Poucas obras me emocionam tanto quanto esta Sonata de Cesar Franck. E nas mãos deste excepcional músico chamado James Ehnes ela se torna ainda mais emocionante. Confesso que já a ouvi dezenas, quiçá dezenas de vezes, com os mais diversos intérpretes, mas Ehnes é um caso a parte. Talvez nem Augustin Dumay / Maria João Pires tenham me deixado tão emocionado. Li em algum lugar que Ehnes é o Heifetz do século XX. Meu ‘chefe’ PQPBach e sua esposa, também violinista, concordam com esta afirmação. Não sei se ainda não é muito cedo para fazermos tal afirmação, vamos esperar um pouco. Mas não posso negar o talento e virtuosismo do rapaz. Ele imprime na sua interpretação aquilo que sempre procuramos, e que encontramos apenas nos grandes mestres: clareza, objetividade, sem subterfúgios, fazendo parecer fácil o que na verdade é um exercício virtuosístico. Espetacular, é o mínimo que podemos dizer. Estou sem meu volume do ‘Caminho de Swann’, de Marcel Proust, onde ele cita inúmeras vezes a pequena ‘passagem’ de Ventuiel’, pequena peça musical que o personagem ouve nos mais diversos momentos durante a obra, e que é a trilha sonora do livro, digamos assim. Ouvindo as primeiras notas desta Sonata não temo em dizer que, quase que com certeza, Proust se inspirou em Franck para imaginar esta obra e este compositor, mesmo com os estudiosos do autor afirmando que a inspiração não foi apenas em um compositor, mas em diversos outros, como Saint-Säens e Debussy. Não importa.
CÉSAR FRANCK (1822–1890)
Sonate pour violon et piano en la majeur
1 I Allegretto ben moderato
2 II Allegro
3 III Ben moderato: Recitative-Fantasia
4 IV Allegretto poco mosso 6.19
RICHARD STRAUSS (1864–1949)
Sonate pour violon et piano en mi bémol majeur
5 I Allegro, ma non troppo
6 II Improvisation: Andante cantabile
7 III Finale: Andante –Allegro
O notável rol de compositores divulgados aqui no PQP Bach ganha mais um integrante.
O irlandês John Field foi muito famoso em seu tempo e tremendamente respeitado por seus colegas. Estudou com Clementi na Inglaterra, fez turnês por toda a Europa e acabou na Rússia, onde fez fama e fortuna. Gastou muito do que tinha – inclusive a saúde – vivendo como um sátiro priápico, e por um triz não morreu na penúria.
Nas décadas que se seguiram à sua morte, e talvez por ter feito sua carreira no que era então um país periférico no mapa-múndi musical (Glinka, na época, era só uma criança), a obra de Field foi sendo esquecida. Hoje, ele praticamente só é lembrado como o primeiro compositor de Noturnos para piano e, nessa condição, como o precursor das obras-primas de Chopin no gênero.
A reputação do dublinense entre os colegas pianistas era tamanha que Franz Liszt escreveu o seguinte no prefácio de uma edição póstuma dos Noturnos de Field:
“Ninguém obteve tais vagas harmonias eólicas, estes meios-suspiros flutuando pelo ar, lamentando suavemente, e dissolvidos em deliciosa melancolia”
Os ouvidos modernos, repletos que estão de Chopin, talvez não encontrem ecos para o entusiasmo de Liszt – que era, aliás, um contumaz rasgador de seda. Quem escuta Field pela primeira vez tem a impressão de que ele se contenta em repetir incessantemente escalas muito ornamentadas sobre um modesto acompanhamento. Por outro lado, quem toma o cuidado de não esperar de Field a audácia harmônica e a invenção melódica do gênio polonês acaba encontrando peças muito agradáveis, que bebem demais da fonte de Hummel – a referência inescapável dos pianistas da época – e parecem olhar, sem preocupação alguma, para o futuro.
Esta bonita caixa da Brilliant Classics, que postaremos ao longo das próximas semanas, é enriquecida por boas interpretações de Bart van Oort e pelo timbre incomum de pianos antigos – aqui, um Broadwood de 1823, semelhante àquele com que o fabricante presenteou Beethoven alguns anos antes.
JohnFIELD (1782-1837)
OS NOTURNOS PARA PIANO
01 – Noturno em Mi bemol maior, H. 24
02 – Noturno em Dó menor, H. 25
03 – Noturno em Lá bemol maior, H. 26
04 – Noturno em Lá maior, H. 36
05 – Noturno em Si bemol maior, H.37
06 – Noturno em Fá maior, H. 40
07 – Noturno em Dó maior, H. 45
08 – Noturno em Lá maior, H. 14e
09 – Noturno em Mi bemol maior, H. 30
10 – Noturno em Mi menor, H. 46b
11 – Noturno em Mi bemol maior, H. 56a
12 – Noturno em Sol maior, H. 58d
13 – Noturno em Ré menor, H. 59
14 – Noturno em Fá maior, H. 62a
15 – Noturno em Mi maior, H. 54f
Só pela audição do RV 552 — com um dos violinos solistas fora do palco — este CD já valeria a pena, mas o resto também é excelente. Este disco recebeu o Gramophone 96 na categoria de Instrumental Barroco e é com certeza um dos melhores CD de Vivaldi que já foram prensados, não apenas pela execução excepcional, mas também pela maravilhosa gravação (a qualidade do som é surpreendente) e principalmente pelas obras que contém: alguns dos melhores concertos do Padre Rosso. Christophe Coin (violoncelo) e Il Giardino Armonico dão um show. Como o disco é de 1995, temos aqui um jovem Il Giardino Armonico, com instrumentos originais. cabe também destacar a notável versão do Concerto para 2 cellos, RV 531, cheia de força e com um banho de bola do já citado Coin e Paolo Beschi. Absolutamente recomendado!
Antonio Vivaldi (1678-1741): “Il Proteo” – Double And Triple Concertos
Concerto In D Major; RV 564 For 2 Violins, 2 Violoncellos, Strings And Basso Continuo
Allegro 04:31
Largo 02:33
Allegro 03:21
Concerto In F Major; RV 551 For 3 Violins, Strings And Basso Continuo
Allegro 04:29
Andante 01:54
(Allegro) 03:02
Concerto In G Minor; RV 531 For 2 Violincellos, Strings And Basso Continuo
Allegro 03:49
Largo 03:08
Allegro 03:01
Concerto In A Major; RV 552 For Violin, “Violino Per Eco Lontano”, Strings And Basso Continuo
Allegro 06:45
Larghetto 04:07
Allegro 03:40
Concerto In C Major; RV561 For Violin, 2 Violoncellos, Strings And Basso Continuo
Allegro 03:41
Largo 02:52
Allegro 02:46
Concerto In F Major; RV 544 “Il Proteo O Sia Il Mondo Al Rovescio” For Violin, Violoncello, Strings And Basso Continuo
Allegro 03:59
Largo 03:11
(Allegro) 03:14
A parceria entre os gigantes Menuhin e Shankar, iniciada a convite do primeiro no Festival de Bath de 1966, resultou numa amizade que duraria até o final de suas vidas e em três bem-sucedidos álbuns que foram condensados neste volume que ora lhes apresento.
Já defendi em outra postagem a divulgação de música clássica de outras paragens, lançando mão das palavras do colega Ranulfus: “uma das coisas que me motivam na colaboração no blog é tentar demonstrar o quanto nosso conceito de ‘clássico’ pode ser justificadamente expandido para além das suas fronteiras tradicionais (no fundo etnocêntricas), e isso com criações autênticas, não com adaptações tipo ‘transcrições de canções populares para orquestra’.”.
A música clássica indiana, com seus instrumentos peculiares, os microtons (shrutis), sua intensa verve e o caráter improvisatório superposto às estritas definições de raga e tala, às quais voltaremos algum dia, pode trazer dificuldades a ouvidos pouco acostumados a ela. A ilustre presença de Lord Menuhin, aqui muito reverente à arte que busca integrar à sua própria, talvez facilite um pouco a introdução de vós outros a este novo planeta musical. Para quem estranha a presença de violino no conjunto de virtuoses indianos, digo que este instrumento, com o mesmíssimo feitio, mas com afinação e sob técnica muito diferentes, é usado há já alguns séculos na Índia para fazer música, ainda que, para isso, seja apoiado entre o ombro esquerdo e o pé direito do executante.
Convido os leitores-ouvintes à apreciação do rico som do sitar, da habilidade de Shankar na improvisação e, especialmente, das intervenções daquele que é considerado por muitos o maior percussionista que já existiu – Alla Rakha, mestre supremo da tabla.
Estas gravações históricas marcaram não só a primeira colaboração entre um músico indiano e um grande nome da música ocidental, como também lançaram a carreira de Shankar no Ocidente, onde se tornaria figurinha fácil nas grandes salas de concertos e influenciaria George Harrison e o som dos Beatles. Conquistou, entre seus pares, a reputação de um dos maiores músicos vivos e, ao morrer em 2012, virou uma lenda – não sem antes deixar para o mundo as maravilhosas filhas Anoushka Shankar e Norah Jones, duas estrelas da música, cada qual em sua própria vertente.
Espero que este grande encontro de notáveis deixe com as senhoras e senhores um sabor de “quero mais” que torne bem-vindo, noutras ocasiões, o que de mais eu lhes trouxer da riquíssima música daquele subcontinente.
WEST MEETS EAST – THE HISTORIC SHANKAR/MENUHIN SESSIONS
Para realizar esta mega postagem, a maior que já fiz, e provavelmente jamais farei algo parecido, preciso da compreensão e da paciência dos senhores. Paciência por se tratarem de 67 cds ao todo, distribuidos em 22 volumes, e claro que não postarei tudo de uma só vez, mas por volumes. Já há algum tempo cogito em trazer alguma integral das Cantatas de Bach, mas a falta de tempo sempre me atrapalhava no projeto. Em alguns casos, na maior parte deles, provavelmente, o texto que ilustrará a postagem será do próprio booklet dessa coleção, uma jóia preciosa que faz parte de meu acervo já há quase vinte anos. A trato como o bem inestimável que é.
