Confesso que até ouvir este cd, nunca tinha ouvido falar de Francesco Durante, ou Emmanuel D’Astorga, o que realmente me chamou a atenção foi o Pergolesi, autor de meu “Stabat Mater” favorito, já postado aqui no blog, na magnífica versão de Emma Kirkby e Christopher Hogwood. Mas qual não foi a minha supresa ao ouvir a “Magnificat” de Francesco Durante, e o Stabat Mater” de D’Astorga: músicas absolutamente maravilhosas, com corais próximos ao que imagino como corais de anjos, e de uma profundidade religiosa que não admite brincadeiras. Então, para esta data natalina, nada como música religiosa de extrema beleza. Maiores informações sobre Franceso Durante, que foi aluno de Scarlatti, pode encontrada aqui. Aproveito esta postagem para desejar a todos os nossos leitores-ouvintes um Feliz Natal e um excelente 2009, e prometo que continuarei trabalhando para possibilitar a vocês o privilégio de terem acesso a música de excelente qualidade com suas melhores interpretações.
Francesco Durante: Magnificat / Emanuele D’Astorga: Stabat Mater / Giovanni Battista Pergolesi: Confitebor tibi Domine (Freiburg Baroque Orch / Hengelbrock)
01 – Francesco Durante – Magnificat – Magnificat anima mea (coro)
02 – Francesco Durante – Magnificat – Et misericordia (Solo Soprano)
03 – Francesco Durante – Magnificat – Fecit potentiam (Coro)
04 – Francesco Durante – Magnificat – Deposuit potentes (Coro)
05 – Francesco Durante – Magnificat – Suscepit Israel (Duetto Tenore-Basso)
06 – Francesco Durante – Magnificat – Sicut locutus est (Coro)
07 – Francesco Durante – Magnificat – Gloria Patri (Coro)
08 – Francesco Durante – Magnificat – Sicut erat in principio (Coro)
Ekkehard Abele, Ann Monoyios, Johannes Happel, Bernhard Landauer, Hermann Oswald – Solistas
Freiburg Baroque Orchestra
Thomas Hengelbrock- Director
09 – Emanuele D’Astorga – Stabat Mater – Stabat Mater (Coro)
10 – Emanuele D’Astorga – Stabat Mater – O quam tristis (Terzetto Soprano-Tenore-Basso)
11 – Emanuele D’Astorga – Stabat Mater – Quis est homo (Duetto Alto-Soprano, Duetto Tenore-Basso)
12 – Emanuele D’Astorga – Stabat Mater – Eja mater (Coro)
13 – Emanuele D’Astorga – Stabat Mater – Sancta Mater (Solo soprano)
14 – Emanuele D’Astorga – Stabat Mater – Fac me tecum (Duetto Alto-Tenore)
15 – Emanuele D’Astorga – Stabat Mater – Virgo virginum (Coro)
16 – Emanuele D’Astorga – Stabat Mater – Fac me plagis (Solo Basso)
17 – Emanuele D’Astorga – Stabat Mater – Christe cum sit (Coro)
Ekkehard Abele, Johannes Happel, Bernhard Landauer, Hermann Oswald, Hans-Jorg Mammel – Solistas
Freiburg Baroque Orchestra
Thomas Hengelbrock- Director
18 – Giovanni Battista Pergolesi – Confitebor tibi Domine – Confitebor (Coro)
19 – Giovanni Battista Pergolesi – Confitebor tibi Domine – Confessio (Solo Soprano)
20 – Giovanni Battista Pergolesi – Confitebor tibi Domine – Fidelia omnia (Solo Soprano)
21 – Giovanni Battista Pergolesi – Confitebor tibi Domine – Redemptionem misit (Coro)
22 – Giovanni Battista Pergolesi – Confitebor tibi Domine – Sanctum et terribile (Solo Alto)
23 – Giovanni Battista Pergolesi – Confitebor tibi Domine – Intellectus bonus (Solo Alto)
24 – Giovanni Battista Pergolesi – Confitebor tibi Domine – Gloria Patri (Coro)
25 – Giovanni Battista Pergolesi – Confitebor tibi Domine – Sicut erat (Coro)
Ekkehard Abele,Johannes Happel, Bernhard Landauer, Stephanie Moller, Hermann Oswald, Hans-Jorg Mammel – Solistas
Freiburg Baroque Orchestra
Thomas Hengelbrock- Director
Homenagem aos 300 anos da estreia da Paixão segundo João de Johann Sebastian Bach
7/4/1724 – 7/4/2024
Nesta obra de Fra Angelico João está representado
O dia 7 de abril de 1724 foi a sexta-feira da Semana Santa daquele ano e as pessoas que estiveram na Igreja de São Nicolau voltaram para casa com a sensação de terem presenciado algo muito especial. Durante o serviço religioso a música, composta pelo novo Cantor da Igreja de Santo Tomás, fora especialmente maravilhosa.
Bach havia sido nomeado recentemente para o cargo, substituindo o grande músico Johann Kuhnau. O cargo oferecido pela Igreja Protestante era muito prestigiado, mas demandava muito trabalho. As tarefas incluíam tocar órgão, ensinar Latim e Música na escola da igreja, compor a música para as igrejas de Santo Tomás e de São Nicolau, reger música e treinar os músicos de duas outras igrejas. Bach foi o terceiro candidato a ser escolhido para o cargo e possivelmente relutou em aceitá-lo, mas em casa havia muitas bocas para serem alimentadas.
Quando Bach se pôs a escrever sua Johannes Passion, conhecia alguns modelos antigos e outros contemporâneos. Os oratórios da Paixão apresentam a narrativa da morte de Jesus intercalada por árias refletivas, coros e corais. Seu antecessor Kuhnau teve uma obra desse tipo apresentada em 1721 e havia um libreto escrito por Barthold Heinrich Brockes (1680-1747) com o título Jesus torturado e morto pelos pecados deste mundo que havia sido musicado por Handel e por Telemann. Havia também uma Paixão segundo João, com libreto de J. G. Postel, que fora musicada pelo jovem Handel aos 19 anos.
John Butt
Bach estava com 39 anos, no auge de sua profissão e certamente queria mostrar aos conselheiros e aos fiéis que fazia jus ao cargo. Além disso, esse gênero tinha um apelo especial sobre a comunidade pelo fato de que a ópera de Leipzig havia colapsado um pouco antes da chegada de Bach. É verdade que o oratório é bem diferente de uma ópera, especialmente esse que já vem com spoiler, mas a expectativa devia ser grande, o que deve ter dado a João Sebastião motivação mais que suficiente para tratar a empreitada com grande cuidado e originalidade.
A versão ouvida naquela ocasião, há 300 anos atrás, foi modificada e reapresentada em 1725, depois mais uma vez em 1732. A versão que conhecemos é uma revisão que Bach fez em 1749, mas que não chegou a ser apresentada por Bach, que morreria pouco depois. Veja mais informações aqui e aqui.
O que se pode esperar da obra? Veja a tradução de um texto que poder ser encontrado na íntegra aqui, feita com a ajuda do Chat PQP: Na verdade, a Paixão de João contém vários ousados traços imaginativos aos quais Bach não voltaria na Paixão segundo São Mateus. O belo e plangente refrão de abertura, um exórdio dirigido a Jesus, é surpreendentemente dissonante e dá o tom para uma composição ousada de uma aparente espontaneidade que desmente sua cuidadosa construção. A parte 2 também começa com uma passagem particularmente memorável, embora por razões muito diferentes: é aqui que o coro realmente mostra seus dentes. Retratando a multidão que clamava pela execução de Jesus, o coro recebe uma música particularmente cruel e rancorosa com escalas cromáticas ascendentes e um turbilhão de cordas. Mesmo momentos suaves, como a ária soprano ‘Ich folge dir gleichfalls’, são frequentemente assombrados por seções cromáticas sutis e escuras.
As últimas fases da obra têm um notável sentido de impulso, sintetizado pela ária de baixo ‘Eilt, ihr angefocht’nen Seelen’ que é pontuada pelo coro que pergunta urgentemente ‘Wohin?’. Após a morte de Jesus, há uma seção reflexiva mais prolongada do que na Paixão de São Mateus, incluindo o terno “Ruht wohl”, uma peça de encerramento para coro (antes de um coral final) que forma um paralelo estrutural com a abertura da obra. Talvez como o próprio Evangelho de João, o que falta à partitura de Bach na lógica convencional e na transparência narrativa, compensa com uma beleza sobrenatural, convicção e um forte sentido poético.
John e sua turma na entrada do PQP Bach Theater em Edinburgh
A gravação escolhida para essa postagem especial é liderada por John Butt que já apareceu algumas vezes no blog e é um excelente músico. (John Butt é professor de música na Universidade de Glasgow, diretor musical da Dunedin Consort e artista principal da OAE. Sua carreira começou com sua nomeação como acadêmico de órgão no King’s College Cambridge, e isso levou a vários cargos acadêmicos e de desempenho (incluindo Organista da Universidade da Califórnia, Berkeley, 1989-97). Seu trabalho, como músico e estudioso, gravita em torno da música dos séculos 17 e 18, mas ele também está preocupado com as implicações do passado em nossa cultura atual).
O que ela tem diferente de outras recentes gravações é que a Paixão é apresentada em um contexto litúrgico, como poderá ser observado nos números extra de música ao início e ao fim dos arquivos. Essas partes assim como os detalhes das faixas da gravação estão nos arquivos no formato pdf.
John Butt treinando o coro dos aspirantes a contribuintes do blog do PQP Bach…
The recording was named a Gramophone Award Finalist, ‘Recording of the Month’ by three separate publications and topped the UK Specialist Chart upon its release in 2013.
Aproveite!
René Denon
Não deixe de visitar essa outra postagem com algumas informações sobre a obra e uma gravação também primorosa…
Vamos às explicações. Trevor Pinnock fez uma bela gravação das Partitas para o selo Archiv na década de 1980 — é esta que ora vos posto –, mas há uma gravação mais recente que é uma melhoria significativa tanto em termos do som gravado, quanto no que diz respeito à interpretação, que subiu vários degraus. Trata-se da gravação de Hänssler. O PQPBach tem ambas. Pinnock é sempre bom, mas ele parece estar no topo na outra versão. Os trinados e ornamentos são relaxados e uniformes, seu toque legato é incomparável. Os movimentos de dança são perfeitos, sem serem apressados ou frenéticos. Tudo parece mais simples sem ser superficial. Mas esta versão aqui é também sensacional, é o trampolim para a outra. E é muito bom ver um grande artista evoluir. A competição é obviamente acirrada neste repertório e não farei nenhuma comparação com versões para piano. Huguette Dreyfus é uma concorrente, embora eu ache Pinnock mais flexível, mais interessante musicalmente e com melhor qualidade de som. Masaaki Suzuki é bom se você quiser tempos mais relaxados e um pouco mais de ar entre você e o instrumento. Aos meus ouvidos, Suzuki é menos “parecido com Bach” do que Pinnock. É elegante, mas de alguma forma um pouco distante e enigmático. Scott Ross é péssimo. Excetuando Ross, eu viveria feliz com qualquer versão para cravo, mas estas duas de Pinnock moram no meu ventrículo esquerdo, que é onde o coração bate mais forte.
J. S. Bach (1685-1750): 6 Partitas, BWV 825-830 (Pinnock – Archiv)
Partita No. 1 In B Flat Major, BWV 825 = B-dur = En Si Bémol Majeur
1-1 1. Praeludium 1:57
1-2 2. Allemande 4:12
1-3 3. Corrente 2:50
1-4 4. Sarabande 4:09
1-5 5. Menuet I/II 2:35
1-6 6. Gigue 2:27
Partita No. 2 In C Minor, BWV 826 = C-moll = En Ut Mineur
1-7 1. Sinfonia. Grave Adagio 4:34
1-8 2. Allemande 5:30
1-9 3. Courante 2:00
1-10 4. Sarabande 2:48
1-11 5. Rondeaux 1:27
1-12 6. Capriccio 3:34
Estreada em 1948, a Sonata para piano de Dutilleux é uma das grandes obras do repertório pianístico do século XX. É claro que devemos desconfiar desse tipo de afirmação categórica, normalmente acompanhada de provas por A+B que não costumam provar grandes coisas. Mas ao menos é o que dizem meus ouvidos: Dutilleux transita com grande liberdade dentro das três formas escolhidas para os três movimentos. É verdade que Liszt argumentou: “vinho novo pede garrafas novas” e nesse aspecto foi seguido por Wagner, Schoenberg, Debussy, Messiaen e tantos outros. Mas Dutilleux já chega bem depois e faz parte daqueles que voltaram às formas antigas para, a partir delas, produzir novidades. No piano de meados do século XX, isso rendeu obras como as Sonatas para Piano de Prokofiev e os Prelúdios e Fugas de Shostakovich, além dessa Sonata de peso do francês Dutilleux.
O primeiro movimento é um legítimo Allegro de sonata, o segundo um lento Lied com explorações harmônicas tipicamente francesas – Gary Higginson escreveu que esta é uma sonata que Debussy poderia ter escrito – e o movimento final é um Chorale (no sentido das obras de Bach para órgão) com variações. Uma curiosidade: os títulos dos movimentos variam entre italiano, alemão e francês, o que poderia indicar uma inclinação cosmopolita de Dutilleux, lembrando que a sonata veio logo após o fim da 2ª Guerra.
No disco gravado pelo também francês Jonas Vitaud, a sonata – que ele estudou, quando jovem, com o próprio compositor – eclipsa as outras obras. Ainda assim, este é um bom álbum para quem quer ouvir os Três Prelúdios (1973–1988) de Dutilleux e as Nuvens cinzentas (Nuages Gris), obra madura de Liszt na qual ele flerta com a música atonal. Também a primeira obra do disco, “Angelus! Prece aos anjos da guarda”, tem uma grandiosa interpretação. Mas na Mephisto Valse e na Valse Oubliée de Liszt, ficou faltando para Vitaud um certo espírito faustiano que habita essas obras: o velho tema do pacto com o coisa-ruim. Para esse Liszt de uma certa malícia, melhor ouvir Horowitz, Novaes, Foldes ou Kissin. Aluno de Brigitte Engerer, Jonas Vitaud é mais polido, mais preocupado com os belos coloridos e ornamentos. No Dutilleux isso funciona perfeitamente.
Liszt, o prolífico, parece o oposto de Dutilleux, compositor de catálogo reduzido, homem discreto e reservado. Mas eu encontro pontos em comum mais profundos. Ambos tiveram uma longa carreira, e seu estilo mudou consideravalmente com o tempo. São músicos da síntese, que assimilaram diversas correntes na sua própria linguagem. Em vida, mostraram-se curiosos e altruistas com seus pares e com as novas gerações. Quanto a Dutilleux, tive a sorte de conhecê-lo em 2004 no festival de Cordes-sur-Ciel, e estudar com ele várias peças, incluindo suas Figuras de ressonância para dois pianos, com Bertrand Chamayou. (Jonas Vitaud, no encarte do álbum)
01 Liszt: Angelus ! Prière aux anges gardiens (extrait des Années de Pèlerinage III)
02 Dutilleux: Prélude n°1 : D’ombre et de silence
03 Liszt: Klavierstück, S192 n°3
04 Dutilleux: Prélude n°2 : Sur un même accord
05 Liszt: Valse oubliée n°1
06 Liszt: Nuages gris
07 Dutilleux: Prélude n°3 : Le jeu des contraires
08 Liszt: Méphisto-Valse n°1
09-11 Dutilleux: Sonate opus 1 (I. Allegro con moto, II. Lied, III. Choral et variations)
Jonas Vitaud, piano
Recorded: Abbaye-école de Sorrèze, France, oct. 2014
Dutilleux on whether chance procedures have a place in music: ‘A very small one, yes – homeopathic maybe!’ (Citado na BBC Music Magazine, December 2022)
É domingo e há uma clara ameaça de tempestade. São as águas de março…
Ultimamente tenho ouvido música no meu estúdio onde passo a maior parte de meu tempo produtivo. O computador está conectado a um DAC (digital audio converter) que por sua vez está conectado ao amplificador, um receiver Yamaha, provavelmente fabricado na China. O Yamaha já passou por uma intervenção eletrônica, possivelmente resultado de oxidação (zinabre para todos os lados), morar perto da praia tem seus custos. Ele está ligado a um par de caixas de som Bose, do tipo shelf, e mais nada, no subwoofer.
Isso é tudo que preciso para ouvir esse maravilhoso disco, Schubert, Schwanengesang.
Eu tenho uma certa birra com esse título, o Canto do Cisne, faça-me o favor. A despeito de minhas restrições pessoais, o título foi aposto numa coleção de canções, reunidas para a publicação pelo editor Tobias Haslinger, em 1829, depois da morte de Schubert. Claro que ele tinha em vista o sucesso dos dois ciclos de canções, Die schöne Müllerin (1824) e Winterreise (1828), publicados anteriormente. A diferença está no fato que os dois primeiros ciclos são sobre poemas do mesmo poeta, Wilhelm Müller, escritos como um ciclo de poemas. No caso de Schwanengesang temos 14 canções escritas no fim da vida de Schubert sobre poemas de três diferentes poetas, não tratam de um único tema, nem tem uma sequência narrativa, como os ciclos anteriores. Apesar disso, o conjunto funciona maravilhosamente como um programa de um recital, no qual a densidade e a profundidade de algumas canções, especialmente aquelas com letra de Heinrich Heine, faz contraponto com as canções mais leves e brilhantes, algumas com letras de Ludwig Rellstab e aquela de Johann Gabriel Seidl, que como poeta não parece ter a mesma dimensão que Heine. Aliás, Heine (1797 – 1856) foi contemporâneo de Schubert (1797 – 1828), sendo que este teve vida mais breve. Os poemas de Heine também inspiraram outras compositores de Lied, especialmente Schumann, mas isso é outra postagem.
Os sete poemas de Rellstab, que se tornaram as sete primeiras canções do Schwanengesang, foram enviadas para serem musicadas por Beethoven, mas acabaram nas mãos de Schubert, encaminhadas pelo assistente-secretário-biógrafo-faz-tudo Anton Schindler. Não consigo deixar de pensar nas palavras ‘lista de Schindler’.
As gravações do ciclo são inúmeras, parece haver mais cantores de Lieder do que apreciadores. Na era dos CDs passou-se a acrescentar mais algumas canções ao disco, para engordar o tempo, mas antes disso, os LPs costumavam trazer apenas as tais 14 canções, assim como neste disco, pós CDs. Eu ouvi centenas de vezes um LP da gravadora de selo amarelo com o barítono Hermann Prey, que foi para Dietrich Fischer-Dieskau o equivalente ao que Roger Moore foi para Sean Connery, se é que você me permite essa liberdade… Desde então, não me canso de ouvir essas canções.
Mas chega de lero, vamos aos disco, que é maravilhoso. Não se deixe irritar pela capa, compare com aquela do disco do HP e verá como o departamento de arte da DG tem evoluído. O que conta é o conteúdo do pacote.
A dupla dando palhinha para a turma do PQP Bach logo depois da entrevista para a postagem…
A voz do Andrè Schuen é espetacular, muito bonita mesmo e ele está em excelente sintonia com o pianista que o acompanha já há um bom tempo, Daniel Heide.
Segue trechos da crítica que pode ser lida na íntegra aqui , na tradução feita com a ajuda do Chat PQP: […] O barítono ítalo-tirolês Andrè Schuen é uma figura cada vez mais destacada no mundo do Lieder.Schwanengesang não desperta sua forte imaginação interpretativa e não deveria.As tentativas de impor uma linha direta a este ciclo têm sido desastrosamente redutoras.Em vez disso, aprecia-se a voz de barítono fresca e lindamente contornada de Schuen, plena de controle de respiração que lhe permite navegar em longas linhas vocais com um senso iluminador de direção musical de longo prazo, além de uma articulação reveladora do texto.[…] Da mesma forma, o pianista Daniel Heide leva em consideração a imagem completa de qualquer canção […]
Trecho do site da DG: Schubert’s enigmatic final collection of songs, Schwanengesang, is the subject of baritone Andrè Schuen and his longstanding accompanist Daniel Heide’s second release for DG. Baritone Andrè Schuen calls Schwanengesang “my greatest love among the Schubert lieder. Especially the Heine settings; they move me the most!” His admiration for the cycle dates back to a time before he had even become a professional singer: “It’s one of the first lied compositions I got to know. I remember a recording with Dietrich Fischer-Dieskau that I played over and over again.”
Escolha seu 007 preferido…
Da série ‘fortune cookie’: As comparações são odiosas!
