Polinizar beleza pela cyberesfera é padecer no paraíso, sabemos bem, e manter-se vivo é um fenômeno, sabemos melhor ainda. Por isso, a Irmandade Mundial de Polinizadores Culturais aprecia por demais constatar que, em sua contagem anual das cabeças, e a despeito da crescente cavalaria do Apocalipse, a maior parte delas siga em riste. E eu, humilde chapeiro-sênior neste blogue já penalmente maior, saúdo que há já dez anos esteja entre elas a do inestimável Instituto Piano Brasileiro.
Fundado em 17 de agosto de 2015 pelo incansável, imparável, inesgotável Alexandre Dias, o Instituto Piano Brasileiro, doravante chamado IPB, busca pesquisar o piano brasileiro em suas múltiplas faces e inúmeras camadas, dedicando-se a investigar discografias e repertórios, a recompor trajetórias de pianistas e compositores, a recuperar e digitalizar acervos, e divulgar suas descobertas ao público através das plataformas de polinização da cyberesfera. Mantido desde sua criação tão só por financiamento coletivo de seus assinantes no Brasil e no exterior, o manancial com que o IPB nos provê é tão generoso quanto imenso é o trabalho que dá a seu fundador. Nas palavras do próprio:
Nosso trabalho é calcado na compreensão de que o Brasil possui uma das culturas mais ricas do mundo, e isso se reflete na cultura pianística. Todos os dias aparecem coisas incríveis em nosso trabalho, e confesso que essa sensação de realização anda lado a lado com um certo desespero por ver tantas coisas desaparecendo, como partituras, gravações, e documentos de nossa história pianística. Uma boa parte de nosso trabalho é dar sobrevida para este material, para que ele se multiplique nas mãos de pianistas, professores e pesquisadores interessados.
Entre momentos surreais, como o resgate de um acervo de Guiomar Novaes duma caçamba de lixo, e a glória de ter um recital do titã Nelson Freire generosamente dedicado ao IPB, além do reconhecimento e do abraço de Minha-Nossa-Sua Majestade, a Rainha, o legado construído ao longo desses dez anos é fruto dum trabalho indispensável que devemos não só reconhecer e homenagear, mas também apoiar. Além de sermos, o IPB e o PQP, sócios de carteirinha da Irmandade Polinizadora supracitada, sinto-me muito próximo do Instituto desde sua criação. Alexandre é nosso leitor-ouvinte há muitos anos, e eu mal tinha completado minhas primeiras semanas como chapeiro na PQP Corp. quando ele surgiu nos comentários duma postagem minha, com um IPB de sete dias no colo, oferecendo apoio para nossa empreitada de resgatar do esquecimento o mestre Antonio Guedes Barbosa. Hoje, para nossa felicidade, o acervo fonográfico de Antonio, doado pela família, está integralmente disponibilizado para a cyberesfera, totalizando horas de gravações inéditas – muitas a mais que sua infelizmente minúscula discografia – a provarem que seu repertório era muito maior e mais complexo do que sabíamos.
Os números do IPB impressionam: em dez anos, foram 7.300 vídeos vídeos postados no canal do YouTube, dos quais cerca de 5.000 vídeos-partituras), com mais de 62 mil inscritos e 14 milhões de visualizações; no Instagram, são 48 mil seguidores e 1628 postagens, e, no Facebook, 38 mil seguidores e milhares de publicações. Sem desejar restringir os caminhos dos leitores-ouvintes na navegação dessa exuberância amazônica, listaremos a seguir alguns pontos especialmente altos do acervo do Instituto para que com eles se deleitem enquanto vocês escolhem seus igarapés:
Arnaldo Estrella – Tchaikovsky: Concerto no. 1 – Bruno Walter/Filarmônica de Nova York (1943)
Entre tantas relíquias, há vários candidatos a Santo Graal – e este é, para mim, o mais forte entre elas: Arnaldo Estrella sob o legendário Bruno Walter a tocar o primeiro movimento do Concerto no. 1 de Tchaikovsky, em pleno Carnegie Hall, com a Filarmônica de Nova York. Difícil algo mais épico.
Guiomar Novaes – Beethoven: Sonata para piano, Op. 111 e Andante Favori – Ao vivo na Sala Cecília Meirelles (1967)
