(PQP garante: este é um dos melhores discos que ele já ouviu).
IM-PER-DÍ-VEL !!!
Tropeçava em latas de lixo quando encontrei a capa abaixo, e imediatamente me vi cheio de interrogações.
Joni Mitchell? Mingus? Que diabos. Ou, que diabos Mitchell está fazendo com Mingus? Por aí já podem notar minha desconfiança em relação à cantora. Mas eu prefiro ficar surdo a desistir antes de tentar. E lá fui, farejando, descobrir que Joni foi criticadíssima à época do disco, 1979; apontaram-na como decadente, esnobe por tentar dar verve ao pop, tentando pegar uma carona na então recente morte do underdog.
Mas quando se cava mais um pouco, se descobre que Mingus havia chamado Joni para ajudá-lo a musicar o Four Quartets de T. S. Eliot alguns meses antes, o baixista já imobilizado pela doença que o mataria em seguida. E que, fruto disso, cresceu a amizade – e mesmo Joni pôde sair de um bloqueio criativo que a consumia durante longo tempo. Donde o disco-homenagem, que ela não imaginava que seria póstumo. Tanto que Mingus só não chegou a escutar uma das faixas, a primeira, composição totalmente dela – ao invés das outras, versões de Mingus, com letras por Joni escritas, e abençoadas pelo mestre.
Não apenas na aura criada pelo duo; Joni, que não era boba, cercou-se de um pequeno grupo de pilares do jazz para gravar o álbum. Em Mingus, a base é a do Weather Report – confira a nominata logo abaixo. (Ame ou odeie o fusion, todos sabemos dos pedigrees.) Aqui só adianto que é um dos mais brilhantes, e por vezes experimental, trabalhos de Jaco Pastorius. Seu baixo é o condutor dessas faixas de um jazz relaxante, espaçado, cheio de respiros – e sim, sob bela e macia voz, bem colocada, discreta. Os detratores estavam errados. Ou com ciúmes. Ainda: um atrativo a mais são os “raps” que entremeiam as canções – vinhetas com gravações de Mingus em conversas, cenas cotidianas, até um scat em duo com Joni. (O que, inclusive, faz deste um disco curto, de apenas seis músicas.)
Joni Mitchell – Mingus (1979)
Joni Mitchell: guitar, vocals
Jaco Pastorius: bass
Wayne Shorter: soprano saxophone
Herbie Hancock: electric piano
Peter Erskine: drums
Don Alias: congas
Emil Richards: percussion
produzido por Joni Mitchell para a Asylum
01 Happy Birthday 1975 (Rap) 0’57
02 God Must Be A Boogie Man (Mitchell) 4’35
03 Funeral (Rap) 1’07
04 A Chair in the Sky (Mingus) 6’42
05 The Wolf That Lives in Lindsey (Mingus) 6’35
06 I’s a Muggin’ (Rap) 0’07
07 Sweet Sucker Dance (Mingus) 8’04
08 Coin in the Pocket (Rap) 0’11
09 The Dry Cleaner from Des Moines (Mingus) 3’21
10 Lucky (Rap) 0’04
11 Goodbye Pork Pie Hat (Mingus) 5’37
Boa audição!
Blue Dog
Vejam o novo cd de Herbie Hancock : River: The Joni Letters
http://jonimitchell.com/herbie.cfm
Sinceramente, comprei e não gostei , achei os arranjos convencionais e poucos ousados.
Four Quartets de Elliot é o creme do creme da poesia de todas os tempos, acho meio arriscado musicá-los,como queriam.
Eliot , com um ”ele” só , tem ainda o magnifico ”The Waste Land” também da mesma grandeza de Four Quartet.
Bluedog.
Tu não sabes, claro. Comprei este vinil de Joni Mitchell em 1980. Ouvi tanto, mas tanto, que um dia fiz um risco com a agulha no lado 2, bem quando Joni começava:
When Charlie speaks of Lester
you know something great has gone…
The sweetest swinging music man
Had a Porkie Pig hat on
A bright staaaaaaaaaaaaaaaaaaar
In a dark age.
Bom, não dava para ouvir isso com um tsc, tsc. Comprei outro lá por 87. Tenho dois. Mas nunca tive o CD. Sou absolutamente tarado por este disco. Canto todas as letras de cor e as gravações com a voz de Mingus também. Maravilha que tenhas encontrado este disco revirando latas de lixo. Bom e treinado faro o teu. Há tanta porcaria que só um nariz muito bom para caçar isto.
O outro disco, tenho em CD, mas e daí?
Já ouviu Hobo Ho hoje?
Gigantesco abraço, meu amigo.
Cesário,
nunca duvide de Mingus, nem mesmo nos Four Quartets. Haveria partes cantadas e partes recitadas por ele. Ele não era nada trouxa e tinha excelente gosto literário.
Abraço.
Não duvido, aliás adoro Mingus , mas não acho que Four Quartets se preste a ser musicado,sabe-se lá!
Como Bach disse a Frederico o Grande quando solicitado a realizar a fuga a Seis Vozes: ”Não sei se seu tema se presta a tanto”
Aqui a conotação obviamente é diferente, não sei se os poemas de ”Four” se prestam a serem musicados,não pela sua qualidade claro,mas pela justamente musicalidade.
Aí estão uma das grandes pérolas da poesia de todos os tempos,quem se dispuser a lê-los seria bom que se acompanhassem da tradução e explicações de Ivan Junqeira(a nova edição),uma das grandes traduções de todos os tempos.
http://www.ubriaco.com/fq.html
Amei isso: “No politeísmo do jazz, Miles exige cultos, Trane requer transes, Mingus demanda festins.” Esse blog é mesmo o máximo. Resolvi comentar aqui apesar de ter já este disco. Pois conheço bem o trabalho de Mitchell e sou fã de Mingus.
Agora, comentário sobre Joni: ela é uma das mais espetaculares vozes da música popular de língua inglesa, fora do jazz. Ela tem flertado com este gênero desde muito tempo, e o novo disco de Hancock é maravilhoso, ao contrário do que alguém escreveu acima… é de extremo bom gosto e sensibilidade, ousadia não é uma questão crucial aqui: Joni tem uma musicalidade pura, cujas letras altamente poéticas servem para materializar um encontro entre uma capacidade visionária feminina e uma precisão de cores na realidade que é impressioannte – aliás, ela é pintora também, e compõe como quem pinta – que se manifesta de forma super pungente na música dela, mesmo que ela use apenas seu violão ou cante à capella. E Hancock viu isso mais que todos os que tentaram versões de músicas super conhecidas dela. A forma como ele abstrai peças simples e diretas como “Both Sides Now” é mais do que um contraexemplo para a afiramação de que o disco River:The Joni Letters é pouco ousado…
Sobre o texto de Eliot… Wasteland pode ser avesso à musicalização, mas os Quartetos… são pura música, sonora e intelectual! Ave Mingus, salve Joni!
blue dog <3