Parabéns, IPB! – Dez Anos do Instituto Piano Brasileiro [Hermeto Pascoal – Calendário do Som: Janeiro – Uaná Barreto]

Polinizar beleza pela cyberesfera é padecer no paraíso, sabemos bem, e manter-se vivo é um fenômeno, sabemos melhor ainda. Por isso, a Irmandade Mundial de Polinizadores Culturais aprecia por demais constatar que, em sua contagem anual das cabeças, e a despeito da crescente cavalaria do Apocalipse, a maior parte delas siga em riste. E eu, humilde chapeiro-sênior neste blogue já penalmente maior, saúdo que há já dez anos esteja entre elas a do inestimável Instituto Piano Brasileiro.

Fundado em 17 de agosto de 2015 pelo incansável, imparável, inesgotável Alexandre Dias, o Instituto Piano Brasileiro, doravante chamado IPB, busca pesquisar o piano brasileiro em suas múltiplas faces e inúmeras camadas, dedicando-se a investigar discografias e repertórios, a recompor trajetórias de pianistas e compositores, a recuperar e digitalizar acervos, e divulgar suas descobertas ao público através das plataformas de polinização da cyberesfera. Mantido desde sua criação tão só por financiamento coletivo de seus assinantes no Brasil e no exterior, o manancial com que o IPB nos provê é tão generoso quanto imenso é o trabalho que dá a seu fundador. Nas palavras do próprio:


Nosso trabalho é calcado na compreensão de que o Brasil possui uma das culturas mais ricas do mundo, e isso se reflete na cultura pianística. Todos os dias aparecem coisas incríveis em nosso trabalho, e confesso que essa sensação de realização anda lado a lado com um certo desespero por ver tantas coisas desaparecendo, como partituras, gravações, e documentos de nossa história pianística. Uma boa parte de nosso trabalho é dar sobrevida para este material, para que ele se multiplique nas mãos de pianistas, professores e pesquisadores interessados.

Entre momentos surreais, como o resgate de um acervo de Guiomar Novaes duma caçamba de lixo, e a glória de ter um recital do titã Nelson Freire generosamente dedicado ao IPB, além do reconhecimento e do abraço de Minha-Nossa-Sua Majestade, a Rainha, o legado construído ao longo desses dez anos é fruto dum trabalho indispensável que devemos não só reconhecer e homenagear, mas também apoiar. Além de sermos, o IPB e o PQP, sócios de carteirinha da Irmandade Polinizadora supracitada, sinto-me muito próximo do Instituto desde sua criação. Alexandre é nosso leitor-ouvinte há muitos anos, e eu mal tinha completado minhas primeiras semanas como chapeiro na PQP Corp. quando ele surgiu nos comentários duma postagem minha, com um IPB de sete dias no colo, oferecendo apoio para nossa empreitada de resgatar do esquecimento o mestre Antonio Guedes Barbosa. Hoje, para nossa felicidade,  o acervo fonográfico de Antonio, doado pela família, está integralmente disponibilizado para a cyberesfera, totalizando horas de gravações inéditas – muitas a mais que sua infelizmente minúscula discografia – a provarem que seu repertório era muito maior e mais complexo do que sabíamos.

Os números do IPB impressionam: em dez anos, foram 7.300 vídeos vídeos postados no canal do YouTube, dos quais cerca de 5.000 vídeos-partituras), com mais de 62 mil inscritos e 14 milhões de visualizações; no Instagram, são 48 mil seguidores e 1628 postagens, e, no Facebook, 38 mil seguidores e milhares de publicações. Sem desejar restringir os caminhos dos leitores-ouvintes na navegação dessa exuberância amazônica, listaremos a seguir alguns pontos especialmente altos do acervo do Instituto para que com eles se deleitem enquanto vocês escolhem seus igarapés:


Arnaldo Estrella – Tchaikovsky: Concerto no. 1 – Bruno Walter/Filarmônica de Nova York (1943)

Entre tantas relíquias, há vários candidatos a Santo Graal – e este é, para mim, o mais forte entre elas: Arnaldo Estrella sob o legendário Bruno Walter a tocar o primeiro movimento do Concerto no. 1 de Tchaikovsky, em pleno Carnegie Hall, com a Filarmônica de Nova York. Difícil algo mais épico.


Guiomar Novaes – Beethoven: Sonata para piano, Op. 111 e Andante Favori – Ao vivo na Sala Cecília Meirelles (1967)

Um dos mais importantes acervos digitalizados pelo IPB é o de Frank Justo Acker. Gaúcho radicado no Rio de Janeiro, Frank capturou ao longo de décadas o som da crème de la crème da Música em palcos cariocas. Suas gravações têm uma calidez e um senso de proximidade do artista que a tornam ímpares entre os registros de sua época. Um exemplo sensacional do talento de Frank é este registro de Guiomar Novaes tocando a derradeira sonata de Beethoven no mesmo ano em que realizou sua única gravação comercial da mesma:

Do mesmo recital, e igualmente preciosa, é a gravação de Frank para a única leitura deixada por Guiomar do Andante favori, WoO 57, de Beethoven – obra que ela nunca gravou comercialmente:


Nelson Freire: entrevistas (2015 e 2019) e recital em prol do Instituto Piano Brasileiro (2019)

Nosso saudoso gigante colaborou intensamente com Alexandre Dias desde antes da fundação do IPB e lhe concedeu duas memoráveis entrevistas. A primeira delas, algumas semanas antes da inauguração do Instituto, foi gravada na casa do Mestre no Rio de Janeiro, e chama a atenção pela extensão, ademais impensável para o mineirinho taciturno, que denota a cumplicidade com o entrevistador e o tamanho de seu amor em comum pelo piano brasileiro. Publicada em texto em 2015, teve seu áudio divulgado pela primeira vez em novembro de 2021, enquanto nós (e o mundo) ainda tentávamos nos recolocar de pé depois daquele dia primeiro tão triste:

A segunda entrevista aconteceu durante a última visita de Nelson a Brasília, especialmente para dar, num imenso gesto de generosidade, um recital em prol do IPB. Produzido por Alexandre Dias e realizado em 17 de janeiro de 2019, o presente de Nelsim ao Instituto foi gravado e – claro – disponibilizado para a cyberesfera. Sempre que tento imaginar o que passou pela mente de Alexandre enquanto um dos maiores pianistas do mundo tocava em prol de seu sonho, eu fracasso clamorosamente -em seu lugar, acho, eu teria virado suco. O que sei lhes dizer é que, sob as mãos de Nelson, a Barcarola de Chopin (a partir de 25:04) acaricia cada fibra do miocárdio, e que há algo entre a preparação para a coda e o acorde final que faz meus olhos suarem sempre:

Logo após o recital, Nelson – feliz como poucas vezes o veríamos diante de uma câmera – conversou descontraidamente com Alexandre na sede do Instituto:


Projeto Nelson Freire

A generosidade de Nelson para com o IPB também refletiu-se na transferência, ainda em vida, de seu acervo pessoal para digitalização. Ele forma a base do colossal Projeto Nelson Freire, ora em andamento, que levará a integral das gravações de seu imenso repertório para a cyberesfera na forma de vídeo-partituras. A vastidão do material já publicado é proporcional à facilidade com que Nelson e sua memória eidética expandiam repertórios. Ainda tenho muita coisa para conhecer, mas poucas descobertas me impressionaram tanto quanto essa gravação do prelúdio Ondine de Debussy, realizada no quarto do garoto de 15 anos durante seus difíceis anos de estudo em Viena sob Bruno Seidlhofer – uma demonstração de sua assombrosa capacidade de leitura à primeira vista, que derrubou o queixo até da Rainha em pessoa, sua alma-gêmea por mais de sessenta anos:

Essa Balada no. 4 de Chopin, gravada ao vivo no Rio de Janeiro por Frank Justo Acker, é a melhor leitura que conheço para essa peça tão visionária quanto difícil de realizar duma maneira convincente:

Nelson dificilmente é lembrado como camerista, fato que gravações como a desse Trio no. 1 de Mendelssohn praticamente nos berram para lamentar:

Esses dois temas recorrentes – o talento de Nelson como camerista e sua generosidade – combinam-se nessa outra gravação rara: um recital com Antonio Meneses, então estudante na Europa, em prol do custeio de seus estudos. Se sua preparação envolveu emergências violoncelísticas, relatadas na descrição do vídeo, a interpretação desse duo em nada as deixou transparecer:


Martha Argerich – Gravações inéditas: em casa em Buenos Aires (1955) – Peças brasileiras com Nelson Freire – Concerto em São Paulo (1979)

Algumas vezes a enxurrada de descobertas do IPB transborda para pianistas de outros países. Da Rainha Martha, orgulhosamente argentina e ligada ao Brasil por muitos amigos (sobretudo por Nelson, seu alter-ego ao piano, como ela conta aqui), surgiu essa gravação doméstica entremeada por conversas com seu pai, Juan Manuel, e seu irmão de mesmo nome, apelidado Cacique (e, sim, é um descalabro o que ela já tocava aos 14 anos):

Apesar da forte ligação com brasileiros, Martha tocou muito poucas obras de nossos compositores. O IPB publicou duas peças de Francisco Mignone em duo com Nelson Freire – a segunda, até então, inédita:


O nocaute do ano, óbvio, também veio de Martha: o combo Prokofiev 3/Chopin 1 sob a regência da fera Eleazar de Carvalho,  que não deixou a Rainha, aparentemente alada e em chamas naquele dia, escapar da orquestra nos dois vertiginosos finales. É ouvir para crer:


Eleazar de Carvalho – Villa-Lobos: Choros no. 10 (1976)

Além das eventuais surpresas estrangeiras, o IPB volta e meia rasga corações com publicações sem a participação do piano. Essa dilacerante gravação ao vivo do Choros no. 10 de Villa-Lobos sob Eleazar de Carvalho no Rio de Janeiro entrou para minha Antologia de Coisas Impressionantes que Todos Deveríamos Ouvir. Escutem e tentem manter-se num só pedaço (porque eu nunca consegui):


Sonia Rubinsky – Villa-Lobos: Suíte para piano e orquestra – primeira gravação mundial

Como pôde uma obra do naipe dessa Suíte para piano e orquestra de Villa-Lobos, estreada há mais de cem anos, não ter sido gravada até o ano passado? Quem sabe um pouco do modus vivendi de Heitor e da consideração que seu país costuma ter para com a preservação do seu patrimônio cultural provavelmente já sabe a resposta. Graças ao IPB, que articulou para que uma extensa lista de autorizações fosse concedida, ela foi tirada do limbo:


Acervo de Jacques Klein (1930-1982)

Um dos mais importantes acervos doados ao IPB foi o do filho mais brilhante de Aracati, cujo punhado de gravações comerciais não dá ideia com a vastidão de seu repertório. Os registros publicados pelo Instituto permitem, com toda tranquilidade, colocar Jacques entre os maiores pianistas de seu tempo no mundo todo. Escutem esse monstro a tocar Beethoven – e com especial carinho o finale da Appassionata –  e tentem não concordar comigo:



Acervo de Antonio Guedes Barbosa (1943-1993)

Levei anos para concluir a integral da discografia do gênio paraibano por aqui, e levaria outros tantos para comentar suas gravações que o IPB ajudou a trazer à tona. Pouparei os leitores-ouvintes de tanta delonga, limitando-me a compartilhar duas delas que provam que, quando tudo dava certo, Antonio nada devia a qualquer lenda do piano, viva ou morta. No Concerto de Chopin, o primeiro ré bemol da entrada do solista já anuncia a grandeza que vem a seguir; para a Totentanz, a única descrição possível é (as maiúsculas e o negrito se justificam) ÉPICA:


Recital de José Vieira Brandão (1952)

A posteridade registrou a importante trajetória de Brandão como compositor e regente, enquanto sua grandeza como pianista, que eu desconhecia completamente, viveu somente na memória de algumas testemunhas, até seu filho doar seu acervo para o IPB e este recital vir à tona. Meu já enorme sombrero de ignorante cresceu inda mais com a descoberta de que houve no Brasil um pianista desses e que dele eu nunca tinha ouvido falar. Atenção especial às peças de Chopin, com leituras especialmente inventivas e marcantes, entre as melhores que escutei na vida:


Fritz Jank – Brahms: Concerto no. 2  (1962)

Nossa já muito longa lista se encerra com um talento alemão adotado pelo piano brasileiro: Fritz Jank, que se notabilizou por gravar a primeira integral brasileira das sonatas de Beethoven, era ainda maior ao vivo, como atesta este registro absolutamente destemido do Concerto no. 2 de Brahms, sob a batuta de outra lenda cujo acervo foi digitalizado pelo IPB, o pianista, compositor, maestro e pedagogo João de Souza Lima:


Além da cornucópia de tesouros como os que mostramos acima, Alexandre, o Imparável, trouxe para a realidade outro antigo projeto: o lançamento do Selo IPB, que estreou em maio passado com o primeiro dos doze álbuns que dedicará ao Calendário do Som composto pelo Bruxo, Demiurgo, Mestre dos Magos, [insira aqui sua alcunha hiperbólica favorita e provavelmente insuficiente] pelo Campeão Hermeto Pascoal, hoje com mais aniversários na conta do que há teclas no piano, seu velho amigo, que trata como ninguém mais sabe tratar no Universo conhecido.

Hermeto, a Joia d’Olho d’Água Grande, compôs o Calendário entre os junhos de 1996 e 1997, como uma “homenagem a todos os aniversariantes do mundo, indistintamente”, escrevendo uma peça para cada dia do calendário, sem esquecer de quem nasceu em 29 de fevereiro de anos bissextos. Cada partitura de Hermeto, com sua caligrafia característica e ocupação da pauta tão livre quanto é o gênio do Campeão, é uma obra de arte à parte. A responsabilidade de transpor esses 366 jorros de desenfreada criatividade para o teclado coube a alguém à altura dela: o brilhante pianista paraibano Uaná Barreto, que os arranjará e gravará especialmente para o Selo IPB. Nas palavras do comunicado de imprensa divulgado quando do lançamento do primeiro álbum, Janeiro, “com liberdade criativa plena, Uaná soube valorizar cada detalhe presente nas partituras, transformando-as em interpretações vivas e singulares, em sintonia com o espírito inventivo da obra. Cada música traz um pouco da alma brasileira, mas sempre falando para o universo – é o termo que Hermeto cunhou: ‘Música Universal Brasileira’. A direção artística do projeto é de Alexandre Dias, diretor do Instituto Piano Brasileiro. Esse álbum traz muitas camadas de significado:

– é uma homenagem a Hermeto Pascoal, uma glória indescritível para a música brasileira;

– ⁠nós procuramos destacar o lado pianístico do Hermeto, reforçando-o como uma de nossas grandes referências no universo do piano;

–  o Calendário do Som representa uma diversidade imensa de ritmos, estilos e referências, trazendo esse verdadeiro caleidoscópio que é a música brasileira.”

A vida é como o som que nunca para, nem aqui e nem lá. Viva ela sempre!” Hermeto Pascoal, 11 de janeiro.


Que viva ela sempre, Hermeto. Viva a Música, viva o Som! E que viva você, Campeão! Que vivam Alexandre Dias e o IPB, e que esses sejam apenas o primeiros dez entre muitos anos de belezas com que nos presentearão, e que todos leitores-ouvintes que se embriaguem com a grande música d’O Bruxo realizada por Uaná se tornem assinantes do IPB e o ajudem a polinizar a riqueza do piano brasileiro por esse mundo tão carente de beleza.

 


HERMETO PASCOAL (1936-∞)

Do Calendário do Som (1997):

1 – 1° de janeiro
2 – 2 de janeiro
3 – 3 de janeiro
4 – 4 de janeiro
5 – 5 de janeiro
6 – 6 de janeiro
7 – 7 de janeiro
8 – 8 de janeiro
9 –  9 de janeiro
10 – 10 de janeiro
11 – 11 de janeiro
12 – 12 de janeiro
13 – 13 de janeiro
14 – 14 de janeiro
15 – 15 de janeiro
16 – 16 de janeiro
17 – 17 de janeiro
18 – 18 de janeiro
19 – 19 de janeiro
20 – 20 de janeiro
21 – 21 de janeiro
22 – 22 de janeiro
23 – 23 de janeiro
24 – 24 de janeiro
25 – 25 de janeiro
26 – 26 de janeiro
27 – 27 de janeiro
28 – 28 de janeiro
29 – 29 de janeiro
30 – 30 de janeiro
31 – 31 de janeiro

Uaná Barreto, arranjos e piano

Direção artística: Alexandre Dias.
Gravação, mixagem e masterização: Estúdio Carranca, Recife
Arte da capa: Pedro Francisco
Diagramação: Max Lima
Selo Instituto Piano Brasileiro

BAIXE AQUI AS 366 PARTITURAS DO CALENDÁRIO DO SOM, EM MANUSCRITOS DO COMPOSITOR (PDF)


OUÇA “JANEIRO”, DO “CALENDÁRIO DO SOM” DE HERMETO PASCOAL NO YOUTUBE:

OUÇA “JANEIRO”, DO “CALENDÁRIO DO SOM” DE HERMETO PASCOAL NO SPOTIFY:

OUÇA “JANEIRO”, DO “CALENDÁRIO DO SOM” DE HERMETO PASCOAL NO TIDAL:


Documento em que Hermeto, de próprio punho, libera suas composições disponíveis em seu site para usufruto da Humanidade e das demais civilizações que, assim desejamos, venham a ter o privilégio de encontrá-las

Vassily é assinante do IPB e veste sua camiseta – e também seu moletom. Além de se tornar um assinante, poderíamos também sugerir uma visita à lojinha do Instituto para apoiar seu trabalho?

A Rainha assina embaixo!

