Um bom e estranho CD. Talvez haja algum fato técnico que una essas obras de Mozart e Prokofiev, algo certamente acima de minha pouca compreensão. Ou será que a bonita e excelente Gesa Lücker apenas gosta das obras e fim? Ou adoro aquela Giga de Mozart e a Sonata Nº 8 de Prokofiev. O resto me pareceu limpinho e sem drama. A Sonata Nº 8 faz parte da trilogia de Sonatas compostas durante a Segunda Guerra. Não é uma obra fácil. Ela mescla violência rítmica, lirismo e uma serenidade triunfal ao final. É jornada musical intensa que vai da angústia à transcendência. Será que a pianista queria justamente o contraste?
W. A. Mozart (1756-1791) / S. Prokofiev (1891-1953): Sonatas e outras obras (Lücker)
Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791)
Sonata No. 5 in G major, KV 283
1) Allegro
2) Andante
3) Presto
4) Adagio in B minor, KV 540
5) Rondo in D major, KV 485
6) Gigue in G major, KV 574
Sergei Prokofiev (1891-1953)
Sonata No. 8 in flat major, op. 84
7) Andante dolce
8. Andante sognando
9) Vivace
Postagem original de 2018
Quando se trata de música clássica, a forma mais fácil de agradar os ingleses é com grandes sonoridades. Eles gostam de juntar centenas de vozes pra cantar o Messias de Haendel todos os anos. Gostam de encher de gente a Abadia de Westminster para ouvir o órgão e cantar em homenagem à rainha [hoje: rei].
O pianista inglês Peter Donohoe é desses. Ano passado, ele tocou no Rio de Janeiro os Vinte olhares sobre o menino Jesus, de Messiaen, foi uma experiência indescritível, uma das grandes obras para piano do último século, extremamente virtuosa e com essa sonoridade grandiosa, sem medo de fazer barulho, que é a marca de Donohoe.
No encarte deste disco, Donohoe argumenta que Prokofiev, assim como Bartók e Stravinsky, não desprezavam o som cantabile do piano, como pensam alguns; mas esses compositores também não desprezavam o uso de outros timbres, notavelmente os percussivos. Donohoe respeita estritamente as indicações de Prokofiev, das quais a mais característica é o non legato, em que as notas soam separadas, e ao mesmo tempo o pianista parece se empolgar nos acordes cheios, nas oportunidades de criar essas grandes sonoridades tão tipicamente russas e inglesas.
As sonatas de guerra de Prokofiev foram compostas a partir de 1939, após um jejum de 16 anos sem compor sonatas para piano, e formam um grupo à parte na sua carreira.
Sobre a 6ª sonata, Sviatoslav Richter disse: “A clareza estilística e a perfeição estrutural dessa música me impressionaram. Eu nunca tinha ouvido algo assim. Com audácia o compositor rompeu com os ideais do Romantismo e introduziu em sua música o pulso terrível da música do Século XX.”
A sonata nº 7 é a mais famosa das três. Alguns lhe dão o apelido “Stalingrado”, por ter sido composta e estreada na época da famosa batalha da 2ª Guerra, e por sua atmosfera apressada e tensa, especialmente no último movimento, ‘Precipitato’, com seu ritmo frenético.
A sonara nº 8 é mais lenta, lírica, com indicações de tempo como ‘Andante dolce’, ‘Allegro moderato’ e ‘Andante sognando’. Para Richter, é a mais complexa das sonatas de Prokofiev, cheia de contrastes.
As sonatas de guerra de Prokofiev são da mesma década que os 20 olhares de Messiaen. À primeira vista são dois compositores completamente diferentes, com visões de mundo diferentes, mas não é que, pianisticamente, se aproximam? Os dois fazem uso de recursos técnicos parecidas, de um virtuosismo extremo e de uma linguagem que não se preocupa em saber se é tonal ou atonal.
A grande diferença entre Prokofiev e Messiaen talvez seja o fato de que o primeiro abraçou, com uma linguagem moderna, as formas tradicionais, enquanto o segundo as considerava relíquias de museu:
O.Messiaen: Pessoalmente, não acredito na “forma concerto”, (…) as obras-primas que conheço no gênero são os concertos para piano de Mozart. Todos os outros me parecem falhos, apesar de duas ou três passagens muito belas no concerto de Schumann ou nos de Prokofiev.
C.S.: Esse ataque ao concerto para piano não se direciona a todas as formas clássicas? Você não tem muita afeição pela sonata tradicional ou pela sinfonia…
O.M.: Como todos meus contemporâneos.
C.S.: Digamos alguns dos seus contemporâneos. Por que motivo?
O.M.: Sinto que essas formas estão “terminadas”. Assim como não se pode escrever uma ópera Mozarteana hoje em dia, é impossível escrever, como Beethoven, um primeiro movimento de sinfonia com um tema que diz “Eu sou o tema”, e retorna após o desenvolvimento afirmando “Olha eu aqui de novo, você me reconhece?”
(Olivier Messiaen Music and Color – Conversations with Claude Samuel)
Messiaen falava de um ponto de vista das vanguardas de Paris ou de Viena. De fato, Schoenberg, Stravinsky (russo emigrado), Villa-Lobos, Boulez não se destacaram nas formas Sinfonia, Concerto e Sonata, ainda que tenham escrito algumas.
Faltou combinar com os russos, como diria Garrincha. Bem longe dessas vanguardas europeias, como dito por Proust que citei no post anterior, havia compositores criando “música russa e simples”, em que as formas clássicas ainda eram relevantes. Não por acaso, as sinfonias, concertos e sonatas para piano contam entre as obras mais importantes e mais tocadas até hoje de Rachmaninoff (3 sinfonias, 4 concertos, 2 sonatas), Prokofiev (7 sinfonias, 5 concertos, 9 sonatas) e Shostakovich (15 sinfonias, 2 concertos, 2 sonatas).
Nas sonatas de Prokofiev observamos temas principais com cara de tema principal, segundos temas com cara de segundo tema, desenvolvimentos e reexposições, codas com cara de coda… Mas nem sempre. Tem vezes em que ele inova. E mesmo quando segue a cartilha, é com uma linguagem própria, um humor e um lirismo que consistem na sua originalidade. Nas palavras de Stravinsky, outro russo: “quanto mais limitações nos impomos, mais nos libertamos”.
Sergei Prokofiev (1891-1953) Sonata nº 6 em lá maior, Op. 82
1. I Allegro moderato
2. II Allegretto
3. III Tempo di valzer lentissimo
4. IV Vivace
Sonata nº 7 em si bemol maior, Op. 83
5. I Allegro inquieto-Andantino
6. II Andante caloroso
7. III Precipitato
Sonata nº 8 em si bemol maior, Op. 84
8. I. Andante dolce – Poco più animato – Allegro moderato – Tempo I – Andante – Andante dolce, come prima – L’istesso tempo – Allegro
9. II. Andante sognando
10. III. Vivace – Allegro ben marcato – Vivace come prima
O Dia das Crianças estaá longe, mas aqui já temos o presente! Em homenagem às eternas crianças que somos, ofereço essas três peças de cunho infantil, de Prokofiev e Saint-Saens.
As peças
Sergei Prokofiev escreveu “Pedro e o Lobo” para o Teatro Infantil de Moscou em 1936. Esta história foi criada para ser narrada enquanto a música toca e para entendê-la precisamos, antes de mais nada, sabermos que: O Pássaro é representado pelo som de uma flauta; o Pato, um oboé; o Gato, uma clarineta; o Avô, um fagote; o Lobo, cornetas francesas; os Caçadores, tímpanos. Pedro é representado pelas cordas. Nessa versão não temos o narrador, fica a cargo de cada um, fechar os olhos e deixar a imaginação florar.
“Histórias de uma Velha Avô”, quatro peças para piano, escritas pouco depois da estreia em Nova York de Prokofiev em 1918, não têm enredo especial, mas são permeadas de lembranças russas.
Escutar “Carnaval dos Animais” de Camille Saint-Saens é como fazer uma viagem musical ao zoológico. Em primeiro lugar, após a introdução, surge a “Marcha Real do Leão”, rugindo nas cordas e pianos. Depois surgem galinhas cacarejando e ciscando (cordas e piano) precedendo galos cantando (clarinete). Os “Jumentos Selvagens” da Mongólia, famosos por sua notável velocidade, aparecem retratados pelos dois pianos. Para fazer uma piada, Saint-Saens, em “Tartarugas”´pegou dois temas vistosos de Offenbach (incluindo o seu famoso “Can-Can”) e os colocou num andamento de passo de tartaruga. Outra paródia surge com o “Elefante”, onde as melodias suaves e semelhantes a contos de fada da “Dança das Sílfides” de Berlioz e de “Sonho de uma Noite de Verão” de Mendelsohn são executadas por cantrabaixos duplos.
Os “Cangurus” destaca os dois pianos como que pulando em derredor. No “Aquário” vislumbram-se brincadeiras de peixes na água proporcionada pelos pianos e, originalmente, uma harmônica de vidro (invenção de Benjamim Franklin em que copos de diferentes tamanhos são mergulhados numa calha com água). Em “Personagens com Grandes Orelhas” Saint-Saens não estava somente se referindo a jumentos, mas talvez, também a asnos humanos.
O “Cuco” em duas notas incessantes da clarineta é ouvido nas florestas sombrias (pianos). O “Viveiro de Aves” é um “tour de force” para a flauta. O tratamento de Saint-Saens ao talvez mais tranquilo de todos os animais, os “Pianistas”, de forma bem humorada critica as escalas e exercícios iniciais dos estudantes. “Fósseis” desencava quatro antigas canções francesas, uma parte do “Barbeiro de Sevilha”, bem como “Dança Macabra” do próprio Saint-Saens. O “Cisne” do violoncelo é o mais famosos dos animais e, talvez, o trabalho mais reputador de Saint-Saens. O momento mais sublime não só da peça, mas, provavelmente de toda a obra do compositor.
O “Finale”, outro can-can, reapresenta muitos mebros do zoológico musical, terminando de forma magistral com um último “relinchar” do asno.
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Sergei Prokofiev & Camille Saint-Saens: Obras Infantis
Sergei Prokofiev
Peter and the Wolf, Op. 67
01. Andantino (1:00)
02. Allegro – Andantino come prima (1:29)
03. L’istesso tempo – Piu mosso (2:24)
04. Moderato – Allegro ma non troppo – Moderato (1:47)
05. Poco piu andante (1:03)
06. Andantino, come prima (1:07)
07. Andante molto (1:24)
08. Nervoso – Allegro – Andante (1:40)
09. Allegretto – Moderato (1:34)
10. Andantino, come prima – Meno mosso (1:05)
11. Vivo – Andante molto – Vivo – Andante (1:17)
12. Allegro – Poco meno mosso – Moderato (Meno mosso) (1:56)
13. Allegro moderato (1:16)
14. Andante (0:36)
15. Moderato – Poco piu mosso (Allegro moderato) – Sostenuto – L’istesso tempo – Poco piu mosso (4:04)
16. Andante – Allegro (0:30)
The Tales of an old Grandmother, Op. 31
17. I. Moderato (3:24)
18. II. Andantino (1:52)
19. III. Andante assai (2:33)
20. IV. Sostenuto (3:38)
Camille Saint-Saens
Carnival of the Animals
21. No. 1: Introduction and Royal March of Lion (2:24 )
22. No. 2: Hens and Roosters (0:57)
23. No. 3: Wild Donkeys (0:40)
24. No. 4: Tortoises (2:00)
25. No. 5: The Elephant (1:21)
26. No. 6: Kangaroos (0:50)
27. No. 7: Aquarium (2:13)
28. No. 8: Personages with long ears (0:55)
29. No. 9: The Cuckoo in the Heart of the Woods (1:59)
30. No. 10. Aviary (1:17)
31. No. 11: Pianists (1:26)
32. No. 12: Fossils (1:15)
33. No. 13: The Swan (3:04)
34. No. 14: Finale (2:00)
St. Peterburg Radio & TV Symphony Orchestra
Stanislav Gorkovenko
Para honrar a memória e celebrar o legado extraordinário de Arthur Moreira Lima, um dos maiores brasileiros de todos os tempos, publicaremos a integral da coleção Meu Piano/Três Séculos de Música para Piano – seu testamento musical – de 16 de julho, seu 85° aniversário, até 30 de outubro de 2025, primeiro aniversário de seu falecimento. Esta é a quarta das onze partes de nossa eulogia ao gigante.
