Daremos um tempo na nossa integral de Lud Van para postarmos… bem, uma integral de Lud Van.
Nem chegamos, enfim, aos idos de março, e não desejamos que nossa tarefa de postar a obra completa do rabugento renano se conclua muito antes da data máxima dos beethovenitas, em dezembro. Ainda que sua obra seja consideravelmente extensa, Beethoven não foi um Telemann – e ainda bem, pois a integral deste sim tomar-me-ia algumas décadas de postagens, quiçá até chegar minha aposentadoria, se minha triste carcaça durar até lá.
Antes tivesse eu levado a sério o piano, e chegado aos pés da aspiração de tocar como um Paul Badura-Skoda, outro que não chegou a saber o que é aposentadoria, por ter mantido a carreira de recitalista até meses antes de falecer no ano passado, dias antes de completar generosos noventa e dois anos. O grande mestre vienense foi o único pianista a legar-nos registros integrais das sonatas de Mozart, Beethoven e Schubert tanto em pianos modernos quanto em instrumentos históricos. Sua Beethoveniana em pianos contemporâneos ao compositor, gravada entre os anos 70 e 80 e lançada pelo interessante selo Astrée na década de 90, será nosso escopo nos próximos dias.
Começaremos, claro, pelo começo – pelo menos o começo que não leva em conta as diminutas sonatas dedicadas ao Eleitor de Colônia por um Ludwig menino, e sim a respeitável trinca publicada como Op. 2 e dedicada a seu professor, Joseph Haydn. Estas obras sempre me pareceram exigir o pianoforte, e Badura-Skoda (doravante referido como PBS) defende-as com muito brio no teclado de um instrumento vienense construído por Johann Schantz na década de 1790. Aos muitos entre vós outros que têm ranços quanto ao som às vezes inconsistente dos instrumentos antigos, eu peço um voto de confiança, e que me digam se este pianoforte bicentenário não está mesmo batendo um bolão.
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
Três Sonatas para piano, Op. 2
No. 1 em Fá menor
1 – Allegro
2 – Adagio
3 – Menuetto and Trio (Allegretto)
4 – Prestissimo
No. 2 em Lá maior
5 – Allegro vivace
6 – Largo appassionato
7 – Scherzo: Allegretto
8 – Rondo: Grazioso
No. 3 em Dó maior
9 – Allegro con brio
10 – Adagio
11 – Scherzo: Allegro
12 – Allegro assai
Paul Badura-Skoda, fortepiano (Johann Schantz, Viena, ca. 1790)
Após a composição das duas sonatas anteriores, ditas para Hammerklavier, ambas com quatro movimentos, sendo que a segunda delas alcançou todos os limites da forma sonata, estabelecendo novos patamares, o que fazer mais? Como prosseguir daqui? Pois a resposta genial veio com a composição de um conjunto de três sonatas que guardam cada uma delas enorme individualidade. Em um sentido, uma volta à proporções menores, mas com uma renovada liberdade. A palavra que me ocorre sempre que penso nestas três sonatas é transcendência. Nelas Beethoven exercita uma enorme flexibilidade e demonstra ainda uma concentrada dose de criatividade. Resumindo: sublimes.
Duas destas sonatas terminam em variações e uma delas em uma fuga. O lirismo também está presente. Não foram as últimas composições para piano do genial Ludovico, mas com elas ele definitivamente terminou o ciclo de sonatas.
Considero essas três peças indispensáveis e já as ouvi inúmeras vezes, com muitos intérpretes. Mas nunca me canso delas. Gosto muitíssimo das gravações do Kovacevich (Philips e EMI), gosto mais da última gravação (creio que ao vivo) do Brendel para a Philips, da gravação menos conhecida da pianista Inger Södergren, no selo Calliope. As Sonatas Nos. 30 e 31 foram gravadas pelo Emil Gilels na Deutsche Grammophon. Alas, ele não chegou a gravar a última sonata, transcendeu. Mas hoje, o dia é de Igor Levit e espero que você, caso tenha chegado até aqui, desfrute também desta gravação e lembre-se da enorme evolução alcançada por um dos maiores compositores de que temos notícia.
Vivat, vivat Beethoven!!
Desenho feito por August von Klöber
Ludwig van Beethoven (1770-1827)
Sonata para piano No. 30 em mi maior, Op. 109
Vivace ma non troppo
Prestissimo
Gesangvoll, mit innigster Empfindung. Andante molto cantabile ed expressivo
Sonata para piano No. 31 em lá sustenido maior, Op. 110
Moderato cantabile molto expressivo
Allegro molto
Adagio ma non troppo – Fuga. Allegro ma non troppo
Esta jornada teria sido impossível sem a condução impecável deste notável pianista e cidadão, Igor Levit! Você poderá ler uma curta entrevista com ele aqui.
Postar-lhes uma hora de música para mostrar-lhes alguns minutos de Beethoven? Seria mais ou menos como trazer uma baleia à sala de visitas para apontar-lhe uma pequena craca no espiráculo – se, pô, a música não fosse a de Mozart e seu intérprete não fosse o insubstituível Arthur Rubinstein.
Ludwig, como sabemos, consolidou-se primeiramente em Viena como pianista virtuose e improvisador. Dessa forma, é muito natural que, além de cavalos de batalha criados por ele próprio, ele lançasse mão do manancial de concertos de Mozart para pavonear seu talento nos palcos. Muito provavelmente as dificuldades propostas pelo mestre de Salzburgo não lhe fizessem qualquer prurido nos dedos, então se entende que Beethoven pudesse soltar suas asinhas pianísticas durante as cadências que Mozart permitia improvisar nos primeiros e terceiros movimentos de seus concertos. De todas as cadências que ele imaginou e tocou, apenas duas – para o magnífico concerto em Ré menor, K. 466 – foram anotadas e chegaram aos nossos dias, e nos abrem uma janela para a experiência certamente extraordinária de ver o maior improvisador de seu tempo meditando lubricamente sobre temas de um de seus modelos. Enquanto eu buscava uma gravação para mostrá-las para vocês, dei-me conta de que, surpreendentemente, a mozartiana de Artur Rubinstein nunca tinha sido publicada por aqui. Assim, resolvi trazer-lhes, além das cadências de Beethoven no seio do concerto em Ré menor, outros quatro concertos do boquirroto salisburguense sob as mãos do magistral pianista que nasceu naquele lugar pitoresco cujo nome a gente escreve “Łódź” e lê como “uúdj”.
A postagem vai como agrado ao querido e incansável colega FDP Bach, que estava de aniversário e, como bem sei, aprecia e muito estas essenciais gravações, cuja série completarei amanhã.
Wolfgang Amadeus MOZART (1756-1791)
Concerto para piano no. 20 em Ré menor, K. 466 Cadências: Ludwig van Beethoven(WoO 58) 1 – Allegro
2 – Romance
3 – Allegro assai
Concerto para piano no. 21 em Dó maior, K. 467 Cadências: Arthur Rubinstein (1887-1982)
4 – Allegro maestoso
5 – Andante
6 – Allegro vivace assai
Mais um pacotinho de variações para piano, do mesmo naipe daquelas que acompanharam a obra de estreia, e pelo mesmo intérprete, o austríaco Rudolf Buchbinder. Quase todas seguem o script de tema (normalmente uma canção em voga na época, hoje fascinantemente obscura) e variações figurativas, sem alterações rítmicas ou harmônicas dignas de nota – todo um universo, portanto, a apartá-las das geniais Variações Diabelli que viriam quase quarenta anos depois. Para concluir, uma enigmática série sobre uma canção um pouco perturbadora em que um sujeito convida uma moça para entrar em sua cabaninha. Alguns estudiosos não se convenceram de que a peça é da lavra de Beethoven. Kinsky e Halm preferiram não lhe atribuir sequer um número de WoO, lançando-a no apêndice (Anh.) de seu catálogo. Outros, incluindo o intérprete, Rodolfo Encadernador, têm certeza em atribuir a obra ao mestre renano pelo simples fato de que ela parece ter seu estilo e não há prova bastante de que ele não a tenha escrito. Eu acho que ela é, sim, de Beethoven – e vocês, que acham?
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
1 – Nove variações em Lá maior sobre “Quant’e piu bello”, da ópera “La Molinara” de Giovanni Paisiello, WoO 69 (1795)
2 – Seis variações em Sol maior sobre “Nel cor più non mi sento”, da ópera “La Molinara” de Giovanni Paisiello, WoO 70 (1795)
3 – Doze variações em Lá maior sobre a Dança Russa do balé “Das Waldmädchen” de Paul Wranitzky, WoO 71 (1796–7)
4 – Oito variações em Dó maior sobre “Une Fièvre Brûlante”, da ópera “Richard Coeur-de-Lion” de André Ernest Modeste Grétry, WoO 72 (1795)
5 – Dez variações em Si bemol maior sobre “La stessa, la stessissima” da ópera “Falstaff” de from Antonio Salieri, WoO 73 (1799)
6 – Sete variações em Fá maior sobre “Kind, willst du ruhig schlafen”, da ópera “Das unterbrochene Opferfest” de Peter Winter, WoO 75 (1799)
7 – Oito variações em Fá maior sobre “Tändeln und scherzen”, da ópera “Soliman II” de Franz Xaver Süssmayr, WoO 76 (1799)
8 – Seis variações fáceis em Sol maior sobre um tema original, WoO 77 (1800)
9 – Oito variações em Si bemol maior sobre “Ich hab’ ein kleines Hüttchen nur”, WoO Anh. 10
O conjunto não existe sem as partes, e as grandes orquestras não existem, por óbvio, sem ótimos músicos. Vários são os exemplos de instrumentistas que marcaram época em seus conjuntos, como o Marcel Tabuteau, o grande solista de oboé da Philadelphia Orchestra sob Stokowski e Ormandy por mais de quarenta anos, e o fenomenal Dennis Brain, trompista da Philharmonia Orchestra, precocemente falecido. Também não é incomum que alguns deles embarquem em carreiras solísticas que nos levem a esquecer de seu passado em orquestras, como fizeram o flautista James Galway e a clarinetista Sabine Meyer, ex-integrantes da Filarmônica de Berlim. Não é raro, também, que haja encontros como o deste disco, em que três grandes músicos da Orchestre de Paris dividem a ribalta com seu então regente, e aqui pianista, Daniel Barenboim.
