Esta coletânea de obras medievais estudas e conduzidas pelo maestro Leopoldo Gamberini (1922-2012) e executadas pela magnífica “I Madrigalisti di Genova” nesta gravação de 1988 que ora compartilho com os amigos do blog foi o meu primeiro CD lá nos idos de 1989, meninão, deslumbrado com a sonoridade da nova tecnologia, resolvi comprar um CD mesmo sem ter onde reproduzir; obra de estréia: “Carmina Burana”. Fui à caça, e na Casa Bevilaqua no centro de São Paulo a encontrei, paguei muito caro e esperei uns 2 meses até poder ouvir. Quando coloquei no toca-CD esperando o fortíssimo do coro inicial ….putz… não era o Carl Orff, era música medieval…. passado o desapontamento achei a gravação “interessante”, hoje acho histórica, muito boa mesmo. Vou tentar fazer um resumo do encarte: os estudiosos aceitam como a primeira escrita do chamado “Carmina Burana” a dois bispos da Stíria (estado da Áustria centro oriental), o bispo Karl com manuscritos que datam de 1218-1231 e o bispo Heinrich e seus manuscritos de 1232-1243. O nome para o conjunto de cantos medievais foi nominado “Carmina Burana” e foi dada pelo bibliotecário G.A. Smeller na primeira edição, depois do primeiro manuscrito ter vindo do convento de Benediktbeuren, em 1803 para a biblioteca Central da Baviera. Os manuscritos continham inúmeros poemas vindos de diversas partes da Europa, estavam escritos em latim, alemão e francês dos séculos XI a XIII. São conhecidos como “Cantos dos estudantes” porque eram cantados pelos jovens da época. Eram músicas feitas na sua maioria por jovens que haviam deixado os estudos religiosos. Assim a influência dos cantos gregorianos é marcante, os poemas foram adaptados e foram incluídas palavras profanas. Esse fenômeno aconteceu na música do IX ao XIII século. Nos cantos de “Carmina Burana” há um espírito popular, irreverente. Assim, as interpretações destas canções “gregorianas” em textos profanos torna-se um grande desafio. Um verso pode ser feito devagar ou pianíssimo, enquanto o outro rápido forte e vice-versa, a intensidade expressiva resultante da tradição eclesiástica. Mais uma vez vemos como eram transmitidas oralmente as melodias originais de país em país, de região para região, de século em século. Para exemplo o canto “Alte Clamat Epiricus (faixa 5) é uma paródia em um primitivo alemão do canto dos cruzados de “Walter der Vogelweide (1170-1230). Além disso, é de ressaltar que a interpretação deve sugerir uma dicção e uma ação cênica. Então você ouve nessas músicas uma ênfase espetacular, altamente recitativa. Muitas das canções da “Carrnina Burana” são escritas no campo aberto (sem pentagrama).
Neste CD é apresentado o texto original, mas o Maestro L. Gamberini tentou reconstruir a melodia com muita pesquisa a fidelidade das interpretações como teriam sido no original, na verdade muitas soluções são possíveis numa escrita sem pentagrama e tudo é válido. Algumas canções deste CD são canções de gananciosos, de pessoas que buscam prazer, encontramos nas músicas: “In Taberna” (faixa 1), “Bacche bene venies” (faixa 3), “Alte clamat Epicums “, a força expressiva com a troca de palavras de religioso para profano, é um fenômeno cultural único, típico de toda a Idade Média do IX ao século XIII. É conhecido como “contra factum”. Os instrumentos foram muito além, muitos originários do Oriente Médio como alaúde, saltério, pífano, tímpano. Temos neste trabalho do Leopoldo Gamberini uma liberdade interpretativa, estes cantos adquirem, com base na canção religiosa e com palavras profanas, uma força criativa surpreendente. O encarte está junto com as faixas.
Bom divertimento !
CARMINA BURANA – I Madrigalisti di Genova (1988)
1-IN TABERNA QUANDO SUMUS
2-VITE PERDITE
3-BACCHE BENE VENIES
4-PROCURANS ODIUM (instrumental)
5-ALTE CLAMAT EPIRICUS
6-MICHI CONFER VINDITOR
7-NOMEN A SOLLEMPNIBUS
8-CRUCIFIGAT OMNES
9-SIC MEA FATA CANENDO
10-TEMPUS TRANSIT GELIDUM
11-LICET EGER
12-FAS ET NEFAS AMBULANT
I Madrigalisti di Genova (1988)
Direção: Leopoldo Gamberini
O Brasil recebeu, no pós-guerra, diversos músicos que vieram da Europa para atuar na Orquestra Sinfônica Brasileira (criada por iniciativa de José Siqueira em 1940) e que se tornaram destaques em seus respectivos instrumentos: o francês Noel Devos no fagote, o tcheco Bohumil Med na trompa, a também francesa Odette Ernest Dias na flauta, para ficar só nesses.
Neste post, rendo tributo ao violista húngaro que adotou o nome de Perez Dworecki (1920-2011, não descobri o nome de batismo dele) postando seu CD mais recente (de uns cinco anos atrás). Ao longo do ano apresentarei discos dos demais músicos.
Esta coletânea abrange do barroco europeu ao nacional contemporâneo (diferente de outras que Dworecki lançou, focadas totalmente no repertório made in Brazil) e recebeu o nome a partir de uma peça composta especialmente pelo paulista Achille Picchi. Deixo as apreciações adicionais por vossa conta.
Boa audição porque já tô pensando no próximo CD, também de viola (mas viola caipira).
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Gaiato: Perez Dworecki
Vivaldi
1. Sonata Para Viola E Piano (Original Para Violoncelo): Largo
2. Sonata Para Viola E Piano (Original Para Violoncelo): Allegro
3. Sonata Para Viola E Piano (Original Para Violoncelo): Largo
4. Sonata Para Viola E Piano (Original Para Violoncelo): Allegro
Veracini
5. Largo
Vieuxtemps
6. Elegie
Grieg
7. Sonata (Andante Molto Tranqüilo): Op. 36 (Original Para Violoncelo)
Ravel
8. Berceuse (Sobre O Nome de Gabriel Fauré)
Achron
9. Melodia Hebraica
Kreisler
10. Liebesleid
Breno Blauth
11. Sonata (Para Viola E Piano): Dramático
12. Sonata (Para Viola E Piano): Evocativo
13. Sonata (Para Viola E Piano): Agitado
Vocês querem mais Amaral Vieira? Então aí vai. Só peças para piano solo…
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Fábulas, para piano solo, e outras obras
1 Fábulas: Deciso
2 Fábulas: Moderato
3 Fábulas: Mosso
4 Fábulas: Dramático
5 Fábulas: Andante
6 Fábulas: Selvagem
7 Fábulas: Appassionato
8 Fábulas: Allegro
9 Fábulas: Risoluto
10 Fábulas: Enérgico e Festivo
11 Sonata piccola: Allegro
12 Sonata piccola: Andantino
13 Con Sonata piccola: Con Spirito
14 Allegro de Concerto, Opus 225
15 Quatro miniaturas: Arabesque I, Opus 82 Arabesque I, Opus 82
16 Quatro miniaturas: Arebesque II, Opus 91 Arebesque II, Opus 91
17 Reminiscência, Opus 83 Reminiscência, Opus 83
18 Burlesca, Opus 95 Burlesca, Opus 95
19 Movimento de Concerto, Opus 192 Movimento de Concerto, Opus 192
20 Trilogia: Elegia
21 Trilogia: Noturno Noturno
22 Trilogia: Toccata
23 O Alvorecer do Século da Humanidade, Opus 256
Olá pessoal! Hoje tenho o imenso prazer de compartilhar uma verdadeira pérola da música brasileira, trata-se de um pouquinho da imensa obra do incrível Jacob Pick Bittencourt, ou Jacob do Bandolim nascido em 14/02/1918, no Rio de Janeiro. Morava na casa de n° 97, da Rua Joaquim Silva, na Lapa. Quando criança uma de suas distrações era ficar na janela de casa ouvindo um vizinho francês, cego, tocar violino. Ao ver o filho com tanto interesse ganhou um violino da mãe aos 12 anos, mas, por não se adaptar ao arco do instrumento, passou a usar grampos de cabelo para tocar as cordas. Depois de várias cordas arrebentadas, uma amiga da família disse: “..o que esse menino quer é tocar bandolim..”. Dias depois, Jacob ganhou um bandolim, comprado na Guitarra de Prata. Era um modelo “cuia”, estilo napolitano, e segundo o próprio Jacob: ” …aquilo me arrebentou os dedos todos, mas eu comecei…”. Aos 13 anos, ainda da janela de sua casa, escutou o primeiro choro: “É do que há” (CD2 faixa 00) – composto e gravado pelo famoso Luiz Americano – “Nunca mais esqueci a impressão que me causou”, afirmaria Jacob, anos mais tarde. Raramente saia à rua. Seu negócio era ir na escola e ficar em casa tocando bandolim. Costumava freqüentar a loja de instrumentos musicais Casa Silva, na rua do Senado, onde, para variar, ficava palhetando os bandolins. Em 1933 se apresentou pela primeira vez, ainda como amador, na Rádio Guanabara, com um grupo formado por amigos, o “Conjunto Sereno”. Ao tomar a decisão que o bandolim “era o seu negócio” e nele se concentrar iniciou a sua carreira radiofônica. O sucesso foi tanto que Jacob foi contratado pela rádio, passando a se revezar com o grupo do famoso flautista Benedito Lacerda, o “Gente do Morro”, no acompanhamento dos principais artistas da época, dentre eles, Noel Rosa, Augusto Calheiros, Ataulfo Alves, Carlos Galhardo, Lamartine Babo. Em conseqüência, seu grupo, que era formado por Osmar Menezes e Valério Farias “Roxinho” nos violões, Carlos Gil no cavaquinho, Manoel Gil no pandeiro e Natalino Gil no ritmo, passou a se chamar “Jacob e sua gente”.
1953 – Sentados: Donga-Pixinguinha-João-da-Bahiana-e-Jacob-do-Bandolim. Em pé no centro Ataúlfo Alves
Em 1940, Jacob se casou com Adylia Freitas, sua grande companheira para toda a vida. Nesta época se firmou uma profunda amizade com o violonista e histórico compositor Ernesto dos Santos – o Donga. Tempos difíceis, cachês fracos e o apoio pessoal e material que veio de Donga foi fundamental para o casal Jacob e Adylia costumavam comentar que “…Donga e a esposa Zaira de Oliveira mataram nossa fome algumas vezes…”. Mais experiente e conhecedor das dificuldades da profissão, Donga convenceu Jacob a prestar concurso público, idéia que o bandolinista abraçou, pois sempre pretendeu alcançar uma estabilidade que lhe permitisse realizar seus saraus e desenvolver sua arte sem ser obrigado a acompanhar cantores e calouros eternamente, isso somado ao temor de perder sua independência em virtude das pressões das gravadoras e dessa forma, por não querer fazer concessões à indústria fonográfica, JACOB prestou concurso, sendo nomeado Escrevente Juramentado da Justiça do Rio de Janeiro, mas continuou tocando bandolim, cada vez mais.
Em 1941, a convite de Ataulfo Alves, participou das gravações, “Leva Meu Samba” (Ataulfo Alves) e a famosa “Ai, que Saudades da Amélia” (Ataulfo Alves e Mário Lago). Em 1947, Jacob lança pela gravadora Continental, seu primeiro disco como solista, um 78 rpm, com um choro de sua autoria, “Treme-treme” (CD01 faixa 00) e a valsa “Glória”, de Bonfiglio de Oliveira, fazendo grande sucesso.
Em 1949, já residindo em Jacarepaguá, na Rua Comandante Rubens Silva, no 62, Jacob passou a realizar grandes saraus que contatavam na platéia com a presença de grandes nomes da política, artes e jornalistas que lá iam ouvir a arte: Dorival Caymmi, Elizeth Cardoso, Serguei Dorenski, Ataulfo Alves, Paulinho da Viola, Hermínio Bello de Carvalho, Canhoto da Paraíba, Maestro Gaya, Darci Villa-Verde, Turíbio Santos e Oscar Cáceres (violonista uruguaio). Segundo Hermínio Bello de Carvalho, assíduo participante dessas reuniões musicais: “….. quem participou de seus célebres saraus, tornou-se não apenas um ouvinte privilegiado das noites mais cariocas que esta cidade já conheceu, mas um discípulo sem carteira de um Mestre que não sonegava lições, que fazia questão de repassá-las nas inúmeras atividades que exercia – inclusive como radialista. Proclamava não ser professor e, por isso, não ter formado alunos. Ignorava que, ao morrer, deixaria não apenas uma escola, mas uma universidade aberta a todos que um dia iriam estudar o gênero a que se dedicou com rara e profícua eficiência. Sua casa em Jacarepaguá era uma permanente oficina musical, onde reunia a nata dos chorões cariocas, proporcionando a eles o convívio com músicos de outros Estados, de quem fazia questão de registrar as obras para posterior divulgação. Canhoto da Paraíba, Rossini Pereira, Zé do Carmo, Dona Ceça e outros autores-instrumentistas eram recepcionados e hospedados em sua casa, num gesto de ampla generosidade por quase todos, reconhecido. Recebia também artistas internacionais do porte de Maria Luisa Anido, Sergei Dorenski e Oscar Cáceres em saraus memoráveis….”
Entre o final de 1956 e 1958, Radamés Gnatalli escreveu “Retratos”, uma suíte para bandolim, orquestra e conjunto regional, onde homenageou, em cada movimento, um dos quatro compositores que considerava geniais e fundamentais na formação da nossa música instrumental: Pixinguinha, Ernesto Nazareth, Anacleto de Medeiros e Chiquinha Gonzaga. Como se revelasse uma fotografia musical extraída da alma de cada um dos quatro homenageados, Radamés traz no primeiro movimento um Choro baseado em Carinhoso, no segundo, uma Valsa a partir de Expansiva, no terceiro, um Schottisch lembrando Três Estrelinhas e no quarto movimento, um Maxixe “a la” Corta Jaca. Uma obra de rara beleza e que exigia um solista sensível e com conhecimento musical. Radamés dedicou a suíte Retratos a Jacob que para executá-la foi obrigado a aprofundar seus estudos de teoria musical, que havia iniciado em 1949, e para isso contou com a ajuda de Chiquinho do Acordeon (Romeu Seibel) e com a sua própria obstinação. Jacob registrou em seu gravador a estréia radiofônica de Retratos interpretada por Chiquinho, na Rádio Nacional, no final dos anos 50 e a partir daí estudou a obra continuamente para enfim gravá-la em fevereiro de 1964 (Gravação compartilhada abaixo). Em maio do mesmo ano, Jacob escreve uma carta a Radamés para confessar que “…valeu estudar e ficar dentro de casa o Carnaval de 64, devorando e autopsiando os mínimos detalhes da obra…”. Jacob que começou na infância tocando “de ouvido” era fanático por ensaios, revelava agora uma nova face, o de musico estudioso. Em agosto de 64, Jacob fez a primeira audição pública de “Retratos”, acompanhado pela Orquestra da CBS, no saguão do Museu de Belas Artes, no Rio de Janeiro. “Retratos” foi um salto de qualidade na carreira de Jacob e na música brasileira. Com a fusão entre a linguagem camerística e a popular Radamés deu-nos uma nova leitura do Choro que, embora pouco reconhecido a época, amadureceria cerca de 20 anos depois.
Jacob do Bandolim no estúdio de gravação do LP Vibrações
Jacob produziu muitos Lps, mas o Lp “Vibrações”, de 1967, é considerado “o maior LP de choro de todos”, com gravações imortais de “Lamento” e “Brejeiro” (Ernesto Nazareth), uma beleza sem igual. Nos faz pensar e crer que um dia lá no futuro artistas como ele serão realmente reconhecidos como gênio. Que obra !!!!
No início de agosto de 1969, Jacob interrompeu uma estadia em Brasília, onde estava se tratando de dois enfartes com o “cardio-bandolinista” Dr. Veloso, retornou ao Rio de Janeiro para reassumir suas funções no Conselho de Música Popular do Museu da Imagem e do Som do RJ, onde ocupava a cadeira n° 22 e para retomar as gravações de seu programa de rádio na Rádio Nacional – “Jacob e seus Discos de Ouro” – um dos poucos programas especializados em choro e samba no rádio brasileiro, sempre transmitido as 23:30 hs. Nessa época, por precaução, após os dois enfartes, Adylia não permitia que Jacob saísse sozinho. Mas, no dia 13.08.69, uma quarta-feira, Jacob, que desde que havia retornado de Brasília insistia em ir ver seu amigo Pixinguinha pois soubera que este passava por problemas, resolveu ir a Ramos de qualquer jeito. D. Adylia que estava adoentada e não podia acompanhá-lo, relutou mas acabou concordando. Dentre outras coisas, Jacob queria acertar com o amigo Pixinga a realização de um velho sonho. A gravação de um disco só com músicas do velho mestre e com a renda revertida para ele. Jacob passou a tarde com Pixinguinha e ao retornar para sua residência em Jacarepaguá, ainda dentro do carro sofreu o terceiro infarte, falecendo na varanda de sua casa, nos braços da esposa, por volta das 19 hs.