– Mais de duzentos milhões de seres humanos falam russo. Só uns poucos tocam bem piano. Não deve ser difícil aprender russo.
Com essa voadora à queima-roupa, recebida como resposta à sua preocupação com o aprendizado do idioma do país ao qual acabara de chegar, Arthur Moreira Lima Júnior foi devidamente apresentado a Rudolf Rikhardovich Kerer (doravante Kehrer), para cuja classe fora designado durante os cinco anos de sua bolsa no Conservatório Pyotr Ilyich Tchaikovsky de Moscou, sob os auspícios do Ministério da Cultura da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, no ano da graça de 1963.
Ao mostrar-lhe a caixa de ferramentas, à maneira do que o famigerado beque Gum faria no Fluminense de quatro décadas depois, Kehrer apresentava o recém-chegado ao modus russicus. No entanto, e por mais dura que imaginássemos a adaptação do carioca bonachão ao planeta soviético, com todas cores tragicômicas das histórias de peixes fora d’água, nosso herói a tirou de letra. Safo, flexível e de ouvido afiado, Arthur Arthurovich transpôs com rapidez as temidas dificuldades de adaptação a território, cultura e idioma. Não tardou para que o novo moscovita estivesse, sob temperaturas dúzias de graus abaixo daquelas de seu habitat, a desfrutar muito a experiência mais decisiva de sua vida – e também, naturalmente, a jogar muita conversa fora po-russki.
Arthur Arthurovich e Rudolf Rikhardovich: sempre no limiar entre a lição e o entrevero.
Enquanto o Brasil marchava para suas décadas de sangue e chumbo, a União Soviética experimentava um minúsculo relaxamento de tensões. Ainda que todas paredes enxergassem, que qualquer moita tivesse muitos ouvidos, e que a Guerra Fria tivesse ebulido com a Crise dos Mísseis do ano anterior, os níveis de paranoia na Moscou de Khruschev eram baixos o suficiente para que a fauna humana vinda do exterior fosse recebida com curiosidade e acolhimento. Ciente de sua posição privilegiada dentro dum regime que controlava todas as instâncias da sociedade, Arthur guardava para si suas críticas e, driblando sensores e censores, aproveitou o que o Regime de melhor tinha a lhe oferecer. O transporte público milagrosamente eficiente e a segurança agradaram-lhe tanto quanto o pervasivo senso de coletividade em tudo e de todos. Mesmo no mítico Conservatório, possivelmente o maior centro formador de músicos do seu tempo, o que em outras paragens seria um ambiente propício a canibalismo entre concorrentes era, na prática, imbuído tão só de camaradagem. Os colegas estudavam juntos, ajudavam-se, retroalimentavam-se, sem vislumbres da competitividade entre pianistas, que Arthur adorava comparar à dos jóqueis nos saudosos páreos da Gávea. Sua maior satisfação, por certo, era com formação holística oferecida aos estudantes. Muito além da Música e de sua História, eles eram instruídos num amplo escopo de disciplinas, da Economia à Política, com doses generosas da doutrina que fundamentava o onipresente Regime. As dezenas de salas do Conservatório vertiam música em todas as vozes e instrumentos, e de suas portas saíam figuras legendárias – gente do naipe de Gilels, de Rostropovich, de Oistrakh – a formarem, por trás delas, novas lendas.
Naquela usina de pianistas em que até os faxineiros assoviavam Rachmaninov, no cerne da então Capital de Todas as Rússias, ninguém o marcaria mais que Rudolf Kehrer. Admirado expoente da Grande Escola Russa, Kehrer incutiu-lhe com eficiência seus fundamentos e prática, que muito divergiam da Escola de Liszt – que fora professor do professor de dona Lúcia Branco – e da Escola Francesa de Mme. Marguerite Long. Os incontáveis arranca-rabos, que Arthur contaria às gargalhadas aos amigos pelo resto da vida, até que foram poucos, se levarmos em conta as culturas e temperamentos diametralmente opostos. Era óbvio ao mestre que o pupilo era uma gema rara, e o talentoso aprendiz sorvia as lições por todas suas terminações nervosas. O resultado não tardou: o pianismo do moço ficou russíssimo, mais russo que os próprios russos (e aqui citamos o crítico e tradutor Irineu Franco Perpétuo, “he outrusses the Russians”). Não perderei tempo tentando convencê-los disso com inda mais verborreia – apenas ouçam, por exemplo, a gravação do Concerto no. 3 de Rachmaninov que incluímos nessa postagem, uma das maiores que existem para essa obra icônica. Ou, talvez, esses Quadros de uma Exposição de Mussorgsky, gravados na Grande Sala do Conservatório de Moscou, seguidos dos Prelúdios de Chopin e de nada menos que OITO peças de bis (porque, sim, recitais mastodônticos são especialidades da Grande Escola Russa)…
… ou esse outro recital-maratona, com duas sonatas de Chopin, a integral de suas valsas, e mais alguns punhados de bis:
Quem ainda não se convenceu poderá mudar de ideia com esse incrível combo Schubert + Barber…
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.. ou com essa gravação feita pelo próprio Kehrer da plateia, talvez o ponto alto do pianorrussismo de Arthur Arthurovich, com uma Rapsódia Espanhola antológica, a melhor que já ouvi:
Rudolf Rikhardovich, o Estoico, só sorriria uma vez para Arthur. Foi na mesma tarde em que, após concluir os cinco anos de estudos sob sua supervisão, o mais meridional de seus pupilos o recebeu em seu apartamento e lhe tocou a Sonata de Liszt – ao que o mestre, notório por nunca elogiar os alunos, por acreditar que a bajulação era danosa à formação de artistas, então tascou:
– Isso foi muito bonito.
E deve ter sido, pois Kehrer convidou Arthur para ser seu assistente na cátedra de piano. Por três anos, sempre o titular viajava, quem assumia suas classes era um carioca de Estácio que, em russo fluente, ensinava pianistas russos como tocar mais russamente que os próprios russos.
Isso é russo o bastante? Para Arthur, ainda não. Sempre mais atento à voz do povo que às academias, ele receberia sua certidão definitiva junto com outro sorriso difícil de conquistar: o daquela rubicunda babushka que, depois de mais um recital abarrotado, veio cumprimentá-lo com um singelo:
– Artur ― nash!
“Arthur é nosso”. E é deles, sim – tanto quanto orgulhosamente nosso. ❤️
ARTHUR MOREIRA LIMA – MEU PIANO/TRÊS SÉCULOS DE MÚSICA PARA PIANO Coleção publicada pela Editora Caras entre 1998-99, em 41 volumes Idealizada por Arthur Moreira Lima Direção artística de Arthur Moreira Lima e Rosana Martins Moreira Lima
Volume 13: A GRANDE ESCOLA RUSSA
Aleksandr Nikolayevich SCRIABIN (1872-1915)
Das Três Peças para piano, Op. 2:
1 – No. 1: Estudo em Dó sustenido menor
Oito Estudos para piano, Op. 42 2 – No. 1 em Ré bemol Maior: Presto
3 – No. 2 em Fá sustenido menor
4 – No. 3 em Fá sustenido maior: Prestissimo
5 – No. 4 em Fá sustenido maior: Andante
6 – No. 5 em Dó sustenido menor: Affanato
7 – No. 6 em Ré bemol maior: Esaltado
8 – No. 7 em Fá menor: Agitato
9 – No. 8 em Mi bemol maior: Allegro
Dos Doze Estudos para piano, Op. 8: 10 – No. 5 em Mi maior: Brioso
11 – No. 11 em Si bemol menor: Andante
12 – No. 12 em Ré sustenido menor: Patetico
Arthur Moreira Lima, piano
Gravação: Sala de Concertos “Bulgaria” em Sofia, Bulgária, 1986 Engenheiro de som: Georgi Harizanov Produção: Nikola Mirchev Piano Steinway & Sons, Hamburgo Remasterização: Rosana Martins Moreira Lima (1998)
Pyotr Ilyich TCHAIKOVSKY (1840-1893)
Dumka, Cena Rústica Russa em Dó menor, para piano, Op. 59
13 – Andantino cantabile
Sergey Sergeyevich PROKOFIEV (1891-1953)
Sonata para piano no. 2 em Ré menor, Op. 14
14 – Allegro non troppo
15 – Allegro moderato
16 – Andante
17 – Vivace
Concerto para piano e orquestra no. 3 em Ré menor, Op. 30
1 – Allegro ma non tanto
2 – Adagio
3 – Alla breve
Arthur Moreira Lima, piano Orquestra Sinfônica da Rádio Nacional da Polônia Thomas Michalak, regência
Gravação: Katowice, Polônia, 1984 Produção: Thomas Frost
Engenheiro de som: Tom Lazarus
Piano: Steinway & Sons, Hamburgo Remasterização: Rosana Martins Moreira Lima (1998)
Dos Dez Prelúdios para piano, Op. 23:
4 – No. 4 em Ré maior: Andante cantabile
5 – No. 5 em Sol menor: Alla marcia)
Dos Nove Études-Tableaux, Op. 39:
6 – no. 5 em Mi bemol menor: Appassionato
Arthur Moreira Lima, piano
Gravação: Sala de Concertos “Bulgaria” em Sofia, Bulgária, 1986 Engenheiro de som: Georgi Harizanov Produção: Nikola Mirchev Piano Steinway & Sons, Hamburgo Remasterização: Rosana Martins Moreira Lima (1998)
Quadros de uma Exposição, para piano
1 – Promenade [I]
2 – Gnomus
3 – [Promenade II] Moderato commodo assai e con delicatezza
4 – Il Vecchio Castello
5 – [Promenade III]. Moderato non tanto, pesamente
6 – Tuileries (Dispute d’enfants après jeux)
7 – Bydło
8 – [Promenade IV]. Tranquillo
9 – Balé dos Pintinhos nas Cascas
10 – Dois Judeus Poloneses: um rico, outro pobre (Samuel Goldenberg und Schmuÿle)
11 – Promenade [V]
12 – Limoges, le marché (La grande nouvelle)
13 – Catacombæ (Sepulcrum romanum) – Cum mortuis in lingua mortua
14 – Baba-Yaga: A Cabana sobre Pernas de Galinha
15 – A Porta de Bogatyr na Antiga Capital de Kiev
Sergey PROKOFIEV
Transcrição livre para piano de Tatiana Nikolayeva (1924-1993)
Suíte do Conto Sinfônico Pedro e o Lobo, Op. 67
16 – Pedro (Tema com Variações)
17 – O Passarinho
18 – O Pato
19 – O Gato
20 – O Avô de Pedro
21 – O Lobo
22 – O Sexteto Final: Todas as Personagens
Arthur Moreira Lima, piano
Gravação: Rosslyn Hill Chapel, Londres, Reino Unido, 1999 Engenheiro de som: Peter Nicholls Produção, edição e masterização: Rosana Martins Moreira Lima Piano: Steinway & Sons, Hamburgo
As Estações do Ano, Suíte para piano, Op. 37a
1 – Janeiro: Junto à Lareira
2 – Fevereiro: Carnaval
3 – Março: O Canto da Cotovia
4 – Abril: Flor da Primavera
5 – Maio: Noites Brancas
6 – Junho: Barcarola
7 – Julho: O Canto do Ceifeiro
8 – Agosto: Colheita
9 – Setembro: Caça
10 – Outubro: O Canto do Outono
11 – Novembro: Troika
12 – Dezembro: Natal
Pyotr TCHAIKOVSKY
Transcrições de Arthur Moreira Lima (1940-2024)
Quatro Romances para piano 13 – Apenas Um Coração Solitário, Op. 6 No. 6
14 – Ode às Florestas, Op. 47 No. 5
15 – Janela Escancarada, Op. 63 No. 2
16 – Sozinho outra Vez, Op. 73 No. 6
Pyotr TCHAIKOVSKY
Das Seis Peças para piano, Op. 51 17 – No. 6: Valsa Sentimental
Arthur Moreira Lima, piano
Gravação: Rosslyn Hill Chapel, Londres, Reino Unido, 1999 Engenheiro de som: Peter Nicholls Produção, edição e masterização: Rosana Martins Moreira Lima Piano: Steinway & Sons, Hamburgo
“4ª parte da entrevista do pianista Arthur Moreira Lima a Alexandre Dias, em que ele falou sobre algumas filmagens raras que está encontrando em seu acervo, que incluem seu programa apresentado na Manchete na década de 1980. Depois relembrou o recital de Arnaldo Estrella a que assistiu em Moscou na década de 1960 e do contato que teve com ele nesta época. Mencionou um raro disco que gravou com obras de Chopin em 1969, o que acabou resultando em um convite de Arturo Michelangeli para ser um de seus alunos neste ano, e comentou o motivo que o levou a declinar. Também falou sobre russos célebres que conheceu na época, como Dimitri Shostakovich e Maya Plisetskaya. Depois relembrou recitais e concertos que tocou no Brasil após sua premiação no Concurso Chopin de 1965, incluindo o histórico recital em que tocou pela primeira vez no Theatro Municipal do Rio de Janeiro músicas de Ernesto Nazareth em 1966, anos antes dos discos antológicos que viria a gravar com obras deste compositor. Nesse contexto, falou sobre o contato que teve com o grande pesquisador Mozart de Araújo. Também comentou sobre quando se tornou assistente de Rudolf Kehrer depois que se formou no Conservatório de Moscou, e relembrou outros concursos de que participou na época, como o Concurso de Montreal em 1968, e o Concurso de Leeds em 1969, no qual ficou classificado em 3º lugar, e falou sobre os problemas que houve nesta edição. Também mencionou as vantagens e desvantagens de se tocar o Concerto No. 2 de Chopin em concursos.”