O trio para a combinação incomum de piano, fagote e flauta, composto aos quinze anos de vida de Beethoven, é uma de suas obras mais claramente mozartianas. Barenboim – no auge de sua forma ao piano, que hoje me parece relegado a um segundo plano em seus interesses – faz-se acompanhar de Michel Debost, expoente da grande escola francesa da flauta e sucessor de Jean-Pierre Rampal na cátedra do Conservatório de Paris, e do excelente fagotista André Sennedat, num registro que é um deleite de escutar. O disco conclui com uma rara oportunidade de ouvir Myron Bloom, legendário trompista da Cleveland Orchestra, tocando música de câmara. Tido como “imexível” e inegociável pelo generalíssimo George Szell, que sabia de sua importância não só para o naipe mas para todos os sopros de sua orquestra. Quando Szell morreu, e a orquestra passaria para a batuta de Lorin Maazel, Barenboim convidou Bloom para mudar-se de mala, cuia e trompa para Paris, onde assumiria a Orchestre local. Bloom arrependeu-se azedamente da escolha, por odiar os colegas da orquestra, apesar de toda rasgação de seda de Barenboim, que era tão fã de seu timbre que creditava os solos do trompista nas gravações e concertos que faziam juntos. Quanto a mim, depois de quase intoxicá-los com tantas versões da sonata para trompa escrita para o infame Punto, talvez vocês me mandem pra dentro de uma se ouvirem, uma vez mais, a fanfarra inicial. Myron Bloom, no entanto, vale a pena, e espero que os leitores-ouvintes também achem o mesmo ao ouvirem esta homenagem que prestamos ao distinto artista, falecido em 2019, aos 93 anos.
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
Trio em Sol maior para piano, flauta e fagote, WoO 37 (1786)
1 – Allegro
2 – Adagio
3 – Andante con variazioni
Michel Debost, flauta André Sennedat, fagote Daniel Barenboim, piano
Sonata em Fá maior para trompa e piano, Op. 17 (1800)
4 – Allegro moderato
5 – Poco adagio, quasi andante
6 – Rondo. Allegro moderato
Chegamos ao terceiro período de composição de Beethoven. O compositor agora praticamente surdo comunica-se com seus amigos pelos cadernos de conversação. Esta condição e o surgimento de instrumentos com um teclado estendido certamente influenciaram sua maneira de compor. Isto marcaria as suas últimas cinco sonatas.
A Sonata No. 28 em lá maior Op. 101 foi composta em 1818, quando Beethoven passava uns dias em Baden, cidade perto de Viena. No nome desta sonata, Beethoven colocou a palavra Hammerklavier, para indicar que a sonata havia sido escrita para este novo instrumento, assim como fez na outra sonata deste disco: a Grösse Sonate für das Hammerklavier, que para nós e todo o mundo ficou conhecida como a ‘Hammerklavier’. Assim como o fez no caso da Sinfonia Eroica, ao compor esta sonata Beethoven expandiu os limites da forma como nunca havia sido nem imaginado. Demoraria muito para que outras sonatas surgissem com o escopo desta. Para termos uma ideia de sua magnitude, foi composta em 1818, mas apenas em 1836 foi apresentada publicamente, por ninguém menos do que Franz Liszt, na Salle Erard, Paris.
What is greatness in music? Before we talk about spiritual greatness, let us establish this: The art of music also has a physical size – width, height, circumference, time, density, weight, appearance and expression. When Ludwig van Beethoven announced his B Major Sonata op. 106 as a great one, his greatest, even (before a single note had been written down), he meant everything: No other sonata from his pen is longer, more compact in sound, fingering or compositional technique, no other is more comprehensive in the sense of the genres it contains – symphony, aria, choir, dance, fugue. And yet, it is conceived, explored and taxed entirely from the perspective of the piano: piano sound and piano playing that tests all limits, even the suggestive ones. Written between the final symphonies, it aspires to their public relevance and resonance – but as a piano work, as a statement of the individual.
A sonata foi dedicada ao Arquiduque Rodolfo, patrono, aluno e grande amigo de Beethoven. Dizem, os primeiros acordes da sonata seriam uma alusão à frase ‘Vivat, vivat Rudolfo’!
The first bar of Beethoven’s ovational Hammerklavier-Sonata is accompanied with the singing of “Vivat, vivat, Rodolfo”. The composer dedicated his opus 106 to the Archduke Rudolf of Habsburg.
Os textos em inglês são citações de um programa de concerto que pode ser lido na íntegra aqui.
Nesta penúltima postagem das Sonatas para Piano de Beethoven, com a intenção de lembrar com ênfase a passagem de 2020, ano que marca os 250 anos de nascimento do grande Ludovico, gostaria de prestar também uma homenagem ao pianista Igor Levit. Além de enorme artista, como essas suas interpretações atestam, mesmo quando o resultado não cai exatamente ao gosto do ouvinte, Levit destaca-se por sua atitude como ser humano, num mundo tão carente de pessoas de destaque cultural que se posicionem com clareza em relação a tantos temas sociais e políticos. Quando um artista deste quilate recebe um prêmio por esse tipo de atuação, é preciso reconhecer. Assim, hats off para o Levit.
Você poderá ler o artigo que conta como Igor Levit ganhou o ‘Beethovenpreis de Bonn’ por seu compromisso social e político na íntegra aqui.
Ludwig van Beethoven (1770-1827)
Sonata para piano No. 28 em lá maior, Op. 101
Etwas lebhaft und mit der innigsten Empfindung
Marschmässig
Langsam und sehnsuchtsvoll
Geschwind, doch nicht zu sehr, und mit Entschlossenheit
Sonata para piano No. 29 em si bemol maior, Op. 106 ‘Hammerklavier’
Allegro
Assai vivace
Adagio sostenuto. Appassionato e con molto sentimento
Essas três pequenas sonatas compostas em Bonn por um Beethoven menino (doze anos!) e dedicadas ao príncipe-eleitor de Colônia (em alemão, Kurfürst) são normalmente ignoradas no cômputo de suas sonatas para piano. Sou da opinião de que elas merecem ser conhecidas, nem que seja para perceber os primeiros lampejos de brilho do garoto que se aventurava ambiciosamente na sonata-forma, e reconhecer as manifestações mais precoces dos cacoetes de Ludwig em sua escrita para o teclado. Jörg Demus – o mais discreto dos integrantes da troika pianística vienense, completada por Friedrich Gulda e Paul Badura-Skoda – traz-nos uma leitura muito bonita, com sua característica precisão elegante, muito embora eu ache que estas sonatinhas exijam o som mais pungente, que eu sei que não é do gosto de todos, do pianoforte. A gravação prossegue com duas sonatinas, a segunda delas completada por Ferdinand Ries (1784-1838), aluno e amigo do compositor, e termina com mais uma fieira de pequenas peças avulsas para piano, incluindo uma écossaise (WoO 23) originalmente escrita para banda marcial, mas que sobrevive tão só num arranjo para piano feito por Carl Czerny (outro pupilo e amigo) e que fica menos estranha aqui que no meio de seus pares, que publicaremos oportunamente.
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
Três sonatas para piano, WoO 47, “ao Eleitor” (Kurfürstensonaten) Compostas entre 1782-1783 Publicadas em 1783 Dedicadas a Maximilian Friedrich, Eleitor de Colônia
No. 1 em Mi bemol maior
1 – Allegro cantabile
2 – Andante
3 – Rondo vivace
No. 2 em Fá menor
4 – Larghetto maestoso – Allegro assai
5 – Andante
6 – Presto
No. 3 em Ré maior
7 – Allegro
8 – Menuetto – Sostenuto
9 – Scherzando: Allegretto, ma non troppo
Jörg Demus, piano
Sonata para piano em Fá maior, WoO 50 (1790-1792)
10 – Sem indicação de andamento
11 – Allegretto
Sonata para piano em Dó maior, WoO 51 (1790-1792), completada por Ferdinand Ries
12 – Allegro
13 – Adagio
14 – Allemande em Lá maior, WoO 81 (1793)
15 – Valsa em Mi bemol maior, WoO 84 (1824)
16 – Valsa em Ré maior, WoO 85 (1825)
17 – Écossaise em Mi bemol maior, WoO 86 (1825)
Gianluca Cascioli, piano
18 – Écossaise em Sol maior para banda marcial, WoO 23 (1810)
Arranjo de Carl Czerny para piano
Quando se trata da Música de Câmera de Beethoven, sempre nos vem à mente os magníficos Quartetos de Cordas, ou as Sonatas para Violino ou então para Violoncelo. Se esquece de outras preciosidades, por algum motivo desconhecido ignorados pelas gravadoras. A não ser que você queira encarar uma Integral de suas obras pela DG, fica difícil o acesso a estas obras.
Estou me propondo a postar estas obras desconhecidas, com formações um tanto quanto diferentes, muitas vezes obras de juventude, sem opus definido, que o próprio Beethoven não considerava a altura de sua obra. Ou até mesmo seus editores não consideravam. As gravações sempre farão parte da Coleção Integral das Obras de Beethoven, publicadas pela Deutsche Grammophon. Claro que isso significa um time de craques como solistas.
