplo espectro de emoções sarcásticas e cômicas. Sem perder com isso o sentimentalismo, é claro, pois Schiff nos apresenta as belas paisagens e o pássaro das Cenas da Floresta, toda a força e seriedade da Fantasia op. 17 em homenagem a Beethoven, etc. Tudo isso, porém, Schiff o faz sem tirar o sorriso do rosto.
E mais um detalhe para os fãs de Schumann: Schiff gravou a Fantasia op. 17 utilizando uma partitura alternativa do último movimento, com correções escritas à mão por Schumann e conservada em uma biblioteca em Budapeste. Na última página, segundo Schiff, essa versão alternativa tem uma grande surpresa em relação à versão mais famosa… e mais não falaremos, afinal vamos deixar que nossos leitores-ouvintes mais atentos encontrem a tal surpresa.
Robert Schumann (1810-1856):
CD1:
Papillons (Butterflies), Op. 2
Piano Sonata No. 1 in F sharp minor, Op. 11
Kinderszenen (Scenes from Childhood), Op. 15
CD2:
Fantasie (Obolen auf Beethovens Monument) in C major, Op. 17
Waldszenen (Forest Scenes), Op. 82
Variations on an original theme, in E flat major (Geistervariationen), WoO 24
András Schiff, piano
Recorded: june 2010, Historical Reitstadel, Neumarkt
O álbum foi gravado no Reitstadel em Neumarkt, Alemanha. O antigo depósito de grãos e armas construído em 1539, foi convertido para uma sala de concertos
Faz algum tempo postei aqui o que considero uma das realizações mais importantes da música instrumental brasileira: os 4 discos do Quinteto Armorial. Esse grupo pernambucano começou a gravar em 1974 e infelizmente não gravou mais depois de 1980.
Interessantemente, no ano seguinte começa a carreira discográfica do outro grupo cujo trabalho eu vejo entre os mais importantes da música instrumental brasileira – e me inclino a dizer que entre as realizações musicais mais relevantes do fim do século XX no mundo: o grupo mineiro (levado ao forno na Bahia) Uakti (nome indígena que por muito tempo eu pronunciei “uákti” e depois me disseram ser “uaktí”).
O Uakti toca principalmente composições de seu fundador Marco Antônio Guimarães, com algumas poucas composições alheias (especialmente canções de Milton Nascimento) arranjadas pelo próprio Marco para o instrumental experimental desenvolvido por ele.
A propósito desse instrumental, o site oficial do grupo traz fotos e algumas informações mais, porém bastante lacônicas. Os encartes originais destes 3 vinis trazem informação rica, mas só terei novamente em mãos daqui a alguns meses. Por outro lado, as melhores informações que encontrei sobre o próprio Marco e se background estão no artigo “Grupo Uakti”, de Artur Andrés Ribeiro. Foi lá que fiquei sabendo o seguinte:
Marco Antônio Guimarães nasceu em Belo Horizonte em 1948, em uma família com raízes no interior e forte tradição de trabalho artesanal em madeira, couro, metal, etc. Na época de sua juventude a Universidade Federal da Bahia havia se tornado um dos principais polos de inovação musical no Brasil, inicialmente com a presença de Hans Joachim Koellreuter, e depois com os suíços Ernst Widmer e Walter Smetak – este uma espécie de cientista maluco da invenção de instrumentos e da experimentação musical radical. Marco se mudou para Salvador para estudar Regência e Composição, e o encontro com Smetak veio de brinde, abrindo a perspectiva de fundir sua própria busca musical com a tradição artesanal da família.
Mas a relação com Smetak é até demasiado óbvia. O que me interessou mais foi a relação com o outro suíço, Ernst Widmer (1927-1990), o qual veio para o Brasil com 29 anos, 4 anos depois se naturalizou, e conseguiu melhor que muitos brasileiros natos realizar a síntese de escrever música moderna efetivamente brasileira. Widmer desenvolveu inclusive uma série de cinco volumes para o ensino do piano, com um conceito geral análogo ao do Mikrokosmos de Béla Bartók, intitulada Ludus Brasiliensis. Widmer parece um tanto esquecido no momento, mas não é de nenhum modo um compositor menor – e será fantástico se a música do Uakti, entre suas outras virtudes, ainda tiver a de nos chamar atenção para a obra desse compositor.
Voltando ao ponto de partida: ao contrário do Quinteto Armorial, que gravou só quatro discos, todos em uma década, o Uakti já tem doze gravados, de 1981 a 2009 – incluindo Águas da Amazônia, de 1999, composição de Philip Glass instrumentada por Marco Antônio a pedido do primeiro. A tentação inicial é dizer que o som do Armorial se volta ao passado, ao tradicional, ao arcaico, e o do Uakti soa de algum modo “futurista” – mas definitivamente não é tão simples assim; inclusive há momentos em que as sonoridades dos dois se cruzam, conversam.
Por outro lado, em trabalhos posteriores às vezes há momentos em que o som do Uakti parece se aproximar algo perigosamente de um mero “new age”. Consequências da colaboração com Glass? Não sei. O trabalho que me bate mais forte ainda é o terceiro, “Tudo e Todas as Coisas”, o último desta postagem – mas talvez seja questão de se aprofundar: estes três eu conheço desde o lançamento, os outros só vim a conhecer agora.
Ficaram querendo os próximos, né? Especialmente o das composições de Glass… Calma, estão no forno! Eu não iria me arriscar a falar deles pra vocês sem estar prevenido, hehehehe…
UAKTI OFICINA INSTRUMENTAL (1981)
1 Promessas do Sol (Milton Nascimento, Fernando Brant – arr. M.A.Guimarães)
2 Dança da chuva (Marco Antônio Guimarães)
3 Maíra (Marco Antônio Guimarães)
4 As nove esferas (Marco Antônio Guimarães)
5 Uakti (Uakti)
6 Planeta-terra (Marco Antônio Guimarães)
UAKTI 2 (1982)
1 Canto de Iarra [Dança das espadas] (Marco Antônio Guimarães)
2 Cio da Terra (Chico Buarque, Milton Nascimento – arr. M.A.Guimarães)
3 Arabesque (Bento de Menezes Neto)
4 Cartiano Marra (Marco Antônio Guimarães)
5 Passo da Lua (Marco Antônio Guimarães)
6 Barroca [Mil e uma noites] (Marco Antônio Guimarães)
7 Marimba d’Angelim (Marco Antônio Guimarães)
TUDO E TODAS AS COISAS (1984)
1 Água (Marco Antônio Guimarães)
Vidro (Marco Antônio Guimarães)
2 As 7 tribos (Marco Antônio Guimarães)
3 O ovo da serpente (Marco Antônio Guimarães)
4 A grande virgem [Para Walter Smetak – In memoriam]
(Rufo Herrera, Marco Antônio Guimarães)
5 Dança das abelhas (Marco Antônio Guimarães)
Flor e mel (Marco Antônio Guimarães)
6 Pêndulo celeste [Para o cometa Halley] (Artur Andrés Ribeiro)
Lua Ganimedes (Marco Antônio Guimarães)
7 Árvore da vida (Marco Antônio Guimarães)
8 Maracatu Elefante (Marco Antônio Guimarães)
Integrantes regulares:
Marco Antônio Guimarães, Paulo Santos, Artur Andrés, Décio Ramos
Eu amo os belos e também zombeteiros Concertos para Piano de Shostakovich! Para um virtuoso tão consumado como Marc-André Hamelin, estes concertos podem parecer quase como um passeio no parque. Certamente, o famoso comando técnico do canadense está mais empolgante do que nunca. Mas isso não significa que Hamelin seja insensível aos muitos tons de voz mais calmos da música. O exemplo claro disso é seu tratamento dos movimentos lentos – o do número 2 pode até ser um tom lânguido demais para alguns gostos (embora não para o meu). As gravações próprio compositor em 1959 em Paris, feitas quando sua técnica já estava começando a ser desafiada pela debilidade muscular que o atormentaria pelo resto de sua vida, oferecem insights inestimáveis sobre sua personalidade musical e Hamelin certamente o ouviu — o final do número 1 comprova. O Segundo Concerto de Shchedrin é um dos exemplos mais inventivos do antigo poliestilismo soviético, mantendo um equilíbrio entre diferentes técnicas e um toque de jazz. É uma boa companhia para Shosta.