Esta não é a melhor gravação de Dido e Aeneas que está em nosso blog. Há outras bem melhores, quase todas. Mas Harnoncourt é sempre Harnoncourt e merece nosso respeito. Trata-se de uma obra-prima composta por Purcell. É considerada a primeira ópera nacional inglesa, tendo sido a única escrita por Purcell (1659-1695), um dos maiores compositores britânicos de todos os tempos e mestre do barroco. Ainda que tenha vivido pouco, nos deixou um número expressivo de odes para coro e orquestra, cantatas, canções, hinos, serviços, sonatas de câmara e obras para teclado, além de mais de quarenta peças para música de cena (PQP Bach tem TODAS, VALE A PENA CONHECER). Henry Purcell alcançou em vida relativo prestígio.
A ópera foi escrita em 1689, para o internato feminino Josias Priest, de Chelsea, Londres, a partir de um libretto de Nahum Tate (1652-1715), poeta e dramaturgo inglês. O enredo segue a história de amor entre a lendária rainha de Cartago, Dido, e o refugiado troiano Enéas, narrada no livro IV da Eneida de Virgílio. Quando o mítico herói e sua tropa naufragam em Cartago, ele e a rainha se enamoram. Mas, por inveja, as bruxas conspiram contra os amantes e convencem Enéas a partir, pois seu destino, traçado pelos deuses, é o de fundar uma nova Tróia, a cidade de Roma. Enéas, mesmo blasfemando contra a inclemência dos deuses, aceita seguir viagem e comunica a Dido que partirá naquela manhã. A rainha, esmagada pela dor, imola-se, apesar de Enéas, comovido e mudando o desígnio, afirmar preferir enfrentar a cólera dos deuses a abandoná-la.
A partitura é uma obra-prima de concisão e uma modelo para toda ópera de bolso: a orquestra inclui cordas e contínuo, há uns poucos papéis principais e a duração dos seus três atos não ultrapassa uma hora. Nela, Purcell incorporou tanto os desenvolvimentos da escola inglesa do século XVII, como influências musicais continentais. Combina, por exemplo, danças e coros, elementos próprios da tradição francesa, com árias que seguem em geral os modelos das óperas barrocas italianas. Os recitativos, por seu turno, a cavaleiro das tradições francesas e italianas, nada têm de artificial – são livres, melódicos e plasticamente moldados ao texto.
A abertura é francesa: um adágio solene inicial dá lugar a uma seção mais animada que introduz a cena. Já os coros homofónicos construídos com base em ritmos de dança, recordam os de Lully, assim como o minueto do coro Fear não danger to ensue (“Não temas os perigos que possam vir”). No entanto, cabe salientar a melodia tipicamente inglesa de Pursue thy conquest, Love (“Persegue tua conquista, Amor”) e a do coro Come away, fellow sailors (“Vinde, camaradas de marinheiros”), no início do terceiro ato. Esta alegre e singela canção marinheira carrega evidente matiz popular.
Algumas árias da ópera foram construídas sobre um baixo ostinato. A última delas, e a mais importante, é o famoso lamento de Dido: When I am laid in earth (“Quando eu descer à terra”), uma das mais tocantes de todo repertório lírico. Nela, além do ostinato, os intervalos descendentes e as harmonias com retardos intensificam o infortúnio da rainha.
O coro final, With drooping wings (“Com asas caídas”) parece inspirado no de Vénus and Adonis, de Blow – de quem Purcell foi, aliás, discípulo. Possui forte caráter elegíaco, sugerido pelo uso de escalas menores descendentes e pelas impressionantes pausas após a expressão “never part” (“nunca parta”).
Henry Purcell (1659-1695): Dido And Aeneas (Concentus Musicus Wien, Harnoncourt)
Dido And Aeneas, Opera, Z. 626
1.1 1. Overture 2:53
Act I
1.2 2. Song (Belinda) & Chorus “Shake The Cloud From Off Your Brow” 1:06
2.1 3. Song (Dido) “Ah! Belinda” 4:08
2.2 4. Recitative & Song (Belinda & Dido) “Grief Increases By Concealing” 0:32
2.3 5. Chorus “When Monarchs Unite” 0:14
2.4 6. Recitative (Dido & Belinda) “Whence Could So Much Virtue Spring?” 2:13
2.5 7. Duet (Belinda & Second Woman) & Chorus “Fear No Danger” 1:36
3.1 8. Recitative (Belinda, Aeneas & Dido) “See, Your Royal Guest Appears” 0:50
3.2 9. Chorus “Cupid Only Throws The Dart” 0:35
3.3 10. Recitative (Aeneas) “If Not For Mine, For Empire’s Sake” 0:23
3.4 11. Song (Belinda) “Pursue Thy Conquest, Love” 0:51
3.5 12. Chorus “To The Hills And The Vales” 1:20
4 13. The Triumphing Dance 1:21
Act II Scene 1
5.1 14. Recitative (Sorceress) “Wayward Sisters” 2:31
5.2 15. Chorus “Harm’s Our Delight” 0:14
5.3.1 16. Recitative (Sorceress) “The Queen Of Carthage”. 0:42
5.3.2 Chorus “Ho Ho Ho” 0:10
5.4.1 17. Recitative (Witches & Sorcerers) “Ruin’d Ere The Set Of Sun?” 1:20
5.4.2 Chorus “Ho Ho Ho” 0:10
5.5 18. Duet (Witches) “But Ere We This Perform” 1:10
6.1 19.Chorus “In Our Deep Vaulted Cell” 1:07
6.2 20. Echo Dances Of Furies 1:01
Act II Scene 2
7.1 21. Ritornelle 0:57
7.2 22. Song (Belinda) & Chorus “Thanks To These Lonesome Vales” 1:15
8.1 23. Song (Second Woman) “Oft She Visits This Lone Mountain” 1:38
8.2 24. Recitative (Aeneas & Dido) “Behold, Upon My Bending Spear” 0:35
8.3 25. Song (Belinda) & Chorus “Haste, Haste To Town” 0:43
9 26. Recitative (Spirit & Aeneas) “Stay, Prince” 3:00
Act III Scene 1
10.1 27. Song (Sailor) & Chorus “Come Away, Fellow Sailors” 1:32
10.2 28. The Sailors’ Dance 0:51
11.1 29. Recitative & Duets (Sorceress & Witches) “See The Flags And Streamers Curling” 1:06
11.2 30. Song (Sorceress) “Our Next Motion” 0:41
11.3 31. Chorus “Destruction’s Our Delight” 0:34
11.4 32. The Witches’ Dance 1:13
Act III Scene 2
12.1 33. Recitative (Dido, Belinda & Aeneas) “Your Counsel All Is Urg’d In Vain” 4:52
12.2 34. Chorus “Great Minds Against Themselves Conspire” 1:04
13 35. Recitative (Dido) “Thy Hand, Belinda” / Song (Dido) “When I Am Laid In Earth” 4:24
14 36. Chorus “With Droppings Wings Ye Cupids Come” 2:47
Chorus – Arnold-Schönberg-Chor*
Chorus Master – Erwin G. Ortner*
Composed By – Henry Purcell
Conductor – Nikolaus Harnoncourt
Libretto By – Nahum Tate
Orchestra – Concentus Musicus Wien
Vocals [Aeneas, A Trojan Prince] – Anton Scharinger
Vocals [Belinda, Dido’s Sister] – Rachel Yakar
Vocals [Dido, Or Elissa, Queen Of Carthage] – Ann Murray
Vocals [Sailor] – Josef Köstlinger
Vocals [Second Witch] – Helrun Gardow
Vocals [Second Woman • First Witch] – Elisabeth Von Magnus-Harnoncourt*
Vocals [Sorceress] – Trudeliese Schmidt
Vocals [Spirit] – Paul Esswood
Duas gravações muito convincentes de Mahler: uma de 1981 com a Filarmônica Checa e outra de 2008 com a Sinfônica de Chicago. A mais antiga faz parte de uma integral gravada por Vaclav Neumann e é bem conhecida pelos aficcionados por Mahler. Já a mais recente é menos conhecida do que o ciclo anterior de Mahler que Haitink havia gravado em Amsterdam, mas eu tive que postá-la para agradar o nosso chefe PQP. Estou brincando, é claro: é um Mahler de peso o da Sinfônica de Chicago, pendendo um pouco mais para a seriedade do que para a leveza, como nesta outra gravação de Haitink com a mesma orquestra. É grandioso quando a partitura pede grandiosidade, mas também os cantos de pássaros nas sopros são muito bem executados e gravados.
Mahler, assim como Kafka, era um tcheco que falava alemão, tendo se mudado para Viena com cerca de 15 anos de idade. Ele regeu muito em Praga, tendo inclusive estreado sua 7ª sinfonia naquela cidade. Desde então, da mesma forma que em Amsterdam (cidade onde Haitink se formou), também em Praga havia uma longa tradição de maestros especialistas em Mahler, com certos detalhes de interpretação que se estabeleceram ao longo das décadas como marcas dos tchecos ao tocarem esse compositor, e isso aparece muito bem nesta gravação da 3ª Sinfonia.
O ciclo de sinfonias de Mahler parece ser mais variado do que o de Bruckner ou o de Brahms: em conteúdo, dá pra debater, mas em termos de forma não resta dúvida, pois há sinfonias bem mais longas (como a 3ª), outras mais curtas (como a 1ª) e algumas têm cantores solistas e/ou coro (2ª, 3ª, 4ª e 8ª). Em relação ao conteúdo elas também variam bastante: entre os diferentes humores de Mahler, acho que o que mais me agrada é o momento pastoral, cheio de pássaros cantando. Esses cantos de pássaros e outros momentos campestres aparecem integrados nos movimentos, aparecendo no meio de outros trechos bem diferentes como valsas e outras danças. Nisso, o Mahler pastoral se diferencia de outros autores que colocam uma cerca bem delimitada nesses momentos: Beethoven em sua 6ª sinfonia, Berlioz na “cena no campo”, movimento mais longo da sua Sinfonia Fantástica, Messiaen e Villa-Lobos em certas obras orquestrais que são, inteiras, dedicadas a cenas na floresta ou nas montanhas.
Essa tendência de Mahler a misturar tudo – aqui um pássaro, ali uma dança, depois uma caótica cena urbana, uma ordenada e pesada marcha militar e de repente mais pássaros! – torna-o estranhamente contemporâneo aos nosso tempos acelerados e caóticos, quando o controle remoto e as redes sociais fazem com que essa colagem de experiências diversas seja mais ou menos o pão nosso de cada dia.
Apesar da mistura e de, portanto, as cenas pastorais aparecerem em quase todas as suas sinfonias (ou todas? seria preciso checar), tenho a impressão de que a 1ª e a 3ª são aquelas com mais animais passeando e cantando. Não é, repito, uma natureza selvagem e pura, pelo contrário, os animais convivem lado a lado com os humanos. Mahler, como um atento leitor de Nietzsche, não parecia acreditar nessa natureza tranquila e pura que aparece em Beethoven ou na Sinfonia Primavera de Schumann. Uma mentalidade fundamentalmente pessimista, mas ao mesmo tempo interessada em todas as belezas que encontra no caminho, talvez se cristalize mais exlpicitamente na 9ª de Mahler, nos dois movimentos centrais, um tranquilo e dançante Ländler (mas já com seus momentos caóticos) seguido de um Rondo Burlesco que é o caos completo e me lembra certos momentos orquestrais de Bartók. Mas nas Sinfonias nº 1 e 3 isso já aparece de modo menos maduro: na 3ª, sobretudo, após três primeiros movimentos com todos os pássaros possíveis, chega o ser humano cantando um texto enigmático do Zaratustra de Nietzsche. O timbre escolhido por Mahler é o de uma mulher com voz grave, e nesta gravação temos a alemã Christa Ludwig (1928 – 2021), uma das mais célebres mezzo-sopranos do século XX.
Gustav Mahler: Sinfonia nº 3 (1902)
Czech Philharmonic Orchestra (Česká Filharmonie / Orquestra Filarmônica Checa)
Václav Neumann (1920-1995), maestro
Christa Ludwig, contralto – 4º movimento
Kühnův Dětský Sbor, Pražský Filharmonický Sbor (Coro Filarmônico de Praga, Coro Infantil Kühn) – 5º movimento
Recording: House of Artists, Praga, 16-19 December, 1981 Neumann/CPO – BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE – mp3 320 kbps
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Gustav Mahler: Sinfonia nº 1, “Titã” (1889)
Chicago Symphony Orchestra
Bernard Haitink (1929-2021), maestro
Recorded live in Orchestra Hall at Symphony Center, Chicago, USA, May 1, 2 and 3, 2008 Haitink/CSO – BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE – mp3 320 kbps
Provavelmente, a Filarmônica de Munique deu mais apresentações da música de Anton Bruckner do que qualquer outra orquestra. Há um grande número de gravações de Bruckner conduzidas pelos maestros lendários que trabalharam na Filarmônica de Munique, incluindo Celibidache, Thielemann, Kempe e Wand. Tendo começado em setembro de 2017, no Mosteiro de St. Florian — um cenário com significado histórico único neste contexto –, a Filarmônica de Munique e Valery Gergiev apresentaram um ciclo espetacular das sinfonias de Anton Bruckner. A extraordinária e belíssima Quinta Sinfonia de Bruckner tem muitas gravações impressionantes. Penso em particular na gravação de Eugen Jochum, que regeu uma performance fantástica (1964) na Abadia de Ottobeuren. E depois um concerto de Chailly em 1991. E, mais recentemente, o último concerto que Nikolaus Harnoncourt deu com a Concertgebouw Orchestra em 2013. Harnoncourt e Bruckner simplesmente “se entenderam” fantasticamente. Mas certamente há apresentações ainda melhores, basta pensar em Celibidache, Karajan e Wand. Aqui, Gergiev nos dá de 80 minutos de pura emoção, sem nenhum tédio. Que profundidade, que brilho, que riqueza de detalhes, sem nenhuma superficialidade! Ele é intenso e envolvente a cada segundo. Este é realmente um acréscimo à discografia de Bruckner e merece um lugar junto aos maiores campeões citados. E, céus, que música!
Anton Bruckner (1824-1896): Sinfonia Nº 5 (Gergiev / Münchner)
ANTON BRUCKNER: Symphony No. 5, WAB 105
1. Introduction: Adagio – Allegro
2. Adagio: Sehr langsam
3. Scherzo: Molto vivace (Schnell) – Trio: Im gleichen Tempo
4. Finale: Adagio – Allegro moderato
RECORDING DATE: 23 / 24 September 2019
LOCATION: Stiftsbasilika St. Florian, Austria
Eis um CD para ouvirmos sem nos cansar, mesmo que seja em um sábado de manhã, envolvido na faxina semanal da casa, tal a qualidade dos músicos envolvidos, e claro, a qualidade das obras interpretadas. Temos aqui um grupo de músicos especializados nesse repertório, liderados pela excepcional flautista Dorothée Oberlinger. Em outras palavras, gente que vive e respira o barroco vinte e quatro horas por dia, sem excessos ou virtuosismos extremos, e que nos oferece um Vivaldi muito atual, mesmo seguindo a linha do historicamente interpretado. Oberlinger se utiliza de instrumentos construídos baseados em modelos dos séculos XVII e XVIII.
Sugiro a leitura do livreto que segue em anexo ao arquivo, que traz uma contextualização histórica das obras gravadas e demais informações técnicas.
Antonio Vivaldi – Concerto per Flauto e Flautino – Dorothée Oberlinger, Sonatori de La Gioiosa Marca
Concerto in re maggiore «La Pastorella» rv 95 per flauto, due violini, violoncello e b.c. (c/e/g)
1 Allegro
2 Largo
3 Allegro
Concerto in sol maggiore rv 101 per flauto, due violini, violoncello e b.c. (b/c/f)
4 […]
5 Largo
6 Allegro
Concerto in la minore rv 108 per flauto, due violini e b.c. (a/c/f)
7 Allegro
8 Largo
Concerto in do maggiore rv 444 per flautino, due violini, viola e b.c. (a/b/c/f)
10 Allegro non molto
11 Largo
12 Allegro molto
Concerto in sol maggiore rv 443 per flautino, due violini, viola e b.c. (a/b/c/f)
13 […]
14 Largo
15 Allegro molto
Concerti per flauto e flautino, archi e basso continuo A 334
16 Allegro ma non molto tutti gl’istromenti sordini
17 Cantabile*
18 Largo e cantabile
19 Allegro
Concerto in si bemolle maggiore «Conca» rv 163 per due violini, viola e b.c. (a/b/c/f)
20 […] / Allegro molto
21 Andante**
22 Allegro
DOROTHEE OBERLINGER flauti dritti
SONATORI DE LA GIOIOSA MARCA
“Les Vêpres siciliennes”, “grand opéra” de Giuseppe Verdi – Paris, 1855.
Após célebre trilogia, formada por “Rigoletto”, “Il Trovatore” e “La Traviata”, Verdi aceitava especial convite, então, do “Opéra”, de Paris, integrando-se à “Grande Exposição”, de 1855. E “Rei Lear”, de Schakespeare, voltava a interessá-lo. Para isto, buscava libretista, após morte do amigo e poeta, Salvatore Cammarano…
A ópera francesa possuía requisitos próprios, tais como cinco atos, tradicional ballet, muito luxo e efeitos cênicos. Em geral, Verdi adaptava-se, desde que amarrado o efeito dramático, tal como fizera em “Jerusalém”, para o teatro francês…
Tais requisitos, no entanto, tiravam-lhe liberdade que oportunizou sucessos anteriores… Nesta ocasião, contava com escritor francês Eugène Scribe, espécie de produtor industrial de libretos, que desengavetou tema destinado, inicialmente, à Gaetano Donizetti e que viria tornar-se “Les Vêpres siciliennes”…
“Maria Callas (Elena) e Boris Christoff (Procida), em “I Vespri Siciliani”, Firenzi – Itália, 1951.
20ª ópera, possui particular densidade e riqueza musical. Sem espetacular fluência das anteriores, pede concentração… E Verdi necessitava discurtir libreto, dado as convenções e o tema, massacre imposto aos franceses, pelos sicilianos, no séc. XIII, que entendia inadequado ao evento… Libreto também mesclava personagens históricos, Guy du Montfort e Giovanni da Procida, com outros, ficcionais, Hélène e Henri, levando à flagrante confusão dos acontecimentos – “ou não seria ópera, diriam alguns”…
Pela falta de diálogo, Verdi queixava-se de Scribe. E quando ocorre inusitada fuga de cena, da jovem e excêntrica “prima donna”, tentou, inutilmente, romper contrato com “Opéra”… Imensa e complexa, “Les Vêpres siciliennes” sensibilizou franceses, pela dramaticidade e comovente melodismo, dança e folclore, belos ensembles e marcante abertura sinfônica, ao lado de “Nabucco” e “La forza del Destino”…
Aspectos iniciais
De volta à Sant’Ágata, após primeiras récitas de “La Traviata” – Veneza, 03/1853, Verdi cogitava nova ópera. E Césare de Sanctis, amigo e empresário, que colaborou na estreia de “Il Trovatore”, após morte do poeta Salvatore Cammarano, sugeriu Domenico Bolognesi, para libreto de “Fausto”, de Goethe. Verdi adorava a obra, mas disse: “não gostaria de colocá-la em ópera. Estudei, mas não a vejo musicalmente, pelo menos, do modo como penso a música”…
Giuseppe Verdi, músico e ativista do “Risorgimento” – por Achille Beltrame, 1899.
Se, de um lado, desinteressava-se por sugestões alheias, voltava-se, novamente, para “Rei Lear”, de Shakespeare… E recebeu correspondência de Antonio Somma, prestigiado dramaturgo, que propôs trabalharem juntos. Autor de teatro, Somma escreveu inúmeras tragédias de sucesso e fora diretor do “Grande Teatro”, de Trieste, onde Verdi estreou “Il Corsaro”…
Verdi respondeu discorrendo sobre sua evolução e amadurecimento. Também, como reagia a diferentes assuntos. Na atualidade, “não musicaria temas como ‘Nabucco’ ou ‘I due Foscari’, apesar de dramáticos, pois lhes faltavam variedade; e há dez anos, não teria me arriscado em ‘Rigoletto’…” E terminou a carta sugerindo à Somma leitura de “Rei Lear”, iniciando intensa correspondência…
Outono de 1853, Verdi partia para Paris, com Giuseppina Strepponi, levando dois atos do libreto de Somma, que nunca escrevera para ópera. Verdi planejava “Rei Lear” em três ou, no máximo, quatro atos… E estava comprometido com novo trabalho para “Opéra”, de Paris. Mas, não seria “Rei Lear”, que pretendia conceber de forma livre e audaciosa, sem submeter-se às convenções da ópera francesa…
“Lear na Tempestade”, desenho de George Rommey, sec. XIX.