Cito abaixo passagem da biografia escrita por Solomon, referente a estes quartetos para piano que estou postando: “Os três Quartetos para Piano e Cordas, WoO 36 (1785), são no estilo de Mozart, cuja música se tornou mais popular depois da subida de Max Franz ao trono em 1784. O Quarteto em mi bemol é francamente modelado pela Sonata para violino, KV 379, de Mozart, devendo-lhe algumas de suas mais belas passagens; enquanto que , segundo Douglas Johnsonn, os Quartetos em dó é ré se baseiam mais sutilmente nas sonatas KV 296 e KV 380, respectivamente. Os movimentos finais são em forma rondó, Beethoven nunca publicou essas obras, possivelmente por seu considerável débito para com Mozart e por serem as partituras tão completamente dominadas pelo piano. Entretanto, é evidente que tinha por elas grande apreço, porquanto contém um certo número de idéias melódicas originais em que se apoiou em Viena para as Sonatas op. Nºs 1 e 3, a Sonata Patética, op. 13, e o finale da Sonata, op. 27, nº1.” Lembrando que Beethoven tinha apenas 15 anos de idade quando compôs estes quartetos. Não se pode esperar maiores genialidades, mas sim uma tentativa de começar a criar uma identidade própria. O que posso considerar de destaque nestas obras é realmente a predominância do piano, instrumento favorito de Beethoven.
Ludwig van Beethoven – Quartetos para Piano, Violino, Viola e Violoncelo, WoO 36
1. Piano Quartet No. 1 in E flat major: 1. Adagio assai – attacca:
2. Piano Quartet No. 1 in E flat major: 2. Allegro con spirito
3. Piano Quartet No. 1 in E flat major: 3. Tema. Cantabile – Variazioni 1-VI – Tema. Allegretto
4. Piano Quartet No. 2 in D major: 1. Allegro moderato
5. Piano Quartet No. 2 in D major: 2. Andante con moto
6. Piano Quartet No. 2 in D major: 3. Rondo. Allegro
7. Piano Quartet No. 3 in C major: 1. Allegro vivace
8. Piano Quartet No. 3 in C major: 2. Adagio con espressione
9. Piano Quartet No. 3 in C major: 3. Rondo. Allegro
Christoph Eschenbach – Piano
Members of Amadeus Quartet:
Norbert Brainin – Violine
Peter Schidlof – viola
Martin Lovett – Cello
Peso-plumíssima esse volume de nossa beethoveniana, completamente dedicada a obras para sopros menos votadas do compositor, muitas delas relegadas às pilhas de papel até depois de sua morte. Os duos para clarinete e fagote são tão fofinhos quanto estranhos, e não surpreende que haja seriíssimas dúvidas acerca de sua autoria (uma pista são as indicações de andamento, totalmente atípicas para Beethoven). O breve quinteto com a curiosa colaboração entre um oboé, um fagote e um trio de trompas dá a impressão de ter sido composto às pressas, sem muito tempo para desenvolver as ideias e explorar os timbres dos instrumentos. O Adagio para três trompas é ainda mais breve, e aqui serve como prelúdio para a obra de mais substância da gravação, os três curtos e solenes Equale (que, na incerteza sobre a denominação do gênero em português, resolvi chamar de “Iguais”, que são sua tradução em latim e italiano). Escritos para serem tocados da torre da catedral de Linz no dia de finados de 1812, têm desde então aparecido em várias exéquias – inclusive no funeral do próprio Beethoven, ocasião em que foram ouvidos tanto no original para quatro trombones quanto num arranjo vocal de Ignaz Seyfried (1776-1841), iniciado no dia em que se ministrou a extrema-unção ao compositor. Apesar da curiosidade de escutar a versão de Seyfried, nunca a ouvi, nem a encontrei em qualquer gravação – mas eu tenho a partitura e, se outros três barítonos se dispuserem, talvez possamos dar um jeito nisso. Se a ideia lhes apetece, deixem-me saber nos comentários.
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
Três Duos para clarinete e fagote, WoO 27
No. 1 em Dó maior
1 – Allegro comodo
2 – Larghetto sostenuto
3 – Rondo: Allegretto
No. 2 em Fá maior
4 – Allegro affettuoso
5 – Aria: Larghetto
6 – Rondo: Allegretto moderato
No. 3 em Si bemol maior
7 – Allegro sostenuto
8 – Aria con variazioni
9 – Allegro assai
Quinteto para oboé, três trompas e fagote em Mi bemol maior, Hess 19 (1793)
10 – Allegro
11 – Adagio maestoso
12 – Minuetto
Adagio em Fá maior para três trompas, Hess 297 (1815)
13 – Adagio
Membros do Ottetto Italiano
Três Iguais para quatro trombones (Drei Equale für vier Posaunen), WoO 30
14 – Andante (Ré menor)
15 – Poco adagio (Ré maior)
16 – Poco sostenuto (Si bemol maior)
Mais um passo nesta série de postagens das Sonatas para Piano de Ludwig van Beethoven, parte das nossas comemorações de 250 anos de seu nascimento.
Após as duas monumentais sonatas postadas no volume anterior, a Waldstein e a Appassionata, temos uma série de pequenas sonatas. É como se o inovador e inesgotável Ludovico precisasse tomar um fôlego e mostrar para a sua audiência também ser capaz de criar lindas e charmosíssimas peças para piano.
A sonata de maior extensão neste disco é a intitulada ‘Les Adieux’ e como muitas outras de suas obras, foi dedicada ao Arquiduque Rodolfo. A sonata tem um caráter programático, fazendo alusão à ocasião na qual o Arquiduque e boa parte da nobreza deixaram Viena por uma temporada, devido ao cerco da cidade pelas tropas de Napoleão. Os movimentos da sonata são intitulados Liebewohl, Abwesenheit e Wiedersehen – Adeus, Ausência e Reunião. A palavra Le-be-wohl foi escrita com as sílabas assim separadas sobre as três primeiras notas da sonata.
As três primeiras sonatas foram escritas por volta de 1809 e 1810. A última sonata do disco, escrita em apenas dois movimentos, é de 1814 e dedicada ao Conde Moritz Lichnowsky. Neste período Beethoven estava usando alemão para deixar as indicações de andamentos dos movimentos de suas obras.
Ludwig van Beethoven (1770-1827)
Sonata para piano No. 24 em fá sustenido maior, Op. 78
Adagio cantábile – Allegro ma non troppo
Allegro vivace
Sonata para piano No. 25 em sol maior, Op. 79
Presto alla tedesca
Andante
Vivace
Sonata para piano No. 26 em mi bemol maior, Op. 81a – ‘Les Adieux’
Das Lebewohl. Adagio – Allegro
Das Wiedersehen. Andante expressivo
Das Wiedersehen. Vivacissimamente
Sonata para piano No. 27 em mi menor, Op. 90
Mit Lebhaftigkeit und darchaus mit Empfindung und Ausdruck
Mais outro balainho, este com peças que, se deixadas soltas, ficariam à deriva e se perderiam em nossa integral.
O disco abre com uma reconstrução da instrumentação dos seis minuetos, WoO 10, que sobreviveram somente em versão para piano – incluindo aquele, em sol maior, que muitos entre nós conheceram porque o pai ouvia Ray Conniff em alta decibelagem (o de vocês não? Muito os invejo). A função segue com as ditas “danças Mödling”, de autoria duvidosa, para um conjunto misto de cordas e sopros. As coisas melhoram um pouco no final, se não com a música, pelo menos com os intérpretes. Os venerandos Yehudi Menuhin e Wilhelm Kempff juntam forças para interpretar duas peças juvenis para violino e piano: as variações sobre “Se vuol ballare”, a popularíssima ária de Fígaro nas “Bodas” de Mozart, e o diminuto rondó em Sol. Para finalizar, uma raríssima, quiçá única oportunidade por aqui ouvir as crinas de David Garrett, um bom violinista que se transformou num astro do crossover. Se as singelas alemandas que Ludwig lhe propõs não desafiam muito sua técnica de bom pedigree, trata-se de uma oportunidade rara de, aqui no PQP Bach, escutar alguém que, conforme asseguram especialistas, é muito gatão.
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
Seis Minuetos para orquestra, WoO 10 (1795)
1 – No. 1 em Dó maior
2 – No. 2 em Sol maior
3 – No. 3 em Mi bemol maior
4 – No. 5 em Si bemol maior
5 – No. 6 em Ré maior
6 – No. 7 em Dó maior
Capella Istropolitana Ewald Donhoffer, regência
Onze Danças para pequena orquestra, WoO 17, “Mödlinger Tänze” (1819)
7 – No. 1: Valsa em Mi bemol maior
8 – No. 2: Minueto em Si bemol maior
9 – No. 3: Valsa em Si bemol maior
10 – No. 4: Minueto em Mi bemol maior
11 – No. 5: Minueto em Mi bemol maior
12 – No. 6: Landler em Mi bemol maior
13 – No. 7: Minueto em Si bemol maior
14 – No. 8: Landler em Si bemol maior
15 – No. 9: Minueto em Sol maior
16 – No. 10: Valsa em Ré maior
17 – No. 11: Valsa em Ré maior
Kammerorchester Berlin Helmut Koch, regência
Doze Variações em Fá maior sobre a Ária “Se vuol ballare”, da ópera “Le Nozze di Figaro” de Wolfgang Amadeus Mozart, para violino e piano, WoO 40
18 – Thema – Variazioni I-XII
Rondó em Sol maior para violino e piano, WoO 41 (1793-1794)
19 – Allegro
Yehudi Menuhin, violino Wilhelm Kempff, piano
Seis Danças Alemãs para violino e piano, WoO 42 (1796)
20 – Sem indicação de andamento
Concluímos nosso minifestival Jandó com o último balaio de gatinhos pianísticos beethovenianos e uma pequena homenagem ao artista.
Lembro-me de, há alguns anos, ter lido uma reportagem sobre Jandó, focando em sua impressionante e variada discografia. O tom, se não deliberadamente desabonador, tendia a pintar o pianista como um músico de pouco brilho que teve que se contentar com a labuta obreira num selo de segunda linha. Além disso, era um compêndio de resmungos, como a alegação de que seus contemporâneos András Schiff e Zoltán Kocsis eram conhecidos internacionalmente porque foram privilegiados pelo governo, ou de que ele próprio, um interiorano, era discriminado por suas contrapartes em Budapest. Somando a tudo algumas cores anedóticas, como o feroz hábito tabágico e o costume de cantarolar ao teclado à la Glenn Gould, controlado pelo truque de lhe manter um cigarro apagado na boca, saía-se com a impressão de que Jandó, professor na conceituada Academia de Música Franz Liszt, seria um músico medíocre e, acima de tudo, uma criatura patética.