BÔNUS:
Nossa homenagem a Arthur abre vastos parênteses para estender nossa gratidão a seu professor, Rudolf Kehrer (1923-2013), por tudo que compartilhou com nosso herói. Nascido em Tbilisi, capital da Geórgia, Kehrer teve sua trajetória interrompida pela Segunda Guerra Mundial, quando sua família, de origem alemã, foi deportada para o Cazaquistão. Proibido de tocar piano durante o seu exílio, e autorizado a tão-só dedilhar o acordeão, manteve a destreza tanto quanto pôde tocando um teclado falso feito de um pedaço de madeira. Foi somente após a morte de Stalin, em 1953, que conseguiu retomar seus estudos no ainda remoto Conservatório de Tashkent, no Uzbequistão. Em 1961, viu sua carreira de concertista ser enfim lançada após vencer o Concurso de Toda-União em Moscou – cujo vencedor anterior fora também um brilhante pianista de origem alemã, de nome Sviatoslav Richter, e para o qual obtivera, aos 37 anos, a autorização excepcional para competir com pianistas mais jovens. Ainda proibido de se apresentar no Ocidente, assumiu uma cátedra no Conservatório de Moscou e fez muitas gravações para o selo Melodiya que, por muito tempo, só circularam pela sovietosfera. Eu as desconhecia completamente, até encontrar essa enorme coletânea da Doremi. O que ouvi derrubou meu queixo. Apesar da capinha safada, que parece ter sido feita pelo Paint duma babushka, o som é bom, e Kehrer, melhor ainda. Ainda mais que uma máquina de vencer na vida (vide seus retratos, que seriam bastantes para ilustrar todos os verbetes duma Enciclopédia do Estoicismo), ele foi um pianista MONSTRUOSO, tão imenso quanto seu repertório. É ouvir para crer.
CD 1
Johannes BRAHMS (1833-1897)
Concerto para piano e orquestra no. 1 em Ré menor, Op. 15
Grande Orquestra Sinfônica da Rádio de Moscou
Gennady Rozhdestvensky, regência
Gravado em 1969
Sergei RACHMANINOFF
Concerto para piano e orquestra no. 2 em Dó menor, Op. 18
Orquestra Filarmônica de Moscou
Kirill Kondrashin, regência
Gravado em 1963
Wolfgang Amadeus MOZART (1756-1791) Concerto para piano e orquestra no. 21 em Dó maior, K. 467
Orquestra Filarmônica de Moscou
Viktor Dubrovsky, regência
Gravado em 1965
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827) Concerto para piano e orquestra no.5 em Mi bemol maior, Op. 73 Orquestra Filarmônica de Moscou
Kirill Kondrashin, regência
Gravado em 1963
Franz LISZT Concerto para piano e orquestra no. 1 em Mi bemol maior, S. 124
Orquestra Filarmônica de Moscou
Viktor Dubrovsky, regência
Gravado em 1965
Sergei PROKOFIEV(1891-1953) Concerto para piano e orquestra no. 1 em Ré bemol maior, Op. 10
Orquestra Filarmônica de Moscou
Kirill Kondrashin, regência
Gravado em 1961
Georgy Aleksandrovich MUSHEL (1909-1989) Concerto para piano e orquestra no. 2 em Lá menor
Orquestra Filarmônica de Moscou
Kirill Kondrashin, regência
Gravado em 1963
Wilhelm Richard WAGNER (1813-1883)
Arranjo de Franz LISZT Abertura de “Tannhäuser”, S.442 (1848)
Gravada em 1961 BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE
CD4
Wolfgang Amadeus MOZART Sonata para piano em Lá menor, K. 310
Gravada em 1975
Ludwig van BEETHOVEN Sonata para piano no. 8 em Dó menor, Op. 13, “Patética” Sonata para piano no. 14 em Dó sustenido menor, Op. 27 no. 2, “Ao Luar”
Gravadas em 1975
Georgy Vasilyevich SVIRIDOV (1915-1998) Sonata para piano
Gravada em 1975
Franz LISZT Estudo Transcendental no. 10 em Fá menor, S. 139 (1852)
Gravado em 1961 Années de Pèlerinage, Livro 2, S. 161 – No. 1, “Sposalizio”
Gravado em 1975
Em homenagem a Fluminense Moreira Lima, seguimos com o álbum de figurinhas dos campeões da Copa Rio de 1952, . Eis o volante Jair Florêncio de Santana, ou, simplesmente, Jair (1929-2014).
Arthur Moreira Lima, um dos maiores brasileiros de todos os tempos (e percebam que nem mencionei seu instrumento!), completaria hoje 85 anos. Para celebrar seu legado extraordinário e honrar sua memória, publicaremos a integral da coleção Meu Piano/Três Séculos de Música para Piano – seu testamento musical – de hoje até 30 de outubro, primeiro aniversário de seu falecimento. Esta é a primeira das onze partes de nossa eulogia ao gigante.
Se me perguntassem qual minha primeira memória de Arthur Moreira Lima, eu provavelmente lhes diria que ela é tão remota quanto a que eu tenho de um pianista. Nasci sob o Terror e cresci entre os ventos da Abertura que traziam de volta quem partira em rabos de foguete. Em minha casa ouvia-se muita música – nenhuma que atraísse cassetetes, e quase sempre daquela prevalente em elevadores e consultórios odontológicos. Ainda assim, era música bastante para que a aparição de um pianista na tela da TV, daquelas de antenas finamente ajustadas com palha de aço, não fosse sumariamente rechaçada por uma mudança de canal para a novela da vez. E o pianista, bem, ele era sempre o mesmo: aquele tipo de perfil pontiagudo, olhos a um só tempo alheios e dardejantes, de postura algo gibosa ao teclado e a drapejar sua cabeleira enquanto debulhava com os dedos coisas que eu não imaginava possíveis a mim, menino telespectador. Ele tocava de tudo, e em todo lugar, e ante centenas, milhares, dezenas de milhares de pessoas, e sozinho, e com orquestras, e em toda e qualquer companhia. No programa que teve na TV aberta, inimaginável nesses nossos tristes tempos de Tigrinho, dividiu a ribalta com chorões e roqueiros, seresteiros e jazzistas; mostrou-me Ney Matogrosso pela primeira vez de cara limpa e apresentou-me o semideus Raphael Rabello, que toca, como Gardel canta para os argentinos, cada dia melhor. Entre um número e outro, com o maroto sotaque que nunca renegou seu berço, entrevistava seus convidados com muita descontração – tanta que promoveu o seguinte diálogo entre meus genitores:
– Esse é aquele pianista?
– É.
– Bem informal, hein?
– Sim.
– Nem parece pianista…
O programa saiu do ar sem-cerimoniosamente, e eu, exceto por um LP e outro que encontrava em briques, fiquei sem saber do madeixudo carismático, até o dia em que, exaurido por um plantão no pronto-socorro e disposto a tudo para ver algo que não fosse sangue ou pus, encontrei um palco montado no meio do maior parque de minha Dogville natal. Sobre ele, um piano, e ante este – sim, adivinharam! – o pianista que nem parecia pianista, e que, contrariando tudo o que se dizia dele – que não estudava, que não se levava a sério, que estava decadente – despachava com segurança os arpejos do Estudo Op. 10 no. 1 de Chopin sob o olhar tietante duns gatos-pingados aos quais me juntei, lá na fila do gargarejo. Emendou, em seguida, o “Revolucionário“, o “Tristesse“, o das teclas pretas, e foi esgotando o Op. 10, estudo a estudo, inteiros ou em parte, até que faltou somente…
– O número 2, Arthur.
– Hein?
– Faltou o número 2.
– Cê me odeia, né? – gargalhava – Mas certamente não tanto quanto eu odeio o número 2.
E atacou o temido Op. 10 no. 2, com aquelas escalas rapidíssimas todinhas com os dedos fracos da mão direita, enquanto resmungava das tendinites que ele lhe trouxera.
– Que mais cês querem?
– …
– Digam logo, que daqui a pouco vão me levar à força pro camarim.
– Piazzolla, então!
E nos deu um Adiós Nonino com a mesma eletricidade que pôs suas madeixas em riste na memorável capa do álbum que dedicou a Astor. Ao terminar, com o produtor já a olhar com ganas de arrancá-lo do palco, um dos gatos-pingados lhe alcançou um número de telefone:
– Volto hoje para o Rio – explicava-se, enquanto guardava o papelucho na casaca – mas não deixo de te ligar.
– A costela está assando desde que saí de casa. Eu e ela te aguardamos.
– E a cerveja?
– Ela também. Mais gelada que em Moscou.