Dmitri Shostakovich (1906-1975): Concertos para Piano Nº 1 e 2 / Rodion Shchedrin (1932): Concerto para Piano Nº 2 (Hamelin / Litton)
Piano Concerto No 1 In C Minor Op 35 (1933) (22:14)
1 Allegro Moderato – 5:40
2 Lento – 8:27
3 Moderato – 1:33
4 Allegro Con Brio 6:31
Piano Concerto No 2 In F Major Op 102 (1957) (19:16)
5 Allegro 6:50
6 Andante – 7:18
7 Allegro 5:05
Piano Concerto No 2 (1966) (21:26)
8 Dialogues: Tempo Rubato 9:02
9 Improvisations: Allegro 4:21
10 Contrasts: Andante – Allegro 7:57
Composed By – Dmitri Shostakovich (faixas: 1 to 7), Rodion Shchedrin* (faixas: 8 to 10)
Concertmaster [Leader Of Orchestra] – Marcia Crayford
Conductor – Andrew Litton
Orchestra – BBC Scottish Symphony Orchestra
Trumpet – Mark O’Keeffe (faixas: 1 to 4)
Angela Hewitt regravou estas obras de Bach. A nova gravação está AQUI. Divirtam-se neste e naquele post!
Esta postagem é de 2012… Devia estar totalmente sem tempo, porque apenas grudei abaixo um texto da Wikipedia.
As Partitas, BWV 825–830, são um conjunto de seis suítes de cravo escritas por Johann Sebastian Bach, e publicadas entre 1726 e 1730, em Leipzig, sob o título da primeira parte dos trabalhos publicados durante a sua vida, e que se chamaram: Clavierübung. Elas foram as últimas das suas suites compostas para teclado as outras sendo, as Seis Suites Inglesas, BWV 806-811 e as Seis Suites Francesas, BWV 812-817.
As partitas, que foram publicadas na primeira parte da publicação de quatro partes total do Clavierübung, durante a vida de Bach, são consideradas o sumo do exercício da técnica extrema da composição de Bach para o teclado.
Exatamente como as outras duas suites prévias, as francesas e as inglesas, todas as “Seis Partitas” seguem o esquema básico da suíte: “allemande-courante–sarabanda e giga“. Neste esqueleto (cada uma possui variedade em seu próprio formato), primeiramente, colocando um movimento de abertura distinto (um prelúdio, uma sinfonia ou fantasia, ou mesmo uma abertura) que determinaria a cor e o temperamento de cada suite e, em seguida, pelas galantarias—danças opcionais—que ele adicionava opcionalmente nos finais das suítes. A variedade sempre aumenta mais em não colocar peças especificamente para danças, como um rondeau e burlesca, o que contribuiu muito para a continuidade da música e caráteres em cada suíte. Na “Partita nº2”, Bach escolheu um capríccio para colocar no final da giga.
Bach mistura, o que parece ser aleatoriamente, as tonalidades para cada grupo de partita, sendo elas “Si bemol Maior; do menor; lá menor; Ré Maior; Sol Maior; e mi menor.” Pelo menos assim parece ao primeiro olhar. Mas, olhando mais profundamente, a gente vê que Bach tem um esquema muito complexo, e ele escolhe expandir os intervalos para cima e para baixo, assim: 2ª (para cima), 3ª (para baixo), 4ª (cima), 5º (baixo), 6ª (cima) (isto é: de Sib a do menor é o intervalo de 2ª para cima; de do a lá menor, é o intervalo de 3ª para baixo; de lá a Ré, é 4ª (cima), assim por diante dando um caráter híbrido (crescendo) de dupla dimensão.
Bach, obviamente gostou desta experiência toda, pois nos próximos dez anos ele compôs e publicou em prestações, mais 3 coletâneas do Clavierübung (“livro para o cravo”)—o mais completo estudo explorando a arte dos instrumentos de teclado que já foi publicado dos compositores barrocos alemães.
J. S. Bach (1685-1750): As 6 Partitas
Disc: 1
1. Partita No. 1 In B Flat Major, BWV 825: Praeludium
2. Partita No. 1 In B Flat Major, BWV 825: Allemande
3. Partita No. 1 In B Flat Major, BWV 825: Corrente
4. Partita No. 1 In B Flat Major, BWV 825: Sarabande
5. Partita No. 1 In B Flat Major, BWV 825: Menuet I – Menuet II – Menuet I da capo
6. Partita No. 1 In B Flat Major, BWV 825: Giga
7. Partita No. 2 In C Minor, BWV 826: Sinfonia: Grave adagio – Andante – Allegro
8. Partita No. 2 In C Minor, BWV 826: Allemande
9. Partita No. 2 In C Minor, BWV 826: Courante
10. Partita No. 2 In C Minor, BWV 826: Sarabande
11. Partita No. 2 In C Minor, BWV 826: Rondeaux
12. Partita No. 2 In C Minor, BWV 826: Capriccio
13. Partita No. 4 In D Major, BWV 828: Ouverture – Allegro
14. Partita No. 4 In D Major, BWV 828: Allemande
15. Partita No. 4 In D Major, BWV 828: Courante
16. Partita No. 4 In D Major, BWV 828: Aria
17. Partita No. 4 In D Major, BWV 828: Sarabande
18. Partita No. 4 In D Major, BWV 828: Menuet
19. Partita No. 4 In D Major, BWV 828: Gigue
Disc: 2
1. Partita No. 3 in A Minor BWV 827: Fantasia
2. Partita No. 3 in A Minor BWV 827: Allemande
3. Partita No. 3 in A Minor BWV 827: Corrente
4. Partita No. 3 in A Minor BWV 827: Sarabande
5. Partita No. 3 in A Minor BWV 827: Burlesca
6. Partita No. 3 in A Minor BWV 827: Scherzo
7. Partita No. 3 in A Minor BWV 827: Gigue
8. Partita No. 5 in G Major BWV 829: Praeambulum
9. Partita No. 5 in G Major BWV 829: Allemande
10. Partita No. 5 in G Major BWV 829: Corrente
11. Partita No. 5 in G Major BWV 829: Sarabande
12. Partita No. 5 in G Major BWV 829: Tempo di Minuetta
13. Partita No. 5 in G Major BWV 829: Passepied
14. Partita No. 5 in G Major BWV 829: Gigue
15. Partita No. 6 in E Minor BWV 830: Toccata – (Fugue)
16. Partita No. 6 in E Minor BWV 830: Allemande
17. Partita No. 6 in E Minor BWV 830: Corrente
18. Partita No. 6 in E Minor BWV 830: Air
19. Partita No. 6 in E Minor BWV 830: Sarabande
20. Partita No. 6 in E Minor BWV 830: Tempo di Gavotta
21. Partita No. 6 in E Minor BWV 830: Gigue
Nossa adorada Anne-Sophie volta ao Concerto Duplo de Brahms, desta vez ao lado de um jovem violoncelista, Pablo Ferrández (não está escrito errado não), e de seus fiéis companheiros na sua longa trajetória, Lambert Orkis e Manfred Honeck.
O Concerto Duplo de Brahms é uma peça única, sem dúvidas. . Ouço esse concerto já há muito tempo, quando a mesma Anne-Sophie o gravou com o nosso Antonio Meneses ao lado do Kaiser Karajan. Foi um disco que causou um grande impacto em minha formação, e até hoje tenho muito carinho por ele. Posteriormente me cairam em mãos as históricas gravações de Oistrak / Rostropovitch, aí admirei ainda mais essa obra.
Em sua biografia de Brahms, Malcolm McDonald assim nos apresenta essa fantástica obra:
“Longe de ser o menor, o Concerto Duplo é sem dúvida o mais romântico de todos os seus concertos, talvez de todas as suas obras orquestrais, e de um modo que provém da própria natureza dos instrumentos. Tratados como solistas em plano de igualdade, os dois instrumentos de corda, tão assemelhados em construção e tão diferentes em caráter, sugerem inevitavelmente o diálogo – e diálogo, mais ainda, masculino-feminino. O violino é algumas vezes um feminino afirmativo e o violoncelo algumas vezes um masculino maleável e sonhador, mas as polaridades fundamentais são construídas na sonoridade deles. E sobre o que falam, no universo romântico, o homem e a mulher? Embora nervosamente, sinfônico e incrivelmente rico em construção, é quase fantasioso caracterizar o Concerto Duplo como música de amor praticamente contínua. Brahms passou a vida compondo canções de amor, mas algumas de suas mais íntimas e mais profundamente sentidas foram sempre as sem palavras (…)”.