Ton Koopman é um dos maiores especialistas em Bach que já pisaram sobre a face da Terra. Já gravou muita coisa do velho mestre, e este com certeza foi o seu projeto mais ambicioso. Ele mesmo escolheu os músicos que fazem parte da orquestra e do Coro. Nomes conhecidos como o das sopranos Sabrine Piau e Barbara Schlick, ou do baixo Klaus Mertens serão constante, já que acompanharam Koopman durante todo o processo de gravação.
Então vamos ao que viemos. espero que apreciem o esforço, e por favor, comentem.
“Johann Sebastian Bach deixou uma magnífica coleção de música vocal para a posteridade. Entre os melhores exemplos estão as grandes obras musicais como as Paixões, Oratórios e Missas, sem precedente nem paralelo em seu próprio tempo. No entanto, de acordo com uma análise de suas obras, elaboradas em 1750, ano de sua morte, a maior parte do legado musical de Bach consistia em “cinco ciclos anuais de peças da igreja”, ou seja, cantatas para os domingos e dias santos. por um total de cinco anos eclesiásticos. Como há cerca de 65 comemorações por ano, cinco ciclos sugeririam um repertório total de mais de trezentas peças. Porém, ao todo menos de duzentas cantatas permanecem.
No entanto, apesar da perda irrecuperável de cerca de um quinto desta coleção, o repertório sobrevivente constituiu um tesouro muito variado e esteticamente superior de obras vocais e instrumentais, inigualável na história da música sacra. Na íntegra, as cantatas de Bach, abrangendo virtualmente toda a vida criativa do compositor, exibem uma excepcional qualidade artística, riqueza, variedade e originalidade. (…)”
CD 1
“Ich hatte viel Bekümmernis” BWV 21
For the 3rd Sunday after Trinity • For all times
PRIMA PARTE
1 Sinfonia
2 Coro: “Ich hatte viel Bekümmernis”
3 Aria (Soprano): “Seufzer, Tränen, Kummer, Not”
4 Recitativo (Soprano): “Wie hast du dich, mein Gott”
5 Aria (Soprano): “Bäche von gesalznen Zähren”
6 Coro: “Was betrübst du dich, meine Seele”
“Aus der Tiefe rufe ich, Herr, zu dir” BWV 131
Penitential Service?
12 Sinfonia-Choral: “Aus der Tiefe rufe ich, Herr, zu dir”
13 Aria (Basso, Choral): “So du willst, Herr, Sünde zurechnen”
14 Coro: “Ich harre des Herrn”
15 Aria (Tenore, Choral): “Meine Seele wartet auf den Herrn”
16 Coro: “Israel, hoffe auf den Herrn”
“Ich hatte viel Bekümmernis” BWV 21 (Appendix):
17 Coro: “Sei nun wieder zufrieden'”
CD 2
“Gottes Zeit ist die allerbeste Zeit” (Actus tragicus) BWV 106
Unspecified occasion
1 Sonatina
2 a [Coro]: “Gottes Zeit ist die allerbeste Zeit”
b [Arioso] (Tenore): “Ach Herr, lehre uns bedenken”
c [Arioso] (Basso): “Bestelle dein Haus; denn du wirst sterben”
3 a [Aria] (Alto): “In deine Hände befehl ich meinen Geist”
b [Arioso – Choral] (Alto, Basso): “Heute wirst du mit mir im Paradies sein”
4 Coro: “Glorie, Lob, Ehr und Herrlichkeit”
“Der Herr denket an uns” BWV 196
Wedding cantata
5 Sinfonia
6 Coro: “Der Herr denket an uns”
7 Aria (Soprano): “Er segnet, die den Herrn fürchten”
8 Duetto (Tenore, Basso): “Der Herr segne euch” 8 Duetto (Tenore, Basso): “Der Herr segne euch”
9 Coro: “Ihr seid die Gesegneten des Herrn”
“Gott ist mein König” BWV 71
Ratswechsel – For the Town Council Inauguration
10 Coro: “Gott ist mein König”
11 Aria – Choral (T, S): “Ich bin nun achtzig Jahr” • “Soll ich auf dieser Welt”
12 Coro [a 4 voci]: “Dein Alter sei wie deine Jugend”
13 Arioso (Basso): “Tag und Nacht ist dein”
14 Aria (Alto): “Durch mächtige Kraft”
15 Coro: “Du wollest dem Feinde nicht geben”
16 Coro [Soli, Coro]: “Das neue Regiment
17 Sinfonia
18 Coro: “Nach dir, Herr, verlanget mich”
19 Aria (Soprano): “Doch bin und bleibe ich vergnügt”
20 Coro: “Leite mich in deiner Wahrheit”
21 Aria (Terzetto: Alto, Tenore, Basso): “Zedern müssen von den Winden”
22 Coro: “Meine Augen sehen stets zu dem Herrn”
23 Coro: “Meine Tage in dem Leide”
CD 3
“Der Himmel lacht! die Erde jubilieret” BWV 31
On the 1st day of Easter
1 Sonata
2 Coro (Coro, Soprano, Alto): “Der Himmel lacht! die Erde jubilieret”
3 Recitativo (Basso): “Erwünschter Tag! Sei, Seele, wieder froh”
4 Aria (Basso): “Fürst des Lebens, starker Streiter”
5 Recitativo (Tenore): “So stehe dann, du gottergebne Seele”
6 Aria (Tenore): “Adam muß in uns verwesen”
7 Recitativo (Soprano): “Weil dann das Haupt sein Glied”
8 Aria (Soprano): “Letzte Stunde, brich herein”
“Barmherziges Herze der ewigen Liebe” BWV185
For the 4th Sunday after Trinity
10 Aria (Duetto: Soprano, Tenore): “Barmherziges Herze der ewigen Liebe”
11 Recitativo (Alto): “Ihr Herzen, die ihr euch”
12 Aria(Alto): “Sei bemüht in dieser Zeit”
13 Recitativo (Basso): “Die Eigenliebe schmeichelt sich”
14 Aria (Basso): “Das ist der Christen Kunst”
15 Choral (Coro): “Ich ruf zu dir, Herr Jesu Christ”
«Christ lag in Todesbanden” BWV 4
For the 1st day of Easter
16 Sinfonia
17 [Coro] Versus I: “Christ lag in Todesbanden”
18 [Duetto] (Soprano, Alto) Versus II: “Den Tod niemand zwingen kunnt”
19 [Aria] (Tenore) Versus III: “Jesus Christus, Gottes Sohn”
20 [Coro] Versus IV: “Es war ein wunderlicher Krieg”
21 [Aria] (Basso) Versus V: “Hier ist das rechte Osterlamm”
22 [Duetto] (Soprano, Tenore) Versus VI: “So feiern wir das hohe Fest”
23 Choral (Coro) Versus VII: “Wir essen und leben wohl”
“Christ lag in Todesbanden” BWV 4 (Appendix):
24 Sinfonia
25 [Coro] Versus I: “Christ lag in Todesbanden”
26 [Duetto] (Soprano, Alto) Versus II: “Den Tod niemand zwingen kunnt”
27 Choral (Coro): Versus VII: “Wir essen und leben Wohl”
[epílogo das trêspartesanteriores, retomando do ponto em que Amadeus ficou horrorizado com o andamento frenético com que Gould tocou uma de suas sonatas, a ponto de exclamar “Soeinspiellen und scheissen ist bey mir einerley!”]
GOULD: Assim fica melhor? [toca novamente o Allegro moderato da Sonata em Dó maior, K. 330, mas dessa vez adota o andamento mais lento de sua gravação de 1958]. Melhor?
MOZART: Melhor, sim. Mas as indicações dinâmicas – o contraste entre forte e piano, os sforzandi…
G: “Culpado, meritíssimo!”. Eu nunca toco sforzandi, “já que eles representam um elemento de quase-teatralidade pelo qual minha alma puritana tem vigorosa objeção”.
M: (cautelosamente) Mas o que dizem os críticos? Quero dizer, acerca dos sforzandi que faltam e o resto…
G: (com uma gargalhada) Oh, os críticos! Deveria ler-lhe o que um desses cavalheiros escreveu sobre minha interpretação para sua Sonata em Lá maior? “É muito difícil captar o que Gould tenta provar, a não ser que o boato de que ele realmente odeia essa música seja verdadeiro. Andamentos são dolorosamente lentos, a articulação picotada e destacada viola a estrutura frasal (e muitas das indicações específicas de Mozart) […] isso tudo evoca a imagem de um moleque tremendamente precoce mas muito sacana tentando aprontar uma para seu professor de piano”.
M: (inseguro de si mesmo) E você, er, realmente odeia essa música… minha música?
G: (sinceramente) Não, Sr. Mozart. É verdade que eu a ouço, entendo e interpreto diferentemente da maior parte das pessoas, e sem dúvidas diferentemente de você, “e tenho certeza de que frequentemente você não aprovaria o que eu faço com sua música. No entanto, mesmo que seja cego, o intérprete tem que estar convicto de que está fazendo a coisa certa e de que ele pode achar maneiras de interpretá-la das quais nem o próprio compositor estaria ciente”.
M: Poderia pedir-lhe para tocar-me uma de suas interpretações que você acha que eu aprovaria?
G: Que tal o Alla turca de sua Sonata em Lá maior?
M: (nervosamente) Er…
G: (com uma gargalhada) Não se preocupe, não o tornarei um Presto, quanto menos um Prestissimo. Muito pelo contrário: vou tocá-lo como um Allegretto, como você mesmo indicou (e como, acrescento, ele é raramente ouvido).