Vassily

Johannes Brahms (1833-1897): Complete Chamber Music (Cd 10 de 11) – String Quartet No.2, op.51 no.2, String Quartet No.3, Op.67 (Quartetto Italiano)

Johannes Brahms (1833-1897): Complete Chamber Music (Cd 10 de 11) – String Quartet No.2, op.51 no.2,  String Quartet No.3, Op.67 (Quartetto Italiano)

O penúltimo cd da Integral da Obra de Câmera de Brahms, vol. 10, traz os dois últimos quartetos de cordas, o segundo do op. 51, e o de op. 67. A respeito dos quartetos de corda, vou citar abaixo um trecho extraído da biografia de Brahms escrita por Malcolm McDonald:

“A impiedosa lógica de sua construção, a extração de tantas coisas de motivos básicos, o esforço para abarcar seu vocabulário harmônico e contrapontístico mais “avançado” e pessoal, admitem poucas concessões à forma escolhida e forçam quase ao limite máximo da resistência. Quanto à forma em si, o desafio de contribuir para um repertório em grande parte criado por Haydn, Mozart, Beethoven e Schubert incitou Brahms a um senso ainda mais agudo de responsabilidade histórica do que de costume. Talvez seja por isso que as obras (sobretudo a nº 1) possam parecer tão invariavelmente sérias e impelidas com dificuldade, tão afligidas pela instabilidade do modo menor. O resultado tem sido muitas vezes severamente criticado como execrável composição de quarteto, e os quartetos de Brahms sem dúvida nunca detiveram a inexpugnável proeminência no repertório de quartetos que as suas sinfonias alcançaram na literatura orquestral. Entretanto, segundo qualqer critério são obras importantes, ´cheias de intensidade apaixonada´e de certa eloquência pressurizada. repletas (praticamente coaguladas) de substância musical e sutileza de composição. Suas formas densamente entrelaçadas, os inúmeros níveis de contraste, o fraseado maleável e fluidez tonal têm exercido seu fascínio sobre várias gerações de analistas musicais. “

Interessante também que estes quartetos foram publicados após o compositor completar 40 anos, mas Brahms já vinha trabalhando neles há muitos anos.

A interpretação continua à cargo do Quartetto Italiano.

Johannes Brahms (1833-1897): Complete Chamber Music (Cd 10 de 11) – String Quartet No.2, op.51 no.2, String Quartet No.3, Op.67 (Quartetto Italiano)

01 String Quartet No.2 in A minor, op.51 no.2 – I. Allegro non troppo
02 II. Andante moderato
03 III. Quasi minuetto, moderato – Allegretto vivace
04 IV. Finale. Allegro con assai – Piu vivace
05 String Quartet No.3 in B flat, op.67 – I. Vivace
06 II. Andante
07 III. Agitato. Allegretto non troppo
08 IV. Poco allegretto con variazioni – Doppio movimento

Quartetto Italiano

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FDP

Piotr Ilich Tchaikovsky (1840-1893): Balé “O Quebra-Nozes” (Completo) (Kirov Orchestra, Gergiev)

Piotr Ilich Tchaikovsky (1840-1893): Balé “O Quebra-Nozes” (Completo) (Kirov Orchestra, Gergiev)

Embora Gergiev tenha vasta experiência teatral e esteja regendo uma orquestra de ópera e balé, este é definitivamente um Concerto de O Quebra-Nozes. Os andamentos são rápidos, as texturas, fluidas, e os bailarinos podem ter bastante dificuldade em acompanhar a música. Para nós, ouvintes amadores, porém, esta é uma maneira soberba de ouvir a partitura completa de Tchaikovsky e nos lembrar de quanta boa música não está incluída na suíte familiar. Gergiev justifica sua reputação como intérprete e maestro, obtendo uma execução incrivelmente precisa do conjunto. O melhor de tudo é que a Philips conseguiu, de alguma forma, reunir mais de 81 minutos de som soberbo neste disco, tornando-o uma pechincha notável. Altamente recomendado!

Esta postagem é em homenagem ao mano PQPBach, que aparentemente está se rendendo à música de Tchaikovsky. Garanto que depois de ouvir este “Nutcracker”, na excelente versão de Gergiev, ele vai se render em definitivo ao russo.

Confesso que até conhecer esta gravação, ainda não tinha ouvido o Balé em sua íntegra, lembro-me de na infância, ou adolescência ter assistido na TV o Barishnikov dançando isso, e fiquei fascinado pela música. Depois disso, tive acesso apenas ás pequenas peças , mas nunca tive uma versão completa da obra.

Valery Gergiev está em seu elemento natural, a música russa, e em outra especialidade, a música de teatro. Gosto muito deste regente, Logo postarei as sinfonias de Prokofiev e os concertos para piano do mesmo Prokofiev com ele, não dá pra não se render à sua energia, e esta Orquestra do Kirov também é de se tirar o chapéu.

Existem diversos momentos que poderia destacar nesta gravação, mas fico com a magnífica “Valsa das Flores”. Pungente, delicada, suave, a imagem que sempre me vem a mente quando a ouço é a do próprio Barishnikov flutuando sobre o tablado do Convent Garden. Minha mãe comentava que parecia que ele desafiava a física, ignorando a lei da gravidade, e simplesmente andando no ar. Que beleza…! É de se ouvir de joelhos, mano PQP.

Piotr Ilich Tchaikovsky (1840-1893): Balé “O Quebra-Nozes” (Completo) (Kirov Orchestra, Gergiev)

1 Ouverture 3:13

Act One

Tableau 1
2 1. The Christmas Tree 3:45
3 2. March 2:14
4 3. Galop And Dance Of The Parents 2:13
5 4. Dance Scene – The Presents Of Drosselmeyer 5:02
6 5. Scene – Grandfather Dance 5:31
7 6. Clara And The Nutcracker 6:23
8 7. The Nutcracker Battles Against The Army Of The Mouse King – He Wins And Is Transformed Into Prince Charming 3:21

Tableau 2
9 8. In The Christmas Tree 3:32
10 9. Scene And Waltz Of The Snowflakes 6:05

Act Two

Tableau 3
11 10. The Magic Castle On The Mountain Of Sweets 3:23
12 11. Clara And Prince Charming 4:52
12. Character Dances (Divertissement):
13 a. Chocolate (Spanish Dance) 1:10
14 b. Coffee (Arabian Dance) 3:11
15 c. Tea (Chinese Dance) 1:07
16 d. Trépak (Russian Dance) 1:01
17 e. Dance Of The Reed Pipes 2:14
18 f. Polichinelle (The Clown) 2:24

19 13. Waltz Of The Flowers 6:24
14. Pas De Deux:
20 a. Intrada 5:01
21 b. Variation I (Tarantella) 0:36
22 c. Variation II (Dance Of The Sugar-Plum Fairy) 2:05
23 d. Coda 1:15

24 15. Closing Waltz – Grand Finale 4:56

Kirov Orchestra
Valery Gergiev

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Vladimir Putin condecora Gergiev como “Herói do Trabalho”

FDP Bach

Johannes Brahms (1833-1897): Complete Chamber Music (CD 8 de 11) Cello Sonata No.1, Op.38, Cello Sonata No.2, Op.99, Clarinet Sonata No.1, Op.120 No.1 (Starker, Sebok, Pieterson, H. Menuhin)

Johannes Brahms (1833-1897): Complete Chamber Music (CD 8 de 11) Cello Sonata No.1, Op.38, Cello Sonata No.2, Op.99, Clarinet Sonata No.1, Op.120 No.1 (Starker, Sebok, Pieterson, H. Menuhin)

Após vários meses, FDP Bach volta à sua proposta de postar a integral da obra de câmara de Johannes Brahms editada pela Philips. Já tivemos grandes momentos com os Trios, nas mãos experientes do Beaux Arts Trio, e agora trago mais três grandes obras do gênio brahmsiano.

As Sonatas para Violoncelo e a Primeira Sonata para Clarinete são obras fundamentais no repertório camerístico, e são inúmeras as gravações existentes no mercado. Das sonatas para violoncelo possuo outras duas gravações, mas preferi dar continuidade à série, e ficar com a dupla Janos Starker e Gyorgy Sebok,  enquanto que a sonata para clarinete está sendo interpretada pela irmã de Yehudi Menuhin, Hephzibah Menuhin ao piano, e o clarinetista George Pieterson.

Johannes Brahms (1833-1897): Complete Chamber Music (CD 8 de 11) Cello Sonata No.1, Op.38, Cello Sonata No.2, Op.99, Clarinet Sonata No.1, Op.120 No.1 (Starker, Sebok, Pieterson, H. Menuhin)

1 Cello Sonata No.1 in E minor, Op.38 – I. Allegro non troppo
2 Cello Sonata No.1 in E minor, Op.38 – II. Allegretto quasi minuetto
3 Cello Sonata No.1 in E minor, Op.38 – III. Allegro – piu presto

4 Cello Sonata No.2 in F major, Op.99 – I. Allegro vivace
5 Cello Sonata No.2 in F major, Op.99 – II. Adagio affettuoso
6 Cello Sonata No.2 in F major, Op.99 – III. Allegro appasionato
7 Cello Sonata No.2 in F major, Op.99 – IV. Allegro molto

Janos Starker – Piano
Gyorgy Sebok – Violoncelo

8 Clarinet Sonata No.1 in F minor, Op.120 No.1 – I. Allegro appassionato
9 Clarinet Sonata No.1 in F minor, Op.120 No.1 – II. Andante un poco adagio
10 Clarinet Sonata No.1 in F minor, Op.120 No.1 – III. Allegretto grazioso
11 Clarinet Sonata No.1 in F minor, Op.120 No.1 – IV. Vivace

George Pieterson – Clarinet
Hephzibah Menuhin – Piano

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Eduard Hanslick incensando Brahms

FDP

Domenico Scarlatti (1685-1757): 18 Sonatas (Maria Tipo, piano)

Domenico Scarlatti (1685-1757): 18 Sonatas (Maria Tipo, piano)

IM-PER-DÍ-VEL !!!

Maria Tipo (1931-2025) foi uma bela napolitana. Domenico Scarlatti foi um dos filhos mais feios da mesma cidade, só que a genética compensou dando-lhe enorme talento. Mas há mais ligações entre ambos. Tipo interpreta fantasticamente bem seu conterrâneo. Não lembro de ter ouvido melhor interpretação destas Sonatas, seja ao cravo, seja ao piano. Este CD é uma joia que merece sua atenção. Ouvi-o inúmeras vezes e ele sempre me encantou. Li agora que esta versão é considerada referência absoluta, mesclando precisão barroca com um toque mediterrâneo único. Tipo era chamada de a Arturo Benedetti Michelangeli feminina” pelo rigor e perfeccionismo. Apenas para efeito de comparação, diria que enquanto Martha Argerich é a tempestade passional, Tipo era a arquiteta do som — controlada, mas com grande fogo interno.

Domenico Scarlatti (1685-1757): 18 Sonatas (Maria Tipo, piano)

1 Sonata In E Major, K. 495
2 Sonata In E Major, K. 381
3 Sonata In E Major, K. 20
4 Sonata In E Minor, K.394
6 Sonata In G Major, K 454
6 Sonata In G Major, K. 425
7 Sonata In D Major, K. 491
8 Sonata In D Minor, K. 32
9 Sonata In A Major, K. 432
10 Sonata In A Minor, K. 109
11 Sonata In A Major, K. 39
12 Sonata In G Major, K. 125
13 Sonata In G Major, K. 470
14 Sonata In E Major, K. 124
15 Sonata In G Major, K. 79
16 Sonata In G Major, K. 547
17 Sonata In B-flat Major, K. 551
18 Sonata In B-flat Major, K. 128

Maria Tipo, piano

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Maria Tipo jovem, a tipo velha vocês pesquisam, tá?

PQP

Piotr Ilich Tchaikovsky (1840-1893): O Lago dos Cisnes, Op. 20 (completo) (Rozhdestvensky)

Piotr Ilich Tchaikovsky (1840-1893): O Lago dos Cisnes, Op. 20 (completo) (Rozhdestvensky)

Isto é a música perfeita para morrer antes de ouvir. Depois de A Bela Adormecida, nada melhor do que Cisnes nadando por duas horas e meia. Ouvi e detestei, mas trata-se de um registro raro, pois é completo e sabe-se que poucos maestros suportam. De bom mesmo, só a faixa 10 do Ato 3. A gente lembra de Renata Vasconcellos quando ela aparecia de manhã… Era a música do resumo das notícias da semana. Que linda mulher! Mas falemos de cisnes, por favor.

A música é pura merda para uma arte anacrônica. É repetitiva e Tchaikovsky sabia disso. O xaroposo tema do cisne (“Leitmotiv de Odette”) é reciclado até a exaustão — aparece em quase todos os atos com poucas variações. O próprio Tchaikovsky reclamou da falta de inspiração em algumas passagens, especialmente nos atos I e III (que compôs por obrigação contratual).

A história original (encomendada pelo Teatro Bolshoi) é confusa e cheia de furos. Por que o mago Rothbart transforma mulheres em cisnes? Ninguém sabe. O final alterna entre tragédia (afogamento tipo enchente no RS) e happy end (o amor vence a maldição), dependendo da montagem. Um horror! O “grande pas de deux” do Cisne Negro, não era para estar lá, ou seja, a famosa cena do Ato III usa música emprestada de outro ballet de Tchaikovsky (sim, de A Bela Adormecida). Ou seja: o remendo de última hora virou a parte mais famosa. Não ouça este CD (duplo!) se você estiver pensando em suicídio. Cuidado, são 148 min! Ainda bem que não temos que VER o balé!

Piotr Ilich Tchaikovsky (1840-1893): O Lago dos Cisnes, Op. 20 (completo) (Rozhdestvensky)
(Melodiya – 1969 / BMG – 1999)(2CD)

01. Introduction(2:48)
02. Act I – No. 1 / Scene. Allegro guisto(2:52)
03. Act I – No. 2 / Valse. Tempo di valse(6:52)
04. Act I – No. 3 / Scene. Allegro moderato(3:41)
05. Act I – No. 4 / Pas de trois – Intrada. Allegro(2:02)
06. Act I – No. 4 / Pas de trois – Andante sostenuto(2:31)
07. Act I – No. 4 / Pas de trois – Allegro semplice – Presto(1:10)
08. Act I – No. 4 / Pas de trois – Moderato(1:03)
09. Act I – No. 4 / Pas de trois – Allegro(1:05)
10. Act I – No. 4 / Pas de trois – Coda. Allegro vivace(1:38)
11. Act I – No. 5 / Pas de deux – Tempo di valse ma non troppo vivo, quasi moderato(2:09)
12. Act I – No. 5 / Pas de deux – Andante – Allegro(5:02)
13. Act I – No. 5 / Pas de deux – Tempo di valse(1:32)
14. Act I – No. 5 / Pas de deux – Coda. Allegro molto vivace(1:50)
15. Act I – No. 6 / Pas d’action. Andantino quasi moderato. Allegro(1:43)
16. Act I – No. 7 / Sujet(0:36)
17. Act I – No. 8 / Danses des coupes. Tempo di polacca(5:58)
18. Act I – No. 9 / Finale. Andante(2:46)

19.Act II – No. 10 / Scene. Moderato(2:40)
20. Act II – No. 11 / Scene. Allegro moderato – Allegro vivo, L’istesso tempo(4:46)
21. Act II – No. 12 / Scene. Allegro – Moderato assai, quasi andante(3:25)
22. Act II – No. 13 / Danses des cygnes – Tempo di valse(2:24)
23. Act II – No. 13 / Danses des cygnes – (Solo Odette) Moderato assai – Molto piu mosso(1:31)
24. Act II – No. 13 / Danses des cygnes – Danses des cygnes. Tempo di valse(1:46)
25. Act II – No. 13 / Danses des cygnes – Allegro moderato(1:18)
26. Act II – No. 13 / Danses des cygnes – Pas d’action (Odette et le prince). Andante-Andante non troppo-Allegro(6:35)
27. Act II – No. 13 / Danses des cygnes – Tout le monde danse. Tempo di valse(1:28)
28. Act II – No. 13 / Danses des cygnes – Coda. Allegro vivo(1:37)
29. Act II – No. 14 / Scene. Moderato(2:32)

1.Act III – No.15: Allegro giusto(2:24)
02. Act III – No.16 Danses du corps de ballet et des nains: Moderato assai – Allegro vivo(2:30)
03. Act III – No.17 Scene (La sortie des invites et la valse): Allegro – Tempo di valse(7:29)
04. Act III – No.18 Scene: Allegro – Allegro giusto(1:34)
05. Act III – No.19 Pas de six: Intrada. Moderato assai(2:24)
06. Act III – No.19 Pas de six: Var.1. Allegro(1:35)
07. Act III – No.19 Pas de six: Var.2. Andante con moto(3:14)
08. Act III – No.19 Pas de six: Var.3. Moderato(1:02)
09. Act III – No.19 Pas de six: Var.4. Allegro(0:53)
10. Act III – No.19 Pas de six: Var.5. Moderato – Allegro semplice – Allegro molto(1:20)
11. Act III – No.19 Pas de six: Coda. Allegro molto(1:41)
12. Act III – Appendice 1 – Pas de deux: Introduction. Moderato – Andante(4:14)
13. Act III – Appendice 1 – Pas de deux: Var.1. Allegro moderato(0:43)
14. Act III – Appendice 1 – Pas de deux: Var.2. Allegro(0:49)
15. Act III – Appendice 1 – Pas de deux: Coda. Allegro molto vivace(2:29)
16. Act III – No.20 Danses hongroise. Czardas: Moderato assai – Allegro moderato – Vivace(2:24)
17. Act III – Appendice 2 – Danse russe: Moderato – Andante semplice – Allegro vivo – Presto(4:40)
18. Act III – No.21 Danse espagnole: Allegro non troppo (Tempo di bolero)(2:25)
19. Act III – No.22 Danse napolitaine: Allegro moderato – Andantino quasi moderato – Presto(1:54)
20. Act III – No.23 Mazurka: Tempo di mazurka(3:44)
21. Act III – No.24 Scene: Allegro – Valse Allegro vivo(3:26)

22. Act IV – No.25 Entr’acte: Moderato(1:55)
23. Act IV – No.26 Scene: Allegro non troppo(2:16)
24. Act IV – No.27 Danses de petits cygnes: Moderato(4:21)
25. Act IV – No.28 Scene: Allegro agitato – Allegro vivace(2:58)
26. Act IV – No.29 Scene finale: Andante – Allegro agitato – Alla breve – Moderato e maestoso – Moderato(6:05)

Gravado em Moscou, 1969
Tempo Total: 148min19

Soloists:
Mikhail Chernyakhovsky – violin
Victor Simon – cello
Olga Erdeli – harp
Suren Gevorkian – trumpet

USSR RTV Large Symphony Orchestra
Gennady Rozhdestvensky

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Parabéns por ter chegado ao final, Rozh!

PQP

.: interlúdio :. Open Sesame – Freedie Hubbard

Como pode um jovem de 22 anos, já em seu álbum de estréia, gravar um dos melhores discos de Jazz da história? Gênio, predestinado, sei lá? Não sei, nem interessa saber, só sei que o cara reuniu aqui um timaço de músicos, nos estúdios de outro gênio, Rudy Van Gelder, e em apenas um dia gravou essa obra prima (segundo o site Discogs este disco foi gravado em 19 de Junho de 1960).