Brahms compôs a obra sempre pensando em seu amigo Joseph Joachim, um renomado violinista da época, e no violoncelista Haussmann, que tocava no Quarteto de Cordas de Joachim, e a obra foi apresentada pela primeira vez para a sua amiga Clara Schumann, em uma formação para trio, tendo Brahms tocado a parte orquestral ao piano.
Sua estréia oficial, com os mesmos dois solistas, foi recebida com ressalvas pela audiência e pela crítica especializada, que estranhou a conjunção dos dois instrumentos. Só com o passar dos anos foi sendo compreendida, e mesmo assim é pouco executada até mesmo nos dias de hoje.
Anne-Sophie Mutter conhece muito bem essa obra, já a gravou em sua juventude, com Karajan, ao lado do brasileiro Antonio Meneses, como comentei acima, para quem se interessar o link foi atualizado há alguns anos e podem achar esse CD aqui. Gostei imensamente de ouvi-la tocando novamante essa obra, agora uma mulher madura e muito experiente. A parceria com Herrández funciona perfeitamente, e somos apresentados a um instrumentista que ainda vai nos proporcioar muito prazer.
A obra que encerra o CD é o belo Trio para Piano, Violino e Violoncelo, de Clara Schumann.
Johannes Brahms – Concerto para Violino e Violoncelo, op. 104
01 – I. Allegro
02 – II. Andante
03 – III. Vivace non troppo
Anne-Sophie Mutter – Violino
Pablo Ferrández – Violoncelo
Czech Philharmonic Orchestra
Manfred Honneck – Conductor
Clara Schumann – Trio para Piano, Violino e Violoncelo
04 – I. Allegro moderato
05 – II. Scherzo – Tempo di menuetto – Trio
06 – III. Andante
07 – IV. Allegretto
Anne-Sophie Mutter – Violino
Pablo Ferrández – Violoncelo
Lambert Orkis – Piano
Ao mudar o nome de uma de suas composições – originalmente 8’37”, em homenagem aos 4’33” de John Cage – para homenagear as vítimas da bomba de Hiroshima, Penderecki não podia imaginar que essa obra faria dele uma celebridade internacional. Pouco depois, em 1961, a obra receberia um grande prêmio da UNESCO, não só por méritos musicais mas também pelo caráter pacifista que a composição adquiriu. Penderecki explicava que, da primeira vez que ouviu a composição ser tocada, ficou impressionado com o impacto emocional e resolveu alterar o nome para Trenódia para as vítimas de Hiroshima. Na Grécia antiga, uma trenódia (do grego antigo θρῆνος / thrênos, de θρέομαι / thréomai, “gritar com força”) era um lamento fúnebre nos funerais, antes de se tornar um estilo literário.
A Trenódia é escrita para orquestra de cordas, em uma linguagem extremamente inovadora, usando algumas técnicas que à época eram comuns na música eletroacústica, mas que Penderecki adapta para instrumentos tradicionais. Os 24 violinos são divididos em quatro grupos; as dez violas, em dois, assim como os dez violoncelos e os oito contrabaixos. Uma linha em zigue-zague mostra a ordem de entrada de cada grupo. O compositor também explica que, em seus anos de formação, “tudo começou com o violino, quando criança eu sempre sonhei em me tornar um virtuoso do violino. Foi o violino, não o piano, que me inspirou em minhas primeiras peças… Eu escrevo sobretudo música para cordas, elas são onipresentes na minha criação.”
Semitha Cevallos nos traz mais algumas direções para navegarmos nesse universo: Penderecki alcançou riqueza de invenção nas cordas, criando maneiras de tocar totalmente novas. Ao lado de técnicas já conhecidas como arco e pizzicato, ele fez uso de vários tipos de vibratos rápidos e lentos. Utilizou também as conhecidas técnicas como legno battuto, col legno e sul ponticello, que eram pouco empregadas até então. Os instrumentos e cordas na obra de Penderecki são utilizados como percussão, pois utilizam o arco e as mãos para obter efeitos percussivos ao tocar as cordas e todo o corpo do instrumento. Outras inovações são as observações como “alcançar a nota mais aguda possível de dado instrumento, pela pressão da corda perto do arco”, “bater no corpo do violino, arranhando o estandarte”.
A proximidade com a música eletroacústica pode ser percebida na notação musical: Penderecki trouxe para a música instrumental a grafia da música eletroacústica. Para as notas, o compositor utiliza retângulos e triângulos, fazendo menção aos clusters e glissandos. Ao ouvir a música de Penderecki e de outros sonoristas, percebe-se a liberdade de expressão da obra e a forte carga emocional contida na sonoridade descoberta pelos poloneses. […] Era uma maneira de dizer aos comunistas que a Polônia era livre das diretrizes impostas e de mostrar que eles podiam fazer o que pretendiam no âmbito musical.
O pano de fundo histórico do século XX nos ajuda a entender a explosão de música inovadora na Polônia nas décadas de 1950 e 60, mais precisamente após 1956: naquele ano, após a morte do primeiro-ministro stalinista Bolesław Bierut, seguiu-se um período de maior liberdade artística e de mais intercâmbio de ideias com outros países. Não custa lembrar que o ministro da cultura polonês no período anterior a 1956, após a estreia da 1ª Sinfonia de Lutoslawski, havia declarado que um compositor como ele deveria ser atropelado por um bonde. Ou seja, após se livrarem daqueles burocratas e militares que pretendiam ditar qual era a música correta para a pátria, poloneses como Lutoslawski, Górecki e Penderecki viveram um período de grande efervescência cultural. Como relata o compositor cubano Leo Browuer, o Outono de Varsóvia era um dos festivais de vanguarda mais importantes do planeta, onde circulavam lado a lado obras de Bacewicz, Berio, Cage, Khachaturian, Messiaen, Penderecki, Shostakovich e Stockhausen .
Segundo a já citada Semitha Cevallos, a partir dos anos 1960 características da vanguarda polonesa apareceram nas obras para orquestra e/ou coral de vários compositores brasileiros, como Almeida Prado (Pequenos Funerais Cantantes, de 1969), Claudio Santoro (Interações Assintóticas, de 1969) e Edino Krieger (Canticum Naturale, de 1972, Três Imagens de Nova Friburgo, de 1988).
Sidney Molina, na Folha de SP, afirmou que mesmo quando radical e experimental, sua arte gélida parece exercer uma inesperada atração sobre o público. Há uma autenticidade em Penderecki, que combina com o olhar triste e os passos pesados com que se dirigia ao centro do palco para reger. Talvez por isso sua música tenha sido tão bem-sucedida no cinema, o que inclui a utilização em trilhas de clássicos como “O Exorcista”, de 1973, e “O Iluminado”, de 1980. Ao longo de muitas décadas ele alternou a composição com a regência, chegando a dirigir 60 concertos por ano em todos os continentes. Esteve muitas vezes na América do Sul, tendo sido próximo do compositor argentino Alberto Ginastera.
O CD lançado pela Filarmônica de Londres em 2020, além da Trenódia, tem outra peça para cordas: um Adagio publicado originalmente como parte da 3ª Sinfonia, para grande orquestra (1995) e depois adaptado pelo compositor para orquestra de cordas (em 2013). Para Penderecki, como explica o libreto do CD, não há problema algum em se tocar um movimento avulso de uma sinfonia. Desde o começo, esse Adagio lembra o Adagietto da 5ª de Mahler, outro movimento de sinfonia que de certa forma ganhou vida própria. Não é possível afirmar que se trate de uma homenagem ou paródia de Mahler, mas sem dúvida este Adagio de Penderecki pertence à mesma família daquele Adagietto.
Dos dois concertos, gostei mais do mais recente, para trompa (2008), que consegue utilizar o instrumento solista não só da forma solene que é mais comum, mas também em orquestrações com outros metais de formas cômicas que lembram Prokofiev e Shostakovich. O 1º concerto para violino (1977) é mais sério, de certa forma impregnado da seriedade de outras obras de Penderecki como a Trenódia (1960), a Paixão Segundo São Lucas (1966) ou o Credo (1998).