M: (com dúvidas) E também com os contrastes entre piano e forte?
G: Esses, também! (com uma gargalhada) Ainda mais porque não há sforzandi neste movimento!
M: Nota por nota, então, como eu o escrevi?
G: Nota por nota – exceto por alguns pequenos arpejos na coda, que dá ao movimento seu toque “turco”.
M: Bem, então… eu sou todo ouvidos!
Esta sinfonia é possivelmente a mais conhecida das Sinfonias de Bruckner e foi a primeira que ouvi. O epíteto “Romântica” foi dado pelo próprio Anton e reflete um estado de harmonia com a natureza que nos é transmitido pela perspectiva global da sinfonia.
Há maravilhosas gravações desta Sinfonia de Bruckner, muitas das quais você encontra nas nossas postagens. No entanto, esta gravação, feita ao vivo, reflete o sentido de uma ocasião especial, na qual um reverenciado e experiente maestro dirige uma excepcional orquestra. Günter Wand tem o completo domínio da situação expondo sem esforço aparente a maravilhosa arquitetura da obra, atingindo as alturas por muitos somente almejadas. A dramaticidade dos clímaces, tão importantes em Bruckner, assim como os momentos em que a orquestra deve apenas murmurar, são apresentados com clareza e transparência. A sensação de um momento especialíssimo está realmente presente no disco.
Bruckner iniciou a composição de sua Sinfonia No. 4 em 1874 e continuou trabalhando nela até 1780, quando reescreveu o último movimento.
Obstinado e perfeccionista, Bruckner sabia exatamente o que pretendia de suas enormes sinfonias. Passou a metade de sua vida preparando-se para compô-las e constantemente trabalhou simultaneamente em novas obras e no aprimoramento das que já havia completado.
Se permitiu que seus (mesmo bem intencionados) amigos revisassem e mesmo mutilassem suas obras, era na esperança de que fossem executadas. No entanto, foi cuidadoso para preservar suas reais intenções, deixando os originais livres destas espúrias intervenções com a designação gültig (=válida). Esses manuscritos foram arquivados na coleção de manuscritos da Biblioteca da Corte Imperial, hoje Biblioteca Nacional de Viena, por seu desejo expresso.
Assim, a versão que podemos ouvir nesta gravação representa o que Bruckner esperava que ouvíssemos.
Anton Bruckner (1824-1896)
Sinfonia No. 4 em mi bemol maior – Romântica
Versão original (1878/1880)
Bewegt, nicht zu schnell
Andante quasi Allegretto
Scherzo. Bewegt – Trio. Nicht zu schnell, keinesfalls schleppend
Ande, baixe os arquivos, entre nesta onda bruckneriana que estamos proporcionando. As camisetas com os dizeres “Eu ouço Bruckner” serão ofertadas posteriormente…
MOZART: (friamente) Não preciso lhe dizer que, ao manter esse ponto de vista, você está numa minoria de… uma pessoa. Ainda que eu não me inclua entre eles (e tenho certeza de que você entenderá que, por motivos puramente pessoais, não compartilho seu ponto de vista), poderia, com toda modéstia, apontar-lhe milhares, mesmo centenas de milhares de amantes da música que…
GOULD: Mesmo que fossem milhões, não fariam diferença. “Ainda criança, eu não conseguia entender como meus professores, e outros adultos presumivelmente sãos, contavam as suas obras entre os grandes tesouros musicais do homem ocidental. […] Acho que eu tinha em torno de treze anos quando finalmente percebi que o mundo inteiro não via as coisas como eu via. Já que jamais me teria ocorrido, por exemplo,que alguém poderia não compartilhar meu entusiasmo por um céu cinza e nublado, foi então um verdadeiro choque descobrir que havia de fato pessoas que preferiam o ensolarado. Poderia acrescentar que isso continua a ser um mistério para mim, mas essa é outra história.
M: (com pena) Acho que começo a entendê-lo, meu pobre amigo. Escute, há um médico aqui que certamente poderia curá-lo de seu entusiasmo por céus cinzas e nublados. Ele se chama Dr. Freud…
G: (às gargalhadas) Não, obrigado – recusei-me a permitir que qualquer de seus colegas se aproximasse de mim enquanto vivia. Em todo caso, minha preferência por certos fenômenos meteorológicos em particular não está de qualquer maneira conectado com minha crítica a certas inconsistências composicionais em sua música. Tome, por exemplo, o Finale Allegro grazioso de sua Sonata em Si bemol maior, K. 333, ou, para ser mais preciso, a cadenza logo antes do final do movimento. “Para mim, essa página vale o preço do ingresso”.
M: (lisonjeado) Sério?
G: (incensado) Mas como lhe deu na telha a ideia insana de escrever “Cadenza a tempo” sobre ela? “É uma cadenza, não importa o que você diga, e eu simplesmente não posso imaginar como você esperaria que alguém passasse da tônica menor (Si bemol menor) para a submediante (Sol bemol maior) sem reduzir a marcha.
M: Parece-me que, pelo que você diz, você aborda minha música pura e simplesmente dum ponto de vista harmônico.
G: Uma vez que – como já disse – ela é incapaz de despertar o menos interesse contrapontístico…
M: E que tal sua forma?
G: (desdenhosamente) Oh, você sabe, “a forma básica da sonata não me interessa lá muito – a questão de temas tônicos vigorosos e masculinos e temas dominantes femininos e delicados parece-me infestado de clichês, isso para não dizer racista. Além do que, você sabe, muitas vezes sucede o contrário – segundos temas agressivos e masculinos, e aí por diante. Quanto à sua Sonata em Si bemol maior, que mencionamos há um instante, reflita sobre a não-integração entre o primeiro e o segundo temas do seu primeiro movimento, os quais, até onde posso perceber, poderiam ser tocados em ordem reversa e ainda assim prover um contraste perfeitamente satisfatório”.
M: Bem, é certamente uma ideia interessante… e talvez nem um pouco excêntrica, ademais…
G: (exultante) Você vê! (subitamente sério) “Mas o que eu não entendo é por que você ignorou tantas oportunidades canônicas óbvias para a mão esquerda!”
M: Você desaprova os baixos de Alberti?
G: Exatamente. Aqui está, por exemplo, o Allegro moderato de sua Sonata em Dó maior, K. 330 (ele começa o movimento com o mesmo andamento frenético de sua gravação de 1970, incluída na postagem) M: (horrorizado) Pare – é insuportável! “Rápido demais. Tocar assim ou cagar, para mim, é a mesma coisa!”
G: (rindo) Desculpe – eu me empolguei!!!
Esta gravação foi “Editor`s Choice” da Gramophone em 2011, “Gravação recomendada” pela ClassicFM e depois, em 2016, foi considerada a melhor gravação do Concerto de Mendelssohn, novamente pela Gramophone. Tá bom?
Aclamado como “o Jascha Heifetz dos nossos dias”, o violinista James Ehnes é considerado um dos artistas mais perfeitos e musicais da música erudita. Talvez seja o melhor violinista em atividade atualmente. Ele já se apresentou em mais de 30 países, atuando e gravando com as melhores orquestras e regentes. A extensa discografia de Ehnes inclui desde sonatas para violino de Bach a Road Movies, de John Adams. Desde que Vladimir Ashkenazy ganhou destaque no cenário mundial na Competição Chopin de 1955 em Varsóvia, ele construiu uma carreira extraordinária de pianista. A regência tomou a maior parte de suas atividades nas últimas duas décadas, e ele mantém um relacionamento de longa data com a Philharmonia Orchestra, da qual foi nomeado regente em 2000.
O Concerto para Violino, Op. 64, de Mendelssohn passou a ser visto como um degrau inescapável na carreira de todo violinista que almejasse o sucesso, multiplicando-se seus recitais e gravações. Hoje é considerado uma das principais composições de Mendelssohn e um dos mais importantes exemplos de seu gênero, continuando a desfrutar de grande popularidade.
Felix Mendelssohn Bartholdy (1809-1847): Concerto para Violino e Orq., Op. 64 / Octeto
Violin Concerto In E Minor Op.64 (26:37)
1 I Allegro Molto Appassionato 12:45
2 II Andante 8:16
3 III Allegretto Non Troppo – Allegro Molto Vivace 5:35
Octet In E Flat Op.20 (30:44)
4 I Allegro Moderato Ma Con Fuoco 13:49
5 II Andante 6:31
6 III Scherzo 4:29
7 IV Presto 5:53
Cello – Edward Arron (tracks: 4 to 7), Robert deMaine (tracks: 4 to 7)
Conductor – Vladimir Ashkenazy (tracks: 1 to 3)
Orchestra – Philharmonia Orchestra (tracks: 1 to 3)
Viola – Cynthia Phelps* (tracks: 4 to 7), Richard O’Neill (tracks: 4 to 7)
Violin – Andrew Wan (tracks: 4 to 7), Augustin Hadelich (tracks: 4 to 7), Erin Keefe (tracks: 4 to 7), James Ehnes
Quando chegamos a postar obras tão fundamentais do repertório pianístico, que todos os grandes pianistas, e os não tão grandes, pretendem gravar, ou pelo menos tocar, começamos a andar em terreno de areia movediça. Tenho pelo menos três pianistas que considero imbatíveis neste repertório. Não vou dar nomes aos bois, pois sei que pedras irão ser atiradas por não ter citado fulano ou beltrano.
Vou deixar os senhores decidirem se András Schiff entra neste panteão de grandes pianistas que encararam estas tão amadas sonatas de Beethoven. Não posso dizer que é a minha integral favorita, e com certeza não é, mas ela tem bons momentos. Músicos de tal estatura merecem o benefício da dúvida pelo conjunto da obra que até então realizaram.
Digo isso, pois quero encerrar esta integral hoje. Certo? Dentro de alguns dias, nosso querido Vassily retorna com estas sonatas, porém com outro sotaque. Quem viver, verá.