Um dos mais importantes acervos digitalizados pelo IPB é o de Frank Justo Acker. Gaúcho radicado no Rio de Janeiro, Frank capturou ao longo de décadas o som da crème de la crème da Música em palcos cariocas. Suas gravações têm uma calidez e um senso de proximidade do artista que a tornam ímpares entre os registros de sua época. Um exemplo sensacional do talento de Frank é este registro de Guiomar Novaes tocando a derradeira sonata de Beethoven no mesmo ano em que realizou sua única gravação comercial da mesma:
Do mesmo recital, e igualmente preciosa, é a gravação de Frank para a única leitura deixada por Guiomar do Andante favori, WoO 57, de Beethoven – obra que ela nunca gravou comercialmente:
Nelson Freire: entrevistas (2015 e 2019) e recital em prol do Instituto Piano Brasileiro (2019)
Nosso saudoso gigante colaborou intensamente com Alexandre Dias desde antes da fundação do IPB e lhe concedeu duas memoráveis entrevistas. A primeira delas, algumas semanas antes da inauguração do Instituto, foi gravada na casa do Mestre no Rio de Janeiro, e chama a atenção pela extensão, ademais impensável para o mineirinho taciturno, que denota a cumplicidade com o entrevistador e o tamanho de seu amor em comum pelo piano brasileiro. Publicada em texto em 2015, teve seu áudio divulgado pela primeira vez em novembro de 2021, enquanto nós (e o mundo) ainda tentávamos nos recolocar de pé depois daquele dia primeiro tão triste:
A segunda entrevista aconteceu durante a última visita de Nelson a Brasília, especialmente para dar, num imenso gesto de generosidade, um recital em prol do IPB. Produzido por Alexandre Dias e realizado em 17 de janeiro de 2019, o presente de Nelsim ao Instituto foi gravado e – claro – disponibilizado para a cyberesfera. Sempre que tento imaginar o que passou pela mente de Alexandre enquanto um dos maiores pianistas do mundo tocava em prol de seu sonho, eu fracasso clamorosamente -em seu lugar, acho, eu teria virado suco. O que sei lhes dizer é que, sob as mãos de Nelson, a Barcarola de Chopin (a partir de 25:04) acaricia cada fibra do miocárdio, e que há algo entre a preparação para a coda e o acorde final que faz meus olhos suarem sempre:
Logo após o recital, Nelson – feliz como poucas vezes o veríamos diante de uma câmera – conversou descontraidamente com Alexandre na sede do Instituto:
Projeto Nelson Freire
A generosidade de Nelson para com o IPB também refletiu-se na transferência, ainda em vida, de seu acervo pessoal para digitalização. Ele forma a base do colossal Projeto Nelson Freire, ora em andamento, que levará a integral das gravações de seu imenso repertório para a cyberesfera na forma de vídeo-partituras. A vastidão do material já publicado é proporcional à facilidade com que Nelson e sua memória eidética expandiam repertórios. Ainda tenho muita coisa para conhecer, mas poucas descobertas me impressionaram tanto quanto essa gravação do prelúdio Ondine de Debussy, realizada no quarto do garoto de 15 anos durante seus difíceis anos de estudo em Viena sob Bruno Seidlhofer – uma demonstração de sua assombrosa capacidade de leitura à primeira vista, que derrubou o queixo até da Rainha em pessoa, sua alma-gêmea por mais de sessenta anos:
Essa Balada no. 4 de Chopin, gravada ao vivo no Rio de Janeiro por Frank Justo Acker, é a melhor leitura que conheço para essa peça tão visionária quanto difícil de realizar duma maneira convincente:
Nelson dificilmente é lembrado como camerista, fato que gravações como a desse Trio no. 1 de Mendelssohn praticamente nos berram para lamentar:
Esses dois temas recorrentes – o talento de Nelson como camerista e sua generosidade – combinam-se nessa outra gravação rara: um recital com Antonio Meneses, então estudante na Europa, em prol do custeio de seus estudos. Se sua preparação envolveu emergências violoncelísticas, relatadas na descrição do vídeo, a interpretação desse duo em nada as deixou transparecer:
Martha Argerich – Gravações inéditas: em casa em Buenos Aires (1955) – Peças brasileiras com Nelson Freire – Concerto em São Paulo (1979)
Algumas vezes a enxurrada de descobertas do IPB transborda para pianistas de outros países. Da Rainha Martha, orgulhosamente argentina e ligada ao Brasil por muitos amigos (sobretudo por Nelson, seu alter-ego ao piano, como ela conta aqui), surgiu essa gravação doméstica entremeada por conversas com seu pai, Juan Manuel, e seu irmão de mesmo nome, apelidado Cacique (e, sim, é um descalabro o que ela já tocava aos 14 anos):