Jacob e Cartola
Jacob sempre perseguiu a perfeição da execução e a excelência na preservação da nossa música, sem, contudo ser um conservador. Municiava-se de recursos tecnológicos de ponta à época (anos 50), para obter resultados inovadores, na busca de novas sonoridades, ou para melhorar o registro de seus arquivos. Da mesma forma, quando estudou, à fundo, a arte fotográfica, para poder microfilmar suas partituras, pois arquivos físicos não lhe bastavam, em se tratando de milhares de partituras a serem preservadas.
O jornalista e filho de Jacob, Sérgio Bittencourt, era famoso pelo estilo polêmico. Não economizava críticas ácidas ao escrever sobre música popular em jornais e revistas. Tornou-se também um rosto conhecido ao atuar como jurado nos programas de calouros de Flávio Cavalcanti. Mas as palavras ficavam doces ao falar sobre a admiração que tinha pelo pai, Jacob do Bandolim, um dos maiores músicos de choro da história do País. A morte de Jacob, em 1969, foi dura para o rapaz de 28 anos. Em sua homenagem, compôs a comovente Naquela Mesa: “Naquela mesa ele sentava sempre / E me dizia sempre o que é viver melhor / Naquela mesa ele contava histórias / Que hoje na memória eu guardo e sei de cor… “ Há quem diga que a canção foi escrita durante o velório do pai. A música ficaria famosa nas vozes de Elizeth Cardoso e Nelson Gonçalves (Faixas bônus) e se tornaria um clássico, quase obrigatória em repertórios boêmios Brasil afora. Até mereceu um arranjo do maestro e arranjador francês Paul Mauriat.
Hoje, são raras as rodas de choro onde não se ouvem as cordas de um bandolim, são raros os bandolinistas que não tem em Jacob sua referência musical e, principalmente, é raro o país que teve o privilégio de ter tido um Jacob do Bandolim. O que dizer do choro “Odeon”, “Brejeiro”, “Noites Cariocas” ou a brincadeira com o Zimbo trio na última faixa do CD 03 “Chega De Saudade”….
Contrariando a letra do Sérgio Bittencourt aonde diz “… e hoje ninguém mais fala do seu bandolim….”. Hoje falamos e mando este petardo em homenagem ao grande músico que foi, é, e sempre será – Jacob do Bandolim.
Fontes bibliográficas: Tributo a Jacob (Discografia) / Sergio Prata e Maria V. Pugliesse / Rio, CECAC, 2003; / Arquivos da família Bittencourt; / Depoimentos de Déo Rian, Elena Bittencourt e César Faria ; / Jacob do Bandolim / Ermelinda de Azevedo Paz , Rio, Funarte, 1997; / O Choro: do Quintal ao Municipal / Henrique Cazes, São Paulo, Editora 34, 1998. / http://jacobdobandolim.com.br/biografia.html
Pessoal, divirtam-se com estes arquivos que ora disponibilizamos. Bom Sarau!
Jacob Do Bandolim – Gravações Originais CD 01
1-0 Treme Treme
1-1 Noites Cariocas
1-2 Despertar Da Montanha
1-3 Dolente
1-4 Pé-De-Moleque
1-5 Simplicidade
1-6 Bonicrates De Muletas
1-7 Cristal
1-8 Mexidinha
1-9 Choro De Varanda
1-10 Vascaíno
1-11 Bole-Bole
1-12 Nostalgia
1-13 Odeon
1-14 Confidências
1-15 Atlântico
1-16 Faceira
1-17 Biruta
1-18 Migalhas De Amor
1-19 Alvorada
CD2
2-0 É do que há
2-1 Doce De Coco
2-2 Reminiscências
2-3 Entre Mil… Você!
2-4 Mimosa
2-5 Sapeca
2-6 Carícia
2-7 Santa Morena
2-8 Tira Poeira
2-9 Diabinho Maluco
2-10 Cochichando
2-11 Agüenta, Seu Fulgêncio
2-12 Sempre Teu
2-13 Implicante
2-14 Lábios Que Beijei
2-15 Serra Da Boa Esperança
2-16 Flor Do Abacate
2-17 Chorando
2-18 Gostosinho
2-19 Noites Cariocas
CD 03
3-1 Assanhado
3-2 Feia
3-3 Bola Preta
3-4 Benzinho
3-5 A Ginga Do Mané
3-6 O Vôo Da Mosca
3-7 Ernesto Nazareth – 2º Movimento Da Suíte Retratos (Retrato B)
3-8 Chiquinha Gonzaga – 4º Movimento Da Suíte Retratos (Retrato D)
3-9 Vibrações
3-10 Receita De Samba
3-11 Ingênuo
3-12 Lamentos
3-13 Murmurando
3-14 Floraux
3-15 Brejeiro
3-16 Noites Cariocas
3-17 Modinha
3-18 Chega De Saudade
JACOB DO BANDOLIM & CONJUNTO ÉPOCA DE OURO – 1967 ( RCA Camden ) FAIXAS DO ÁLBUM VIBRAÇÕES (Compositor) JACOB DO BANDOLIM: Bandolim / DINO 7 CORDAS: Violão 7 cordas / CESAR FARIA E CARLINHOS: Violão / JONAS: Cavaquinho / GILBERTO D’ÁVILA: Pandeiro / JORGINHO: Percussão
Eu não diria que este é um grande disco, mas sim que é suficientemente significativo para ser compartilhado e ouvido nesta semana de paixão/passio/passamento não só de Jesus, segundo a tradição tantas vezes e tão brilhantemente musicada por J.S. Bach, como também desse edifício de tantos sentidos atribuídos que é a catedral de Nôtre Dame de Paris.
Lançado na França em 1962 – bem antes, portanto, da ascensão do movimento de interpretação historicamente informada – o Bach de Pierre Cochereau e Armand Birnbaum soa às vezes estupidamente bombástico, às vezes efetivamente impressionante ou sinceramente comovente (caso, em especial, dos dois solos do trompetista Maurice André – faixas A03 e B03). Obviamente não cabe aí nem pensar no adjetivo “autêntico” –
… mas tampouco caberia usar a palavra “autêntico” para a própria Nôtre Dame – tantas vezes “depenada” e reformada que talvez o que conhecemos se deva mais ao arquiteto Eugène Viollet-le-Duc, em meados do século XIX, que aos seus criadores originais dos séculos XII e XIII.
O fato é que as reformas arquitetônicas e realizações musicais ditas inautênticas são elas mesmas parte da História tanto quanto as ditas autênticas… Dificilmente alguém que vai a Paris deixaria de visitar a Nôtre Dame por “inautêntica” – então talvez ainda valha a pena ouvir este disco, no mínimo para ouvirmos como certos músicos de destaque numa das principais “capitais culturais” do mundo eram capazes de interpretar o barroco de Bach em meados do século XX…
E não fiquem com vergonha se chegarem a gostar: ego, Ranulfus Monacus, vos absolvo!
“Grandes Órgão e Fanfarras na Notre Dame: Johann Sebastian Bach”
Regente da Fanfarra: Armand Birnbaum
Trompete solo: Maurice André (1933-2012)
Órgão: Pierre Cochereau (1924-1984)
FAIXAS (títulos em português conforme a capa do disco)
A01 Jesus bleibet meine Freude (da Cantata 147)
……(Jesus, alegria dos homens)
A02 Wir glauben all’ an einem Gott (BWV 680)
……(Nós todos cremos todos em um só Deus)
A03 Herzlich tut mich verlangen (BWV 727)
……(Ardentemente eu aspiro a um fim feliz)
A04 Nun freut euch, lieben Christen g’mein (BWV 388)
……(Rejubilai-vos, cristãos amados)
A05 Gottes Sohn ist kommen (BWV 318)
……(O filho de Deus chegou)
A06 Ach Herr lass dein lieb Engelein (Johannespassion BVW 245)
……(Coral final da Paixão segundo São João)
B01 Sinfonie der Kantate Nr 29 “Wir danken Dir, Gott)
……(Sinfonia da Cantata nº 29 “Nós vos agradecemos, Deus”)
B02 Aus tiefer Not ruf’ ich zu Dir
……(Do fundo de minha desgraça venho a vós, Senhor)
B03 Erbarm’ dich mein, o Herre Gott (BWV 305)
……(Tende piedade de mim, oh Senhor Deus)
PQP, aquele chato, caça a palavra de Carlinus para dizer que, em sua opinião, as gravações da 7ª de Haitink e Wand dão um baile na de Celibidache. Um Baile, um 7 x 1. Só isso. Diz aí, Carlinus!
Seguindo com nosso empreendimento. Desta vez surgem duas obras monumentais — a Sinfonia No. 7 e Te Deum, de singular beleza. A Sinfonia No. 7 em Mi Maior é uma das obras mais conhecidas de Bruckner. Foi composta entre os anos de 1881 e 1883 e foi revista, como Bruckner costumava fazer, no ano de 1885. O trabalho consagrou em definitivo o compositor. A monumentalidade da obra impressiona. A outra obra do post é o Te Deum, que na tradição latina da Igreja é um hino de louvor, cantado geralmente como agradecimento a Deus por uma benção especial. O termo em latim é: Te Deum Laudamus. Ou seja, A Ti, ó Deus, louvamos. Uma boa apreciação!
Anton Bruckner (1824-1896) – Sinfonia No. 7 em Mi Maior
01. Applause
02. I – Allegro moderato
03. II – Adagio. Sehr feierlich und sehr langsam
01. III – Scherzo. Sehr schnell – Trio
02. IV – Finale. Bewegt, doch nicht schnell
Te Deum, para solistas, coral, órgão e orquestra
03. Applause
04. I – Allegro moderato
05. II – Te ergo. Moderato
06. III – Aeterna fac. Allegro moderato. Feierlich, mit Kraft
07. IV – Salvum fac. Mooderato – Allegro moderato
08. V – In te, Domine, speravi. Mäßig bewegt – Allegro moderato
Philharmonischer Chor München
Sergiu Celibidache, regente Members of the Münchener Bach-Chor
Josef Schmidhuber, chorus master
Margaret Price, soprano
Christel Borchers, contralto
Claes H. Ahnsjö, tenor
Karl Helm, baixo
Elmar Schloter, órgão
Hoje estou compartilhando mais uma gravação da Naxos do pianista e compositor Franz Xaver Scharwenka. Nascido em 6 de janeiro de 1850 em Samster (na moderna Szamotuly perto de Poznań, Polônia) no coração da então região prussiana de Wielkopolska. Este CD traz algumas adoráveis danças polonesas e o gigante (em termos de dificuldade pianística) concerto número 4. Ativo tanto como pianista, compositor e professor, Xaver evitou a vanguarda musical, assim como os modismos parisienses e vienenses do final e início do século XX, permanecendo fiel às idéias estéticas românticas do século XIX. Apesar de seus contemporâneos, como por exemplo Liszt, elogiassem os seus trabalhos como compositor a história, no entanto, se move de misteriosas maneiras, e por alguma estranha razão o seu trabalho foi esquecido por muitos anos. Suas principais composições se mostraram de muito difícil execução para muitos artistas, e as audiências esperavam ouvir niovidades e não peças que arremetiam ao romantismo tardio. Talvez por estas razões as obras de Scharwenka foram negligenciadas.
Espero que esta gravação prove que o trabalho de Scharwenka é um elemento valioso do patrimônio musical polaco, digno de reintrodução. As peças que fazem parte deste quarto CD que compartilho com vocês , traz obras que gozavam de considerável popularidade e eram freqüentemente executadas na virada do século XIX para o XX. As Danças Polonesas são peças que gosto muito, os ritmos da tradição folclórica polonesa misturado com sua paixão por Chopin nos remetem às mazurcas do último mostrando bem quais foram as fontes de inspiração. O Concerto em Fá menor, é o último concerto para piano de Scharwenka. Coroa sua experiência como virtuosi do piano, requer alta demanda de técnica do solista, alcançam o ápice do desempenho habilidades, particularmente nos movimentos finais. Na época as plateias queriam ver os artistas em geral como figuras de circo, fazendo malabarismo para executar música, ouvimos muitas passagens que requer uma técnica absurda, textura maciça da parte de piano baseada em oitavas duplas, repetições e passagens de bravura, bem como sequências de acordes em oitavas e cadências virtuosas cobrindo toda a gama de som do instrumento criando uma impressão de que o compositor queria resumir realizações do pianismo da época em uma única composição. Do ponto de vista estilístico, o concerto é uma peça eclética, que combina elementos típico dos concertos brilhantes de Mendelssohn, Liszt e Tchaikovsky. Composto em 1908, o Concerto para Piano em Fá menor, Op. 82, teve sua estréia em Berlim em outubro do mesmo ano. Dois anos depois o compositor fez o concerto em Nova York, Scharwenka como solista acompanhado pela New York Symphony Orchestra sob a batuta de Gustav Mahler. Embora um trabalho de gênio, sua incrível técnica e dificuldade interpretativa fez com que o Concerto, ao longo do tempo, fosse ignorado pela maioria dos pianistas. Neste Cd quem encarou o grande desafio técnico foi o pianista François Xavier Poizat e a Poznań Philharmonic Orchestra sob a regência de Łukasz Borowicz. De quebra ainda temos a abertura Mataswintha e a sonata para Cello Op. 46. São belas obras do romantismo tardio que valem a pena ouvir.
Xaver Scharwenka (1850-1924): Piano Concerto no. 4
01 – Piano Concerto No.4 in F minor, Op.82 – I. Allegro patetico
02 – Piano Concerto No.4 in F minor, Op.82 – II. Intermezzo Allegretto molto
03 – Piano Concerto No.4 in F minor, Op.82 – III. Lento
04 – Piano Concerto No.4 in F minor, Op.82 – IV. Allegro con fuoco
05 – Mataswintha Opera Overture
06 – Cello Sonata in E minor, Op.46 – II. Andante religioso
07 – Polish National Dances, Op.3 – No. 1 in E flat minor
08 – Polish National Dances, Op.3 – No. 8 in B flat minor
09 – Polish National Dances, Op.3 – No. 15 in B flat major
Piano – François Xavier Poizat
Poznań Philharmonic Orchestra
Maestro – Łukasz Borowicz
Esta é uma seleção composta: as faixas 1 e 2 foram gravadas e lançadas em 1963 no vinil com a capa ao lado; a faixa 4, já em 1957/62, e a faixa 3 apenas em 1969/72 – o que deixa entreouvir que a técnica e timbre do “barítono do século” ainda podem ter amadurecido entre seus 32 e 44 anos.
O repertório é todo barroco, e geralmente entendemos isso como “contemporâneo de Bach” – mas vejamos: quando João Sebastião nasceu:
Rosenmüller tinha morrido há um ano (com 65)
Alessandro Scarlatti estava na ativa, com 25 anos
Couperin tinha 17
Telemann tinha seus 4 aninhos (e sobreviveria JSB por mais 18)
Aldous Huxley chama a atenção, em um ensaio, para que “barroco” não parece significar o mesmo em música e nas demais artes: nestas, “barroco” sugere uma extensão da inventividade renascentista pelos terrenos do tenso, assimétrico, dramático, exagerado; já na música, o trajeto parece ser do irregular para o regular, do inventivo e do emocional para o cada vez mais padronizado e convencional (com o que Bach aparece como uma espécie de canto de cisne da invenção e originalidade no barroco).
Aqui temos em Rosenmüller (faixa 3) uma amostra do barroco seiscentista de sabor tardo-renascentista – e teríamos uma amostra do tardo-barroco mais tediosamente convencional se tivéssemos conservado a peça de Telemann incluída no vinil acima: uma cantata não-religiosa, humanista, sobre o valor da esperança (Die Hoffnung ist mein Leben), quem sabe prefigurando o que Schiller faria pouco mais tarde com o valor da alegria. Nobre intento… só que acabou dando numa das peças barrocas mais chatas que já ouvi!
Felizmente o próprio tio Dietrich se encarregou de salvar a honra de Telemann, gravando o que suspeito ser sua obra prima: a cantata tragicômica sobre a morte de um canário “experimentado em sua arte” por obra de um gato – animal que termina merecendo um movimento para xingar sua glutonice, e mais um para desejar que o canário o arranhe e bique por dentro – ao lado de frases da mais autêntica e compungida ternura dedicadas ao passarinho. Talvez mais uma confirmação de que o convívio com animais humaniza – enquanto o convívio só com ideais mumifica.
De entremeio temos o sempre intenso Couperin cantando as dores de Jerusalém subjugada pelos babilônios lá por 600 a.C. – isso como abertura das cerimônias católicas relativas à… morte de Jesus, nesse estranho sincretismo que é a cultura judaico-cristã.
E temos Alessandro!Alessandro Scarlatti, que, no meu sentir, enquanto os outros saíam do barroco provinciano seiscentista meramente para a convencionalidade dos salões da nobreza, Alessandro dá o passo e não vê só os salões: já vislumbra lá na frente a volta do primado do sentimento no romantismo, bem como a criatividade livre, expressa na imprevisibilidade e na assimetria, a ser reivindicada pelos criadores do século XX.