Freedie Hubbard sempre foi um de meus músicos de jazz favoritos. Talvez um dos trompetistas mais enérgicos que já ouvi, o cara tinha pulmões de ferro para conseguir tirar aqueles solos de seu instrumento. E neste seu disco de estréia ele também já demonstra uma tremenda maturidade e sensibilidades musicais, como em faixas como na balada “But Beautiful”. Claro que não podemos esquecer dos músicos que o acompanham, destacando o sax Tenor Tina Brooks e o futuro pianista de John Coltrane, McCoy Tyner.  Claro que por trás de tudo estava o incrível produtor Rudy Van Gelder, que está por trás dos melhores discos de Jazz gravados na década de 60. Seu estúdio em New Jersey era frequentado pelos melhores músicos da época.

Mas o que torna esse álbum tão especial, além do fato de ser um álbum de estréia, o que já é um feito notável? O que sempre me impressionou e cativou em Freedie Hubbard foram, claro, sua técnica e virtuosismo, além de uma energia contagiante. E a já citada maturidade musical de um jovem de meros 22 anos de idade. Isso é incrível … a impressão que sempre tive foi de que a energia que ele transmitia em seus solos contagiavam todos os músicos envolvidos. E Van Gelder, que de bobo não tinha nada, neste disco apresentou ao mundo um dos maiores trompetistas que já respiraram na face da Terra, isso numa época em que a concorrência era pesada, uma época de ouro, Miles Davis, Dizzie Gilespie e Donald Byrd são apenas alguns que citaria agora, músicos que por sinal também frequentavam o mesmo estúdio.

Enfim, espero que apreciem. Os que não conhecem, conheçam. Coloquem o fone de ouvido para ouvir as nuances dos improvisos, o barulho dos pratos da bateria. Tremendamente bem gravado em estéreo, e já remasterizado umas duas ou três vezes. Estou trazendo para os senhores a remasterização da Mosaic, que também as ‘alternate takes’, as gravações que foram deixadas de lado por algum motivo.

1. Open Sesame
2. But Beautiful
3. Gypsy Blue
4. All Or Nothing At All
5. One Mint Julep
6. Hub’s Nub
7. Open Sesame (Alt Tk)
8. Gypsy Blue (Alt Tk)
9. Asiatic Raes
10. The Changing Scene
11. Karioka

Freedie Hubbard – Trompete
Clifford Jarvis – Bateria
McCoy Tyner – Piano
Sam Jones – Baixo
Tina Brooks – Sax Tenor

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Antonio Vivaldi (1678-1741): Concertos para Flauta Transversa (Kossenko, Arte Dei Suonatori)

Antonio Vivaldi (1678-1741): Concertos para Flauta Transversa (Kossenko, Arte Dei Suonatori)

Os Concertos para Flauta de Vivaldi formam um corpus indefinido. É difícil ter uma ideia precisa do número dos Concertos para Flauta escritos pelo Padre Vermelho. Seis deles, entretanto, foram publicados. Esta é uma versão absolutamente magnífica e um must-have para todos os amantes Vivaldi, bem como para todos os que apreciam as boas performances em instrumentos originais. O francês Alexis Kossenko dá um banho neste excelente CD da Alpha. Sim, coisa finíssima.

Importante: apesar de sacerdote, Vivaldi teve vários casos amorosos, um dos quais com uma de suas alunas, a cantora Anna Giraud. Tal como muitos outros compositores da época, terminou sua vida na pobreza. As suas composições já não suscitavam a alta estima que tiveram em Veneza na juventude do padreco. E vamo que vamo.

Antonio Vivaldi (1678-1741): Concertos para Flauta Transversa (Kossenko, Arte Dei Suonatori)

1. Concerto en Sol Majeur, RV 435: I. Allegro 2:18
2. Concerto en Sol Majeur, RV 435: II. Largo 2:46
3. Concerto en Sol Majeur, RV 435: III. Allegro 2:07

4. Concerto en La Mineur, RV 440: I. Allegro non molto 3:45
5. Concerto en La Mineur, RV 440: II. Larghetto 2:55
6. Concerto en La Mineur, RV 440: III. Allegro 2:54

7. Concerto en Sol Majeur, RV 436: I. Allegro 2:51
8. Concerto en Sol Majeur, RV 436: II. Largo 3:30
9. Concerto en Sol Majeur, RV 436: III. Allegro 2:30

10. Concerto en Mi Mineur, RV 430: I. Allegro 2:47
11. Concerto en Mi Mineur, RV 430: II. Largo 1:48
12. Concerto en Mi Mineur, RV 430: III. Poco Allegro 2:56

13. Concerto en Mi Mineur, RV 432: I. Allegro 3:27

14. Concerto en Sol Majeur, RV 438: I. Allegro 2:52
15. Concerto en Sol Majeur, RV 438: II. Andante 3:26
16. Concerto en Sol Majeur, RV 438: III. Allegro 3:20

17. Concerto « Il Cardellino » en Ré Majeur, RV 428 (extrait): Andante 3:11

18. Concerto en Ré Majeur, RV 429: I. Allegro 2:47
19. Concerto en Ré Majeur, RV 429: II. Andante 2:50
20. Concerto en Ré Majeur, RV 429: III. Allegro 3:30

21. Concerto en Fa Majeur, RV 434: I. Allegro ma non tanto 3:33
22. Concerto en Fa Majeur, RV 434: II. Largo cantabilte 4:06
23. Concerto en Fa Majeur, RV 434: III. Allegro 1:42

24. Concerto en Ré Majeur, RV 427: I. Allegro 2:55
25. Concerto en Ré Majeur, RV 427: II. Largo 3:47
26. Concerto en Ré Majeur, RV 427: III. Allegro 2:14

Alexis Kossenko flute & direction
Arte Dei Suonatori

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Antonio Vivaldi era assim

PQP

.: interlúdio :. Ennio Morricone: The Oscar Winner

.: interlúdio :. Ennio Morricone: The Oscar Winner

Dois CDs estupendamente bem produzidos com obras do grande Morricone. Mas os dois não podem ser mais diferentes. O primeiro vem dos filmes: com grande orquestra, solistas, órgão, tudo de bom e perfeito, é claro. O segundo é interpretado por um trio de jazz que também é genial. Sim, a dupla de CDs é um samba do afrodescendente desprovido de pensamento lógico, só que é bom de ouvir. Nossa memória afetiva é facilmente levada a passear por filmes extraordinários. Só a lembrança dos filmes de Sergio Leone já vale ouvir o CD com atenção.

Porém, se você veio de Marte e está lendo isso, conto-lhe que Ennio Morricone (Roma, 1928 – Roma, 2020) foi um compositor, arranjador e maestro italiano que escreveu músicas de diversos estilos, mas especializou-se em belas melodias e arranjos para o cinema. Morricone compôs mais de 400 partituras para filmes de cinema e televisão, além de mais de 100 obras, digamos, de música erudita. Sua trilha sonora para Três Homens em Conflito (The Good, the Bad and the Ugly, 1966) é considerada uma das trilhas sonoras mais influentes da história e foi introduzida no Grammy Hall of Fame. Sua filmografia inclui mais de 70 filmes premiados, dentre eles todos os filmes de Sergio Leone desde Por um punhado de dólares, todos os filmes de Giuseppe Tornatore desde Cinema Paradiso, mais A Batalha de Argel, Animal Trilogy de Dario Argento, 1900, de Bernardo Bertolucci, Exorcist II, Dias no Paraíso, vários filmes importantes no cinema francês, em particular Le Professionnel, bem como A coisa, A Missão, Os Intocáveis e muitos outros que você viu, se realmente não é um  marciano.

.: interlúdio :. Ennio Morricone: The Oscar Winner

1.1 Gabriel’s Oboe
1.2 The Good, The Bad And The Ugly
1.3 Mission
1.4 For A Fistful Of Dollars
1.5 Duck, You Sucker
1.6 Once Upon A Time in the West
1.7 Once Upon A Time in America
1.8 To the Ancient Stairs
1.9 Cinema Paradiso
1.10 Moses
1.11 A Trumpet
1.12 Brothers
1.13 Ave Maria Guarani
1.14 Once Upon A Time in the West
1.15 The Legend of the Pianist on the Ocean
1.16 Wild Bunch
1.17 For a fistful of Dollars
1.18 Playing Love
1.19 For a fistful of Dollars
1.20 The Return of Ringo
1.21 Cinema Paradiso
1.22 Gabriel’s Oboe
1.23 The Legend of the Pianist on the Ocean

2.1 For a few Dollars More
2.2 My name is Nobody
2.3 Sacco and Vanzetti
2.4 Metello
2.5 Once Upon A Time in America, Deborah Theme
2.6 The Mission Suite
2.7 The Legend of the Pianist on the Ocean
2.8 Per Amore
2.9 The Secret of the Sahara
2.10 Tie me up! Tie me down!
2.11 Here’s to you
2.12 To the Ancient Stairs
2.13 For a fistful of Dollars
2.14 Once Upon A Time in the West – Duck, You Sucker
2.15 The Godfather Part II
2.16 Once Upon A Time in America
2.17 The Legend of the Pianist on the Ocean
2.18 Lemon Scent
2.19 Your Love
2.20 Cinema Paradiso
2.21 Gabriel’s Oboe

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Ennio Morricone (1928-2020)

PQP

Rimsky-Korsakov (1844-1908): Sherazade e A Grande Páscoa Russa (NYP, Temirkanov)

Rimsky-Korsakov (1844-1908): Sherazade e A Grande Páscoa Russa (NYP, Temirkanov)

IM-PER-DÍ-VEL !!! 

Mussorgsky foi militar, Korsakov também. Os milicos do PQP Bach são melhores que os milicos dos outros, claro. Viram o nível de nossos milicos golpistas? Meu deus, o que é aquilo? Só prendendo mesmo. Eu gosto de Sherazade, gosto mais ainda de A Grande Páscoa Russa e a gravação de Temirkanov é uma joia indiscutível. Complicado arranjar um registro mais perfeito e compreensivo destas obras que não podem faltar em nenhuma discoteca básica. Excelente performance e alta temperatura emocional. Temo que seja uma das melhores gravações que já ouvi deste repertório. A única vez que chorei em um concerto, o regente era Temirkanov, a pianista era Martha Argerich, e eles interpretavam o Concerto Nº 3 para piano e orquestra de Prokofiev.

Rimsky-Korsakov (1844-1908): Sherazade e A Grande Páscoa Russa (NYP, Temirkanov)

1. Scheherazade, Op. 35: The Sea and Sinbad’s Ship 11:06
2. Scheherazade, Op. 35: The Story of the Kalender Prince 13:10
3. Scheherazade, Op. 35: The Young Prince and the Young Princess 11:10
4. Scheherazade, Op. 35: Festival in Bagdad 12:26
Glenn Dicterow, violin

5. Russian Easter Overture, Op. 36 16:06

New York Philharmonic
Yuri Temirkanov, conductor

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Não se fazem mais milicos como antigamente.
Não se fazem mais milicos como antigamente.

PQP

.: interlúdio :. Buena Vista Social Club: At Carnegie Hall (1998)

Buena Vista Social Club at Carnegie Hall

Quem era vivo na década de 1990 vai se lembrar desse grupo de músicos cubanos, muitos deles com mais de 70 ou mesmo 80 anos de idade, que de repente ficaram famosos a partir de um documentário. Fizeram um belíssimo disco de estúdio, ganharam Grammy, mas o disco que apresento aqui é o segundo, gravado ao vivo em Nova York quando estavam na crista da onda.

É um caso raro de músicos que fizeram carreiras mais ou menos discretas por décadas, tocando em cassinos, casas noturnas e coisas do tipo, alguns deles desde antes da Revolução Cubana de 1959… e de repente alcançaram um estrelato mundial, coisa que naqueles tempos pré-Youtube e pré-redes-sociais ainda passava necessariamente pelo controle de gravadoras e outras empresas com poder de distribuição internacional. Os músicos se conheciam há anos, mas não formavam exatamente uma banda, de modo que temos um tipo de jazz caribenho em que os arranjos são bastante fluidos, às vezes o trompete tem destaque, às vezes o piano (Rubén González, 1919-2003), às vezes a voz masculina e às vezes a voz feminina (Omara Portuondo, nasc. 1930 e ainda não se aposentou!). Eu insisto em chamar esse tipo de música de jazz, o que é uma certa alfinetada na concepção segundo a qual esse estilo estaria restrito às fronteiras de um certo país anglófono. É bastante curioso que antes de 1959 as músicas de Cuba e dos EUA eram bem entrelaçadas e logo depois os laços se cortaram por motivos políticos, com esses músicos – muitos deles já falecidos em 2025 – representando uma memória viva de fluxos culturais típicos de tempos idos.

Buena Vista Social Club At Carnegie Hall:
Chan Chan 4:46
De Camino A la Vereda 4:59
El Cuarto de Tula 8:01
La Engañadora 2:44
Buena Vista Social Club 5:59
Dos Gardenias 4:24
Quizás, Quizás 3:48
Veinte Años 4:07
Orgullecida 3:23
¿Y Tú Qúe Has Hecho? 3:33
Siboney 2:33
Mandinga 5:30
Almendra 5:49
El Carretero 5:39
Candela 7:00
Silencio 5:25

Rubén González – Piano

Hugo Garzón – Vocals
Ibrahim Ferrer – Vocals
Manuel ‘Puntillita’ Licea – Vocals
Omara Portuondo – Vocals
Pío Leyva – Vocals

Barbarito Torres – Laúd
Benito Suárez Magana – Guitar
Compay Segundo – Guitar, Vocals
Ry Cooder – Guitar, Producer
Eliades Ochoa – Guitar, Vocals

Jesús ‘Agauje’ Ramos – Trombone
Manuel ‘Guajiro’ Mirabal – Trumpet
Octavio Calderón – Trumpet

Orlando ‘Cachaíto’ López – Double Bass
Salvador Repilado – Double Bass

Alberto ‘Virgilio’ Valdés – Maracas, Backing Vocals
Amadito Valdés – Timbales
Angel ‘Terry’ Domech – Congas
Joachim Cooder – Drums, Percussion
Roberto García – Bongos, Cowbell, Guiro
Juan De Marcos González – Leader, Backing Vocals, Guiro

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Compay Segundo (1907-2003), autor da famosíssima canção que abre o álbum

Pleyel

 

Antonio Vivaldi (1678-1741): Concertos para órgão (Bussi, Kraemer, Musica Ad Rhenum, Wentz)

Antonio Vivaldi (1678-1741): Concertos para órgão (Bussi, Kraemer, Musica Ad Rhenum, Wentz)

É um bom disco raro de um repertório raríssimo. A gravadora deste CD é realmente obscura, mas os intérpretes são animados e de excelente nível. Vivaldi é às vezes é espetacular, mas nunca é ruim. Este fica bem acima da média e dificilmente alguma discoteca terá este CD. Os destaques são o concerto RV 335 e a surpreendente sonoridade do RV 779. Ambos me fizeram parar de trabalhar para dar-lhes atenção. Chutando um pouquinho, aposto que muitos destes concertos para órgão foram originalmente concebidos para outros instrumentos (como o violino ou o oboé) e depois adaptados ou transcritos para órgão. Isso eu acho, sei lá.

Antonio Vivaldi (1678-1741): Concertos para órgão (Bussi, Kraemer, Musica Ad Rhenum, Wentz)

01 – Concerto in D minor for violin, organ + strings RV541, 1 Allegro.mp3
02 – Concerto in D minor for violin, organ + strings RV541, 2 Grave.mp3
03 – Concerto in D minor for violin, organ + strings RV541, 3 Allegro.mp3

04 – Concerto in C major for violin, cello, organ + strings RV544a, 1 Allegro.mp3
05 – Concerto in C major for violin, cello, organ + strings RV544a, 2 Andante.mp3
06 – Concerto in C major for violin, cello, organ + strings RV544a, 3 Allegro.mp3

07 – Concerto in A major, Il Rossignuolo, for violin, organ + strings RV335, 1 Allegro.mp3
08 – Concerto in A major, Il Rossignuolo, for violin, organ + strings RV335, 2 Largo.mp3
09 – Concerto in A major, Il Rossignuolo, for violin, organ + strings RV335, 3 Allegro.mp3

10 – Concerto in F major for traverso, organ + strings RV767, 1 Alla breve.mp3
11 – Concerto in F major for traverso, organ + strings RV767, 2 Larghetto.mp3
12 – Concerto in F major for traverso, organ + strings RV767, 3 Allegro.mp3

13 – Concerto in C minor for violin, organ + strings RV766, 1 Allegro.mp3
14 – Concerto in C minor for violin, organ + strings RV766, 2 Largo.mp3
15 – Concerto in C minor for violin, organ + strings RV766, 3 Allegro.mp3

16 – Concerto in C major for violin, traverso + organ RV779, 1 Andante.mp3
17 – Concerto in C major for violin, traverso + organ RV779, 2 Allegro.mp3
18 – Concerto in C major for violin, traverso + organ RV779, 3 Largo e cantabile.mp3
19 – Concerto in C major for violin, traverso + organ RV779, 4 Allegro.mp3

20 – Concerto in F major for violin, organ + strings RV542, 1 Allegro.mp3
21 – Concerto in F major for violin, organ + strings RV542, 2 Alla franchese.mp3
22 – Concerto in F major for violin, organ + strings RV542, 3 Allegro.mp3

Marcelo Bussi, órgão
Manfred Kraemer, violino
Balázs Máté, violoncelo
Jed Wentz, flauta transversa
Musica Ad Rhenum

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Johannes Brahms (1833-1897)

PQP

Piotr Illich Tchaikovsky (1840-1893): Piano Concerto Nº 1, Op. 23 / Serguei Rachmaninov (1873-1943): Concerto para Piano Nº 3, Op. 30 (Argerich, Chailly, Kondrashin)

Piotr Illich Tchaikovsky (1840-1893): Piano Concerto Nº 1, Op. 23 / Serguei Rachmaninov (1873-1943): Concerto para Piano Nº 3, Op. 30 (Argerich, Chailly, Kondrashin)

“So go ahead: live dangerously.”