Apesar da forte ligação com brasileiros, Martha tocou muito poucas obras de nossos compositores. O IPB publicou duas peças de Francisco Mignone em duo com Nelson Freire – a segunda, até então, inédita:
O nocaute do ano, óbvio, também veio de Martha: o combo Prokofiev 3/Chopin 1 sob a regência da fera Eleazar de Carvalho, que não deixou a Rainha, aparentemente alada e em chamas naquele dia, escapar da orquestra nos dois vertiginosos finales. É ouvir para crer:
Eleazar de Carvalho – Villa-Lobos: Choros no. 10 (1976)
Além das eventuais surpresas estrangeiras, o IPB volta e meia rasga corações com publicações sem a participação do piano. Essa dilacerante gravação ao vivo do Choros no. 10 de Villa-Lobos sob Eleazar de Carvalho no Rio de Janeiro entrou para minha Antologia de Coisas Impressionantes que Todos Deveríamos Ouvir. Escutem e tentem manter-se num só pedaço (porque eu nunca consegui):
Sonia Rubinsky – Villa-Lobos: Suíte para piano e orquestra – primeira gravação mundial
Como pôde uma obra do naipe dessa Suíte para piano e orquestra de Villa-Lobos, estreada há mais de cem anos, não ter sido gravada até o ano passado? Quem sabe um pouco do modus vivendi de Heitor e da consideração que seu país costuma ter para com a preservação do seu patrimônio cultural provavelmente já sabe a resposta. Graças ao IPB, que articulou para que uma extensa lista de autorizações fosse concedida, ela foi tirada do limbo:
Acervo de Jacques Klein (1930-1982)
Um dos mais importantes acervos doados ao IPB foi o do filho mais brilhante de Aracati, cujo punhado de gravações comerciais não dá ideia com a vastidão de seu repertório. Os registros publicados pelo Instituto permitem, com toda tranquilidade, colocar Jacques entre os maiores pianistas de seu tempo no mundo todo. Escutem esse monstro a tocar Beethoven – e com especial carinho o finale da Appassionata – e tentem não concordar comigo:
Acervo de Antonio Guedes Barbosa (1943-1993)
Levei anos para concluir a integral da discografia do gênio paraibano por aqui, e levaria outros tantos para comentar suas gravações que o IPB ajudou a trazer à tona. Pouparei os leitores-ouvintes de tanta delonga, limitando-me a compartilhar duas delas que provam que, quando tudo dava certo, Antonio nada devia a qualquer lenda do piano, viva ou morta. No Concerto de Chopin, o primeiro ré bemol da entrada do solista já anuncia a grandeza que vem a seguir; para a Totentanz, a única descrição possível é (as maiúsculas e o negrito se justificam) ÉPICA:
Recital de José Vieira Brandão (1952)
A posteridade registrou a importante trajetória de Brandão como compositor e regente, enquanto sua grandeza como pianista, que eu desconhecia completamente, viveu somente na memória de algumas testemunhas, até seu filho doar seu acervo para o IPB e este recital vir à tona. Meu já enorme sombrero de ignorante cresceu inda mais com a descoberta de que houve no Brasil um pianista desses e que dele eu nunca tinha ouvido falar. Atenção especial às peças de Chopin, com leituras especialmente inventivas e marcantes, entre as melhores que escutei na vida:
Fritz Jank – Brahms: Concerto no. 2 (1962)
Nossa já muito longa lista se encerra com um talento alemão adotado pelo piano brasileiro: Fritz Jank, que se notabilizou por gravar a primeira integral brasileira das sonatas de Beethoven, era ainda maior ao vivo, como atesta este registro absolutamente destemido do Concerto no. 2 de Brahms, sob a batuta de outra lenda cujo acervo foi digitalizado pelo IPB, o pianista, compositor, maestro e pedagogo João de Souza Lima:
Além da cornucópia de tesouros como os que mostramos acima, Alexandre, o Imparável, trouxe para a realidade outro antigo projeto: o lançamento do Selo IPB, que estreou em maio passado com o primeiro dos doze álbuns que dedicará ao Calendário do Som composto pelo Bruxo, Demiurgo, Mestre dos Magos, [insira aqui sua alcunha hiperbólica favorita e provavelmente insuficiente] pelo Campeão Hermeto Pascoal, hoje com mais aniversários na conta do que há teclas no piano, seu velho amigo, que trata como ninguém mais sabe tratar no Universo conhecido.