Quem ouvir a gravação seguinte perceberá que não. Tomem, por exemplo, o rondó que a abre, que Beethoven descreveu com o neologismo “ingharese” (mescla de “zingarese” e”ungherese”/”cigano” e “húngaro”) e que seu factotum, o atochador Anton Schindler, descreveu como “A Fúria pelo Tostão Perdido”. Em frenéticos seis minutinhos, carregados do mais explícito humor, Beethoven parece querer demolir toda reputação de pathos e heroísmo que lhe plugam – e Jandó realiza, com muita destreza, os intentos do mestre. Gosto muito também de sua interpretação para o dito “Andante favori”, o movimento lento inicialmente destinado à sonata alcunhada “Waldstein”, que acabou substituído por uma introdução mais concisa, provavelmente, porque o primeiro e último movimentos já exigiam músculo o bastante e, ainda, porque o andante, assim como o finale, também é um rondó. Se a vastidão do repertório de Jandó – e, mui provavelmente, também seu contrato – não lhe permite lapidar cada peça que grava ao ponto do memorável, esperamos que o que aqui ouviram possa inspirá-los a explorar sem preconceitos sua discografia em constante expansão. Se ele merece a prata, o ouro ou o mármore, vocês me contam depois.
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
BAGATELAS E DANÇAS PARA PIANO, volume 3
Rondó alla ingharese, quasi un capriccio, em Sol maior, Op. 129, “Der Wut über den verloneren Groschen” (“A Fúria sobre o Tostão Perdido”) Composto em 1795 Completado por Anton Diabelli e publicado postumamente em 1828 1 – Allegro vivace
2 – Andante em Fá maior, WoO 57, “Andante favori” (1804)
3 – Duas Danças Alemãs, Hess 67 – Allegro e Da Capo (“Der Deutscher”) (1811)
Dois Rondós para piano, Op. 51 (1796-1798)
4 – No. 1 em Dó maior
5 – No. 2 em Sol maior
6 – Rondó em Lá maior, WoO 49 (1783)
Doze Minuetos, WoO 7 (1795)
7 – No. 1 em Ré maior
8 – No. 2 em Si bemol maior
9 – No. 3 em Sol maior
10 – No. 4 em Mi bemol maior
11 – No. 5 em Dó maior
12 – No. 6 em Lá maior
13 – No. 7 em Ré maior
14 – No. 8 em Si bemol maior
15 – No. 9 em Sol maior
16 – No. 10 em Mi bemol maior
17 – No. 11 em Dó maior
18 – No. 12 em Fá maior
O peculiar nome de Jenő (algo como “Eugênio”) Jandó chamou-me pela primeira vez a atenção pelas repetidas vezes que aparecia nas paredes das lojas de discos (para vocês verem como eu sou velhinho) tomadas por CDs da Naxos. Seu repertório parecia inesgotável: de Bach a Bartók, passando por concertos completos de Mozart, um catatau de obras de Liszt e integrais das sonatas de Haydn, Schubert e Beethoven. Cheguei a pensar que se tratasse de uma fraude, ao feitio da milagrosa série de gravações atribuídas aJoyce Hatto. Minhas investigações, muito pelo contrário, mostraram-me que não só Jandó realmente tinha feito todas aquelas gravações, com também tinha sido ele mesmo um dos muitos artistas cujas faixas tinham sido espuriamente atribuídas a Hatto por seu esposo, um produtor fonográfico e, como depois se viu, um tremendo aldrabão.
Fui escutá-lo, apesar das recomendações contrárias dos vetustos habitués das lojas de discos, e tive uma boa surpresa. Saía-se muito bem no repertório de seus compatriotas húngaros, e também em Mozart e Haydn. Embora talvez lhe falte algo de brilho e élan para gravar sonatas de Beethoven memoráveis, seu estilo se presta muito bem a este repertório de peças curtas que seguimos a lhes apresentar.
A gravação abre logo com a peça de maior fôlego, a Fantasia, Op. 77, a única peça para piano que Ludwig publicou e assim chamou. Nominalmente em Sol menor, ela modula amplamente ao longo de seus dez minutos, e seu estilo – livre na abertura e engenhoso nas variações que a concluem – é possivelmente a melhor janela que nos restou para a imensa habilidade de Beethoven como improvisador, que lhe trouxe fama, juntamente com o virtuosismo ao teclado, bem antes dele se fazer notar como compositor. Em meio a curtas bagatelas (uma delas alcunhada “Lustig-Traurig”, ou “Alegre-Triste” – praticamente Beethoven numa casca de noz) e graciosas séries de danças, algumas das quais já ouvidas nesta série com roupagem orquestral, duas outras obras se destacam: uma Polonaise, Op. 89, composta em 1814 para surfar na voga do ritmo entre os aristocratas da época e que acaba curiosamente evocando as polonaises da juventude de Chopin, então uma criança; e os Prelúdios, Op. 39, escritos ainda em Bonn, que modulam para todas as tonalidades maiores e são mais comumente executados ao órgão – instrumento que Neefe, seu professor, tocava na corte do Eleitor de Colônia, e que o próprio Ludwig tocava durante as muitas ausências do titular. As duas peças, frutos de períodos tão diferentes na vida do compositor, têm o comum o fato de terem sido publicadas pela necessidade do vil metal: a Polonaise foi dedicada à tzarina da Rússia, que recompensou o mimo com um bom punhado de bufunfa, e a obra adolescente acabou indo à prensa simplesmente porque precisava pagar o aluguel.
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
BAGATELAS E DANÇAS PARA PIANO, volume 2
1 – Fantasia em Sol menor, Op. 77 (1810)
2 – Doze Danças Alemãs, WoO 13 (1792-1797)
3 – Sete Contradanças, WoO 14 (1791-1801)
4 – Seis Escocesas, WoO 83 (1806)
5 – Minueto em Mi bemol maior, WoO 82 (1803)
6 – Allegretto em Dó menor, Hess 69 (1795-1796)
7 – Polonaise em Dó maior, Op. 89 (1814)
8 – Bagatela em Dó menor, ‘Lustig-Traurig’, WoO 54 (1802)
9 – Rondó em Dó maior, WoO 48 (1783)
10 – Prelúdio em Fá menor, WoO 55 (1803)
11 – Dois Prelúdios em todas tonalidades maiores, Op. 39 (1789)
12 – Fuga em Dó maior, Hess 64
13 – Finale de concerto em Dó maior, Hess 65 (originalmente para o Op. 37)
As duas sonatinhas (leichten Sonaten) que abrem o disco pertencem ao passado, foram compostas em 1795/6, apesar só terem sido publicadas em 1805, sendo esta a razão para o número de opus 49. Elas são charmosas e muito lindas, e servem para abrir os trabalhos para o que vem pela frente: duas sonatas espetaculares: Waldstein e Appasionata. Cuidado, não subestime a Sonata No. 22, em fá maior, Op. 54, só por estar entre estas obras magníficas. Ela também merece toda a nossa admiração, mas é difícil não falar mais sobre as duas outras monumentais sonatas.
Conde Waldstein, amigo leal do Ludovico!
Na minha opinião, a Waldstein é a sonata mais decisiva entre todas as compostas pelo grande Ludovico. Esta sonata é um marco, uma espécie de Bojador… Se o pianista cruzar esta etapa, estará além, terá transposto as maiores dificuldades e estará pronto para as riquezas que estão a vir.
As sonatas Waldstein e Appassionata são do período heroico do compositor, junto com a Sinfonia No. 3, justamente apelidada ‘Eroica’. Veja o que diz Maynard Solomon: Com as sonatas Waldstein e Appassionata, compostas principalmente em 1804 e 1805, Beethoven transpôs irrevogavelmente as fronteiras do estilo pianístico clássico, criando sonoridades e tessituras que nunca haviam sido antes obtidas. Ele deixou de limitar as dificuldades técnicas de suas sonatas para permitir a execução por amadores competentes (…) As dinâmicas foram grandemente ampliadas; as cores são fantásticas e luxuriantes, aproximando-se de sonoridades quase orquestrais. Ainda Solomon: – os movimentos lentos estão organicamente ligados aos finales, de modo a dar a impressão de obra em dois movimento ampliados.
O livrinho sobre as sonatas para piano de Beethoven, escrito por Denis Matthews, para a coleção Guias Musicais BBC, conta que entre os fatores que contribuíram para a grandeza de estilo sem precedentes da Waldstein está o fato de Beethoven ter adquirido em 1803 um piano Erard, com um compasso a mais no agudo. Isso fizera inclusive que ele reescrevesse certas passagens do Concerto em dó menor. Também é desta época a Sonata a Kreutzer e Leonora (Fidelio) estava já pelo caminho.
Assim, temos mais uma postagem que homenageia este extraordinário compositor, repleta de música maravilhosa, com a interpretação audaciosa e competentíssima de Igor Levit, que nos dá aqui uma palhinha, só para a turma do PQP-Bach.
Ludwig van Beethoven (1770 – 1827)
Sonata para piano No. 19 em sol menor, Op. 49, 1
Andante
Allegro
Sonata para piano No. 20 em sol maior, Op. 49, 2
Allegro, ma non troppo
Tempo di Menuetto
Sonata para piano No. 21 em dó maior, Op. 53 – “Waldstein”
Allegro com brio
Adagio molto
Allegretto moderato – Prestissimo
Sonata para piano No. 22 em fá maior, Op. 54
Im tempo d’un Menuetto
Allegretto – Più allegro
Sonata para piano No. 23 em fá menor, Op. 57 – “Appassionata”
Ludovico disse à Andreas Streicher, em castiço alemão: I received your fortepiano the day before yesterday. It is really marvelous, anybody else would like to have it for his own, and I – you may laugh, but I would have to lie if I didn’t tell you that it is too good for me, and why? – because it deprives me of the freedom to create my own tone.