Martha Argerich está impressionante nesta versão do Concerto nº 3 de Rachmaninov. Sai fogo dos seus dedos, e o piano parece que vai explodir a qualquer momento. Ricardo Chailly sofre para acompanhá-la. Com certeza uma das mais fortes e expressivas interpretações deste concerto, e, sem dúvida, uma das melhores gravações já feitas deste concerto. Como é ao vivo, experimentem ouvir com fone de ouvido, para captar os ruídos externos, tosses, ranger de cadeiras… é uma experiência muito interessante, e que dá um toque de realismo a esta gravação.

Isto é loucura em ação. A Terceira de Rachmaninoff, com Martha Argerich, é a mais rápida e fisicamente emocionante que você já ouviu. Ela foi gravada ao vivo, e os equilíbrios são um pouco estranhos. Também dá para perceber que Riccardo Chailly e sua orquestra estão se esforçando muito para acompanhá-la, enquanto antecipam o que ela fará em seguida — mas e daí? Isto é o mais perto que se pode chegar de uma experiência de combustão espontânea e sobreviver. A de Tchaikovsky é, se possível, ainda mais selvagem, com algumas notas perdidas. Mas com uma artista como Argerich, você simplesmente não pode julgar a execução nota por nota. Então, vá em frente: viva perigosamente. — David Hurwitz

Juntamente com o Rach 3 o cd também traz o belo Concerto nº 1 para Piano de Tchaikovsky, um dos favoritos deste que vos escreve. Já conhecia esta gravação do tempo do vinil, na verdade, ainda tenho esse LP. E sempre tive muito carinho por ele. O grande Kiril Kondrashin, já em seus últimos anos de vida, acompanha toda a impetuosidade de Martha Argerich.

Serguei Rachmaninov (1873-1943) – Piano Concerto nº3, in D Minor, op. 30

1. Piano Concerto No.3 in D minor, Op.30 – 1. Allegro ma non tanto
2. Piano Concerto No.3 in D minor, Op.30 – 2. Intermezzo (Adagio)
3. Piano Concerto No.3 in D minor, Op.30 – 3. Finale (Alla breve)

Martha Argerich – Piano
Riccardo Chailly – Conductor
Berlin Radio Symphony Orchestra

Piotr Illich Tchaikovsky (1840-1893) – Piano Concerto nº1, in B Flat Minor, op. 23

4. Piano Concerto No.1 in B flat minor, Op.23 – 1. Allegro non troppo e molto maestoso – Allegro con spirito
5. Piano Concerto No.1 in B flat minor, Op.23 – 2. Andantino semplice – Prestissimo
6. Piano Concerto No.1 in B flat minor, Op.23 – 3. Allegro con fuoco

Martha Argerich – Piano
Kiril Kondrashin – Conductor
Bavarian Radio Symphony Orchestra

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A Rainha Martha

FDP

Brahms: Concerto para Piano e Orq. No 2 & Mozart: Concerto para Piano e Orq. No 23 (Rubinstein, Krips, Wallenstein)

Brahms: Concerto para Piano e Orq. No 2 & Mozart:  Concerto para Piano e Orq. No 23 (Rubinstein, Krips, Wallenstein)

O maestro Josef Krips gostava de fish and chips, mas só lhe davam crips. Chips são batatas fritas, um lanche clássico. É provavelmente o termo que você mais viu ou ouviu em filmes ou programas de TV. Contrariamente a Krips, eu sou das poucas pessoas do mundo que não acha batatas fritas uma iguaria de revirar os olhos. Como, é óbvio, mas jamais peço em bares e restaurantes. Já os crips… Crips é aquele biscoito crocante com manteiga, aquela coisa nojenta que nos faz felizes, nos torna gordos e por fim nos mata. Os Crips também são gangues de rua afro-americanas, com origem em Los Angeles. Eles são conhecidos por atividades criminosas como assassinatos, roubos e tráfico de drogas, e por vestirem roupas azuis, como os gremistas. Com toda esta informação, desejo-lhe uma boa audição deste CD gravado no mês passado.

Brahms: Concerto para Piano e Orq. No 2 & Mozart: Concerto para Piano e Orq. No 23 (Rubinstein, Krips, Wallenstein)

Concerto No. 2 In B-Flat, Op. 83
Composed By – Johannes Brahms

Conductor – Josef Krips
Piano – Arthur Rubinstein
Orchestra – RCA Symphony Orchestra*
1 Allegro Non Troppo
2 Allegro Appassionato
3 Andante
4 Allegretto Grazioso

Concerto No. 23 In A, K. 488
Composed By – Wolfgang Amadeus Mozart

Conductor – Alfred Wallenstein
Piano – Arthur Rubinstein
Orchestra – RCA Victor Symphony Orchestra
5 1. Allegro
6 2. Adagio
7 3. Allegro assai

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PQP

Dmitri Shostakovich (1906-1975): The Two Piano Trios, Op. 8 & Op. 67 / Cello Sonata Op. 40 (Guarneri Trio Prague)

Dmitri Shostakovich (1906-1975): The Two Piano Trios, Op. 8 & Op. 67 / Cello Sonata Op. 40 (Guarneri Trio Prague)

O Trio para Piano Nº 1, Op. 8, é uma das primeiras composições de câmara de Dmitri Shostakovich. Foi tocado privadamente no início de 1924, mas só foi publicado na década de 1980. Vinte anos depois, o compositor escreveu o mais conhecido Trio para Piano nº 2, Op. 67. Originalmente intitulada Poème, o Trio Nº 1 foi composto em 1923, quando o compositor tinha dezesseis anos e estava no Conservatório de Leningrado há três. Quando a partitura estava sendo preparada para publicação, seis décadas depois, os últimos 22 compassos da parte para piano haviam sido perdidos, tendo sido completados pelo aluno de Shostakovich, Boris Tishchenko. Depois vem o Trio nº 2, uma obra bastante sombria. Escrita em 1942, ela reflete tanto os horrores da guerra quanto a morte de alguns amigos próximos. O Trio Guarneri responde com aguda sensibilidade às oscilações de humor da música, às vezes assustadoramente soturna, opressiva e ameaçadora. A execução do finale é profundamente comovente, oscilando entre a paixão feroz e a desolação absoluta. A Sonata para Violoncelo, Op. 40, foi composta em 1934, no período em que Shostakovitch apaixonara-se por uma jovem estudante, o que ocasionou um efêmero divórcio de sua esposa Nina. O compositor dedicou esta sonata ao violoncelista Victor Lubatski e ambos a estrearam em Moscou, no dia 25 de dezembro de 1934. O primeiro movimento (Allegro non troppo) é escrito em forma sonata. O primeiro tema, bastante extenso, é apresentado pelo violoncelo, acompanhado por arpeggios do piano e depois desenvolvido por este até seu clímax; o segundo tema, muito mais delicado, é, contrariamente, apresentado pelo piano e imitado pelo violoncelo. Durante o desenvolvimento o primeiro tema ganha motivos rítmicos, mas logo o afetuoso segundo tema reaparece. Tudo parece em ordem, encaminhando-se para o final do movimento, mas Shostakovitch nos surpreende ao inserir alguns acordes em staccato do piano, acompanhados por notas sustentadas pelo violoncelo, o que faz com que a música torne-se quase estática. É uma estranha preparação para o que se ouvirá no segundo movimento (Allegro) o qual é um scherzo típico de Shostakovitch. Trata-se de um frenético ostinato que é interrompido por um tema apresentado pelo piano que, apesar de mais tranquilo, é também muito pouco contemplativo. O terceiro movimento (Largo) faz-lhe intenso contraste, pois é uma melodia tranquila e vocal, acompanhada pelo piano de forma introspectiva, dissonante e um tanto fúnebre. O Allegro final é um rondó bastante irônico no qual o tema principal é apresentado três vezes, ligados, a cada intervalo, por estranhas e vertiginosas cadenzas.

Dmitri Shostakovich (1906-1975): The Two Piano Trios, Op. 8 & Op. 67 / Cello Sonata Op. 40 (Guarneri Trio Prague)

1 Piano Trio No. 1, In C Minor, Op. 8 12:21

Piano Trio No. 2, In E Minor, Op. 67 (25:18)
2 I. Andante – Moderato – Più Mosso 6:53
3 II. Allegro Con Brio 3:06
4 III. Largo 5:20
5 IV. Allegretto – Pesante – Adagio 9:51

Sonata In D Minor, Op. 40, For Violoncello And Piano (26:15)
6 I. Allegro Non Troppo – Largo – Poco Con Moto 11:36
7 II. Allegro 3:04
8 III. Largo 7:06
9 IV Allegro – Risoluto 4:16

Cello – Marek Jerie
Ensemble – Guarneri Trio Prague
Piano – Ivan Klánský
Violin – Čeněk Pavlík

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Trio Guarneri de Praga finalizando uma obra e aguardando seu aplauso. Sim, falei contigo mesmo, meu!

PQP

György Ligeti (1923-2006): Clear or Cloudy (CDs 3 e 4, de 4) — 28/05/2023 — 100 anos de Ligeti!

György Ligeti (1923-2006): Clear or Cloudy (CDs 3 e 4, de 4)  — 28/05/2023 — 100 anos de Ligeti!

IM-PER-DÍ-VEL !!!

Mais Ligeti aqui.

Intrigante, surpreendente, engraçada, Ligeti é a música do final do século XX e além. Os trabalhos incluem peças para instrumentos solo (órgão, piano), para conjuntos de câmara desde quartetos até orquestras de câmara, mais obras para coral, concertos instrumentais e para grande orquestra. Os vários conjuntos — Ensemble Intercontemporain, Orquestra de Câmara da Europa, London Sinfonietta, Orquestra Filarmônica de Viena, Coro da Rádio Alemã de Hamburgo, Quarteto Hagen, Vienna Brass Soloists, irmãos Kontarsky, Quarteto LaSalle e vários outros solistas excepcionais — , estão sob a direção de luminares como Claudio Abbado, David Atherton, e Pierre Boulez. E quem não rir com as Aventures é mulher do padre ou come uma freira feia sob pagamento (módico, com dinheiro dos crentes). Destaques também para os ESPLÊNDIDOS Concertos para Piano e para Violino.

György Ligeti (1923-2006): Clear or Cloudy (CDs 3 e 4, de 4)

CD 3:

1. Aventures for 3 singers and 7 instrumentalists (1962) [12:01]
Nouvelles Aventures for 3 singers and 7 instrumentalists
2. 1. Sostenuto [6:17]
3. 2. Agitato molto [5:12]

Cello Concerto (1966)
4. 1. Quarter = 40: Attacca [6:55]
5. 2. (Lo stesso tempo) [8:14]
Jean-Guihen Queyras
Ensemble Intercontemporain, Pierre Boulez

Chamber Concerto for 13 instrumentalists
6. 1. Corrente (Fliessend) [5:03]
7. 2. Calmo, sostenuto [5:48]
8. 3. Movimento preciso e meccanico [3:51]
9. 4. Presto [3:32]
Ensemble Intercontemporain, Pierre Boulez

Mysteries of the Macabre for Trumpet and Piano
10. Arr. Elgar Howarth [6:52]
arr. Elgar Howarth
Håkan Hardenberger, Roland Pöntinen

Double Concerto for flute, oboe & orchestra
11. 1. Calmo, con tenerezza [8:08]
12. 2. Allegro corrente [7:51]
Jacques Zoon & Douglas Boyd
Chamber Orchestra of Europe, Claudio Abbado

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CD 4:
1. Die große Schildkröten-Fanfare vom Südchinesischen Meer [0:37]
Håkan Hardenberger

Three Pieces for two Pianos
2. 1. Monument [4:15]
3. 2. Selbstportrait [7:08]
4. 3. Bewegung [4:56]
Aloys Kontarsky, Alfons Kontarsky

Études pour piano (1985)
Premier livre
5. Étude 2: Cordes à vide [3:36]
6. Étude4: Fanfares [3:24]
Gianluca Cascioli

Piano Concerto (1985-88)
7. 1. Vivace molto ritmico e preciso – attacca subito: [3:54]
8. 2. Lento e deserto [7:01]
9. 3. Vivace cantabile [4:24]
10. 4. Allegro risoluto, molto ritmico – attacca subito: [4:48]
11. 5. Presto luminoso: fluido, costante, sempre molto ritmico [3:17]
Pierre-Laurent Aimard
Ensemble Intercontemporain, Pierre Boulez

Violin Concerto (1992)
12. 1. Praeludium: Vivacissimo luminoso – attacca: [4:23]
13. 2. Aria, Hoquetus, Choral: Andante con moto – attacca: [8:11]
14. 3. Intermezzo: Presto fluido [2:44]
15. 4. Passacaglia: Lento intenso [5:55]
16. 5. Appassionato: Agitato molto [7:12]
Saschko Gawriloff
Ensemble Intercontemporain, Pierre Boulez

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Ma che...
Ma che…

PQP

Nagasaki, Ano 80 – A Música dos Gaikokujin [Schnittke – Schafer – Haitzeg – Offermans – Schubert]

9.8.1945 11:02 [Foto do autor]

Abençoada por um clima ameno e uma localização privilegiada, a linda Nagasaki já tinha para contar uma longa história de interação com forasteiros antes de, há exatos oitenta anos, receber de seus céus a mais hedionda das surpresas.

Os primeiros a chegar foram os portugueses, a quem chamaram nanbanjin (“bárbaros do sul”). Depois, os ingleses e neerlandeses foram algo melhor recebidos, decididamente não por sua aparência (que os levou a serem denominados kōmōjin,“gente ruiva”), e sim porque em sua pauta costumava estar só o comércio, e não o proselitismo católico que acompanhava os lusos, reprimido ao longo de vários xogunatos com uma violência que transformou o Japão numa usina de mártires. A reabertura dos portos japoneses, já no século XIX, trouxe ao maravilhoso porto natural de Nagasaki uma variada fauna estrangeira que aquela nação, provavelmente a de maior homogeneidade étnica de todos os tempos, perplexamente denominou ijin (“pessoas diferentes”). Com o tempo, consolidou-se o termo gaijin (“pessoa de fora”), que, aos poucos, ganhou uma conotação pejorativa que o faz ser preterido em conversas educadas em prol do polido gaikokujin (“pessoa de país estrangeiro”).

 

IX – YAIZU

A primeira bomba atômica foi lançada sobre Hiroshima em 1945, seguida por uma segunda bomba sobre Nagasaki.
Em 1954, uma bomba de hidrogênio explodiu no atol de Bikini. A tripulação do Daigo Fukuryu Maru, um barco de pesca do porto de Yaizu, foi coberta pelas cinzas da morte. Seis meses depois, Kuboyama Aikichi morreu. Os japoneses foram vítimas de armas nucleares três vezes.

[Posfácio, maio de 1983]
Não apenas os japoneses, mas também os micronésios próximos ao atol de Bikini foram atingidos pela precipitação radioativa mortal da bomba de hidrogênio. Toda a ilha foi poluída. Aqueles que fugiram retornaram posteriormente à sua terra natal, Bikini, apenas para desenvolver câncer e leucemia devido à radiação residual. Muitos ainda sofrem.
Yaizu e Bikini — um destino compartilhado.

[1955]

Atacada meros três dias depois de Hiroshima, Nagasaki pareceu sempre tocar segundo violino para sua icônica irmã de desgraça. Hiroshima foi, desde o começo, a primeiríssima da infame lista de alvos escolhidos a dedo pelos perpetradores entre as mui poucas cidades japonesas de algum tamanho que ainda não tinham sido arrasadas por bombardeios incendiários (porque de nada valeria, segundo suas mentes brilhantes, testar o poder de destruição da arma nova onde só houvesse escombros). Já Nagasaki e suas duzentas e cinquenta mil almas não eram sequer o alvo preferencial da alegre trupe do Bockscar naquela quinta-feira de tempo casmurro: a ordem era de atacar a cidade de Kokura (hoje distrito de Kita-Kyushu), mas os céus encobertos fizeram a carga mortífera ser transportada ao alvo alternativo. As nuvens que salvaram Kokura quase repetiram a dose sobre Nagasaki, até que uma infeliz brecha entre elas permitiu o despejo de Fat Man diretamente sobre a Catedral de Urakami, aniquilando imediatamente quarenta mil pessoas e outras tantas nos meses seguintes.

Se Hiroshima, plana como uma panqueca, fora arrasada por completo por um artefato menos poderoso que Fat Man, Nagasaki acabou relativamente poupada pelo relevo montanhoso e pela localização periférica do hipocentro da explosão. Além disso, o ataque, que atingiu em cheio o subúrbio católico de Urakami, fez um número desproporcional de vítimas entre dois grupos tradicionalmente segregados: os supracitados cristãos, e os burakumin, casta associada a profissões consideradas impuras, em especial aquelas ligadas à morte, como coveiros, açougueiros e trabalhadores de curtumes. Assim, com o fardo mais letal caindo sobre lombos já marginalizados, Nagasaki nunca considerou o ataque, ao contrário de Hiroshima, como parte central de sua identidade. “A bomba caiu em Urakami, não em Nagasaki”, dizia-se na época, enquanto os jornais mostravam a catedral destruída, na tentativa de associar a desgraça às suas vítimas cristãs, e alguns praticantes do xintoísmo, então religião oficial do Império, insinuavam que a destruição vinha como castigo pela aceitação da religião agourenta trazida do estrangeiro.


X – PETIÇÃO
Parem a bomba atômica! Parem a bomba de hidrogênio! Parem a guerra!
O apelo das mães do bairro de Suginami, em Tóquio, espalhou-se por todo o Japão. Crianças, mães, pais, idosos e trabalhadores de todos os tipos assinaram a petição.
Pela primeira vez, o clamor abafado do povo foi ouvido, e milhões assinaram a petição pela paz.

[1955]


Takashi Nagai (1908-1951)

Os cristãos de Nagasaki, uma vez mais acuados, não demorariam a encontrar seu ícone em meio às ruínas: Takashi Nagai, um médico que sobreviveu a explosão e, a despeito de seus graves ferimentos, dedicou-se de maneira abnegada a cuidar dos feridos. Ao retornar à sua casa, dias depois do ataque, encontrou, de sua esposa, apenas alguns ossos e o rosário derretido. Católico devoto, tido como santo pelos correligionários, Nagai foi uma figura controversa por afirmar que a destruição da comunidade cristã fora um sacrifício divinamente inspirado que, aceito por Deus, teria posto um fim à guerra – o que, para seus muitos críticos, privava as vítimas do ataque, dentre outros, do direito à ira, à revolta e à busca de reparação. Antes de morrer de leucemia aos quarenta e três anos, certamente em consequência da radiação, publicou suas memórias, intituladas “Os Sinos de Nagasaki”, que foram levadas às telas do cinema num longa-metragem homônimo de grande sucesso. Sua canção-título, Nagasaki no Kane, composta pelo veterano Yuji Koseki em 1949, viria a ser a primeira obra musical a citar o ataque, ainda que de maneira muito tangencial: à sombra da ferrenha censura das forças ocupantes, a canção, discorre sobre os sentimentos de Nagai, enlutado e mortalmente doente, a alentar-se de esperança ao ouvir os sinos da catedral reconstruída – sem que haja qualquer menção ao que a destruiu:


Mesmo olhando para o céu mais brilhante,
sinto dolorosamente a tristeza mais profunda.
No mundo humano sempre ondulante,
sou apenas uma flor silvestre passageira:
Tranquilamente, alegremente, em Nagasaki,
Soam os sinos de Nagasaki.