Volume 6
01. Sonate Nr. 22 F-dur, Op. 54 I. In tempo d’un Menuetto
02. Sonate Nr. 22 F-dur, Op. 54 II. Allegretto
03. Sonate Nr. 23 f-moll «Appassionata», Op. 57 I. Allegro assai
04. Sonate Nr. 23 f-moll «Appassionata», Op. 57 II. Andante con moto
05. Sonate Nr. 23 f-moll «Appassionata», Op. 57 III. Allegro ma non troppo
06. Sonate Nr. 24 Fis-dur, Op. 78 I. Adagio cantabile. — Allegro ma non troppo
07. Sonate Nr. 24 Fis-dur, Op. 78 II. Allegro vivace
08. Sonate Nr. 25 G-dur, Op. 79 I. Presto alla tedesca
09. Sonate Nr. 25 G-dur, Op. 79 II. Andante
10. Sonate Nr. 25 G-dur, Op. 79 III. Vivace
11. Sonate Nr. 26 Es-dur, Op. 81a I. Das Lebewohl (Adagio. — Allegro)
12. Sonate Nr. 26 Es-dur, Op. 81a II. Abwesenheit (Andante espressivo)
13. Sonate Nr. 26 Es-dur, Op. 81a III. Das Wiedersehen (Vivacissimamente)
Volume 7
01. Sonate Nr. 27 e-moll, Op. 90 I. Mit Lebhaftigkeit und durchaus mit Empfindung und Ausdruck
02. Sonate Nr. 27 e-moll, Op. 90 II. Nicht zu geschwind und sehr singbar vorgetragen
03. Sonate Nr. 28 A-dur, Op. 101 I. Etwas lebhaft und mit der innigsten Empfindung
04. Sonate Nr. 28 A-dur, Op. 101 II. Lebhaft. Marshmäßig
05. Sonate Nr. 28 A-dur, Op. 101 III. Langsam und sehnsuchtsvoll
06. Sonate Nr. 28 A-dur, Op. 101 IV. Geschwind, doch nicht zu sehr, und mit Entschlossenheit
07. Sonate Nr. 29 B-dur, Op. 106 (für das Hammerklavier) I. Allegro
08. Sonate Nr. 29 B-dur, Op. 106 (für das Hammerklavier) II. Scherzo Assai vivace
09. Sonate Nr. 29 B-dur, Op. 106 (für das Hammerklavier) III. Adagio sostenuto
10. Sonate Nr. 29 B-dur, Op. 106 (für das Hammerklavier) IV. Largo. — Allegro risoluto
Volume 8
01. Sonate Nr. 30 E-dur, Op. 109 I. Vivace, ma non troppo. — Adagio espressivo
02. Sonate Nr. 30 E-dur, Op. 109 II. Prestissimo
03. Sonate Nr. 30 E-dur, Op. 109 III. Tema con Variazioni
04. Sonate Nr. 31 As-dur, Op. 110 I. Moderato cantabile, molto espressivo
05. Sonate Nr. 31 As-dur, Op. 110 II. Allegro molto
06. Sonate Nr. 31 As-dur, Op. 110 III. Adagio ma non troppo. — Fuga Allegro, ma non troppo
07. Sonate Nr. 32 c-moll, Op. 111 I. Maestoso. — Allegro con brio ed appassionato
08. Sonate Nr. 32 c-moll, Op. 111 II. Arietta (con Variazioni)
GOULD: (algo constrangido) “Eu admito que minha realização do primeiro movimento [da Sonata K. 331] é algo idiossincrática”
MOZART: (acidamente) Não me diga. (depois de uma curta pausa) O que meu tema fez para merecer esse tratamento?
G: (protestando cautelosamente) É um tema banal!
M: Certamente não do modo em que você o tocou!
G: Exatamente. Queria que as pessoas o escutassem e o experimentassem de um modo completamente diferente, entende? “Eu queria submetê-lo a um tipo de escrutínio em que seus elementos básicos fossem isolados uns dos outros, e a continuidade do tema, deliberadamente corroída”
M: E quando você transpõe as defesas – bum! – você explode tudo pelos ares, ahn?
G: Não, muito pelo contrário. “A ideia era que cada variação sucessiva contribuísse para a restauração daquela continuidade e, absorta nesta tarefa, fosse menos visível como um elemento ornamental, decorativo”
M: (estupefato) Como o quê? Como um “elemento decorativo”?
G: Como um “elemento ornamental, decorativo”. “Parece-me que você simplificou as coisas abusando das figurações; tem-se a impressão de que é tudo puramente arbitrário – um deleite puramente tátil que qualquer outra fórmula poderia igualmente prover”. Nada há de atraente nisso, você entende? Isso sem falar da completa ausência de qualquer interesse contrapontístico. Puro hedonismo teatral, se é que você me entende. (após uma breve pausa) Bem, diga algo.
M: Com toda honestidade, estou sem palavras. Ao ouvir você falar desse jeito, qualquer um pensaria que você não gosta de minha música…
G: (rapidamente e com veemência) Não, de modo algum! Que faz você dizer isso? Sua primeira sinfonia, por exemplo, é uma joia absoluta! Eu mesmo a regi certa vez, em 1959, no Festival de Vancouver. Ou que tal suas seis primeiras sonatas para piano? “Elas têm aquelas ‘virtudes barrocas’ – uma pureza de condução de vozes e cálculo de registro – que nunca foram igualadas em suas obras mais tardias e que as fazem as melhores da série. E ainda que ‘quando mais curta, melhor’ geralmente represente minha postura em relação a sua música, tenho que dizer que sua Sonata em Ré maior, K. 284, que é provavelmente a mais longa delas, é minha favorita”.
M: (desanimadamente) Não sei se devo me alegrar ou não…
G: (confidentemente) Sabe, Sr. Mozart, “você deveria ter congelado seu estilo quando deixou Salzburgo; se tivesse se contentado em não alterar sua linguagem musical nas trezentas e tantas obras que escreveria depois, eu estaria perfeitamente contente”.
M: (pensativamente) Você acha que Viena – como devo dizer? – corrompeu meu estilo?
G: Temo que sim, claro. “Quando gerações de ouvintes acham apropriado atribuir-lhe termos como ‘leveza’, ‘facilidade’, ‘frivolidade’, ‘galanteria’, ‘espontaneidade’, convém-nos ao menos refletir acerca dos motivos para tais atribuições – que não são necessariamente nascidas de desapreço ou de caridade”.
M: (incredulamente) Em outras palavras, nada de “Don Giovanni” e nada de “A Flauta Mágica”?
G: Não!
M: Nenhuma das minhas últimas sinfonias?
G: Enfaticamente não!
M: E presumo que nenhuma de minhas últimas sonatas, também?
G: Essas, muito menos! “Eu as acho insuportáveis” – perdoe-me dizer isso. Elas são “repletas de presunção quase teatral, e posso seguramente afirmar que, ao gravar uma peça como a Sonata em Si bemol maior, K. 570, eu o fiz sem qualquer convicção. (à parte) O mais honesto a se fazer teria sido pular essas obras, mas o ciclo tinha que ser concluído”.
M: (quietamente) E tudo que eu teria escrito se eu não tivesse…
G: (furiosamente, quase abrupto) Que disparate! Imaginemos que você… bem, digamos que você tivesse chegado aos setenta anos; você teria então morrido em 1826, um ano antes de Beethoven e dois anos antes de Schubert, pelo que, se eu pudesse extrapolar seu estilo posterior com base nas suas trezentas últimas obras, você acabaria um compositor entre Weber e Spohr. É uma especulação tão absurda quanto seria imaginar o que eu acabaria por gravar se eu não tivesse morrido aos cinquenta anos (amargamente) Deixe-me dizer uma coisa, Sr. Mozart: eu não teria gravado nada – nada mais! Aliás, eu já planejava abandonar o piano quando completasse cinquenta anos…
M: Se eu o compreendi bem, eu morri tarde demais, em vez de muito cedo…
G: Correndo o risco de exagerar: sim.
PQP Bach tem lá suas manias. Uma delas é de considerar Fauré superior a Debussy. Ouçam este disco! Que repertório maravilhoso! Kathtyn Stott é uma intérprete internacionalmente reconhecida da música para piano de Fauré. Trata-se de uma especialista. Há muito tempo ela queria gravar os dois quartetos para piano do compositor, mas estava procurando o grupo certo. Ela descobriu o Hermitage String Trio, um conjunto com o qual ela passou a fazer turnês. Aos quartetos são acrescentados de um trabalho para piano solo de Fauré, o Noturno Nº 4. A pianista inglesa e os russos do Hermitage funcionam muito bem juntos. Os movimentos lentos, no entanto, são estranhos, parecem tensos, como se Stott quisesse um tempo e os russos outro, mas talvez seja apenas uma impressão minha. Mas ficou lindo! A leitura de Stott do Noturno Nº 4 de Fauré é sensível e bonita. Apesar de minha pequena restrição, este é um disco que desafia as grandes performances do passado.
Gabriel Fauré (1845-1924): Quartetos para Piano Nº 1 & 2 / Noturno Nº 4
Piano Quartet No. 1 in C minor, Op. 15
1 1. Allegro molto moderato 09:12
2 2. Scherzo. Allegro vivo 05:17
3 3. Adagio 06:47
4 4. Allegro molto 07:52
Piano Quartet No. 2 in G minor, Op. 45
5 1. Allegro molto moderato 10:52
6 2. Allegro molto 03:29
7 3. Adagio non troppo 11:20
8 4. Allegro molto – Più mosso 08:36
9 Nocturne No. 4 in E flat major, for solo piano, Op. 36 08:17
Postar qualquer gravação de Gould é, admito, pedir para levar pedrada. Pedradas, aliás: várias delas. Todas bem merecidas.