Eu falaria dias sobre os detalhes do meu xodó nesta seleção, que é a Infirmata, Vulnerata do Alessandro – que alguns querem ver como peça sacra, o que não me convence… – mas vou só mencionar que, quando minha mente está “tocando” Infirmata, Vulnerata, com a maior facilidade ela “desliza de faixa” e prossegue pela Actus Tragicus, composta por Bach aos 22-23 anos – ou seja: quando Alessandro estava nos seus 47-48. Para facilitar o acesso às sutilezas emocionais da obra, incluo abaixo o texto latino com uma tentativa de tradução… e deixo vocês com a música. Vão lá!
(Ah, sim: titio Dietrich & amigos foram de uma geração anterior ao movimento de instrumentos de época e interpretações estilisticamente autênticas – mas não por isso deixam de fazer música da melhor! Em todo caso, se vocês quiserem comparar com uma leitura “de época” da Infirmata, Vulnerata – com contratenor, dois violinos, órgão e tiorba no contínuo – a realização de que mais gostei até agora vocês encontram em https://www.youtube.com/watch?v=7Q1b6YsiROo . – Qual eu prefiro? As duas, claro! Se posso ter duas coisas gostosas, a troco do quê vou colocar hierarquia entre elas?)
INFIRMATA, VULNERATA: O TEXTO
(Tentativa de interpretação nas entrelinhas: Ranulfus)
Infirmata, vulnerata
Enfermada e ferida
puro deficit amore
por puro amor insuficiente
et liquescens gravi ardore
e pelo ardor penoso que se liquefaz,
languet anima beata.
jaz doente a alma abençoada.
O care, o dulcis amor,
Ó caro, ó doce amor,
quomodo mutatus es mihi in crudelem,
de que modo te transmudaste para mim em cruel,
quem numquam agnovisti infidelem!
a mim que nunca pudeste dizer infiel!
Vulnera percute, transfige cor.
Machuca, golpeia, transpassa o coração:
Tormenta pati non timeo.
sofrer as torturas não temo.
Cur, quaeso, crudelis
Por quê, por favor, cruel ...
es factus, es gravis?
... te tornaste, e sombrio?
Sum tibi fidelis,
A ti sou fiel,
sis mihi suavis.
a mim sê suave!
Vicisti, amor, vicisti,
Venceste, amor, venceste,
et cor meum cessit amori.
e meu coração se rende ao amor.
Semper gratus, desiderabilis,
Sempre bem-vindo e desejável,
semper, semper eris in me.
sempre, sempre estarás em mim.
Veni, o care, totus amabilis,
Vem, ó querido, todo amável,
in aeternum diligam te.
serei eternamente ligad@ a ti.
[Da capo] Semper gratus, desiderabilis,
[Da capo] Sempre bem-vindo e desejável,
semper, semper eris in me... In me.
sempre, sempre estarás em mim... Em mim.
FAIXAS
01 Alessandro SCARLATTI (1660-1725) Infirmata, Vulnerata (Enferma e ferida)
Moteto(?) sobre poema em latim de autor desconhecido
Lançado em vinil em 1963 – 6 movimentos – 13’42
02 François COUPERIN (1668-1733) Première Leçon de Ténèbres: Pour le Mercredi
(1º Ofício de Trevas: para a Quarta-Feira Santa)
Texto: Vulgata Latina: Lamentações de Jeremias, cap.1
Lançado em vinil em 1963 – 7 movimentos – 16’36
03 Johann ROSENMÜLLER (1619-1684) Von den himmlischen Freuden (Das alegrias celestiais)
Cantata para barítono e baixo contínuo
Lançado em vinil em 1972 – 4 estrofes – 9’10
04 Georg Philip TELEMANN (1681-1767) Trauermusik eines kunsterfahrenen Kanarienvogels
(Música fúnebre para um canário virtuose =
“Kanarienkantate” [Cantata do Canário])
Lançado em vinil em 1962 – 9 movimentos – 16’50
MÚSICOS
Voz (barítono): Dietrich Fischer-Dieskau (1925-2012)
Flauta transversal: Aurèle Nicolet (faixas 1 e 2)
Oboé: Lothar Koch (faixa 4)
Violino: Helmuth Heller (f. 1, 2 e 4); Koji Toyoda (f. 3)
Viola: Heiz Kirchner (faixa 4)
Cello: Irmgard Popper (f. 1, 2 e 4); Georg Dondere (f. 3)
Contrabaixo: Hans Nowak (faixa 3)
Cravo: Edith Picht-Axenfeld
Adoro esse trabalho do Pavarotti (1935-2007) e do Henry Mancini (1924-1994) que ora posto para o deleite dos amigos do Blog. Tinha estes registros em fita K7, a italianada da famiglia era fechada com o Pavarotti, lembro bem quando ganhei este K7 do meu pai “sem segundas intenções”…. ouvimos até gastar no bom e velho toca-fitas da nossa saudosa Brasília 74 nos passeios de fim de semana….. Há canções doces (Parlami D’amore, Mariu), canções adoráveis (Palco della Scala, com referências a música da “Pantera cor de rosa” demais…) e canções agridoces (Addio, Songi Di Gloria e Rondine Al Nido), aliás quem conhece aquele hino de Minas Gerais imortalizada nas vozes de Tonico e Tinoco: “Oh, Minas Gerais / Oh, Minas Gerais / Quem te conhece não esquece jamais…” não será mera coincidência o arranjo “Vieni sul mar”… qual melodia veio primeiro ? Este trabalho da dupla Henry e Pava é no mínimo gostoso demais de ouvir, a orquestração do grande Henry Mancini era diferente mesmo, o cara era um gênio. Apesar dos “Três Tenores” acabarem ficando com o estigma de “figurinhas carimbadas” na década de 90 este registro do Pava de 84 nos oferece músicas que por si só já dão muito prazer. Os arranjos de Mancini são realmente o que ajuda a fazer a diferença.
Relaxem e ouçam o calor, a alegria e o drama que os mestres dão a cada música, Pava estava com sua adorável voz no auge no início dos anos 80 e o Henry foi o ítalo-americano mais influente das trilhas sonoras do cinema. Vale a pena ouvir !!!! Mamma mia, apreciem sem moderação.
1984 – Mamma
1 – Mamma (Bixio, Cherubini)
2 – Non ti scordar di me (De Curtis, Furnò)
3 – Lolita (Buzzi-Peccia)
4 – Musica proibita (Gastaldon)
5 – Firenze sogna (Cesarini)
6 – Vivere (Bixio)
7 – Parlarmi d’amore, Mariù (Bixio, Neri, Sievier)
8 – In un palco della Scala
9 – Addio, sogna di gloria (Innocenzi, Rivi)
10 – Voglio vivere così (D’Anzi, Manlio)
11 – Chitarra Romana (Di Lazzaro, Bruno)
12 – Rondine al nido (De Crescenzo, Sico)
13 – La Ghirlandeina (Trad)
14 – La mia canzone al vento (Bixio, Cherubini)
15 – Vieni sul mar (Califano)
16 – La campana di San Giusto (Arona)
Arranjos – Henry Mancini
Maestro do Coro – Henry Mancini
Regente – Henry Mancini
Solos de Flauta – Andrea Griminelli
Tenor – Pavarotti
Henry Mancini Orchestra and Chorus
Gravado no Grand Casino, Noga Hilton, CH Geneva, 1984
EX-CEP-CIO-NAL !!! (só para não dizer IM-PER-DÍ-VEL !!! ). Tanto as composições quanto a realização. [Pequena intervenção de Ranulfus na postagem de CVL]
Esta é uma postagem atípica de minha parte, posto que sou notoriamente voltado para o repertório nacional e contemporâneo, mas emblemática: é de um CD com sete cantatas da veneziana Barbara Strozzi anexo ao livro Safo Novella, de Silvana Scarinci. A musicóloga paranaense (acho que ela é paranaense) estudou academicamente a vida e o legado dessa que foi a mais significativa compositora mulher do barroco e responsável pelo surgimento da cantata: cantata entendida não na sua forma barroco-tardia – dividida em movimentos, escrita para coro e orquestra e ligada a temas sacros – e sim como uma ária operística solta, de duração às vezes não tão curta quanto as de óperas, e destinada à execução em salões (e não em teatros). Tais cantatas não estavam vinculadas às formas em voga na ópera ou mesmo a formas-canção e atendiam à contingência de sua criadora, que não podia circular pela sociedade sem importunações devido à sua condição de cortesã, sublimada através da expressão da poesia de Safo. Saiba mais sobre o livro e o CD aqui.
***
Barbara Strozzi (1619-1677): Safo Novella
1. Giusta negativa – 04:44
2. L’astratto – 10:01
3. Lagrime mie – 10:42
4. Amor dormiglione – 03:03
5. Appresso ai molli argenti – 14:01
6. Moralità amorosa – 04:51
7. Hor che Apollo – 14:30
Intérpretes
Marília Vargas (soprano),
Luis Otávio Santos e André Cavazotti (violinos barrocos),
Sérgio Álvares (viola da gamba) e
Silvana Scarinci (tiorba)
CVL (publicado originalmente em 28.01.2011 — link revalidado em 2016 por Ranulfus, com insistência de PQP em 8 de março de 2019).
PS.: Recomendo aos estudiosos de música barroca e também da problemática dos gêneros na música a aquisição do livro, que contém as partituras de todas as peças do disco.
Tentarei finalizar esta caixa com 12 Cds com as sinfonias de Bruckner, sendo conduzidas por Celibidache, o mais rápido possível. Sei. A parcimônia e os intervalos entre uma postagem e outra estão cacete. É que nesses últimos dias estive sem muita vontade de postar. Além do que comecei a trabalhar numa escola, com possibilidade de trabalhar em outra, já que passei num concurso para professor. Em dois empregos, o tempo para postar irá diminuir. Mas, vamos a mais um post dessa fabulosa caixa. Bruckner labutou em sua Oitava Sinfonia de 1884 a 1887. Mas, mesmo assim, o trabalho só foi estrear em 1892 com Hans Richter. Ou seja, o trabalho somente veio para o mundo propriamente 8 anos após a sua concepção. Tal característica era típica de Bruckner, que era dado a profundos e incessantes receios. Sua personalidade o impulsionava a tais atos. Mas, ainda bem, pois temos uma verdadeira obra prima. É um dos trabalhos mais prodigiosos do compositor. A versão que temos nest post é do ano de 1890. Não deixe de ouvir. Boa apreciação!
Anton Bruckner (1824-1896): Sinfonia No. 8
01. Applause
02. Allegro moderato
03. Scherzo. Allegro moderato – Trio. Langsam
04. Adagio. Feierlich langsam; doch nicht schleppend
05. Finale. Feierlich, nicht schnell
06. Applause
Hoje estamos postando uma versão de Turandot que nos foi solicitada pelos nossos amigos do blog, a ópera em três atos foi composta pelo italiano Giacomo Puccini (1858-1924) e estreada no Scala de Milão a 25 de abril de 1926 com Toscanini na batuta. Como já postamos AQUIcomentários e outras gravações desta fabulosa ópera, tentarei ser mais breve focando nos artistas desta gravação. Sem querer fazer de novo um resumo da ópera Turandot, vou apenas recordar que é uma história de uma princesa chinesa fria e cruel que, em vingança pela desgraça sofrida por um ancestral elaborou três enigmas para todos os seus pretendentes, se o pretendente não acertasse todos os enigmas ela mandava executar o indivíduo. Porém um príncipe estrangeiro se apaixona por ela, e consegue decifrar os enigmas, ela expressa seu ódio e raiva por ter sido superada. A ópera foi censurada na China por muitos anos porque o regime alegou que denegriu a China, os chineses e suas tradições, foi encenada apenas em 1998.
Nilsson e Corelli
Feita em estúdio no ano de 1965 com Nilsson, Corelli e Molinari-Pradelli é perfeita para quem prefere intensidade e excitação desenfreadas acima de tudo, então, um baita Turandot. Francesco Molinari-Pradelli foi considerado como um maestro de fraseado correto, mas não genial, e eu não discordo, mas uma coisa que neste trabalho não falta é a emoção. No final do primeiro ato (que para mim é um bom exemplo para comparação com outras gravações, CD1 faixa 15) acelera para uma velocidade vertiginosa no clímax, criando o caos musical: não é suave, não é elegante, mas capta perfeitamente o desespero selvagem do momento como Calaf desafia a todos. De todas as gravações amplamente disponíveis, esta provavelmente é mais próxima de um “Turandot as verismo”. Em vez do lirismo clássico de Puccini, ou do charme e majestade exóticos do mítico cenário chinês, a principal preocupação aqui parece ser a sangrenta brutalidade e loucura do enredo. Nilsson fez de Turandot sua grande especialidade no repertório italiano; o papel principal é muito exigente e requer um soprano com meios poderosos; é por isso que os sopranos wagnerianos tomaram conta da fria e arrogante princesa chinesa, nenhum tão bem sucedido quanto a imponente Nilsson (gosto muito da Callas e da Caballé, mas a Nilsson representa o papel da forma que Puccini deve ter concebido). O resto do elenco é magnífico, com Scotto e Corelli fornecendo muita emoção. O emocionante Calaf de Franco Corelli com sua voz tremendamente poderosa incendeia a partitura. Outros Calafs são mais elegantes tanto musicalmente quanto emocionalmente (é uma questão de gosto, tem o incomparável Pavarotti, o Fernandi, Stefano, todos gigantes), mas poucos podem igualar a excitação crua que Corelli oferece. Como Liú, Renata Scotto transmite fragilidade e sentimento impecáveis, lindo de ouvir. Sua interpretação da cena da tortura (CD2 faixa 15) é de cortar o coração, com tons quebrados e melancólicos, chega a ser gutural e ainda assim ardente. Bonaldo Giaiotti canta Timur com um tom áspero, enquanto Ping, Pang e Pong de Guido Mazzini, Franco Ricciardi e Piero de Palma são igualmente um trio de vozes bem entrosados com personalidade de sobra, das versões que já ouvi acredito que é a melhor versão para estes personagens.O Rome Opera Chorus oferece o coro com tons bastantes suaves e firmes, com um som grande e robusto para melhorar a atmosfera de sede, sangue e paixão ardente.
Essa é uma gravação que realmente provoca faíscas. Sensacional!
O Libretto e a história “passo a passo” estão AQUI, extraído de um livro , “As mais Famosas Óperas”, Milton Cross (Mestre de Cerimônias do Metropolitan Opera). Editora Tecnoprint Ltda., 1983.
Abrem-se as cortinas e desfrutem da magnífica música de Puccini !
Turandot – Giacomo Puccini
CD1
01 Popolo di Pekino!
02 Padre! Mio padre!
03 Perduta la battaglia
04 Gira la cote! Gira!
05 Perche tarda la luna
06 La, sui monti dell’est
07 O giovinetto!
08 Figlio, che fai
09 Fermo! che fai T’arresta!
10 Silenzio, ola!
11 Guardalo, Pong!
12 Non indugiare!
13 Signore, ascolta!
14 Non piangere, Liu!
15 Ah! per l’ultima volta!
16 Ola, Pang! Ola Pong!
17 O Cina, o Cina
18 Ho una casa nell’Honan
19 O mondo, pieno di pazzi innamorati!
20 Addio, amore!
21 Noi si sogna
22 Gravi, enormi ed imponenti
23 Un giuramento atroce mi costringe
24 Diecimila anni al nostro Imperatore!
CD2
01 In questa reggia
02 Straniero, ascolta!…Nella cupa notte
03 Guizza al pari di fiamma
04 Gelo che ti dà foco
05 Gloria, O vincitore!
06 Figlio del cielo!
07 Tre enigmi m’hai proposto!
08 Ai tuoi piedi ci prostriam
09 Così comanda Turandot
10 Nessun dorma!
11 Tu che guardi le stelle
12 Principessa divina!
13 Quel nome!
14 L’amore …Tanto amore, segreto e inconfessato
15 Tu, che di gel sei cinta
16 Liù…bontà!
17 Principessa di morte!
18 Che è mai di me
19 Del primo pianto…
20 La mia gloria è il tuo amplesso!
21 Diecimila anni al nostro Imperatore!
O desânimo tomava conta de Ruggiero Leoncavallo (Nápoles, 8 de março ou 23 de abril de 1857/1858 – 9 de agosto de 1919 em Montecatini Terme, Itália). Tinha passado dos trinta anos e sua carreira só apresentava decepções. Quando, afinal, conseguiria emplacar uma ópera ? A primeira, Tommaso Chatterton, deixara de ser apresentada porque, à última hora, o empresário fugira com o dinheiro. Com dezessete anos, sem um vintém e perplexo com a desonestidade e a incompreensão de seus semelhantes, partiu para o Egito. Seu tio, que trabalhava como diretor de imprensa do Ministério do Interior, no Cairo, poderia facilitar-lhe as coisas. Mas os tempos bons nessa cidade também duraram pouco: estourou a guerra anglo-egípcia e êle foi obrigado a fugir, disfarçado de árabe. Em Port-Said ganhou algum dinheiro como pianista e conseguiu comprar uma passagem para Marselha, colocando-se a salvo.