E foi arrastado para as coxias, de onde voltou para tocar um Tchaikovsky furioso com a Sinfônica de Dogville. Nunca soube se ele, enfim, telefonou para o churrasqueiro. Imagino que sim. Afinal, aquele ex-menino prodígio, de nobre arte forjada no Brasil e burilada na França e na União Soviética, capaz de dialogar com bolcheviques e mencheviques, maragatos e chimangos, cronópios e famas, sempre foi também um perfeito exemplo do que em minha terra se chama de “pau de enchente” – aquele tipo que, como os galhos de árvores levados pelas enxurradas, vai parando aqui e ali – e nunca perdeu qualquer oportunidade de falar, de ouvir e de aprender.
– Decadente.
– Quê?
– Sim. Olha aí: tá vendendo disco na Caras!
– Eita…
O brasileiro não é gentil com seus heróis, e desancaram o heroico Sr. Pau de Enchente quando ele lançou sua antologia pianística a preços módicos e acessível em qualquer banca de revistas. Onde outros viam dinheirismo e decadência, eu, seu desde sempre tiete, só via generosidade – a mesma que o fez tocar para aquelas centenas, aqueles milhares, aquelas dezenas de milhares de gentes, a brilhar na TV e matar de inveja tantos colegas de ofício, a implodir o Muro da Vergonha entre os assim chamados “erudito” e “popular’, e que o levaria, em seu caminhão-teatro feito Caravana Rolidei, a tocar para compatriotas que nunca tinham visto um piano na vida.
Eu nunca consegui lhe agradecer, que se dirá o bastante – se é que haveria gratidão suficiente para tanta dedicação aos ouvidos de seu país! Até tive oportunidades: afinal, tanto eu quanto Sr. De Enchente escolhemos a mesma ilha para passar nossos últimos anos. Por algum tempo, inclusive, compartimos a mesma praia em que, vez que outra, nossos percursos se cruzavam. Numa delas, ele jogava bola com uma criança que, com um pontapé somado ao vigor do Vento Sul, mandou a redondinha na minha direção. Eu, que tenho dois pés esquerdos, devolvi-a com uma vergonhosa rosca para os devidos donos. Já me conformava com a ideia de ir buscá-la ainda mais longe, quando, antes mesmo dela quicar no chão, aquele torcedor doente do Fluminense Football Club aparou a pelota com um golpe seco que orgulharia o Príncipe Etíope e, com um toque de letra digno de Super Ézio, devolveu-a à remetente.
– Valeu, meu bom!
Craque com as mãos e com os pés, o Pelé e o Garrincha do Piano Brasileiro, gênio da raça: também tocas cada dia melhor! Venero-te tanto que jamais te conseguirei ser crítico. Se os leitores-ouvintes o quiserem, que assim sejam – mas minha homenagem aqui, ela terá só carinho e saudade ❤️.
Em memória de Fluminense Moreira Lima (16 de julho de 1940, Rio de Janeiro – Florianópolis, 30 de outubro de 2024) em seu 85º aniversário.
ARTHUR MOREIRA LIMA – MEU PIANO/TRÊS SÉCULOS DE MÚSICA PARA PIANO Coleção publicada pela Editora Caras entre 1998-99, em 41 volumes Idealizada por Arthur Moreira Lima Direção artística de Arthur Moreira Lima e Rosana Martins Moreira Lima
Volume 1: CLÁSSICOS FAVORITOS I
Johann Sebastian BACH (1685-1750)
Transcrição de Myra Hess (1890-1965)
Da Cantata “Herz und Mund und Tat und Leben“, BWV 147: 1 – Coral: Jesus bleibet meine Freude
Wolfgang Amadeus MOZART (1756-1791)
Da Sonata para piano no. 11 em Lá maior, K. 331: 2 – Alla Turca: Allegretto
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827) Bagatela em Lá menor, WoO 59, “Für Elise” 3 – Poco moto
Carl Maria Friedrich Ernst Freiherr von WEBER (1786-1826)
Da Sonata para piano no. 1 em Dó maior, Op. 24: 4 – Rondo: Presto (“Perpetuum mobile“)
Robert Alexander SCHUMANN (1810-1856)
Das Fantasiestücke, Op. 12: 5 – No. 3: “Warum?”
Ferenc LISZT (1810-1886)
Dos Grandes Estudos de Paganini, S. 141:
6 – No. 3: La Campanella
Jules Émile Frédéric MASSENET (1842-1912)
De Thaïs, ópera em três atos:
7 – Méditation (transcrição do compositor)
Jakob Ludwig Felix MENDELSSOHN Bartholdy (1809-1847)
Da Música Incidental para Ein Sommernachtstraum (“Sonho de uma Noite de Verão”), de William Shakespeare, Op. 61:
8 – No. 9: Marcha nupcial (transcrição do compositor)
Pyotr Ilyich TCHAIKOVSKY (1840-1893)
Das Dezoito Peças para piano, Op. 72:
9 – No. 2: Berceuse
Sergei Vasilievich RACHMANINOFF (1873-1943)
Dos Morceaux de Fantaisie, Op. 3: 10 – No. 2: Prelúdio em Dó sustenido menor
Anton Grigorevich RUBINSTEIN (1829-1894)
Das Duas Melodias, Op. 3: 11 – No. 1: Melodia em Fá maior
Alexander Nikolayevich SCRIABIN (1872-1915)
Dos Doze Estudos, Op. 8: 12 – No. 12 em Ré sustenido menor, “Patético”
Achille Claude DEBUSSY (1862-1918)
Da Suite Bergamasque, L. 75: 13 – No. 3: Clair de Lune
Manuel DE FALLA y Matheu (1876-1946)
De El Amor Brujo, balé em um ato: 14 – Dança Ritual do Fogo (transcrição do compositor) BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE
Volume 3: CLÁSSICOS FAVORITOS II
Johann Sebastian BACH (1685-1750)
Transcrição de Ferruccio Busoni (1866-1924)
Da Toccata e Fuga em Ré menor para órgão, BWV 565:
1 – Toccata
Giuseppe Domenico SCARLATTI (1685-1757)
2 – Sonata em Mi Maior, L. 23 (K. 380)
Carl Philipp Emanuel BACH (1714-1788)
3 – Solfeggietto em Dó menor, H 220, Wq. 117:2
Georg Friedrich HÄNDEL Da Suíte para Teclado no. 5 em Mi maior, HWV 430: 4 – No. 4: Ária com Variações, “The Harmonious Blacksmith”
Ludwig van BEETHOVEN
5 – Seis Escocesas, WoO 83
Fryderyk Franciszek CHOPIN (1810-1849)
6 – Fantasia-Improviso em Dó sustenido menor, Op. 66
Gioachino Antonio ROSSINI (1792-1868)
Das Soirées Musicales: 7 – No. 8: La Danza (Tarantella Napolitana)
Felix MENDELSSOHN Das Canções sem Palavras: 8 – Allegro non troppo (Op. 53 no. 2) – Allegretto grazioso (Op. 62 no. 6, Frühlingslied) – Presto (Op. 67 no. 4, La Fileuse)
Ferenc LISZT Dos Liebesträume, Noturnos para piano, S. 541: 9 – No. 3 em Lá bemol maior
Edvard Hagerup GRIEG (1843-1907)
Do Peças Líricas, Livro III, Op. 43: 10 – No. 1: Papillon
Antonín Leopold DVOŘÁK (1841-1904)
Das Oito Humoresques, Op. 101: 11 – No. 7 em Sol bemol maior
Pyotr TCHAIKOVSKY
Das Estações, Op. 37a: 12 – No. 11: Novembro (Troika)
Sergey Sergeyevich PROKOFIEV (1891-1953)
Das Dez Peças para piano, Op. 12: 13 – No. 2: Gavota em Sol menor
Claude DEBUSSY
14 – La Plus que Lente, L. 121
Isaac Manuel Francisco ALBÉNIZ y Pascual (1860-1909)
Da Suíte Espanhola no. 1, Op. 47:
15 – No. 3: Sevilla
Gravações realizadas na Saint Philip’s Church em Londres, Reino Unido, em 1998 Piano Steinway and Sons Engenheiro de som: Peter Nichols Direção Musical, produção, edição e masterização por Rosana Martins Moreira Lima
Fãs de Arthur encontram-se doravante INTIMADOS a ouvir o podcast “Conversa de Pianista”, do Instituto Piano Brasileiro, em que nosso ídolo conversa com o incrível Alexandre Dias, e que foi ao ar em 2020:
“1ª parte da entrevista do pianista Arthur Moreira Lima a Alexandre Dias, em que ele falou sobre como o piano começou em sua vida, suas primeiras aulas em família, seus primeiros recitais quando criança prodígio, e suas aulas com a grande professora Lúcia Branco, que o levou a participar do I Concurso Internacional de Piano do Rio de Janeiro do 1957. Também comentou sobre grandes pianistas a que assistiu nas décadas de 1940 e 1950. Foram mencionados alguns dos assuntos que serão conversados nos próximos episódios, com especial atenção para sua rica discografia, e também sua premiação em importantes concursos internacionais de piano, como o Concurso Chopin (1965), Concurso de Leeds (1969) e o Concurso Tchaikovsky (1970). Nossa homenagem e agradecimento ao grande pianista Arthur Moreira Lima, que em 2020 completa 80 anos”.
Em mais uma homenagem a Fluminense Moreira Lima, oferecer-lhe-emos um álbum de figurinhas com os heróis da final da Copa Rio de 1952, que certamente fizeram Arthurzinho chorar de alegria. Eis o arqueiro Carlos José Castilho, o Castilho (1927-1987).
Este CD recebeu todos os prêmios possíveis de se ganhar em 1994. Mereceu, é sensacional, esplêndido, até hoje imbatível, creio. Rostropovich estendeu a mão para o menino Vengerov, na época com 20 anos, para que ele subisse nos ombros de gigantes como Kogan e Oistrakh e conseguisse superá-los. Aqui, Rostrô atua como regente. Não há nada mais ou menos nesta gravação — solista, orquestra e regente estão impecáveis. Se o destaque é o tenso Concerto de Shostakovich, Prokofiev não lhe fica atrás. Creio que Rostrô deve ter orientado Vengerov a fazer a mais dilacerante das cadenzas na Passacaglia de Shosta, uma especialidade de Oistrakh. Nela o violino acaba abandonado pela orquestra, realizando um belíssimo e longo solo que dá entrada ao movimento final. Este CD é um dos que devem ser levados para a ilha deserta ou, no mínimo, deve ser guardado no nosso ventrículo esquerdo, que é onde o coração bate mais forte.
Prokofiev: Concerto para Violino Nº 1 / Shostakovich: Concerto para Violino Nº 1 (Vengerov / Rostropovich)
1. Prokofiev: Violin Concerto No. 1 In D Major, Op. 19: Andantino
2. Prokofiev: Violin Concerto No. 1 In D Major, Op. 19: Scherzo: Vivacissimo
3. Prokofiev: Violin Concerto No. 1 In D Major, Op. 19: Moderato
4. Shostakovich: Violin Concerto No.1 In A Minor: Nocturne: Moderato
5. Shostakovich: Violin Concerto No.1 in A minor: Scherzo: Allegro
6. Shostakovich: Violin Concerto No.1 in A minor: Passacaglia: Andante
7. Shostakovich: Violin Concerto No.1 in A minor: Burlesque: Allegro con brio
Performed by London Symphony Orchestra
with Maxim Vengerov, violin
Conducted by Mstislav Rostropovich
Se não me engano, faz muito tempo que não posto estes concertos, e como eles fazem falta …
A violinista alemã Franziska Pietsch faz um belo trabalho aqui, considerando o quão difíceis e complexos são estes concertos. E ela também não é mais uma garotinha, ao contrário, já está adentrada nos cinquenta e tantos anos, e talvez falte a impetuosidade da juventude em alguns momentos desta gravação, principalmente no Concerto nº1, mas nada que comprometa o conjunto. Sentimos então a maturidade musical da artista se manifestando, principalmente a partir do belíssimo final do último movimento, e é nestes momentos mais emotivos e eloquentes da obra que sentimos seu tremendo senso de equilíbrio e confiança.