Justifico: a postagem com menos downloads entre as que fiz foi aquela do infame concerto em que Leonard Bernstein lavou as mãos ante a plateia antes de tocar com Gould o Concerto no. 1 de Brahms. Um colega de blog confessou-me que não tivera a coragem de baixar a gravação, e a caixa de comentários transbordou, se não de ódio, de manifestações de desprezo pela pessoa e pelo pianismo do canadense – que, reconheço, é merecedor de todas as críticas que recebe, mesmo mais de três décadas depois de sua morte, a despeito de sua criatividade e formidável domínio sobre seu instrumento.
Postar a integral de Gould para as Sonatas de Mozart – que, junto com aquelas de Beethoven, são figurinhas fáceis nas listas de mais detestadas de todos os tempos e estão inscritas com sangue e sanha nos livros de ódio de muitos melômanos – é pedir, como se diz lá na minha terra, para levar nos dedos. Mesmo os fãs mais incondicionais reconhecem, por exemplo, que a gravação da Sonata K. 331 é o pináculo da perversidade gouldiana, com as variações de abertura tocadas em velocidade crescente, um minueto interminável e um Alla turca bizarramente ruminativo. A recomendação mais complacente que encontrei para a série foi “para anti-mozartianos e completistas” – as mais furiosas, bem, furto-me a compartilhá-las em nome do pundonor que cabe a este blog (*pigarro*) ultrafamília.
Por que, então, postar Gould tocando Mozart? Puramente como um pretexto para divulgar a tradução do delicioso texto em que o alemão Michael Stegemann imagina um diálogo entre o compositor e o pianista que tão deliberadamente sabota suas obras, incluído no encarte do relançamento dessas gravações como parte da Glenn Gould Edition, em 1992. Baseada principalmente em entrevistas concedidas ao documentarista Bruno Monsaingeon e em ataques furibundos de críticos (trechos citados entre aspas), ele tem o mesmo tom dos textos com que Gould divulgava suas ideias sobre música, imaginando (dentro das peculiaridades de seu funcionamento cerebral) um colóquio entre um pianista de nome Glenn Gould e um psicanalista chamado, bem, glenn gould.
Enquanto antecipo minhas desculpas por eventuais derrapadas na tradução (pois a vida é demasiado curta para se aprender alemão), faço votos de que se divirtam com o texto. E, ah: o link para a gravação está lá no local de costume. Só para constar.
COLLOQUIUM OLYMPICUM (FICTUM)
Dois homens numa nuvem. Um deles usa um pulôver, jaqueta de tweed, capa de inverno, cachecol de lã, boina xadrez, óculos aro de tartaruga, luvas sem dedos, calças bufantes e sapatos marrons surrados. Ele toca piano – o Andante grazioso con variazioni da Sonata em Lá maior, K. 331, de Mozart. O outro usa uma peruca com tranças, lenço franzido, casaca de brocados ricamente bordados (com a Ordem do “Cavaleiro da Espora Dourada”), calças até os joelhos, meias de seda e sapatos com fivela. Ele escuta atentamente. O primeiro deles é GLENN GOULD, o outro, WOLFGANG AMADEUS MOZART.
GOULD: (concluindo o movimento) E…?
MOZART: (perplexo) Desculpe-me perguntar-lhe, meu amigo, mas você sempre senta tão abaixo do teclado quanto está a tocar piano?
G: Sempre.
M: E sempre nessa, er, cadeira?
G: Sempre, sim. Meu pai a fez para mim quando eu tinha vinte, vinte e um anos.
M: (cautelosamente) Mas está quebrada…
G: Eu sei. Um acidente. Um agente de aeroporto subiu nela e foi-se através do assento.
M: (sem compreender) Um agente de aeroporto…?
G: Esquece. (rapidamente e com desconforto evidente) E antes que você pergunte, eu sempre cantarolo junto com a música quando estou tocando piano. Para mim isso não é qualquer vantagem, é apenas algo inevitável que sempre me acompanhou, eu nunca consegui me livrar disso. Desculpe.
M: Não precisa se desculpar. Não me incomodou, em particular. Não isso, de qualquer maneira…
G: O quê, então?
M: (evasivamente) O instrumento que você usa soa estranho… Não é um dos fortepianos de Streicher, é?
G: É um Steinway, número de série CD 318.
M: (sem muita convicção) Aha.
G: Então, o quê, exatamente, incomodou você?
M: (hesitantemente) Bem, como deveria colocar-lhe… foi… Quero dizer, você…
G: … toquei muito devagar?
M: Bem, eu escrevi “Adagio” sobre a quinta variação, e você a tocou como “Allegro”.
G: Você quer dizer, rápido demais?
M: … enquanto o tema do Andante grazioso soou mais como um Largo, tocado por você. (quietamente) Eu quase não o reconheci.
G: (gargalhando) Você não foi o primeiro! Havia pessoas (e espero que elas ainda existam) que descreveram minha gravação como “a mais repugnante jamais feita”.
M: (sem entender) Gravação…?
G: (benevolamente) Escute, Sr. Mozart, desde que você morreu, um monte de coisas aconteceu, sobre as quais você sequer poderia imaginar. Mas, em termos de nossa conversa, eu não acho que elas sejam importantes e sugiro que as esqueçamos. Por ora, agradeceria se nos mantivéssemos no assunto; quando terminarmos, terei a maior felicidade em falar-lhe de aeroportos, gravações e por aí vai, OK?
M: “OK”, como diz você – seja lá o que signifique.
G: Beleza. Você me falava que achou a quinta variação muito rápida e o tema muito lento, correto?
M: Entre outras coisas. Mesmo com a maior boa vontade do mundo eu não sei por que você…
G: (mantendo-se em seu raciocínio) Veja bem, “de acordo com o esquema que empreguei, a penúltima variação só perde em velocidade para o finale do movimento”
M: (algo perturbado) O esquema que você empregou. Mas, sério, meu amigo, e o meu esquema?
G: (recusando-se a abandonar seu raciocínio) “A ideia por trás da interpretação era, já que o segundo movimento é mais um noturno-com-minueto do que um movimento lento” – você não negará isso – “e já que o pacote é finalizado com aquela curiosa porção de exotismo à moda serralho, estamos lidando com uma estrutura incomum, e virtualmente todas as convenções de sonata-allegro podem ser deixadas de lado”
M: Sério? (sarcasticamente) Bem, muito obrigado por explicar minha própria sonata para mim!
Consistindo somente de música para trompa e piano, este pequeno disco não pode sequer esboçar a herança de Beethoven. Mas faz mais do que imaginamos, pois as primeiras peças de câmara de Beethoven, agora entre as menos conhecidas, estavam entre as mais entusiasticamente tocadas durante sua vida. A diversão é principalmente nas outras três partes do álbum, que são bem e mal-sucedidas de diferentes maneiras. A sonata de Ries imita de perto as de Beethoven, tanto no humor geral quanto em vários detalhes, mesmo sem captar sua toda aquela tensão. Carl Czerny, em seu andante e polaca para trompa e piano, op. posth., capta a parte expansiva de Beethoven e dá à trompa e ao piano uma dinâmica extraordinária dentro do contexto do início do século XIX. As peças mais atraentes são as duas obras de Ignaz Moscheles.
Beethoven / Czerny / Ries / Moscheles: A herança de Beethoven (Música para trompa e piano)
1. Ludwig Van Beethoven – Sonate en Fa maj op. 17 – Allegro moderato (8:34)
2. Ludwig Van Beethoven – Sonate en Fa maj op. 17 – Poco Adagio, quasi andante (1:29)
3. Ludwig Van Beethoven – Sonate en Fa maj op. 17 – Allegro moderato (5:02)
4. Carl Czerny – Andante e polacca op. posth – Andante (3:21)
5. Carl Czerny – Andante e polacca op. posth – Allegro alla Polacca (8:41)
6. Ferdinand Ries – Sonate en fa maj op.34 – Largetto (12:11)
7. Ferdinand Ries – Sonate en fa maj op.34 – Andante (3:57)
8. Ferdinand Ries – Sonate en fa maj op.34 – Rondo Allegro (6:58)
9. Ignaz Moscheles – Theme varie du Feuillet d’Album de Rossini (8:32)
10. Ignaz Moscheles – Introduction et Rondeau Ecossais op. 63 (8:21)
Louis-Philippe Marsolais, trompa
David Jalbert, piano
Começo dizendo que cresci ouvindo e amando os tradicionais Concertos para Violino. E dá-lhe Beethoven, dá-lhe Mendelssohn, dá-lhe Tchaikovski, dá-lhe Bartók, dá-lhe Shostakovich, dá-lhe Prokofiev! Na verdade, sabem?, eu não gosto muito de Philip Glass. As palavras usuais que uso para enquadrar Glass são normalmente para dizer que ele é menor, muito menor do que Adams, Riley, Reich, etc. Sigo com a mesma opinião. Ou seja, aqui me interessa mais Adams, mas o Glass até que é bom. Seu concerto é um híbrido de minimalismo, neorromantismo e neobarroco. Em resumo, mostra uma evolução do minimalismo inicial mais “hardcore”. Como Glass, John Adams é considerado um minimalista, mas em 1993, quando escreveu este concerto, ele já estava se bandeando. Seu Concerto para Violino é uma composição tradicional norte-americana escrita em um estilo que deve muito ao modernismo. A Chaconne de Adams é a coisa mais linda! Enquanto Glass transformou seu minimalismo anterior, Adams o abandona. Bom disco.