O selo honconguês Naxos busca sempre expandir seu já vasto catálogo sem repetir repertório, normalmente gravando séries integrais com artistas e conjuntos menos célebres e lançando-as no mercado envoltas em projetos gráficos espartanos, sem firulas, e por preços camaradas. Naquelas priscas eras em que só se construía um acervo discográfico com a aquisição de mídias físicas, a Naxos era uma das melhores amigas dos melômanos que, como eu, tinham muita ambição e pouca bufunfa. Muito embora esta abordagem low cost e bastantona do repertório sempre tenha tido seus detratores, nunca me decepcionei com os discos da Naxos, talvez mesmo por saber o que esperar deles. Mais que isso, não foram raras as vezes que me surpreendi com as escolhas arrojadas de repertório e com a qualidade do que ouvi. Foi através da Naxos, por exemplo, que conheci artistas notáveis como a pianista turca İdil Biret, intérprete maravilhosa do repertório romântico, e a violoncelista alemã Maria Kliegel, que oferece interpretações muito marcantes para um repertório vasto, e muitas vezes desconhecido para mim. Enquanto lhes prometo que Biret e Kliegel participarão desta série, a fim de que nossos leitores-ouvintes possam tirar suas próprias conclusões sobre elas, peço licença para voltar os holofotes para o herói desconhecido da Naxos: o pianista húngaro Jenő Jandó, que contribuirá com os três próximos volumes desta nossa beethoveniana.
Ecce homo
Falaremos mais sobre Jandó nas postagens seguintes. Permitam-nos por ora apontar algo sobre as curtas peças desse álbum. Nenhuma delas foi publicada durante a vida do compositor, talvez porque ele próprio não lhes atribuísse qualquer importância – “bagatelas”, afinal, muito embora o termo “bagatelas” tenha sido a elas atribuído por editores, e não pelo próprio Beethoven, que assim intitulou três coleções de peças (Opp. 33, 119 e 126) que publicaria ao longo da vida. Poucas delas chegam a dizer ao que vieram, por consistirem de alguns poucos gestos, talvez a captura de alguma ideia que pareceu interessante, mas não o bastante para ser desenvolvida sobre uma partitura. E, ah, sim: a primeira delas é a celebrérrima Pour Elise, vítima primaz das mãos inábeis de estudantes, quiçá batida demais para não ser ouvida sem ranço, mas que se revela mais misteriosa que mimosa sob as falanges de um bom profissional. Apesar de sua fama extraordinária, este bombom musical não parece ser muito do gosto de Jandó e dos produtores, que não lhe destinaram sequer uma faixa própria no álbum, espremendo-a numa faixa com outras três peças. E, já que estamos no tópico “Peças Surradas pelos Diletantes”, cabe um outro aviso: o segundo entre os minuetos do WoO 10 será aterrorizantemente familiar a tanto aos tocadores de piano que persistiram até o estudo de terças quanto àqueles cujos pais ouviam Ray Conniff noite e dia – no meu caso, marco “sim” para ambas.
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
BAGATELAS E DANÇAS PARA PIANO, VOLUME 1
1 – Bagatela em Lá menor, WoO 59, “Für Elise” (1810) – Bagatela em Si bemol maior, WoO 60 (1818) – Allegretto quasi andante em Sol menor, WoO 61a (1825) – Allegretto em Si menor, WoO 61 (1821)
2 – Sete Ländler, WoO 11 (1799)
3 – Seis Ländler, WoO 15 (1795)
4 – Doze Danças Alemãs, WoO 8 (1795)
5 – Minueto em Dó maior, WoO 218
6 – Seis Minuetos, WoO 10 (1795)
7 – Bagatela em Dó maior, Hess 56 (esboço para as Bagatelas, Op. 126)
8 – Presto em Dó menor, WoO 52 (1795) – Bagatela em Dó maior, WoO 56 (1803)
9 – Duas Bagatelas para piano, WoO 216a e 216b
10 – Allegretto em Dó menor para piano, WoO 53 (1796-1797)
Mais um balaio de gatos que raramente ouvimos miar, em sua maior parte consagrado ao meio do quarteto de cordas – formação que preocuparia Beethoven desde o começo de sua carreira, muito em função dos modelos impressionantes deixados por Mozart e Haydn, e mantê-lo-ia ocupado até o fim da vida.
Os prelúdios e fugas que abrem a gravação (Hess 29-31) foram exercícios de contraponto e fuga escritos para o professor Albrechtsberger, e atestam o afinco com que Beethoven – tido, não sem razão, como um enfant terrible e aluno irascível – dedicava-se a seus estudos. Seus manuscritos autógrafos estão cheios de correções de Albrechtsberger, mas o que vocês ouvem aqui são as intenções do compositor – “erradas”, talvez, segundo os cânones da composição, mas inteiramente originais. O Hess 32 é uma versão preliminar do primeiro quarteto dos seis publicados como Op. 18. O quarteto seguinte (Hess 34), que já ouvimos nesta série, é um arranjo do compositor para a primeira sonata de seu Op. 14. Completam a gravação as transcrições para quinteto de cordas de duas fugas de grandes mestres, Bach e Händel, provavelmente feitas com finalidade de estudo técnico para composições próprias (a da Bach é uma transcrição apenas parcial, dando a entender que Beethoven debruçou-se sobre alguma questão contrapontística específica); um prelúdio com o fragmento de uma fuga (Hess 40), composto na mesma época da fuga do Op. 137; e um surpreendente, brevíssimo fragmento para quarteto de cordas (alcunhado “Schluss” ou “encerramento”), que chega a entusiasmar com sua verve digna de um dos quartetos do Op. 59, antes de sem-cerimoniosamente terminar.
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
Prelúdio e fuga em Mi menor para dois violinos e violoncelo, Hess 29 (1794)
1 – Prelúdio
2 – Fuga
Lukas Hagen e Rainer Schmidt, violinos Clemens Hagen, violoncelo
Prelúdio e fuga em Fá maior para dois violinos, viola e violoncelo, Hess 30 (1795)
3 – Prelúdio
4 – Fuga
Prelúdio e fuga em Dó maior para dois violinos, viola e violoncelo, Hess 31 (1795)
5 – Prelúdio
6 – Fuga
Mendelssohn-Quartett
Quarteto em Fá maior para dois violinos, viola e violoncelo, Hess 32 (1799)
7 – Allegro con brio
8 – Adagio molto
9 – Scherzo. Allegro
10 – Allegretto
Minueto em Lá bemol maior para dois violinos, viola e violoncelo, Hess 33 (1792)
11 – Sem indicação de andamento
Hagen Quartet
Quarteto em Fá maior para dois violinos, viola e violoncelo, Hess 34 (arranjo de Beethoven da sonata para piano em Mi maior, Op. 14 no. 1)
12 – Allegro moderato
13 – Allegretto
14 – Allegro
Amadeus Quartet
Allegretto em Si menor para dois violinos, viola e violoncelo, Hess 35 (1817) (arranjo de Beethoven de trechos da fuga em Si menor, BWV 869, do primeiro volume de “O Cravo bem Temperado de J. S. Bach)
15 – Allegretto
Endellion String Quartet
Fuga da abertura do oratório “Solomon” de G. F. Händel, para dois violinos, viola e violoncelo, Hess 36 (1798)
16 – Sem indicação de andamento
Hagen Quartet
Prelúdio para doisviolinos, duas violas e violoncelo, Hess 40 (1817) 17 – Sem indicação de andamento
Perez Quintet
Fragmento em Ré menor para dois violinos, viola e violoncelo, “Schluss”
18 – Sem indicação de andamento
Continuamos com as postagens da série das Sonatas para Piano de Beethoven interpretadas por Igor Levit. Agora ultrapassamos a metade do caminho com as três sonatas do Opus 31.
Do ponto de vista da obra de Beethoven, este é um momento importante. As obras produzidas em Bonn e em seus primeiros anos em Viena não ganharam número de opus, não constavam do catálogo oficial do compositor. As obras compostas em Viena, especialmente a partir de 1793, passaram a ter esta numeração e revelam a genialidade de Beethoven. As três Sonatas para piano do Opus 31, de 1802, representam um ponto significativo na carreira de nosso genial homenageado, mas havia muito ainda por vir.
Nesta primeira fase de sua carreira, era comum que Beethoven publicasse grupos de três peças reunidas em um único número de opus. Foi assim com o Opus 1 (Trios com Piano), Opus 2 (Sonatas para Piano), Opus 9 (Trios de Cordas), Opus 10 (Sonatas para Piano), Opus 12 (Sonatas para Violino e Piano), Opus 30 (Sonatas para Violino e Piano) e Opus 31, com as Sonatas para Piano deste álbum. Houve o Opus 18, com os seis primeiros quartetos de cordas e haveria ainda o Opus 59, mais 3 quartetos de cordas. No entanto, com opus 31 Beethoven parece terminar esta fase de sua carreira. Segundo Czerny, pouco depois da composição da Sonata em ré maior, Op. 28, Beethoven teria dito a seu amigo Krumpholz: Estou apenas um pouco satisfeito com minhas obras anteriores. De hoje em diante, tomarei outro rumo.
Assim como nos outros casos de conjuntos de três obras em um mesmo número de opus, neste conjunto de três sonatas, as duas primeiras são mais simples e a última, mais ousada. Realmente, as duas primeiras sonatas têm três movimentos cada e a última, uma típica Sonata Grande, tem quatro movimentos. No entanto, a segunda, intitulada “Tempest”, é possivelmente a mais famosa das três.
Eu gostei bastante da interpretação do Igor Levit para estas três sonatas, onde os movimentos mais rápidos ganharam uma bravura especial.