Na montanha russa de emoções do Segundo Concerto Franziska nos envolve na intrincada estrutura harmônica, por vezes quase tropeçando na trama que Prokofiev teceu com maestria e genialidade. Não temos aqui tempo para muitos suspiros e sussurros, é como se tudo ocorresse nas sombras, mas por vezes conseguimos enxergar momentos de luz e esperança. Considerando o momento histórico em que o compositor viveu, período de sombras e tensões, conseguimos entender o enredo da obra, por assim dizer. E assim, novamente naqueles momentos mais líricos, como o magnífico Andante assai, a maturidade artística e musical de Franziska se impõe.
Desafios existem para serem superados, diz o velho clichê. E Franziska Pietsch os encara com autoridade e confiança. Vale a pena conhecer esta violinista, aqui acompanhada pelo ótimo Cristian Macelaru, à frente da Deutsches Symphonie-Orchester Berlin.
Violin Concerto No. 1 in D major, Op. 19
I. Andantino 9:31
II. Scherzo: Vivacissimo 4:00
III. Moderato – Allegro moderato 8:25
Violin Concerto No. 2 in G minor, Op. 63
I. Allegro moderato 11:27
II. Andante assai – Allegretto 10:10
III. Allegro, ben marcato 6:31
Franziska Pietsch
Deutsches Symphonie-Orchester Berlin
Cristian Măcelaru
Mais um outono para a Rainha, e desta feita ela nos presenteia com gravações novas – tão novas, claro, quanto podem ser as de alguém tão avessa aos estúdios e afeita a dividir a ribalta com jovens colegas e os parceiros de sempre. Estas que ora lhes apresento foram feitas algumas semanas depois do seu octagésimo aniversário, em junho de 2021, no festival que Martha vem consolidando em Hamburgo e no qual desfruta do privilégio de selecionar a pinça o tradicional petit comité que tem garantido muito de sua longeva alegria em pisar palcos.
No que tange a Sua Majestade, o melhor que ela nos oferece nesses volumes são a leitura da sonata Op. 30 no. 3 de Beethoven, com Renaud Capuçon – seu mais frequente e afiado parceiro ao arco, nos últimos anos -, um ebuliente Segundo Concerto de Ludwig, e o belíssimo Trio de Mendelssohn, ao lado de Mischa Maisky e da über-diva Anne-Sophie Mutter. A família Margulis – Jura, Alissa e Natalia – traz um azeitadíssimo Trio “Fantasma” e um mui tocante “Canto dos Pássaros”, joia folclórica catalã posta em pauta por Pau Casals. O variado cardápio também inclui as “Canções e Danças da Morte” de Mussorgsky, com o ótimo baixo Michael Volle, e uma Sonata para dois pianos e percussão de Bartók para a qual a Rainha, que tanto a tocou com nosso Nelson Freire, convidou seu outro Nelson favorito, o compatriota Goerner. O melhor retrogosto, entretanto, não foi o que veio de dedos hermanos, e sim das diminutas mãos de Maria João em Schubert – que maravilhosos, os dois improvisos! – e da última apresentação pública de Nicholas Angelich, um brahmsiano que sempre honrou o grande hamburguense e fez da Segunda Sonata para viola e piano seu canto de cisne.
ooOoo
Uma breve nota: a partir de hoje, mudarei a maneira de compartilhar música com os leitores-ouvintes. Cansei de ver a pedra rolar tantas vezes morro abaixo. Não farei mais comentários. Que venham os tomates.
Disco 1
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
Sete Variações para violoncelo e piano sobre “Bei Männern, welche Liebe fühlen”, da ópera “Die Zauberflöte” de Wolfgang Amadeus Mozart, WoO 46 1 – Thema. Andante
2 – Variation I
3 – Variation II
4 – Variation III
5 – Variation IV
6 – Variation V: Si prenda il tempo un poco più vivace
7 – Variation VI. Adagio
8 – Variation VII. Allegro ma non troppo
Mischa Maisky, violoncelo
Martha Argerich, piano
Das Três Sonatas para violino e piano, Op. 30:
Sonata no. 3 em Sol maior 9 – Allegro assai
10 – Tempo di Minuetto, ma molto moderato e grazioso
11 – Allegro vivace
Renaud Capuçon, violino
Martha Argerich, piano
Dos Dois Trios para piano, violino e violoncelo, Op. 70:
No. 1 em Ré maior, “Fantasma” 12 – Allegro vivace e con brio
13 – Largo assai ed espressivo
14 – Presto
Alissa Margulis, violino Natalia Margulis, violoncelo Jura Margulis, piano
Disco 2
Ludwig van BEETHOVEN
Concerto para piano e orquestra no. 2 em Si bemol maior, Op. 19
1 – Allegro con brio
2 – Adagio
3 – Rondo. Molto allegro
Martha Argerich, piano
Symphoniker Hamburg
Sylvain Cambreling, regência
Jakob Ludwig Felix MENDELSSOHN-Bartholdy (1809-1847)
Trio para piano, violino e violoncelo no. 1 em Ré menor, Op. 49
4 – Molto allegro agitato
5 – Andante con moto tranquillo
6 – Scherzo: Leggiero e vivace
7 – Finale: Allegro assai appassionato
Anne-Sophie Mutter, violino
Mischa Maisky, violoncelo
Martha Argerich, piano
Johannes BRAHMS (1833-1897)
Das Duas Sonatas para clarinete e piano, Op. 120 (transcritas para viola e piano pelo compositor):
Sonata no. 2 em Mi bemol maior 8 – Allegro amabile
9 – Allegro appassionato
10 – Andante con moto – Allegro – Più tranquillo
Gérard Caussé, viola
Nicholas Angelich, piano
Disco 3
Franz Peter SCHUBERT (1797-1828)
Dos Improvisos para piano, D. 935 (Op. Posth. 142): No. 2 em Lá bemol maior
1 – Allegretto
No. 3 em Si bemol maior, “Rosamunde” 2 – Andante
Sonata para piano em Lá maior, D. 664
3 – Allegro moderato
4 – Andante
5 – Allegro
Maria João Pires, piano
Wolfgang Amadeus MOZART (1756-1791)
Sonata para piano a quatro mãos em Dó maior, K. 521
6 – Allegro
7 – Andante
8 – Allegretto
Martha Argerich e Maria João Pires, piano
Disco 4
Pau CASALS i Defilló (1876-1973)
1 – El Cant dels Ocells, para violino, violoncelo e piano
Alissa Margulis, violino
Natalia Margulis, violoncelo
Jura Margulis, piano
Manuel de FALLA y Matheu (1876-1946)
Suite Popular Espanhola, para violino e piano
2 – El Paño Moruno
3 – Nana
4 – Canción
5 – Polo
6 – Asturiana
7 – Jota
Quinteto em Fá menor para dois violinos, viola, violoncelo e piano
8 – Molto moderato quasi lento – Allegro
9 – Lento, con molto sentimento
10 – Allegro non troppo ma con fuoco
Akiko Suwanai e Tedi Papavrami, violinos Lyda Chen, viola Alexander Kniazev, violoncelo Evgeni Bozhanov, piano
Disco 5
Astor Pantaleón PIAZZOLLA (1921-1992)
1 – Le Grand Tango
Gidon Kremer, violino Georgijs Osokins, piano
Leonard BERNSTEIN (1918-1990)
Danças Sinfônicas de West Side Story, para dois pianos
2 – Prologue
3 – Somewhere
4 – Scherzo
5 – Mambo
6 – Cha-cha
7 – Meeting Scen
8 – Cool Fugue
9 – Rumble Track
10 – Finale
Apesar de a orquestra ser a do Concertgebouw de Amsterdam, aqui temos um Prokofiev com sotaque russo. As Sinfonias de Nº 5 e 7 são as minhas preferidas dentre as que o ucraniano escreveu e Ashkenazy realiza um de seus melhores trabalhos com ela. É linda esta sinfonia. Simplesmente, ela não tem momentos fracos, é toda perfeita. Ouçam e confiram! Nada a ver, mas sempre fico puto ao pensar na morte de Prokofiev. Ele morreu aos 61 anos, em 5 de março de 1953, no mesmo dia que Stalin. Por três dias, a oficialidade e a multidão que se despedia do Rei dos Expurgos impossibilitou a retirada do corpo de Prokofiev para o serviço funerário. No funeral, não havia flores nem músicos, todos requisitados pelo funeral do líder soviético.
Gravação de 1988. Eu tinha esta gravação em fita cassete… Jansons voltou a gravar esta Sinfonia com o Concertgebouw e o fez ainda melhor. Mas aqui nós temos a célebre orquestra de Leningrado, o que sempre dá arrepios em velhos comunas. Em 1988, eles ainda eram muito a orquestra de Mravinsky — ele se aposentou em 1988 depois de liderá-los com mão de ferro por cinquenta anos. O letão Jansons chegou ao pódio quase por direito de nascença. Seu pai, Arvids, tinha sido “maestro substituto” da orquestra atrás de Mravinsky e Sanderling. Mas Mariss, com 45 anos, não era um maestro jovem e inexperiente, e nasceu para isso. Aqui, tudo é vivacidade. Os músicos estão animados e o som é visceral. Como de costume para Leningrado, o som é o de estar na plateia, não somos jogados no meio da orquestra. Jansons não herdou a Filarmônica de Leningrado, nem seu pai, que morrera antes, em 1984. Essa honra coube ao grande Yuri Temirkanov, cuja gravação da Quinta pela RCA é um arraso. A 5ª simplesmente não tem momentos fracos. É uma tremenda sinfonia!
Temos neste CD dois grandes concertos para piano, duas obras primas incontestes. O que eles tem em comum talvez seja o fato de terem sido compostos por compositores russos, e paro por aí. Tratam-se de obras muito diferentes em sua concepção e em sua estrutura. E talvez em suas diferenças eles se complementem.
Lançado lá em 2015, a gravação nos apresenta uma nova estrela dos teclados, a italiana Beatrice Rana, na época com meros 22 anos de idade. A impetuosidade da juventude foi um fator importante em seu desafio de encarar estas obras. É preciso se jogar de corpo e alma, mergulhar fundo para voltar renovado para a superfície. E Beatrice Rana encarou o desafio com muita força, talento e competência.
Lírica e terna, audaciosa e impetuosa, todos estes adjetivos podem ser aplicados a ela, e são necessários quando se encaram estes concertos. Nada é tão simples quanto parece, depois da tempestade vem uma relativa calmaria, para logo depois novamente se imprimir um ritmo alucinante e intenso. Imagino o quanto os músicos ficam exaustos depois de encararem estes dois petardos.
Enfim, um belíssimo CD para ser apreciado por aqueles que gostam de emoções fortes. Fui ver o que os clientes da amazon.com tinham a dizer sobre ele e quase todos foram unânimes em lhe dar merecidíssimas cinco estrelas. Não foi a estreia de Beatrice Rana no mercado fonográfico, anteriormente ela já lançara dois CDs, mas já nos mostra uma artista madura, apesar da idade, e que não teme os desafios.
Boa apreciação, como diria nosso querido colega Carlinus.