Krzysztof Penderecki (1933-2020): Trenódia para as vítimas de Hiroshima / Concerto para trompa e Concerto para violino nº 1 / Adagio para cordas
1. Horn Concerto ‘Winterreise’ (17:31)
2. Adagio For Strings (11:37)
3. Violin Concerto No. 1 (40:25)
4. Threnody For The Victims Of Hiroshima (8:56)
London Philharmonic Orchestra
Recorded live at the Royal Festival Hall, London, 2013 (3) and 2015 (1-2, 4)
Conductor – Krzysztof Penderecki (1-2, 4)
Conductor – Michał Dworzynski (3)
Horn – Radovan Vlatković (1)
Violin – Barnabás Kelemen (3)
O compositor John Zorn é um homem de muitos projetos, gêneros e estilos. Quando perguntado sobre estilos, ele respondeu: “Não tenho medo de estilos, gosto de todos.” Sua música é um cruzamento único — seja jazz de vanguarda, clássico, música de desenho animado, improvisação livre, etc. –, ele mergulha continuamente em territórios musicais diferentes. Sendo um explorador intrépido e uma esponja musical, seus interesses são tão vastos e em constante mudança que é inútil colocá-lo em qualquer coisa, exceto em uma categoria para si mesmo. Parece que a exploração é a motivação e o principal motor que conduz Zorn. Aqui, com Bill Frisell, Carol Emanuel e Kenny Wollesen, prepare-se para algumas das músicas mais bonitas que Zorn já fez. Ele se volta para a delicadeza da música de câmara com um conjunto íntimo de harpa, vibrafone e violão inspirado na Música Antiga, em Debussy, no minimalismo de Reich e nas tradições espirituais esotéricas de todo o mundo. A música é lírica e hipnótica, perfeita para meditação matinal, para uma tarde solitária ou contemplação à meia-noite. Interpretado com grande emoção por colaboradores de longa data de Zorn, eles interagem com sensibilidade e graça. Os Gnostic Preludes são uma das criações mais delicadas e sutis de Zorn.
John Zorn: The Gnostic Preludes
1 Prelude 1: The Middle Pillar 6:39
2 Prelude 2: The Book Of Pleasure 6:06
3 Prelude 3: Prelude Of Light 5:56
4 Prelude 4: Diatesseron 4:35
5 Prelude 5: Music Of The Spheres 8:14
6 Prelude 6: Circumambulation 6:34
7 Prelude 7: Sign And Sigil 6:22
8 Prelude 8: The Invisibles 3:35
Composed By, Arranged By – John Zorn
Ensemble – The Gnostic Trio
Guitar – Bill Frisell
Harp – Carol Emanuel
Vibraphone, Bells – Kenny Wollesen
Aí alguém se importa se for postada mais uma versão desses monumentos da literatura violinística? Ainda mais com uma grande especialista no repertório, Rachel Podger? E gravação esta que procurei como um alucinado quando soube de seu lançamento?
Os nossos mais fiéis e antigos leitores / ouvintes devem se lembrar de uma gravação dos concertos para cravo que postei há algum tempo atrás com o Pierre Hantaï, que me deixou maravilhado. Reconheço que o impacto desta gravação da Podger não foi tão grande num primeiro momento quanto aquela gravação do Hantaï. Mas temos de tirar o chapéu para esta excepcional instrumentista e pesquisadora do barroco. Ela arrisca e se dá muito bem. Começando pelo reduzido número de instrumentistas que a acompanham:apenas sete músicos, mas sete músicos especialistas neste repertório, e que Podger dirige com competência e talento.
Em tempo: Mestre Avicenna assoprou velinhas nessa última semana. Apesar de estar afastado do blog por motivos particulares, mantemos contato direto. Há algum tempo atrás ele se deu ao trabalho de mandar para alguns membros do blog cópias de um excepcional filme, ou mini-série se preferirem, do Fassbinder, e não nos cobrou nada por isso.
Dedico então esta postagem à sabedoria e generosidade deste grande intelectual com quem tenho o prazer de compartilhar este espaço.
Johann Sebastian Bach (1685-1750) – Violin Concertos – Podger
01. Concerto in A Minor, BWV 1041 – 1. Allegro
02. 2. Andante
03. 3. Allegro Assai
04. Concerto in E Major, BWV 1042 – 1. Allegro
05. 2. Adagio
06. 3. Allegro Assai
07. Concerto in G Minor After BWV 1056 – 1. Allegro
08. 2. Largo
09. 3. Presto
10. Concerto in A Major After BWV 1055 – 1. Allegro
11. 2. Larguetto
12. 3. Allegro Ma Non Tanto
Estes dois discos têm me acompanhado no caótico trânsito de minha cidade nas últimas semanas e me dado tanto prazer que decidi fazer a postagem. Se o carro para no sinal, na geleia geral do trânsito ou no posto de gasolina, abro os vidros e deixo que essa exuberante arte do excesso se espalhe e impressione as pessoas, que me olham com alguma curiosidade.
As óperas têm estado presentes no blog, especialmente nas edições completas (e vastamente comentadas), mas aqui temos uma proposta diferente – coleção de árias – o crème de la crème. Veja o título: 40 Most Beautiful Arias – 40 Mais Belas Árias !
Há uma certa simplificação, pois que nem todas as faixas são árias, há alguns duetos também.
Eu confesso que costumava olhar com um certo desdém para este tipo de edição, por parecer um pouco populista, mas rendi-me à efetividade do produto, adorei ouvir essas belezuras, uma depois da outra… Realmente, é fácil criticar este tipo de lançamento, inclusive por deixar esta ou aquela outra ária de fora, pois que há muitas tantas tão bonitas, mas no fim dos discos chegamos ao entendimento de porque tantas pessoas se apaixonam por ópera. Além disso, a alternância tanto dos tipos de vozes quanto de estilos funcionou bem para mim.
No pacote há 18 compositores representados e o campeão é Puccini, com 11 árias, seguido de Mozart e Verdi, cada um com 5 números. Bizet tem 4 faixas, Handel 2 e o resto, uma cada.
Na escolha dos intérpretes os produtores devem ter tido um olho nos contratos, de forma que se poderia dizer que este ou aquele intérprete teria sido uma melhor opção. Mas não nos prendamos a essas coisas e se deixe levar pela onda da ópera, no que ela tem de melhor.
Há uma certa aura em torno de música clássica, ópera em especial, deixando uma impressão de inacessibilidade, que é necessário ter um gosto adquirido para de fato apreciar, mas isso é falso. As pessoas gostam (sempre gostaram) de ópera. Eu gosto do filme ‘O Feitiço da Lua’ (Moonstruck) pela história, mas também pela cena da ópera. O mocinho do filme (Nicholas Cage, quando jovem) é um padeiro que ama ópera e consegue levar a mocinha (Cher, a noiva de seu irmão mais velho) para uma noite na ópera. Mas não é um teatro qualquer, é o Metropolitan! A cena transmite toda a excitação e expectativa que antecede o espetáculo e mostra como as pessoas se envolvem com a apresentação. Pois bem, nem precisa vestir sua roupa de domingo, apenas ouça e deixe-se encantar pela magia dessas peças.
Moonstruck – Loretta e Ronny vão à Opera
As estrelas do disco:
Disco 1
Nessun dorma (Ninguém durma) – ária do Ato III de Turandot (1926), de Giacomo Puccini. A princesa Turandot decretara que ninguém poderia dormir na cidade de Pequim até o nome do príncipe (Calaf) lhe ser revelado. Calaf havia concordado que morreria caso seu nome fosse descoberto antes do amanhecer. Ele canta certo de que o esforço será em vão e que ao amanhecer ele mesmo dirá seu nome à princesa ganhando assim a sua mão em casamento. O papel é de um tenor. Neste disco, a ária é cantada por Placido Domingo que teve uma voz maravilhosa…
Turandot, no Met…Carmen foi uma ópera revolucionária
L’amour est un oiseau rebelle (O amor é um pássaro rebelde) – Habanera – Ária do Ato I de Carmen (1875), de Georges Bizet. A ária é cantada pela própria protagonista, ao sair do trabalho, na fábrica de charutos. Carmen é a própria sedução, falando sobre o amor e as loucuras de amar. O papel é escrito para um mezzo-soprano, e a intérprete é Julia Migenes. Carmen é uma ópera especial entre todas, não só pela música maravilhosa, mas pela audácia dos temas e, é claro, termina em tragédia.