Ludwig van Beethoven (1770 – 1827)
Sonata para piano No. 16 em sol maior, Op. 31, 1
Allegro vivace
Adagio grazioso
Allegretto
Sonata para piano No. 17 em ré menor, Op. 31, 2 – “Tempestade”
Largo – Allegro
Adagio
Allegretto
Sonata para piano No. 18 em mi bemol maior, Op. 31, 3 – “Hunt”
Beethoven também produziu dois conjuntos de três obras antes das publicações com números do opus. Há um conjunto de três quartetos com piano, catalogados como WoO. 36, em 1785, e um conjunto de três sonatas para piano, as Kurfürstensonaten, WoO. 47, de 1783. Mas o mais magnífico conjunto de três obras, só que cada uma com seu próprio número de opus, é o formado pelas últimas três sonatas para piano. Você não perde por esperar…
Dentro de nosso plano de postar a obra completa de Ludwig van Beethoven em gravações inéditas no blog, chegamos a uma questão de ordem.
Começamos por sua primeira obra publicada, ainda antes dos onze anos, e prosseguimos em ordem cronológica com aquelas a que o compositor atribuiu número de opus. Publicamos ontem seu extremamente bem-sucedido septeto, obra que antecede sua primeira sinfonia e a expansão de seus horizontes para projetos mais ambiciosos, enquanto a Europa caminhava outra vez para a guerra e Beethoven já confessava a seus amigos de Bonn a surdez crescente. E eis que se impõe a questão que supracitamos: prosseguimos nossa série em ordem cronológica, ou damos um tempo e retrocedemos a seus tempos na Renânia?
A pergunta é apenas retórica, pois a decisão já foi tomada, e eu a explico. A obra de Beethoven vai bem além das 137 composições publicadas com número de Opus. Há um imenso contingente de obras que, por diferentes motivos, nunca entraram neste, assim digamos, rol oficial de composições. O esforço de organizar este imenso saco de gatos de quase seiscentas peças de maneira temática ou cronológica tem ocupado musicólogos quase que desde a morte de Beethoven e pariu um bom número de catálogos. O mais importante deles, fruto dos esforços de Georg Kinsky e Hans Halm, veio à luz em 1955. Conhecido, naturalmente, como catálogo Kinsky-Halm, ele lista as composições sem número de opus (em alemão, Werke ohne Opuszahl) e lhe atribui um número sob a classificação, surpresa-surpresa, WoO. Posteriormente viriam catálogos complementares, em grande parte superpostos à amplamente aceita classificação de Kinsky e Halm, que incluíam obras descobertas ou atribuídas a Beethoven depois de 1955, dos quais os únicos dignos de nota são os de Willy Hess (com obras designadas por, ahn, Hess) e o de Giovanni Biamonti (vulgo Bia).
Com raras exceções (como as importantes variações em Dó menor, WoO 80), Beethoven normalmente atribuía números de opus a todas composições que submetia à prensa. Assim, essas centenas de obras com números WoO, Hess ou Biamonti, entre as quais há um bom número de composições espúrias (ou seja, que não foram realmente escritas por Beethoven, ainda que atribuídas a ele) costumar incluir-se num desses três grupos: são fragmentárias ou incompletas; foram escritas sem intenção de publicação (tanto como presentes a pessoas próximas ou como homenagens a pessoas ilustres, frequentemente seus patronos aristocráticos); ou foram consideradas indignas de publicação pelo compositor. Por isso, e sem perder de vista nosso intuito de publicar a integral da obra do gênio de Bonn, decidi que essas criações, geralmente de menor relevância artística a despeito da importância histórica e musicológica, deveriam ser publicadas antes das obras-primas que começariam a vir em notável sequência após a primeira sinfonia, para não corrermos o risco de, sabe-se lá, interromper uma extraordinária série de quartetos de cordas por conta da obrigação contratual de publicar a bonitinha e ordinária “Pour Elise”.
Não que isso signifique que ouviremos má música. Tomem, por exemplo, estas séries de danças que agora publicamos. A primeira, que constitui o chamado “Ritterballett” (“balé de cavaleiros”, muitas vezes erroneamente traduzido como “balé sobre cavalos (!)”), foi escrita ainda em Bonn para um folguedo de Carnaval do conde Waldstein, patrono de Beethoven. Ainda que muito convencional, fica fácil de imaginar a aristocracia renana a mordiscar canapés e entreolhar-se, talvez com estranheza, em reação volumosas e esporádicas explosões de têmpera beethoveniana do modesto conjunto orquestral. Da mesma forma, enquanto talvez mastigavam faisão, conseguissem acertar o passo nas danças alemãs, contradanças e minuetos que vêm em seguida. O que me é difícil de entender é o porquê do pomposo poseur von Karajan ter decidido gravá-las com seus filarmônicos berlinenses e seu inconfundível, polido “toque Karajan”. A mesma pergunta aplica-se aos dois maestros notáveis que completam a gravação: Sir Neville Marriner e sua inseparável Academy of Saint Martin-in-the-Fields, e Lorin Maazel, também a reger os Karajan kinder.
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
Música para um Balé de Cavaleiros, para orquestra, WoO 1, “Ritterballett” Composta entre 1790-1791
1 – Marcha
2 – Canção alemã
3 – Canção de caça
4 – Canção alemã (da capo)
5 – Romance. Andantino
6 – Canção alemã (da capo)
7 – Canção de guerra: Allegro assai con brio
8 – Canção alemã (da capo)
9 – Canção de beber (‘Mihi est pPropositum‘): Allegro con brio
10 – Canção alemã (da capo)
11 – Dança alemã – Valsa
12 – Coda. Allegro vivace
Minueto para orquestra em Mi bemol maior, WoO 3, “Minueto de Felicitação” (“Gratulations-Menuett“) Composto em 1822 13 – Tempo di Menuetto quasi Allegretto
Berliner Philharmoniker Herbert von Karajan, regência
Doze Minuetos para orquestra, WoO 7 Compostos em 1795
14 – No. 1 em Ré maior
15 – No. 2 em Si bemol maior
16 – No. 3 em Sol maior
17 – No. 4 em Mi bemol maior
18 – No. 5 em Dó maior
19 – No. 6 em Lá maior
20 – No. 7 em Ré maior
21 – No. 8 em Si maior
22 – No. 9 em Sol maior
23 – No. 10 em Mi bemol maior
24 – No. 11 em Dó maior
24 – No. 12 em Fá maior
Doze Danças Alemãs para orquestra, WoO 8 Compostas em 1795
26 – No. 1 em Dó maior
27 – No. 2 em Lá maior
28 – No. 3 em Fá maior
29 – No. 4 em Si maior
30 – No. 5 em Mi bemol maior
31 – No. 6 em Sol maior
32 – No. 7 em Dó maior
33 – No. 8 em Lá maior
34 – No. 9 em Fá maior
35 – No. 10 em Ré maior
36 – No. 11 em Sol maior
37 – No. 12 em Dó maior – Coda
The Academy of Saint Martin-in-the-Fields Sir Neville Marriner, regência
Doze Contradanças para orquestra, WoO 14 Compostas entre 1791-1801
38 – No. 1 em Dó maior
39 – No. 2 em Lá maior
40 – No. 3 em Ré maior
41 – No. 4 em Si maior
42 – No. 5 em Mi bemol maior
43 – No. 6 em Dó maior
44 – No. 7 em Mi bemol maior
45 – No. 8 em Dó maior
46 – No. 9 em Lá maior
47 – No. 10 em Dó maior
48 – No. 11 em Sol maior
49 – No. 12 em Mi bemol maior
Ao estrear em 1800 seu septeto para violino, viola, violoncelo, contrabaixo, clarinete, trompa e fagote, Op. 20, o já célebre Beethoven coroou uma série de bem-sucedidas composições: dois concertos para piano estreados por ele próprio; um popular quinteto para piano e sopros; e seis inovadores quartetos de cordas. A repercussão do septeto, no entanto, superou com sobras a dos outros. Composto na tradição das serenatas de Mozart, mas peculiar em sua instrumentação sem pares e pelo toque concertístico, foi um sucesso inesperado que, nas décadas seguintes, muito aborreceria o compositor pelas repetidas demandas de reeditar e rearranjar a obra para outras combinações instrumentais (como fez, por exemplo, no trio Op. 38), eclipsando obras que considerava muito melhores. Hoje relativamente esquecido dentro do magnífico conjunto de criações de Beethoven, o septeto é sempre uma delícia de se escutar, em especial pelo colorido e virtuosismo da parte do clarinete e da elaborada parte do violino, que inclui uma cadenza no movimento final. Aprecio muito, também, das participações muito canoras do fagote e do violoncelo, normalmente relegados à tarefa do baixo, mas aqui desobrigados dela pela parruda presença do contrabaixo.
A gravação que lhes alcanço tem a distinta participação de Leonidas Kavakos, que já foi apresentado a vocês, e é parte dum álbum duplo que tem em seu primeiro volume o concerto para violino, Op. 61, em que ele conduz de seu instrumento a Orquestra da Rádio Bávara. Para o segundo volume, o solista teve a curiosa ideia de parear o concerto com o septeto, competentemente tocado e gravado com músicos da orquestra que regeu. Naturalmente, o violino de Kavakos tem aqui um destaque ainda maior do que a partitura lhe reserva, sem que isso comprometa o equilíbrio da peça. Ainda mais curiosa foi a escolha de concluir o disco com algumas das variações sobre árias nacionais, Opp. 105 e 107, compostas originalmente para flauta e piano, e publicadas na maturidade do compositor para fazer dinheiro. Não que lhes faltem brilho e graça, mas elas parecem anticlimáticas se escutadas após o irresistível septeto. Minha sugestão subversiva aos leitores-ouvintes? Invertam a ordem proposta pela Sony e concluam sua audição com o septeto.