A vida modesta em Paris, onde já residia havia alguns anos, agora melhorava: para não morrer de fome, Leoncavallo atuara em cafés-concêrto, compusera cançonetas para as vedetes de um music hall, dera lições de música e ensaiara cantores. Mas a Ruggiero faltava alcançar o sonho de projetar-se como autor de ópera: pediu conselho a amigos, entre os quais o barítono francês Victor Maurel, e teve a atenção despertada para o recente sucesso de outro italiano, Pietro Mascagni, obtido com Cavalleria Rusticana, através de um concurso patrocinado pelo editor Edoardo Sonzogno. Decidiu tentar o mesmo caminho: talvez fosse essa a estrada do sucesso. Incentivado por Maurel, Leoncavallo decide tentar os caminhos trilhados por Mascagni no sucesso de Cavalleria Rusticana.
Conseguiu a partitura da ópera vitoriosa, estudou-a e teve uma inspiração súbita: um caso trágico, acontecido quando criança, encaixava-se bem no esquema vitorioso de Mascagni. Um dia, num pequeno teatro napolitano, durante a representação de uma peça na qual abundavam cenas fortes de amor, o ator principal matara a heroína – que, na vida real, era sua esposa – e o traía com o criado. Depois, chamara o criado ao camarim, e lá também o matara. Para o público que assistia a peça, a morte no palco parecera parte do drama, mas para o pequeno Ruggiero, sentado bem próximo, tudo fora bem verdadeiro. Depois, o pai de Leoncavallo, que era juiz, seria encarregado de presidir o julgamento, fornecendo ao jovem maiores informações. O tema em si não era novidade: já havia sido explorado por outros autores, mas se prestava bem a uma ópera curta, tal como Cavalleria. Leoncavallo retirou-se para Vacallo, nas cercanias de Chiasso (cantão italiano da Suíça) e, em cinco meses, terminou os 70 minutos de duração de sua ópera – libreto e música -, seguindo o mais perto possível o esquema utilizado por Mascagni: um prólogo isolado do corpo da ópera. Várias cenas corais, um intermezzo orquestral. Até mesmo o tempo de duração das duas óperas era equivalente – com 4 minutos a menos para a de Leoncavallo.
Victor Maurel
O passo seguinte foi obter de Victor Maurel a promessa de fazer o papel de Tonio na estréia. A presença do bariono era muito importante, pois sua grande amizade com o editor Sonzogno era meio caminho andado para que este bancasse a ópera. Mas, para isso, Leoncavallo teve que ceder a algumas exigências do cantor: Maurel, temendo ser ofuscado pelo tenor que interpretava Canio (Fiorello Giraud, rapaz de 22 anos que era uma das revelações do bel canto na Itália), sugeriu mudar o nome da ópera de Pagliaccio (no singular) para Pagliacci (plural) ; dessa forma, ninguém poderia dizer que Canio era a figura central.
Outro pedido insistente foi a contratação de um jovem diretor, de idéias modernas, para dirigir a estréia: um tal de Arturo Toscanini. Com apenas 25 anos, no início da carreira, Toscanini dedicou-se com afinco à preparação do espetáculo, chegando a obter de Leoncavallo a divisão da ópera em dois atos (originalmente era em um só ato), de modo a tornar mais leve a apresentação. As negociações com Sonzogno, o único editor em condições de concorrer com Ricordi, na época, não foram longas. Embora assediado continuamente por autores em busca de patrocinador, Edoardo Sonzogno teve tempo de perceber, em Pagliacci, os mesmos componentes que haviam feito o sucesso internacional de Cavalleria Rusticana. Mais ainda: no trabalho de Leoncavallo pressentia a possibilidade de infligir outra derrota a seu concorrente editorial. Tudo aprovado, a estréia da nova ópera ficou marcada para 21 de maio de 1892, no Teatro Dal Verme, de Milão. “Lembro-me bem daquela extraordinária noite em que a ópera subiu a cena”, escreveu o crítico Claude Trevor. “Ninguém sabia coisa alguma sobre ela, exceto que era uma novidade, e de importância bastante para atrair a atenção de Maurel, que cantou a parte de barítono. O Teatro Dal Verme, inteiramente lotado, explodiu em frenesi. E ao cair do pano houve uma cena de entusiasmo tão selvagem como raras vezes se vê.” Até o final do primeiro ato, Leoncavallo foi obrigado a aparecer no palco doze vezes. A ária “Vesti Ia giubba” foi bisada e aclamada. Nem mesmo um acidente inicial – quando o burrico, que transporta os palhaços numa carrêta, tropeçou e provocou risos da plateia – comprometeu o brilho da peça. O regente ganhou entusiástica ovação. E todo o elenco – Maurel, Giraud, Adelina Stehle Mangiarotti, Daddi e Roussel – foi aplaudido de pé durante muitos minutos.
Ruggiero Leoncavallo
A crítica é que não se mostrou unânime nos aplausos (claro né?). Alguns apontaram a habilidade como libretista, mas faziam sérios reparos à qualidade e oportunidade da música. Outros viam no ousado enredo “sinal evidente da decadência do teatro lírico”. Aos críticos que atacavam ferozmente Pagliacci, Leoncavallo sempre retribuiu com indiferença ou desprezo. Depois de seu maior sucesso, o músico colocou, na sala de trabalho, uma grande fotografia do “manekenpis” (menino em pose de urinar, símbolo de Bruxelas) no ato de regar, com dourado esguicho, um muro no qual estava anotada a palavra “críticos”(boa essa!). Em pouco tempo, Pagliacci entrou no repertório dos maiores teatros do mundo. Foi traduzida em diversos idiomas (inclusive hebraico e búlgaro) e conseguiu ser mais representada em Paris do que Pelléas et Mélisande, de Debussy, considerada a ópera francesa de maior sucesso nos primeiros anos do século XX. Em 1945, a ópera de Leoncavallo chegava a apresentação de número 460 na Opéra-Comique de Paris. Foi uma das primeiras óperas apresentadas na televisão dos Estados Unidos e, em 1950, na Alemanha, foi levada em 23 teatros, numa mesma temporada. Depois de Pagliacci (conforme ocorrera com Mascagni, após Cavalleria), Leoncavallo não conseguiu emplacar mais nada de significativo até 1903, com uma simples cançoneta, escrita especialmente para a casa de discos Grammophono: Mattinata, que Enrico Caruso gravou com acompanhamento de piano do autor (já postado AQUI).
Resumo da ópera: Três horas de uma tarde de sol. É 15 de agosto (o ano se situa entre 1865 e
1870), dia da festa da Assunção. A entrada da pequena aldeia de Montalto, na Calábria. seus habitantes se reúnem em trajes festivos para saudar a companhia de atores ambulantes que ali armara acampamento. “Hoje – Grande representação – Palhaço”, lê-se no tosco cartaz em frente ao improvisado teatro. Tonio, o disforme integrante da troupe, observa com desdém a alegre multidão, e afasta-se, indo deitar à sombra do palco. Por fim, chegam os comediantes em uma carreta ornamentada e puxada por um burrico. Peppe, em trajes de Arlequim, conduz o animal com um chicote na mão. Nedda está sentada na frente da carroça. Atrás, vestido de Palhaço,seu marido Canio bate o tambor e conclama o povo. A multidão rodeia o carro aos gritos: “Viva Palhaço! Viva o príncipe dos palhaços!” Canio agradece, simulando cortesia, e tirando o barrete com gesto cômico pede a palavra, em meio ao riso geral. Anuncia pomposamente um grande espetáculo a noite, as 23 horas. (Na época, em algumas regiões da Itália, a contagem do tempo iniciava-se a partir das 20 horas. Assim, 21 horas seria a primeira hora e 19 horas, a 23a.). Todos prometem comparecer. Tonio acerca-se da carroça. Ao tentar ajudar Nedda a descer, recebe uma bofetada de Canio. Todos riem, confundindo o ciúme do Palhaço com uma amostra do que será a comédia.Um camponês convida os atores para beber. Canio e Peppe aceitam, mas Tonio alega ter que escovar o burrinho. “Cuidado, Palhaço”, insinua alguém jocosamente, “êle quer ficar só com Nedda para poder cortejá-la.” Canio não gosta: “É melhor não brincar assim comigo, meu caro. No palco, o Palhaço é indulgente com a esposa que o trai sob o aplauso do público. Mas o teatro e a vida não são a mesma coisa”. Há uma ponta de ameaça no ar e todos, inclusive Nedda, ficam constrangidos. Mas é o próprio Canio quem se encarrega de contornar a situação: beija Nedda afetuosamente e parte com todos em direção à aldeia, enquanto os sinos anunciam a missa.
Ficando a sós, Nedda medita sobre as palavras de Canio. Suspeitaria ele de que ela tem realmente um amante? Não, não é possível! Ninguém conhece seu segredo. Uma revoada de pássaros, entretanto, distrai seu pensamento e recorda-lhe uma canção que ouvira de sua mãe quando menina. Nedda põe-se a cantar. Tonio aproxima-se e elogia o canto de Nedda. Tenta confessar-lhe seu amor, mas é repelido com ironias e, por insistir, a chicotadas. Prometendo vingança, Tonio afasta-se com o rosto ferido. Nesse momento aparece o amante de Nedda: é Sílvio, um jovem camponês. Ela o adverte da imprudência de aparecer a luz do dia, mas o rapaz garante-lhe que não há perigo: Canio está longe, bebendo na cidade. E, diante dos receios de Nedda, êle sugere que ambos fujam nessa mesma noite, para longe. Enquanto isso, Tonio ouvira toda a conversa e se havia dirigido para a vila, a fim de prevenir Canio. Quando este chega, ainda consegue ouvir a despedida de Nedda: “Até a noite e serei tua para sempre’: Sai correndo atrás de Silvio, mas êste já se distanciara. De volta, Canio quer saber o nome do fugitivo. Chega a ameaçar Nedda com o punhal. Peppe o contém, lembrando que o povo está saindo da missa e se dirige para o teatro: a hora do espetáculo se aproxima. Todos se afastam discretamente, deixando Canio sozinho com seu desespero.
Chega a hora da encenação. Peppe com a corneta e Tonio com o tambor atraem os espectadores que chegam de todas as partes. A multidão toma seus lugares e mostra impaciência pelo começo da representação. De repente, as cortinas se abrem. No palco, um cenário mal pintado, que representa uma pequena sala com duas portas laterais e janela ao fundo. Colombina (Nedda) anda nervosamente em cena: ela aguarda Taddeo (Tonio), seu serviçal, que tarda a chegar. Da janela, ouvem-se acordes de uma guitarra. É Arlequim (Peppe), o amante de Colombina, que vem fazer-lhe uma serenata. Logo após chega Taddeo, trazendo as compras. Êle presta contas e, não resistindo a beleza da patroa, confessa-lhe sua admiração. As declarações de Taddeo são interrompidas pela entrada de Arlequim, que o derruba com um pontapé (todos riem) e depois se abrasa a amante. Ele planeja com ela uma fuga para essa noite. Canio (representando o Palhaço) entra de repente. E a tempo de ouvir a mulher gritando para Arlequim, que foge: “Até a noite e serei tua para sempre”. Invocando coragem, Canio prossegue a comedia: acusa Colombina de ter estado ali com outro homem; há dois lugares na mesa. “Que idiotice!”, responde Colombina. “Você está embriagado?” “Sim”, responde Canio, encarando-a. Na realidade, desde que a surpreendera com o rival, ele está transtornado. Assim, sem que o público perceba, a comédia começa a assumir caráter de realidade. Nedda, preocupada, insiste no roteiro da comédia e indica Taddeo (que se escondera) como o homem que a acompanhava. Tonio (Taddeo) aparece e pede – com sarcasmo exagerado – que Canio acredite na mulher. “Ela é pura! E seus lábios fiéis detestam mentir!” O público ri, mas o grito de ódio de Canio emudece todos: ele esqueceu a personagem e agora representa sua própria tragédia. Volta-se para a mulher e exige o nome do amante. Nedda tenta desesperadamente o retorno à comédia e chama-o Palhaço. “Náo. Não sou Palhaço!”, protesta Canio, enquanto o público comenta o realismo da cena. Desanimado, Canio deixa-se tombar numa cadeira, chorando sua amargura e lembrando o quanto fêz por sua mulher no passado. A platéia aplaude entusiasmada o que supõe ser uma excelente atuação. Nedda pede ao marido que a deixe partir, já que é indigna de seu amor. “Não”, responde Canio. Ela deve ficar e dizer o nome de seu amante. A jovem insiste em retomar a comédia e aponta Arlequim como tal.
Canio levanta-se furioso e exige: “O nome, ou tua vida!” Os espectadores estão confusos: já não é comédia aquilo a que assistem. Peppe tenta intervir, mas é contido pelo vingativo Tonio. Silvio quer aproximar-se do palco, mas a platéia, que se levanta assustada, o impede. Tomando de uma faca que estava sobre a mesa, Canio, cego de ódio, golpeia Nedda. Agonizando, ela grita por Silvio, que avança tentando salvá-la. “Ah, é você!”, grita Canio, voltando-se para o rapaz, e enterra-lhe o punhal no coração. Silvio cai fulminado junto a Nedda. E enquanto a multidão se precipita para agarrá-lo, Canio, imóvel, atordoado, deixa cair a arma, dizendo-lhes: “A comédia terminou . . . “
Capa do Encarte
Esta gravação que vos trago é simplesmente maravilhosa. Os dois destaques aqui são Carlo Bergonzi e Herbert von Karajan. Eu escutei outras gravações desta ópera e apesar de serem boas gravações cada qual à sua maneira, a gravação de Karajan é distinta e soberba. Os tempos dos compassos estão certos e as sutis nuances e mudanças nos tempos são simplesmente deliciosas. Karajan aborda esta ópera com um conceito musical diferente do de seus antecessores e vemos o que pode ser feito com essa linda música além de reproduzi-la de maneira simples e rotineira.
Os cantores também são excelentes. Primeiro de tudo, Bergonzi é perfeito como o atormentado Canio. Em “Vesti la Giubba”, ele apresenta uma performance de um homem cujo mundo inteiro acaba de cair ao seu redor e, no segundo ato, “No Pagliaccio non Son” retrata um homem totalmente no final de sua melancolia. Para mim, este é um desempenho perfeito do Pagliacci. Os tempos de Von Karajan são perfeitos e seu fraseado com a orquestra é requintado. Taddei, canta um belo prólogo. Ele pode cantar lindamente, comicamente, e em um momento ele é quase mefistofélico, como na cena com Nedda. Joan Carlyle é uma excelente Nedda, embora não seja do mesmo nível de Callas (já postado AQUI pelo Bisnaga), mas muito atraente. Rolando Panerai canta muito bem, se não um pouco robusto, no papel lírico barítono de Silvio. Igualmente maravilhosa voz Tenor de Ugo Bennelli no papel de Beppe / Arlequino, que canta o papel com uma beleza e facilidade inigualável por qualquer outro Tenor.
A história “passo a passo” esta junto no arquivo de download com as faixas, o resumo da ópera foi extraído do livro “As mais Famosas Óperas”, Milton Cross (Mestre de Cerimônias do Metropolitan Opera). Editora Tecnoprint Ltda., 1983.
Pessoal, abrem-se as cortinas e deliciem-se com a magnífica obra de Ruggiero Leoncavallo!
Dois admiradores do blog (um de música brasileira e outro de música contemporânea em geral) estão se desfazendo de parte de seu acervo e mandaram aqui pro Rio (um me entregou em mãos) algumas coisas bem legais. Sem saber por onde começar, posto este concerto do irlandês Ben Dwyer, tocado pelo amigo Fábio Zanon com a RTÉ National Symphony Orchestra. A Orquestra Sinfônica Nacional da RTÉ é uma orquestra da Raidió Teilifís Éireann. É a primeira orquestra sinfônica de Dublin e uma das melhores orquestras da Irlanda.
O que falar sobre o concerto? Bem, vou criar uma nuvem para me esquivar dessa tarefa: esta obra pode ser tonal ou não tonal, virtuosística ou banal, densa ou frívola, bem orquestrada ou confusa, longa demais ou insuficiente, excepcional ou nada de mais. E você pode gostar ou não gostar – ou baixar e não baixar. Te vira.
“Eu gostaria de pensar que minha música convida o ouvinte a adentrar um mundo sonoro especial que atiça a imaginação e é cheio de cor e movimento. Em torno de formas, sons e texturas que se interpenetram e criam seu próprio espaço”. – Jane O’Leary
Não sou muito entusiasta de música textural, mas a americana residente na Irlanda Jane O’Leary me chamou a atenção por sua tentativa de realizá-la dentro da proposta que enuncia acima. Conheça a compositora clicando aqui.