Convocada por Deus, minha esposa
Voltou para o céu, me deixando só neste mundo.
Quando olho para o rosário que deixou de lembrança,
Só encontro os traços das minhas lágrimas:
Tranquilamente, alegremente, em Nagasaki,
Soam os sinos de Nagasaki”

[traduzido livremente pelo autor]


Nagai também publicou vários poemas que foram postos em música. Seu principal parceiro foi o hibakusha Fumio Kino, um músico amador que, como ele, perdera a casa e a família no ataque. Uma das composições da dupla, Ano ko (“Aquela criança”, 1949), homenageia os trezentos alunos da Escola Primária Yamasato incinerados pela explosão, ao contemplar os vestígios deixados por um deles:


Os rabiscos permanecem na parede,
O nome daquela criança,
rabiscado em letras infantis.

Grito em voz baixa e
me esforço para ouvir:

Ah, se aquela criança ainda estivesse viva…

[traduzido livremente pelo autor]


A escola foi reconstruída, e Ano Ko é anualmente cantada por seus alunos nas cerimônias de 9 de agosto em Nagasaki, assim como outra composição de Kino, Kora no mitama yo (“As Almas das Crianças”), homenagem à Escola Primária Shiroyama e suas quatrocentas vítimas, também honradas em coro por seus colegas de hoje em dia.


XI – MÃE E UMA CRIANÇA

Pais foram forçados a abandonar filhos presos sob casas destruídas, filhos abandonaram pais, maridos abandonaram esposas e esposas abandonaram maridos, todos em fuga frenética do incêndio. Essa era a realidade na época da bomba atômica.
Ainda assim, em meio a tudo isso, muitos testemunharam a visão milagrosa de crianças que sobreviveram, seguras firmemente nos braços de suas mães mortas.

[1959]


Afora esses tributos pequenos, ainda que muito célebres, houve poucas outras contribuições de compositores japoneses em honra às vítimas do ataque a Nagasaki. A mais significativa delas viria quase trinta anos depois de Fat Man: em 1974, a cidade encomendou um poema sinfônico com seu nome a Ikuma Dan, que regeu a estreia e, aparentemente, perdeu sua partitura. Nagasaki passou cinquenta anos sem reapresentações até ser reconstruído e novamente executado ano passado, vinte e três anos após a morte do compositor. Outra contribuição, muito singela, é a canção Senbazuru (“Mil Grous”), composta por Michiru Ōshima com letra da hibakusha Kanae Yokoyama. Nascida em Nagasaki, Ōshima estreou-a na cerimônia do quinquagésimo aniversário do ataque à sua cidade, dedicando-a à menina Sadako Sasaki. Exposta à radiação em Hiroshima e desenganada pela leucemia, Sadako acreditava poder salvar-se se completasse mil tsuru (grous, símbolos tradicionais de convalescência e longevidade) em origami, a arte japonesa de dobraduras em papel. Sadako faleceu ao completar 646, e seus colegas providenciaram para seu funeral os tsuru que faltavam. Desde então, centenas de milhares de tsuru são anualmente enviados ao memorial consagrado a Sadako em sua cidade por gente do mundo todo – inclusive este escriba.


Reafirmando o compromisso com a paz,
Nós dobramos grous escarlates.

Almas de coração puro,
Nós dobramos grous brancos.

Em emoções ardentes,
Nós dobramos grous vermelhos.


Como puderam perceber, a indignação e as evocações cataclísmicas tão prevalentes nas composições japonesas inspiradas pelo ataque a Hiroshima estão virtualmente ausentes naquelas alusivas a Nagasaki. “Hiroshima se enfurece, Nagasaki reza”, diz-se no Japão. E parece mesmo que sim: ao reconstruir-se como a cidade aberta ao mundo que sempre almejou ser, Nagasaki tentou dar de ombros para as lembranças dolorosas da guerra. Seus visitantes de hoje em dia, diferentemente de quem vai a Hiroshima, só encontram indícios dos horrores de 9 de agosto de 1945 se os buscarem muito ativamente. Por isso, talvez, a maior parte dos tributos musicais que lhe foram prestados não veio de compositores japoneses, e sim de dedicados gaikokujin.

O primeiro entre eles (e, por muito tempo, também o único) foi o enfant terrible Alfred Schnittke, que apresentou seu oratório Nagasaki (1958) como peça de formatura aos catedráticos de composição do Conservatório de Moscou. Levou tomates, como sempre, e foi acusado de formalismo – o que lhe deve ter inspirado gargalhadas histéricas pelo resto de sua vida, cada vez que imaginava como a sisuda banca examinadora reagiria ao poliestilismo que marcaria seu estilo maduro. Mais ainda: foi obrigado a aguar as tintas sonoras com que descreveu a explosão e suas consequências, o que descaracterizou tanto a obra que o levou a renegá-la e esquecê-la. O oratório só voltaria a ser apresentado na forma original quarenta e oito anos após sua estreia, em sua primeira apresentação pública, na magnífica Cidade do Cabo. Felizmente para nós outros, a sorte resolveu sorrir um pouco para Schnittke depois de sua morte, e hoje há em sua Rússia natal tanto um Instituto Musical como uma orquestra e um coro que levam seu nome, e são eles que lhes trarão Nagasaki na gravação que ofereço, exatamente como seu autor a concebeu.

Hic iacet Alfredus

Ao contrário daquela peça homônima mais célebre (baixe-a aqui), escrita por Penderecki num exercício de abstração e dedicada à vítimas de Hiroshima somente a posteriori,  o canadense R. Murray Schafer (autor do interessantíssimo livretinho A Nova Paisagem Sonora) tinha em mente os gritos, queimaduras e ventos nucleares que assolaram Nagasaki ao compor sua Trenodia (1970). Nas palavras do autor:

Os textos lidos pelos jovens narradores em ‘Trenodia’ são relatos de crianças testemunhando o bombardeio atômico de Nagasaki em 9 de agosto de 1945. A orquestra e os coros ilustram essa cena aterrorizante. Recebi a encomenda de uma peça para a Orquestra Sinfônica Júnior de Vancouver logo após chegar para lecionar na Universidade Simon Fraser.

Eu queria escrever uma peça para aqueles jovens intérpretes que os fizesse refletir sobre questões sociais. A Guerra Fria estava a todo vapor em 1967, e os estoques de armas nucleares estavam crescendo rapidamente. Eu sabia que esses relatos extremamente explícitos de sofrimento e morte afetariam tanto os intérpretes quanto seus pais, forçando-os a considerar seriamente as consequências de uma guerra nuclear. Como havia inúmeras passagens em que os intérpretes eram obrigados a criar sua própria música para acompanhar textos específicos, eles tinham um papel mais sério a desempenhar do que se tivessem simplesmente herdado uma expressão pronta do compositor. Houve lágrimas após a apresentação.

Mas também me lembro de um homem que se aproximou de mim, desafiador, e disse: ‘Vamos lançar de novo!’. Remoí por meses que uma obra dedicada à causa da paz tenha provocado sentimentos tão raivosos. Mas, graças a Deus, nenhuma bomba atômica foi lançada desde então“.


XII – LANTERNAS FLUTUANTES
Em 6 de agosto, os sete rios de Hiroshima enchem-se de lanternas flutuantes, com os nomes de pais, mães e irmãs gravados.
A maré muda antes que as lanternas cheguem ao mar, e elas são levadas de volta para a cidade pelas ondas. Agora apagadas, a massa de lanternas amassadas flutua nas correntes escuras do rio.
Naquele dia, no passado, esses mesmos rios fluíam densos de cadáveres.

[1968]



Igualmente inventiva é a composição Vozes de Nagasaki, do flautista neerlandês Wil Offermans, que faz parte da Suíte Dejima, criada por Offermans em conjunto com o Templo Kofuku-ji em Nagasaki para celebrar os 400 anos de relações entre os Países Baixos e o Japão. Inspirada pela longa tradição de interações culturais da cidade, a peça descreve sua beleza e a da natureza circundante. As “vozes aleatórias” humanas previstas na partitura representam vozes do passado e, por isso, são expressões de alegria, de medo, de amor e da existência humana em geral. Para a apresentação, as várias partes de flauta também podem ser duplicadas, com um grupo maior, de preferência o público, assumindo as “vozes aleatórias”. O resultado é encantador.


XIII – MORTE DO PRISIONEIRO DE GUERRA

Cerca de trezentos mil japoneses morreram devido às bombas atômicas que vocês lançaram. Mas suas bombas atômicas também mataram 23 jovens do seu próprio país. Americanos que haviam saltado de paraquedas em ataques aéreos antes do bombardeio de Hiroshima foram mantidos lá como prisioneiros de guerra. Alguns disseram que também havia mulheres prisioneiras de guerra.
Nós nos perguntamos como elas eram quando morreram, que roupas, que sapatos usavam.
Fomos a Hiroshima e ficamos chocados com o que descobrimos. Como os prisioneiros de guerra americanos estavam mantidos em abrigos subterrâneos perto do centro da explosão, eles provavelmente teriam morrido em pouco tempo. Ou, talvez, alguns pudessem ter sobrevivido. Mas, antes que seu destino pudesse ser conhecido, os japoneses os massacraram, soubemos.
Tremíamos enquanto pintávamos a morte dos prisioneiros de guerra americanos.
[1971]


A obra mais significativa em cinco décadas a se inspirar em Nagasaki veio a público ano passado. Encomendada pela Orquestra Sinfônica de Saint Paul, capital do estado norte-americano de Minnesota e cidade-irmã de Nagasaki desde 1955, Green Hope after Black Rain (“Esperança Verde após Chuva Negra”) foi composta por Steve Heitzeg em tributo não só às vítimas dos ataques ao Japão, mas também aos japoneses e seus descendentes que foram confinados em campos de concentração nos Estados Unidos durante a Segunda Guerra. Seu título faz referência às imensas canforeiras do santuário Sannō de Nagasaki, que, arrancadas e calcinadas pela explosão, foram dadas como mortas até que lhe surgissem brotos. Replantadas no seu lugar original, servem desde então de símbolo da reconstrução da cidade e da esperança de seus moradores em que da devastação, por fim, algum dia ressurgiria a vida. Nas palavras de seu compositor:

Compus ‘Esperança Verde Após a Chuva Negra’ (Sinfonia para os Sobreviventes de Manzanar, Hiroshima e Nagasaki) em homenagem aos sobreviventes dos campos de concentração nipo-americanos (o maior dos quais foi Manzanar, no estado da Califórnia] e às pessoas e árvores bombardeadas em Hiroshima e Nagasaki.

A sinfonia é um apelo à paz e um protesto contra a injustiça, a bomba atômica e outras armas de destruição em massa, e a insanidade da guerra.

A partitura inclui vários instrumentos de percussão natural, como galhos, folhas, flores de cerejeira secas e vagens de sementes de ginkgo biloba, eucalipto, cânfora e cerejeiras de Hiroshima e Nagasaki, um tambor taiko, pedras do campo de concentração nipo-americano de Manzanar e de Hiroshima, um sino de templo e guirlandas de tsuru de origami.”

A gravação que compartilho foi feita a partir da transmissão por rádio da estreia mundial da obra, dada pela orquestra de Saint Paul no ano passado. Para minha grata surpresa, quando esta postagem já estava no prelo, soube que a première japonesa aconteceu há algumas semanas, quando as Orquestras de Saint Paul e de Nagasaki tocaram juntas no Japão. Melhor ainda: ela foi gravada em vídeo e está disponível na cyberesfera:

Minha homenagem às vítimas de Nagasaki encerra-se com a mais improvável das contribuições. Afinal, enquanto o garoto Franz Schubert escrevia Heidenröslein em 1815, aos dezoito anos, o Japão vivia o isolamento do período Edo, samurais singravam seu território a serviço de senhores feudais, e tanto aeronaves quanto a fissão nuclear estavam ainda muito distantes dos céus japoneses. Na segunda metade daquele século, a abertura dos portos às nações estrangeiras levaria a organização política e a sociedade do país a rápidas transformações. A música europeia tomou de assalto os salões recém-formados, e a educação musical foi incorporada ao currículo das escolas. A urgência em criar e expandir um repertório para os conjuntos vocais escolares levou não só a arranjos de canções tradicionais, como também a versões japonesas de canções europeias – entre elas, a da pequena rosa baldia imaginada por Goethe, transformada em japonês numa rosa selvagem (Nobara), que se tornou imensamente popular entre as crianças do Japão, muitas das quais sequer imaginam que a música foi composta por um genial gaikokujin.

Os leitores-ouvintes que assistiram a Rapsódia em Agosto (1991), o penúltimo filme do demiurgo Akira Kurosawa, talvez tenham reconhecido nele a melodia da rosa baldia, cantada pelas crianças que visitam a avó hibakusha em Nagasaki e ouvem da anciã suas reminiscências de luto e ressentimento. Talvez também tenham, como eu, achado a primeira hora e tanto do filme algo simplória e esquemática, e assim mordido a isca deixada pelo velho Kurosawa, mestre consumado do movimento e da manipulação, só para serem conduzidos àquela cena final que…

Bem, que nunca mais lhes permitirá escutar Nobara sem que ela lhes rasgue os corações.

XIV – CORVOS

Japoneses e coreanos se parecem. Como distinguir um rosto impiedosamente queimado do outro?
‘Após a bomba, os últimos cadáveres a serem eliminados foram os coreanos. Muitos japoneses sobreviveram à bomba, mas pouquíssimos coreanos. Não havia nada que pudéssemos fazer. Corvos vieram voando, muitos deles. Os corvos vieram e comeram os globos oculares dos cadáveres coreanos. Eles comeram os globos oculares.’ (Dos escritos de Ishimure Michiko.)
Os coreanos foram discriminados até mesmo na morte. Os japoneses discriminaram até mesmo os cadáveres. Ambos foram vítimas asiáticas da bomba.
Lindos chima-jeogori [traje nacional coreano], voem de volta para a Coreia, para o céu sobre a pátria. Humildemente oferecemos esta pintura. Rezamos.
Cerca de cinco mil coreanos morreram em massa em Nagasaki, para onde foram levados como trabalho forçado para os estaleiros da Mitsubishi. Há histórias semelhantes sobre coreanos em Hiroshima.
Somente na Coreia do Sul, quase quinze mil hibakusha vivem hoje sem reconhecimento oficial de seu status como sobreviventes da bomba atômica.
[1972]

 

NAGASAKI, ANO 80

Yūji KOSEKI (1909-1989)
Letra de Hachirō Satō

1 – Nagasaki no Kane (“Os Sinos de Nagasaki”)

Yumi Aikawa, contralto
Meisterbrass Quartett


Fumio KINO (1907-1970)
Poemas de Takashi Nagai (1908-1951)

2 – Ano ko (“Aquela Criança”)
3 – Shirayuri otome (“Virgens como os Lírios Brancos”)

Ensemble Vocal Ephémère

Fumio KINO
Poema de Hachirō Shimauchi

4 – Kora no mitama yo (“As Almas das Crianças”)

Coro dos alunos da Escola Municipal Shiroyama de Nagasaki


Alfred Garrievich SCHNITTKE (1934-1998)

Nagasaki, oratório para coro misto, mezzo-soprano, orquestra sinfônica e órgão, Op. 19

5 – “Nagasaki, cidade da dor” (poema de Anatoly Sofronov )
6 – “A Manhã” (poema de Tōson Shimazaki )
7 – “Naquele dia fatídico” (poema de A. Sofronov)
8 – “Nas Cinzas” (poema de Eisaku Yoneda)
9 – “O Sol da Paz” (poema de Georgy Fere)

Ksenia Vyaznikova, mezzo-soprano
Evgenia Krivitskaya, órgão
Coro e Orquestra Sinfônica do Instituto Estatal de Música “Schnittke” de Moscou
Igor Gromov, regência


Raymond Murray SCHAFER (1933-2021)

10 – Threnody (“Trenodia”), para coro e orquestra de jovens, cinco narradores e música eletrônica (1970)

Carole Hoskins, Elizabeth Luther, Ellen Procunier, Eric Mah e Marg Turl, narradores
Lawrence Park Collegiate Choir
Lawrence Park Collegiate Orchestra
North Toronto Collegiate Orchestra
John P. Barron, regência


Steve HEITZEG (1959)

Green Hope After Black Rain (“Esperança Verde após Chuva Negra), Sinfonia para os sobreviventes de Manzanar, Hiroshima e Nagasaki (2024)

11 – Peregrinação ao Campo de Internação de Manzanar (um conjunto de variações contra a injustiça, dedicado à memória de Sue Kunitomi Embrey): “Remoção Forçada” – “Na Entrada do Campo de Internação de Manzanar” – “Ireito (Torre de Consolação da Alma)” – “No Túmulo do Bebê Toshiro ‘Jerry’ Ogata” – “Relembrando Manzanar (Nidoto Nai Yoni: ‘Que isso não aconteça novamente.’)” – “Os fantasmas de Manzanar”
12 – Vento sem Retorno (para os hibakusha – o povo bombardeado), dedicado a Setsuko Thurlow: “Sombras Nucleares” – “Guirlandas de tsuru de Papel de Origami” – “Rumo a Mil tsuru de Origami”
13 – Sementes da Paz (para as hibakujumoku — as árvores bombardeadas de Hiroshima e Nagasaki), dedicada a Nassrine Azimi e Tomoko Watanabe: “Dança das Sementes” — “Entre Árvores Sagradas” — “Testemunha das Árvores” — “As Cerejeiras de Kayoko” (21 notas para os 21 dias de busca de Tsue Hayashi por sua filha Kayoko) — “A Cura das Folhas”

The Saint Paul Civic Symphony Orchestra
Jeffrey Stirling, regência

Gravação da estreia mundial


Wil OFFERMANS (1959)

14 – Voices of Nagasaki (“Vozes de Nagasaki”) para conjunto de flautas

Conjunto de Flautas de Zagreb


Ikuma DAN (1924-2001)

15 – Nagasaki, Poema Sinfônico para coro misto e orquestra (1974)

Coro da Federação Coral de Nagasaki
Orquestra Sinfônica de Kyushu
Ikuma Dan, regência

Gravação da estreia mundial


Michiru ŌSHIMA (1961)
Letra de Kanae Yokoyama

16 – Senbazuru (“Mil Grous”)

Coro da Federação Coral de Nagasaki
Orquestra Sinfônica de Nagasaki
Masanori Mikawa, regência

17 – Senbazuru

Amane Machida, soprano


Franz Peter SCHUBERT (1797-1828)
Poema de Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832), traduzido por Sakufu Kondo (1880-1915)
Arranjo de Shin’ichirō Ikebe (1943) para a trilha sonora do filme Hachigatsu no Kyōshikyoku (“Rapsódia em Agosto”) de Akira Kurosawa (1991)

18 – Nobara (“Rosa Selvagem”), versão japonesa de Heidenröslein, D. 257

Coro Infantil Hibari (Hibari Jido Gasshodan)

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XV – NAGASAKI
A cidade-alvo de Kokura estava coberta por nuvens espessas, e os dois B-29 voaram para o alvo alternativo, o porto de Nagasaki. A visibilidade também era ruim, então a bomba atômica foi lançada sobre a siderúrgica Mitsubishi, nos arredores da cidade.
A bomba explodiu diretamente acima da catedral católica em Urakami, matando os padres e aqueles que ali se reuniam para o culto. Os mortos foram espalhados em círculos concêntricos infinitos, com a catedral no centro.
A bomba de Nagasaki era feita de plutônio e era mais poderosa que a bomba de Hiroshima. Mais uma bomba atômica. Nagasaki foi devastada. Cento e quarenta mil pessoas morreram.