Março de 1854, versos e cenas de “Rei Lear” avançavam, detalhada e sucintamente… No teatro, “longo era sinônimo de chato. E chato, o pior dos estilos”, dizia Verdi, referindo-se ao ritmo e fluidez do drama…
Nesta ocasião, Francesco Piave acompanhava produção de “La Traviata”, no Teatro “San Benedetto”, de Veneza, então, grande sucesso, após fracasso inicial, no “La Fenice”. Regozijando, Piave escreveu à Tito Ricordi: “gostaria que Verdi estivesse aqui, no lugar de Paris, incomodando-se com Meyerbeer”…
Também Somma informou do triunfo de “La Traviata”, com o soprano Maria Spezia, em “Violetta”. “Escuto coisas maravilhosas sobre ‘La Spezia’. Quem sabe, será uma boa ‘Cordélia’?” respondeu, pensando em “Rei Lear”… Ano de 1855, recebia dois últimos atos de “Rei Lear”, quando já havia concluído sua ópera parisiense, “Les Vêpres siciliennes”, a ser encenada em 13/06/1855… Contratempos da estreia, no entanto, levaram-no adiar composição de “Rei Lear”…
“Les Vêpres siciliennes”
Eugène Scribe (1791-1861), dramaturgo e libretista francês.
Para libreto de “Les Vêpres siciliennes” (ou “I Vespri Siciliani”), Verdi contou com Eugène Scribe, conhecido escritor francês de parcerias com Meyerbeer, Auber, Gounod e Donizetti. E após seis anos, desde o “rifacimento de I Lombardi”, que resultou em “Jerusalém”, Verdi voltava a produzir para “Opéra”, de Paris…
Scribe sugeriu, convenientemente, libreto escrito com Charles Duveyrier, de 1839, “Le Duc d’Albe”, destinado à Gaetano Donizetti. Tema histórico, que tratava de revolta flamenga contra dominação espanhola, no séc. XVI. Donizetti, falecido em 1848, deixara a ópera inacabada, sendo completada por Matteo Salvi – única récita em Roma, 1882…
Então, Scribe transferiu ação para Sicília e instruiu seu colaborador: “No lugar dos flamengos, que pretendiam expulsar os espanhóis, nos reportaremos aos sicilianos – furiosos, ultrajados e vingativos, que massacraram os franceses”. E deixou Verdi, por trinta anos, acreditando ser libreto original…
Charles Duveyrier, libretista francês (1803-1866), Co-autor de “Les Vêpres Siciliennes”, com Eugène Scribe.
Assim, “Les Vêpres siciliennes” trata da rebelião contra presença francesa, 1282. Além de relação amorosa, ficcional, protagonizada por Hélène, nobre e idealista siciliana, e Henri, filho do governador francês…
A ópera se encerra no grande levante, um massacre conhecido como “Les Vêpres siciliennes” – sinal do ataque dado pelo badalar dos sinos, ao anunciarem os cânticos e orações das vésperas – “ofício cristão” ao entardecer… No caso da ópera, ao anunciarem o casamento de Hélène e Henri…
“Grande ópera” francesa
Primeira incursão de Verdi na “grand opéra” francesa, composição de “Les Vêpres siciliennes” ocorreu lentamente. Gênero consagrado por Meyerbeer, teve notáveis predecessores e contemporâneos…
“Medea”, de Luigi Cherubini, Milão – Itália, 1909.
Primeiros ensaios datam dos anos 20 e 30, do sec. XIX, inspirados nas grandiosidade e megalomania da “era Napoleônica”. Assim, na Paris cosmopolita do início do século, italianos como Luigi Cherubini e Gaspare Spontini buscavam estilo gradiloquente e monumental – para glórias da França e da burguesia ascendente!
Então, teatros modernizaram cenários e efeitos de palco, adequando-se à obras de longa duração e mega espetáculos… Não por acaso, iriam germinar conceitos como “obra de arte total”, de Richard Wagner, sintetizados na ópera – a música do romantismo!
E outros seguiram, com “La Muette de Portici”, de Auber, 1828; “Guilherme Tell”, última ópera de Rossini, 1829; e “La Juive”, de Halévy, 1835. Também, “Fausto”, de Gounod, de 1859; e “Les Troyans”, de Berlioz, 1858… E Wagner, aos 29 anos, fazia incursão com “Rienzi”, de 1842. Mas, foi Meyerbeer quem consagrou-se na cena parisiense, com “Robert le Diable”, 1831; e “Les Hugenots”, de 1836 – repertório ainda presente nos grandes teatros de ópera…
“Grand opéra” se caracterizava pela pompa e suntuosidade, pelos temas clássicos e históricos, grande orquestra e efeitos cênicos, luxos do vestuário e cenários, do número de solistas e dançarinos, inclusive animais, por vezes, a desfilarem no “palco cênico”… “Les Troyans” era tão complexa, que Berlioz nunca presenciou produção completa, por fim, ocorrida em duas noites – Karlsruhe, Alemanha, 1890…
“La muette de Portici”, Ato V, última cena – Paris, 1863. 1ª Grande ópera francesa, de Daniel Auber e Eugène Scribe.
Com elementos maximizados, a ópera do sec. XIX tornava-se imensa e lucrativa indústria, tal como o cinema, no séc. XX… Assim, empresários e solistas, músicos e libretistas faziam fortuna, entre eles, o próprio Verdi, por vezes, contrariado pelas convenções, mas atento aos contratos e direitos autorais – ou seja, muita “merde!” – na gíria da época, expressão de sucesso de público e financeiro…
Mas, ao exigir produções caras e complicadas, tal modelo, por fim, provocou cansaço e reação, mantendo-se alguns elementos e enxugando-se outros, no intuito de reduzir excessos. Sobretudo, cenas desprovidas de drama ou paixão, de resto, apoiadas em “brilho e paetês”… Como diria Verdi: “chato é o pior dos estilos!”… Assim, óperas como “Aída” e “Don Carlo” ainda combinaram efeitos da “grand opéra”, mas preservando dramaticidade…
“Robert le Diable”, “grand opéra” de Meyerbeer e libreto de Scribe – Pintura de Edgar Degas, 1876.
A fuga de Cruvelli… ou a “prima donna” sumiu!
Em carta à Clarina Maffei, amiga, intelectual e ativista do “Risorgimento”, Verdi lembrou antigo descontentamento com “La Scala”, de Milão, e também do ambiente parisiense, onde não pretendia estabelecer-se: “Sou apaixonado por meu próprio céu”, dizia…
E assinalou a superficialidade de “Etoile du Nord”, de Meyerbeer, apesar do sucesso de público; e de outro, produção tão descuidada de “Guilherme Tell”, de Rossini, num teatro que se pretendia principal da Europa… Mas, ainda permaneceu, por quase dois anos, na França. “Entre dois gumes”, Verdi também sentia-se acossado em seu torrão natal, pela oficialização da união com Giuseppina…
Condessa Clara Maffei, literata e apoiadora do “Risorgimento”, reunia, em Milão, ativistas como Grossi, Manzoni e Verdi.
Setembro de 1854, sua ópera francesa, “Les Vêpres siciliennes”, estava concluída, com ensaios previstos para outubro… No entanto, o soprano contratado sumira… Absolutamente, ninguém localizava Sophie Cruvelli! Jovem, talentosa e um tanto excêntrica, o soprano alemão italianizara seu sobrenome Crüwell, para Cruvelli. E aos 20 anos, era reconhecida em papéis verdianos, estreando numa montagem de “Attila”, em Veneza; depois “Ernani” e “Nabucco”, em Londres; e “Luisa Miller”, em Milão…
Em Paris, cantou “Norma” e “La Sonambula”, de Bellini; “Fidelio”, de Beethoven; e “Semiramide”, de Rossini, tornando-se celebridade!… Contratada na temporada, ensaiou “Les Vêpres siciliennes” por uma semana e, simplesmente, em “Les Hugenots”, faltou 1ª récita, ocasionando cancelamento e devolução de ingressos…
Após duas semanas, “La France Musicale” reiterava: “Nada se sabe de Mlle. Cruvelli. Seu desaparecimento inesperado torna impossível, no momento, apresentação da ópera dos Srs. Scribe e Verdi. Nesta situação, Sr. Verdi declarou, oficialmente, que retirará a ópera”… E o assunto intrigou, por algumas semanas, o público. Afinal, que teria acontecido? Rapto, morte, algum affair…
Sophie Cruvelli, soprano alemão, consagrou-se em “Attila”, de Verdi – Veneza, 1847. Depois, mais de 60 récitas no “La Scala” – Milão, 1849.
Então, Verdi escreveu à Piave: “Dos acontecimetos musicais, saiba que ‘La Cruvelli’ fugiu! Para onde? Só o diabo sabe! Em princípio, algo que me deu ‘no saco’, mas agora, confidencialmente, estou me divertindo… A deserção ensejou rompimento contratual, o que já formalizei… E quanto às propostas compensatórias, usei de toda ‘grâce’ que você me ensinou, dizendo não a todas!”…
De fato, alheia aos compromissos e sem avisar, Sophie tirara uns dias, em Bruxelas e Estrasburgo, com o namorado e futuro esposo, barão Vigier, deixando, para trás, apreensão e caos. Boatos circularam nas principais cidades europeias. Até uma revista musical – “Where’s Cruvelli?” – foi encenada em Londres, onde a jovem “prima donna” também dera “o cano”, certa ocasião…
Mas, seu reaparecimento, semanas depois, desarmou o público, provocando risos, até gargalhadas… Logo na entrada em cena de “Les Hugenots”, a rainha indaga à Valentine: “Dis-moi le résultat de ton hardi voyage” (“Fale-me do resultado de sua ousada viagem”)… Para o público presente, cena foi irresistível – até para os mais indignados! E a performance, convincente. Também, “Les Vêpres siciliennes”, seu último e grande triunfo. Dois anos após, Sophie casava-se com barão Vigier e abandonava os palcos…
Giuseppe Verdi, músico italiano, ativista do “Risorgimento”, nomeado senador por Vittorio Emanuele, rei de Itália, 1874.
“Exposition Universelle des Produits de l’Agriculture, de l’Industrie et des Beaux-Arts de Paris” – 1855
A estreia de “Les Vêpres siciliennes” ocorreu durante “1ª exposição universal”, realizada em Paris, 1855. Evento grandioso da administração Haussmann e do regime de Napoleão III, motivada pela grande exposição de Londres, de 1851, onde o imperador francês esteve exilado, passando a admirar a nação inglesa… Assim, presença da rainha Vitória era simbólica – última visita à França foi de Henrique VI, há cerca de 400 anos…
“Palácio da Indústria” – Exposição Universal, de Paris, 1855.
Mais de 5 milhões de visitantes percorreram as instalações… Artefatos de luxo dominaram setor industrial. Também pratarias, candelabros e urnas da “antiguidade e da cultura renascentista; além do gótico, romano e árabe, colecionados por monarcas franceses”… As exposições francesas, no entanto, ficaram aquém das britânicas, do “Crystal Palace”, de 1851 – e as rivalidades se evidenciavam. Nas artes plásticas, no entanto, franceses como Ingres e Delacroix destacaram-se; também nascia classificação oficial dos vinhos de “Bordéus”…
Rainha Vitoria e Napoleão III visitam edifício das “Belas Artes” – Exposição Universal, de Paris, 1855.
Naquele contexto, entre rivais esnobes e poderosos, culturas coloniais se representavam através de artefatos exóticos, matérias primas e alimentos, que abasteciam as nações europeias, engrandecidas e partilhando o mundo…
De outro, haviam críticos, como Mirabeau, “da arquitetura das instalações”, de Renan – “o útil não enobrece”, considerando ética e progresso; ou Baudelaire, “da continuidade do progresso, se culturas e individuos ascendiam e declinavam, apesar dos avanços materiais”… Ou seja, como dialogavam: progresso, felicidade e igualdade… Tais reflexões, no entanto, passaram ao largo do entusiasmo e das crenças ufanistas – do otimismo de ocasião…
Hector Berlioz, músico francês, por Kriehuber, 1845.
E para encerramento, concerto público dirigido por Berlioz – cantata “L’Imprériale”, “Symphonie Triomphale” e “Te Deum”, com cerca de 1.200 artistas… E Berlioz resumiu: “A música pouco importava e foi interrompida para discurso do príncipe”… “Mas, havia outro concerto, dia seguinte”… “para ocasião contava efeito maior, em local que acolhia a multidão”… “tributo às conquistas do imperador e da nação”… e “todos proclamando a civilização francesa, em mais um apogeu!”… “Vive la France!”
Estreia no “Opéra” – Paris, 13/06/1855 – “Salle le Peletier”…
Durante o “episódio Cruvelli”, Verdi recebeu convite de Gênova. Novo teatro se erguia na cidade e para inaugurá-lo, não apenas uma ópera, mas o consentimento para chamá-lo “Teatro Verdi”, do que o músico declinou, embora, concordando em compor uma ópera. E Tito Ricordi sugeriu “Rei Lear”, cujo libreto estava pronto…
Cartaz do “Opéra”, de Pais, para estreia de “Les Vêpres siciliennes”, com soprano Sophie Cruvelli, 1855.
Mas, Verdi deixara “Rei Lear” de lado, diante dos contratempos de “Les Vêpres siciliennes”. E ainda descontente com libreto, sobretudo, o 5° ato, escreveu à François Crosnier, diretor do “Opéra”: “algo mortificante e perturbador, para mim… se tivesse previsto tal indiferença, teria ficado em meu país”, referindo-se ao inacessível Scribe. Pretendia encerrar a ópera com “cena comovente, que trouxesse lágrimas e cujo efeito era certo… assim, teria melhorado a ópera, que nada tem de tocante, exceto a ‘romace’ do 4° ato” – opinião de Verdi…
Também queixou-se da ausência do libretista nos ensaios, além da indisposição para revisar versos inapropriados ou difíceis de cantar… E conforme combinado, nada que atacasse a honra dos italianos: “Sr. Scribe ofende franceses porque foram massacrados; e italianos, reduzindo Procida à conspirador convencional… Se existem virtudes e vícios em todas as raças, não somos piores que o resto… Assim, não me tornarei cúmplice de ofensas à meu país!”…
François-Louis Crosnier, dramaturgo, político e diretor de teatro francês.
Verdi revelava todo desconforto, tanto pelos aspecto dramático e artesanal do enredo, quanto descuido no tratamento político, do que era zeloso, dado ideais de liberdade e unificação do país – sicilianos se insurgiam contra dominação; e franceses não eram vítimas, apesar de sofrerem violento massacre…
Assim, “episódio Cruvelli” suscitou considerações do que seria “catástrofe anunciada”, propondo dissolução do contrato, mesmo com prejuízos mútuos… E finalizou pedindo à Crosnier que ouvisse sua experiência: “sucesso era algo improvável!”…
Mas, Crosnier não aceitou recisão contratual, apesar da extensa argumentação. Ensaios foram retomados, prolongando-se por 5 meses, e Verdi obteve alguns ajustes do libreto… Hector Berlioz, que assistiu ensaio, observou: “Verdi está em desavença com toda aquela gente do ‘Opéra’… lamento… e ponho-me no lugar dele, um artista valoroso e honrado!”…
Finalmente, “Les Vêpres siciliennes” foi à cena, em 13/06/1855, com a excêntrica Sophie Cruvelli, como ‘Hélène’… Crítica e público, no geral, aprovaram. E Verdi escreveu à Clarina Maffei: “Ao que parece, ‘Les Vêpres siciliennes’ não foi mal… Imprensa foi moderada ou favorável, exceto por 3 jornalistas italianos”…
“Théâtre de l’Académie royale de musique” – “Grand salle Le Peletier”, conhecido como “Opéra”, de Paris, até o incêndio, de 1873 – palco da estreia de “Les Vêpres siciliennes”. Atual “Opéra” ou “Opéra Garnier” sucedeu aquele espaço, na administração Haussmann – Napoleão III, inaugurado em 1875.
Também aprovação de músicos franceses, como Adolphe Adam, que declarou-se “convertido à música de Verdi”; e Berlioz, escrevendo em “La France Musicale”: “Apesar dos méritos de ‘Il Trovatore’ e tantas obras comoventes, ‘Les Vêpres siciliennes’ apresenta expressivo melodismo, sóbria orquestração e poéticas sonoridades, que agregam maiores força e amplitude”…
Passada estreia, Verdi pretendia retornar à Sant’Agata em duas semanas, mas permaneceu 6 meses, com Giuseppina, em Enghien-les-Bains, norte de Paris… E foi à Londres tratar de “royalties”, referentes à “Il Trovatore”, que demandavam tornar-se cidadão inglês, francês ou piemontês, por recentes acordos… Ao que respondeu: “quero permanecer o que sou, vale dizer, um camponês de ‘Le Roncole’. E prefiro pedir ao governo de ‘Parma’ que faça um acordo com a Inglaterra”…
“Les thermes”, Enghien-les-Bains, norte de Paris.
Eugène Scribe
Além de prolífica, a dramaturgia de Scribe se caracterizou pelo trabalho colaborativo. Pois, combinado aos dotes literários, foi talentoso agenciador e empresário, reunindo escritores de acordo com a demanda, fosse para o teatro popular ou para ópera…
Eugène Scribe (1791-1861), dramaturgo e libretista francês.
Nascido em Paris, Eugène Scribe, cedo, revelou interesse pelo teatro e literatura. Destacou-se no prestigiado “Collége Saint-Barbe” e iniciou estudos de direito. Filho de comerciantes de seda, abandonou a advocacia, após falecimento da mãe, para dedicar-se, exclusivamente, ao teatro, junto com ex-colega, Germain Delavigne… Assim, desde jovem, acostumou-se a produzir coletivamente…
De início, sobreviveu com herança familiar, enquanto as peças, escritas com Delavigne, obtinham gradual reconhecimento. Aos 22 anos, escreveu 1° libreto, para “La chambre à coucher”, “opéra-comique” de Luc Guénée. Sucesso maior, no entanto, veio com a comédia “Une nuit de la Garde nationele”, em parceria com Charles Delestre-Poirson…
Em cinco anos, se estabelecia como dramaturgo e fundava o “Théâtre du Gymnase”, com estreia de “Le Boulevard Bonne-nouvelle”, também escrita com dois amigos, Charles Duveyrier e Charles Moreau… E na década de 1820, mais de 100 peças para o “Gymnase”, além de libretos e peças para “Comédie-française”, “Opéra” e “Opéra-comique”…
Daniel Auber, músico francês, da 1ª “grand opéra”, “La muette de Portici”, 1828, libreto de Eugène Scribe.
E iniciava longa colaboração com o compositor Daniel Auber, que resultou em 39 libretos, entre eles, “La Muette de Portici”, de 1828, primeira “grande ópera” francesa… Depois, com Giacomo Meyerbeer, consolidou o gênero, em “Robert le Diable” e “Les Hugenots”; e “La Juive”, com Halévy, de 1835… Também colaborou com Rossini, Cherubini, Donizetti, Gounod, Thomas e Offenbach. E com Verdi, “Les Vêpres siciliennes”, de 1855, em parceria com Charles Duveyrier…
Assim, boa parte do sucesso deveu-se aos colaboradores, difundindo-se, jocosamente, que Scribe “contratava um para a narrativa, outro para os diálogos e um terceiro para as piadas”… No entanto, era uma tradição francesa e algo confortável para o autor. Conta-se, era tão escrupulosamente honesto, ao dividir o sucesso, que, por vezes, remunerava alguém até por simples ideia ou sugestão…
Sua obra inclui 120 libretos, com 48 músicos; e mais de 300 peças teatrais, com 60 co-autores; além de 130 títulos originais… Relatos dão conta de ser metódico e incansável, ocupando-se todas as manhãs, a partir das 5:00hs ou 6:00hs, até meio-dia, na prática da escrita…
E a partir de 1830, quando publica “Bertrand et Raton”, inicia série de comédias históricas e políticas, embora, muitos entendam, pouco relacionarem-se com política ou história, mas tornaram-se modelo de novo gênero e que lhe valeram indicação para “Académie Française”, eleito em 1836…
“Bertrand et Raton” ou “L’art de conspirer”, comédia de Eugène Scribe – litografia de Honoré Daumier, séc. XIX.
Embora introduzindo questões sociais, objetivo maior era entretenimento. Assim, desenvolveu conceito “la pièce bien faite” (“peça bem feita”), onde preconizava: enredo conciso, narrativa convincente, estrutura padrão e pouca reflexão intelectual… Por vezes, artistas buscavam mais retratar sua época – “le état d’esprit”, do que discuti-la. E o faziam através de enredos e personagens pouco complexos, ou minimamente conflituados e reflexivos… Visando, sobretudo, assimilação e sucesso…
Tais conceitos se refletiam na “grand opéra”, onde a simplificação, do enredo e dos personagens, se revestia de luxo e empolamento; onde conteúdo maior, por vezes, se tornava celebrar o luxo, no palco e na platéia. Uma arte que suscitasse sofisticação e glamour, apropriada à nova burguesia, em portentoso ritual, ainda que, esteticamente, com leveza de conteúdo – arte para um estilo de vida, mais representativa do que reflexiva…
Giacomo Meyerbeer, músico alemão, consagrou-se na “grand opéra” francesa, com “Robert Le Diable” e “Les Hugenots, libretos de Eugène Scribe.