Jane O’Leary (1946): In the stillness of time
Piano Quintet
1. First Movement (2:17)
2. Second Movement (3:44)
3. Third Movement (4:33)
4. Fourth Movement (5:10)
ConTempo Quartet; Jane O’Leary, piano
5. a piacere (4:57)
Paul Roe, bass clarinet
Why the Hill Sings
6. First Movement (6:04)
7. Second Movement (4:38)
Garth Knox, viola d’amore; Jane O’Leary, piano
In the Stillness of Time
8. First Movement (4:32)
9. Second Movement (5:28)
10. Third Movement (2:47)
11. Fourth Movement (4:28)
12. Fifth Movement (2:17)
RTÉ Vanbrugh Quartet
something there
13. First Movement (1:40)
14. Second Movement (2:40)
15. Third Movement (2:10)
16. Fourth Movement (1:30)
Concorde
17. Mystic Play of Shadows (9:58)
RTÉ Vanbrugh Quartet
“Esse é o mais lindo monumento erigido para a eterna glória da música”, assim declarou Debussy, que sempre foi um grande crítico da música de Richard Wagner, a respeito da ópera Parsifal, a última ópera composta pelo mestre alemão, sendo considerada por muitos críticos o ápice do cenário wagneriano. Tá bom…. “o mais lindo…” é muito, mas entre as 5 melhores obras, acho que aí sim fica mais coerente.
Na prazerosa busca em melhor informar aos leitores do PQP acabamos aprendendo muito com a experiência dos outros. Começamos com o que sabemos, partimos para a pesquisa em bibliografias que possuímos e, tendo um esqueleto do que pretendemos, partimos para a pesquisa na Internet. Até aí nada original. O que é interessante é chegar a algum site que já tenha pesquisado sobre o assunto sobre o qual pretendemos escrever e obter subsídios valiosos para adicionar ao nosso esqueleto. Hoje pela manhã, estava dando tratos à bola de como seria a abordagem da ópera Parsifal, para aqueles que não têm conhecimento da obra e resolvi pesquisar o fundamento histórico que Wagner musicou. Nesta ópera em particular existem diversos sites com as mais diferentes opiniões, misticismo, esoterismo, influências, simbolismos… e tantos outros “ismos”.
Vamos lá então: A ópera de Richard Wagner, “Parsifal”, tem sido, desde sua primeira apresentação no Festival de Bayreuth em 1882, um objeto de imensa fascinação para músicos, intelectuais e simples admiradores apaixonados pela música. Para os primeiros, o trabalho antecipa os desenvolvimentos do compositor desde “Tristão e Isolda”, e atinge um nível de complexidade além de qualquer composição anterior. Para os intelectuais, a mistura de várias teologias e filosofias de Wagner cria um esoterismo irresistível. A longa partitura é envolvida por uma mística incomparável e é, em uma palavra, sublime. Para os admiradores de música um monumento a beleza. Na abertura do libreto de sua última obra, Richard Wagner escreveu as seguintes instruções: “A ação da ópera Parsifal se passa no território dos guardiões do Graal, o castelo de Monsalvat, situado nas montanhas ao norte da Espanha Gótica”. A localização geográfica escolhida por Wagner não foi fruto de fantasia. Sua decisão foi tomada após uma série de pesquisas baseadas em fatos históricos (é baseada em Parzival, atribuído a Wolfram von Eschenbach (~1170 – ~1220)). Quem se deslocar de Barcelona em direção ao noroeste, após quarenta quilômetros de viagem irá divisar a montanha de Montserrat. Trata-se, sem dúvida alguma, da paisagem natural mais impressionante da Catalunha. Diz a lenda que São Pedro depositou em uma das centenas de cavernas que existem no maciço rochoso de Montserrat, uma estátua de madeira da virgem Maria, esculpida por São Lucas. A imagem foi descoberta no século VII e recebeu o nome de Virgem de Montserrat. No ano 976, foi construída uma pequena igreja perto do topo da montanha. Com o passar dos anos, começaram a se multiplicar uma série de milagres provocados por intermediação da virgem. Isto motivou as autoridades religiosas a construir em 1027, o mosteiro beneditino de Nossa Senhora de Montserrat. Hoje ele é considerado, após Santiago de Compostela, o segundo maior centro de peregrinações da Espanha. Em 1811, o mosteiro e a biblioteca foram saqueados e incendiados pelas tropas napoleônicas. Durante os trabalhos de restauração foi construído em um anexo, o museu de Montserrat, que possui em seu acervo obras de Caravaggio e El Greco. A ordem militar dos cavaleiros templários foi fundada na época das cruzadas, para defender o Santo Sepulcro. Sua primeira sede foi na mesquita al-Aqsa situada no monte do Templo, em Jerusalém. Com o passar dos anos, a ordem se transformou no mais poderoso braço militar dos cruzados, espalhando-se por toda a Europa. Dezenas de castelos dos templários foram construídos na Inglaterra, França, Alemanha, Portugal e Espanha, além daqueles espalhados pelo oriente médio. A ordem passou a ser indispensável ao governo pontifício e recebia total apoio dos papas. No século XIV, o Papa Clemente V e o rei da França, Felipe o Belo, se aliaram para destruir os templários e se apossar de suas imensas riquezas. Em 1307, Clemente V editou a Bula Pastoralis praeeminentiae ordenando a prisão de todos os membros da ordem. Acusados de heresia, os templários foram detidos, torturados e tiveram suas propriedades e bens confiscados. Seu líder máximo, Jacques de Molay foi queimado vivo. Antes de sua execução, protestando inocência perante os membros da inquisição, ele implorou a Deus para que no prazo de um ano, o Papa e o rei fossem chamados aos céus para se submeterem ao julgamento divino. A prece de Molay foi atendida. Em menos de um ano tanto Clemente V como Filipe IV morreram. Após a execução do Grão-Mestre do Templo, a Inquisição intensificou a perseguição dos membros remanescentes da ordem. Os últimos sobreviventes foram os templários da Catalunha, que receberam a proteção dos monges beneditinos e se refugiaram no mosteiro de Montserrat. Diz a lenda que o Santo Graal foi levado para este refúgio e escondido numa das grutas da montanha. Baseado nesses fatos, Richard Wagner foi buscar inspiração na história da Abadia de Montserrat, para criar o fictício castelo de Monsalvat, último território dos guardiões do Santo Graal. Até os dias de hoje, Wagner é um dos compositores mais apreciados na Catalunha e todas suas óperas foram traduzidas para idioma catalão.
Wagner concebeu a ideia de escrever “Parsifal” em 1857, mas tal como o ciclo do “Anel”, passou por um período de amadurecimento de 25 anos, tendo sido finalizada somente em janeiro de 1882. Vários críticos de arte inibem o público, desencorajando-o a assistir ou ouvir a ópera, ao afirmarem que a obra é tão séria e solene que apenas os entusiastas por Wagner conseguem apreciá-la. Na verdade, para quem gosta do gênero, e ignora as mensagens subliminares (criadas pelos tais e criativos intelectuais aproveitando os ganchos que o Wagner deixou), o enredo se torna simples e agradável, abordando conhecidas lendas e mitos medievais da época das Cruzadas. Mas gosto muito de enxergar o “algo além”, aquela dúvida que diz: “será que é isso” ? Acredito que o drama Parsifal ensina suas lições de vida. No entanto pelo que pesquisamos vamos dar algumas sugestões de interpretação do poema que podem não estar tão erradas, pois Parsifal é uma das mais místicas óperas. Podemos enxergar simbolismos por toda parte. A lenda pode ser considerada como representação da luta entre o paganismo e o cristianismo nos primeiros séculos da Igreja, os poderes da magia e as quentes paixões do coração humano lutando contra o poder crescente da verdade cristã e o poder vitorioso da pureza como retratado no herói inocente. Ou pode ser considerado como representando em uma lenda mística a história espiritual de Cristo vindo em presença posterior entre os filhos dos homens e imaginada no Parsifal místico. Wagner menciona que esta Escritura estava sempre em sua mente ao escrever Parsifal: “Porventura não fez Deus tola a sabedoria deste mundo? A loucura de Deus é mais sábia que os homens; e a fraqueza de Deus é mais forte que os homens”. Ou além disso, pode representar, de maneira marcante e inspiradora, que os puros de coração obtenham as vitórias na vida; que os inocentes são os valentes filhos de Deus; que o coração que resiste à paixão do mal e é tocado pela piedade é o coração que
Estreia Parsifal 1882 Amalie Materna, Emil Scaria and Hermann Winkelmann
reencarna a pureza apaixonada do Cristo e pode revelar novamente o poder de cura, o Santo Graal de Deus. “Por mais medieval que a linguagem e o simbolismo de Parsifal possam ser”, diz um crítico moderno, “não podemos deixar de reconhecer a simplicidade e o poder da história. Seu significado espiritual é universal. Qualquer que seja o significado disso, vemos claramente que o cavaleiro inocente é Pureza, Kundry é a Maldade do mundo expressa em sua forma mais sedutora, e o Rei Amfortas sofrendo com sua ferida aberta é a Humanidade. Não se pode ler o drama sem emoção, sem se agarrar ao coração, em seu maravilhoso significado, lições edificantes e enobrecedoras “. Nas “Wagner’s Letters”, 1880, páginas 270, 365, 339 o mestre comenta: “O fundador da religião cristã não era sábio: Ele era divino. Acreditar Nele é imitá-lo e buscar a união com Ele … Em conseqüência de Sua morte expiatória, tudo o que vive e respira pode conhecer a si mesmo redimido … Somente o amor enraizado na simpatia e expresso em ação ao ponto de uma completa destruição da auto-vontade, é o amor cristão “. A ideia dominante em Parsifal é a compaixão como a essência da santidade, pode também sugerir que todas as grandes religiões em sua essência de paz e amor são semelhantes…. eita, chega…. !!! Vamos à música, podemos ficar filosofando aqui por muitas e muitas páginas, o mar de informação desta obra na net é incrível. Quem se interessar pode viajar por horas lendo e se divertindo.
Curiosidades e esquisitices: Quando de sua estreia no ano de 1882, as 16 apresentações foram regidas por Hermann Levi, filho de um importante rabino da cidade de Karlsruhe, que, apesar da insistência de Wagner para que se convertesse ao cristianismo antes do começo dos Festivais, permaneceu fiel ao judaísmo. Por coincidência, a regência do “Parsifal” no ano de seu centenário foi entregue por Wofgang Wagner, neto do compositor, ao maestro judeu James Levine. Outra curiosidade que envolve “Parsifal”, diz respeito aos aplausos: por ocasião da estréia, Wagner estabeleceu que ao final do 1º e 2º atos, o público deveria se abster de aplaudir, a fim de que fosse mantido o clima provocado pela música. O reconhecimento aos cantores e músicos seria reservado para o final do 3º ato. Com a morte de Wagner, sua família e seus admiradores quiseram ser mais exigentes que o falecido e ficou decidido que a ópera não seria aplaudida nem em seu encerramento. Esta tradição foi mantida até 1965, e atualmente existe o compromisso tácito da platéia de não aplaudir somente o final do 1º ato. Portanto, se um dia você tiver o privilégio de assistir Parsifal, não cometa o sacrilégio de aplaudir o final do primeiro ato. Nem respire.
Hermann Levi
Resumo (extraído do site: www.barroconabahia.com.br/parsifal/default.asp)
Parsifal foi estreada em 26 de julho de 1882 em Bayreuth. Tem 3 atos e 5 cenas
O Santo Graal, cálice com o qual Cristo celebrou a última ceia e com o qual José de Arimatéia recebeu o sangue derramado abaixo da cruz, e a Lança Santa com que o soldado romano feriu o Crucificado, foram entregues, por anjos que desceram à terra, para o puro e justo cavaleiro Titurel. Para guardar esta Santa Relíquia, ele construiu um castelo e fundou uma irmandade com outros cavaleiros puros, para defender as relíquias na terra. Foi também consagrado como o primeiro rei do Santo Graal e em todas as vezes que ele, com a irmandade, revelaram o Graal para celebrar os Santos Mistérios, uma força divina fortalecia os cavaleiros. Após a morte de Titurel, o filho deste, Amfortas, foi o sucessor como rei do Santo Graal. Mesmo morto, Titurel ainda vivia na cova, graças à força divina. Klingsor, um antigo candidato a membro da irmandade, e que não foi aceito por falta de pureza e capacidade moral, tornou-se inimigo da irmandade, um demônio. Amparado pelas forças do mal, ele tenta destruir a irmandade e, para isso, está procurando roubar e abusar das Santas Relíquias. Muitos cavaleiros já caíram nas armadilhas de Klingsor. Para acabar com a perseguição, Amfortas foi, um dia, para o jardim encantado, lutar contra o inimigo, Klingsor. Porém, aconteceu que mesmo o rei do Santo Graal foi vítima de sua maldade. Kundry, uma bruxa, amiga de Klingsor, incorporando uma personagem de belíssima mulher, roubou a consciência de Amfortas e, desta forma, ele caiu nos braços dela. Klingsor então pode roubar a Lança Santa e, com ela, ferir Amfortas. Somente graças à ajuda de Gurnemanz, um nobre cavaleiro, o rei conseguiu escapar no último momento, mas sua chaga foi grave e não quer se cicatrizar. A chaga traz dores e terríveis sofrimentos para Amfortas. Ele deseja a salvação, preferindo morrer a continuar com uma vida de sofrimentos. Mas a força do Santo Graal, a cada vez que Amfortas celebra os mistérios, fortalece-o, ainda que não o cure, uma vez que ele recebeu a chaga por força do pecado que cometeu com Kundry, contra sua própria natureza. Toda a irmandade perdeu força, acompanhando a fraqueza do rei, sendo o roubo da Lança Santa um sinal preocupante. Nas orações de Amfortas apareceu-lhe, certa vez, uma profecia do Santo Graal: “um dia aparecerá um tolo inocente que irá trazer a salvação e ser o novo rei.”
Parsifal e os Cavaleiros do Graal
Primeiro Ato: Gurnemanz, o mais velho cavaleiro da irmandade, ensina aos jovens escudeiros o serviço dos cavaleiros do Graal. Kundry, como bruxa selvagem, aparece trazendo um bálsamo para Amfortas, que ela conseguiu na Arábia. Durante o caminho para banhar-se em um lago na floresta, o rei Amfortas aparece carregado em uma cadeira de arruar, acompanhado por alguns cavaleiros. No banho, ele procura aliviaras dores da chaga. Gurnemanz e Amfortas contam a origem do Santo Graal e as circunstâncias do roubo trágico, por Klingsor, aos escudeiros e cavaleiros, que se admiram. Após o retorno de Amfortas para o castelo, um cisne branco cai do céu. Os cavaleiros e escudeiros ficam escandalizados: “Quem cometeu um crime deste na floresta do Graal, onde todos os animais são considerados santos?” Logo os cavaleiros encontram o delinquente, o jovem que atirou a flecha improvisada no cisne branco. Durante o interrogatório do jovem atirador, Gurnemanz percebe que Parsifal nem sabe seu próprio nome, nem sua origem, nem tem noção da culpa por ter atirado no cisne na floresta santa. Gurnemanz tem a primeira noção de que este jovem poderia ser o anunciado tolo inocente. Desse modo, convida o jovem Parsifal para acompanhá-lo até o castelo do Graal, onde serão, naquele dia, celebradas as cerimônias da revelação do Graal. Em um cortejo solene, os cavaleiros entram, acompanhados por anjos, no templo do Graal. Parsifal, acompanhado por Gurnemanz, entra no templo e testemunha uma cerimônia grandiosa. Ele não demonstra reação alguma, permanecendo mudo e quieto em um canto. Amfortas entra, trazido em seu trono de arruar, pelos cavaleiros. Titurel, o pai de Amfortas e antigo rei que ainda vive na cova, pela força do Santo Graal, pede ao filho para iniciar a celebração. Mas Amfortas, fraco e cansado, sofrendo pela chaga, recusa celebrar a cerimônia. Os cavaleiros não se importam com isso e insistem, novamente, no início da celebração. Isolado e sofrendo as maiores dores, Amfortas finalmente cumpre sua função como rei do Graal, que coros de anjos acompanham solenemente. Parsifal permanece impassível em um canto, até o fim da cerimônia. Certamente Parsifal não pode ser a pessoa anunciada: mesmo um tolo completo, ele não demonstrou um único sinal de compaixão. Decepcionado, Gurnemanz expulsa Parsifal do templo do Graal.