John Adams (1947) & Philip Glass (1937): Concertos para Violino
John Adams — Violin Concerto
1 – I. ♩ = 78 14:44
2 – II. Chaconne: Body Through Which The Dream Flows 11:02
3 – III. Toccare 7:45
Philip Glass — Concerto for Violin and Orchestra
4 – I. ♩ = 104 – ♩ = 120 6:25
5 – II. ♩ = Ca. 96 9:53
6 – III. ♩ = Ca. 150 – Coda: ♩ = 104 9:46
Violin, Soloist – Robert McDuffie
Orchestra – Houston Symphony Orchestra
Conductor – Christoph Eschenbach
Há muitos anos atrás, lá nos primórdios do PQPBach, eu estava, para variar, preparando uma integral dos Concertos para Piano de Mozart, na peculiar versão do Jos van Immerseel, cd a cd (10 ou 12 ao todo, não lembro). Vendo o quanto eu me esforçava para preparar os textos, cd por cd, PQPBach foi enfático: não precisa ficar preparando texto para cada CD, a partir de determinado momento, apenas relacione as faixas, e deu para a bola. Comecei a fazer isso, pensando que os nosso leitores iriam reclamar. Mas ninguém reclamou. Ou seja, é muito grande a probabilidade de nos esforçarmos para melhor apresentarmos o que trazemos, mas grande parte dos leitores irão direto para o link para descarregar.
P.S. Vamos ver quantos irão reclamar, ainda mais que neste volume, no seu segundo CD, temos a monumental Sonata Waldstein.
Volume 5
Cd 1
01. Sonate Nr. 16 G-dur, Op. 31 No. 1 I. Allegro vivace
02. Sonate Nr. 16 G-dur, Op. 31 No. 1 II. Adagio grazioso
03. Sonate Nr. 16 G-dur, Op. 31 No. 1 III. Rondo Allegretto
04. Sonate Nr. 17 d-moll, Op. 31 No. 2 I. Largo. — Allegro
05. Sonate Nr. 17 d-moll, Op. 31 No. 2 II. Adagio
06. Sonate Nr. 17 d-moll, Op. 31 No. 2 III. Allegretto
07. Sonate Nr. 18 Es-dur, Op. 31 No. 3 I. Allegro
08. Sonate Nr. 18 Es-dur, Op. 31 No. 3 II. Scherzo Allegretto vivace
09. Sonate Nr. 18 Es-dur, Op. 31 No. 3 III. Menuetto Moderato e grazioso
10. Sonate Nr. 18 Es-dur, Op. 31 No. 3 IV. Presto con fuoco
CD 2
01. Sonate Nr. 21 C-dur, Op. 53 I. Allegro con brio
02. Sonate Nr. 21 C-dur, Op. 53 II. Introduzione Adagio molto
03. Sonate Nr. 21 C-dur, Op. 53 III. Rondo Allegretto moderato
04. Andante favori F-dur, WoO 57 Andante grazioso con moto
Bonita gravação de um improvável duo de kora (a harpa-alaúde mandê) e violoncelo. Os músicos são amigos, e foi sua amizade quem os levou, por fim, ao estúdio.
O francês Ségal nasceu em Reims e estudou em Lyon. Enveredou por todo lado em sua carreira, inclusive para o dito “trip-hop” com seu grupo Bumcello. Seu instrumento, aqui, definitivamente não soa como aquele para o qual Bach escreveu suas maravilhosas suítes. Ségal o faz mergulhar de espigão e tudo, e inclusive percussivamente, na longa tradição representada por seu parceiro africano.
O malinês Ballaké Sissoko nasceu em Bamako, capital do país, e foi muito influenciado pelo compatriota Toumani Diabaté, o grande nome da kora. A origem do instrumento remonta ao período correspondente à Idade Média na Europa. Mais adiante, no apogeu do império Songhay, a região que hoje é o Mali enriqueceu graças ao lucrativo comércio de ouro, sal e, infamemente, escravos. O principal entreposto das caravanas era a mítica cidade de Tomboctou, também conhecida como Timbuktu. Inestimável e mui ameaçada integrante do Patrimônio Cultural da Humanidade, ela é sede de uma das mais preciosas (e frágeis) bibliotecas do mundo islâmico. De quebra, como bem deverá se recordar quem lia os quadrinhos das aventuras de Mickey e de Tintin, Timbuktu é sinônimo de fim de mundo, e não à toa: está a pelo menos três dias (que para mim foram cinco) de Bamako, num ônibus atrolhado, tórrido e sovaquento, com janelas invariavelmente seladas por conta da fobia local a brisa – QUALQUER brisa.
Em compensação, para quem tem um camelo e está em Marrakesh, Tombouctou é logo ali (foto do autor)
Voltando à vaca fria, não creio que caibam quaisquer ressalvas à postagem deste disco num blogue criado pelo filho renegado da família Bach. O demiurgo Johann Sebastian é o Alfa e o Ômega, o Princípio e o Fim de toda Música, e este álbum que ora apresento, afinal, contém não só grande música, critério bastante para que o lancemos aqui, mas também arte que é clássica até o caroço. Como o colega Ranulfus muito bem defendeu nos comentários de uma antiga postagem, “uma das coisas que me motivam na colaboração no blog é tentar demonstrar o quanto nosso conceito de ‘clássico’ pode ser justificadamente expandido para além das suas fronteiras tradicionais (no fundo etnocêntricas), e isso com criações autênticas, não com adaptações tipo ‘transcrições de canções populares para orquestra’.”
Ditto.
CHAMBER MUSIC (2009)
01 – Chamber Music (Sissoko)
02 – Oscarine (Ségal)
03 – Houdesti (Sissoko)
04 – Wo Yé N’gnougobine (Sissoko)
05 – Histoire de Molly (Ségal)
06 – “Ma Ma” FC (Ségal)
07 – Regret – À Kader Barry (Sissoko)
08 – Halinkata Djoubé (Sissoko)
09 – Future (Sissoko)
10 – Mako Mady (Sissoko)
Um disco verdadeiramente espetacular. A Música Aquática de Telemann, mais a muito irreverente Suíte Alster são para ouvir e se divertir, ouvir e se divertir, ouvir e se divertir. Acho que, de todas as suítes orquestrais de Telemann, a Alster é minha preferida. O New London Consort é um excelente conjunto, fazendo inteira justiça a esta grande música.
G. P. Telemann (1681-1767): Water Music / Alster Overture: Water Music / Alster Overture
1. Wassermusik Overture in C, Ouverture
2. Wassermusik Overture in C, Sarabande
3. Wassermusik Overture in C, Bour e
4. Wassermusik Overture in C, Loure
5. Wassermusik Overture in C, Gavotte
6. Wassermusik Overture in C, Harlequinade
7. Wassermusik Overture in C, Der St rmende Aeolus
8. Wassermusik Overture in C, Menuet
9. Wassermusik Overture in C, Gigue
10. Wassermusik Overture in C, Canarie
11. Die Relinge Concerto in A, The Frogs
12. Die Relinge Concerto in A, The Frogs, Adagio
13. Die Relinge Concerto in A, The Frogs, Menuet
14. Alster Overture in F, Alster Overture
15. Alster Overture in F, Die canonierende Pallas
16. Alster Overture in F, Das Alster Echo
17. Alster Overture in F, Die Hamburgischen Glockenspiele
18. Alster Overture in F, Der Schwanen Gesang
19. Alster Overture in F, Der lster Sch ffer Dorff Music
20. Alster Overture in F, Die concertirenden Fr sche (und) Kr hen
21. Alster Overture in F, Der ruhende Pan
22. Alster Overture in F, Der Sch ffen und Nymphen eilfertiger Abzug
Um belo e inspirado andante, da primeira sonata do op. 49, dá início a este terceiro volume das Sonatas para Piano de Beethoven, nas mãos muito competentes de András Schiff.
Meu colega de blog, René Denon, comentou dia destes em conversa no grupo do Whatsapp que sempre que vai dormir, gosta de ouvir obras para piano. Não me utilizo de tal método, mas acho interessante sua escolha. Talvez a percussão das teclas tenha efeito sonífero (lembro de determinada pianista japonesa cujo nome não lembro, que misturava new age com aquele jazz bem Pop, aquilo sim me dava sono), ou então alguns músicos que são considerados New Age (ainda existe este movimento?) . Ou então podemos nos chatear até mesmo com determinada interpretação de uma sonata de Beethoven, achá-la maçante. Sei lá, questão de gosto. Um outro amigo gostava de ouvir cds com mantras de monges tibetanos, ou então, gravação de sons das baleias. Cada um com seu método.
Volume 3
01. Sonate Nr. 19 g-moll, Op. 49 No. 1 I. Andante
02. Sonate Nr. 19 g-moll, Op. 49 No. 1 II. Rondo Allegro
03. Sonate Nr. 20 G-dur, Op. 49 No. 2 I. Allegro ma non troppo
04. Sonate Nr. 20 G-dur, Op. 49 No. 2 II. Tempo di Menuetto
05. Sonate Nr. 9 E-dur, Op. 14 No. 1 I. Allegro
06. Sonate Nr. 9 E-dur, Op. 14 No. 1 II. Allegretto
07. Sonate Nr. 9 E-dur, Op. 14 No. 1 III. Rondo Allegro commodo
08. Sonate Nr. 10 G-dur, Op. 14 No. 2 I. Allegro
09. Sonate Nr. 10 G-dur, Op. 14 No. 2 II. Andante
10. Sonate Nr. 10 G-dur, Op. 14 No. 2 III. Scherzo Allegro assai
11. Sonate Nr. 11 B-dur, Op. 22 I. Allegro con brio
12. Sonate Nr. 11 B-dur, Op. 22 II. Adagio con molta espressione
13. Sonate Nr. 11 B-dur, Op. 22 III. Menuetto
14. Sonate Nr. 11 B-dur, Op. 22 IV. Rondo Allegretto
Volume 4
01. Sonate Nr. 12 As-dur, Op. 26 I. Andante con Variazioni
02. Sonate Nr. 12 As-dur, Op. 26 II. Scherzo Allegro molto
03. Sonate Nr. 12 As-dur, Op. 26 III. Marcia funebre
04. Sonate Nr. 12 As-dur, Op. 26 IV. Allegro
05. Sonate Nr. 13 Es-dur, Op. 27 No. 1 I. Andante. — Allegro
06. Sonate Nr. 13 Es-dur, Op. 27 No. 1 II. Allegro molto e vivace
07. Sonate Nr. 13 Es-dur, Op. 27 No. 1 III. Adagio con espressione
08. Sonate Nr. 13 Es-dur, Op. 27 No. 1 IV. Allegro vivace
09. Sonate Nr. 14 cis-moll, Op. 27 No. 2 I. Adagio sostenuto
10. Sonate Nr. 14 cis-moll, Op. 27 No. 2 II. Allegretto
11. Sonate Nr. 14 cis-moll, Op. 27 No. 2 III. Presto agitato
12. Sonate Nr. 15 D-dur, Op. 28 I. Allegro
13. Sonate Nr. 15 D-dur, Op. 28 II. Andante
14. Sonate Nr. 15 D-dur, Op. 28 III. Scherzo Allegro vivace
15. Sonate Nr. 15 D-dur, Op. 28 IV. Rondo Allegro ma non troppo
Será que um Stradivarius vale tudo o que pedem por ele?