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
Septeto em Mi bemol maior para violino, viola, clarinete, trompa, violoncelo, fagote e contrabaixo, Op. 20 Composto entre 1799-1800 Publicado em 1802 Dedicado à imperatriz Maria Theresa da Áustria
1 – Adagio – Allegro con brio
2 – Adagio cantabile
3 – Tempo di menuetto
4 – Tema con variazioni. Andante
5 – Scherzo – Allegro molto e vivace
6 – Andante con moto alla marcia – Presto
Leonidas Kavakos, violino Christopher Corbett, clarinete Eric Terwilliger, trompa Marco Postinghel, fagote Wen Xiao Zheng, viola Hanno Simons, violoncelo Heinrich Braun, contrabaixo
Variações sobre Canções Folclóricas, Op. 105
7 – No. 3: A Schüsserl und a Reindl
Variações sobre Canções Folclóricas, Op. 107
8 – No. 1: I bin a Tiroler Bua
9 – No. 2: Bonny Laddie, Highland Laddie
10 – No. 6: Peggy’s Daughter
11 – No. 7: Schöne Minka
Admitamos que, apesar de agradável, a sonata que Beethoven escreveu para Stich-Punto-Dot-Ponto não é lá uma obra-prima, o que talvez lhes torne um pouco duro o afã de escutá-la outras vezes. No entanto, com0 eu talvez insensatamente me propus a apresentar-lhes a obra integral de nosso casmurro favorito, não me posso furtar a obrigação de alcançar a vocês a Op. 17 tocada em violoncelo, pois assim nosso herói permitiu (“para o fortepiano com uma trompa ou um violoncelo”, diz o frontispício). A versão para violoncelo tem uma parte mais elaborada para o instrumento solista, porque decerto havia mais cellistas capazes de tocá-la do que o único mortal apto a fazê-lo na trompa: justamente Punto, aquele com quem “Beethovener” teve um de seus corriqueiros arranca-rabos depois de apresentar a obra em Pest. Para completar a publicação, recorri ao expediente que não aprecio de fatiar outras gravações e amalgamá-las num só pacote. Como se isso não bastasse, ainda tive a ideia talvez infeliz de reunir a mesma obra tocada em outros instrumentos, para que os leitores-ouvintes cheguem a um veredito de qual melhor a faz soar. Não me culpem – nem culpem os sopristas, tampouco, pela intenção bem justificada de se apropriarem da única sonata para instrumento de sopro que Beethoven publicou em vida. Apresentá-la-emos com fagote, com flauta e com, pasmem, basset horn ou corno de bassetto (pois não sei qual o nome que isso tem em português – alguém me ajuda?). Sim, eu já até me antecipei a vocês e lhes disse lá em cima que não será moleza, e talvez lhes dê até gastura escutar tantas vezes a mesma peça. Acredito que aqueles que conseguirem possivelmente concluirão que qualquer uma das versões alternativas soa melhor até que a trompa – e não me espantaria se preferissem aquela com cor de basset/cuerno de bajete (será que poderia chamá-la “corne de baixete” em nossa língua?), na qual soa surpreendemente idiomática.
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
Sonata em Fá maior para piano com uma trompa ou violoncelo, Op. 17 Composta em 1800 Publicada em 1801 Dedicada à baronesa Josefine von Braun
I – Allegro moderato
II – Poco adagio, quasi andante
III – Rondo – Allegro moderato
Em quatro versões:
Para violoncelo e piano (faixas 1-3) David Geringas, violoncelo Ian Fountain, piano
Para fagote e piano (faixas 4-6) Rie Koyama, fagote Clemens Müller, piano
Para flauta e piano (faixas 7-9) Emmanuel Pahud, flauta Éric Le Sage, piano
Para basset horn e piano (10-12) Geert Baeckelandt, basset horn Maiko Inoue, piano
Mais uma postagem na série das Sonatas para Piano de Beethoven interpretadas pelo Igor Levit. Agora a postagem vem com quatro sonatas, três delas com apelidos, entre elas a famosa Sonata “Ao Luar”.
Começamos com a Sonata No. 12, chamada “Marcia funebre” e que foi terminada por volta de 1800, na mesma época da Primeira Sinfonia. A Sonata foi dedicada ao amigo (pelo menos por um certo tempo) e patrono, Príncipe Karl von Lichnowsky. A estrutura desta sonata é nada convencional, iniciando com um tema e variações. É verdade que Mozart já fizera isto antes e Beethoven compôs inúmeros conjuntos de variações. Mas o que é bastante inovador é o uso de um movimento intitulado “Marcia funebre”, prenunciando o que aconteceria na sua Terceira Sinfonia. Este movimento foi orquestrado por Beethoven e chegou a ser tocado no seu funeral, em 1827. Esta sonata certamente não era estranha à Chopin!
Princesa Josephina
O Opus 27 contém duas sonatas que foram intituladas “Quasi una fantasia”, indicando que o compositor tomaria algumas liberdades com a forma. No caso da Sonata No. 13, os movimentos se seguem ininterruptamente, como em uma fantasia, que passa de um episódio ao outro. Além disso, não seguem a ordem usual esperada para uma sonata. Esta sonata foi dedicada à Princesa Josephina von Liechtenstein, como era comum ocorrer com as dedicatórias, a alguém da nobreza.
Giulietta Guicciardi
Já isto não é o caso da Sonata “Ao Luar”, que foi dedicada à Condessa Giulietta Guicciardi. Beethoven conheceu a Condessa através de suas duas amigas, as irmãs Therese e Josephine Brunsvik. Beethoven tornou-se professor da Giulietta, candidatíssima à Amada Imortal, indicada para este papel por Anton Schindler. O assistente e biografo de Beethoven que foi bastante contestado em suas informações. Neste caso, a contestação veio de Therese, em favor de sua irmã, Josephine. Altas especulações. O que importa é que a sonata é uma das mais populares e com devida justiça. Em uma interpretação como esta aqui, do Igor Levit, passamos do maravilhoso e surpreendente Adagio inicial, pela distensão do Allegretto, para o tempestuoso e virtuosístico Presto agitato final. Deste movimento, Charles Rosen disse: É o mais desenfreado em sua representação da emoção. Mesmo hoje, duzentos (e vinte) anos depois, sua ferocidade é estonteante!
A Sonata No. 15, Pastoral, é reconhecida por suas dificuldades técnicas e por sua beleza. Foi dedicada ao Conde Joseph Sonnenfels. Em geral, o título Pastoral é dado a uma obra que faz referência ao campo ou à natureza, como é o caso da Sinfonia Pastoral. Não parece ser o caso aqui, onde pode aludir à calma, simplicidade e leveza da sonata. É claro que o nome foi dado pelos editores originais, que o fizeram sem maiores consultas ao Ludwig.
Ludwig van Beethoven (1770-1827)
Sonata para piano No.12 em lá bemol maior, Op. 26 – “Marcia funebre”
Andante con variazioni
Allegro molto
Marcia funebre sulla morte d’um eroe
Allegro
Sonata para piano No. 13 em mi bemol maior, Op. 27,1 – “Quasi una fantasia”
Andante – Allegro
Allegro molto e vivace
Adagio con espressione
Allegro vivace
Sonata para piano No. 14 em dó sustenido menor, Op. 27, 2 – “Quasi una fantasia” – “Ao Luar”
Adagio sostenuto
Allegretto
Presto agitato
Sonata para piano No. 15 em ré maior, Op. 28 – “Pastoral”
Uma vez, Friedrich Himmel, o pianista real da corte da Prússia, fez uma série de improvisações para Beethoven. Depois que Himmel tocou por um certo tempo, Ludwig mandou: “Muito bem, quando você vai começar? ” Mais tarde ele explicou: “Eu pensei que Himmel estava só preludiando um pouquinho…”
Confesso que nunca tinha ouvido o quarteto Op. 16 – que considerava, em minha imensa ignorância, um mero arranjo do quinteto para piano e sopros que tanto aprecio. Ao escutá-lo, e muito apreciá-lo, aprendi que as duas obras foram publicadas quase que simultaneamente (o que a mim, mau sapão, deveria ter sido óbvio, por terem o mesmo número de Opus), dentro da praxe beethoveniana de tentar atingir todos os públicos para lucrar mais com suas edições, pois o quinteto, que foi um sucesso, demandava um conjunto instrumental bem mais difícil de reunir do que um quarteto com piano. Se a versão com sopros tem obviamente mais colorido timbrístico, o quarteto destaca mais a faceira parte do piano, tocada pelo próprio Beethoven na estreia e em muitas outras ocasiões. De algum modo, também, na versão sem sopros me pareceu mais evidente um grande efeito humorístico do rondó, em que as cordas parecem atrasar-se na entrada do tema.
Mesmo que não tivesse gostado do quarteto, e ainda que não me obrigasse a postá-lo por conta da proposta, da qual ainda não me arrependi (frise-se o ainda), de lhes alcançar tudo o que Ludwig publicou até do Beethoven-Tag em dezembro, eu o faria por conta dos intérpretes desta gravação, uma legião estrangeira estelar que parece divertir-se bastante com essa obra do mestre. Ao violino, o legendário Isaac Stern, nascido numa região disputada entre Polônia e Ucrânia e criado nos Estados Unidos. Seu compatriota Emanuel Ax, nascido em Lviv, então polonesa Lwów, toca a parte para piano que tanto apetecia a Beethoven. O conjunto se completa com Yo-Yo Ma – nascido de família chinesa na França, e também cidadão dos Estados Unidos – e o cochabambino Jaime Laredo, que aqui toca viola, mas distinguiu-se como violinista e, entre tantas proezas, por conseguir cair nas graças de Glenn Gould, que o escolheu como parceiro na gravação das sonatas para violino e teclado de Bach. O disco encerra com o belo quarteto que Schumann escreveu, para a mesma formação e na mesma tonalidade, naquele extraordinário 1842 em que produziu febrilmente tanta ótima música de câmara, incluindo o Quinteto, Op. 44, que, se não é gêmeo do quarteto como as duas versões do Op. 16 de Beethoven, é estreitamente próximo.
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
Quarteto em Mi bemol maior para piano, violino, viola e violoncelo, Op. 16 1 – Grave – Allegro ma non troppo
2 – Andante cantabile
3 – Rondo: Allegro ma non troppo
Robert Alexander SCHUMANN (1810-1856)
Quarteto em Mi bemol maior para piano, violino, viola e violoncelo, Op. 47 4- Sostenuto assai – Allegro ma non troppo
5 – Scherzo: Molto vivace – Trio I – Trio II
6 – Andante cantabile
7 – Finale: Vivace
Isaac Stern, violino Jaime Laredo, viola Yo-Yo Ma, violoncelo Emanuel Ax, piano
Seis quartetos… de uma só vez?