Una furtiva lacrima – ária de L’elisir d’amore (1832), ópera de Gaetano Donizetti, cantada por Nemorino, um jovem camponês. Ele está cheio de confiança por ter tomado a segunda dose da Poção do Amor (na verdade, apenas vinho) e esnoba todas as belas da vila, reunidas e interessadas nele devido à fortuna que acabara de herdar. Entre elas está Adina, que fica magoada com sua indiferença e sai. Nemorino assim descobre que ela está interessada nele e canta sua alegria por descobrir que ela o ama. Aqui o tenor é Roberto Alagna.
Je dis que rien ne m’épouvante (Posso dizer que nada me assusta…) – ària de Carmen, cantada por Micaëla, uma jovem da vila de Don José e que está apaixonada por ele. Carmen mete Don José em tantas confusões que a ele só resta unir-se aos contrabandistas (Dancaïre e Remendado, ótimos nomes…) que vivem escondidos nas montanhas. A pobrezinha Micaëla vai a sua procura e para afugentar seu próprio medo, canta essa canção.
Bizet
Au fond du temple saint também é de Bizet, mas da ópera Les pêcheurs de perles (1863) e não é uma ária, é um dueto. Os personagens são Nadir e Zurga, dois vértices de um (surpresa) triângulo amoroso. Os cantores aqui são Jerry Hadley e Thomas Hampson.
Ombra mai fu (também conhecida como Largo de Handel) – é uma ária da ópera Xérxes (1739), de Georg Frideric Handel. Muito conhecida, a ária é cantada por Xérxes para uma árvore, um plátano, louvando suas maravilhas… Aqui Xérxes é a cantora Jennifer Larmore.
When I am laid in earth – é um lamento cantado por Dido, na ópera Dido and Aeneas (década de 1680) de Henry Purcell. O sem-coração do Aeneas se apaixona por Dido, uma rainha, mas deve retornar à sua pátria e a abandona. É claro que ela vai se matar por isso, mas não sem antes nos cantar este maravilhoso lamento… Remember me, remember me, but ah! forget my fate! Aqui o lamento é da maravilhosa Véronique Gens.
Voi che sapete che cosa è amor – ária da ópera Le Nozze di Figaro (1786) do cara que sabia de tudo sobre ópera, Wolfgang Amadeus Mozart. A ária é cantada por Cherubino, um jovem pajem que vive apaixonado por todas as mulheres da ópera e canta para elas essa linda canção sobre o amor de dentro de seu uniforme militar… É claro que o papel é sempre de uma cantora (contralto) e aqui é a spettacolare Cecilia Bartoli.
Soave sia il vento – duetto de Così fan tutte (1790), outra do grande Mozart. Esta ópera é sobre (in)fidelidade no amor – rola uma aposta e dois casais serão submetidos a uma série de provas. Os mocinhos partem em um barco (de mentirinha, é claro) e as mocinhas, Dorabella e Fiordiligi, junto ao cético Don Alfonso, dão adeusinhos a eles, desejando que bons ventos os levem… As cantoras aqui são as famosas Kiri Te Kanawa e Frederica von Stade, que leva nobreza até no nome.
Mon coeur s’ouvre à ta voix – ária da ópera Samson and Delilah (1877) de Camille Saint-Saëns. Não consigo pensar nessa ópera sem lembrar dos filmes de Cecil B. DeMille, com Victor Mature e a deslumbrante Hedy Lamarr (deve ser um lance de numerologia, esse nome). Mas, voltando ao assunto, temas bíblicos como esse eram usados para um bom libreto, e essa ária é o momento no qual Dalila encanta e seduz o povero Sansão. A cantora aqui é o mezzo-soprano Olga Borodina e no finalzinho da ária o tenor José Cura da a voz a um balbuciante Sansão.
Nossa foto é apenas ilustrativa…
Pourquoi me réveiller, ária da ópera Werther (1887), de Jules Massenet. Você provavelmente sabe, Os Sofrimentos do Jovem Werther é um livrinho escrito por Goethe contando a história do mísero Werther, que está apaixonado pela Charlotte, que o ama de volta, mas está casada com outro homem. Sofrência no úrtimo com o terrível desfecho, suicídio do pobrezinho. O livro é um clássico, dizem autobiográfico (menos a parte do suicídio…) e gerou uma onda de suicídios nos dias de seu lançamento. Nesta ária, Werther lembra-se, ao lado de Charlotte, das suas leituras de poesias… O cantor é o tenor Jerry Hadley.
La donna è mobile, canzone do ato III, de Rigoletto (1851) ópera de Giuseppe Verdi. Essa é uma dessas óperas que você precisa ouvir pelo menos uma vez. Aqui o Duque de Mantua, um grande mulherengo, a là Don Giovanni, canta disfarçado de soldado está linda ária com palavras nada altaneiras sobre o caráter mundano das mulheres… O tenor aqui é Richard Leech.
Canção da Lua é uma ária da ópera Rusalka (1901), de Antonín Dvořák, mais conhecido pelo seu belíssimo Concerto para Violoncelo e pela Sinfonia ‘do Novo Mundo’. Rusalka conta a história de uma ninfa aquática que se apaixona por um humano. Aqui ela implora à Lua que revele ao príncipe (claro que o humano seria um príncipe…) o seu amor. A popularidade da ária sobrepujou a ópera e faz parte do repertório de grandes sopranos. Aqui está a cargo de Eva Urbanová.
Un bel di é uma ária de nosso campeão Puccini, da ópera Madama Butterfly (1904). Cio-Cio-San, a Madame Butterfly, espera já há três anos a volta de seu marido americano. Sua empregada Suzuki tenta convence-la que ele não retornará, mas ela crê na volta dele – Un bel di, vedreno o barco chegando e tal… Aqui a cantora é Cristina Gallardo-Domâs.
Donna non vidi mai é uma ária da ópera Monon Lescaut (1893), de (ta dã…) Puccini. O jovem cavaleiro Renato des Grieux acaba de conhecer e se apaixonar por Manon Lescaut. Desafortunadamente ela deve atender ao chamado de seu irmão, mas promete retornar. Ficando sozinho des Grieux canta nesta ária todo o seu amor por Manon. Quem empresta a voz a des Grieux aqui é José Cura.
Brindisi, de outra maravilhosa ópera de Verdi. Mais uma que precisa ser ouvida – La Traviata (1853). Alfredo, o mocinho da ópera, é convencido por Gastone e Violetta, a mocinha, a exibir sua voz. Ele então canta esta Canção de Brindar. Na gravação Alfredo é Neil Shicoff.
La Divina interpretou Tosca como poucas…
Vissi d’arte é a ária! Como todas as próximas neste disco, é de Puccini, da ópera Tosca (1900), talvez a ópera das óperas. A mocinha é ela mesma uma cantora de ópera (o cara era bom). Amor e música – as razões de viver de Tosca (Vissi d’arte = Eu vivo para a arte). A primeira cantora a cantar no papel de Tosca foi Giuditta Pasta, a mais famosa cantora lírica do século XIX. Foi Desdemona em Otello e teve três grandes óperas escritas para ela – Anna Bolena, La Sonnambula e Norma, na qual está a ária Casta Diva, que faz parte do segundo CD. Foi a partir daí que se passou a chamar essas mega artistas de Diva. Giuditta Pasta foi a primeira Diva! Aqui a Diva é Kiri Te Kanawa.
Che gelida manina (Que mãozinha gelada!) ária cantada por Rodolfo para Mimi, quando eles se encontram pela primeira vez. Eles são os protagonistas de mais uma ópera emblemática, La Bohème (1896), de (adivinhe) Giacomino Puccini. Ele aproveita para dizer que está apaixonado por ela. Aqui, o Rodolfo é o ótimo José Carreras.
Si, mi chiamano Mimi é da mesma ópera, mesmo momento. Rodolfo acabou de se declarar a Mimi e pede que lhe fale algo sobre ela. Bom, ela então lhe diz (cantando lindamente) que a chamam Mimi, apesar de seu nome ser Lucia. Ah, o amor! Mimi aqui é interpretada pela espetacular Barbara Hendricks.
O soave fanciulla– Depois dessas duas árias, os enamorados se reúnem nesse dueto que encerra o Primeiro Ato da ópera La Bohème. De novo, José Carreras e Barbara Hendricks são Rodolfo e Mimi.