[1982]

 

As pinturas e legendas que ilustram esta postagem são parte da série de quinze Painéis de Hiroshima, realizada entre 1950 e 1982 pelo casal  Iri e Toshi Maruki, e que se encontra em exibição permanente na Galeria Maruki, em Saitama, Japão (exceto o último painel, intitulado Nagasaki, doado ao Museu da Bomba Atômica daquela cidade). Convido os leitores-ouvintes uma vez mais a me acompanharem numa doação em prol da preservação dessas inestimáveis obras de arte, bem como em outra para apoiar a ICAN (Campanha Internacional para Abolição das Armas Nucleares), recipiente do Prêmio Nobel da Paz de 2017, e ajudar a manter, entre outras iniciativas, seu Memorial às 38 mil crianças mortas nos ataques.


Publicado no 80° aniversário do ataque criminoso a Nagasaki e dedicado à memória de suas dezenas de milhares de vítimas inocentes.

Nunca as esqueceremos.

Vassily

György Ligeti (1923-2006): Clear or Cloudy (CDs 1 e 2, de 4) — 28/05/2023 — 100 anos de Ligeti!

György Ligeti (1923-2006): Clear or Cloudy (CDs 1 e 2, de 4) — 28/05/2023 — 100 anos de Ligeti!

IM-PER-DÍ-VEL !!!

Mais Ligeti aqui.

Devo iniciar declarando meu amor. Pois a verdade, caríssimos pequepianos, é que amo Ligeti. Assim como o imenso Bartók, Ligeti foi um compositor húngaro, um dos mais notáveis do século XX. Este álbum quádruplo da DG é maravilhoso. Vejam só quem toca, não há second choices: só dá Boulez, Abbado, Hagen Quartett, Orquestra Filarmônica de Viena… Neste dois primeiros CDs já estão Lontano, Atmosphères, Luz aeterna, Volumina, o Quarteto Nº 1, a Sonata para Cello Solo, ou seja, muitas obras-primas. Ligeti se tornou conhecido por ter sido fartamente utilizado por um grande fã seu, o cineasta Stanley Kubrick, que usou suas músicas em filmes como 2001: Uma Odisséia no Espaço (2001) e De Olhos Bem Fechados (Eyes Wide Shut). É preciso que se esclareça que Ligeti não compôs tais músicas como trilhas desses filmes, mas elas foram utilizadas por Stanley Kubrick pela extrema adequação entre suas linguagens. Não, não é pouca coisa.

György Ligeti (1923-2006): Clear or Cloudy (CDs 1 e 2, de 4)

CD 1:
György Ligeti (1923 – 2006)
Sonata for Solo Cello
1. 1. Dialogo: Adagio, rubato, cantabile [4:55]
2. 2. Capriccio: Presto con slancio [3:47]
Matt Haimovitz

Six Bagatelles for Wind Quintet (1953)
3. 1. Allegro con spirito [1:14]
4. 2. Rubato. Lamentoso [3:04]
5. 3. Allegro grazioso -attacca subito [2:43]
6. 4. Presto ruvido [0:58]
7. 5. Adagio. Mesto [2:27]
8. 6. Molto vivace. Capriccioso [1:21]
Jacques Zoon, Douglas Boyd, Richard Hosford, James Sommerville, Matthew Wilkie, Claudio Abbado

String Quartet No. 1 (Métamorphoses nocturnes)
9. Allegro grazioso [1:31]
10. Vivace, capriccioso [0:34]
11. A tempo [1:20]
12. Adagio, mesto [2:10]
13. Presto [2:11]
14. […] molto sostenuto – Andante tranquillo [1:34]
15. Più mosso [2:00]
16. Tempo di Valse, moderato, con eleganza, un poco capriccioso [0:55]
17. Subito prestissimo [0:43]
18. Subito: molto sostenuto [0:45]
19. Allegretto, un poco gioviale [0:54]
20. Allarg. Poco più mosso 0:001:03
21. Subito allegro con moto, string. poco a poco sin al prestissimo [0:34]
22. Prestissimo [1:05}
23. Allegro comodo, gioviale [0:13]
24. sostenuto, accelerando [1:46]
25. Lento [0:42]
Hagen Quartett

Ten Pieces for Wind Quintet
26. 1. Molto sostenuto e calmo [2:05]
27. 2. Prestissimo minaccioso e burlesco [0:43]
28. 3. Lento [1:48]
29. 4. Prestissimo leggiero e virtuoso [0:49]
30. 5. Presto staccatissimo e leggiero [0:31]
31. 6. Preso staccatissimo e leggiero [1:12]
32. 7. Vivo, energico [1:08]
33. 8. Allegro con delicatezza [2:32]
34. 9. Sostenuto, stridente [1:03]
35. 10. Presto bizzarro e rubato, so schnell wie möglich [1:01]
Wiener Bläsersolisten

String Quartet no.2 (1967-68)
36. Allegro nervoso [5:13]
37. Sostenuto, molto calmo [4:56]
38. Come un meccanismo di precisione [3:09]
39. Presto furioso, brutale, tumultuoso [2:01]
40. Allegro con delicatezza – stets sehr mild [5:38]
LaSalle Quartet

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CD 2:
1. Atmosphères [9:05]
Vienna Philharmonic Orchestra, Claudio Abbado

2. Volumina [17:28]

3. Lux aeterna (1966) [7:59]
Helmut Franz
Chor des Norddeutschen Rundfunks

4. Organ Study no.1 “Harmonies” [9:04]
Gerd Zacher

5. Lontano (1967) (for large orchestra) [12:44]
Vienna Philharmonic Orchestra, Claudio Abbado

6. Ramifications for string orchestra or 12 solo strings (1968-69) [8:28]
Ensemble Intercontemporain, Pierre Boulez

7. Melodien for Orchestra [13:07]
London Sinfonietta, David Atherton

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Ligeti: sorria, você está sendo fotografado!
Ligeti: sorria, você está sendo fotografado!

PQP

Gustav Mahler (1860-1911): Sinfonia Nº 7 (Neumann, Leipzig)

Este blog tem atualmente seis colaboradores fixos e mais alguns de rara aparição. A palavra é usada aqui no sentido de colaboração mesmo, e não aquele jargão horrível para funcionários, até porque o blog não gera dinheiro. Faço esse preâmbulo para dizer que fui eu, Pleyel, o responsável pela “chuva de Mahler” nas últimas semanas: primeiro completando o ciclo com Svetlanov e sua orquestra russa e depois repostando o jovem Gustavo Dudamel com sua orquestra venezuelana. Dudamel é provavelmente o maestro vivo com mais íntima afinidade com a música de Mahler, ao lado do veterano Tilson Thomas (que fez uma Sétima elogiadíssima por PQP Bach).
Agora voltemos à velha guarda: trago hoje um Mahler com sotaque da Europa Central, com o maestro Václav Neumann (1920-1995), maestro tcheco nascido em Praga que rege aqui a tradicional orquestra do Gewandhaus de Leipzig na então Alemanha Oriental. Foi quando residia em Leipzig, aliás, após um tempo morando em Praga, que Mahler compôs sua primeira sinfonia por volta de 1888: ele era maestro no Neues Stadttheater, a casa de ópera destruída na 2ª Guerra, e tinha o posto de maestro substituto da Gewandhausorchester. Já a sétima sinfonia ele iria compor mais de 15 anos depois, quando residia em Viena, mas sua estreia ocorreu em Praga em 1908.

Depois disso, os tchecos mantiveram uma tradição de interpretação de Mahler mesmo quando suas obras eram menos lembradas lá por 1930, 1940… e Vaclav Neumann fez parte da geração de maestros – junto com Lenny Bernstein, Rafael Kubelík, Bernard Haitink e, um pouco depois, Claudio Abbado e Evgeny Svetlanov – que, pouco após a 2ª Guerra, foram responsáveis por inúmeros sucessos de público e de crítica que colocaram as sinfonias de Mahler definitivamente nos programas orquestras em todo o mundo.

Gustav Mahler (1860-1911): Sinfonia Nº 7
1. 1. Langsam Allegro risoluto, ma non troppo
2. 2. Nachtmusik. Allegro moderato
3. 3. Scherzo. SchattenhafT
4. 4. Nachtmusik. Andante amoroso
5. 5. Rondo-Finale. Allegro ordinario
Vaclav Neumann, Gewandhausorchester Leipzig
Recording: 1968

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Václav Neumann (1920-1995)

Pleyel

Anton Bruckner (1824-1896): Sinfonia Nº 8 (Edição especial em comemoração aos 120 anos da RCO)

Anton Bruckner (1824-1896): Sinfonia Nº 8 (Edição especial em comemoração aos 120 anos da RCO)
Anton Bruckner: o genial e acanhado foi o único compositor presente na grande festa

IM-PER-DÍ-VEL !!!

Este disco, pelo que pude apurar, não teve venda comercial. Foi uma edição especial de 2008, comemorativa aos 120 anos da Orquestra do Concertgebouw de Amsterdam. É uma esplêndida e gravação ao vivo — realizada em 2005 e transmitida pelo rádio (sim há rádios cultas de verdade na Holanda) — com, obviamente, o imortal Bernard Haitink na regência. Ouvi disco agora e, olha, só de pensar já fico arrepiado. É música de gente grande, tocada por uns sujeitos enormes. Haitink gravou a Oitava de Bruckner só várias vezes. Vejamos quantas  foram:

  • Concertgebouw Orchestra (1969) Philips
  • Concertgebouw Orchestra (1970) World Music Express
  • Concertgebouw Orchestra (1979) SunJay Classics
  • Concertgebouw Orchestra (1981) Philips
  • European Youth Orchestra (1989) Digital Co.
  • Bayerische Rundfunk Sinfoniorchester (1993) SunJay Classics
  • Wiener Philharmoniker (1995) Philips
  • Boston Symphony Orchestra (1998) Karna Musik
  • Staatskapelle Dresden (2002) Hänssler
  • Royal Concertgebouw Orchestra (feb. 2005) RCO <—- o CD que ora postamos
  • Royal Concertgebouw Orchestra (may. 2005) Karna Musik

E olha, ele aprendeu DIREITINHO!

Bruckner – Sinfonía Nº 8 – Haitink (RCO 120 años)

1. Symphony No. 8: I. Allegro moderato 16:40
2. Symphony No. 8: II. Scherzo: Allegro moderato 16:11
3. Symphony No. 8 III. Adagio: Feierlich langsam; doch nicht schleppend 28:03
4. Symphony No. 8: Finale : Feierlich, nicht schnell 24:34

Royal Concertgebouw Orchestra
Bernard Haitink

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PQP

Johann Sebastian Bach (1685-1750) – Variações Goldberg – Gustav Leonhardt

Curiosamente, em quase dezoito anos de PQPBach, nunca postamos as Variações Goldberg com o mítico Gustav Leonhardt. O lendário cravista liderou a ofensiva das interpretações historicamente informadas, ao lado de Nikolaus Harnoncourt, ainda lá nos anos 50 e até o final de sua vida foi um dos grandes nomes deste estilo de interpretação. Para os senhores terem uma idéia de quanto Leonhardt era dedicado a esta obra, o primeiro registro que realizou foi em 1953, quando tinha meros 25 anos de idade.

Esta gravação que ora vos trago foi realizada em 1978, e pra muitos críticos é um de seus melhores registros.  Mas alguém pode perguntar: com nomes atuais como Jean Roundeau, Pierre Hantäi (meu favorito), Víkingur Ólafsson e Mahan Esfahani realizando registros brilhantes destas peças tão peculiares, quase míticas, ouvir Leonhardt ainda é necessário? Me utilizo da famosa expressão ‘Sentado no ombro de Gigantes’ para responder a esta pergunta. Os nomes citados acima, além de dezenas de outros intérpretes, com certeza se inspiraram nas ‘escolhas’ que o velho mestre fez e nas descobertas de novas possibilidades que ele explorou em sua longa carreira. Então, para mim, um teimoso melômano que sou, respondo que sim, é necessário. Não sei precisar quantas vezes e versões já ouvi destas peças em meus 60 anos de vida, desde o velho LP de Ralf Kirkpatrick que sempre esteve na pequena coleção de discos que tínhamos em casa, e que ainda possuo, e levarei comigo até o final de meus dias.

Gustav Leonhardt é mais que atual em pleno 2025. Não teve medo de ousar e desafiar os cânones de seu tempo, assim como seu contemporâneo Glenn Gould o fez, lá em 1955. Dois revolucionários, eu diria, cada um defendendo sua bandeira, com brilhantismo.

Mas vamos ao que viemos. Bach com um dos seus principais intérpretes, Gustav Leonhardt, em registro de 1978.

1 Aria
2 Variatio 1, A 1 Clav.
3 Variatio 2, A 1 Clav.
4 Variatio 3, A 1 Clav. Canone All’Unisono
5 Variatio 4, A 1 Clav.
6 Variatio 5, A 1 Ovvero 2 Clav.
7 Variatio 6, A 1 Clav. Canone Alla Seconda
8 Variatio 7, A 1 Ovvero 2 Clav. Al Tempo Di Giga
9 Variatio 8, A 2 Clav.
10 Variatio 9, A 1 Clav. Canone Alla Terza
11 Variatio 10, A 1 Clav. Fughetta
12 Variatio 11, A 2 Clav.
13 Variatio 12, Canone Alla Quarta
14 Variatio 13, A 2 Clav.
15 Variatio 14, A 2 Clav.
16 Variatio 15, A 1 Clav. Canone Alla Quinta, Andante
17 Variatio 16, A 1 Clav. Ouverture
18 Variatio 17, A 2 Clav.
19 Variatio 18, A 1 Clav. Canone Alla Sesta
20 Variatio 19, A 1 Clav.
21 Variatio 20, A 2 Clav.
22 Variatio 21, Canone Alla Settima
23 Variatio 22, A 1 Clav. Alla Breve
24 Variatio 23, A 2 Clav.
25 Variatio 24, A 1 Clav. Canone All’Ottava
26 Variatio 25, A 2 Clav. Adagio
27 Variatio 26, A 2 Clav.
28 Variatio 27, A 2 Clav. Canone Alla Nona
29 Variatio 28, A 2 Clav.
30 Variatio 29, A 1 Ovvero 2 Clav.
31 Variatio 30, A 1 Clav. Quodlibet
32 Aria Da Capo

Gustav Leonhardt – Harpsichord

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Hiroshima, Ano 80 – A Música dos Hibakusha [Dan – Hayashi – Hosokawa – Kawasaki – Kōjiba – Ōki – Takemitsu – Yamamoto]

Hiroshima, Ano 80 – A Música dos Hibakusha [Dan – Hayashi – Hosokawa – Kawasaki – Kōjiba – Ōki – Takemitsu – Yamamoto]
6.8.1945
8:15
[Foto do autor]

No dia em que lembramos os oitenta anos da estreia da mais avassaladora obra-prima da psicopatia humana, não tentarei evocar a hecatombe daquela manhã de verão em Hiroshima. Minha voz jamais voaria tão alto e, ademais, duvido de que haverá um humano sequer, de qualquer ofício, capaz de pintar com total acurácia o variado buffet servido pela Morte em 6 de agosto de 1945. Dito isso, e enquanto me equilibro entre o dever doloroso de recordar a miséria sem precedentes trazida pelo ataque criminoso e o anseio por que ela nunca mais se repita, chamarei a atenção dos leitores-ouvintes para algumas obras dedicadas a seus sobreviventes por compositores japoneses.