E de fato, as peças lhe renderam sucesso de público e financeiro, o que lhe permitiu acumular patrimônio e apoiar instituições beneficentes… Autor eclético, também introduziu atmosferas evocativas, de sonho e sobrenatural, nas peças e libretos…
Alguns dramaturgos, como Henrik Ibsem e Bernard Shaw lhe reconheceram qualidades… Outros, como Théodore de Banville e Théophile Gautier, o criticaram: “máximo da arte burguesa e filistinista (anti intelectual) para agradar as massas”… ou “como alguém sem poesia, lirismo, estilo, filosofia, verdade e naturalidade, se tornou autor mais elegante de seu tempo?”…
E o próprio Scribe alegou que o público do sec. XIX não frequentava o teatro para instruir-se, como no sec. XVIII, mas para distrair e entreter-se: “segredo está em obter confiança do espectador, de atender suas expectativas, de torná-lo partícipe, como se fosse um colaborador que, por fim, aplaude a si mesmo”…
Na “Académie Française”, disse: “não acredito que um dramaturgo possa tornar-se historiador – não é sua missão. Nem o próprio Moliére recuperou a história de seu tempo”… E quanto às óperas, alguns comentaram: “libretos parecem frutos de algum universo paralelo, de vago colorido histórico e geográfico, povoado por personagens incongruentes, sofrendo crises implausíveis”…
Trata-se, portanto, de autor controverso. De um lado, pronto a seduzir, atento às expectativas de público e pouco inclinado a discutir seu tempo… De outro, atraiu atenção de nomes como Alexandre Dumas, filho, Oscar Wilde e Arthur Miller…
“La Juive”, grande ópera de Halévy e Scribe – Ato 1 da produção original de 1835, desenhada por Charles Séchan, Léon Feuchère, Jules Dieterle e Édouard Desplechin.
Verdi teve dificuldades com Scribe. E divergências ficaram claras no enredo e tratamento histórico de “Les Vêpres siciliennes”. Por fim, obteve alguns ajustes do libreto e maior coerência dramática. Ainda teriam colaboração indireta, em posterior adaptação de Antonio Somma, de “Gustavo III”, escrito por Scribe para Daniel Auber, que resultou em “Ballo Maschera”…
Vésperas sicilianas – ano de 1.282
Origem da revolta deveu-se ao coroamento de Carlos I de Anjou, rei da Siília, em 1266, estabelecendo “domínio angevino”, que reduzia poderes locais e aumentava impostos. Carlos I derrotara o rei Manfredo, representante do “Sacro Império Romano Germânico”, na batalha de Benevento; e, posteriormente, decapitou Conradino da Germânia, filho de Manfredo e pretendente ao trono da Sicília, em 1268…
Carlos I de Anjou derrota Manfredo, rei da Sicília – batalha de Benevento, 1266.
Fatos ocorreram no âmbito da “baixa idade média” e das “cruzadas”. Também da rivalidade entre os “guelfi”, partidários do papa; e os “gibelinos”, partidários do “Sacro Império Romano Germânico”, pelo controle da Sicília…
Processo complexo, onde Carlos I representava interesses “guelfi” e pleiteava apoio, do papa Gregório X, para empreender uma “cruzada”, a partir do título de rei de Jerusalém e da ocupação de Saint Jean d’Acre, “cabeça de ponte” para a “Terra Santa”… E o estratégico porto de Messina, abrigo da “frota angevina” para conquista do oriente médio e dos ortodoxos bizantinos…
Neste contexto, estourou revolta local, em Palermo, espalhando-se pela ilha, com rápida expulsão dos franceses. O estopim é controverso. Conta-se, na Páscoa de 1282, provocação de soldado francês, a uma jovem casada siciliana, teria revoltado o marido, que matou o soldado… também, pedras atiradas por crianças e repelidas com violência pelos franceses… ou seja, rejeição e estranhamentos cotidianos teriam culminado em violenta mobilização popular…
Pedro III, de Aragão, coroado Pedro I, da Sicília, após vitória sobre Carlos I de Anjou.
Em minoria, franceses fugiram para os navios, ancorados na costa, ou disfarçaram-se em trajes civis, sendo facilmente identificados, quando obrigados a pronunciar “grão de bico” em “ciciri” – dialeto siciliano, pela chamada técnica do “xibolete”…
Pólo comercial e militar do mar Mediterrâneo, a ilha da Sicília era cobiçada por grandes nações, que formavam alianças e disputavam interesses… Frente à expulsão dos franceses, Carlos I tentou recuperar a ilha, com apoios de Afonso X, de Castela e dos “guelfi”, de Veneza; mas sicilianos contavam com apoios de Pedro III, de Aragão, e da frota bizantina, de Miguel VIII; além de Rodolfo I, da Germânia, Eduardo I, da Inglaterra e dos “gibelinos”, de Gênova…
Vitorioso, Pedro III foi coroado Pedro I, da Sicília. Mas, foi excomungado pelo papa Martinho IV, junto com apoiadores sicilianos, deixando a esposa, Constança de Hohenstaufen, filha do rei Manfredo, em seu lugar… Assim, retornavam as influências “gibelinas” e do “Sacro Império”… Instabilidade e disputas, no entanto, permaneceram com as chamadas “guerras das Vésperas”, prolongando-se até 1372, no tratado de “Avignon” – após 90 anos de lutas…
Constança de Hohenstaufen, rainha de Aragão – Condessa de Barcelona, depois rainha da Sicília.
Pela contundência do levante, ao badalar dos sinos nas “Vésperas”, de 1282, supõe-se que a população estava pronta para ação, sobretudo, frente à pequena guarnição francesa. Além disto, note-se a presteza com que se formaram alianças internacionais, fossem de apoio aos sicilianos e aragoneses; ou aos franceses, que não mais retomaram a ilha…
Figura particular do conflito foi João de Procida, médico e jurisconsulto, que aproximou-se de Manfredo de Hohenstaufen, rei deposto da Sicília; e depois, do filho, Conradino da Germânia. Mas, com as derrotas sucessivas, exilou-se, sendo acolhido por Constança de Hohenstaufen e nomeado chanceler de Aragão, por Pedro III. Então, retornou à Sicília, como diplomata, para atuar junto aos “gibelinos”, nas resistência e preparação do histórico levante – “Vésperas sicilianas”, 30 de março de 1282…
E Guy du Montfort, nobre que prestou serviços à Carlos I de Anjou, como vigário-geral, na Toscana… Mas, por vingança das mortes do pai e irmão, assassinou, cruelmente, o primo, Henrique de Almain, durante eleição papal, de 1271, o que lhe valeu excomunhão… Então, voltou a servir Carlos I, sendo preso pelos aragonenses, na costa da Sicília, 1287… Implacável, foi colocado, por Dante, no “7° circulo do Inferno – rio de sangue fervente”… Na ópera de Verdi, apresentado como governador da Sicília…
Libreto
Dado a complexidade do tema, uma redução à estereótipos “vítima e agressor”, “bem contra o mal” ou “heróis versus vilões”, incomodava Verdi. Afinal, franceses ocuparam a ilha, mas cena final, do massacre siciliano, muito provavelmente, despertaria indignação na plateia francesa…
João de Procida, médico e jurisconsulto, chanceler de Aragão.
Se tema abordava disputas maiores, de interesses entre grandes nações, por vezes, entremeadas de sublevações locais, ora desejosas de serem governadas por uns, ora por outros, eram fatos passados que pouco importariam ao público… Mas, a teatralização do massacre, frente à orgulho atávico, preocupava Verdi…
Na Itália, a ópera era instrumento de propaganda e fomento da unificação. Daí intensificar-se no músico italiano, adepto do “Resurgimento”, preocupação com simbolismos embutidos no libreto, tal como nas óperas da 1ª fase – dos “anos nas galés”… Provável exagero frente à plateia francesa, que acabaria por acolher a ópera…
E sendo nacionalista, também era inaceitável escrever música em texto que desqualificasse fato histórico ou povo italiano. E argumentava, “bons e maus existiam em todas as raças”, frente à maniqueísmo simplista que enredo poderia induzir… Se a cena final estigmatizasse o “mau”, algo injusto com a população oprimida; de outro, vitimizaria o opressor, então, reconhecido “bom”; em flagrante inversão de valores, além de desconsiderar contextos maiores…
Para Verdi, libreto estava mal planejado ou infeliz escolha… E cena final incomodava por considerá-la também ofensiva aos franceses… Artista politizado, apesar da rusticidade campesina, preferia encerrar a ópera em cena comovente, focada no par romântico, evitando provocações e ao largo de eventuais reações xenófobas… Daí, necessidade de diálogo com Scribe…
Cidade de Palermo – Sicília, Itália.
Curiosamente, tema gerava mais desconforto à Verdi, honrado pelo convite, do que aos libretistas franceses, por apresentar algo inoportuno, em meio aos eventos da “Grande Exposição”… E afinal, fora agraciado com a “Cruz de Cavaleiro da Legião de Honra”, pelo imperador Napoleão III, em 1852 – preocupações que lhe percorriam a mente, função da temática…
Assim, tais questões suscitavam ruptura do contrato, diante de “provável fracasso”, da falta de diálogo com Scribe e pelo episódio “Cruvelli”, inusitado mas oportuno, a desorganizar temporada do “Opéra”. Por fim, Verdi conseguiu adaptações do libreto, contrato permaneceu e “Les Vêpres siciliennes” foi bem sucedida…
Cena do 1° ato – “I Vespri Siciliani”, de G. Verdi.
Sinopse
A ópera desenvolve-se durante a ocupação francesa da Sicília, séc. XIII. E libreto mescla revolta local com amor de uma nobre siciliana, Elena, por Henri (Arrigo, na adaptação italiana), ambos personagens ficcionais e ativistas pela causa da Sicília. No enredo, Henri desconhecia ser filho do governador francês, Guy du Montfort, que tenta conquistar sua afeição e convencê-lo a assumir-se como francês… Elena, por seu lado, exorta Henri a vingar morte do irmão, executado por Montfort…
Outro personagem, o revolucionário Giovanni da Procida, fomenta indignação dos sicilianos contra os usurpadores franceses. Mas, Montfort mostra carta de uma mulher – mãe de Henri, escrita no leito de morte, onde confessava ser Monfort, seu pai… De início, Henri se revolta, mas acaba sensibilizado, protegendo Montfort de atentado, planejado por Elena e Procida…
“I Vespri siciliani” – “Arrigo! Ah, parla a un core”, 4° Ato – manuscrito de Verdi.
A suposta filiação de Henri, no entanto, não o demove da luta siciliana, mas causa rejeição entre os companheiros. Então, reitera estar pronto para morrer pela Sicília, porque ama Elena e sua terra! No entanto, revoltosos são presos e Henri considerado traidor. De outro, ao saber ser Henri, filho de Montfort, Elena o perdoa por recuar do atentado. E Giovanni da Procida, obstinado, insiste na causa siciliana…
Diante das prisões e condenações de Elena e Procida, Henri, em imensa dor, reconhece filiação e apela ao pai, por misecordia – condição imposta para libertação dos revoltosos. Montfort exulta, concede perdão aos revoltosos e vislumbra, no casamento de Elena e Henri, pacificação do conflito… Mas Procida, ao contrário, vê oportunidade para sublevação, ao repique dos sinos, nas bodas de Elena e Arrigo!
Ciente do ataque e dividida, Elena desespera-se, tenta renunciar ao casamento, mas Montfort, convencido dos sentimentos de ambos, atende apelo de Arrigo e realiza cerimônia. Sinos tocam e multidão investe em violento confronto – tropas francesas são massacradas!
Após estreia francesa, Verdi acompanhou tradução italiana, de Arnoldo Fusinato, para produções em Parma e Turim, final de 1855. E por razões de censura, adaptada como “Giovanna de Guzmann”, com ação em Portugal; depois, como “Batilde di Turenna”, em Nápoles, 1857. Muito encenada, finalmente, consagrou-se temática original, em italiano, como “I Vespri siciliani”:
“I Vespri Siciliani” – Cenografia do Ato V, de Filippo Peroni.
Ação ocorre em Palermo, Sicília – 1.282, séc. XIII.
Personagens:Hélène (Elena), irmã de Frederico da Áustria (soprano); Henri (Arrigo), jovem siciliano (tenor); Guy du Montfort (Guido di Montforte), governador francês da Sicília (barítono); Giovanni da Procida, médico siciliano (baixo); De Béthune e Conde Vaudemont, dois oficiais franceses (baixos) ; Ninetta, criada de Elena (soprano); Danieli, jovem siciliano (tenor); Thibault (Tebaldo) e Robert (Roberto), dois soldados franceses (tenor e baixo); Manfredo, um siciliano (tenor);
Coros:População siciliana e guarnição francesa;
Ballet: Cavalheiros e damas, entre franceses e sicilianos.
Ópera inicia com “Sinfonia” – abertura orquestral
1° Ato – Praça principal de Palermo
Após célebre abertura sinfônica, abre-se o 1° Ato… Renunidos na praça, em frente ao palácio do governo, guarnição francesa brinda à pátria, formada por Thibault, Robert e outros… Afastados do local, populares observam, descontentes com a presença francesa… Ocupantes mostram arrogância, inclusive desrespeito às mulheres. E sicilianos externam sua raiva…
Sophie Cruvelli – célebre soprano, “Hélène”, estreia de “Les Vêpres siciliennes”, Paris, 1875.
Tendo irmão executado pelos franceses, entra nobre e ativista siciliana, duquesa Elena, vestida de preto. E Robert, entre soldados bêbados, manda que cante… Entristecida, Elena concorda e entoa canção dos marinheiros, na dolente cavatina “Deh! Tu calma, o Dio possente, col tuo riso, el cielo e mar” (Ah! tu acalmas, Deus poderoso, com teu sorriso, o céu e o mar”); mas na cabaletta, incisivo “allegro giusto”, incita sicilianos contra a ocupação, “Coraggio! su coraggio, del mare audaci figli!” (“Coragem! Coragem, ousados filhos do mar!”), “Il vostro fato è in vostra man!” (“Vosso destino está em vossas mãos!”)…
Populares investem contra soldados, mas entra governador francês, Guy du Montfort. Revoltosos se acalmam e afastam-se… Permanecem Elena, Ninetta, sua criada, e Daniele, jovem siciliano. Em quarteto, quase “à capela”, Elena inicia, “D’ira fremo all’aspetto tremendo” (“Tremo de raiva, diante de terrível aparência”). E responde Ninetta, “Tace l’ira all’aspetto tremendo, Il mio seno s’agghiaccia d’orror” (“A raiva silencia, meu peito congela de horror”)… Ameaçador, Monfort canta: “D’odio fremon compresso, tremendo, Ma di sprezzo sorride il mio cor!” (“Tremem, intensamente, de ódio, mas meu coração sorri com desprezo!”)…
Cena “I Vespri siciliani” – Opera Estatal de Viena, 2024.
Em seguida, entra Arrigo (Henri, na produção francesa), ativista siciliano, recém libertado pelos franceses. Montfort ordena saída de Elena, Ninetta e Danieli. Arrigo permanece e iniciam grande duetto. Monfort indaga por sua família… “Qual è il tuo nome?”… Arrigo é suficiente, responde, “Il mio rancore Ti è noto! al mio nemico Ciò basti!” (“Conheces meu rancor! Para um inimigo é o que basta!”)… Arrigo desconhecia o pai, mas refere-se ao duque Frederigo, que o acolheu quando criança… “Fellone!” (“Maldito!”), reage Montfort. E Arrigo responde, “Di giovane audace pùnisci l’ardir!” (“Castiga minha ousadia juvenil!”)…
Montfort, gradualmente, revela admiração pelo caráter e coragem do rapaz. E tenta cooptá-lo para servir à França, desde que se afastasse de Elena. Arrigo fica surpreso. Montfort sabia de seu amor pela siciliana, “Leggo nel tuo pensiero, per me non v’ha mister” (“Leio em teu pensamento, para mim não existem segredos”), diz Montfort. Generosa ou corruptora oferta do governador escondia, de fato, a paternidade de Arrigo… Daí, cuidado na condução da conversa, embora enérgica…
Mas, resoluto, Arrigo recusa, “Sono libero e l’ardire di grand’alma è innato in me! L’ira tua mi può colpire, ma non tremo innanzi a tee” (“Sou livre e audácia me é inata! Tua ira pode golpear-me, mas nada temo”)… “Per lei disfido io morte!” (“Por ela desafiarei a morte!”) e dirige-se ao palácio de Elena, encerrando 1° Ato…
Louis-Henri Obin – baixo, “Giovanni da Procida”, estreia de “Les Vêpres siciliennes”, Paris, 1855, por Alphonse Liébert.
2° Ato – Na orla marítima
Voltando do exílio, em pequeno barco pesqueiro, João de Procida, médico e revolucionário, desembarca no litoral siciliano. Cena abre com dolente melodia, no oboé. Saudoso, Procida exalta sua terra, “O patria, o cara pátria, alfin te veggo!”, e sua alegria, “O tu, Palermo, terra adorata…!” sendo recebido por Manfredo e outros companheiros… Então, solicita reunião com Elena e Arrigo, para tratarem da ocupação francesa, em “Nell ombra e nel silenzio…” (“Na escuridão e no silêncio…”)
Planejam uma rebelião, a desencadear-se na festa de casamento de jovens sicilianos. Procida se retira e Elena pergunta à Arrigo, que recompensa desejaria, por participar do levante. Arrigo responde: nada além do amor, jurando vingar morte do irmão de Elena!… Em duetto, Elena canta, “Quale, o prode, al tuo coraggio potrò rendere mercé?” (“De que forma poderei recompensar tua coragem?”)… e Arrigo, “O donna, t’amo! Ah sappilo! né voglio altra mercé, che il diritto di combattere e di morir per te!” (“Mulher, te amo! Tens que saber! Não desejo outra gratidão, além do direito de lutar e morrer por ti!”)…
Entra oficial francês, De Béthune, trazendo convite para uma festa, enviado por Montfort. Ao recusar, Arrigo é preso e conduzido… Entra Procida… Jovens sicilianos reunem-se na praça e dançam. Ouve-se brilhante “tarantella”!… A fim de acirrar ânimos, Procida sugere aos soldados franceses aproximarem-se para importunar mulheres sicilianas. Liderados por Robert, retiram algumas jovens, sob protestos, para levá-las à festa, enquanto outras fogem… Cena de algazarra, tumulto e efeitos de coro, entre franceses e sicilianos… Plano de Procida surtira efeito! E junto aos companheiros, decidem infiltrar-se no baile e buscar vingança!… Encerrando 2° Ato…
Cena “I Vespri siciliani” – Opera Estatal de Viena, 2024.
3° Ato
Cena 1 – No palácio de Montfort
Curta introdução das cordas abre a cena. Solitário e acossado pelo passado, Montfort reflete. Um filho desconhecido reaparecia, cuja mãe fugira, enducando-o no ressentimento pelo pai, então, opressor do povo siciliano. Agora, no leito de morte, mandava carta revelando ser Arrigo, jovem e destemido inimigo, seu filho… Em monólogo, Montfort canta “Sì, m’abborriva ed a ragion! cotanto vêr lei fui reo, che giunsi un dì a rapirla!” (“Sim, me odiava e com razão! Fui mal e cheguei a raptá-la, um dia!”)… Entra De Béthune e avisa que Arrigo fora preso e se encontra no palácio. Montfort lamenta, “In braccio alle dovizie, in seno degli onor, un vuoto immenso, orribile, regnava nel mio cor…” (“Nos braços das riqueza e honrarias, imenso, horrível vazio reinava em meu coração…”)
Marc Bonnehée – barítono, “Guy du Montfort”, estreia de “Les Vêpres siciliennes”, Paris, 1855 – foto Pierre Petit.