Disco 2
O mio babbino caro (cuidado, não é ‘bambino’!) é uma ária famosa de uma (não tão famosa) ópera de um ato de Puccini, chamada Gianni Schicchi (1918). A ária é cantada por Lauretta, que implora a seu pai (babbino) – Ganni Sichicchi – que a ajude casar-se com o amor de sua vida, Rinuccio. Bom, nem os nomes ajudam muito, mas a ária é daquelas que está no repertório de todas as grandes cantoras. Aqui, Lauretta é interpretada por Cristina Gallardo-Domâs.
Ebben? Ne Andrò Lontana é uma ária da ópera La Wally (1892), escrita por Alfredo Catalani. Essa ária é cantada pela heroína, quando ela decide sair de casa para sempre. Bom, ela é uma garota tirolesa que morre jogando-se em uma avalanche de neve… Pois é, vá entender libretos de óperas. A cantora aqui também é Cristina Gallardo-Domâs.
Les Contes d’Hoffmann, no Met!
Barcarolle é um dueto para soprano e mezzo-soprano de Les Contes d’Hoffmann (1881), a última ópera de Jacques Offenbach. Offenbach foi ótimo violoncelista e compôs inúmeras operetas de enorme sucesso. Essa Barcarolle tem uma das melodias mais populares do mundo e aposto como você vai se lembrar de já tê-la ouvido antes. Aqui as intérpretes são Jennifer Larmore e Hei-Kyung Hong.
La fleur que tu m’avais jetéeé outra pérola de Carmen, de Bizet. A canção da flor é um dos momentos mais líricos da ópera e traz o motivo do destino. Don José aqui é interpretado por Placido Domingo.
Puccini
Signore, ascolta! É uma ária de Turandot, que como você já sabe, é de Puccini. A ária é cantada por Liu, uma escrava, para o príncipe Calaf, por quem está secretamente apaixonada! Ela o alerta para não arriscar sua vida pela fria princesa Turandot… Liu aqui é interpretada por Kiri Te Kanawa.
Un di felice é um dueto do primeiro ato da espetacular La Traviata (1853) de Giuseppe Verdi. Alfredo e Violetta cantam o tema mais famoso da ópera, que aqui são interpretados por Neil Shicoff e Edita Gruberova.
Dôme épais le jasmin– dueto da ópera Lakmé (1883), de Léo Delibes, cantado por Lakmé e sua serva Mallika, enquanto vão colher flores às margens de um rio. Um destes temas que são maiores do que a própria ópera, assim como a Barcarolle, de Offenbach. Aliás, cantados aqui pelas mesmas intérpretes, Jennifer Larmore e Hei-Kyung Hong.
Porgi amor– Cavatina do Segundo Ato de Le Nozze di Figaro (1786), de Mozart. A condessa, Rosina, só em seu quarto, lamenta a infidelidade de seu marido, o Conde de Almaviva. Ária curta, sem repetições, na qual a quase impossível simplicidade de Mozart transborda numa pequena joia. Aqui a condessa é Lella Cuberli.
Esse sabia de tudo e mais ainda, sobre óperas…
Dalla sua pace – Ária da ópera Don Giovanni (1787), composta pelo divino Mozart, e é cantada por Don Otavio, noivo de Donna Anna. Eu tinha um amigo que o chamava Don Otário, pois o personagem é assim, um dois de paus, nada faz de interessante, mas é o tenor da ópera, onde o Don, Leporello e Masetto são todos baixo-barítonos. Isso sem contar o Comendador, que é um baixo à la Ghiaurov. Dalla sua pace foi composta para a apresentação da ópera em Viena, depois do sucesso em Praga, pois o tenor do dia não conseguia cantar a segunda ária de Don Otavio – Il mio tesoro – cuja parte …cercate…, é de matar de difícil. Aqui a bela Della sua pace está aos encargos de Hans Peter Blochwitz.
Casta Diva, assim como Vissi d’arte, é uma das mais famosas árias do repertório de soprano. A ópera é Norma (1831), de Bellini. Não é o capitão da Seleção Brasileira de Futebol de 1958, cuja estátua se encontra em frente ao Maracanã, mas Vincenzo Bellini, que escreveu o papel para Giuditta Pasta, a primeira das Divas. Aqui, a intérprete é Maria Callas, a Diva do século XX. O que realmente torna uma cantora uma Diva é a paixão que coloca em suas interpretações, assim como seu senso teatral.
Lascia ch’io pianga – Retornando no tempo, essa é uma ária da ópera Rinaldo (1705), de Handel. Como você pode imaginar, este é um lamento, construído sobre uma sarabanda. Logo após se casar com Rinaldo, Almirena é raptada por Armida. Ela está só no jardim de Armida e canta este seu lamento. A cantora na gravação é Marilyn Horne.
J’ai perdu mon Eurydice – essa memorável ária é da versão em francês de Orpheé et Eurydice (adaptada em 1774 da versão em italiano). Em italiano é Che faro senza Euridice (1762). Uma das mais lindas melodias colocadas em uma ária. Inesquecível mesmo após a primeira audição. A cantora aqui é Susan Graham.
Bein Männern, welche Liebe fuhlen – é um dueto da ópera Die Zauberflöte (1791), de Mozart. Pamina e Papageno cantam juntos um dueto sobre o amor em geral, mas não cantam um para outro, pois que não são parte de um par amoroso. Nesta gravação os cantores são Rosa Mannion e Anton Scharinger
Celeste Aidaé a ária na qual Radamés, escolhido para comandar os invasores etíopes, canta sua esperança de ser o grande vencedor para assim ganhar também o amor de Aida. A ópera Aida (1871), de Giuseppe Verdi, é uma daquelas obras que é reconhecida por todos e as suas montagens podem envolver quase um universo. Aqui Radamés está ao encargo de Placido Domingo.
Chi il bel sogno di Doretta, da ópera La Rondine (A Andorinha) (1917) de Puccini. Nesta ária a protagonista Magda conta como Doretta se apaixonou por um estudante. Na ópera, por sua performace, Magda ganha um colar de pérolas, que aqui vai para Kiri Te Kanawa.
Quizz do PQP Bach: Qual é a série de cuja trilha sonora esta ária faz parte?
Amor ti vieta é uma ária da ópera Fedora, de Umberto Giordano. Como parte de seu plano de vingança, Fedora (1898) seduz o Conde Loris Ipanov. Nesta ária eles se encontram em uma festa e ele diz a ela que realmente a ama. O conde aqui é Placido Domingo.
Es lebt eine Vilja (Vilja-Lied) é da ópera Die Lustige Witwe (1905), de Franz Lehár. Em sua festa Hanna conta a história de um espírito da montanha, uma Vilja, que vaga por lá e seduz os caçadores com sua beleza. A cantora aqui é Karita Mattila.
E lucevan le stelle é do Terceiro Ato de Tosca, de Puccini. Mario Cavaradossi é o mocinho (literalmente) da ópera, um jovem e liberal pintor, amante de Tosca. Nesta belíssima ária Cavaradossi troca sua última posse, um anel, para que um guarda leve uma carta para sua amada Tosca. Enquanto ele escreve a carta, canta seu amor por Tosca e pela vida. Mais uma vez, a voz linda de Placido Domingo.
Verdi
Ave Maria é uma ária da ópera de maturidade de Verdi, Otello (1887). Desdemona reza à Virgem Maria um pouco antes de Otello entrar e cego de ciúmes, matá-la. Pois é, feminicídio é comum nas óperas… A Desdemona da vez é Cristina Gallardo-Domâs.
Non più mesta accanto al fuoco é da ópera La Cenerentola (1817), de Gioacchino Rossini. Ele mão poderia faltar , este genial compositor. Essa ópera é baseada no conto de fadas Cinderela, e foi composta em apenas 24 dias. Este é um dos momentos finais da ópera, onde a Cinderela canta que já não fica mais triste perto do fogo. Muito virtuosismo, mas a melodia aqui é a mesma de uma ária cantada pelo Conde Almaviva no final de O Barbeiro de Sevilha. Não por pouco que Rossini tinha fama de preguiçoso. Compunha deitado em sua cama. Se a folha em que estava escrevendo caísse, em vez de pegá-la do chão, ele começava tudo novamente em uma outra mais à mão. A cantora aqui é Jennifer Larmore.