Parsifal no jardim das Donzelas
Segundo ato: O que Gurnemanz ainda não descobriu é que Parsifal pode ser, de fato, o anunciado tolo inocente, o que o feiticeiro Klingsor já percebeu. Para acabar com Parsifal, Klingsor prepara as mais fortes armadilhas contra ele: mulheres sedutoras e a bruxa Kundry, incorporando a linda mulher, para fazê-lo também cair em tentação. Parsifal, que depois de expulso do Castelo do Graal já andou o mundo todo e aprendeu bastante, chega ao jardim encantado de Klingsor. Muitas mulheres, de beleza excepcional, tentam seduzi-lo, mas ele, inexperiente, pensa que são lindas flores. Kundry, a mais bela de todas, aparece e pede que as outras se retirem. Ela lança, agora, sua mais forte arma: ela chama Parsifal pelo seu nome, pois havia dois dias que ele não ouvia sua mãe o chamar e tinha-o esquecido. Parsifal lembra-se de seu nome e da própria mãe que o chamava, sempre, pelo nome. Recordações e muitas emoções inundam sua mente. Assim, Parsifal começa a compreender a vida, e tem início um processo de maturação. Kundry não consegue seduzir Parsifal, mas um único beijo que ela soltou foi suficiente para ele acordar: Parsifal começa a ter noção do que era o amor de sua mãe, do sofrimento e das dores que ele deu a ela através da fuga sem motivo. Parsifal agora entende as dores e os sofrimentos de Amfortas, como Rei do Graal de um lado, e pecador de outro. Entende, também, Kundry, que está querendo seduzi-lo, porém procura a libertação da possessão do demônio. Compreende a paixão do Salvador para a salvação de todos os homens. Depois dessa transformação de Parsifal, Klingsor não consegue nada contra ele. A Lança Santa que Klingsor joga, com toda raiva, contra Parsifal, para milagrosamente em pleno vôo, acima da cabeça deste. Assim ele pega a Lança Santa e, com ela, faz o sinal da cruz. Imediatamente Klingsor e o jardim desaparecem.
Tradicional encerramento da ópera
Terceiro ato: Por muito tempo a irmandade do Santo Graal vive sem a força sagrada, porque Amfortas foi fraco demais para cumprir a função da celebração do Graal. A irmandade está muito triste e Titurel morreu definitivamente. Naquela Sexta-feira Santa, a irmandade irá se reunir pela última vez para celebrar o funeral de Titurel. Gurnemanz vive perto do Castelo do Graal, como eremita. Nesta Sexta-feira-Santa, pela manhã bem cedo, Gurnemanz encontra Kundry, perto da casa dele, no meio da mata. Mas desta vez Kundry parece bem diferente, não há mais a mulher selvagem e bruxa como antes: ela mudou. Está vestida como uma penitente. Gurnemanz interpreta essa mudança como um bom sinal. Logo após, aparece mais alguém, um cavalheiro estranho, com um capacete fechado e armado, com uma lança. Quando o cavalheiro abre finalmente o capacete, Gurnemanz reconhece o que Kundry sentira antes: o estranho cavaleiro é Parsifal. E logo depois ele reconhece, também, a Lança Santa que Klingsor roubou e que Parsifal traz de volta. Assim, Gurnemanz descobre que Parsifal é, realmente, o anunciado redentor que trará a salvação para Amfortas. Como o cavaleiro mais nobre da irmandade do Santo Graal, Gurnemanz consagra Parsifal, com óleo, como novo rei do Graal. Como primeira tarefa, ele batiza a convertida Kundry, que lava os pés dele, seguindo o exemplo de Maria Madalena. Gurnemanz acompanha, novamente, Parsifal, agora como o novo rei, para a cerimônia no castelo, onde as últimas celebrações do Santo Graal, em homenagem a Titurel, falecido, irão acontecer. Amfortas, sofrendo muito, não quer saber da celebração do Graal, desejando apenas a morte. Recusa-se, veementemente, realizar a cerimônia, desejando ver-se livre do seu sofrimento. Naquele momento, quando a irmandade estava prestes a forçar Amfortas a cumprir sua função, Parsifal aparece com a Lança Santa. Ele toca com a lança a chaga de Amfortas e imediatamente a chaga se cicatriza. A anunciada salvação para Amfortas chegou. Como novo rei do Santo Graal, Parsifal preside a Santa Cerimônia, elevando o Santo Graal, abençoando toda a irmandade, anunciando que nunca mais deverá ser coberto o Santo Graal, e que todos tenham acesso a sua força. Coros de anjos cantam o apoteótico final: “Salvação para o Redentor”.
Para finalizar, Parsifal é pai de Lohengrin, um individuo que também teve direito a uma ópera de Wagner quando este era um rapazinho mais novo, ópera essa que futuramente postaremos !
Pessoal, o poema em português e a história “passo a passo” com fotos dos encartes originais estão junto no arquivo de download com as faixas, o resumo da ópera foi extraído do livro “As mais Famosas Óperas”, Milton Cross (Mestre de Cerimônias do Metropolitan Opera). Editora Tecnoprint Ltda., 1983.
PARSIFAL Opera em três atos de Richard Wagner, libreto do compositor.
PARSIFAL com M. Callas, B. Christoff, Vittorio Gui
Anos atrás, quando ouvi pela primeira vez essa apresentação de Parsifal , achei muito estranho ser cantada em italiano e ao mesmo tempo curioso. Após algumas outras audições, descobri um excelente desempenho tanto da adaptação para o italiano como dos cantores. A intensidade, o comprometimento e os momentos fascinantes que Callas, então com 27 aninhos, nos proporcionam particularmente em seu monólogo do ato II, “Grausamer”, no qual ela descreve o sucedido depois de ter rido de Cristo na cruz, é notável, a diva interpreta Kundry como uma pantera escura e neurótica, encantadora e antipática, sobretudo muito bem cantada. Baldelli, tenor, tem uma interpretação mediana, as vezes acho que grita demais. Já Christoff, que é abençoado com sua bela voz trovejante, parece um padre guardião ainda mais pontificável. Panerai, pinta Amfortas com muita gentileza, nobreza e grande força. Modesti é um Klingsor frio e calculista. Gui e a Orquestra Sinfonica Della Rai estão um pouco lento mas competentes. Não é exatamente uma gravação ao vivo esta feita entre 20 e 21 de novembro de 1950, mas uma gravação para rádio, que é muito diferente.
Kundry – Maria Callas
Parsifal – Africo Baldelli
Gurnemanz – Boris Christoff
Amfortas – Rolando Panerai
Titurel – Dimitri Lopatto
Klingsor – Giuseppe Modesti
Cavaleiros do Santo Graal – Aldo Bertocci e Mario Frosini
Escudeiros do Graal – Silvana Tenti, Miti Truccato Ritmo, Franco Baldaccini, Aldo Bertocci
Donzelas das Flores – Lina Pagliughi, Renata Broilo, Anna María Canali, Liliana Rossi, Silvana Tenti, Miti Truccato Pace
Orquestra sinfônica e coro do Rai de Roma
Gaetano Riccitelli, maestro do coro
PARSIFAL com Placido Domingo, Jessye Norman, James Levine
Sem dúvida Plácido Domingo se encaixou muito bem no papel de Parsifal, ele não se arrisca muito, mas exige exatamente o tipo de tons médios e baixos, ricos e poderosos, característicos do Placidão. Lembrando que ele é um “Jovem Tolo” de meia-idade. Kundry de Jessye Norman, retratando a sedutora enlouquecida figura, sugere credibilidade a psique torturada por trás dos gritos de cortar a respiração, tradicionais de Kundry. Gurnemanz, em muitos aspectos, o personagem mais interessante do trabalho, parece exatamente assim na performance ricamente peculiar de Robert Lloyd. Franz Mazura, um veterano Klingsor, competente, sua voz gotejando o mal, ele conspirou com amargura compreensível como o vilão. Ekkehard Wlaschiha era um Amfortas bastante sonoro, melodramático ! A regência de James Levine, um modelo de arrebatamento concentrado durante o período de cinco horas, colocou justamente a ênfase na partitura orquestral. Seus andamentos em seu estado mais lânguido dramatizam mais ainda esta ópera wagneriana. Gravação 01 de Junho de 1994.
Kundry – Jessye Norman
Parsifal – Placido Domingo
Amfortas – Ekkehard Wlaschiha
Gurnemanz – Robert Lloyd
Titurel – Paul Plishka
Klingsor – Franz Mazura
The Metropolitan Opera Orchestra and Chorus
James Levine, Maestro
PARSIFAL com Peter Hofmann, Dunja Vejzovic, Karajan
Parsifal de Karajan parece crescer em estatura como uma interpretação em cada nova audição; ouvi há um tempão atrás, na época do vinil , esta versão que ora posto foi gentilmente cedida pelo FDPBach e ouvindo de novo na sua remasterização para o CD, parece ter adquirido uma nova profundidade, em termos de som, devido ao maior alcance da gravação e à maior presença de cantores e orquestra. Como em praticamente todos os casos, o CD oferece uma experiência mais imediata. A leitura de Karajan, um pouco distante no Ato 1, cresce em intensidade e sentimento com o próprio trabalho, alcançando uma força quase aterrorizante no Prelúdio para o Ato 3, que é sustentado até o fim da ópera. O Gurnemanz de Moll é uma performance profundamente expressiva e suavemente moldada de notável beleza. Vejzovic, cuidadosamente construída por Karajan, dá a performance de sua vida como Kundry. O tom de Hofmann como Parsifal descreve a angústia e a eventual serenidade do personagem em sua interpretação sincera e interior. Van Dam é um tanto plácido como Amfortas, mas seu canto exibe poder admirável e boa estabilidade. Nimsgern é malícioso como Klingsor. Eu gosto muito do tom sensual de Barbara Hendricks como a primeira donzela de flores. Os efeitos dos sinos e do coro distante dos meninos no domo da abadia são extraordinariamente belos e há vários momentos de arrepiar nesta leitura que são inigualáveis. A Filarmônica de Berlim é magnífica. Das gravações comerciais, a de 1979-80 de Herbert von Karajan para a Deutsche Grammophon é para mim a melhor gravação de “Parsifal”. Segundo comentários da Amazon nenhuma partitura se adequava às predileções de von Karajan mais do que essa ópera. Este é o maior Parsifal já registrado. Na minha opinião quando se trata de escolher uma gravação para viver numa ilha deserta essa seria uma das primeiras a levar, Karajan fodástico nesta gravação de março de 1981. A melhor de todas !!!!
Parsifal – Peter Hofmann
Amfortas – José van Dam
Gurnemanz – Kurt Moll
Kundry – Dunja Vejzovic
Klingsor – Siegmund Nimsgern
Titurel – Victor von Halem
Donzelas das Flores – Barbara Hendricks, Janet Perry, Inga Nielsen, Audrey Michael.
Berlin Deutsche Oper Chorus
Berlin Philharmonic Orchestra
Dia desses foi postado pelo mano PQP Bach uma gravação deste bom velhinho, Günter Wand, creio que da Nona de Bruckner. Resolvi então procurar e achei suas gravações das sinfonias de Brahms.
Amo, adoro e venero estas sinfonias, e não canso de procurar outras versões delas. Já devo ter umas 6, pelo menos. E ainda procuro aquela que poderei considerar definitiva. Toscanini, Fürtwangler, Karajan, Bernstein, Abbado, Wand, Klemperer, Jochum, todos eles sem exceção deram suas contribuições. Não consegui estabelecer um ranking entre estas gravações, nem pretendi fazê-lo, pois os vejo de diferentes perspectivas. Alguns críticos consideram as gravações de Toscanini e de Fürtwangler imbatíveis. Porém os métodos de gravação da época ainda eram precários, e por mais que os engenheiros de som trabalhassem, não conseguiam fazer milagres. Os outros acima citados viram a evolução das gravações, a criação do estéreo, do som digital.
Vejo nas obras dele um embate constante entre a razão e a emoção, e dependendo do regente, vemos este conflito quase que explícito. Por exemplo, o primeiro e o quarto movimentos da Sinfonia nº1, este último já discutido aqui no blog. Wand nos brinda com uma gravação impecável do ponto de vista do equilíbrio e dinâmica. O registro da massa orquestral nos momentos mais expressivos não soa tão grandiloquente quanto ao que Karajan imprimiu à Filarmônica de Berlim (tremo ao lembrar da abertura da primeira sinfonia na sua gravação dos anos 80), ou o Bernstein, um pouco mais contido, é verdade, à Filarmônica de Viena, porém acho que o resultado soou mais agradável, não tão assustador quando a de Herr Karajan. Wand é grande em todos os sentidos. Conseguiu colocar a excelente NDR Sinfonieorchester nos níveis de excelência de outras orquestras tradicionais alemãs, e a sonoridade que ele consegue extrair é exemplar, contando também com a ajuda da engenharia de som da RCA.
Deixem-me contar uma pequena crônica de minha vida, que se passou há exatos 20 anos atrás, quando morava em São Paulo. Minha casa tinha uma varanda nos fundos, de onde tinhamos uma vista privilegiada do bairro da Aclimação. Certo final de tarde de sábado, sozinho em casa, coloquei minha velha fita cassete da Sinfonia nº1 com o Karajan no walkman, sentei-me em uma cadeira, e fiquei ali ouvindo o velho Herbert regendo a sua Filarmônica de Berlim. Senti minha alma ser transportada para outra dimensão. Naquele dia fui agraciado com um pôr-de-sol de outubro deslumbrante, com nuvens assustadoras no céu, e quando soavam os timpanos da orquestra parecia que era a voz de Deus querendo falar comigo, ou pelo menos tentando. Não, não fumei nem tomei nada antes, e não arrisco dizer que foi uma experiência quase mística. Aqueles foram um dos momentos mais marcantes de minha vida. Nunca mais consegui experimentar a mesma emoção. Já ouvi esta sinfonia milhares de vezes, e ouvirei quantas mais forem possíveis, mas sei que nunca mais ter a mesma sensação.
Com relação á terceira sinfonia, bem, só tenho a dizer que se Brahms só tivesse composto o terceiro e o quarto movimentos desta sinfonia já teria dado sua contribuição para história da música ocidental. É uma sinfonia romântica em sua essência, talvez a mais desavergonhadamente romântica das quatro. Seu terceiro movimento é de um lirismo pungente, emocionante, quase nos leva às lágrimas. Nela Brahms extravasa suas emoções.
01 – Brahms Symphony No.1 in C minor, Op.68 – I. Un poco sostenuto, Allegro
02 – Brahms Symphony No.1 in C minor, Op.68 – II. Andante sostenuto
03 – Brahms Symphony No.1 in C minor, Op.68 – III. Un poco allegretto e grazioso
04 – Brahms Symphony No.1 in C minor, Op.68 – IV. Adagio non troppo ma con brio
05 – Brahms Symphony No.3 in F, Op.90 – I. Allegro con brio
06 – Brahms Symphony No.3 in F, Op.90 – II. Andante
07 – Brahms Symphony No.3 in F, Op.90 – III. Poco allegretto
08 – Brahms Symphony No.3 in F, Op.90 – IV. Allegro
Eu tava na agonia para postar este CD desde quando o comprei, em agosto. Queria compartilhar com vocês não os Concertos de Haydn e sim o Concertino do pernambucano Clóvis Pereira, escrito a pedido de Antonio Meneses. (Apesar de que as versões de Meneses para os dois Concertos de Haydn serem simplesmente ESPLÊNDIDAS).
Segundo apurei numa matéria na revista Concerto de julho ou junho, não me lembro, Meneses estava na casa do maestro Rafael Garcia, no Recife, quando o regente chileno mostrou uma gravação das Três peças nordestinas de Clóvis Pereira (creio que exatamente a mesma gravação postada há um ou dois anos aqui no Blog, do CD A música erudita de compositores populares pernambucanos).
Meneses gostou tanto do Aboio, o segundo movimento, que Rafael Garcia acabou apresentando por telefone o celista ao compositor e testemunhou a encomenda da obra, saída a pulso devido ao receio do autor de não fazer algo à altura do intérprete. Para se ter ideia da auto-exigência de Clóvis Pereira, ele — que é o maior compositor pernambucano erudito vivo, depois de Marlos Nobre — tem um catálogo que não deve passar de 25 obras (contabilizei 15 até agora), com a compensação de a maior parte delas ter sido gravada e ser eventualmente executada.
Quanto ao Concertino em si, creio que a maior virtude dele é a de se adequar a qualquer programa de concerto sem maiores dificuldades, por ser tonal e respeitar a estrutura tradicional dos concertos clássico-românticos além de se valer de temas e ritmos nordestinos marcantes, desenvolvidos através de um tratamento harmônico neoclássico que evitasse qualquer tentação de modalismo exoticista — vale lembrar que Clóvis Pereira foi aluno de Guerra-Peixe e um dos primeiros compositores armoriais. Prova dessa citada virtude é a sua inclusão entre os dois concertos de Haydn no presente disco.
Clóvis Pereira parece ter nomeado a obra de concertino, em vez de concerto, por conta das cadências curtas e da ausência de dificuldades extremas para o solista (o que ele compensou na Suíte Macambira (2008), para cello solo, já postada também aqui no blog). Essa prudência, já explicada dois parágrafos atrás, é até boa para evitar excesso de expectativa e comparações com obras estabelecidas.
O primeiro movimento, assim como o tema rondó do terceiro, é calcado em ritmo de galope nordestino e se vale da forma-sonata de uma maneira interessante e pouco usual: estabelecendo uma alternância tensão-afrouxamento a partir de um único tema em andamentos diferentes, o segundo mais lento.
O segundo movimento, monotemático, utiliza o mesmíssimo aboio das já mencionadas Três peças nordestinas, mas agora com um acompanhamento orquestral diferente e que atinge o clímax em fortíssimo no meio do movimento, imprimindo uma forma de arco ao direcionamento da dinâmica ao longo dos cinco minutos desta parte da obra.