I – FANTASMAS
Era uma procissão de fantasmas.
Roupas queimadas num instante. Mãos, rostos e peitos incharam; bolhas roxas logo estouravam e a pele pendia como trapos.
Uma procissão de fantasmas, com as mãos estendidas à frente. Arrastando a pele dilacerada, caíram exaustos, amontoando-se uns sobre os outros, gemendo e morrendo.
No centro da explosão, a temperatura atingiu 6.000 graus. Uma sombra humana foi gravada em degraus de pedra. O corpo daquela pessoa vaporizou? Foi levado pelo vento? Ninguém nos conta como era perto do hipocentro.
Não havia como distinguir um rosto carbonizado e cheio de bolhas do outro. As vozes ficaram ressecadas e roucas. Amigos diziam seus nomes, mas ainda não se reconheciam.
Um bebê solitário dormia inocentemente, com uma pele linda. Talvez tenha sobrevivido, abrigado pelo seio da mãe. Esperamos que pelo menos esta criança desperte para continuar vivendo.
[1950]

Chamadas em japonês de hibakusha, essas centenas de milhares de pessoas carregariam pelo que lhes restou das vidas não só as escaras físicas do calor e da radiação de Little Boy, como também a culpa dos sobreviventes – o remorso de serem as gotas vivas no meio dum mar de mortos – e um sem-fim de estigmas: aos olhos dos preconceituosos, seriam radioativos e malditos, contagiosos e letais. Isso tudo, somado à rigorosa censura imposta pela potência vitoriosa – antes bombardeante, depois ocupante -, manteve por muitos anos sob mordaça a voz dos hibakusha. As primeiras cerimônias em memória às vítimas eram feitas em silêncio quase total, interrompido brevemente por orações apenas balbuciadas. Com o tempo, e enquanto se recriavam as popularíssimas associações corais que tomaram de assalto o Japão a partir da abertura de seus portos na metade do século XIX, esses eventos passaram também a incluir canto, ainda que simbolicamente amordaçado –  como na letra da “Canção da Paz de Hiroshima”, que parece falar de qualquer coisa, menos duma desgraça infligida pelo homem a humanos:


Onde nuvens brancas flutuam –
Até os confins do céu, de leste a oeste
Ecoa no alto o som do Sino da Paz.
Pois agora nos levantamos bravamente
E aqui construímos nosso futuro próspero.
De onde crescem ondas azuis
Até os confins do mar, de sul a norte,
Ecoamos nossas preces por toda parte
Ao som do Sino da Paz.
Pois agora superamos nossas dificuldades
E daqui olhamos para o futuro
Onde os ventos frescos e brilhantes sopram
Até os confins do Japão e para nossos amigos no exterior
Ecoamos nossa vontade fervorosa
Ao som do Sino da Paz
Pois aqui cantamos em harmonia
E agora estendemos nossas mãos”

[traduzido livremente pelo autor]


II – FOGO
“‘Pikah!’ [onomatopeia japonesa para ‘clarão’] Um forte clarão azul-esbranquiçado. A explosão, a pressão, a tempestade de fogo — nunca na Terra ou no Céu a Humanidade havia experimentado tal explosão. Chamas irromperam no instante seguinte e saltaram para o céu. Quebrando o silêncio sobre as ruínas sem limites, o fogo rugiu.
Alguns jaziam inconscientes, presos por vigas caídas. Outros, recuperando os sentidos, tentavam se libertar, apenas para serem envolvidos pelas chamas carmesim.
Cacos de vidro perfuravam barrigas, braços eram torcidos, pernas se dobravam, pessoas caíam e eram queimadas vivas.
Abraçando seu filho, uma mulher lutava para se libertar de debaixo de um poste caído.
‘Depressa! Depressa!’, gritou alguém. ‘É tarde demais.’ ‘Então nos entreguem a criança.’ ‘Não, corra você. Eu vou morrer com minha filha. Ela ficaria vagando só pelas ruas.’
A mulher empurrou as mãos que a ajudavam e foi consumida pelas chamas.”
[1950]

Foi somente com o final da ocupação estrangeira, em 1952, que a mordaça foi afrouxada. As memórias dos hibakusha começaram, por fim, a vir à tona com a dor e a indignação devidas – dentro, por óbvio, das proporções possíveis a uma cultura que promove tanto o estoicismo quando o asco pela derrota. Enquanto as cerimônias em memória às vítimas passavam a lembrar do ataque e seus horrores, alguns hibakusha saíam reticentemente do ostracismo para compartilhar suas experiências com audiências a cada ano maiores, mais jovens e, por isso, mais alijadas de suas memórias do ataque a Hiroshima. Cada vez maiores, também, eram os grupos convidados a cantar nas cerimônias, e esse contexto levou, naturalmente, a que a música coral predominasse entre as primeiras composições dedicadas à memória do 6 de agosto.

A mais célebre entre elas, e merecidamente, é a suíte Genbaku Shokei (“Cenas da Bomba Atômica”), composta pelo toquiota Hikaru Hayashi em três movimentos em 1958 e concluída, com a adição do quarto movimento, apenas em 2001. Pondo em música poemas da coletânea homônima do hibakusha Tamiki Hara (1905-1951), que vagou por dias pela cidade devastada, essas “Cenas” são especialmente tocantes na simplicidade crua de seu primeiro movimento, Mizu o kudasai (“Me dá água”), que evoca as cenas dantescas de moribundos, com a pele esfarrapada, arrastando-se até os sete rios de Hiroshima para tentar saciar sua sede mortal. O texto, escrito em japonês fragmentário e com o silabário katakana, reservado a telegramas e palavras estrangeiras, faz suarem até os mais secos dos olhos:


Me dá água
Ah, me dá água
Me deixa beber
Morrer seria melhor
Morrer seria
Aaah
Ajuda ajuda
Água…
Água
Alguma
Alguém
Oh oh oh oh oh
Oh oh oh oh oh

O céu partiu ao meio
A cidade sumiu
O rio
Está correndo…

[traduzido livremente pelo autor]


III – ÁGUA
“Havia montanhas de cadáveres, com cabeças empilhadas no centro do monte. Estavam empilhados de forma que seus olhos, bocas e narizes pudessem ser vistos o mínimo possível.
Em um monte ainda não cremado, o globo ocular de um homem se movia e observava. Ele ainda estaria vivo? Ou um verme teria mexido em seu olho morto?
Água! Água! Pessoas vagavam por ali, procurando água. Fugindo das chamas, clamando por água para molhar seus lábios moribundos. Uma mãe ferida com seu filho fugiu para a margem do rio. Ela escorregou em águas profundas, se arrastou pelas águas rasas. Correndo enquanto o fogo violento engolfava o rio, parando de vez em quando para molhar o rosto, ela continuou correndo até finalmente chegar a este local. Ela ofereceu um seio ao filho, apenas para descobrir que ele havia dado seu último suspiro.
A imagem do século XX de Nossa Senhora e o Filho: uma mãe ferida embalando seu bebê morto. Não é uma imagem de desespero? Mãe e filho devem ser, devem ser, um símbolo de esperança.”
[1950]

Numa escala muito maior, as composições de Masao Ōki usam vastos recursos corais e orquestrais para responder à inspiração trazida pelos artistas hibakusha. Sua imensa cantata Ningen o kaese (“Devolvam-nos a Humanidade”), em duas partes, faz jus aos indignados versos do poeta Sankichi Tōge (1917-1953), um ativista que nunca mediu palavras para descrever tanto as consequências macabras do ataque quanto seu ódio profundo por seus perpetradores:

Vocês, meninas,
chorando mesmo sem ter de onde virem as lágrimas;
gritando mesmo sem ter lábios para formar palavras;
lutando mesmo sem ter pele nos dedos para agarrar
qualquer coisa dentro de vocês, meninas.
Seus membros se contraem, escorrendo sangue, suor gorduroso e linfa;
seus olhos, fendas inchadas, rebrilham brancos;
apenas os elásticos de suas calcinhas seguram suas barrigas inchadas;
vocês estão completamente além da vergonha,
mesmo com suas vergonhas expostas:
quem poderia imaginar que há pouco tempo todas vocês eram lindas colegiais?
Emergindo das chamas que tremulavam sombriamente na Hiroshima queimada,
não mais vocês mesmas,
vocês correram para fora,
rastejaram uma após a outra,
lutaram para chegar até este descampado,
em agonia deitaram suas cabeças,
carecas, exceto por alguns fios de cabelo, no chão.
Por que vocês devem sofrer assim?
Por que vocês devem sofrer assim?
Por qual motivo?
Por qual motivo?
Vocês, meninas, não sabem o quão desesperadora é a sua condição,
o quanto vocês se transfiguraram em relação ao humano.
Vocês estão simplesmente pensando,
pensando naqueles que até esta manhã
foram seus pais, mães, irmãos, irmãs
(algum deles as reconheceria agora?)
e nas casas em que vocês dormiram, acordaram, comeram
(naquele instante, as flores da cerca viva foram arrancadas;
agora nem mesmo suas cinzas foram encontradas),
pensando, pensando
enquanto estão deitadas ali entre amigas que,
uma após a outra,
param de se mover,
pensando em quando vocês eram, meninas,
seres humanos.

[traduzido livremente pelo autor]


IV – ARCO-ÍRIS
“Um soldado nu estava de pé, apenas com suas botas e espada. Jovens soldados com braços quebrados e pernas esmagadas. Os feridos corriam sem rumo, com a pele esfarrapada coberta por cobertores.
Não havia som algum, apenas um silêncio mortal. Então, um soldado enlouquecido apontou para o céu e gritou repetidamente: ‘Um avião! Um B-29!’. Não havia sombra de avião à vista. Cavalos feridos, cavalos frenéticos, corriam descontroladamente.
Aviadores americanos, que vieram bombardear o Japão, haviam sido capturados e colocados em um quartel em Hiroshima. A bomba atômica matou amigos e inimigos. Dois soldados jaziam encolhidos na estrada perto do domo, com os pulsos ainda algemados.
A fumaça e a poeira sopradas para o alto formaram uma nuvem, e logo grandes gotas de chuva caíram do céu, que antes estava limpo. Um arco-íris arqueava-se sobre este domo enegrecido. O arco-íris de sete cores brilhava intensamente.”
[1951]

Nascido dez anos depois do ataque, Toshio Hosokawa teve educação musical esmerada em seu país e na Alemanha. Quando retornou ao Japão, no trigésimo aniversário do bombardeio, chocou-se com a teimosa, envergonhada relutância de sua família e de seu país em tocarem no assunto. Em resposta a essa opressão do silêncio, produziu dois réquiens para quebrar o silêncio em seu derredor: o Réquiem de Hiroshima (1989-92) e o oratório Koe Nakigoe (“A Voz dos Sem Voz”, 1989-2001), em homenagem aos hibakusha perpetuamente degredados à mordaça em sua cidade natal.


V – MENINOS E MENINAS
“Elas jaziam mortas em montes ao longo da margem do rio, com as cabeças apontando para a água que procuravam. Ao chegarem ao rio, a água permaneceu fora de alcance, abaixo da margem íngreme, e elas morreram sem saciar a sede. Crianças em idade escolar foram mobilizadas para ajudar a construir aceiros. Muitas turmas foram completamente aniquiladas. Duas irmãs seguravam as figuras transformadas uma da outra. Outras meninas morreram sem um único arranhão no corpo. Quando viu esta pintura, um carpinteiro que havia sido exposto à bomba nos disse: ‘Minha filha é a única sobrevivente de sua turma. Mas seus dedos foram torcidos e queimados, seu rosto se fundiu à garganta e ela não consegue andar. Seu corpo não cresceu desde então, quando ela tinha treze anos.’
[1951]

Com a reconstrução de Hiroshima e o restabelecimento de suas casas de concerto e seus conjuntos orquestrais, a música instrumental também passou a prestar tributos aos hibakusha. Masaru Kawasaki tinha 21 anos quando a sorridente tripulação do Enola Gay pulverizou sua cidade. Apesar de estar a menos de dois quilômetros do hipocentro da explosão, ele sobreviveu, com sequelas que trataria até o final da vida. Dedicou-se principalmente ao repertório para banda sinfônica e foi o primeiro compositor hibakusha a ver sua obra popularizada: um triunfo considerável sobre o estigma e o preconceito. Sua série mais conhecida, Inori no kyoku dai (“Música de Oração”), é bastante executada no Japão, e sua primeira peça, “Dirge”, composta em 1975 e estreada no trigésimo aniversário do ataque, tem feito parte de todas as cerimônias de 6 de agosto desde então.


VI – DESERTO ATÔMICO
“Nada para comer, nenhum remédio. Nenhum abrigo contra a chuva. Sem eletricidade, sem jornais, sem rádio, sem médicos. Larvas se reproduziam em cadáveres e feridos, nuvens de moscas zumbiam e enxameavam. O cheiro de cadáveres pairava no vento.
As pessoas não estavam apenas feridas fisicamente, seus espíritos também estavam profundamente feridos.
Uma mulher, sem se importar em cobrir sua pele esfarrapada, procurou seu filho. Ela vagou por dias a fio.
Ainda hoje, ossos humanos são às vezes desenterrados em Hiroshima.”
[1952]

Entre todas as obras que ora lhes apresento, compiladas ao longo de quase três décadas e resgatadas de meios tão diferentes quanto cassetes, rolos, CD-Rs e DVDs, aquelas da hiroshimense Tomiko Kōjiba estão as que mais me agradam. Sua Trilogia de Hiroshima, composta pelo Réquiem de Hiroshima, pela suíte Sete Perfis Intocados (expressão de sua vontade de retratar o caráter dos hibakusha duma maneira que resistisse à erosão do esquecimento) e por O Futuro a 4000 ºC (referência à temperatura sob o hipocentro nos primeiros segundos após a explosão) atestam sua fascinante originalidade, cujos frutos, infelizmente, não nos chegam tão frequentemente aqui nestes rincões tão tristes.


VII – BAMBUZAL
“Muitos se abrigaram em um bambuzal. — Não foi um terremoto, mas o que foi? — Poderia ter sido um conjunto de bombas incendiárias? — Foi uma bomba, não, um raio da morte. — De qualquer forma, houve um clarão — pikah! — e depois um trovão estrondoso — don! — Não. Em Hiroshima, não ouvimos nenhum trovão. Foi tão grande que houve apenas um clarão.
Eles continuaram falando sobre aquele momento. Havia muitos bambuzais nos arredores de Hiroshima, e a bomba atômica queimou o bambu de um lado. Os moradores de rua se abrigaram nos bambuzais. E um por um, deram seu último suspiro.
As pessoas nos chamavam por socorro, mas não tínhamos coragem de ir até elas. Não havia mais espaço para os feridos em nossa casa.
Sob a Ponte Mitaki, havia uma pilha de cadáveres. Uma pessoa agachada ali parecia estar viva, mas não conseguimos determinar sua idade ou sexo. Na manhã de 26 de agosto, a cabeça da pessoa caiu para a frente e ela morreu. A bomba foi lançada em 6 de agosto, então essa pessoa suportou em silêncio por vinte dias. Não havia ninguém para se livrar desses corpos, e eles não foram removidos até que um tufão os arrastou para o mar em setembro.””
[1954]

Muito mais projeção tem a obra de Ikuma Dan, compositor de origem aristocrática, descendente duma longa linhagem de samurais, que viveu uma grande parte de sua vida na China, onde viria a falecer. Dan gravou a integral de suas sinfonias com orquestras europeias, e a sexta delas, intitulada Sinfonia Hiroshima, combina elementos composicionais europeus e japoneses, alguns mesmo em tom de pastiche, e incorpora dois  instrumentos tradicionais – o nōkan e o shinobue, respectivamente um flautim e uma flauta de bambu – a uma grande massa orquestral da qual, sublimemente, emerge também a voz duma soprano.


VIII – RESGATE
“Os incêndios queimavam sem parar.
Pessoas do campo vieram em busca de parentes e os levaram para fora da cidade. Muitos morreram no caminho.
Longas filas se formaram para receber rações. Uma menina morreu perto, ainda segurando sua porção de biscoito.
Cacos de vidro estavam incrustados nos corpos dos pais do marido da nossa irmã. Seus tornozelos incharam tanto quanto suas coxas. Eles haviam se refugiado em nossa casa, e decidimos levá-los para o filho mais velho. Colocamos os dois em uma carroça e a puxamos até Kaita, passando pelo centro da explosão. Uma chuva fina caía.
Depois da bomba, choveu com frequência em Hiroshima. Mesmo sendo agosto, um dia frio se seguiu ao outro.
Alguém nos disse em meio a soluços: ‘Abandonei minha mãe. Gritei: ‘Perdoem-me!” No esforço frenético para escapar, esposas e maridos tiveram que se abandonar, pais tiveram que abandonar seus filhos.
Muitos dias se passaram antes que a ajuda humanitária fosse organizada.”
[1954]

Concluo meu tributo aos hibakusha com outra obra de Masao Ōki: sua Quinta Sinfonia, intitulada Genbaku (“Bomba Atômica”) e conhecida mais simples e amplamente como Hiroshima, foi inspirada nos oito primeiros Painéis de Hiroshima – exatamente as pinturas que ilustram essa publicação. Ōki também foi um prolífico compositor de trilhas sonoras para filmes, atendendo tanto à demanda por romances escapistas quanto a épicos sobre samurais, passando ao largo de temas nucleares. A censura das forças de ocupação e a complicada relação da sociedade japonesa com o legado da guerra explica o pequeno número de produções do país dedicadas aos hibakusha. A mais importante delas, surgida quarenta e cinco anos depois do ataque, foi sem dúvidas Kuroi Ame (“Chuva Negra“, 1989), de Shōhei Imamura (não confundir com a tolice homônima lançada no mesmo ano, estrelada por Michael Douglas), para cuja trilha sonora o mestre Tōru Takemitsu forneceu duas peças baseadas em seu Réquiem para Cordas (1957), e que acabou por lhe inspirar uma peça original, que recebeu o nome do filme e encerra esta nossa homenagem.