Aluno de Gabriel Fauré, Maurice Ravel teve um difícil início de carreira como compositor: tirando Fauré que sempre o apoiou, a maior parte do mundo acadêmico desprezava o seu estilo. No começo do século XX, ele precisava se defender das acusações de ser uma mera cópia de seu amigo Claude Debussy: entre outros argumentos, ele explicava que obras como Jeux d’eau (1901) usavam inovações que só apareceriam nas obras do amigo uns anos depois (Images, Préludes).
Em 1900, Ravel (3º em pé) ainda usava bigode. Não tão grande quanto o de Fauré (sentado ao piano)
Mas após as mortes de Debussy (1918), Saint-Saëns (1922) e de Fauré (1924), Ravel finalmente foi reconhecido como o maior compositor vivo na França e talvez no mundo: uma turnê nos EUA em 1928 iria aumentar seu renome e sua conta bancária. Nessa época, ele escreveria mais para orquestra, o que não era o caso do jovem da década de 1900 que dificilmente encontraria uma orquestra disponível para suas obras.
Os dois concertos para piano surgem após a turnê americana e são fortemente influenciados pelo jazz. E La Valse, concebida como um balé mas mais comumente apresentada sem dança, é ao mesmo tempo uma homenagem e uma paródia das grandes valsas orquestrais vienenses.
Os frequentadores deste blog devem ter visto eu e o nosso líder PQP incensarmos o maestro Evgeny Svetlanov (1928-2002) em suas gravações de repertório do início do século XX: Debussy, Scriabin, Mahler… E nos momentos mais dançantes de Ravel, Svetlanov e sua orquestra soviética dão um show novamente impressionam. A gravação do Concerto em Sol – em 1959 com Yakov Zak, vencedor do Concurso Chopin de 1937 – tem o som um pouco mais abafado, mas as outras gravações são mais recentes, anos 1970-80, com um rico colorido orquestral.
Svetlanov (1928-2002)
Maurice Ravel (1875-1937):
1-3. Concerto para Piano em Sol maior:
I. Allegramente
II. Adagio assai
III. Presto
Yakov Zak, USSR State Academic Symphony Orchestra, Evgeny Svetlanov (Recorded 1959)
4. Concerto para Piano para a mão esquerda, em Ré maior
Alexander Slobodyanik, USSR State Academic Symphony Orchestra, V. Verbitsky (Recorded 1978)
5. Pavane pour une infante défunte
6. La valse, poème chorégraphique pour orchestre
USSR State Academic Symphony Orchestra, Evgeny Svetlanov (Recorded 1975, 1982)
“The young Egyptian soprano Fatma Said, praised for the luminosity and rich colours of her voice, makes her recording debut for Warner Classics with El Nour. Her enticing and absorbing recital programme crosses cultures, combining art songs by French, Spanish and Egyptian composers with Egyptian folk songs and popular songs from the Middle East. As she explains, “‘El Nour’ in Arabic means ‘the light’, and this album sheds light on how music that has been interpreted many times can be perceived in a different light. The idea is to connect three cultures – Arabic, French and Spanish – and to show how much, despite cultural, geographical and historical differences, they have in common when it comes to music”.
Assim nos é apresentado no site da Amazon esse belíssimo CD de estréia da jovem soprano egípcia Fatma Said junto a gravadora Warner. O repertório explora Ravel, Berlioz, até mesmo o poeta espanhol Federico Garcia Lorca, além de compositores egípcios e canções do folclore egípcio, sempre com muita sensibilidade e competência. Não busco com frequência discos com recitais com destaque para voz humana, mas tive de me render ao talento natural de Fatma Said. Ela interpreta com naturalidade um repertório difícil e bem diverso, em uma mistura étnico-cultural. Canta em francês, em espanhol e em sua língua natal, o árabe.
Infelizmente não obtive maiores informações sobre o CD, nem no site da própria gravadora. Não tem um livreto. Em seu site oficial (www.fatmasaid.com) ficamos sabendo que sua agenda tem sido bem extensa, com recitais em diversos teatros pela Europa e Estados Unidos, e uma aclamada apresentação em uma recente encenação da ‘Flauta Mágica’, de Mozart, em Milão.
Espero que apreciem. Logo trarei o novo CD da moça, outro primor.
01. Ravel Shéhérazade, M. 17_ I. Asie
02. Ravel Shéhérazade, M. 17_ II. La flûte enchantée
03. Ravel Shéhérazade, M. 17_ III. L’indifférent
04. Falla Tus ojillos negros
05. Serrano La canción del olvido No. 2, Canción de Marinela
06. Obradors 2 Cantares populares No. 2, Del cabello más sutil
07. Berlioz Zaïde, H. 107, Op. 19
08. GaubertLe repos en Égypte
09. Lorca 13 Canciones españolas antiguas No. 1, Anda jaleo
10. Lorca 13 Canciones españolas antiguas No. 6, Sevillanas del siglo XVIII
11. Lorca 13 Canciones españolas antiguas No. 8, Nana de Sevilla
12. Abd al-Rahīm Ana Bent El Sultan
13. Bizet Adieux de l’hôtesse arabe, WD 72
14. Aatini Al Naya Wa Ghanni
15. El Helwa Di
16. Sahar El Layali (Kan Enna Tahoun)
17. Yamama Beida
Malcolm Martineau – Piano (1-3, 7-8, 12-13)
Rafael Aguirre – Guitar (4-6, 9-11)
Burcu Karadağ – Ney (2, 13-17)
John Dowland foi um compositor, alaudista e cantor, contemporâneo de William Shakespeare, nascido na Inglaterra durante a era Elizabetana. Dowland escolheu a melancolia. Foi um músico versátil e, talvez, o mais famoso de sua época. Era considerado um instrumentista virtuoso. Compôs música sacra, música secular, obras para canto e instrumentais. Sua música instrumental passou por uma grande revitalização, tendo sido incluída no repertório erudito a partir da segunda metade do século XX. Este disco de 1987 tem um conjunto de cinco violas e um alaúde. Vocês sabem: tudo o que Savall toca vira ouro e aqui não é diferente. Os instrumentistas se deleitam no culto à melancolia dentro do qual Dowland, o “Orfeu inglês” da era elisabetana, é tão profundamente associado, em parte graças às 21 peças de consorte intituladas Lachrimae. Como o compositor é copiado na página de rosto da partitura dizendo que “as lágrimas podem ser derramadas não apenas de tristeza, mas às vezes de alegria”. Cheia de dissonâncias carregadas de lamentações, a música dificilmente abre um sorriso, mas o brilho da execução de Hespèrion XX traz alegria.
John Dowland (1563-1626): Lachrimæ or Seven Teares (HespèrionXX / Savall)
1 Lachrimae Antiquae 4:42
2 Sir John Souch His Galiard 2:02
3 Lachrimae Antiquae Novae 4:51
4 M. Henry Noell His Galiard 1:59
5 Lachrimæ Gementes 4:25
6 The Earle Of Essex Galiard 1:25
7 Lachrimæ Tristes 5:19
8 M. Nicholas Gryffith His Galiard 1:53
9 Lachrimæ Coactæ 4:53
10 M. Gils Hoby His Galiard 1:26
11 Lachrimæ Amantis 5:23
12 M. Thomas Collier His Galiard 1:27
13 Lachrimæ Veræ 5:13
14 Captaine Digorie Piper His Galiard 1:50
15 Semper Dowland Semper Dolens 5:57
16 The King Of Denmarks Galiard 1:58
17 Sir Henry Umptons Funerall 6:03
18 M. Bucton His Galiard 1:30
19 M. John Langtons Pavan 5:08
20 Mrs. Nichols Almand 1:22
21 M. George Whitehead His Almand 1:45
Composed By – John Dowland
Directed By – Jordi Savall
Ensemble – Hespèrion XX
Hoje ouvi o Concerto para 2 cravos de Carl Philipp Emanuel Bach, Wq 46. E não consegui ultrapassá-lo. Fiquei em loop. O movimento lento (Largo e con sordino) me pareceu de uma beleza aterradora, de uma profundidade e inteligência abissais na versão da Musica Antiqua Köln (Goebel) que rolava nos meus fones. Ouvi umas 5 vezes o movimento de 10 min. Depois, em casa, fui ouvir a versão de Ton Koopman com a OSI e… Tudo me pareceu uma interessante improvisação. Algo até leve. Aí está um dos aspectos mais interessantes das interpretações, né? São dois mestres, porém onde Goebel viu uma coisa, Koopman viu outra. Eu fico com Goebel, mas como ir contra Koopman? Jamais! Desculpem, vou escutar tudo de novo. (Talvez seja bom lembrar que Goebel contou com os grandes Andreas Staier e Robert Hill nos cravos…).