Entra Arrigo, estranha certa cordialidade e inicia grande duetto, “Sogno, o son desto?” (“Estou sonhando ou desperto?”), “Inver di strana sorte, se da te non m’aspetto altro che morte!” (“Estranha sorte, se de ti só espero a morte!”). E Montfort, “La speri invan!” (“Esperas em vão!”). E Arrigo, “difender la sua terra e nobil scopo. Io combatto un tiranno” (“defender sua terra é nobre, combato um tirano!”). Monfort, “Ma da vil lo combatti. Colla spada io ferisco e tu il pugnale, nell’ombra vibri!” (“E fazes de forma vil. Luto com a espada e tu com punhal, nas sombras!”). Arrigo, “Per mia sventura! ” (“Para minha desgraça!”)…
“O stolto, cui salvò la mia clemenza” (“Estúpido, minha clemência te salvou”), diz Monfort, no arioso, “Quando un ribelle in te salvava, Arrigo… nulla ti disse il cor? (“Quando um rebelde te salva, Arrigo… nada te diz o coração?”). Arrigo estremece, “A qual tormento nuovo, spietato, il crudo fato – mi condannò!” (“A que novo tormento, cruel destino me condenou!”)…
Música se agita e Monfort canta, “Ebben, Arrigo! se il mio tormento l’ingrato core non ti colpì, or di tua madre leggi 1’accento!” (“Pois bem, se meu tormento não comove teu coração ingrato, então, lê palavras de tua mãe!”)… E Arrigo, “Che? di mia madre?”… Em célebre melodia da abertura sinfônica, Monfort canta mirando o filho, “Sì, mentre contemplo quel volto amato!… Benché velato d’atro dolor, l’alma è commossa. Io son beato, tutto ho ripieno di gaudio il cor!” (“Enquanto contemplo rosto amado!… embora, velado por dor amarga, tenho alma comovida. Sinto-me abençoado e coração pleno de alegria!”).
Cena de “I Vespri siciliani” – Plácido Domingo, tenor – Paris, 1974.
Arrigo se encanta com a letra materna. Mas, surpreende-se, “O ciel! che scopro?… arcan funesto mi si rivela… fremo d’orror! (“O céu! que descubro?… terrível segredo… tremo de horror!”). E Monfort indaga, “Ma fuggi il mio sguardo, O figlio?” (“Porque evitas me olhar, filho?”). Indignado, Arrigo sussurra, “O donna, Io t’ho perduta!” (“Mulher, eu te perdi!”)… Música se agita! Monfort, vaidoso de sua posição, tenta seduzir, gaba-se do poder e tudo que desfruta… “Il mio potere, Arrigo, sconosciuto t’è dunque?” (“Meu poder te é desconhecido”)… “So! che tu accenni, a te concesso fia… titoli, onor, dovizie, speri. Quanto ambizion desia!” (“Basta pedir e te será concedido… títulos, honrarias, riquezas. Quanto tua ambição desejar!”)…
Ao que Arrigo responde, “Al mio destin mi lascia e pago allor sarò!” (“Deixa seguir meu destino e me darei por contente!”). Monfort insiste, “Ma non sai tu che splendida fama suonò di me?” (“Mas, não sabes da esplêndida fama que desfruto?”). E Arrigo, incisivo, acusa: “Nome esecrato egli è!” (“Teu nome é execrável!”)… Então, Monfort se ofende e reage, “Parole fatale, Insulto mortale” (“Palavra fatal! Insulto mortal!)… “La gioia è svanita che l’alma sperò!” (“Toda alegria se esvaneceu!”)… “Che un barbaro figlio sul padre scagliò” (“Filho cruel, que renega seu pai!”)…
Louis Gueymard – tenor, “Arrigo”, estreia de “Les Vêpres siciliennes”, Paris, 1855, por Etienne Carjat, 1857.
Na orquestra, “allegro assai”, Arrigo suplica, “Ah! rendimi, o fato, l’oscuro mio stato!” (“Ah! devolve, destino, meu estado de pobreza!”). Monfort segue, “T’arresta, Arrigo! plachisi Quell’ostinato core!” (“Controla-te, Arrigo! Acalma o duro coração!”)… E atormentado, Arrigo canta, “Lasciami, o crudo, lasciami in preda al mio dolore!” (“Deixa-me, cruel, deixa-me em minha dor!”). Andamento cai para “adagio”, canta Montfort, “Invano, o figlio, crudel mi chiami, del padre vincati la prece e il duol!” (“Em vão, filho, me chamas de cruel, vença em ti a dor de um pai!”). E Arrigo, “Fuggir mi lascia, se è ver che m’ami… Ah! volare al tuo sen io pur vorrei, ma non poss’io!” (“Deixa-me ir, se é que me amas… quisera te abraçar, mas não posso!”). Em “allegro agitato”, segue Arrigo, “Lo spettro di mia madre, che tra di noi si pone” (“Espectro de minha mãe se interpõe entre nós!”) e Montfort exclama, “O figlio mio!”…
E Arrigo, “Suo carnefice fosti: e l’alma è rea” (“Foste um carrasco, minha alma se mancharia”). E Montfort, “O figlio mio!”… Então, Arrigo apela a sua mãe, no belo tema da abertura sinfônica, “Ombra diletta, che in ciel ripòsi, la forza rendimi che il cor perdé” (“Alma amada, que no céu repousa, dá-me a forza que meu coração perdeu”). Montfort tenta abraçá-lo, mas Arrigo, sem transigir e conflituado, deixa cena! Reage bruscamente, se desvencilha de Monfort e sai às pressas! Enquanto o poderoso governador lamenta… Encerrando Cena 1, do 3° Ato…
Cena 2 – Baile no palácio de Montfort
Nobres, entre franceses e sicilianos, preparam-se para festa… Abre grande cena de ballet – “Le quattro Stagioni”. Todos cantam, “O splendide feste!”. Disfarçados, estão Elena, Procida, Arrigo e outros… Elena e Procida pretendem matar Monfort! Mas, Arrigo está perturbado… Montfort entra, acompanhado de oficiais… E ao aproximar-se, Arrigo põem-se na diateira, a fim de protege-lo de Procida e Elena. Por sua vez, sicilianos não entendem complacência de Montfort com Arrigo – ficam desconfiados e indignados…
Cena “I Vespri siciliani” – Opera Estatal de Viena, 2024.
Montfort percebe ameaça e ordena prisão de Elena, Procida, Danieli e outros… Cena desenvonlve-se em grande concertato, típico da “grand opéra”, iniciando em “Colpo orrendo, inaspettato!” (“Golpe orrendo, inesperado!”), depois, em “Ah! patria adorata!”… Arrigo é execrado pelos sicilianos, que o vem como traidor! Dividido, tenta segui-los, mas é contido por Montfort! Encerrando Cena 2, do 3° Ato…
4° Ato – Na prisão
Atormentado com a prisão dos companheiros, Arrigo vai às masmorras, na grande fortaleza. E lamenta, “Giorno di pianto, di fier dolore!” (“Dia de lágrimas, de dor cruel!”). Elena vem ao seu encontro e cantam intenso duetto, “O sdegni miei tacete – fremer mi sento il core… Forse a novel tormento mi serba il traditore!” (“Sinto o coração tremer. Acaso, novo tormento reserva o traidor!”)…
E Arrigo, arrazado, revela ser filho de Montfort, “Il padre mio!”… Elena comove-se, adquire tom piedoso e reflete sobre o conflito de Arrigo, na bela romance, “Arrigo! Ah, parli a un core…” (“Arrigo! Ah, fale a um coração…”), delicada declaração de amor, preparando-se para perdoá-lo… Arrigo exulta, “Pensando a me! È dolce raggio” (“Pensas em mim! Eis teu perdão”). E Elena, “Or dolce all’anima voce risuona, che il ciel perdona” (“Doce voz, em minha alma, diz que o céu te perdoa”), reafirmando-se amor de ambos!
Martina Arroyo (Elena), Plácido Domingo (tenor) – Cena de “I Vespri siciliani”, direção Nilo Santi – Paris, 1974.
Entra Procida, com uma carta – plano de fuga dos prisioneiros… “Amica man, sollievo al martir nostro, questo foglio recò!” (“Mão amiga trouxe esta carta, para alívio de nossos martírios!”). Elena lê, “D’Aragona un navile solcò vostr’onde, ed è già presso al porto, gravido d’oro e d’armi!” (“Navio de Aragão chega ao porto, carregado de ouro e armas!”)… Entra Montfort, convocando padres e execução dos revoltosos… Procida se surpreende com filiação de Arrigo, “Che?…” Elena confirma, “Suo figlio!…”
Procida intervèm, “Lui!… suo figlio!… Or compiuto è il nostro fato! Addio, mia patria, invendicato” (“Ele!… seu filho!… Destino está selado! Adeus, minha pátria, morrerei sem vingança!”), iniciando intenso quarteto. Montfort canta, “Sì, col lor capo sarà troncato a quell’ardire furente il vol” (“Sim, com suas cabeças será eliminada ousadia da rebelião”). E Arrigo lamenta, “Nella tua tomba – sventurata, per me cangiossi – il patrio suol!” (“Em tumba desventurada se torna o solo pátrio!”). E Elena, “Addio, mia patria amata”…
Montserrat Caballé (Elena), em “I Vespri siciliani”, “Metrpolitan Opera”, New York, 1974.
Coro interno entoa “De profundis!”… E Arrigo implora por misericórdia!, “Pietà, pietà di loro. Sospendi il cenno, o qui con essi io moro!” (“Piedade, piedade por eles. Suspende a ordem ou morro com eles!”). Percebendo fragilidade, Montfort confronta Arrigo, “Padre mi chiama, Arrigo, e ad essi e a te perdono!” (“Chama-me pai, Arrigo, e os perdoarei!”). Arrigo exclama, “Oh, cielos!”… Elena suplica, “Ah! non lo dir e lasciami morire!” (“Não o digas, deixa-nos morrer!”)… Mas, Arrigo vislumbra local das execuções, com carrasco empunhando machado… E dois penitentes aproximando-se! Procida exclama, “A morte vieni!”, e Elena, “A gloria!”…
Arrigo desespera-se, “O donna!… O mio terror!”. No pátio da cidadela, por trás dos soldados, populares cercam local e rezam… Procida e Elena são conduzidos para execução… Carrasco toma Elena! Arrigo não resiste, em desespero, lança tremendo grito: “O padre, o padre mio!!”…
E Montfort exulta, “O gioia! e fia pur vero?” (“Oh, alegria! E verdadeira?”)… “O ministro di morte: Arresta! a lor perdono!” (“Ministro de morte: Pare! estão perdoados!”). Todos comemoram! E escoltados por soldados, Elena e Procida descem escadaria, levados até Montfort: “Né basti a mia clemenza. Qual d’amistà suggello tra popoli rivali, D’Arrigo e di costei io sacro il nodo” (“Mas, não basta minha clemência. Em gesto de amizade, entre povos rivais, consagro união de Elena e Arrigo”)… “Pace e perdono!… io ritrovai mio figlio!” (“Paz e perdão!… reencontrei meu filho!”)…
Martina Arroyo (soprano), em “I Vespri siciliani”, direção Nilo Santi – Paris, 1974.
Em grande cena coral, Elena e Arrigo exaltam, “O mia sorpresa! o giubilo maggior d’ogni contento!” (“Oh, minha surpresa! Júbilo maior não haverá!”), “S’apre al più dolce amore, è pegno d’amistà” (“Se abre ao mais doce amor, promessa de amizade”)… Montfort e franceses cantam, “Risponda ogni alma al fremito d’universal contento!” (“Deixemos a cada alma, emoção de universal satisfação!”), “Il serto dell’amore coroni l’amistà” (“Grinalda do amor coroa a amizade”)… Mas, Procida e sicilianos sussurram entre si, “Di quelle gioie al fremito, al general contento… dai veli dell’amore, vendetta scoppierà!” (“Frêmitos de alegria, contentamento geral… dos véus do amor, vingança explodirá!”) – em meio às festas, tramava-se a revolta!… Encerrando 4° Ato, em vibrante concertato!
Obs: Aqui, divergência de Verdi, quanto ao libteto. Do aparente apaziguamento do conflito, com base em união amorosa e afeto familiar – Elena, Arrigo e Montfort, a suscitar concórdia e perdão dos revoltosos, quando sicilianos prosseguiam conspirando, então, como traidores, liderados por Procida… Para Verdi, libreto deslegitimava revolta, diante da opressão francesa, num “embaralhado ficcional, político e familiar”… A ópera, entretanto, é densa e musicalmente rica – “ou não seria Verdi!”
5° Ato – Jardins do palácio de Montfort
Reunidos nos jardins do palácio, coro de cavalheiros e damas homenageiam Elena, que agradece no célebre bolero, “Mercé, dilette amiche” (“Obrigado, queridos amigos”). Também Arrigo regozija, na leveza de “La brezza aleggia intorno – a carezzarmi il viso, E di profumi eletti – imbalsamato è il cor” (“Brisa acaricia meu rosto. E delicados perfumes envolvem meu coração”). E se retira para encontrar Montfort…
Maria Callas, em “Mercé, dilette amiche”, de “I Vespri siciliani”, de Verdi.
Inicia cena final, com Procida, Elena e Arrigo. Entra Procida, dirigindo-se à Elena, “Al tuo cor generoso, Donna, grata esser dee la nostra terra!” (“A teu coração generoso, senhora, nossa terra é grata!”). Elena indaga, “Perché?”… Em conflitado duetto, canta Procida, “Senza difesa, il nemico abbandona tutto fidente in noi, torri e bastite. Vestito a pompa e in braccio a gioia folle, ognuno si dà in preda al piacer, lieto e festante” (“Sem defesa e confiando em nós, inimigo abandona torres e baluartes. E vestidos com pompa, se entregam à louca alegria, celebrando o prazer, as brincadeiras e as festas”). Percebendo alienação e vulnerabilidade dos franceses, Procida vê oportunidade para reação dos sicilianos…
Elena indaga, “Qual ci sovrasta fato?” (“Que destino nos aguarda?”). Canta Procida, “Nulla ti sia celato! Non appena tu avrai mosso l’ardente sì, e del compito imene I sacri bronzi dato avran l’annunzio, all’istante in Palermo e universale Il massacro incominci” (“Não deves ignorar nada! Quando tiveres pronunciado o ardente ‘sim’ e os sinos anunciarem as sagradas bodas, explodirá um massacre em Palermo e em todas as partes”). Elena resiste, “Ah! mai!” (“Ah, jamais!”)…
Procida questiona, “Ma sul tuo core, Ove già l’odio è spento, D’un Francese poté tanto l’amore? D’un rio tiranno figlio!…” (“Em teu coração, ódio se apagou diante do amor de um francês? filho de um tirano!…”). Elena responde, “Ei m’è sposo!” E Procida desafia, “O donna, che ti arresta? Va corri, mi denuncia! Il prezzo è la mia testa!” (“Oh, senhora, que te detém? Corre, denuncia-me! O preço é minha cabeça!”). Elena responde, “Io gli amici tradire? No, no… ma pur… dovrei uccidere lo sposo?… Ah! nol potrei!” (“Trair meus amigos? Não, não… porém… matar meu esposo? Ah! Não poderei!”)…
Martina Arroyo (soprano), Plácido Domingo (tenor), Roger Soyez (baixo), em “I Vespri siciliani” – Paris.
Fanfarra de metais e entra Arrigo, “Suonò l’ora sì cara… L’imen ci chiama all’ara!…” (“Chegou a hora, querida… as bodas nos chamam ao altar!…”). Mas, percebe, “Ella trema! È pallido il suo fronte!” (“Tremes! Tua fronte está pálida!”) “Di tal terror quali ha motivi ascosi? Ah! parla, o ciel!” (“Que causa oculta tanto terror? Ah, Fala, Oh! Céu!”). E Procida adverte Elena, “Sì, parla! se tu l’osi!” (“Sim, fala! Se ousas dizer!”). Em dramático terceto final, Elena sussurra, “Sorte fatale! oh fier cimento!” (“Destino fatal! oh, cruel provação!”). Segue Procida, “Del suol natale in tal cimento a te favelli il santo amor! Pensa al fratello! col divo accento Egli ti addita la via d’onor! (“Que te guie melhor o amor sagrado pelo solo pátrio! Pensa em teu irmão! Sua divina palavra te apontará o caminho da honra!”)…
Arrigo insiste, “Ah! parla, ah! cedi – al mio tormento. Pietà, pietade del mio dolor!” (“Ah, fala, ah! Cede ao meu tormento. Piedade, pela minha dor!”). Em profundo silêncio, Elena olha para ambos e lamenta, “In fra di noi si oppone una barriera eterna! Del fratel l’ombra fiera a me comparve… La veggo!… innanzi sta!… grazia, perdono! Arrigo!… ah!… tua non sono!” (“Barreira eterna está entre nós! Sombra orgulhosa do meu irmão aparece… eu o vejo!… ele está diante de mim!… graça, perdão! Arrigo!… ah!… tua não sou!”
Martina Arroyo, “Elena” em “I Vespri siciliani”, Opéra de Paris, 1979.
“Che dicesti?”, questiona Arrigo. “Quest’imeneo giammai si compirà!” (“Esta boda jamais se celebrará!”), responde Elena… Procida acusa, “O tradita vendetta!”, pois vê nas bodas, estopim da revolta… Elena canta, “Va! t’invola all’altar! Speranze, addio! Morrò! ma il tolgo a crudo fato e rio!” (“Vai, afasta-te do altar! Esperança, adeus! Morro! Mas te salvo de destino cruel e sangrento!”). Arrigo reage, “M’ingannasti, o traditrice, sulla fé de’ tuoi sospir!” (“Me enganaste, traidora, com suspiros fingidos!”), culminando em “Dunque addio, beltà fatale, per te moro di dolor!” (“Adeus, beleza fatal, por ti morrerei de dor!”)…
Procida insiste, acusa e pressiona Elena, “Tu fingevi, o traditrice, Di voler con noi morir, Ma volgesti, o ingannatrice, A rea fiamma i tuoi sospir! (“Tu disseste, traidora, que querias morrer conosco, mas teus desejos estavam na chama de teus sentimentos, mentirosa!”). Também, Arrigo pressiona, “Ebben, prosegui! il vo’ saper!” (“Segue, pois, quero saber teus motivos!”). E Procida retruca, “Prosegui! Di tuo fratello agli assassini or vendi a bassa voce la Sicilia e gli amici!” (“Segue! Vende a Sicília a teus amigos, assassinos de teu irmão!”)… Elena canta, “Ah! no, nol posso! Ma non mentiva il labbro, quando amor ti giurò! Io t’amo, ed esser tua giammai potrò!” (“Ah! não, não posso! Porém, não mentiram meus lábios, quando te juraram amor… te amo e jamais poderei ser tua!”)… “No, non sono traditrice, né mentirono i sospir!” (“Não sou traidora, nem fingidos meus sospiros!”), culminando em “Taccia il bronzo ormai fatale, precursor di strage e orror!” (“Calem-se sinos fatais, precursores de massacre e orror!”)…
Martina Arroyo, Kostas Paskalis, Wieslaw Ochman, em “I Vespri siciliani” – Paris, 1975.
Em brusco pianíssimo, contraste na orquestra, prepara-se o final. Saem do palácio, adentrando jardins, Montfort, seguido de cavalheiros e damas. E Arrigo, novamente, apela ao pai, “Deh! vieni, il mio mortale dolor ti mova, o padre! il caro nodo che io cotanto ambia, del fratello al pensier, Elena infrange!” (“Ah! vem, que minha dor mortal te comova, oh pai!… A amada união que tanto desejo, Elena rompeu, em memória do irmão!”)…
Montfort dirige -se à Elena, “Errore! invan ritrosa, pugni contro il tuo core: ei m’è palese!” (“Erro! em vão, te esquivas, lutas contra teu coração, vejo!”)… “Lo credi!… l’ami!… egli ti adora; ed io che nomaste tiranno, vo’ per voi… (sorrindo) esserlo ancora; a me le destre, o figli! V’unisco, o nobil coppia!” (“Creiam! Tu o amas!… e ele te adora! E eu, a quem chamaste tirano… (sorrindo) agora o serei por você, filho! Eu os uno, nobre casal!”)…
E Procida exorta, “E voi, segnal felice, bronzi, echeggiate!” (“E vocês, sinos, felizes mensageiros, repicai!”). Elena adverte, “No, impossibil fia!” (“Não, impossível!”). Montfort insiste, “Di gioia al suon che lieto in aria echeggia, Giura!” (“Ao ressoar alegre e feliz, dos sinos, pelo ar, jurem!”)… Música em “allegro agitato”. Em desespero, exclama Elena, “No!… mai!… nol posso!… ah! lassi voi!” (“Não!… jamais!… não posso!… ah! pobre de vocês!”)… Ouvem-se os sinos!! “T’allontana! va! fuggi!” (“Afastem-se! Vão! Fujam!”)…
Montfort indaga, “E perché mai?” (“E porque?”)… Elena, “Non odi tu le grida?…” (“Não ouves os gritos?…”). Montfort replica, “È il popol che ci aspetta!” (“O povo nos espera!”). Elena adverte, “È il bronzo annunciator…” (“Os sinos anunciam…”). E intervém Arrigo, “Di gioia!” (“A felicidade!”). E Procida corrige, “Di vendetta!!” (“A vingança!!”)… Do alto das escadarias e de todos os lugares surgem sicilianos, entre homens e mulheres, com tochas, adagas e punhais, gritando em coro derradeiro: “Vendetta! vendetta! Ci guidi il furor! Già l’odio ne affretta Le stragi e l’orror! Vendetta, vendetta è l’urlo del cor!” (“Vingança! Vingança! Guiados pela fúria! Ódio, terror e morte nos move! Vingança, vingança, grito do coração!”)…
– Cai o pano –
Desde a estreia, em Paris, “I Vespri siciliani” tem sido frequentemente montada. E “Elena”, interpretada por divas, como Maria Callas, Leyla Gencer e tantas outras… Aos 42 anos, Verdi amadurecia e elevava o cenário romântico europeu. Durante os anos de 1850, ainda compôs “Simon Boccanegra”, “Ballo Maschera” e “Aroldo” – “rifacimento di Sttifelio”. E até os 80 anos, profícua atividade e obras marcantes, com “Aída”, o monumental “Réquiem”, “Otelo” e “Falstaff”… Mestre italiano, falecido aos 88 anos, 1901, tornou-se autor de óperas mais encenado no mundo…
Giuseppe Fortunino Francesco Verdi – Giuseppina Verdi Strepponi, união de 50 anos.