01 – Piano Concerto No. 2 in G Minor, Op. 16- I. Andantino – Allegretto
02 – Piano Concerto No. 2 in G Minor, Op. 16- II. Scherzo. Vivace
03 – Piano Concerto No. 2 in G Minor, Op. 16- III. Intermezzo. Allegro moderato
04 – Piano Concerto No. 2 in G Minor, Op. 16- IV. Finale. Allegro tempestoso
05 – Piano Concerto No. 1 in B-Flat Minor, Op. 23- I. Allegro non troppo e molto maestoso – Allegro con spirito
06 – Piano Concerto No. 1 in B-Flat Minor, Op. 23- II. Andantino semplice – Prestissimo
07 – Piano Concerto No. 1 in B-Flat Minor, Op. 23- III. Allegro con fuoco
Beatrice Rana – Piano
Orchestra Dell´Accademia Nazionale Di Santa Cecília
Antonio Pappano – Conductor
Escritos entre 1915 e 1923 (1º para violino), entre 1913 e 1921 (3º para piano) e em 1935 (2º para violino), esses concertos são da fase mais internacional de Prokofiev, quando ele se mudou várias vezes mas viveu principalmente em Paris e foi fortemente influenciado pelo estilo orquestral dos balés (anos 1910) e obras neoclássicas (1918 em diante) de Stravinsky. Inclusive o impacto de Stravinsky, naqueles tempos, longe de ter se limitado a Prokofiev, foi imenso e, em comparação, nosso querido Sergei parecia um compositor menor: embora também grande, foi às vezes visto como um imitador, desprovido de grandes originalidades como, por exemplo, o inimitável tom folclórico de Bartók. Hoje, há um certo consenso de que a linguagem de Prokofiev é uma mistura única de coisas que circulavam em sua época e não um mero pastiche.
A orquestra da Suisse Romande e seu maestro, o longevo Ernest Ansermet (1883-1969), eram especialistas em obras desse repertório do início do século, incluindo dezenas de gravações de Stravinsky, Debussy e Honegger. Então é claro que a orquestra se sai muito bem aqui nessas obras de Porkofiev.
Ruggiero Ricci – o som dele é mais cativante do que o sorriso
Ruggiero Ricci (1918-2012) foi um violinista nascido na Califórnia que também era muito respeitado em obras que, na época, eram ainda contemporâneas, como os concertos e sonatas de Bartók e Prokofiev, a Kammermusik No. 4 de Hindemith, etc. Ele estreou o concerto para violino de Ginastera. Julius Katchen (1926-1969) também nasceu nos EUA e faleceu jovem, de câncer, em Paris.
Sergei Prokofiev (1891-1953):
Violin Concerto No. 1 In D Major, Op. 19
1. I. Andantino
2. II. Scherzo Vivacissimo
3. III. Moderato
Violin Concerto No. 2 In G Minor, Op. 63
4. I. Allegro Moderato
5. II. Andante Assai
6. III. Allegro, Ben Marcato
Piano Concerto No. 3 In C Major, Op. 26
7. I. Andante – Allegro
8. II. Tema Con Variazione
9. III. Allegro Ma Non Troppo
Ruggiero Ricci – violin (tracks: 1-6, recorded 1958)
Julius Katchen – piano (tracks: 7-9, recorded 1953)
Orchestre de la Suisse Romande, Ernest Ansermet
Este foi o álbum de estreia de Julia Fischer. Sua colaboração com Yakov Kreizberg já vinha de algum tempo. Ela o considerava o mais simpático dos maestros, e ele a ajudou a concretizar a gravação. Ele compartilhava com ela a admiração pelo concerto de Khachaturian e apoiou o plano de gravar esta peça imerecidamente negligenciada. Ela achava difícil até vendê-la para os promotores de concertos, que sem dúvida teriam preferido a milésima versão do concerto de Tchaikovsky. Mas ambos os artistas acreditaram em todos os trinta e sete minutos da obra, que é mesmo magnífica. Kreizberg, imaginem, morreu em 2011 com apenas 51 anos. No Concerto de Khat, há um “apelo de sabor armênio”, às vezes soando folclórico, até mesmo oriental. Há poesia também, como no tratamento do segundo tema, e de todo o comovente Andante sostenuto, com mais cor armênia. David Oistrakh estreou este concerto. O Primeiro Concerto para Violino de Prokofiev é a obra mais familiar deste programa, tanto em concerto como em disco. Nas notas do livreto de Fischer, ela menciona sua ironia, sarcasmo, e seu lirismo, no qual ela diz que pretendeu focar. Ela faz justiça a todos os os estados de espírito, pois saborear esses contrastes é essencial, né? E ela tem razão — este é um concerto principalmente lírico, e sua estrutura incomum de dois movimentos externos lentos emoldurando um scherzo central influenciou alguns outros concertos de cordas. A abordagem de Fischer é bastante íntima e convincente. O Glazunov é aceitável, com um allegro final bem dançável e assobiável.
O Primeiro Concerto para Piano de Prokofiev (1911) é uma obra da juventude, o Segundo (1912) é o mais original e memorável — na verdade, uma de suas obras-primas. Este concerto, apesar da sua grandeza, parece atrair principalmente pianistas de nicho — como Vladimir Feltsman, emigrado russo nos EUA desde o final da década de 1980, cujo legado gravado consiste em grande parte em alguns grandes concertos russos mais Bach e algum Schubert. Nesta versão, Prokofiev não soa tão revolucionário e audaz quanto talvez devesse, as obras soam enérgicas e charmosas. Está bem, mas estas versões perdem de longe para Ashkenazy, Argerich, Bavouzet e Beroff (Também temos Ash e a Rainha no PQP, só que o Bavouzet e o Beroff têm a integral dos Concertos).
Serguei Prokofiev (1891-1953): Concertos para Piano Nº 1 e 2 + Romeu dá adeus à Julieta (Feltsman / Tilson Thomas)
Concerto No. 1 For Piano & Orchestra, Op. 10 (D-Flat Major / Des-Dur / Ré Bémol Majeur)
Allegro Brioso 3:38
Meno Mosso 3:27
Andante Assai 3:59
Allegro Scherzando 4:30
Concerto No. 2 For Piano & Orchestra, Op. 16 (G Minor / G-Moll / Sol Mineur)
I–Andantino 11:45
II–Scherzo: Vivace 2:42
III–Intermezzo: Allegro Moderato 7:01
IV–Finale: Allegro Tempestoso 11:16
“Romeo Bids Juliet Farewell” (Lento) (No. 10 From 10 Pieces For Piano From Romeo & Juliet, Op. 75) 6:56
Os cabelos de Feltsman ficaram mais ralos, os que sobraram ficaram brancos e acho que chegaram uns quilinhos a mais. Acontece com tudo mundo que não morre, Vladi. Aliás, ainda bem!
Talvez, quem sabe?, este seja um dos melhores CDs que já postei aqui. Na minha opinião é, sem dúvida. Como dois parênteses, dois extraordinários Concertos para Piano de Prokofiev cercam o Concerto Nº 3 do maior compositor do século XX (provocação gratuita do bem, mesmo que expresse minha opinião real, àqueles que votam em Stravinsky, outro gênio indiscutível). Ao piano, Marthita em sua melhor forma. Na última vez em que veio à Porto Alegre, pedi-lhe dois autógrafos, um num antigo vinil onde interpretava peças para dois pianos junto com Nelson Freire — ela olhou para a capa e gritou “Nossa, eu um dia fui jovem, eu era um pouco mais bonita do que a bruxa de hoje, não?”, ao que assenti com entusiasmo… — e este que posto hoje — “Nossa, neste aqui eu tocava muito bem!”, e caiu na gargalhada, completando: “Gravamos tudo rapidamente. Foi perfeito. Gastamos mais tempo conversando e tirando as fotos em preto e branco para o CD”.
Tinha razão, foi tudo perfeito. O que Martha Argerich faz nestes três concertos em termos de virtuosismo e temperatura emocional é efetivamente espantoso, apenas repetível sob outra forma, tão pessoal é sua abordagem.
Não é um CD normal este que você vai baixar hoje.
Prokofiev (1891-1953): Concertos para piano Nº 1 & 3 / Bartók (1881-1945): Concerto para piano Nº 3 (Argerich / Dutoit)
Prokofiev – Piano Concerto No. 1 in D flat Op. 10 1. First movement: Allegro brioso 6:57
2. Second movement: Andante assai 4:34
3. Third movement: Allegro scherzando 4:31
Bartók – Concerto for Piano and Orchestra No. 3 Sz119 4. First movement: Allegretto 7:22
5. Second movement: Adagio religioso -[poco più mosso] – tempo I 10:45
6. Third movement: Allegro vivace – [presto] 6:50
Prokofiev – Piano Concerto No. 3 in C Op. 26 7. First movement: Andante – Allegro 9:43
8. Second movement: Tema (Andatino) and Variations 9:39
9. Third movement: Allegro ma non troppo – meno mosso – Allegro 9:51
Martha Argerich, piano
Orchestre Symphonique De Montréal
Charles Dutoit
Um disquinho bem mais ou menos. Um Shostakovich molenga e um Prokofiev mais ou menos. Harrell e Schwarz ficam a léguas de Rostropoviche Ozawa e a quilômetros disto aqui (Gabetta e Mäkelä). Acho que não é música pra eles, porque, por exemplo, eu me desmilinguo ouvindo Harrell tocando as Sonatas de Brahms para Violoncelo e Piano e aqui não acontece nada. Fui ler outras críticas para ver se estava muito errado e a Gramophone me tranquilizou ao chamar o Shosta de molenga e o Prokofiev de… Nem lembro mais. Harrell é um mestre, mas talvez se saia melhor entre os românticos.
Shostakovich: Concerto para Violoncelo e Orq. Nº 2 / Prokofiev: Sinfonia Concertante para Violoncelo e Orq. (Harrell, Schwarz, Royal Liverpool Phil Orch)
Cello Concerto No. 2 In G Major Op. 126
Composed By – Dmitri Shostakovich
(34:20)
1 I. Largo 13:42
2 II. Allegretto — 4:40
3 III. Allegretto 15:58
Symphony-Concerto For Cello And Orchestra In E Minor Op. 125
Composed By – Sergei Prokofiev
(38:03)
4 I. Andante 10:14
5 II. Allegro Giusto 17:26
6 III. Andante Con Moto — Allegretto — Allegro Marcato 10:23
Violoncelo – Lynn Harrell
Orchestra – Royal Liverpool Philharmonic Orchestra
Conductor – Gerard Schwarz
Ora, ora, ora, uma repostagem? Não, meus caros amigos nada disso. A versão do Celibidache era a versão do Celibidache: lenta, tão lenta que não coube mais nada no CD. Aqui temos uma concepção diferente das Sinfonias Nº 1 e 5, bem dentro do habitual. Se ganhamos uma gravação boa, super-melodiosa e dentro dos padrões, perdemos algo da monumentalidade do Celi. E ganhamos uma versão completa do divertido “Tenente Kijé” e ainda a Marcha do “Amor por Três Laranjas”. Apesar da seriedade da Sinfonia Nº 5 parecer estranha ao resto do repertório, trata-se de um belo CD. A orquestra eslovaca que interpreta as obras mantém intacta a reputação do país de contar com conjuntos extraordinários.