O terceiro movimento alterna um outro tema de galope nordestino com um de frevo, o qual vem a revisar simbolicamente uma omissão histórica do Movimento Armorial na década de 70 – que rejeitou o frevo pelo fato de ser um gênero musical popular urbano e tonal quando os compositores armoriais bebiam majoritariamente da música folclórica rural e modal.
Dito isto, o concertino de Clóvis Pereira colocou-se como a mais apresentável e bem recebida peça para cello e cordas do repertório nacional não só pelo empenho de Meneses (que inclusive toca o Aboio em uma versão para cello solo como bis em alguns recitais e pediu a Clóvis Pereira a exclusividade de execução durante alguns anos) mas pelos próprios méritos: a não opção pelo virtuosismo extremado, pela dramaticidade, e pelo folclórico apelativo acabou favorecendo uma obra com melodiosidade e boa comunicação e soube fazer uma concessão ao público sem perder em termos estéticos.
PS.: O tema original do aboio, com extensão de quatro frases (a quarta com coda), foi gravado por Ariano Suassuna no interior da Paraíba e, fora o emprego por Clóvis Pereira em duas ocasiões, foi usado por Cussy de Almeida em seu próprio Aboio e no Gloria da Missa Sertaneja. Cada compositor criou desenvolvimentos temáticos diferentes para a toada de vaqueiro.
Clóvis Pereira (1932) e Joseph Haydn (1732-1809): Concertos para violoncelo
Haydn
1. Concerto For Cello And Orchestra No. 1 In C Major, Hob. VIIb:1: I. Moderato
2. Concerto For Cello And Orchestra No. 1 In C Major, Hob. VIIb:1: II. Adagio
3. Concerto For Cello And Orchestra No. 1 In C Major, Hob. VIIb:1: III. Allegro Molto
Pereira
4. Concertino For Cello And String Orchestra: I. Allegro Con Moto
5. Concertino For Cello And String Orchestra: II. Aboio. Adagio
6. Concertino For Cello And String Orchestra: III. Rondo Agalopado. Allegro
Haydn
7. Concerto For Cello And Orchestra No. 2 In D Major, Hob. VIIb:2: I. Allegro Moderato
8. Concerto For Cello And Orchestra No. 2 In D Major, Hob. VIIb:2: II. Adagio
9. Concerto For Cello And Orchestra No. 2 In D Major, Hob. VIIb:2: III. Rondo. Allegro
Neste terceiro CD da série dedicada ao grande pianista, compositor e professor Xaver Scharwenka (1850-1924) a gravadora Hyperion selecionou mais nove peças sempre com a competente interpretação da pianista turca Seta Tanyel. As peças que abrem este CD são quatro Danças Polonesas, Op 58, foram compostas quando Scharwenka estava no auge de seu poder criativo. Em contraste com seus trabalhos anteriores neste gênero, essas peças fazem um maior uso de harmonias cromáticas e modulações avançadas, mostrando maior maturidade do compositor, não são apenas meras referências às mazurcas de Chopin. Embora Scharwenka não fosse o nacionalista ardente há talvez uma referência irônica ao hino polonês na última peça deste conjunto. Já o Scherzo em sol maior, Op 4 (1869) é uma peça cheia de exuberância juvenil e um bom exemplo da capacidade de Scharwenka de compor de forma eficaz para sua própria exibição como virtuoso sem sacrificar o verdadeiro conteúdo musical. O pianista não recebe trégua enquanto a peça se desenrola, terminando com uma onda espetacular de dificílimas oitavas quebradas. O século XIX foi a idade de ouro dos grandes pianistas virtuosos que eram obrigados pela tradição a compor música para tocar em seus próprios concertos. Durante a primeira metade do século, em particular, muita música foi escrita principalmente para simples exibição de virtuosismo do intérprete e continha todas as dificuldades técnicas imagináveis. Um grande número de fantasias, rondós e conjuntos de variações sobre as melodias populares apareceram, que foram alvo de críticas muito negativas de músicos e compositores sérios, representados em particular por Robert Schumann. Scharwenka não foi exceção, criou obras para não ficar de fora da dita moda dos pianistas “malabaristas”. A Barcarolle em Mi menor Op 14 é uma peça curta composta no início da década de 1870. Scharwenka usa seu conhecimento profundo do piano com um bom efeito, com uma rica linha melódica acima de um constante e ondulante acompanhamento, peça bem bonita. A obra Novelette und Melodie, Op 22, (1875), encontamos alguma evidência aqui da influência de Schumann, particularmente na Novelette mais enérgica, em contraste direto, a simplicidade do Melodie cria um ar de tranquilidade zen. Com exceção de suas Danças polonesas, Variations para Piano, Op 48, foi provavelmente o trabalho mais popular de Scharwenka durante sua vida. Ele certamente tocava em seus concertos e, em 1919, foi interpretado pelo jovem Claudio Arrau em Berlim, em um concerto para celebrar o quinquagésimo aniversário de Scharwenka como artista, as Variações são um excelente trabalho de grande criatividade. Divirtam-se !
Peças para piano Volume 3
01 Polish Dance op 58 n01
02 Polish Dance op 58 n02
03 Polish Dance op 58 n03
04 Polish Dance op 58 n04
05 Scherzo in G major op 4
06 Barcarolle in E minor op 14
07 Novelette und melodie op 22 – Novelette
08 Novelette und melodie op 22 – Melodie
09 Variations for piano op 48
Olá pessoal, estou postando o segundo CD da obra de Scharwenka, assim como o CD 1 este conjunto de peças para piano surpreendem bastante pela harmonia gostosa e alegre de ouvir. Composto em 1877 e dedicado a Brahms, o Romanzero Op 33 é uma fantasia em quatro movimentos. O primeiro movimento dramático um scherzo é seguido por um Adagio bastante contemplativo, que serve como um intermezzo que conduz ao terceiro movimento. Aqui, após a abertura do Vivace, o tema do Adagio aparece novamente. No Allegro do último movimento parece sugerir uma polonesa de Chopin, melodia leve e envolvente. A sonatina em mi menor, Op 52 n º 1 foi composta em 1880. É bastante formal em estilo, seguindo modelos do período clássico, com um “Tempo di Menuetto” como o segundo movimento. A sonoridade desta sonatina lembra obras compostas voltadas ao estudo do piano, de habilidade intermediária, uma elegante peça para os pianistas amadores. Ao longo de sua carreira criativa, Scharwenka retornava constantemente a escrita das danças polonesas, assim como Chopin sempre retornava a escrever mazurcas. De fato, a maioria das chamadas danças polonesas de Scharwenka são mazurkas. Ele escreveu cerca de trinta ao todo, e os dois aqui que compreendem Op 29, em Dó menor e Si menor, respectivamente, foram escritos por volta de 1876. Como a maioria de seus trabalhos anteriores nesse gênero, eles consistem em um número pequeno de temáticas contrastantes e elegantes. Durante os sete anos que se passaram desde o aparecimento de sua primeira sonata para piano, Scharwenka estabeleceu sua reputação como compositor, e sua segunda sonata em Mi Op 36, composta em 1878, foi sem dúvida seu trabalho mais substancial para piano solo. Dividido em quatro movimentos, com o scherzo precedendo o terceiro movimento lento. Mais uma vez o conteúdo melódico é forte e a escrita do piano é de alto padrão consistente, como se poderia esperar de um dos principais pianistas do início do século vinte. Um apanhado de obras que nos remetem instantâneamente ao compositor que o mestre pianista Scharwenka gostava mais de interpretar: Chopin.
Aclamada tanto por suas performances distintas do repertório tradicional quanto por sua consistente defesa das obras de compositores menos conhecidos, Seta Tanyel tem atraído muita atenção do público em todo o mundo. Nascida em Istambul nos idos de 1947, de ascendência armênia. Ela recebeu inúmeros elogios da crítica por suas gravações nos selos das Chandos, Collins Classics e Hyperion. “As performances de Seta Tanyel estão além do louvor em sua inestimável série Scharwenka”, declarou a revista Gramophone. As gravações pelo selo da Hyperion foi descrita pela revista americana Fanfare como “uma adição diferenciada ao catálogo – um vencedor. Ouçam e divirtam-se !
Franz Xaver Scharwenka CD2
01 Romanzero Op 33 Allegro
02 Romanzero Op 33 Adagio
03 Romanzero Op 33 Vivace
04 Romanzero Op 33 Allegro
05 Sonatine in E minor Op 52 Allegro
06 Sonatine in E minor Op 52 Tempo di Menuetto
07 Sonatine in E minor Op 52 Allegro
08 Polish Dance Op 29 Vivace
09 Polish Dance Op 29 Moderato
10 Sonata No 2 Op 36 Allegro Maestoso
11 Sonata No 2 Op 36 Allegro appassionato
12 Sonata No 2 Op 36 Adagio
13 Sonata No 2 Op 36 Allegro con brio
A Sinfonia No. 4 em dó menor de Shostakovich foi feita em 1936, momento auge dos Grandes Expurgos ocorridos de 1934 a 1939, durante os chamados Processos de Moscou. Depois da consolidação do poder nazista em 1933, a Alemanha começara o desenvolvimento de sua indústria de guerra, preparando-se para a futura guerra contra a União Soviética, sua maior inimiga. Diante desse perigo externo, ainda havia o “perigo interno”, o crescimento da oposição de esquerda ao stalinismo por parte dos bolchevique-leninistas (trotskistas) na União Soviética. Muito da agitação dos opositores de esquerda ao stalinismo dessa época vêm do fôlego proporcionado pela Revolução Espanhola que se inicia em 1936, e também pela continuidade da Revolução Chinesa no sucesso da Longa Marcha, além do próprio perigo do nazismo que crescia. Diante disso, Stálin foi obrigado a tomar duas medidas: prender, executar e perseguir todos os perigos em potencial dentro e fora da União Soviética, inclusive executando todos os dirigentes do Partido Comunista e boa parte de seus militantes (executando também militantes revolucionários anarquistas e bolchevique-leninistas na Espanha), e, por outro lado, buscar um acordo com a Alemanha na fé de que a diplomacia impediria o ataque iminente (que foi firmado em 1939 no Pacto de Ribbentrop-Molotov).
No meio dessa conturbada conjuntura, Shostakovich, bebendo ainda dos ventos criativos da década anterior, estudava Mahler, e lançara sua ópera Lady Macbeth de Mtsensk, baseada na novela homônima de Leskov, fazendo imenso sucesso no mundo inteiro.
E foi através do jornal Pravda que Shostakovich, no meio de toda essa turbulência, ficou sabendo que sua ópera Lady Macbeth era atacada como “barulho ao invés de música”. Sua quarta sinfonia buscava dar um fôlego criativo para fora dos limites das duas sinfonias anteriores que se detinham sob a estética do realismo socialista. Além disso, a quarta sinfonia é quase uma apresentação do resultado de seus estudos sobre Mahler. Shosta termina a obra, mas impede a estreia que estaria marcada para dezembro de 1936.
ESCUTANDO A 4ª SINFONIA
Essa obra não se assemelha às sinfonias de Mahler apenas por todo o cromatismo tonal, mas também pelo tamanho da orquestra: 125 músicos. A duração também: por volta de 60 minutos.
Primeiro Movimento (Allegretto poco moderato – Presto)
o tema A se desenvolve por um longo tempo, numa tensão tão infinita que até Mahler ficaria espantado; ao fim, no que parece que será o clímax do início do movimento, temos uma quebra pela percussão, que inicia aos poucos, juntos a um solo de viola um novo tema, um tema B, até que é substituído pelo fagote que canta o tema A junto ao ritmo percussivo dos pizzicatos. Acaba inconclusivo, agudo e grave ao mesmo tempo, como se uma contradição imanente à música apenas se retirasse de cena, para cedo ou tarde, retornar…
Segundo Movimento (Moderato con moto)
Shostakovich aqui demonstra sua capacidade de fazer nascer de uma grande tensão algo libertador, como se a própria tensão estivesse prenhe de sua resolução. Apesar do começo com um tema dançante e lamentoso, já ao meio do movimento, após aparecimento aqui e ali de motivos do tema A do primeiro movimento, a futura resolução no terceiro movimento surge grandiosa, mas rapidamente desaparece; quase como se fosse um ensaio geral do que estaria por vir.
Após variações nas cordas, as flautas surgem repetindo o tema A deste movimento, que é interrompido brevemente pelas cordas, mas o tema retorna, variando, em meio aos metais que surgem com o tema B deste movimento. A harmonia vez ou outra beira outros tons, assim como fazia Mahler. Novamente, entre variações do tema A, o tema B surge nos metais, enquanto nas flautas se mantêm o tema A. É quase como uma briga entre metais e madeiras que sofre uma dura intervenção nas cordas do ritmo compassado do motivo do tema que finalizará a sinfonia no terceiro movimento. Os tímpanos também intervém, e tudo volta à “normalidade”. Isso ocorre ao final dos três minutos. Em seguida, o tema A retorna nas cordas em sua forma original, como uma dança lamentosa. Varia por um longo tempo nos violinos e violas, repete-se nos cellos, e se interrompem. As flautas entram em cena com o tema, variando-o a beira da dissonância, criando uma harmonia quase que “alienígena”, que vai ficando extremamente tensa até que os metais surjam novamente com o tema B, ao que acompanham as flautas. As cordas fazem o “baixo-contínuo”, e toda orquestra agora está engolfada por este tema. Um fagote solista faz a transição para o final do movimento, que termina com uma percussão que beira os dois temas sem se definir.
Terceiro Movimento (Largo – Allegro)
O terceiro movimento inicia com uma melodia grave surgindo nas madeiras e outro mais agudo surge no oboé e se repete nas flautas. Essa melodia, uma marcha fúnebre, tem uma gravidade semelhante à que tem o terceiro movimento da 1ª Sinfonia de Mahler, parecendo um tema folclórico. Os contrabaixos repetem-se no fundo como um coração batendo, enquanto as cordas leve e lentamente repetem o motivo deste movimento final; os sopros respondem; metais reclamam um tom grave e uma percussão delicada toca levemente. Lá, nos fundos, algum metal repete lentamente o motivo deste tema final. A delicada percussão do xilofone (ou vibrafone?) se mantém até o fim da sinfonia, com o grave dos contrabaixos constante, batendo como um coração, provavelmente inspirado no final da Patética de Tchaikovsky, encerrando a sinfonia num sombrio desfecho.
O INTÉRPRETE
A interpretação de Rattle é tipicamente inglesa: bem definida e comportada, dando ênfase nas danças, tornando as fanfarras dos metais quase em “valsas”. Falta algo da visceralidade misturada com a rigidez teuto-eslava dos russos, como se pode ouvir na interpretação de Kondrashin. O ponto forte de Rattle é a melodiosidade: sua rigorosidade inglesa ajuda a manter as melodias principais da sinfonia bem definidas, tornando-as empolgantes. Além disso, como todo bom inglês, sabe lidar bem com os metais.
FUNERAL RUSSO
A prova de que os ingleses são bons com os metais está na obra seguinte, o “Funeral Russo”, de Britten. Apesar de ser sua única obra com este arranjo, ele se sai muito bem. Pega a famosa canção “Tu caíste, como vítima, na luta!”, e a transforma numa quase-fanfarra de metais e percussão.
Essa canção, muito conhecida na Rússia, foi escrita em 1878. Foi cantada principalmente na Revolução de 1905, após o massacre do Domingo Sangrento realizado pelo Czar, e foi novamente recuperada em 1917, na marcha de março feita em Petrogrado em homenagem às vítimas da Revolução de Fevereiro. Graças às revoluções de 1917, ela se tornou mundialmente famosa, sendo cantada mesmo durante os protestos no ano de 1968 pela Europa. O próprio Shostakovich coloca essa canção no terceiro movimento (o Adagio) de sua 11ª Sinfonia. Foi muito utilizada também em filmes, como no “Encouraçado Potemkin” de Eisenstein, e também no filme soviético de 1935 “A Juventude de Maxim”.
Vejam esta bela cena do filme com a letra da música em português:
É interessante o que Britten faz com a obra: intercala a canção com uma fanfarra militar, quase que burlesca, que não tem muito a ver com a Rússia, nem com a canção. Mas tem muito a ver com Mahler e com o próprio Shostakovich (ambos utilizavam marchas militares de forma séria e também como paródia em suas sinfonias), e também com o momento em que Britten escrevia a obra, 1936: ascensão do fascismo na Alemanha e na Itália, Revolução na Espanha e na China, Processos de Moscou na URSS, etc.
Em síntese, ambas as obras conseguem sintetizar o espírito da primeira parte do século XX: fúria, terror, suspense, pesar, esperança. São obras sublimes, e o álbum é muito inteligente ao juntar as duas.