Após estreia, na sala “Le Peletier” (antigo “Opéra”), Paris, 1855, “Les Vêpres siciliennes” foi encenada em Parma, final de 1855, e no “La Scala”, de Milão, 1856, como “Giovanna de Guzman”; também no teatro “San Carlo”, de Nápoles, 1857, como “Batilde di Turenna”; e após, no teatro “Drury Lane”, de Londres, 1859; “Academy of Music”, Nova York, 1859; “Theatro D. Pedro II”, Rio de Janeiro, 1871; e retomada em Stuttgart, 1929; e Berlim, 1932…
“Theatro D. Pedro II”, inaugurado em 1871, palco de “I Vespri siciliani”, Rio de Janeiro.
No Rio de Janeiro, com a demolição do “Theatro Provisório”, em atividade até 1875; “Theatro D. Pedro II” seguiu programação artística, com montagens de “Guilherme Tell”, de Rossini; e “I Vespri siciliani”, a partir de 1871… A capital brasileira, no entanto, sempre sujeita à novos projetos urbanos, também o veria demolido, em 1934… Construção suntuosa, com assoalho e teto em madeira, proporcionava acurada acústica, segundo relatos… Recebeu nomes, como Enrico Caruso e Sarah Bernhardt. E conta-se, estreia de Arturo Toscanini, aos 19 anos, regendo “Aída”, de Verdi, em 1886…
Gravações de “Il Vespri siciliani”
Vigésima ópera de Verdi, considerando “Jerusalém – rifacimento de I Lombardi”, “I Vespri siciliani” ganhou os palcos do mundo… Dado a música de ballet e outras partes, produções costumam fazer cortes de até ~1h, resultando entre ~2:20hs à ~3:30hs. Seguem gravações em CDs e DVDs:
Gravação em CD – MYTO Records, 1951
“Orquestra Maggio Musicale Fiorentino”, direção Erich Kleiber Solistas: Maria Callas (Elena) – Giorgio Kokolios Bardi (Arrigo) – Enzo Mascherini (Guido di Monforte) – Boris Christoff (Giovanni da Procida) “Chorus Maggio Musicale Fiorentino”, Florença, Itália
Gravação em CD – Walhall, 1955
“Orquestra della RAI di Torino”, direção Mario Rossi Solistas: Anita Cerquetti (Elena) – Mario Ortica (Arrigo) – Carlo Tagliabue (Guido di Monforte) – Boris Christoff (Giovanni da Procida) “Coro della RAI di Torino”, Turim, Itália
Gravação em CD – Nuova Era, 1964
“Teatro dell’Opera di Roma”, direção Gianandrea Gavazzeni Solistas: Leyla Gencer (Elena) – Gastone Limarilli (Arrigo) – Giangiacomo Guelfi (Guido di Monforte) – Nicola Rossi-Lemeni (Giovanni da Procida) “Chorus dell’Opera di Roma”, Roma, Itália
Gravação em CD – MYTO Records, 1970
“Orquestra e Coro do Teatro Alla Scala”, direção Gianandrea Gavazzeni Solistas: Renata Scotto (Elena) – Gianni Raimondi (Arrigo) – Piero Capuccilli (Guido di Monforte) – Ruggero Raimondi (Giovanni da Procida) “Teatro Alla Scala”, Milão, Itália
Gravação em LP – RCA, 1973
“New Philharmonia Orchestra”, direção James Levine Solistas: Martina Arroyo (Elena) – Plácido Domingo (Arrigo) – Sherrill Milnes (Guido di Monforte) – Ruggero Raimondi (Giovanni da Procida) “John Alldis Choir”
Obs: Vigorosa produção, dado nível e empenho do conjunto, entre solistas, direção, coro e orquestra!
Gravação youtube – MET Opera, 1974
“Metropolitan Opera Chorus and Orchestra”, direção James Levine Solistas: Montserrat Caballé (Elena) – Nicolai Gedda (Arrigo) – Sherrill Milnes (Guido di Monforte) – Justino Diaz (Giovanni da Procida) “Metroplitan Opera”, New York, USA
Gravação em DVD – NVC Arts, Warner, NTSC, 1986
“Orquestra e Coro do Teatro Comunale di Bologna”, direção Riccardo Chailly Solistas: Susan Dunn (Elena) – Veriano Luchetti (Arrigo) – Leo Nucci (Guido di Monforte) – Bonaldo Giaiotti (Giovanni da Procida) Direção e produção de Luca Ronconi “Teatro Comunale”, Bologna, Itália
Gravação em CD EMI – DVD Naxos, NTSC, 1989
“Orquestra e Coro do Teatro Alla Scala”, direção Riccardo Muti Solistas: Cheryl Studer (Elena) – Chris Merrit (Arrigo) – Giorgio Zancanarro (Guido di Monforte) – Ferruccio Furlanetto (Giovanni da Procida) Direção de Christopher Swann e Pier Luigi Pizzi “Teatro Alla Scala”, Milão, Itália
Obs: Produção completa, com cerca de 3:30hs, com bela atuação de Cheryl Studer.
Gravação youtube – 1998
“Chor und orchester der Wiener Staatoper”, direção Roberto Abbado Solistas: Eliane Coelho (Elena) – Johan Botha (Arrigo) – Renato Bruson (Guido di Monforte) – Ferruccio Furlanetto (Giovanni da Procida) “Wiener Staatoper”, Viena, Austria
Obs: Performance do notável soprano brasileiro, Eliane Coelho, radicada na Áustria e elenco permanente da “Ópera Estatal de Viena”.
Gravação em DVD – C Major, 2013
“Orquestra e Coro do Teatro Regio di Parma”, direção Massimo Zanetti Solistas: Daniela Dessi (Elena) – Fabio Armiliato (Arrigo) – Leo Nucci (Guido di Monforte) – Giacomo Prestia (Giovanni da Procida) Direção de Pier Luigi Pizzi “Teatro Regio di Parma”, Itália
Martina Arroyo, soprano – “Elena”, em “I Vespri siciliani”, de Verdi.
Download no PQP Bach
Para download e compartilhamento da música de Verdi em “I Vespri siciliani”, sugerimos gravação da “New Philharmonia Orchestra” e “John Alldis Choir”, direção James Levine, com Martina Arroyo e grandes solistas – RCA de 1973:
Interpretando “Elena”, grande soprano estadunidense, Martina Arroyo, nascida em New York, formação religiosa e moradora do Harlem. Sua família proporcionou ampla educação musical, além da vida cultural nova-iorquina, onde alternava prática coral, na “Hunter College High School”, com atuações na Broadway…
Filha de engenheiro naval portoriquenho, Arroyo formou-se em letras “neolatinas” e trabalhou dois anos, como assistente social, enquanto aprofundava estudo do canto lírico… Entre as primeiras cantoras negras a atuar no MET, junto com Leontyne Price e Grace Bumbry, fez brilhante carreira na Europa e USA… Adquiriu projeção internacional, como soprano principal da “Ópera de Zurique”, 1963, com destaque em “Aída”, de Verdi… E no MET, 1964, quando substituiu Birgit Nilsson…
Plácido Domingo, tenor – “Arrigo”, em “I Vespri siciliani”, de Verdi.
Convidada frequente de Leonard Bernstein, para 9ª sinfonia, de Beethoven, e concertos de música sacra; incursionou também pela música do sec. XX, com estreias mundiais de “Andromache’s Farewell”, de Samuel Barber; e “Momente”, de Karlheinz Stockhausen; além de gravar repertório barroco – “Sanson”, de Haendel, com Karl Richter… Artista reconhecida, recebeu inúmeras homenagens. Por fim, criou a “Fundação Martina Arroyo”, para formação de cantores…
Reunindo talentos de ator e cantor, o grande tenor, Plácido Domingo, destaca-se em “Arrigo”, nesta desafiante ópera. Nascido em Madrid, ainda jovem mudou-se para o México, onde iniciou carreira, acompanhando os pais, numa companhia de “zarzuelas”. Aos 16 anos, fez teste como barítono, para “Ópera Nacional do México”, e foi-lhe pedido cantar algo mais agudo. Então, foi aceito como tenor na companhia mexicana…
Sherrill Milnes, barítono – “Guy du Montfort”, em “I Vespri siciliani”, de Verdi.
Também formou-se em piano e regência. E a partir dos anos 60, atuou nos USA, destacando-se em “Alfredo”, de “La Traviata”, ao lado do, ninguém menos, soprano Joan Sutherland… E brilhou no “Metropolitan Opera”, de New York…
Em 1985, fez inúmeros concertos beneficentes, pelas vítimas do terremoto que assolou a cidade do México… E notabilizou-se em temporadas na Europa e USA, além de produções para o cinema, música popular e direção de orquestra…
Interpretando “Guy du Montfort”, o carismático Sherrill Milnes, barítono estadunidense, nascido em Downers Grove, Illinois. Família de produtores de leite, desde jovem, alternava as lidas da fazenda, com os estudos musicais. Posteriormente, entre medicina e música, optou pela carreira musical, na expectativa de tornar-se professor. Assim, de início modesto e poucas pretensões, a voz robusta e presença de palco possibilitaram à Milnes brilhar entre os grandes barítonos de sua geração…
Ruggero Raimondi, barítono – “Giovani da Procida”, em “I Vespri siciliani”, de Verdi.
Milnes atuou em festejadas casas de ópera e suas qualidades de ator o levaram ao cinema, em “Tosca”, de Puccini… Junto às poderosas vozes de Arroyo, Domingo e Raimondi, além dos solos, compõe belos conjuntos, firmemente alicerçados pela magnífica “New Philharmonia Orchestra” e “John Alldis Choir”…
Como “Giovanni da Procida”, o notável barítono italiano, Ruggero Raimondi. Nascido em Bologna, entudou no “Conservatório Giuseppe Verdi”, de Milão, depois, em Roma. “Procida”, um personagem que o acompanhou, com sucesso, desde início da carreira… Muito tímido, para um cantor de ópera, foi estimulado por colegas, diretores e regentes – maestro Molinari-Pradelli percebeu seu potencial, ainda aos 15 anos… Atuou no cinema, com destaque para “Don Giovanni”, de Joseph Losey, 1979…
James Levine, à frente da “New Philharmonia Orchestra”, em “I Vespri siciliani”, de Verdi, 1973.
E o trabalho do inglês John Alldis, especialista em repertório coral, aliado à direção de James Levine, junto à “New Philharmonia Orchestra”, conferem especiais cuidado e energia nesta produção… Levine destacou-se à frente da “Orquestra Sinfônica de Boston” e, sobretudo, da “Metropolitan Opera House”, de New York – atuações amplamente reconhecidas. O grande regente faleceu em 2021…
Por fim, cumprimentamos e aplaudimos a excelente “New Philharmonia Orchestra” e “John Alldis Choir”, presentes nesta magnífica gravação, realizando a poderosa música de Verdi!
Capa RCA – “I Vespri siciliani”, de Verdi, com “New Philharmonia Orchestra” e “John Alldis Choir”, direção James Levine, 1973.
Vídeo youtube – produção “Orquestra e Coro do Teatro Comunale di Bologna”, direção Riccardo Chailly, com Susan Dunn (soprano), Veriano Luchetti (tenor), Leo Nucci (barítono) e Bonaldo Giaiotti (baixo), direção e produção de Luca Ronconi – Itália, 1986:
Vídeo youtube – produção “Orquestra e Coro do Teatro Alla Scala”, direção Riccardo Muti, Cheryl Studer (soprano), Chris Merrit (tenor), Giorgio Zancanarro (barítono), Ferruccio Furlanetto (baixo), direção de Christopher Swann e Pier Luigi Pizzi – Milão, Itália, 1989 (clique aqui para abrir o link no YouTube)
Capa DVD “Teatro alla Scala” – Milão, Itália, 1989.
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“Entusiasmo de John Alldis, diretor inglês, à frente do ‘PQP Bach Choir’…”
Mais uma vez temos a oportunidade de propriamente ouvir a apaixonante obra prima do padroeiro do blog, a Paixão segundo Mateus. Longe vão os dias nos quais dispúnhamos apenas dos LPs da Abril Cultural com trechos da gravação de Eugen Jochum. Agora, com os muitos CDs coletados ao longo de décadas, com os arquivos musicais mais as plataformas de streaming, fico atarantado com a imensa possibilidade de escolha.
As dores do mundo persistem…
Eu costumo ouvir essa obra nesses dias, por gosto da música, mas também como uma maneira de me elevar espiritualmente, se me permitem. Dito ainda de outra forma, de fazer um esforço para me distanciar das coisas terrenas, que são importantes, mas que têm a terrível tendência de nublar nossa perspectiva de buscar algo mais perene, mais etéreo e mais elevado. Nada como arte, em todas as suas formas, musical, plástica, em palavras, para nos colocar a caminho dessa busca de algo mais divino do que apenas humano.
Além disso, essa grande obra que retrata a redenção, o perdão, a esperança, obtidas de um sobre-humano sacrifício, me faz refletir nas grandes dores pelas quais passam hoje tantos de nossos semelhantes. Vários conflitos, plenos de injustiça, desamor e desrespeito, estão indo e vindo no noticiário, alguns temerosamente perto de nós mesmos.
Mas como o papel do blog é chamar sua atenção para a música, aqui está ela, mais uma gravação da Paixão do Outro Evangelista, aquele que nasceu em 1685…
Aqui o ótimo maestro Ricardo Chailly dirige um conjunto espetacular, com imensa tradição. A orquestra e os coros são de Leipzig, lugar no qual o grande compositor passou seus últimos anos, de 1723 até 1750. Claro que a abordagem é tradicional, nada de instrumentos de época, mas algumas lições do movimento HIP aparecem, especialmente no andamento geral da música.
Eu não consigo deixar de me emocionar naqueles momentos cruciais, que sempre demandam um disfarçado levar de mãos e dedos as olhos…
O coro de abertura, aqui tocado com mais energia do que com doloridas notas. As árias Buss und Reu, para contralto, e Blute nur, du liebes Herz!, para soprano, são de ouvir com lencinhos nas mãos. No outro disco há a sublime Erbame dich, mein Gott, com violino obligato, para contralto e a ária Aus Liebe will mein Heiland sterben, para soprano.
A ária Erbame dich é realmente muito especial. Yehudi Menuhin amava esta peça e há algumas gravações com ele acompanhando a cantora da ocasião disponíveis no Youtube. Eu gosto de algumas dessas gravações avulsas, como essa e essa aqui .
Há também alguns momentos nos recitativos que são espetaculares e que desaguam em belíssimos corais ou árias. Como exemplo temos a cena da última ceia, o momento que a turba opta por Barrabás e o momento que na cruz, Jesus clama pelo Pai – Eli, Eli, lemá sabactâni. Mas não vou ficar aqui a dar spoilers, vá logo ouvir a música.
Schubert, com certeza, jamais foi negligenciado por Alfred Brendel. Mas suas sonatas para piano, com algumas exceções, foram e são. No ensaio de Brendel de 2015, A Lifetime of Recordings, ficamos sabendo com incredulidade que Otto Erich Deutsch, que catalogou a obra de Schubert, ouviu pela primeira vez a Sonata D. 958 — hoje considerada a primeira parte de uma trilogia de despedida — quando o próprio Brendel a tocou em Viena na década de 1960. Diz-se que Rachmaninoff nem sabia que existiam sonatas para piano de Schubert. Embora eu seja um habitué de recitais de piano, nunca ouvi uma Sonata de Schubert ao vivo. Como sublinha Brendel, a descoberta tardia destas obras é em função da sua originalidade desconcertante: comparadas com as sonatas clássicas de Haydn, Mozart e Beethoven, ou com as sonatas românticas de Chopin, Schumann e Brahms, elas são inclassificáveis. Charles Rosen (outro notável pianista-autor) joga a toalha em seu deslumbrante The Classical Style, cujo penúltimo parágrafo conclui que Schubert “se destaca como um exemplo da resistência às generalizações”. Um dos projetos indispensáveis de Brendel tem sido o de promover as Sonatas para piano de Schubert. Ele gravou e regravou essas obras. E o fez da forma mais sublime que se possa imaginar.
E o que dizer da Wanderer? Que obra espetacular! A Fantasia Wanderer é uma obra para piano em quatro movimentos composta por em novembro de 1822. Esta fantasia é considerada como a composição de Schubert para piano mais exigente tecnicamente, e uma das poucas a exigir virtuosismo. Schubert disse mesmo Das Zeug soll der Teufel spielen (O diabo devia tocar isto), fazendo referência à sua própria incapacidade de executá-la.
Franz Schubert (1797-1828): Sonata D. 960 / Fantasia Wanderer D. 760 (Brendel)
Sonata In B Flat Major, D. 960
1 1. Molto Moderato 14:38
2 2. Andante Sostenuto 8:54
3 3. Scherzo (Allegro Vivace Con Delicatezza) 3:57
4 4. Allegro, Ma Non Troppo 8:30
5 Fantasia In C Major, Op. 15 D. 760 “Wanderer Fantasy” 21:04
Pô, Mingus! The shoes of the fisherman`s wife are some jive ass slippers? Como uma obra tão espetacular pode ter um título tão… Sei lá. Alguém sabe de alguma referência que o explique? O nome original era Once upon a time, there was a holding corporation called Old America…
Let My Children Hear Music é um álbum lançado pela Columbia Records em 1972. A música é composta para grande orquestra de jazz e Mingus trabalhou com vários arranjadores, orquestradores e maestros, principalmente Sy Johnson e Alan Raph, para realizar algumas de suas composições mais ambiciosas. O resultado é extraordinário. Comprei este álbum pela primeira vez aos 17 anos e logo vi que ele tinha tudo: beleza, swing, majestade e emoções que abrangem a comédia, a alegria e até o terror. Mingus me apresentou a um mundo musical de possibilidades ilimitadas. Todos os instrumentos conhecidos e desconhecidos do jazz aparecem aqui (incluindo violoncelo, trompa, fagote e uma seção inteira de baixos com arco em algumas músicas), assim como toda estratégia de vanguarda, e ainda assim tudo soa totalmente natural, com melodias e harmonias gloriosas. Tal como Welles, William Blake e muitos dos génios subestimados ou ignorados, Mingus era um verdadeiro dissidente. Ele era ao mesmo tempo progressista e conservador, intensamente comprometido em conservar a melhor música do passado, insistindo para que ela fosse ouvida, e um vanguardista. Enfim, era um artista com perfeita noção da posição em que está inserido. Temos faixas sensacionais neste disco, quase todas elas, mas nada se compara a The Shoes, na minha opinião.