Sergei Prokofiev (1891-1953): Sinfonias Nº 1 e 5 / Tenente Kijé / Marcha de “O Amor por Três Laranjas” (Gunzenhauser / Mogrelia)
1. Symphony No. 1 in D major, Op. 25, “Classical”: I. Allegro 4:16
2. Symphony No. 1 in D major, Op. 25, “Classical”: II. Larghetto 4:03
3. Symphony No. 1 in D major, Op. 25, “Classical”: III. Non troppo allegro 1:27
4. Symphony No. 1 in D major, Op. 25, “Classical”: IV. Molto vivace 4:21
Slovak Philharmonic Orchestra
Gunzenhauser, Stephen, Conductor
5. Symphony No. 5 in B flat major, Op. 100: I. Andante 14:08
6. Symphony No. 5 in B flat major, Op. 100: II. Allegro marcato 9:00
7. Symphony No. 5 in B flat major, Op. 100: III. Adagio 13:33
8. Symphony No. 5 in B flat major, Op. 100: IV. Allegro giocoso 10:41
Slovak Philharmonic Orchestra
Gunzenhauser, Stephen, Conductor
9. Lieutenant Kije, Op. 60: I. The Birth of Kije 4:10
10. Lieutenant Kije, Op. 60: II. Romance 4:48
11. Lieutenant Kije, Op. 60: III. Kije’s Wedding 2:57
12. Lieutenant Kije, Op. 60: IV. Troika 3:04
Slovak State Philharmonic Orchestra, Kosice
Mogrelia, Andrew, Conductor
13. The Love for Three Oranges Suite, Op. 33bis: No. 3: March
Slovak State Philharmonic Orchestra, Kosice
Mogrelia, Andrew, Conductor
O balé Romeu e Julieta de Prokofiev é uma composição dividida em três atos e treze cenas. Foi estreada no dia 11 de janeiro de 1940 no teatro Kirov, em Leningrado, e é, obviamente, baseado na tragédia homônima de William Shakespeare. Prokofiev extraiu deste balé três suítes orquestrais (Op. 64, 64a e Op. 101), além de uma seleção ainda mais reduzida adaptada para o piano (Op. 75). Bem. quem procura esta Suíte não precisa ir além deste magnífico CD. Este é um disco extraordinário e eu gostaria que a CBS tivesse contratado Esa-Pekka Salonen para fazer a versão completa do balé. Tudo começa por Prokofiev, claro, ao selecionar os itens que constariam da Suíte. Eles são admiravelmente paralelos à narrativa, mas também estão dispostos de forma a tornar a escuta contínua muito prazerosa. A execução orquestral é maravilhosamente feliz em seus detalhes: “Julieta – A Jovem” é cativantemente leve e graciosa, enquanto a mais robusta “Máscaras” tem apontamentos rítmicos soberbamente nítidos. O contorno melódico de Salonen é comovente na “Dança do Amor” com um toque das cordas maravilhosamente livre e expressivo, enquanto que, mais tarde, o “Adeus antes da despedida” é igualmente tocante. As duas danças que seguem a “Dança do Amor” fazem um contraste encantador. A “Dança Folclórica” é de total alegria, com violinos delicados contra sopros jocosos e a “Dança com Bandolins” é picantemente colorida com grande efeito. Depois, a “Serenata da Manhã” oferece outro interlúdio de bandolim antes do poderoso desfecho dramático de encerramento. Uma joia!
Serguei Prokofiev (1891-1953): Suíte Romeu e Julieta, Op. 64 (Salonen)
1 A Ordem do Duque 1:36
2 Interlúdio 2:08
3 Preparativos para o baile 1:41
4 Julieta – A Jovem 3:13
5 Chegada dos convidados 3:32
6 Máscaras 2:36
7 Dança dos Cavaleiros 5:50
8 A cena da varanda 1:18
9 Variação de Romeu 1:07
10 Dança de amor 4:53
11 Dança folclórica 3:23
12 Dançar com bandolins 1:51
13 Tybald luta contra Mercutio 1:19
14 Romeu resolve vingar a morte de Mercúcio 2:10
15 Final: Ato II 2:03
16 Adeus antes da despedida 4:58
17 Serenata da Manhã 2:27
18 Funeral de Julieta 5:37
19 Morte de Julieta 3:34
Este CD foi postado originalmente lá em 2018, muita água já passou por baixo da ponte, e como gosto dessa pianista, estou atualizando o Link.
Vou fazer hoje uma postagem em ritmo acelerado, pois o tempo urge, e em menos de meia hora preciso sair para cumprir minha rotina diária de serviço. Mas antes vou dar aos senhores o prazer de ouvirem novamente este jovem talento, Anna Vinnistskaya, pianista russa nascida em 1983. Aqui ela encara dois dos grandes concertos para piano do século XX, o Segundo de Prokofiev e o em Sol Maior de Ravel. Duas obras primas indiscutíveis.
A moça está muito bem acompanhada aqui pela Deutsches Symphonie-Orchester Berlin, dirigida por Gilbert Varga, filho de uma lenda do violino, Tibor Varga.
Espero que apreciem.
Serguei Prokofiev (1891-1953): Piano Concerto no.2 in G minor, op.16 / Maurice Ravel (1875-1937): Concerto pour Piano et Orchestre en Sol Majeur – Anna Vinnitskaya
01. Piano Concerto no.2 in G minor, op.16 -Andantino-Allegretto
02. Scherzo Vivace – Serge Prokofiev piano concerto n2 Gm op16.
03. Intermezzo Allegro – Serge Prokofiev piano concerto n2 Gm op16.
04. Allegro tempestoso – Serge Prokofiev piano concerto n2 Gm op16.
05. Concerto pour Piano et Orchestre en Sol Majeur – Allegramente
06. Adagio assai
07. Presto
Anna Vinnistskaya – Piano
Deutsches Symphonie-Orchester Berlin
Gilbert Varga – Director
Andei relapso com os trabalhos neste blog, e começo este post com um breve pedido de desculpas por isso; a vida andou um tanto cheia de afazeres e o tempo, esse danado, voou. Mas cá estamos, e vamos em frente. Para tentar me redimir por essa ausência, voltei com um discaço que me acompanha há muitos anos. Nada mais nada menos que Galina Vishnevskaya e seu marido Mstislav Rostropovich gravados ao vivo em Moscou nos anos 60. O repertório, creio, não deixa nem um tiquinho de decepção para quem, em plena terceira década do terceiro milênio, viaja no tempo para a capital russa com essas preciosas gravações: Mussorgsky (1839-1881), Shostakovich (1906-1975) e Prokofiev (1891-1953).
Um detalhe charmoso deste álbum é que nele podemos ouvir Rostropovich em sua múltiplas frentes de atuação: como regente (Mussorgsky), como violoncelista (Shostakovich, op. 127) e como pianista (Shostakovich 0p. 109 e Prokofiev). Slava – como Rostropovich era carinhosamente conhecido – respirava música, era todo colcheias e semifusas e sustenidos da cabeça aos pés, e esse disquinho é como um prisma que revela suas diferentes faces conforme a luz vai mudando de direção.
Shosta e Slava: mais que amigos, friends
E tem mais, bem mais. Com a palavra, Sigrid Neef, no encarte do disco, em livre tradução deste blogueiro:
“Diversas gravações documentam a aclamada parceria entre Vishnevskaya e Rostropovich, a prima donna do Teatro Bolshoi em Moscou e o grande violoncelista virtuoso. Ainda assim, este CD é uma pequena sensação e um golpe de sorte. Gravações de dois concertos foram descobertas no arquivo da antiga gravadora estatal soviética Melodiya. Um deles incluía a lendária estreia do ciclo de canções de Dmitri Shostakovich a partir de poemas de Alexander Blok, seu opus 127, com Galina Vishnevskaya, Mstislav Rostropovich, David Oistrakh e Moisei Vainberg. Era um ensamble verdadeiramente fenomenal e autêntico, porque o compositor escreveu o ciclo com eles em mente e dedicou a peça a Vishnevskaya. Apesar de tudo isso, a Melodiya arquivou a fita e lançou posteriormente uma nova gravação da obra com artistas menos proeminentes, em 1976. Vishnevskaya e Rostropovich haviam sido proscritos pela burocracia cultural soviética.
O delito deles foi ter abrigado em sua dacha o dissidente Alexander Solzhenitsyn, autor do histórico e monumental Arquipélago Gulag, que seria expulso da União Soviética no ano seguinte, 1974. Mais tarde, naquele mesmo ano, Vishnevskaya e Rostropovich deixaram a URSS. Eles perderam a cidadania em 1978, e essa só lhes foi restituída em 1990.
A espetacular história dessa performance é ofuscada por uma sensacional serenidade interior. A cantora e o violoncelista mostram simpatia, amor, bondade e verdade em um mundo cheio de agressividade, crueldade e mentiras. Eles sentiram sua responsabilidade para com a música e, mais que isso, a Deus. Essa é a fonte desse seu feito singular. Há também um senso de maré alta. Todas as composições de Shostakovich presentes foram escritas para Galina Vishnevskaya e dedicadas a ela. Já para a adaptação de Sergei Prokofiev para Akhmatova, não existem no mundo artistas mais apropriados que Vishnevskaya e Rostropovich.”
Sem mais delongas, portanto. vamos ao disco!
Modest Mussorgsky (1839-1881) Songs and Dances of Death (orquestrado por Dmitri Shostakovich – estreia mundial)
1 – I. Lullaby
2 – II. Serenade
3 – III. Trepak
4 – IV. The Field-Marshall
Galina Vishnevskaya, soprano
Gorki State Philharmonic Orchestra
Mstislav Rostropovich, regência
Dmitri Shostakovich (1906-1975) Seven Romances to Poems by Alexander Blok, op. 127 (estreia mundial)
5 – I. Ophelia´s song
6 – II. Hamayun, the prophetic bird
7 – III. We were together
8 – IV. The city sleeps
9 – V. Storm
10 – VI. Mysterious sign
11 – VII. Music
Galina Vishnevskaya, soprano
David Oistrakh, violino
Mstislav Rostropovich, violoncelo
Moisei Vainberg, piano
Satires, op. 109 Five romances on lyrics by Sasha Chorny
12 – I. To a critic
13 – II. Spring´s awakening
14 – III. The descendants
15 – IV. Misunderstanding
16 – V. The Kreutzer Sonata
Sergei Prokofiev (1891-1953) Five Poems by Anna Akhmatova, op. 27
17 – I. The Sun has filled my room
18 – II. True tenderness
19 – III. Memory of the Sun
20 – IV. Greetings
21 – V. The king with grey eyes
Galina Vishnevskaya, soprano
Mstislav Rostropovich, piano
As faixas 1 a 4 foram gravadas ao vivo no auditório da Gorki State Philharmonic Society, em 9 de fevereiro de 1963. As faixas 5 a 21 foram gravadas ao vivo na Grande Sala do Conservatório de Moscou, em 23 de outubro de 1967.
Eu tinha plena certeza de que esta série já tinha sido postada. Não sei como nem por que isso nunca aconteceu. Já oferecemos algumas outras opções para estes concertos, mas nunca estas aqui.
Provavelmente estas leituras de Ashkenazy para os concertos para piano de Prokofiev são suas melhores gravações já realizadas, junto com seu espetacular Rach, com o mesmo Previn e Sinfônica de Londres.
Nem vou me estender muito nos comentários, deixar que os senhores apreciem estes dois cds que merecem mais que cinco estrelas, com músicos no apogeu de suas carreiras.
O último a baixar é mulher do padre !!!