E um Amati? Ou um Guarneri?
Talvez este álbum possa ajudá-los a responder.
Nele, o virtuoso ítalo-americano Ruggiero Ricci (1918-2012) toca, em quinze famosos violinos, várias peças curtas que considera adequadas às características de cada instrumento. Depois, no que é talvez a parte mais interessante do álbum, ele toca o mesmo trecho – o início solo inicial do Concerto no. 1 de Max Bruch – com as mesmíssimas condições de estúdio em cada um dos violinos, a maior parte dos quais leva apelidos que remetem a ex-proprietários célebres. Apesar da overdose de Stradivari, o xodó de Ricci era seu inseparável Guarneri del Gesù (o “Ex-Huberman”, que surpreendemente não aparece nesta gravação), que foi, depois de sua morte, adquirido por uma companhia japonesa e cedido à violinista japonesa Midori Gotō.
A “Glória de Cremona” a que se refere o título é a rica tradição de luteria daquela cidade, que teve seu pináculo entre os séculos XVI e XVIII através de luthiers da estirpe de Stradivari, Guarnieri, Bergonzi, Amati e da Salo, cujos preciosos instrumentos são, há já muito tempo, o privilégio dos maiores virtuosos.
THE GLORY OF CREMONA – RUGGIERO RICCI
Jean-Antoine DESPLANES [Giovanni Antonio Piani] (1678-1760)
01 – Intrada [violino de Andrea Amati, c. 1560-170]
PietroNARDINI (1722-1793) 02 – Larghetto [violino de Antonio Stradivari, “ex-Rode”, 1733]
Antonio Lucio VIVALDI (1678-1741)
03 – Praeludium [violino de Nicolò Amati, 1656]
Niccolò PAGANINI (1782-1840)
04 – Cantabile e Valzer [violino de Antonio Stardivari, “Il Monasterio”,1719]
Wolfgang AmadeusMOZART (1756-1791)
arranjo de Carl Friedberg (1872–1955)
05 – Adagio [violino de Giuseppe Guarneri del Gesù, “Il Plowden”, 1735]
Dmitri Borisovich KABALEVSKY (1904-1987)
06 – Improvisation, Op. 21 no. 1 [violino de Antonio Stradivari, “Il Spagnolo”, 1677]
Piotr Ilyich TCHAIKOVSKY (1840-1893)
07 – Souvenir d’un lieu cher, Op. 42 – no. 2: Mélodie [violino de Giuseppe Guarneri del Gesù, “Il Lafont”, 1735]
Francesco Maria VERACINI (1690-1768)
08 – Largo [violino de Gasparo da Salo, ca. 1570-80]
Maria Theresia vonPARADIS (1759-1824)
arranjo de Samuel Dushkin (1891-1976)
09 – Sicilienne [violino de Carlo Bergonzi, “Il Constable”, 1731]
Jenő HUBAY (1858-1937)
10 – The Violin Maker of Cremona [violino de Giuseppe Guarneri del Gesù, “Ex-Bériot”, 1744]
Georg FriedrichHÄNDEL (1685-1759)
11 – Larghetto [violino de Antonio Stradivari, “El Madrileño”, 1720]
Robert SCHUMANN (1810-1856)
arranjo de Fritz Kreisler (1875-1962)
12 – Romance em Lá maior [violino de Giuseppe Guarneri del Gesù, “Ex-Vieuxtemps”, 1739]
Johannes BRAHMS (1833-1897)
13 – Dança Húngara no. 20 [violino de Antonio Stradivari, “Ex-Joachim”, 1714]
14 – Dança Húngara no. 17 [violino de Giuseppe Guarneri del Gesù, “Ex-Gibson”, 1734]
Jakob Ludwig Felix MENDELSSOHN-Bartholdy (1809-1847)
arranjo de Fritz Kreisler
15 – Lieder ohne Wörte, Op. 62 – No. 1: “Mailüfte” (“Brisas de Maio”) [violino de Antonio Stradivari, “Ex-Ernst”, 1709]
Ruggiero Ricci, violinos Leon Pommers, piano
Max Christian FriedrichBRUCH (1838-1920)
Concerto para violino e orquestra no. 1 em Sol menor, Op. 26
I – Vorspiel. Allegro moderato (excerto – solo inicial)
Executado por Ruggiero Ricci nos seguintes instrumentos:
16 – Andrea Amati (c. 1560-70)
17 – Nicolò Amati (1656)
18 – Antonio Stradivari, “Il Spagnolo” (1677)
19 – Antonio Stradivari, “Ex-Ernst” (1709)
20 – Antonio Stradivari, “Ex-Joachim” (1714)
21 – Antonio Stradivari, “Il Monasterio” (1719)
22 – Antonio Stradivari, “El Madrileño” (1720)
23 – Antonio Stradivari, “Ex-Rode” (1733)
24 – Gasparo da Salo (c. 1570-80)
25 – Carlo Bergonzi, “Il Constable” (1731)
26 – Giuseppe Guarneri del Gesù, “Il Gibson” (1734)
27 – Giuseppe Guarneri del Gesù, “Il Lafont” (1735)
28 – Giuseppe Guarneri del Gesù, “Il Plowden” (1735)
29 – Giuseppe Guarneri del Gesù, “Ex-Vieuxtemps” (1739)
30 – Giuseppe Guarneri del Gesù, “Ex-Bériot” (1744)
Um CD espantoso que demonstra algo que os mais observadores já desconfiaram: na maior parte das vezes, os compositores ficam com seus sotaques corrigidos e melhores quando interpretados por conterrâneos. Em música, a questão da vivência cultural é preponderante. Aqui, os escandinavos responsáveis pela execução da obra do norueguês Grieg entram com os acentos e algumas dinâmicas que nunca ouvi nestas obras. E que lhe caem extremamente bem! O resultado são interpretações que dão outro gosto a estas obras complicadas do repertório grieguiano. Os caras usam uma dureza e concisão raras. Se eu fosse você, largaria tudo agora para ouvir este tremendo disco.
Edvard Grieg (1843-1907): Cello Sonata, String Quartet
1. Cello Sonata In A Minor Op. 36: I. Allegro Agitato 9:46
2. Cello Sonata In A Minor Op. 36: II. Andante Molto Tranquillo 6:29
3. Cello Sonata In A Minor Op. 36: III. Allegro – Allegro Molto E Marcato 12:02
4. String Quartet In G Minor Op. 27: I. Un Poco Andante – Allegro Molto Ed Agitato 11:59
5. String Quartet In G Minor Op. 27: II. Romanze – Andantino 6:25
6. String Quartet In G Minor Op. 27: III. Intermezzo – Allegro Molto Marcato 6:26
7. String Quartet In G Minor Op. 27: IV. Finale – Lento – Presto Al Saltarello 9:03
Truls Mørk, violoncelo
Håvard Gimse, piano
Solve Sigerland, violino
Atle Sponberg, violino
Lars Anders Tomter, viola
Truls Mørk, violoncelo
Um álbum com o mesmo conceito daquele que postamos ontem: um célebre concerto para violino, Ruggiero Ricci, e várias cadências de diferentes autores. A orquestra, aqui, sai-se melhor, e Ricci parece mais à vontade com Brahms do que com Beethoven. As cadências mais famosas dividem o álbum com algumas das quais eu não fazia a menor ideia – assim como, em minha habitual ignorância, também não sabia que o célebre musicólogo Donald Francis Tovey tinha sido compositor.
RUGGIERO RICCI PLAYS BRAHMS VIOLIN CONCERTO
JohannesBRAHMS (1833-1897)
Concerto em Ré maior para violino e orquestra, Op. 77
01 – Allegro non troppo (início, compassos 1-525)
02 – Cadência de Ferruccio Busoni
03 – Cadência de Joseph Joachim
04 – Cadência de Edmund Sing
05 – Cadência de Hugo Heermann
06 – Cadência de Leopold Auer
07 – Cadência de Eugène Ysaÿe
08 – Cadência de František Ondrícek
09 – Cadência de Franz Kneisel
10 – Cadência de Henri Marteau
11 – Cadência de Fritz Kreisler
12 – Cadência de Donald Francis Tovey
13 – Cadência de Jan Kubelík
14 – Cadência de Adolf Busch
15 – Cadência de Jascha Heifetz
16 – Cadência de Nathan Milstein
17 – Cadência de Ruggiero Ricci
18 – Allegro non troppo (conclusão, compassos 511-535)
19 – Adagio
20 – Allegro giocoso, ma non troppo vivace – Poco più presto
Ruggiero Ricci, violino Sinfonia of London Norman del Mar, regência
Ruggiero Ricci (1918-2012) foi um extraordinário violinista, de carreira muito longa (mais de setenta anos!) e prolífica como solista e professor. Seu legado fonográfico é comparavelmente imenso, e só cresce se levamos as considerações as inúmeras gravações piratas de seus concertos lançadas por selos inescrupulosos.