Bem, naquela época não se costumava colocar a nominata de todos os músicos envolvidos, mas consegui os dos principais solistas:
Lonnie Hillyer – trumpet
Julius Watkins – French horn
Bobby Jones – tenor saxophone
Joe Wilder – trumpet
Charles McCracken – cello
Charles McPherson – alto saxophone
James Moody – tenor saxophone
Sir Roland Hanna – piano
Snooky Young – lead trumpet throughout
Dannie Richmond – drums
Charles Mingus: Let My Children Hear Music
1 “The Shoes of the Fisherman’s Wife Are Some Jive Ass Slippers” – 9:34
2 “Adagio ma Non Troppo” – 8:22
3 “Don’t Be Afraid, the Clown’s Afraid Too” – 9:26
4 “Taurus in the Arena of Life” – 4:17 (on CD reissue)
5 “Hobo Ho” – 10:07
6 “The Chill of Death” – 7:38
7 “The I of Hurricane Sue” – 10:09
Mestre incontestável do piano, Maurizio Pollini deixou imenso e diversificado legado, em trajetória musical de mais de 60 anos…
Nascido em Milão, Itália, 1942, numa família de artistas – pai violinista e arquiteto; mãe cantora e pianista; e irmão escultor; aos 14 anos, já executava os estudos de Chopin e, aos 18 anos, venceu célebre “Concurso Internacional Chopin”, VI edição – 1960, sendo mais jovem concorrente e tendo Arthur Rubinstein na presidência de honra…
Clareza e precisão acompanharam carreira e performances, muitas vezes, levando à controvérsia, quanto às sensibilidade e lirismo de suas interpretações, o que fica a critério do público e inúmeros registros, em áudio e vídeo… No entanto, parece indiscutível seu comprometimento musical, sua obsessão pela excelência e profundidade… Assim, teve trajetória musical marcada por exigente repertório, distanciando-se de quaisquer tipos de leveza ou apelo virtuosístico, apesar dos amplos recursos: “Pollini tinha maior desenvoltura, aos 18 anos, que quaisquer dos jurados”, disse Rubinstein, em Varsóvia, 1960…
Maurizio Pollini, vencedor da “VI Edição do Concurso Internacional Chopin”, Varsóvia – Polônia, 1960.
Então, mergulhou em mundos pouco acessíveis, das asperezas da última fase de Beethoven, ou da música dodecafônica e contemporânea… E seus registros apresentavam combinações inusitadas, como os concertos de Schumann e Schoenberg, que sugerimos nesta edição…
Também realizou cursos em composição e direção, com breves incursões, na década de 1980, com a ópera “La Donna del Lago”, de Rossini; ou em concertos sinfônicos e parcerias com o filho, Danieli Pollini. Mas, sua atuação como pianista prevaleceu… E durante os chamados “anos de chumbo”, década de 1960, engajou-se politicamente, filiando-se à esquerda democrática italiana; além de agendar, com Claudio Abbado, programas acessíveis de música erudita, em fábricas e universidades – motivos de reflexão, presentes ao longo da carreira…
Maurizio Pollini e Claudio Abbado em ensaio c/orquestra.
E disse, ao “The Guardian”, em 2011: “A arte, em si, tem sempre caráter progressista e necessário, mesmo que pareça absolutamente inútil, em termos práticos”… “de certa forma, a arte representa o ato de ‘sonhar’, para uma sociedade. Se dormir ou sonhar são de vital importância para um ser humano; da mesma forma, uma sociedade não sobreviveria sem a arte…”
Dado a precocidade, após “Concurso de Varsóvia”, o jovem Pollini, então, aluno de Carlo Vidusso, decidiu ampliar repertório no lugar de iniciar carreira internacional… E convites eram muitos… Assim, por algum tempo, passou a ler, jogar xadrez e conviver, informalmente, com Arturo Benedetti Michelangeli, célebre pianista… E aliou ao repertório tradicional, de Schubert, Chopin, Schumann e Beethoven; autores do século XX, como Stravinsky, Bartók, Schoenberg e Webern; além de modernistas do pós-guerra, como Stockhausen, Boulez e Luigi Nono – delineando estilo e preferências, como músico e intérprete…
E com amigo de longa data, maestro Claudio Abbado, realizou inúmeras parcerias; além de atuar com outros regentes, como Karl Bohm, Riccardo Muti, Daniel Barenboim e Riccardo Chailly… Artista aclamado, conquistou dois prêmios “Grammy”: em 1980, com “Piano concertos 1 + 2”, de Bartók, com “Chicago Symphony Orchestra”, direção Claudio Abbado; e em 2007, curiosamente, com a integral dos “Noturnos”, de Chopin, apesar da controversa discussão entre seus lirismo e desenvoltura técnica… Também gravou notáveis integrais, das sonatas de Beethoven e do “Cravo Bem Temperado”, vol. 1, de JS Bach…
Maurizio Pollini e Claudio Abbado – dois grandes amigos…
No final de 2016, “Deutsche Grammophon” lançou conjunto com 55 CDs e DVDs, celebrando 75 anos do pianista… Artista discreto, Pollini dizia: “Minhas decisões na escolha de repertório basearam-se sempre na convicção de que nunca me cansaria de tocá-lo”… E teve períodos em que preferiu concertos ao vivo, do que realizar gravações. E disse, à revista “Gramophone”: “Temos que conviver com fato de que uma performance tem permanência artificial, pois nossas ideias estão sempre mudando”… Assim, “um registro deve ser aceito como documento de um momento. (Por isto), quase nunca ouço meus discos antigos…”
E nos últimos anos, embora distanciado, permaneceu atento à política italiana, ao questionar com franqueza, especialmente, a esquerda, pela qual tanto se mobilizou… E a música, seu meio natural, permaneceu ponto de partida e chegada, razão de sua existência e referência de vida…
Maurizio e o filho, Daniele Pollini – pianistas.
Família de pianistas, Maurizio Pollini foi casado, por 56 anos, com Maria Elisabetta – apelido “Marilisa”, e com o filho, Daniele, realizou alguns concertos e gravações… E, finalmente, do rigor, cultivado ao longo da carreira, nos últimos anos, descontraiu-se pouco mais, adicionando “bis” e autografando CDs nos recitais, então, interagindo afetivamente com seu imenso público… Assim, apaziguava-se e celebrava a vida!
Para Download: “Schumann & Schoenberg Piano Concertos”, com “Die Berliner Philharmoniker”, direção Claudio Abbado.
Robert Schumann: “Konzert für Klavier und Orchester”, op. 54
Capa “Deutsche Grammophon” – Maurizio Pollini e “Die Berliner Philharmoniker”, direção Claudio Abbado.
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“Falecido, aos 82 anos, Pollini é lembrado entre os maiores músicos dos últimos 50 anos. E na Itália, teatro “alla Scala”, de Milão, fez especial referência – entre seus mais atuantes solistas…”
Morre o homem, vive o Mito. Acho que é essa a expressão que se usa quando um grande pessoa morre, daquelas pessoas que realmente contribuíram de alguma forma para tornar este nosso triste planeta mais agradável de se viver.
Maurizio Pollini nos deixou mas ficou sua obra e seu talento, imortalizado em diversos discos, que irão nos acompanhar no resto da jornada de nossas vidas. E é um destes discos, talvez uma das melhores gravações já realizadas deste imortal concerto, que trago para os senhores, para entenderem a dimensão e o tamanho do artista que nos deixou. Tivemos o privilégio de ter acesso a essas gravações.
Karl Böhm nos deixou há muito tempo, quarenta e três anos, para ser mais exato, e um pouco antes de vir a falecer entrou no estúdio com o jovem Pollini e gravou o Concerto para Piano nº 1, de Brahms, um dos concertos mais emblemáticos já escritos para o instrumento. E tinha de ser com a maior das orquestras, a Filarmônica de Viena, orquestra que dirigiu por décadas. Essa gravação me foi apresentada há não muitos anos, mas desde o primeiro momento entendi que era muito especial. Gilels, Richter, Rubinstein, Kovacevich, todos estes gigantes do piano deixaram registradas suas interpretações desse concerto, todas com seus méritos, com certeza, e Pollini sem dúvida, com essa gravação, escreveu seu nome no panteão dos grandes intérpretes dessa obra.
Alguns anos mais tarde ele gravou os dois concertos de Brahms com seu grande amigo, Claudio Abbado, e mais recentemente, com Christian Thielemann. Ouvi essa última gravação hoje de tarde, também excelente, mas a presença de Böhm aqui é o grande diferencial. O velho maestro conduz os filarmônicos austríacos com sabedoria, como não poderia deixar de ser, tantas as vezes em que ele dirigiu não apenas essa orquestra, mas também esse concerto. Grande músico que já era, Pollini entendeu que tinha um grande parceiro ao seu lado, e se portou de forma digna, nos apresentando uma interpretação muito expressiva, porém sem cair em sentimentalismos exagerados.
Escrevi esse texto no calor do momento, em tempo recorde, a pedidos do nosso mentor PQPBach. Meu acervo é muito grande, e é complicado encontrar certas gravações que não ouvimos há muito tempo. Consegui esse arquivo com o colega Rene Denon, também um fã de Pollini. No correr da semana vou tentar atualizar os links de minhas postagens antigas com o grande pianista.
Descanse em Paz, maestro Maurizio.
01. Piano Concerto No. 1 Op. 15- I. Maestoso
02. Piano Concerto No. 1 Op. 15- II. Adagio
03. Piano Concerto No. 1 Op. 15- III. Rondo. Allegro non troppo
Maurizio Pollini – Piano
Wiener Philharmoniker
Karl Böhm – Conductor
A notícia surgiu logo de manhã, no grupo de WhatsApp, e depois se confirmou ao longo do dia nas mídias sociais e jornais on line: Maurizio Pollini è morto.
Maurizio Pollini, pianist who defined modernism, dies at 82
Eu não consigo deixar de lembrar o punch line da anedota sobre o político: Pois sim, morreu para você, filho ingrato! É assim que nos sentimos, na morte de certos artistas. Apesar de tudo, a arte e seus efeitos sobre nós continuarão, por mais algum tempo.
O pianista Maurizio Pollini, através de suas gravações, especialmente aquelas das décadas de 1970, 80 e 90, tem feito parte de meu universo musical desde o início e suas interpretações certamente ajudaram a moldar minhas preferências musicais.
O disco mencionado na postagem, dos concertos de Mozart, é de 1976, quando comecei a comprar meus primeiros LPs. Aqui está minha lista de joias, que levaria para aquela ilha deserta:
Estudos de Chopin (1972); Prelúdios de Chopin (1975); Últimas Sonatas para Piano de Beethoven (1976); Concertos de Mozart (1976) e Imperador, de Beethoven (1979), ambos com Böhm regendo a Filarmônica de Viena; Concertos para piano Nos. 1 e 2, de Bartók (1979), com Abbado regendo a Sinfônica de Chicago, o Quinteto com piano de Brahms (1980), com o Quarteto Italiano, as Sonatas para piano Nos. 2 e 3, de Chopin (1986); Últimas Sonatas para piano de Schubert (1989) e um disco no qual Pollini gravou ao vivo algumas Sonatas para piano de Beethoven, especialmente a Waldstein (1998). Os discos de Chopin ainda tenho em uma caixota, que tem também as Polonaises, feitos pela Microservice, Disco é Cultura.
Veja o que foi lembrado sobre o Pollini (nunca consegui chamá-lo Maurizio…) neste dia:
Harris Goldsmith, a critic who made a specialty of writing about the piano, called Mr. Pollini’s playing “almost entirely geometric” and said he was “a musical counterpart of Mondrian.” Harris Goldsmith, um crítico que se especializou em escrever sobre piano, chamou a interpretação de Pollini de “quase inteiramente geométrica” e disse que ele era “uma contraparte musical de Mondrian”.
Conductor and composer Boulez tried to describe Mr. Pollini for the New York Times in 1993. “He does not say very much, but he thinks quite a lot,” Boulez said. “I find him very concentrated on what he is doing. He goes into depth in the music, and is not superficial, and his attitude as a musician is exactly his attitude as a man. He is as interesting as anyone could be.” O maestro e compositor Boulez tentou descrever Pollini para o New York Times em 1993. “Ele não diz muito, mas pensa bastante”, disse Boulez. “Acho ele muito concentrado no que está fazendo. Ele se aprofunda na música, e não é superficial, e sua atitude como músico é exatamente sua atitude como homem. Ele é tão interessante quanto qualquer um poderia ser.”
Pollini não tocava música de Bach ao piano por razões intelectuais, uma vez que o compositor não as havia escrito para piano. Mas, para nossa fortuna, ele reconsiderou isso posteriormente.
“The important thing with him was the structure, the idea, and not so much the sound or the instrument,” Mr. Pollini told Newsday. “And Bach himself made many, many transcriptions of his work, taking it from one instrument and giving it to another. And so I finally decided that the piano was all right.” “O importante com ele era a estrutura, a ideia, e não tanto o som ou o instrumento”, disse Pollini ao Newsday. “E o próprio Bach fez muitas, muitas transcrições de sua obra, pegando-a de um instrumento e dando-a a outro. E então finalmente decidi que o piano estava bem.”
Graças a essa mudança de atitude temos uma gravação feita em 2009 do Primeiro Livro do Cravo Bem Temperado.
O disco com os Estudos de Chopin foi gravado em setembro de 1960 pela EMI, no famoso Studio No. 1, Abbey Road, Londres, mas não chegou a ser lançado na época. O produtor foi Peter Andry e o disco foi lançado em 2011 pelo selo Testament, em homenagem a Andry. Vale a pena a comparação com a agora consagrada gravação feita posteriormente, para o selo Deutsche Grammophon.
Além de grande artista, ele também esteve atento aos movimentos políticos, chegando a se filiar ao Partido Comunista Italiano por um tempo. “Corre-se o risco de estar em um compartimento fechado como um pianista de concerto”, disse Pollini em 1975. “Acho que um artista deve manter os olhos abertos para o que está acontecendo ao seu redor.”
Definitivamente, uma ótima sugestão para artistas e amantes das artes em geral.
Tive um colega no saudoso Jornal da Tarde que costumava dizer: “escrever sobre quem a gente admira é a coisa mais fácil do mundo; escrever sobre quem a gente ama e idolatra é a coisa mais difícil”. Sentado na frente do computador para tentar botar pra fora algo sobre Maurizio Pollini (1942-2024), que nos deixou ontem, só posso concordar contigo, meu caro Eduardo. Pollini sempre esteve lá, desde o começo, meu big bang particular, quando o tempo e o universo nasceram. Se a chama da música foi acesa na minha vida por dois outros pianistas, Vladimir Horowitz e Glenn Gould, em um par de CDs que meu irmão trouxe de uma viagem a Nova York, Pollini foi o primeiro amor, o primeiro herói, um símbolo daquilo de mais belo e precioso que a humanidade produziu nesse rochedo que vaga pelo Sistema Solar. Se comecei a entender o que era o mundo pelas doces vozes de meus pais e irmãos me acalentando, foi com os discos de Pollini que comecei a entender o que era a música, esse Mistério de beleza e verdade que expressa aquilo que não se pode colocar em palavras (e, muitas vezes, também aquilo que se pode).
E, puxa, que sorte imensa poder passar o resto da vida navegando e mergulhando no oceano de gravações que maestro Pollini deixou, num arco que perfaz uns bons quatrocentos anos de música — grande artista que é — eu ia escrever “foi”, mas a verdade é que um ser iluminado como Pollini sempre “é”, nunca deixará de “ser” —, explorou um universo que foi do barroco a compositores do nosso tempo.
Claudio Abbado, Luigi Nono e Maurizio Pollini: che trio!
Uma vida e uma carreira marcadas por integridade artística, respeito aos compositores, generosidade para com os colegas e, dando corpo a tudo isso, uma humildade de alguém que compreendeu que a arte é aquilo que nos salva da barbárie, que nos dá asas e nos torna imortais. Quando Pollini tocava, não era sobre ele, era sobre a música. Uma lição tão essencial, tão básica, e também tão esquecida nesses tempos de likes, engajamentos e que tais.
Sem querer escorregar e fazer desse texto um detestável “eubituário”, conto que tive a sorte de vê-lo algumas vezes, em diferentes salas na capital alemã, ao longo de nove anos. Sempre, em todas elas, me pegava olhando em volta, para a Philharmonie enchendo aos pouquinhos, ou sentindo o cheiro das novíssimas poltronas das Pierre Boulez Saal, e pensando: cacete, vou ver o Pollini! Era sempre um sonho virando realidade. E foi sempre absolutamente excepcional.
Pollini na Pierre Boulez Saal, em Berlim, 2019. Foto deste blogueiro
Dito tudo isto, que gravação escolher para homenageá-lo? É quase como se perguntar “qual tijolo escolho para mostrar a beleza e a grandiosidade da Muralha da China” ou qualquer coisa que o valha. Resolvi seguir o coração e trazer as Quatro Baladas do mestre polonês. Se de alguma forma Chopin personifica em sua obra o que é o piano, a beleza e as possibilidades desse maravilhoso instrumento, Pollini também o faz com o estupendo repertório de gravações que deixou. Não existe maior testemunho do que se pode fazer com essas 88 teclas do que o legado fonográfico de Maurizio Pollini.
E aqui Pollini voa pelas harmonias chopinianas como um condor cruzando a Cordilheira dos Andes! Que maravilha são essas baladas, que coisa assombrosa é o pianismo desse homem, e quanta beleza, quanta poesia… Pollini mostra que a dicotomia entre técnica e sensibilidade é uma falácia, é um dilema que simplesmente não existe quando se trata dos grandes mestres. Sua técnica é um negócio de outro planeta, mas nada soa como virtuosismo superficial. A arquitetura de uma sonata de Beethoven, de uma Mazurka de Chopin ou de um Klavierstück de Stockhausen ganha, em suas mãos, uma expressão límpida e viva, prenhe de sentido e de verdade. Se existe aquilo que chamam de Deus, é com certeza Pollini que ele(a) escuta quando chega do trabalho e se senta em sua nuvem preferida para ouvir algo belo e esquecer que deu merda com essa tal de humanidade.
1. Ballade No. 1 in G minor, Op. 23
2. Ballade No. 2 in F major, Op. 38
3. Ballade No. 3 in A flat major, Op. 47
4. Ballade No. 4 in F minor, Op. 52
5. Prelude Op. 45 in C sharp minor, No. 25
6. Fantasia in F minor, Op. 49
Maurizio Pollini, piano
Pollini em Varsóvia, logo após vencer o VI Concurso Internacional de Piano Chopin, em 1960
Maurizio Pollini faleceu hoje, dia 23 de março de 2024, aos 82 anos. Certamente, foi o pianista que mais ouvi tocar em meus 66 anos e o que maior prazer me causou. Meu pai começou tudo quando eu ainda era adolescente. Como esquecer da série de concertos de Mozart gravados por Pollini com Karl Böhm? Depois vieram seus imbatíveis Concertos para Piano de Brahms, a música moderna, as Sonatas de Schubert — sua Fantasia Wanderer… — as últimas Sonatas de Beethoven e depois a integral. E Debussy e Chopin. Eu não estou aqui para medir pianistas, mas não creio ter havido melhores do que S. Richter e Pollini. Ah, e como esquecer quando o vi em Londres? Como esquecer do discurso que minha mulher — uma muito talentosa e inteligente musicista — fez no intervalo, falando sobre como ele dava sentido a cada nota que tocava? O fato é que estou triste, apesar de termos registrados grandes momentos deste enorme artista. Jamais escreverei um RIP para ele, pois agora mesmo estou ouvindo estes CDs que ora posto. Não vou te deixar descansando, Maurizio. Esqueça.
Ludwig van Beethoven (1770-1827): Integral dos Concertos para Piano (Pollini / Abbado)
The Piano Concertos (Live Recordings)
Concerto For Piano And Orchestra No. 1 In C Major
1. Allegro Con Brio 17:16
2. Largo 11:13
3. Rondo. Allegro [Scherzando] 8:59
Concerto For Piano And Orchestra No. 2 In B Flat Major
1. Allegro Con Brio 13:33
2. Adagio 7:41
3. Rondo. Molto Allegro 7:31
Concerto For Piano And Orchestra No. 3 In C Minor
1. Allegro Con Brio 16:07
2. Largo 10:07
3. Rondo. Allegro 9:28
Concerto For Piano And Orchestra No. 4 In G Major
1. Allegro Moderato 17:18
2. Andante Con Moto 5:17
3. Rondo. Vivace 10:00
Concerto For Piano And Orchestra No. 5 In E Flat Major, “Emperor”
1. Allegro 20:29
2. Adagio Un Poco Moto – Attacca: 7:48
3. Rondo. Allegro 10:35
Maurizio Pollini, piano
Berliner Philharmoniker
Claudio Abbado
Uma música sublime aliada à imagem criada pelos retratos de um rechonchudo senhor com sua peruca reforça uma imagem de Bach como um homem maduro, já depois de seus sessenta anos, genial em sua consumada arte de compor obras primas perfeitas.
Claire Huangci
Mas houve um jovem Johann Sebastian que explorava seus talentos e sua virtuosidade nos teclados diversos, apossando-se das obras estabelecidas nas gerações precedentes e ensaiando suas próprias criações. As peças desse disco – toccatas – são desses anos de juventude. Veja o que diz sobre elas o ótimo Karl Geringer: Entre as obras que Bach produziu em seus anos de formação merecem menção uma fantasia e um grupo de toccatas. Ele sentia-se atraído pelo caráter livre e rapsódico dessas formas, que lhe ofereciam uma boa oportunidade para contrastes espetaculares entre as seções individuais. A lógica inflexível e as proporções bem equilibradas de composições ulteriores estão ausentes na maioria dessas peças, mas [elas] exibem o ardor e a fértil imaginação características do jovem gênio.