Sim, era precisamente o que Ludwig planejava fazer em sua estreia no gênero mais nobre da música de câmara, sobre o qual, outra vez, faziam sombra numerosas obras-primas de Mozart e Haydn. O número de quartetos no Op. 18, logicamente, não foi por acaso: seis tinham sido os grandes quartetos que Mozart dedicara a Haydn, e que ficaram associados ao nome do dedicatário; e assim também, em grupos de seis, Haydn publicou uma boa parte de suas sessenta e quatro composições no gênero. Assim como já fizera com as sonatas para piano e os trios para piano, violino e violoncelo, calcando-se sobre modelos dos mestres para buscar uma linguagem própria, Beethoven preparou meticulosamente seus primeiros quartetos de cordas ao longo de dois anos. Quando os publicou, em 1801, através da firma daquele cidadão de incrível nome Tranquillo Mollo, a boa repercussão convenceu-o de que já tinha os dois pés firmes para galgar o último degrau de suas ambições como compositor, no qual, outra vez, trabalharia sob a sombra intimidante de Haydn e Mozart: compor uma sinfonia.
Apesar de um tanto eclipsados pelos grandes, visionários quartetos da maturidade de Beethoven, eu aprecio muito essas obras muito bem trabalhadas, especialmente a primeira – a minha favorita – e a última da série. O ótimo Tokyo String Quartet, naquela que considero ser sua melhor formação, com Peter Oundjian no primeiro violino, dá-nos uma interpretação luminosa, arejada e nada constrita, que nada fica a dever aos conjuntos de maior renome, que muitas vezes erram a mão, a meu ver, por carregarem muito na dinâmica e no individualismo das vozes, em detrimento do equilíbrio do conjunto. Completam o álbum triplo o arranjo para quarteto de cordas da Sonata Op. 14 no. 1 e o imponente quinteto para cordas, que será objeto de postagem específica, no qual ao quarteto de Tokyo se une a viola de Pinchas Zukerman.
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
Seis quartetos para dois violinos, viola e violoncelo, Op. 18
No. 1 em Fá maior
1 – Allegro con brio
2 – Adagio affettuoso ed appassionato
3 – Scherzo: Allegro molto
4 – Allegro
No. 2 em Sol maior
5 – Allegro
6 – Adagio cantabile
7 – Scherzo: Allegro
8 – Allegro molto quasi presto
Quarteto em Fá maior, Hess 34 (arranjo de Beethoven para a Sonata para piano em Mi maior, Op. 14 no. 1)
9 – Allegro moderato
10 – Allegretto
11 – Allegro
No. 5 em Lá maior
1 – Allegro
2 – Menuetto
3 – Andante cantabile (Variazioni)
4 – Allegro
Quinteto em Dó maior para dois violinos, duas violas e violoncelo, Op. 29*
5 – Allegro moderato
6 – Adagio molto espressivo
7 – Scherzo: Allegro
8 – Presto
Volta e meia o resmelengo Ludwig abria uma janela em suas preocupações habituais mais prementes para impressionar-se com alguém. Na maior parte das vezes, esse alguém trajava vestidos e anáguas, pertencia à aristocracia, e estava do outro lado de um abismo amoroso intransponível para um homem de modestas origens. Noutras, Beethoven impressionava-se com algum músico que lhe instigava a produção febrilmente rápida de alguma obra para seu instrumento – como foi com os irmãos Dupont, que inspiraram as faceiras sonatas para violoncelo do Op. 5, e com o boêmio Jan Václav Stich (1746-1803), virtuose da trompa, mais conhecido pela versão italiana de seu nome, Giovanni Punto (sim: “Stich”=”ponto”. Ponto para Stich, pela marotice – e outro para mim, pelo trocadilho).
Punto foi um dos trompistas mais influentes da história, responsável por inovações técnicas que expandiram enormemente as capacidades do instrumento – mais notadamente, o uso da mão direita dentro da campana, que permitiu ao instrumentista, pela primeira vez, produzir notas fora da série harmônica. Era um personagem pitoresco, que trazia em seu currículo uma fuga espetacular da propriedade dum nobre de quem seu pai era servo, e que deu ordens expressas de arrebentar os dentes do fujão, se capturado fosse, para que nunca mais pudesse produzir música com sua boca. Rodou todo o continente, causando sensação a cada cidade em que chegava, precedido por sua imensa fama. Beethoven, procrastinador compulsivo, prometeu-lhe uma sonata com acompanhamento de piano em poucos dias, mas só resolveu iniciá-la, no que lhe era bem típico, no antepenúltimo dia. Finalizando a parte da trompa na véspera da estreia da obra em Viena, com ele próprio ao piano, improvisou a maior parte de sua, bem, parte, de modo que, quando bisaram o último movimento, a plateia ouviu uma peça substancialmente diferente da que escutara antes. A repercussão foi boa a punto (pois eu não perderia o trocadilho) de Stich convencer o quase balzaquiano ermitão a deixar seu bastião vienense e acompanhá-lo em turnê pelo continente. No concerto seguinte, em Pest, a dupla provocou a seguinte reação de um crítico:
“Quem é esse Beethovener? [sic] Não o conhecemos. O senhor Punto, claro, é muito conhecido”
A breve parceria não iria muito longe, pois o pau comeu logo depois da apresentação em Pest. Punto, injuriado, seguiu sua trajetória rocambolesca pela Europa, enquanto “Beethovener” voltou a Viena, colocou enfim a procrastinada sonata toda na pauta e a publicou em 1800 através da firma de Tranquillo Mollo (excelente nome). O frontispício destinava-a “para piano com uma trompa ou um violoncelo”, de maneira a permitir uma maior divulgação da obra, dada a escassez de trompistas capazes de tocá-la. Sabendo de sua história, acredito que os leitores-ouvintes compartilharão comigo a impressão de que o movimento lento foi algo feito realmente às pressas, como que composto nas coxias do teatro, mesmo com a tentativa velhaca de disfarçar seu laconismo com a transição decididamente brusca para o rondó final.
A presente gravação, feita com instrumentos de época, também inclui o belo trio Op. 40 de Brahms, composto em homenagem a sua recém-falecida mãe e notório pelo maravilhoso, sentido Adagio mesto, e por uma sonata do austríaco Nikolaus von Krufft, contemporâneo de Beethoven, que também teve aulas com Albrechtsberger e, provavavelmente, também foi inspirado por Punto a escrever para seu complicado instrumento. O trompista Lowell Greer usa aqui três trompas naturais diferentes, contemporâneas de cada obra, inclusive para tocar Brahms – que prescreveu uma trompa natural para seu trio, a despeito de já haver, em sua época, trompas com válvulas, que diminuíram bastante as dificuldades em tocar passagens cromáticas.
Johannes BRAHMS (1833-1897)
Trio em Mi bemol maior para trompa, violino e piano, Op. 40
1 – Andante
2 – Scherzo
3 – Adagio Mesto
4 – Finale: Allegro con brio
Lowell Greer, trompa natural Stephanie Chase, violino Steven Lubin, fortepiano
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
Sonata em Fá maior para trompa e piano, Op. 17 Composta em 1800. Publicada em 1801 Dedicada à baronesa Josefine von Braun
5 – Allegro moderato
6 – Poco Adagio, quasi Andante
7 – Rondo: Allegro moderato
Nikolaus Freiherr VON KRUFFT (1779-1818)
Sonata em Fá maior para trompa e piano
8 – Allegro moderato
9 – Andante espressivo
10 – Rondo: Alla Polacca
Lowell Greer, trompa natural Steven Lubin, fortepiano
Este disco inicia com a primeira sonata de Beethoven que ganhou um apelido, a Pathétique. A Sonata em dó menor, Op. 13, é um microcosmo do tipo de música que associamos ao compositor: inicia gravemente e anuncia o drama que está por vir, mas irrompe em um episódio virtuosístico. E nesta gravação, isto é bastante evidenciado. A música é cheia de paixão e lirismo, mas também demanda enorme técnica do intérprete. Esta alternância entre estes estados, o movimento lento, por exemplo, e o allegro final, ilustram a capacidade criativa de Beethoven e fazem dele um artista único. Composta em 1798 e dedicada ao Príncipe Karl von Lichnowsky, foi um sucesso instantâneo, firmando completamente a reputação de Beethoven como compositor, além de pianista.
Baronesa Josefa von Braun
Após esta intensa sonata, Beethoven criou duas lindas sonatinhas, as de números 9 e 10, em mi maior e sol maior, Op. 14. Cheias de charme e aparentemente bem mais simples do que suas predecessoras. Charles Rosen observa que estas duas sonatas oferecem menos dificuldades técnicas e parecem destinadas ao uso doméstico. Certamente devem ter agradado muito a Baronesa Josefa von Braun, a quem foram dedicadas.
A Sonata No. 9, em mi maior, foi também arranjada Quarteto de Cordas e esse arranjo mostra a maestria de Beethoven para escrever para cordas.
Sonata…Quarteto!
Com a próxima Sonata No. 11, em si bemol maior, Op. 22, escrita em 1800, Beethoven retoma o estilo Grand Sonata, em quatro movimentos e era considerada por ele uma de suas melhores sonatas deste período inicial.
Beethoven em 1803
Ludwig van Beethoven (1770-1827)
Sonata para piano No. 8 em dó menor, Op. 13 – “Pathétique”
Quando Beethoven estava ainda estava na casa dos vinte anos, os pianos eram todos feitos de madeira e bastante delicados. Uma vez, Ludovico quebrou tantas cordas enquanto tocava um concerto de Mozart que um de seus amigos precisou desembaraçar as cordas quebradas enquanto ele prosseguia tocando. Ainda bem que não precisamos nos preocupar com cordas quebradas com esta gravação.