Hermeto, a Joia d’Olho d’Água Grande, compôs o Calendário entre os junhos de 1996 e 1997, como uma “homenagem a todos os aniversariantes do mundo, indistintamente”, escrevendo uma peça para cada dia do calendário, sem esquecer de quem nasceu em 29 de fevereiro de anos bissextos. Cada partitura de Hermeto, com sua caligrafia característica e ocupação da pauta tão livre quanto é o gênio do Campeão, é uma obra de arte à parte. A responsabilidade de transpor esses 366 jorros de desenfreada criatividade para o teclado coube a alguém à altura dela: o brilhante pianista paraibano Uaná Barreto, que os arranjará e gravará especialmente para o Selo IPB. Nas palavras do comunicado de imprensa divulgado quando do lançamento do primeiro álbum, Janeiro, “com liberdade criativa plena, Uaná soube valorizar cada detalhe presente nas partituras, transformando-as em interpretações vivas e singulares, em sintonia com o espírito inventivo da obra. Cada música traz um pouco da alma brasileira, mas sempre falando para o universo – é o termo que Hermeto cunhou: ‘Música Universal Brasileira’. A direção artística do projeto é de Alexandre Dias, diretor do Instituto Piano Brasileiro. Esse álbum traz muitas camadas de significado:
– é uma homenagem a Hermeto Pascoal, uma glória indescritível para a música brasileira;
– nós procuramos destacar o lado pianístico do Hermeto, reforçando-o como uma de nossas grandes referências no universo do piano;
– o Calendário do Som representa uma diversidade imensa de ritmos, estilos e referências, trazendo esse verdadeiro caleidoscópio que é a música brasileira.”
A vida é como o som que nunca para, nem aqui e nem lá. Viva ela sempre!” Hermeto Pascoal, 11 de janeiro.
Que viva ela sempre, Hermeto. Viva a Música, viva o Som! E que viva você, Campeão! Que vivam Alexandre Dias e o IPB, e que esses sejam apenas o primeiros dez entre muitos anos de belezas com que nos presentearão, e que todos leitores-ouvintes que se embriaguem com a grande música d’O Bruxo realizada por Uaná se tornem assinantes do IPB e o ajudem a polinizar a riqueza do piano brasileiro por esse mundo tão carente de beleza.
HERMETO PASCOAL (1936-∞)
1 – 1° de janeiro
2 – 2 de janeiro
3 – 3 de janeiro
4 – 4 de janeiro
5 – 5 de janeiro
6 – 6 de janeiro
7 – 7 de janeiro
8 – 8 de janeiro
9 – 9 de janeiro
10 – 10 de janeiro
11 – 11 de janeiro
12 – 12 de janeiro
13 – 13 de janeiro
14 – 14 de janeiro
15 – 15 de janeiro
16 – 16 de janeiro
17 – 17 de janeiro
18 – 18 de janeiro
19 – 19 de janeiro
20 – 20 de janeiro
21 – 21 de janeiro
22 – 22 de janeiro
23 – 23 de janeiro
24 – 24 de janeiro
25 – 25 de janeiro
26 – 26 de janeiro
27 – 27 de janeiro
28 – 28 de janeiro
29 – 29 de janeiro
30 – 30 de janeiro
31 – 31 de janeiro
Uaná Barreto, arranjos e piano
Direção artística: Alexandre Dias.
Gravação, mixagem e masterização: Estúdio Carranca, Recife
Arte da capa: Pedro Francisco
Diagramação: Max Lima
Selo Instituto Piano Brasileiro
BAIXE AQUI AS 366 PARTITURAS DO CALENDÁRIO DO SOM, EM MANUSCRITOS DO COMPOSITOR (PDF)
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O penúltimo cd da Integral da Obra de Câmera de Brahms, vol. 10, traz os dois últimos quartetos de cordas, o segundo do op. 51, e o de op. 67. A respeito dos quartetos de corda, vou citar abaixo um trecho extraído da biografia de Brahms escrita por Malcolm McDonald:
Embora Gergiev tenha vasta experiência teatral e esteja regendo uma orquestra de ópera e balé, este é definitivamente um Concerto de O Quebra-Nozes. Os andamentos são rápidos, as texturas, fluidas, e os bailarinos podem ter bastante dificuldade em acompanhar a música. Para nós, ouvintes amadores, porém, esta é uma maneira soberba de ouvir a partitura completa de Tchaikovsky e nos lembrar de quanta boa música não está incluída na suíte familiar. Gergiev justifica sua reputação como intérprete e maestro, obtendo uma execução incrivelmente precisa do conjunto. O melhor de tudo é que a Philips conseguiu, de alguma forma, reunir mais de 81 minutos de som soberbo neste disco, tornando-o uma pechincha notável. Altamente recomendado!