Esta aqui traz Ricci já um tanto fora de sua melhor forma, aos 76 anos, mas ainda a tocar com muita energia e sabedoria, acompanhado de maneira anêmica e protocolar pela orquestra meia-boca. A maior atração, parece-me, não é nem tanto o Concerto de Beethoven em si, e sim o fato da gravação incluir praticamente todas as cadenze importantes escritas para ele, a longo de quase de dois séculos, por diversos violinistas e compositores. Note-se que, se Beethoven não nos legou sua própria cadenza na versão para o violino, ele deixou uma para a transcrição que fez do Concerto para o piano. Essa cadenza, extremamente serelepe e com participação esteroidea dos tímpanos, foi por sua vez transcrita e adaptada por Wolfgang Schneiderhan para o violino e incluída no disco.
Os leitores-ouvintes certamente reconhecerão as cadenze escritas por Joachim e Fritz Kreisler, que são as mais frequentemente escolhidas pelos violinistas. Recomendo, no entanto, nem que seja para engrossar o coro do escândalo, a sensacional (para mim), transgressora (para todos) e sacrílega (para muitos) cadenza escrita por Alfred Schnittke: ela começa bastante convencional, ainda que ao estilo do compositor, para então incluir citações de concertos de Shostakovich, Bartók, Brahms e Berg (o coral bachiano do segundo movimento de “Em memória de um Anjo”), havendo ainda espaço para uma “palhinha” da Sétima de Beethoven. Compreensivelmente odiada pelos críticos (o mínimo que li sobre ela foi considerá-la uma “pichação”), ela tinha sido gravada, até onde me consta, somente por Gidon Kremer (que, aliás, a encomendara a Schnittke) sob Neville Marriner e a Academy of St. Martin-in-the-Fields
Se os ouvidos de vocês doerem muito, há várias cadenze bem convencionais para neutralizar a dor – a de Ferdinand David, virtuoso que inspirou o Concerto de Mendelssohn, é uma grata surpresa. Programem o Mp3 player e sejam felizes.
RUGGIERO RICCI PLAYS BEETHOVEN VIOLIN CONCERTO
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
Concerto em Ré maior para violino e orquestra, Op. 61
01 – Allegro ma non troppo (início, compassos 1-510)
02 – Cadenza de Ludwig van Beethoven (arranjo de Wolfgang Schneiderhan)
03 – Cadenza de Ferdinand David
04 – Cadenza de Henri Vieuxtemps
05 – Cadenza de Joseph Joachim (primeira versão)
06 – Cadenza de Joseph Joachim (segunda versão)
07 – Cadenza de Ferdinand Laub
08 – Cadenza de Henryk Wieniawski
09 – Cadenza de Camille Saint-Saëns
10 – Cadenza de Leopold Auer
11 – Cadenza de Eugène Ysaÿe
12 – Cadenza de Ferruccio Busoni
13 – Cadenza de Fritz Kreisler
14 – Cadenza de Nathan Milstein
15 – Cadenza de Alfred Schnittke
16 – Allegro ma non troppo (conclusão, compassos 511-535)
17 – Larghetto
18 – Rondo: Allegro
Ruggiero Ricci, violino Orchestra Sinfonica del Chianti Piero Bellugi, regência
Direto do túnel do tempo, trago para os senhores uma magnífica gravação de uma das minhas sinfonias favoritas, a Segunda de Brahms, onde um jovem maestro se consolidava entre os grandes regentes do final do século XX, Claudio Abbado. O ano era 1968, este que vos escreve ainda mal falava as primeiras palavras, além de mal conseguia caminhar.
Cinquenta e um anos se passaram desde então, aquele jovem maestro já nos deixou, mas antes de isso acontecer, nos proporcionou muita alegria e emoção no coração, graças a sua incrível sensibilidade artística Abbado já não está mais entre nós. E é com muita emoção que ouço esta pintura que é a Segunda de Brahms nas mãos deste jovem que ainda não conhecia muito da vida, digamos assim. Já no primeiro movimento ela mostra a que veio. Intercala momentos de lirismo, e ao mesmo tempo de tensão, a linguagem brahmsiana já está bem clara e definida, identificamos rapidamente suas principais características. Sim, sabemos que ele demorou para escrever sua primeira sinfonia, sempre dizia que depois de Beethoven, não havia mais o que se poderia expressar. Que bom que ele conseguiu superar essa barreira criativa. Que talvez tenha sido benéfica, basta analisarmos a qualidade destas quatro maravilhas que são suas sinfonias. A maturidade ajudou a moldá-las.
1. Symphony No. 2 in D, Op. 73- 1. Allegro non troppo
2. Symphony No. 2 in D, Op. 73- 2. Adagio non troppo – L’istesso tempo, ma grazioso
3. Symphony No. 2 in D, Op. 73- 3. Allegretto grazioso –
4. Symphony No. 2 in D, Op. 73- 4. Allegro con spirito
5. Academic Festival Overture, Op.80
Berliner Philharmoniker
Claudio Abbado – Conductor
Em 1 de julho de 2008 PQP Bach fez a postagem das três últimas sonatas para piano de Franz Schubert, interpretadas por Maurizio Pollini. Os arquivos da postagem estão agora na poeira internética. O post recebeu 26 comentários!! O texto é um pouco mais longo do que costumamos ver em suas atuais postagens e é uma delícia de ler. Nada de ilustrações. Eu diria, um clássico PQP.
Meu eterno interesse por estas peças de Schubert e minha admiração por essas gravações de Pollini fizeram com que eu preparasse tudo para relançar o post. Começamos assim uma nova série:
PQP Originals!
Aqui está o texto do PQP:
Sei que não somente “aqueles comentaristas habituais” hostilizarão esta gravação colocada entre as melhores da DG (obrigado pela lembrança dos Originals, Lais; minha gravação é pré-Originals), como nossa comparsa Clara Schumann deverá apresentar chiliques em defesa de seu amado Alfred Brendel que, segundo ela, acarinha melhor o compositor que ela mais ama.
(Nunca entendi esta senhora que casa com um, tem Brahms por amante, mas gosta mesmo é de Schubert. A mente masculina é mais simples e burra, graças a Deus, e interessa-se por todas, prova de seu amor à humanidade.)
Schubert é o compositor que mais lamento. Apenas 31 anos! Onde ele chegaria se tivesse vivido, por exemplo, os 57 anos de Beethoven? É difícil de responder, ainda mais ouvindo suas últimas obras, amadurecidas a fórceps pelo sofrimento causado pela doença. Este criador de melodias irresistíveis trabalhava (muito) pela manhã, caminhava à tarde e bebia à noite. O bafômetro o pegaria na volta, certamente. Seria um recordista de multas. Não morreu da sífilis e sim de tifo, após ingerir um vulgar peixe contaminado. Ou seja, uma droga de um peixe podre nos tirou anos de muitas obras, certamente. Espero que, se o inferno existir, este peixe esteja lá queimando. Desgraçado, bicho ruim!
A interpretação de Pollini é completamente despida de exageros ou de virtuosismo. Ele respeita inteiramente Schubert, compositor melodista e destituído de virtuosismo pessoal ao piano, pero… nada de sentimentalismos, meus amigos. Pollini é um realista. E, com efeito, as sonatas finais desfazem o mito do Schubert fofinho, mundano e feliz. Era um indivíduo profundo e o trágico não lhe era estranho.
Minha sonata preferida é a D. 960, com seu imenso e emocionante primeiro movimento. Quando o ouço de surpresa, penso que virão o que não me vêm há anos: lágrimas. O que segue é-lhe digno, com destaque especial para o zombeteiro movimento final. O D. 959 também é extraordinário, principalmente o lindíssimo e nobre Andantino e o lied do Rondó. Também tenho indesmentível amor pela contrastante primeira peça das Drei Klavierstucke.
A Fundação Maurizio Pollini, desta vez patrocinada por PQP Bach, agradece todos os apoios recebidos e declara-se ofendida pela nefasta ironia perpetrada pelo provocador Kaissor (ou foi o Exigente?) ao querer estigmatizar nosso ídalo por ser mais divulgado em razão do perfil marcadamente “comercial” de sua gravadora. Com todo o respeito, respondemos a ele que Pollini é a Verdade e o Absoluto. Dou a Schnabel um lugar no pódio e ele que fique quieto. “O homem que inventou Beethoven”??? Arrã. Acho que foi reinventado… :¬)))
Caso você queira ler também os comentários da época, clique aqui.
Atrevo-me apenas acrescentar que o tema do quarto movimento da Sonata em lá maior, D. 959, foi tomado emprestado do Allegretto quasi andantino da Sonata em lá menor, D. 537, de alguns anos antes, e é memorável. Para uma comparação, vá a 7’30 do vídeo aqui. Ou então ouça toda a sonata interpretada por Wilhelm Kempff, um mago das gravações, em particular, das obras de Schubert.
Franz Schubert (1797-1828)
Disco 1
Sonata para Piano em dó menor, D. 958
Allegro
Adagio
Allegro – Trio
Allegro
Sonata para Piano em lá maior, D. 959*
Allegro
Andantino
Allegro vivace – Trio. Um poco più lento
Allegretto
Maurizio Pollini, piano
Produção: Rainer Brock
*Maurizio Pollini dedica a gravação da Sonata em lá maior à memória de seu caro amigo Rainer Brock
Se você não chorar com o primeiro movimento da Sonata em si bemol maior, D. 960, então chorará com o segundo, o Andante sostenuto. Schubert sabia tudo sobre superação das dores naquela altura da vida.