Como prelúdio ao conjunto das sete toccatas deixadas pelo jovem Bach, a ótima e também bastante jovem pianista Claire Huangci interpreta o arranjo para piano da famosa Toccata e fuga em ré menor feito por Ferruccio Busoni.
Johann Sebastian Bach (1685 – 1750)
Toccata e Fuga em ré menor, BWV565 (Arr. F. Busoni for piano)
O álbum começa com a tocata mais famosa da história da música, embora não seja o tipo de obra que estamos acostumados a ouvir tocada em uma gravação de piano solo. A transcrição de Ferruccio Busoni da mundialmente famosa Tocata de Ré menor de Bach, que pega a obra normalmente ouvida em um poderoso órgão barroco e a toca de maneira romantizada em um teclado de piano, fornece um início cativante, parecendo soprar as teias de aranha das teclas, aguçando o nosso apetite pelo Bach original e as suas sete tocatas. Todas foram escritas durante os anos de Bach em Weimar e dão-lhe vida como um compositor bem versado na arte séria do contraponto barroco, mas que contrasta esta maestria com execuções virtuosas e improvisadas e passagens lentas e sonhadoras. [tradução feita com a ajuda do Chat PQP]
Johann Sebastian Bach, se isto fosse possível, estaria completando hoje 339 anos de idade. Eu diria que são 339 anos muito bem vividos. Após um post mortem um tanto obscuro, Papai Bach retornou no século XIX para ocupar definitivamente o posto de um dos grandes gênios da humanidade, uma das provas de que o ser humano pode ser grandioso sem provocar guerras e violência.
Ouço Bach desde antes dos dez anos de idade, quando saí do banheiro aos gritos perguntando que música era aquela que meu pai pusera na vitrola — era o Concerto Nº 3 de Brandenburgo. Comemoro hoje com 5 gloriosos CDs na música de câmara de Bach fantasticamente bem interpretados por interpretados por Reinhard Goebel e sua turma, atualmente desfeita. O correto é comemorar com cerveja, pois Johann Sebastian a amava e produzia toneladas dela.
Não dá pra resistir ao timbre do violino barroco de Reinhard Goebel, e à precisão de Robert Hill. Impecável também está o violoncelista Jaap Ter Linden interpretando as Sonatas para Viola da Gamba.
Bach 339 anos !!! – Johann Sebastian Bach (1685-1750): Kammermusik 5 CDs (Musica Antiqua Köln / Reinhard Goebel)
CD 1
01 Sonata No 1 in B Minor for Violin and Harpsichord – BWV1014 – I. Adagio
02 Sonata No 1 in B Minor for Violin and Harpsichord – BWV1014 – II. Allegro
03 Sonata No 1 in B Minor for Violin and Harpsichord – BWV1014 – III. Andante
04 Sonata No 1 in B Minor for Violin and Harpsichord – BWV1014 – IV. Allegro
05 Sonata No 2 in A Major for Violin and Harpsichord – BWV1015 – I. [ohne Satzbezeichnung]
06 Sonata No 2 in A Major for Violin and Harpsichord – BWV1015 – II. Allegro assai
07 Sonata No 2 in A Major for Violin and Harpsichord – BWV1015 – III. Andante un poco
08 Sonata No 2 in A Major for Violin and Harpsichord – BWV1015 – IV. Presto
09 Sonata No 3 in E Major for Violin and Harpsichord – BWV1016 – I. Adagio
10 Sonata No 3 in E Major for Violin and Harpsichord – BWV1016 – II. Allegro
11 Sonata No 3 in E Major for Violin and Harpsichord – BWV1016 – III. Adagio ma non tanto
12 Sonata No 3 in E Major for Violin and Harpsichord – BWV1016 – IV. Allegro
13 Sonata No 4 in C Minor for Violin and Harpsichord – BWV1017 – I. Siciliano ( Largo)
14 Sonata No 4 in C Minor for Violin and Harpsichord – BWV1017 – II. Allegro
15 Sonata No 4 in C Minor for Violin and Harpsichord – BWV1017 – III. Adagio ma non tanto
16 Sonata No 4 in C Minor for Violin and Harpsichord – BWV1017 – IV. Allegro assai
17 Sonata No 5 in F Minor for Violin and Harpsichord – BWV1018 – I. Largo
18 Sonata No 5 in F Minor for Violin and Harpsichord – BWV1018 – II. Allegro
19 Sonata No 5 in F Minor for Violin and Harpsichord – BWV1018 – III. Adagio
20 Sonata No 5 in F Minor for Violin and Harpsichord – BWV1018 – IV. Vivace
01 Sonata for Violin and Harpsichord – BWV1019 – I. Allegro
02 Sonata for Violin and Harpsichord – BWV1019 – II. Largo
03 Sonata for Violin and Harpsichord – BWV1019 – III. Allegro
04 Sonata for Violin and Harpsichord – BWV1019 – IV. Adagio
05 Sonata for Violin and Harpsichord – BWV1019 – V. Allegro
06 Sonata for Violin and Harpsichord – BWV1020 – I. Ohne Satzbezeichnung
07 Sonata for Violin and Harpsichord – BWV1020 – II. Adagio
08 Sonata for Violin and Harpsichord – BWV1020 – III. Allegro
09 Sonata for Violin and Harpsichord – BWV1022 – I. Ohne Satzbezeichnung
10 Sonata for Violin and Harpsichord – BWV1022 – II. Allegro e presto
11 Sonata for Violin and Harpsichord – BWV1022 – III. Adagio
12 Sonata for Violin and Harpsichord – BWV1022 – IV. Presto
13 Fugue for Violin and Harpsichord – BWV1026 – Allegro
14 Suite for Violin and Harpsichord – BWV1025 – I. Fantasia
15 Suite for Violin and Harpsichord – BWV1025 – II. Courante
16 Suite for Violin and Harpsichord – BWV1025 – III. Entree
17 Suite for Violin and Harpsichord – BWV1025 – IV. Rondeau
18 Suite for Violin and Harpsichord – BWV1025 – V. Sarabande
19 Suite for Violin and Harpsichord – BWV1025 – VI. Menuett
20 Suite for Violin and Harpsichord – BWV1025 – VII. Allegro
21 Sonata for Violin and Bass Continuo – BWV1021 – I. Adagio
22 Sonata for Violin and Bass Continuo – BWV1021 – II. Vivace
23 Sonata for Violin and Bass Continuo – BWV1021 – III. Largo
24 Sonata for Violin and Bass Continuo – BWV1021 – IV. Presto
01 Sonata for Violin and Basso Continuo in E minor, BWV1023 – I – Adagio ma non tanto
02 Sonata for Violin and Basso Continuo in E minor, BWV1023 – II – Allemande
03 Sonata for Violin and Basso Continuo in E minor, BWV1023 – III – Gigue
04 Sonata for Violin and Basso Continuo in C minor, BWV1024 – I – Adagio
05 Sonata for Violin and Basso Continuo in C minor, BWV1024 – II – Presto
06 Sonata for Violin and Basso Continuo in C minor, BWV1024 – III – Affettuoso
07 Sonata for Violin and Basso Continuo in C minor, BWV1024 – IV – Vivace
08 Sonata for Violin and Basso Continuo in A major, BWV Anh.153 – I – Allegro
09 Sonata for Violin and Basso Continuo in A major, BWV Anh.153 – II – Largo
10 Sonata for Violin and Basso Continuo in A major, BWV Anh.153 – III – Allegro assai
11 Sonata for Violin and Basso Continuo in A major, BWV Anh.153 – IV – Adagio
12 Sonata for Violin and Basso Continuo in A major, BWV Anh.153 – V – Allegro
13 Sonata No.1 for Viola da Gamba and Harpsichord in G major, BWV1027 – I – Adagio
14 Sonata No.1 for Viola da Gamba and Harpsichord in G major, BWV1027 – II – Allegro ma non tanto
15 Sonata No.1 for Viola da Gamba and Harpsichord in G major, BWV1027 – III – Andante
16 Sonata No.1 for Viola da Gamba and Harpsichord in G major, BWV1027 – IV – Allegro moderato
17 Sonata No.2 for Viola da Gamba and Harpsichord in D major, BWV1028 – I – Adagio
18 Sonata No.2 for Viola da Gamba and Harpsichord in D major, BWV1028 – II – Allegro
19 Sonata No.2 for Viola da Gamba and Harpsichord in D major, BWV1028 – III – Andante
20 Sonata No.2 for Viola da Gamba and Harpsichord in D major, BWV1028 – IV – Allegro
01 Viola Da Gamba Sonata No. 3 – BWV1029 – I – Vivace
02 Viola Da Gamba Sonata No. 3 – BWV1029 – II – Adagio
03 Viola Da Gamba Sonata No. 3 – BWV1029 – III – Allegro
04 Sonata for Violin and Harpsichord – BWV1019a – I – Presto
05 Sonata for Violin and Harpsichord – BWV1019a – II – Largo
06 Sonata for Violin and Harpsichord – BWV1019a – III – Cantabile
07 Sonata for Violin and Harpsichord – BWV1019a – IV – Adagio
08 Sonata for Violin and Harpsichord – BWV1019a – V – Presto
09 Sonata No. 1 for Flute and Bass Continuo – BWV1033 – I – Andante-Presto
10 Sonata No. 1 for Flute and Bass Continuo – BWV1033 – II – Allegro
11 Sonata No. 1 for Flute and Bass Continuo – BWV1033 – III – Adagio
12 Sonata No. 1 for Flute and Bass Continuo – BWV1033 – IV – Menuett I,II
13 Sonata No. 2 for Flute and Bass Continuo – BWV1034 – I – Adagio
14 Sonata No. 2 for Flute and Bass Continuo – BWV1034 – II – Allegro
15 Sonata No. 2 for Flute and Bass Continuo – BWV1034 – III – Andante
16 Sonata No. 2 for Flute and Bass Continuo – BWV1034 – IV – Allegro
17 Sonata No. 3 for Flute and Bass Continuo – BWV1035 – I – Adagio
18 Sonata No. 3 for Flute and Bass Continuo – BWV1035 – II – Allegro
19 Sonata No. 3 for Flute and Bass Continuo – BWV1035 – III – Siciliano
20 Sonata No. 3 for Flute and Bass Continuo – BWV1035 – IV – Allegro assai
01 Partita for Solo Flute in A minor – BWV1013 – I – Allemande
02 Partita for Solo Flute in A minor – BWV1013 – II – Corrente
03 Partita for Solo Flute in A minor – BWV1013 – III – Sarabande
04 Partita for Solo Flute in A minor – BWV1013 – IV – Bouree (Anglaise)
05 Sonata No.1 for Flute and Harpsichord in B minor – BWV1030 – I – Andante
06 Sonata No.1 for Flute and Harpsichord in B minor – BWV1030 – II – Largo e dolce
07 Sonata No.1 for Flute and Harpsichord in B minor – BWV1030 – III – Presto-Allegro
08 Sonata No.2 for Flute and Harpsichord in Eb major – BWV1031 – I – Allegro moderato
09 Sonata No.2 for Flute and Harpsichord in Eb major – BWV1031 – II – Siciliano
10 Sonata No.2 for Flute and Harpsichord in Eb major – BWV1031 – III – Allegro
11 Sonata No.3 for Flute and Harpsichord in A major – BWV1032 – I – Vivace
12 Sonata No.3 for Flute and Harpsichord in A major – BWV1032 – II – Largo e dolce
13 Sonata No.3 for Flute and Harpsichord in A major – BWV1032 – III – Allegro
Reinhard Goebel – Violin
Robert Hill – Cembalo
Jaap Ter Linden – Cello
Henk Bouman – Cembalo
Wilbert Hazelzet – TransversFlöte
Amanhã tem níver de Papai Bach. São 339 anos entre nós. Então, nada como um Hantaï para comemorar. Ele é um dos principais mensageiros de Bach em nosso conturbado planeta. Não há muito o que pensar aqui. Há uma escassez mundial de bons cravistas — por alguma razão, todo mundo parece estar gravando Bach no piano — mas simplesmente não há comparação, toda a beleza das obras para teclado de Bach só são reveladas no cravo, na minha opinião. Hantaï é um apaixonado por essa música e este é um notável CD. Hantaï revela um enorme amor por essa música — atributo não tão comum quanto você imagina — e nos traz esplêndidas interpretações delas. E não esqueça: Bach é comemorado com cerveja! Sempre!
J. S. Bach (1685-1750): Toccatas BWV 913-5 / Suite “aufs Lautenwerk” BWV 996 / Sonata BWV 964 (Hantaï)
Suite For Lute In E Minor, Bwv 996 (Bc L166) (15:12)
1 1. Praeludio (Passagio – Presto) 2:13
2 2. Allemande 3:05
3 3. Courante 2:20
4 4. Sarabande 3:55
5 5. Bourrée 0:58
6 6. Gigue 2:32
7. Prelude For Keyboard In D Major (Six Little Preludes No. 4), Bwv 936 (Bc L67) 1:41
Toccata For Keyboard In D Minor, Bwv 913 (Bc L144) (14:04)
8 [Introduction] 0:45
9 [Adagio] 2:06
10 Thema 3:31
11 [Adagio] 3:24
12 Allegro 4:11
Toccata For Keyboard In E Minor, Bwv 914 (Bc L145, 163) (7:24)
13 [Introduction] 0:34
14 Un Poco Allegro 1:33
15 Adagio 1:58
16 Fuga: Allegro 3:08
17 Fantasia For Keyboard In G Minor, Bwv 917 (Bc L140) 2:13
Toccata For Keyboard In G Minor, Bwv 915 (Bc L148) (9:14)
18 [Presto] – Adagio 1:16
19 Allegro – Adagio 3:40
20 Fuga 4:16
Sonata Arranged For Keyboard In D Minor (after Bwv 1003, Possibly By J.G. Müthel), Bwv 964 (Bc L184) (22:09)
21 Adagio 3:46
22 Thema: Allegro 6:59
23 Andante 5:39
24 Allegro 5:40
Ouvi este disco umas 4 vezes. Fiquei bem feliz de ouvi-lo, mas nada permaneceu na minha cabeça. Nada. Parece ser o CD ideal para se pensar em outra coisa sem ser muito incomodado. Não pensem que isto é uma critica. Se fosse, não o teria ouvido tantas vezes. O grande Georg Tintner não se importa em “chafurdar na névoa impressionista”. Ele mostra um Delius muito lírico e sutil, com harmonias lindas que nos fazem sonhar ou dormir. O concerto para violino é, como diz Tanya Tintner no encarte, uma espécie de solilóquio meditativo para violino e orquestra que deveria soar como “uma improvisação maravilhosa”. É bastante cansativo para o instrumentista, pois o violinista tem que tocar durante a maior parte da peça, mas não é uma demonstração de virtuosismo, mas sim de musicalidade. Philippe Djokic toca a obra de modo convincente.
Frederick Delius (1862-1934): Concerto para Violino e outras peças (Tintner)
1 Irmelin – Prelude 4:47
2 Koanga – La Calinda 4:32
3 A Village Romeo and Juliet – The Walk to the Paradise Garden 11:30
4 Fennimore and Gerda – Intermezzo 5:28
Violin Concerto
5 With moderate tempo – 05:38
6 Maestoso – 15:13
7 Allegretto 06:43
8 On Hearing the First Cuckoo in Spring 7:48
9 Summer Night on the River 6:13
10 Sleigh Ride 6:20
Recorded At – Cathedral Church Of All Saints, Halifax
Violin – Philippe Djokic
Conductor – Georg Tintner
Orchestra – Symphony Nova Scotia
O compositor francês Francis Poulenc (1899-1963) é injustamente uma presença pouco frequente pelos programas de concerto mundo afora, apesar de ser um compositor de primeiríssima linha, com obras de diversos estilos e formações. Este disco joga luz sobre uma faceta cintilante da música de Poulenc, suas obras sacras, com dois verdadeiros tesouros: o Gloria (1960), uma de suas peças mais festejadas, e o Stabat Mater (1950).
O mestre PQP Bach já declarou sua admiração por esse repertório neste belíssimo disco de Richard Hickox, Catherine Dubosc, Westminster Singers e a City of London Sinfonia. Já o discaço de hoje vem do outro lado do Atlântico, com um time de muito respeito: a soprano Kathleen Battle, o coro do Festival de Tanglewood e Seiji Ozawa à frente da Orquestra Sinfônica de Boston. Tem coisas que só a Deutsche Grammophon faz por você, não é mesmo?
Estreia de Seiji Ozawa com a Sinfônica de Boston, Tanglewood, 1964
Gloria, para soprano, coro e grande orquestra, é baseado no texto de mesmo nome do Ordinário da Missa segundo o rito romano. Foi uma encomenda da Fundação Koussevitsky em homenagem ao regente Sergei Koussevitsky — que foi diretor da Sinfônica de Boston por um quarto de século — e sua esposa Natalia. A orquestra, aliás, foi responsável pela estreia da obra, em 1961, sob regência de Charles Munch. Uma obra interessantíssima, de cores stravinskyanas.
Já o Stabat Mater coloca em cena a prece (ou sequentia, para ser mais exato) católica de mesmo nome que narra as dores de Maria durante a crucificação de Cristo. Também para soprano, coro e orquestra, é dividido em doze partes e joga muito com as estruturas e formações (o coro chega a soar a capella mais de uma vez), com texturas que se desdobram umas dentro das outras. Deve ser uma experiência e tanto escutá-la ao vivo…
Enfim, um disco muito bom, de sonoridade brilhante e muita beleza. Pessoal de Boston na ponta dos cascos, um coro inspirado e Ozawa — um gigante da batuta que nos deixou no último dia 6 de fevereiro, aos 88 anos — at his finest. Meu destaque pessoal fica por conta do arraso que é a interpretação de Kathleen Battle, com sua linda voz de timbre quente, como se fosse um anjo divino anunciando palavras sagradas de algum lugar fora do tempo.
1 – Gloria in excelsis Deo
2 – Laudamus te
3 – Domine Deus, Rex coelestis
4 – Domine Fili, Domine Deus
5 – Domine Deus, Agnus Dei
6 – Qui sedes ad dexteram Patris
Stabat Mater
7 – Stabat Mater dolorosa
8 – Culus animam gementem
9 – O quam tristis
10 – Quae moerebat
11 – Quis est homo
12 – Vidit suum
13 – Eia, Mater
14 – Fac ut ardeat
15 – Sancta Mater
16 – Fac ut portem
17 – Inflammatus et accensus
18 – Quando corpus morietur
Kathleen Battle, soprano
Tanglewood Festival Chorus
Boston Symphony Orchestra
Seiji Ozawa, regência
Kathleen Battle: que voz!
PS: Você sabia que o simpático teatro do Festival de Tanglewood, em Lenox, Massachussets, se chama Seiji Ozawa Hall?
Nada como tomar um mate e comer Pastelinas ao cair da tarde em Massachusets ouvindo um Poulenc dos bons
Além de ser um extraordinário maestro, Leonard Slatkin é uma subcelebridade do twitter (ou X). Ele costuma divulgar as capas mais horrendas de discos de vários gêneros. Também conta piadas e comemora encontros com os maiores músicos, coisa normal em sua vida. E, por trás de tantos interesses e alegria esconde-se um espetacular artista. Haitink e Mravinsky estabeleceram padrões de referência tão elevados para as gravações desta sinfonia que apenas uma leitura excepcional ou que apresente a obra sob uma nova luz válida pode esperar competir. Slatkin não bate os citados, mas chega bem próximo. As partes mais tranquilas estão lindas, mas aquelas que são mais febris ou urgentes são subestimadas. Vale a audição, sem dúvida. Eu curto muito este CD.
Leonard Slatkin
D. Shostakovich: Sinfonia N° 8 (Slatkin)
1 Adagio; Allegro; Adagio 26:30
2 Allegretto 6:12
3 Allegro Non Troppo 5:55
4 Largo 9:43
5 Allegretto 13:06
Composed By – Dmitri Shostakovich
Conductor – Leonard Slatkin
Orchestra – Saint Louis Symphony Orchestra
Nos vídeos abaixo, você pode saber exatamente do que se trata. A surpresa é que você pode usar o cupom PQPBACH e receber 30% de desconto no concerto do dia 21 de março aqui em Porto Alegre, cidade de PQP Bach… Alguma vantagem nós, porto-alegrenses, merecemos ter. Afinal, já basta a gente sofrer há quase 4 anos com um bolsonarista na prefeitura. Mil vezes 339 anos com Bach do que 4 com o Melo.
Ah, e Bach se comemora com cerveja. Ele a amava e produzia em quantidades industriais — música e cerveja.