IM-PER-DÍ-VEL !!!

Isto é a música perfeita para morrer antes de ouvir. Depois de A Bela Adormecida, nada melhor do que Cisnes nadando por duas horas e meia. Ouvi e detestei, mas trata-se de um registro raro, pois é completo e sabe-se que poucos maestros suportam. De bom mesmo, só a faixa 10 do Ato 3. A gente lembra de Renata Vasconcellos quando ela aparecia de manhã… Era a música do resumo das notícias da semana. Que linda mulher! Mas falemos de cisnes, por favor.

Os Concertos para Flauta de Vivaldi formam um corpus indefinido. É difícil ter uma ideia precisa do número dos Concertos para Flauta escritos pelo Padre Vermelho. Seis deles, entretanto, foram publicados. Esta é uma versão absolutamente magnífica e um must-have para todos os amantes Vivaldi, bem como para todos os que apreciam as boas performances em instrumentos originais. O francês Alexis Kossenko dá um banho neste excelente CD da Alpha. Sim, coisa finíssima.

Dois CDs estupendamente bem produzidos com obras do grande Morricone. Mas os dois não podem ser mais diferentes. O primeiro vem dos filmes: com grande orquestra, solistas, órgão, tudo de bom e perfeito, é claro. O segundo é interpretado por um trio de jazz que também é genial. Sim, a dupla de CDs é um samba do afrodescendente desprovido de pensamento lógico, só que é bom de ouvir. Nossa memória afetiva é facilmente levada a passear por filmes extraordinários. Só a lembrança dos filmes de Sergio Leone já vale ouvir o CD com atenção.

IM-PER-DÍ-VEL !!! 



É um bom disco raro de um repertório raríssimo. A gravadora deste CD é realmente obscura, mas os intérpretes são animados e de excelente nível. Vivaldi é às vezes é espetacular, mas nunca é ruim. Este fica bem acima da média e dificilmente alguma discoteca terá este CD. Os destaques são o concerto RV 335 e a surpreendente sonoridade do RV 779. Ambos me fizeram parar de trabalhar para dar-lhes atenção. Chutando um pouquinho, aposto que muitos destes concertos para órgão foram originalmente concebidos para outros instrumentos (como o violino ou o oboé) e depois adaptados ou transcritos para órgão. Isso eu acho, sei lá.



O maestro Josef Krips gostava de fish and chips, mas só lhe davam crips. Chips são batatas fritas, um lanche clássico. É provavelmente o termo que você mais viu ou ouviu em filmes ou programas de TV. Contrariamente a Krips, eu sou das poucas pessoas do mundo que não acha batatas fritas uma iguaria de revirar os olhos. Como, é óbvio, mas jamais peço em bares e restaurantes. Já os crips… Crips é aquele biscoito crocante com manteiga, aquela coisa nojenta que nos faz felizes, nos torna gordos e por fim nos mata. Os Crips também são gangues de rua afro-americanas, com origem em Los Angeles. Eles são conhecidos por atividades criminosas como assassinatos, roubos e tráfico de drogas, e por vestirem roupas azuis, como os gremistas. Com toda esta informação, desejo-lhe uma boa audição deste CD gravado no mês passado.