Dmitri Shostakovich (1906-1975): Symphony No. 4 in C minor op. 43; Benjamin Britten (1913-1976): Russian Funeral
Dmitri Shostakovich (1906-1975):
Symphony No. 4 in C minor opus 43
01 I. Allegretto poco moderato-Presto-(Tempo I)
02 II. Moderato con moto
03 III. Largo-Allegro
Benjamin Britten (1913-1976):
Russian Funeral
04 Russian Funeral (for brass and percussion) – Andante alla marcia – Un pochissimo animando – Tempo primo piu maestoso
City of Birmingham Symphony Orchestra
Simon Rattle, conductor
Grande blog PQP Bach… Vida longa ao melhor blog de música do Brasil !!!! Parabéns por mais um ano ! Vou postar nesta data de aniversário a ópera Sansão e Dalila do mestre Saint-Saëns (9 de outubro, 1835 – 16 dezembro, 1921). No início da segunda metade do século XIX a França foi tomada de uma moda de oratórios bíblicos; o governo francês, então, resolveu promover um concurso de obras do gênero. Saint-Saëns resolveu encarar este desafio. E inspirado em Haendel, a quem admirava muitíssimo, planejou compor um oratório baseado na história de Sansão que está encontrada no livro dos Juízes, no antigo testamento da Bíblia. A história que inicialmente Saint pesquisou e estudou foram os versos que Voltaire havia escrito em 1732 para que o compositor Rameau musicasse, fato que não aconteceu. Camille não gostou do texto, queria algo novo, não tão fiel às escrituras. Convidou o marido de uma de suas primas, um talentoso poeta chamado Ferdinand Lemaire à escrever um oratório sobre o tema, mas ele sugeriu a Saint que fosse sim uma “grand opera”. Em 1865 Lemaire entregou o libreto como o conhecemos hoje. Camille entre uma viagem e outra concluiu partes do que hoje é o segundo ato e chamou alguns convidados para uma audição particular da nova obra. Entre eles as duas árias mais famosas da ópera, cantadas por Dalila, “Amour, viens aider na faiblesse” e “Mon coeur s’ouvre a ta voix” (faixa7 CD do Carreiras). Porém a receptividade da plateia foi fria e o compositor deu uma leve “brochada” e pôs de lado a ideia. Numa das suas inúmeras viagens, em 1869, Camille encontrou seu amigo Franz Liszt e este o convenceu a retomar o trabalho e se comprometeu a encená-la no teatro da corte de Weimar do qual ele era o diretor. Saint-Saëns voltou ao trabalho, alternando momentos de entusiasmo e indiferença, o fato é que a ópera só ficou pronta em 1876. Em agosto de 1877 organizou uma representação da ópera completa na casa de um amigo na cidade de Croissy, a obra foi recebida friamente pois a moda dos temas bíblicos tinha passado completamente. Como diz o ditado “quem tem amigo não morre pagão” Liszt cumpriu a promessa e em 2 de dezembro de 1877 a ópera estreou em Weimar, com o libreto traduzido para o alemão. Foi um grande sucesso, porém a imprensa francesa, na época completamente germanófoba por causa da guerra Franco-Prussiana, ignorou completamente o sucesso. A ópera só foi estrear na França em 1890 graças aos esforços de uma aluno de Camille, Gabriel Fauré. Levou ainda dois anos para ser ouvida na Ópera de Paris, transformando-se num absoluto sucesso, até 1976 contabilizavam-se 965 apresentações de Sansão e Dalila só no teatro Palais Garnier. No Metropolitan de NY a ópera estreou na temporada de 1915/1916 com Margaret Matzenauer como Delila, Enrico Caruso como Sansão e Pasquale Amato como o Sumo Sacerdote. Desde então, o Met encenou produções da ópera pelo menos uma vez a cada década, dando mais de 200 apresentações do trabalho.
Plácido Domingo atuou como Samson na produção de San Francisco Opera de 1981 que ora disponibilizo na íntegra, gravação ao vivo. Já o CD com a Agnes e o Carreras é um highlight de dez faixas com os melhores momentos. Gosto mais da versão do Plácio Domingo.
“É a história de um homem que foi forte o suficiente para derrotar os inimigos de Israel, os filisteus, mas não o suficiente para resistir à malícia de uma mulher, ô mulherada poderosa… o Sansão ai do lado está só o pó! ”
Resumo:
Primeiro ato: Gaza, 1150 a.C. Em uma praça em Gaza, um grupo de hebreus implora a Jeová por alívio de sua escravidão aos filisteus; Sansão, seu líder, os repreende por sua falta de fé. Quando o comandante dos filisteus, Abimelech, denuncia os hebreus e seu deus, Sansão o mata e leva os hebreus embora. O Sumo Sacerdote de Dagon vem do templo filisteu e amaldiçoa a força prodigiosa de Sansão, partindo com o esquife do homem morto. Um hebreu antigo elogia o retorno de Sansão. As paredes externas do templo desaparecem para revelar a ex-amante de Sansão, a filistéia Dalila, que o convida a ir naquela noite a sua casa vizinha. Ela e suas donzelas dançam sedutoramente para Sansão, que se torna surdo às severas profecias do hebreu antigo.
Segundo ato: No vale de Sorek, Dalila chama seus deuses para ajudá-la a enredar e desarmar Samson, prometendo ao Sumo Sacerdote encontrar uma maneira de tornar o herói impotente. Sansão aparece, apaixonado apesar de si mesmo; quando Dalila o tem em seu poder, ela finge descrença em sua constância e exige que ele mostre seu amor confiando nela o segredo de sua força, chorando quando ele se recusa. Sansão ouve trovões como um aviso de Deus, mas não pode resistir a seguir Dalila para dentro. Pouco tempo depois, tendo finalmente aprendido que o segredo da força de Sansão é seu cabelo comprido, ela chama soldados ocultos filisteu, que correm para capturar e cegam Sansão.
Terceiro ato: Em uma masmorra em Gaza, o cego Sansão empurra um moinho em círculo, orando por seu povo, que sofrerá por seu pecado. Ele ouve suas vozes castigando-o. Durante um bacanal no Templo de Dagon, Dalila e o Sumo Sacerdote provocam Sansão. Quando eles o forçam a se ajoelhar diante de Dagon, ele pede a um menino que o leve aos dois pilares principais do templo. Sansão ora a Jeová para restaurar sua força e, com grande esforço, ele puxa os pilares e o templo, esmagando a si mesmo e seus inimigos.
A história “passo a passo” com fotos do encarte original do CD e DVD estão junto no arquivo de download com as faixas, o resumo da ópera foi extraído do livro “Outras Óperas Famosas”, Milton Cross (Mestre de Cerimônias do Metropolitan Opera). Editora Tecnoprint Ltda., 1983.
Parabéns ao blog e acima de tudo um ótimo divertimento!
Samson et Dalila, José Carreras, Agnes Baltsa
01 Dieu! Dieu d-Israel!
02 Arretez, O Mes Freres
03 Maudite A Jamais Soit La Race
04 Printemps Qui Commence
05 Samson, Recherchant Ma Presence –
06 En Ces Lieux, Malgre Moi, M-ont R
07 Mon Coeur S-ouvre A Ta Voix
08 Vois Ma Misere, Helas!
09 Bacchanale
10 Seigneur, Inspire-Moi, Ne M-aband
Dalila – Agnes Baltsa
Samson – José Carreras
High Priest of Dagon – JonathanSummers
Abimelech – Simon Estes
An old Israelite – Paata Burchuladze
Chor & Symphonie – Orchester das Bayrischen Rundfunks
Regente – Sir Colin Davis
Gravação – München, fevereiro 1989
Sansão e Dalila (conversão de DVD para mp3) – Plácido Domingo e Shirley Verrett
Act 1 – Chapter 2 até Chapter 13
Comentário Julius Rudel – Chapter 14
Act 2 – Chapter 15 até Chapter 23
Comnetário Julius Rudel – Chapter 24
Act 3 – Chapter 25 até Chapter 31
Comentário final – Chapter 32
Samson – Placido Domingo
Dalilah – Shirley Verrett
High Priest – Wolfgang Brendel
Abimelech – Arnold Voketatis
An old Hebrew – Kevin Langan
San Francisco Opera
San Francisco Opera Chorus
Regente – Julius Rudel
Gravação ao vivo, San Francisco Opera, 1981
Se, no cair da noite, algo em você pedir um clima litúrgico, experimente Franck.
Se pedir intelectualidade vibrante, desenvolvimentos de idéias ousados levando a orgasmos mentais, experimente Franck.
Se pedir contemplação serena, experimente Franck.
E se estiver num estado de sensualidade mais corpórea… mesmo isso eu digo que é possível encontrar em Franck – embora admita que sintonizá-lo nesse canal já não é bem assim pra qualquer um.
É domingo e não quero torrar ninguém falando de como Franck gera obras inteiras de motivos de duas notas, das construções em arco ou espelho tipo 12321, da quase obsessão com o número 3 (3 temas, 3 partes divididas em três, 3 na cam… – ops, aí eu já não tava lá pra ver). Digo apenas: aqui você tem 3 x 2 CDs, desfrute!
As peças famosas estão sempre no segundo CD de cada par. Tudo em ordem cronológica, dá pra ver como através de diversas tentativas menores um compositor prepara os músculos para um tour de force.
No caso de Franck isso parece se dar, justamente, em três grandes ondas. No topo da última reuniu em si o potencial de ruptura de um Wagner com o potencial de renovação-do-herdado de um Brahms. Inventou o uso do órgão como orquestra, e elevou a aplicação do intrumento até um nível onde, estendendo os olhos até o horizonte, a única outra coisa que se avista é Bach.
E no entanto mais de metade da obra, em volume, consiste de pequenas peças pra tocar nos ofícios ordinários de pequenas igrejas, concebidas para caber naquela sanfona com fole de pedal que se chama harmônio. Treinado pelo pai para a carreira de pianista-prodígio, fugiu dos teatros e palcos para ir criar belezas inconspícuas em espaços de devoção obscuros.
Não se negue que em algumas dessas peças o cheiro de igreja chega a ser incômodo – mas muitas outras são arranjos de noëls – cantos populares de Natal – que parecem conversar diretamente com as miniaturas para jovens pianistas de Tchaikovski, tão divinamente gravadas por Rimma Bobritskaia neste post do PQP aqui.
Pra terminar: já disse em outro post que, no meu ouvir, Hans-Eberhard Ross não declama as frases de Franck com a clareza desejável. Mas isso não quer dizer que o interesse desta edição seja só histórico, “aqui tem a obra inteira, embora esteja ruim de ouvir”. De jeito nenhum! No mínimo os timbres do instrumento são os mais incríveis que já vi brotar de um órgão: flautas mais azuis que céu do Sul em dia de geada, baixos abismais pra DJ nenhum botar defeito…
Para cada volume (par de CDs) tem ainda um livrim com quase 30 páginas, em ingrêis e alemão. Diverti-vos!
CD 1.1
01 Piece en mi bemol, 1846
02 Piece pour Grand Orgue, 1854
03 Andantino Gm, 1856
04 Fantaisie en C, version I, 1856
05-09 Cinq pieces pour Harmonium transcrites pour Grand Orgue par Louis Vierne
10 Offertoire, Allegretto moderato en A, ~1858
11 Fantaisie en C, version II, 1863
12 Quasi Marcia op. 22 pour Harmonium, ~1865
CD 1.2
Six Pieces pour Grand Orgue, 1859-1863
01 Fantaisie op16
02 Grande Piece Symphonique op17
03 Prelude, Fugue et Variations op18
04 Pastorale op19
05 Priere op20
06 Final op21
CD 2.1
01-39 Pieces pour harmonium ou orgue a pedales (L’Organiste II)
CD 2.2
01-05 Pieces pour harmonium ou orgue a pedales (L’Organiste II)
06 Fantaisie C major, version III, 1868
07 Entree pour Harmonium, 1875
08 Fantaisie en A (3 pieces pour Grand Orgue, 1878)
09 Cantabile (3 pieces pour Grand Orgue, 1878)
10 Piece heroique (3 pieces pour Grand Orgue, 1878)
11 Petit Offertoire pour Harmonium, ~1880
12 Andante quasi lento pour Harmonium, ~1880
CD 3.1 Pieces pour Orgue ou Harmonium, 1990
(7 sobre cada nota, em maior ou menor; projeto inconcluso, faltando 3 grupos: A, Bb, B)
01-08 Sept Pieces en C et Cm (+ Amen = 8 faixas)
09-16 Sept Pieces en Db et C#m
17-24 Sept Pieces ‘Pour le temps de Noel’ en D et Dm
25-32 Sept Pieces en Eb et Ebm
33-40 Sept Pieces en Em et E
41-48 Sept Pieces en F et Fm
CD 3.2
Pieces pour Orgue ou Harmonium, 1990 (continuação de 3_1)
01-08 Sept Pieces en F# et Gbm
09-16 Sept Pieces ‘Pour le temps de Noel’ en G et Gm
17-23 Sept Pieces en Ab et G#m
24 Choral I en E, 1890
25 Choral II en Bm, 1890
26 Choral III en Am, 1890
Para festejar a entrada de um novo ano o monge Ranulfus foi buscar vinhos de anos velhíssimos: a Idade Média.
Talvez o que mais o tenha inspirado a fazê-lo seja o nome do grupo: Chominciamento de Gioia – onde a primeira palavra (se não falha agora o tino linguístico do referido monge) com toda probabilidade é derivada no verbo italiano cominciare (começar), apenas que numa grafia incomum, dando ao conjunto o sentido de “puxar festa”, de provocação ou incitamento à alegria (gioia), ou até mesmo de “alegre começo”. Para que coisa melhor, então, numa entrada de ano?
Ainda mais falando de vinhos, videiras e vinhas!
Verdade que em muitas das peças o vinho entra domado por fortes sentidos religiosos – especialmente naquelas cantadas em (tinha que ser!) galaico-português.
Ainda assim, o monge espera que possa ser um bom divertimento a pelo menos uma boa parcela dos nossos leitores – ainda mais que os textos todos estão incluídos no arquivo. Isso ajuda até mesmo a seguir a versão orffiana (mais conhecida) da canção satírica In Taberna, da coletânea medieval de canções conhecida como Carmina Burana, que encerra o CD.
Mas agora vam’bora, cada um atrás da sua taça, que o ano não tarda!!
IN VINEA MEA: vinhos & vinhas na Idade Média com o Ensemble Chominciamento de Gioia
01 Bacche bene venies – Carmina Burana nº 200 – séc.13
02 Deficiente vino – Ms I-Pa 2788, Perugia – séc.14
03 Como Deus fez vynno 0 Cantigas de Santa Maria nº 23 – séc.13
04 Bon vin doit – Roman de Fauvel – séc.14
05 Alte clamat Epicurus – Carmina Burana nº 211
06 L’autre lèr cuidèl aver druda – Chãnson trobadorica, NN – séc.12
07 Ben pod’as cousas – Cantigas de Santa Maria nº 73 – séc.13
08 Sacerdos in aeternum – Ms I-Pa 2799, Perugia – séc.14
09 Procurans odium – Carmina Burana nº 12 – séc.13
10 Vinum bonum – Ms. Egerton – séc.13
11 Ges de disnar – Bertrand de Born – séc.12
12 Dixit pater familias – Ms I-Pa 2785, Perugia – séc.14
13 Poder a Santa Maria – Cantigas de Santa Maria nº 161 – séc.13
14 Felix vitis – Ms I-Pa 2785, Perugia – séc.14
15 A que Deus – Cantigas de Santa Maria nº 351 – séc.13
16 O Divina Virgo flore – Laudario di Cortona – séc.13
17 On parole / A Paris / Frese nouvella – Ms. Montpelier – séc.13
18 In taberna – Carmina Burana nº 196 – séc.13
PS: por muito tempo este CD pareceu inencontrável na Amazon – até que em 06/04/2016 o(a) leitor(a) que se identifica como Sedmagis nos enviou o link – que agora, finalmente, foi incorporado à imagem no alto do post, e de quebra matou a charada da inencontrabilidade: em 2010 recebi o arquivo com um erro de latim no título, que é IN VINEA, não IN VINA. Sem sermos especialistas em línguas mortas, acabamos engolindo essa mosca por mais de cinco anos. Valeu, Sedmagis!!
Johannes Vermeer: O Copo de Vinho (1658-1660). Gemalde Galerie Berlin.
Aqui temos dois importantes representantes da música francesa do final do século XIX e início do século XX. Fauré, especificamente, é mais conhecido pelo seu Réquiem, com certeza uma das páginas mais belas da história música, tanto pela pureza, quanto pela simplicidade daquilo que ouvimos. No Réquiem de Fauré, percebemos um senso de equilíbrio, de elegância, clareza, recato poético, o que torna a obra absolutamente arrebatável. Sua música possui uma fragrância inconfundível. César Franck também foi o criador de um estilo bem singular no qual os atributos mais densos podem ser verificados em sua Sinfonia em D menor. Ou seja, nestes dois belos e tristes quartetos de cordas aqui apresentados, temos a oportunidade de descobrirmos um pouco mais do mundo artístico desses dois importantes compositores. Boa apreciação!
César Franck (1822-1890) – String Quartet in D major
01. Poco lento – Allegro
02. Scherzo:Vivace
03. Larghetto
04. Allegro molto
Gabriel Fauré (1845-1925) – String Quartet in E minor
05. Allegro moderato
06. Andante
07. Allegro