Serguei Prokofiev (1891-1953) – Integral dos Concertos para Piano (Ashkenazy, Previn, LSO)
CD1
01. Piano Concerto No. 1 in D flat major- I Allegro brioso
02. Piano Concerto No. 1 in D flat major- II Andante assai
03. Piano Concerto No. 1 in D flat major- III Allegro scherzando
04. Piano Concerto No. 4 in B flat major- I Vivace
05. Piano Concerto No. 4 in B flat major- II Andante
06. Piano Concerto No. 4 in B flat major- III Moderato
07. Piano Concerto No. 4 in B flat major- IV Vivace
08. Piano Concerto No. 5 in G major- I Allegro con brio
09. Piano Concerto No. 5 in G major- II Moderato ben accentuato
10. Piano Concerto No. 5 in G major- III Allegro con fuoco
11. Piano Concerto No. 5 in G major- IV Larghetto
12. Piano Concerto No. 5 in G major- V Vivo
CD 2
01. Piano Concerto No.2 in G minor -I- Andantino
02. Piano Concerto No.2 in G minor -II- Scherzo – Vivace
03. Piano Concerto No.2 in G minor -III- Intermezzo – Allegro moderato
04. Piano Concerto No.2 in G minor -IV- Allegro tempestoso
05. Piano Concerto No.3 in C -I- Andante – Allegro
06. Piano Concerto No.3 in C -II- Terna con variazioni
07. Piano Concerto No.3 in C -III- Allegro ma non troppo
Vladimir Ashkenazy – Piano
London Symphony Orchestra
Andre Previn
Um disco recente com música que eu amo profundamente (principalmente as Sonatas 1 e 6) interpretada por uma pianista jovem e pouco conhecida. Poderia dar errado: não seria a primeira nem a segunda vez se eu parasse o disco no meio e retornasse aos grandes mestres do passado – ou no caso de Prokofiev, dois grandes pianistas ainda vivos mas já na casa dos 70 anos: Sokolov e Raekallio.
A aposta na moça italiana, porém, deu certo: Stefania Argentieri faz um Prokofiev envolvente e escolhe um repertório bastante interessante, começando com obras maduras (Peças de Cinderela, de 1944, 6ª Sonata, de 1940) e passa depois para obras de quando o compositor tinha menos de 20 anos. Nessa abordagem cronológica invertida, é como se a pianista mergulhasse na individualidade de Prokofiev mostrando como ele partiu de ideias que circulavam em sua época e foi criando, aos poucos, um lugar próprio para si.
Com seus ritmos constantes ligados à dança (não por acaso seus balés e música para o palco em geral tiveram tanto sucesso), Prokofiev seria, na sua geração, uma espécie de anti-Debussy. O francês, em sua busca pelos sons do vento e do mar, nunca imitava o ritmo previsível dos relógios. É verdade que o jovem Debussy havia composto, na Suite Bergamasque (de 1890, retocada para publicação em 1905), um minueto e um passepied, duas danças de ritmo constante apesar de extremamente sofisticadas. Mas seu estilo ainda estava em formação. É nos 24 Prelúdios para piano (1909-1913) que a linguagem de Debussy está plenamente formada e ele utiliza ritmos constantes apenas para quebrá-los pouco depois, como em La sérénade interrompue (A serenata interrompida), de nome autoexplicativo, e em Hommage à S. Pickwick Esq. P.P.M.P.C. (Homenagem a um personagem cômico de Charles Dickens). Nesta última, o hino da Grã-Bretanha começa solene e grave, mas logo se torna bem-humorado e grotesco justamente pelas interrupções e irregularidades.
Assim como Debussy, Prokofiev precisou tatear um pouco antes de achar o seu estilo que aparece nas danças extraídas do balé Cinderela e na 6ª Sonata. Na sua 1ª sonata, Prokofiev ainda era um jovem compositor e pianista estudando no Conservatório de São Petersburgo. O estilo às vezes parece imitar o de Scriabin, mas uma imitação muito bem feita, uma cópia de gênio. E nos estudos a figura de Chopin também aparece nas entrelinhas.
Vejamos abaixo, nas palavras extraídas do encarte do álbum por Attilio Cantore (professor em Milão), outros aspectos da relação entre Prokofiev e o vasto e agitado mundo que existia ao redor dele. Nessa verificação da hipótese mais ou menos óbvia de que Prokofiev não era um sábio em sua torre de marfim isolado da música do século XX, o interessante é percebermos como Prokofiev ocupa, no meio dos outros e relacionado a eles, um lugar que ninguém mais poderia ocupar.
Aluno de Liadov, Tcherepnin e Rimsky-Korsakov, de quem assimilou a veia épica, Sergei Prokofiev apareceu na cena russa e internacional bastante jovem. Seu ecletismo encontrou um terreno fértil numa época em que o cenário musical incluía o impressionismo francês, o romantismo sinfônico tardio da Europa central, além do “profeta” Scriabin e Schönberg participando da crise na organização tonal.
Se é verdade que Prokofiev, quando mais maduro, se sentia estrangeiro ao pensamento dodecafônico, é igualmente verdade que em 1911 foi o jovem Prokofiev que estreou na Rússia os Klavierstücke, Op. 11 de Schönberg. Igualmente significante foi a nunca resolvida rivalidade com Stravinsky: uma contínua batalha com o compositor 9 anos mais velho, também formado em São Petersburgo, que levou o mais jovem ao estudo e à assimilação tática e tácita de características de Stravinsky.
A música de Prokofiev oferece um retorno à tonalidade: de um jeito novo, ele cria um mundo tonal cheio de “notas erradas”. Sua escrita, embora mostre diversas influências, parece evitar estratégias codificadas: é uma escrita com suas próprias leis. Mesmo na mesma obra, podem coexistir diferentes princípios de difícil identificação.
Retrato de Prokofiev por Anna Ostroumova – Paris, 1926
Sergei Prokofiev (1891-1953): Seis peças de Cinderela, op.102
1 I. Valsa: Cinderela e o Príncipe
2 II. Variação de Cinderela
3 III. A disputa
4 IV. Valsa: Cinderela vai para o baile
5 V. Pas de Chale
6 VI. Amoroso Sonata para Piano nº 6 em lá maior, op. 82
7 I. Allegro Moderato
8 II. Allegretto
9 III. Temp di Valzer, Lentissimo
10 IV. Vivace
11 Sonata para Piano nº 1 em fá menor, op. 1 Quatro Estudos, op. 2
12 No. 1 em ré menor
13 No. 2 em mi menor
14 No. 3 em dó menor
15 No. 4 em dó menor 16 Suggestion Diabolique, op. 4 nº 4
Stefania Argentieri, piano
Recorded at Teastro Giuseppe Curci, Barletta, Italy, 2019
Celebramos mais um aniversário da Rainha, e ela não dá sinais de arrefecer o radiador. Vá lá, volta e meia a assombrosa octogenária nos dá um susto, só para daí voltar com tudo – cancelando um concerto ou outro, naturalmente, como sói acontecer desde que Martha é Martha – e nos fazer sonhar com mais uma década todinha (a nona de sua vida, e a oitava como pianista) com ela a forrar nossos tímpanos de deleite.
Já é meu bem surrado costume cantar-lhe parabéns pelo cumple e celebrar a data gaiatamente, compartilhando presentes gravados pela própria aniversariante. Marthinha segue tão ativa fazendo música quanto afastada dos estúdios, de modo que todos os novos registros de sua arte, como há já algumas décadas, provêm somente de apresentações ao vivo. Entre as adições à discografia marthinhiana lançadas desde o 5 de junho passado – as quais passo a lhes oferecer a seguir -, apenas uma foi gravada, conforme a promessa do título desta postagem, na nona década de vida da Rainha. Trata-se de um recital em duo com o violinista Renaud Capuçon, gravado no ano passado, em que ela nos serve algumas de suas especialidades: além de uma das sonatas de Schumann, que a mantém entre os poucos grandes intérpretes a prestigiá-las em
seu repertório, ela demonstra seguir afiada como sempre na realização das eletrizantes partes pianísticas da “Kreutzer” e da sonata de Franck.
Robert Alexander SCHUMANN (1810-1856) Sonata para violino e piano no. 1 em Lá menor, Op. 105
1 – Mit leidenschaftlichem Ausdruck
2 – Allegretto
3 – Lebhaft
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827) Sonata para violino e piano no. 9 em Lá maior, Op. 47, “Kreutzer”
4 – Adagio sostenuto – Presto
5 – Andante con variazioni
6 – Finale. Presto
César-Auguste-Jean-Guillaume-Hubert FRANCK (1822-1890) Sonata em Lá maior para violino e piano
7 – Allegretto ben moderato
8 – Allegro
9 – Recitativo – Fantasia. Ben moderato
10 – Allegretto poco mosso
Renaud Capuçon, violino
Gravado ao vivo no Grand Théâtre de Provence em Aix-en Provence (França) em 22 de abril de 2022.
Ontem o Brasil perdeu uma de suas maiores artistas: Rita Lee Jones de Carvalho (1947-2023), ou simplesmente Rita Lee, para todos os milhões de pessoas que a temos, eternamente, como rainha. Sequer vou tentar colocar em palavras aqui o que ela representa; tudo soaria pequeno, banal, clichê, e de ontem pra hoje uma boa turma fez isso muito melhor do que eu faria.
Minha pequena homenagem vai na forma de trazer pra vocês este pequeno disco que foi muito, mas muito, mas muito importante na minha vida. Foi seguramente a fita K7 que mais escutei nessa minha caminhada nesse planetinha azul. O clique para a música clássica viria um pouco mais tarde, aos 12 anos, por obra de meu irmão e um par de discos de Vladimir Horowitz e Glenn Gould que ele trouxera de uma viagem aos Estados Unidos.
Mas as sementes foram lançadas com aquela fitinha K7 que trazia Rita Lee narrando Pedro e o Lobo, op. 67, de Sergei Prokofiev, junto com a Orquestra Nova Sinfonieta regida por Roberto Tibiriçá. O fascínio, o estímulo à imaginação e à fantasia, a crença no poder mágico dos sons organizados em forma de música: estava tudo ali. Era o começo de uma jornada de vida inteira pelas maravilhas do som e dos instrumentos.
Por isso, e por mais um tantão de coisa: obrigado, Rita! Que a volta aí pras estrelas seja bacana…
Sergei Prokofiev (1891-1953) Pedro e o Lobo, op. 67 fábula sinfônica para crianças
Rita Lee, narração
Orquestra Nova Sinfonieta
Roberto Tibiriçá, regência
Este é um daqueles discos tão bem interpretados — orquestra, solistas, regente — que nos convence de qualquer coisa. O trabalho de Sokhiev e seus pupilos é esplêndido, a captação do som é notável e até Rach fica parecendo muito bom. Falo sério!
O Concerto Nº 2 para Violino de Prokofiev é muito bonito — é uma de minhas músicas preferidas neste mundo –, dois belos movimentos rápidos circundam um sublime e apaixonado movimento central. Pouco antes de seu regresso definitivo à Rússia, em 1935, na mesma época em que trabalhava no balé Romeu e Julieta, Prokofiev compôs este maravilhoso Concerto. Trata-se de sua última obra composta no Ocidente.
Já a composição das Danças — pero no mucho — Sinfônicas permitiu a Serguei Rachmaninov um mergulho nas lembranças de sua antiga Rússia. Última de suas obras, as Danças são como um resumo de sua vida de compositor. De grande variedade rítmica e lirismo, a obra é plena de reminiscências dos cantos da Igreja Ortodoxa Russa e de citações de obras do próprio Rachmaninov, além de Rimsky-Korsakov, Stravinsky e outros.
Serguei Prokofiev — Violin Concerto No.2 In G Minor, Op. 63 Violin – Geneviève Laurenceau
1 – Allegro Moderato
2 – Andante Assai
3 – Allegro, Ben Marcato
Serguei Rachmaninov — Symphonic Dances, Op. 45
4 – Non Allegro
5 – Andante Con Moto (Tempo Di Valse)
6 – Lento Assai – Allegro Vivace – Lento Assai. Come Prima – Allegro Vivace
Geneviève Laurenceau, violin
Orchestre National Du Capitole De Toulouse
Tugan Sokhiev