Carl Philipp Emanuel Bach (1714-1788): Concertos para 2 Cravos (Musica Antiqua Köln / Goebel / Staier / Hill)
Konzert Für 2 Cembali Und Orchester F-Dur – Wq 46; Helm 408
1. Allegro 8:55
2. Largo E Con Sordino 10:06
3. Allegro Assai 4:33
Konzert Für 2 Cembali Und Orchester Es-Dur – Falck 46
1. Un Poco Allegro 10:39
2. Cantabile Senza Accompagnamento 3:20
3. Vivace 6:44
Cello – Christina Kyprianides*, Phoebe Carrai
Composed By – Carl Philipp Emanuel Bach (faixas: 1 to 3), Wilhelm Friedemann Bach (faixas: 4 to 9)
Conductor – Reinhard Goebel
Harpsichord – Andreas Staier, Robert Hill (9)
Horn – Andrew Joy, Stefan Blonck
Orchestra – Musica Antiqua Köln
Timpani – Eckhard Leue
Trumpet – Friedemann Immer, Susan Williams (2)
Viola – Christian Goosses, Karin Baasch, Karlheinz Steeb
Violin [❘] – Benjamin Hudson, Gustavo Zarba, Hajo Bäß, Reinhard Goebel, Werner Ehrhardt
Violin [❘❘] – Almut Bergmeier*, Andrea Keller, Mary Utiger, Paula Kibildis
Violone – Jean Michel Forest*, Jonathan Cable
A música do compositor ucraniano Valentin Silvestrov — disse uma vez nosso chefe PQP Bach — é delicada mas nada fácil de ignorar. É um sussurro muito instigante e contemporâneo. As sonatas para piano de Silvestrov têm algo em comum com as de Scriabin, a semelhança talvez possa ser descrita como uma tendência dos dois compositores a saborear as dissonâncias, ou seja, abordá-las de forma, lenta, suave, cheia de segundas e terceiras intenções…
Alexei Lubimov (nasc. 1944) é um pianista e cravista russo. Seu interesse, nas décadas de 1960 e 70, por compositores contemporâneos ocidentais como Arnold Schoenberg e Karlheinz Stockhausen o levou a ser mal visto pelas autoridades soviéticas: talvez como estratégia para ficar menos visado, ele se dedicou então a estudar a sonoridade de instrumentos antigos. Pela gravadora Erato, Lubimov gravou uma inovadora integral de sonatas de Mozart em um fortepiano de época. Depois, ele gravaria pela Bis o concerto n. 11 de Mozart, para dois pianos, com Brautigam, também em instrumentos de época (neste caso, réplicas do original). Ele também apareceu aqui no blog com um belíssimo Chopin, rara incursão de Lubimov no repertório romântico. Mas ele não deixaria de se interessar por música contemporânea (por exemplo aqui: Ustvolskaya, Gubaidulina, Górecki e Pelécis). E de Silvestrov, além deste disco pela Erato, Lubimov também gravou pela ECM obras para piano solo e com orquestra.
Ivan Monighetti, também nascido na Rússia mas com família em parte ocidental como o sobrenome entrega, atualmente vive na Suíça. Já Lubimov continua morando na Rússia, onde teve um recital com obras de Schubert e Silvestrov interrompido pela polícia. Sobre Monighetti, o violoncelista Mstislav Rostropovitch costumava dizer: “é um de meus alunos favoritos. Tendo conduzido a orquestra sua gravação dos concertos de Tishchenko e de Boris Tchaikovsky, eu não pude evitar o orgulho por meu notável pupilo.” A sonata para violoncelo e piano de Silvestrov, de 1983, foi dedicada a Monighetti, assim como a 2ª sonata para piano foi dedicada a Lubimov.
Hoje os países de Lubimov e de Silvestrov estão em guerra. Vamos nos permitir ouvir essa arte profunda e multifacetada que fazem Lubimov e Monighetti com as partituras de Silvestrov, sem fazer comentários tratando uma carnificina humana como se fosse uma partida de futebol? Vamos nos permitir ouvir com atenção as sensações causadas pelo piano e pelo violoncelo, sem pensamentos pré-concebidos sobre nações e outras abstrações? Será que conseguimos não nos rebaixar ao nível que esperam da gente? Sem arte, não há esperança.
Sehnsucht, palavra central e quase intraduzível do período vienense fin-de-siècle, descreve aspectos do desejo, da melancolia e da nostalgia. Durante a pandemia de Covid-19, havia uma saudade coletiva, tanto entre artistas quanto entre espectadores. O recital Sehnsucht, criado por Barbara Hannigan em Rotterdam, foi tocado ao vivo na sala de concertos vazia de De Doelen. A gravação em álbum, reconhece a tremenda performance de todos os envolvidos. Dois jovens artistas holandeses, o maestro Rolf Verbeek e o barítono Raoul Steffani, juntaram-se a Hannigan e à Camerata RCO para esta viagem íntima. O recital explora dois ciclos de canções de Berg que foram escritos pouco depois 4ª sinfonia de Mahler. Todas estas obras são apresentadas em arranjos para conjunto de câmara. Os lieder de Berg são expandidos de sua formação original de voz e piano para um diálogo com novas cores e formações. A 4ª sinfonia de Mahler é reduzida a uma jornada camarística como uma terna conversa.
Alban Berg / Gustav Mahler: 7 Frühe Lieder / 4 Gesänge / Sinfonia Nº 4 (Hannigan, Steffani, Rolf Verbeek)
01. Berg: 7 Frühe Lieder (Arr. for Soprano and Chamber Orchestra by Reinbert de Leeuw): No. 1, Nacht
02. Berg: 7 Frühe Lieder (Arr. for Soprano and Chamber Orchestra by Reinbert de Leeuw): No. 2, Schilflield
03. Berg: 7 Frühe Lieder (Arr. for Soprano and Chamber Orchestra by Reinbert de Leeuw): No. 3, Die Nachtigall
04. Berg: 7 Frühe Lieder (Arr. for Soprano and Chamber Orchestra by Reinbert de Leeuw): No. 4, Traumgekrönt
05. Berg: 7 Frühe Lieder (Arr. for Soprano and Chamber Orchestra by Reinbert de Leeuw): No. 5, Im Zimmer
06. Berg: 7 Frühe Lieder (Arr. for Soprano and Chamber Orchestra by Reinbert de Leeuw): No. 6, Liebesode
07. Berg: 7 Frühe Lieder (Arr. for Soprano and Chamber Orchestra by Reinbert de Leeuw): No. 7, Sommertage
08. Berg: 4 Gesänge, Op. 2 (Arr. for Baritone and Chamber Orchestra by Henk de Vlieger): No. 1, Aus Dem Schmerz sein Recht
09. Berg: 4 Gesänge, Op. 2 (Arr. for Baritone and Chamber Orchestra by Henk de Vlieger): No. 2, Schlafend trägt man mich in mein Heimatland
10. Berg: 4 Gesänge, Op. 2 (Arr. for Baritone and Chamber Orchestra by Henk de Vlieger): No. 3, Nun ich der Riesen Stärksten überwand
11. Berg: 4 Gesänge, Op. 2 (Arr. for Baritone and Chamber Orchestra by Henk de Vlieger): No. 4, Warm die Lüfte
12. Mahler: Symphony No. 4 in G Major (Arr. for Chamber Orchestra by Erwin Stein): I. Bedächtig, nicht eilen
13. Mahler: Symphony No. 4 in G Major (Arr. for Chamber Orchestra by Erwin Stein): II. In gemächlicher Bewegung, ohne Hast
14. Mahler: Symphony No. 4 in G Major (Arr. for Chamber Orchestra by Erwin Stein): III. Ruhevoll, poco adagio
15. Mahler: Symphony No. 4 in G Major (Arr. for Chamber Orchestra by Erwin Stein): IV. Wir geniessen die Himmlischen Freuden. Sehr behaglich
Barbara Hannigan
Raoul Steffani
Camerata RCO
Rolf Verbeek