O Trio para Piano Nº 1, Op. 8, é uma das primeiras composições de câmara de Dmitri Shostakovich. Foi tocado privadamente no início de 1924, mas só foi publicado na década de 1980. Vinte anos depois, o compositor escreveu o mais conhecido Trio para Piano nº 2, Op. 67. Originalmente intitulada Poème, o Trio Nº 1 foi composto em 1923, quando o compositor tinha dezesseis anos e estava no Conservatório de Leningrado há três. Quando a partitura estava sendo preparada para publicação, seis décadas depois, os últimos 22 compassos da parte para piano haviam sido perdidos, tendo sido completados pelo aluno de Shostakovich, Boris Tishchenko. Depois vem o Trio nº 2, uma obra bastante sombria. Escrita em 1942, ela reflete tanto os horrores da guerra quanto a morte de alguns amigos próximos. O Trio Guarneri responde com aguda sensibilidade às oscilações de humor da música, às vezes assustadoramente soturna, opressiva e ameaçadora. A execução do finale é profundamente comovente, oscilando entre a paixão feroz e a desolação absoluta. A Sonata para Violoncelo, Op. 40, foi composta em 1934, no período em que Shostakovitch apaixonara-se por uma jovem estudante, o que ocasionou um efêmero divórcio de sua esposa Nina. O compositor dedicou esta sonata ao violoncelista Victor Lubatski e ambos a estrearam em Moscou, no dia 25 de dezembro de 1934. O primeiro movimento (Allegro non troppo) é escrito em forma sonata. O primeiro tema, bastante extenso, é apresentado pelo violoncelo, acompanhado por arpeggios do piano e depois desenvolvido por este até seu clímax; o segundo tema, muito mais delicado, é, contrariamente, apresentado pelo piano e imitado pelo violoncelo. Durante o desenvolvimento o primeiro tema ganha motivos rítmicos, mas logo o afetuoso segundo tema reaparece. Tudo parece em ordem, encaminhando-se para o final do movimento, mas Shostakovitch nos surpreende ao inserir alguns acordes em staccato do piano, acompanhados por notas sustentadas pelo violoncelo, o que faz com que a música torne-se quase estática. É uma estranha preparação para o que se ouvirá no segundo movimento (Allegro) o qual é um scherzo típico de Shostakovitch. Trata-se de um frenético ostinato que é interrompido por um tema apresentado pelo piano que, apesar de mais tranquilo, é também muito pouco contemplativo. O terceiro movimento (Largo) faz-lhe intenso contraste, pois é uma melodia tranquila e vocal, acompanhada pelo piano de forma introspectiva, dissonante e um tanto fúnebre. O Allegro final é um rondó bastante irônico no qual o tema principal é apresentado três vezes, ligados, a cada intervalo, por estranhas e vertiginosas cadenzas.

IM-PER-DÍ-VEL !!!
















![Hiroshima, Ano 80 – A Música dos Hibakusha [Dan – Hayashi – Hosokawa – Kawasaki – Kōjiba – Ōki – Takemitsu – Yamamoto]](https://pqpbach.ars.blog.br/wp-content/uploads/2025/08/Hiroshima_1043-960x681.jpg)











Como meu coração é mesmo grande, nele cabem muitos compositores que adoro com igual paixão. Mahler é um deles e já estava na hora de voltar a ele. FDP Bach já postou anteriormente a integral de suas sinfonias, mas vou refazê-la por um simples motivo: tenho a integral das sinfonias em 320 Kbps e sabemos: Mahler tem de ser ouvido em detalhes, com os pianissimi quase inaudíveis e os fortissimi de fazer as janelas gemerem, senão perde a graça. Mais: seus principais ciclos de canções — including A Canção da Terra — estão nesta coleção de 16 CDs da DG. O regente escolhido é o mesmo que FDP escolheu. Por que mudaria se concordo com ele?


IM-PER-DÍ-VEL !!!