HIROSHIMA, ANO 80

Minoru YAMAMOTO (1912-1996)
Poema de Yoshio Shigezono

1 – Canção da Paz de Hiroshima

Coral e Banda Sinfônica da Cidade de Hiroshima


Hikaru HAYASHI (1931-2012)
Poemas de Tamiki Hara (1905-1951)

Cenas da Bomba Atômica
(1958-2001), para coro
2 – Me dá água
3 – Crepúsculo
4 – Noite
5 – Verde perene

Ensemble PVD
Hiroki Fujii, regência


Masao ŌKI (1901-1971)
Poemas de Sankichi Tōge (1917-1953)

“Devolvam-nos a Humanidade”, cantata para solistas, coro e orquestra

6 – Parte I (1961) – Prólogo: “Devolva-nos a nossa humanidade” – Capítulo 1: 6 de agosto; Morte – Capítulo 2: Na estação de curativos – Capítulo 3: Olhos – Capítulo 4: A criança pequena – Capítulo 5: Uma chamada  –  Final: “Devolva-nos a nossa humanidade”

Mieko Takizawa, soprano
Echiko Narita, contralto
Akio Amano, tenor
Koichi Tajima, baixo
Coro da Associação Musical Ro-on de Tokyo
Orquestra Sinfônica de Tóquio
Kikuo Sato, regência

7 – Parte II (1963): “Declaração” – “Lápide” – “Manhã” – “Passos”

Kiyoshi Oda, barítono
Coral Infantil da Associação de Música dos Trabalhadores de Tóquio
Orquestra Sinfônica de Tóquio
Hitoshi Ueda, regência


Toshio HOSOKAWA (1955)

8 – Réquiem de Hiroshima, para vozes, coro infantil e adulto, orquestra e fita pré-gravada (1989)

Ryo Akiyama, Miyuki Katayama e Jon Brokering, vozes
The Tokyo Little Singers
Coros da OMP e da NHK
Orquestra Sinfônica Japonesa
Kazuyoshi Akiyama, regência

De “A Voz dos Sem Voz”, oratório para solistas, coro e orquestra (1989-2000):

9 – Finale: A Voz dos Sinos do Templo

Chor- und Symphonieorchester des Bayerischen Rundfunks
Sylvain Cambreling,
regência


 

Masaru KAWASAKI (1924-2018)

Da série “Música de Oração”:

10 – No. 1, “Dirge“, para banda sinfônica

Orquestra de Sopros de Hiroshima
Yoshihiro Kimura, regência

11 – No. 2, “Elegia”, para banda sinfônica

Orquestra de Sopros Tokyo Kosei
Kazuyoshi Akiyama, regência

12 – No. 3, “Canção de Hiroshima”, para banda sinfônica

Clube de Música Instrumental da Escola  Motomachi de Hiroshima
Akira Doi, regência

13 – No. 4, “Prece”, para viola solo

Margareth Miller, viola

14 – No. 5, “Matinas”, para flauta e piano

Nancy Brown, flauta
Yumiko Womack, piano


Tomiko KŌJIBA (1952)

15 – Réquiem de Hiroshima, para orquestra de cordas (1979)

Orquestra Sinfônica de Hiroshima
Kazuyoshi Akiyama, regência

16 – Sete Perfis Intocados, para piano (2005)

Kōhei Fujimoto, piano

17 – “Futuro a 4000 °C”, para orquestra (2005)

Orquestra Sinfônica de Hiroshima
Kazuyoshi Akiyama, regência


Ikuma DAN (1924-2001)

Sinfonia no. 6, para soprano e orquestra, “Hiroshima” (1985)

18 – Andante ma non troppo. Quasi andante sostenuto
19 – Allegro ritmico
20 – Andante sostenuto e funebre

Anna Pusar, soprano
Michiko Akao, nōkan e shinobue
Wiener Symphoniker
Ikuma Dan, regência


Masao ŌKI

Sinfonia no. 5, “Hiroshima” (1953)

21 – Prelúdio
22 – Fantasmas
23 – Fogo
24 – Água
25 – Arco-íris
26 – Meninos e meninas
27 – Deserto Atômico
28 – Elegia

Nova Orquestra Filarmônica do Japão
Takuo Yuasa,
regência


Tōru TAKEMITSU (1930-1996)

Da Trilha sonora para o filmeChuva Negra“, de Shōhei Imamura (1989):
29 – Morte e Ressurreição
30 – Música Fúnebre

I Fiamminghi
Rudolf Werthen, regência

31 – Chuva Negra, para orquestra de cordas (1989)

Orquestra Metropolitana de Tokyo
Tōru Takemitsu, regência

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE 


As pinturas e legendas que ilustram esta postagem são parte da série de quinze Painéis de Hiroshima, realizada entre 1950 e 1982 pelo casal  Iri e Toshi Maruki, e que se encontra em exibição permanente na Galeria Maruki, em Saitama, Japão. Convido os leitores-ouvintes a me acompanharem numa doação em prol da preservação dessas inestimáveis obras de arte, bem como em outra para apoiar a ICAN (Campanha Internacional para Abolição das Armas Nucleares), recipiente do Prêmio Nobel da Paz de 2017, e ajudar a manter, entre outras iniciativas, seu Memorial às 38 mil crianças mortas nos ataques.


Publicado no 80° aniversário do ataque criminoso a Hiroshima e dedicado à memória de suas dezenas de milhares de vítimas inocentes.

Vassily

 


 

Gustav Mahler (1860-1911): Sinfonia Nº 1 e Canções de um Viandante (CD 1 de 16) (Bernstein)

Gustav Mahler (1860-1911): Sinfonia Nº 1 e Canções de um Viandante (CD 1 de 16) (Bernstein)

Como meu coração é mesmo grande, nele cabem muitos compositores que adoro com igual paixão. Mahler é um deles e já estava na hora de voltar a ele. FDP Bach já postou anteriormente a integral de suas sinfonias, mas vou refazê-la por um simples motivo: tenho a integral das sinfonias em 320 Kbps e sabemos: Mahler tem de ser ouvido em detalhes, com os pianissimi quase inaudíveis e os fortissimi de fazer as janelas gemerem, senão perde a graça. Mais: seus principais ciclos de canções — including A Canção da Terra — estão nesta coleção de 16 CDs da DG. O regente escolhido é o mesmo que FDP escolheu. Por que mudaria se concordo com ele?

A Sinfonia Nº 1 era originalmente um poema sinfônico baseado na péssima novela “Titan”, de Jean Paul. Depois, tornou-se Sinfonia Titan. O primeiro movimento é pura expectativa e energia. Bernstein o trata de modo estranho, cheio de maneirismos pouco comuns em outros regentes. Após este início, a coisa entra nos eixos. E como! O terceiro movimento é curiosamente uma variação em tom menor da canção Frère Jacques e descreve o enterro de um caçador, promovido pelos animais que ele costumava matar. Abaixo, deixo para vocês o texto da Wikipedia a respeito:

Histórico

A estréia da sinfonia ocorreu no dia 20 de Novembro de 1889, em Budapeste, sob a regência do próprio Mahler. Na ocasião, a sinfonia não foi bem recebida pelo público.

A Sinfonia 1 em Ré Maior é escrita para uma orquestra composta pelos seguintes instrumentos: 4 flautas (2 piccolos), 4 oboés (um corne inglês), 4 clarinetes, 3 fagotes (um contrafagote), 7 trompas, 4 trompetes, 3 trombones, 1 tuba, 4 tímpanos, pratos, triângulo, tam-tam, bombo, 1 harpa, 1 quinteto de cordas formado por: violinos, violas, cellos e baixos.

Um caso de amor do compositor durante sua juventude provavelmente serviu de inspiração para a criação da sinfonia. Contudo, ela é mais do que isso conforme explica o próprio Mahler numa carta para Max Marschalk, em 26 de Março de 1896: Gostaria que ficasse enfatizado ser a sinfonia maior do que o caso de amor que se baseia, ou melhor, que a precedeu, no que se refere à vida emocional do criador. O caso real tornou-se razão para a obra, mas não em absoluto, o significado real da mesma. (…) Assim como considero uma vulgaridade inventar música para se ajustar a um programa, também acho estéril dar um program para uma obra completa. O fato de a inspiração ou base de uma composição ser uma experiência de seu autor não altera as coisas.

Originalmente ela foi concebida para ser um grande poema sinfônico.

Mahler escreveu um programa para a sinfonia, após as primeiras apresentações, embora dissesse em várias ocasiões que acreditava que a música deveria falar por si mesma, sem a necessidade do apoio de um texto explicativo.

Características

Como costumava fazer com outras obras suas, Mahler revisou a Sinfonia 1, entre os anos de 1893 e 1896. A mudança mais significativa foi retirada de um movimento andante chamado “Blumine”, sobra de uma música incidental que Mahler tinha escrito para Der Trompeter von Säkkingen (1884). Em 1894, depois de três apresentações, Mahler descartou o movimento e só permaneceram as referências a ele no segundo motivo do finale.

O movimento “Blumine” só foi redescoberto em 1966, por Donald Mitchell. Benjamin Britten conduziu a primeira apresentação da Sinfonia 1 com o movimento “Blumine”, desde que ele tinha sido executado pela última vez por Mahler em Aldeburgh. As maiorias das apresentações modernas da sinfonia não incluem o “Blumine”, ainda que seja possível não raramente se deparar com execuções do movimento em separado. De forma análoga, poucas gravações da sinfonia 1 incluem o movimento.

A obra inclui vários temas de um ciclo de canções composto por Mahler entre 1883 e final de 1884 chamado: Lieder Eines fahrenden Gesellen (Canções de um Viajante). Existem influências também de Das klagend Lied (A Canção da Lamentação), completada por Mahler em 1 de Novembro de 1880 para participar de um concurso de 1881 conhecido como Prêmio Beethoven.

A Sinfonia 1 de Mahler é uma sinfonia primaveril, semelhante em alguns aspectos com a Sinfonia 1 de Robert Schumman. Ela não é contudo uma simples descrição visual da natureza. Ela reflete uma natureza sob os inocentes olhos de uma criança, que ao mesmo tempo toma consciência da fragilidade e da morbidez inerentes à condição humana.

Os movimentos

Na sua forma final a sinfonia, cuja duração aproximada é de 55 minutos, é formada por quatro movimentos distribuídos da seguinte forma:

1. Langsam, schleppend – Devagar, arrastando (~ 16 minutos)
2. Scherzo, Kraeftig bewegt – Poderosamente agitado (~ 8 minutos)
3. Feierlich und gemessen, ohne zu schleppen – Solene e moderado, sem se arrastar (~ 11 minutos)
4. Stuermisch bewegt – Agitado (~ 20 minutos)

A sinfonia inicia de forma misteriosa no primeiro movimento. Sons do cuco e de outros pássaros, representados musicalmente, anunciam o despertar da natureza e dão fim à tensão e às dúvidas. Um tema lírico segue.

O segundo movimento é um Landler-scherzo, parecido com os landlers de Anton Bruckner e de Haydn.

O terceiro movimento causou uma certa polêmica na época devido a sua aparente bizarrice. Adaptada como marcha fúnebre, é usada de forma paródica uma melodia infantil bastante conhecida, chamada em alguns países de Frère Jacques e em outros de Bruder Martin. A seu respeito Mahler escreveu no programa para os concertos em 1893 e 1894:

A idéia dessa peça veio ao autor por intermédio de uma gravura paródica conhecida por qualquer criança da Alemanha do Sul e intitulada “Os funerais do caçador”. Os animais da floresta acompanham o caixão do caçador morto; lebres empunham uma bandeira; à frente uma trupe de músicos boêmios acompanhados por instrumentistas gatos, corujas e corvos… Cervos, corças e outros habitantes da floresta, de pêlo ou pena, seguem o cortejo com fisionomias afetadas. A peça, com uma atmosfera ora ironicamente alegre, ora inquientante, é seguida de imediato pelo último movimento “d’all Inferno al Paradiso”, expressão súbita de um coração ferido no mais profundo de si…

O silêncio do terceiro movimento é abruptamente interrompido, de forma histérica, pela orquestra no quarto movimento. Conta-se que durante uma das primeiras apresentações da Sinfonia 1, uma senhora espantou-se e derrubou todos os objetos que carregava na mão.

Após alguns minutos a fúria inicial do último movimento é contida e cede lugar a uma melodia lírica. Os temas dos movimentos anteriores são lembrados. Perto do final, ocorre uma nova tempestade sonora, porém, ao contrário do início, que lembrava uma “luta”, agora o sentimento é de “triunfo”. Nesta parte Mahler pede para que os trompetistas da orquestra toquem de pé.

Na primeira postagem que fizemos da Sinfonia Nº 1, FDP Bach escreveu:

As opções de gravações das sinfonias de Mahler são inúmeras. Regentes como Bernstein chegaram a gravá-la duas vezes, enquanto outros não encaravam a totalidade, preferiam se concentrar em apenas algumas das sinfonias. Portanto, sei que muitos irão dizer que a “Titan” do Bernstein é superior à do Chailly, ou que a versão do Haitink é insuperável, ou que o atual menino de ouro da Filarmónica de Berlim, Simon Rattle é o cara, , ou que até mesmo a 9ª do Karajan, postada aqui há apenas alguns dias atrás é imbatível. Acatarei todas as opiniões, mas a versão que prevalecerá até o final é a do Bernstein, da DG. Os motivos que me levaram a escolhê-la são pessoais, mas baseados em diversas críticas altamente favoráveis, lidas nas mais variadas fontes. Até me dei ao trabalho de procurar uma biografia de Mahler entre as publicações brasileiras, mas infelizmente está tudo esgotado, até mesmo a autobiografia da Alma Mahler, publicada pela editora Martins Fontes nos anos 80, ou até mesmo a do Michael Kennedy, publicada pela Jorge Zahar Editor, também na mesma época. Em inglês as opções são múltiplas, basta fazer uma pesquisa no site da Livraria Cultura.

Esta introdução é necessária para alertá-los do tamanho da brincadeira a que estou me dedicando. Terei de conciliá-la com os estudos para um Concurso Público, para o qual estou me dedicando com total empenho. Portanto, se forem demorados os intervalos entre as postagens, peço para que considerem a situação a que os deixei cientes aí acima.

As gravadoras são pão-duras. Nas chamadas integrais destas sinfonias, as mesmas são divididas entre os cds. Exemplo: na versão do Chailly lançada pela DECCA, no final do cd em que se tem a primeira sinfonia, o espaço restante do cd é aproveitado para se colocar o primeiro movimento da 2ª, e assim por diante. Imagine como são os casos das sinfonias mais longas, como a 3ª, 6, 7, ou a 8ª… É uma confusão tremenda. E isso também acontece na gravação do Bernstein que irei postar.. Mas estou me dando ao trabalho de dividi-las devidamente (e viva o Sony Sound Forge). ´Seria sacanagem deixá-los esperando pela continuação num próximo cd. mas vamos ao que interessa.

CD1

Gustav Mahler – Sinfonia Nº 1 e Canções de um Viandante

Symphonie no. 1
01. Symphonie no. 1 – Langsam. Schleppend. Wie ein Naturlaut – Im Anfang sehr gemächlich
02. Kräftig bewegt, doch nicht zu schnell – Trio. Recht gemächlich
03. Feierlich und gemessen, ohne zu schleppen
04. Stürmisch bewegt

Concertgebouw Orchestra
Leonard Bernstein

Lieder eines fahrenden Gesellen (Canções de um Viandante)
05. Wenn mein Schatz Hochzeit macht
06. Ging heut morgen übers Feld
07. Ich hab ein glühend Messer
08. Die zwei blauen Augen

Thomas Hampson: baritone
Wiener Philarmoniker
Leonard Bernstein

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Viram como eu sou bom pra caraglio?
Viram como eu sou bom pra caraglio?

PQP

Giuseppe Tartini (1692-1770): A Sonata do Diabo (“Il Trillo del diavolo”, “O Trinado do Diabo”) e outras peças (Manze)

Giuseppe Tartini (1692-1770): A Sonata do Diabo (“Il Trillo del diavolo”, “O Trinado do Diabo”) e outras peças (Manze)
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IM-PER-DÍ-VEL !!!

“Uma noite sonhei que tinha feito um pacto com o diabo, o qual se dispôs a me obedecer, em troca de minha alma. Meu novo servo antecipava meus desejos e os satisfazia. Tive a ideia de entregar-lhe meu violino para ver se ele sabia tocá-lo. Qual não foi meu espanto ao ouvir uma Sonata tão bela e insuperável, executada com tanta arte. Senti-me extasiado, transportado, encantado; a respiração falhou-me e despertei. Tomando meu violino, tentei reproduzir os sons que ouvira, mas foi tudo em vão. Pus-me então a compor uma peça – Il Trillo del Diavolo – que, embora seja a melhor que jamais escrevi, é muito inferior à que ouvi no sonho”.

Giuseppe Tartini

Este é um dos CDs mais loucos que você vai ouvir. Mas é uma loucura inspirada. Andrew Manze, seguindo uma sugestão que está em uma das cartas de Tartini, livra-se de qualquer acompanhante e toca estas peças — normalmente executadas no mínimo com cravo contínuo — no violino solo. E Manze se utiliza de grande liberdade, improvisando, afastando-se do texto e voltando à partitura original. É um belo pesadelo e uma grande performance, altamente barroca. Se é “autêntica” ou não, eu não tenho a menor ideia. Manze não parece preocupado com isso. São execuções fluidas e livres, de bela sonoridade. Um CD inesquecível.

A vida de Tartini foi um tanto louca. Mesmo proibido pela família, casou-se secretamente com Elisabetta Premazzone, sobrinha de um cardeal que se opôs ao casamento. O feito rendeu-lhe uma ordem de prisão, o que levou Tartini a fugir para Assis, onde, disfarçado de Frade, se exilou no mosteiro da cidade.

Em Assis, Tartini se entregou ao estudo do violino, pesquisando novas metodologias e possibilidades sonoras do instrumento. Ali ele fez a descoberta do “Terzo Suono”, o terceiro som, um “fantasma sonoro” que pode ser percebido quando dois sons são intensos o suficiente para chegarem simultaneamente ao ouvido e gerar um terceiro som.

É um efeito semelhante ao dos sons binaurais. No violino, é comum executar este som, basta que o violinista toque notas duplas, se seu ouvido for sensível o suficiente ele ouvirá um terceiro tom, também conhecido como “Tons de Tartini”. Foi em seu livro Tratado de música segundo a verdadeira ciência da harmonia, que Tartini tornou o tema público.

Passados dois anos, Tartini foi perdoado e voltou imediatamente à companhia da esposa. Neste período, Tartini deu início a carreira de concertista.

Os três últimos parágrafos foram roubados daqui.

Giuseppe Tartini (1692-1770): A Sonata do Diabo e outras peças

“La Sonata Del Diavolo” En Sol Mineur
1 [Largo] 6:36
2 Allegro 6:06
3 Andante – Allegro – Adagio 6:18

De “L’Arte Del Arco” (14 Variations Sur La Gavotte De L’op. 5 n 10 De Corelli)
4 Theme Et Variation 1 1:00
5 Variations 2 Et 4 1:09
6 Variations 9, 15 Et 12 1:28
7 Variations 10 Et 20 1:52
8 Variations 29 0:46
9 Variations 30 0:38
10 Variations 33 2:04
11 Variations 34 1:11
12 Variations 23 0:53
13 Variations 38 1:11

Sonate En La Mineur
14 Cantabile 1:56
15 Allegro 1:57
16 [Andante] 4:50
17 Giga 2:33
18 Aria [Avec Vatiations] 1:40
19 Variations I 1:18
20 Variations II 3:52
21 Variations III 1:32
22 Variations IV 2:43
23 Variations V 1:19

“Pastorale” Pour Violon Scordatura
24 Grave 5:00
25 Allegro 3:30
26 Largo – Presto – Andante 4:59

Andrew Manze, violino

BAIXE AQUI — DOWNLOAD HERE

Exemplo de execução da Sonata "Il Trillo del diavolo"
Exemplo de execução da Sonata “Il Trillo del diavolo”

PQP

Johannes Brahms (1833-1897): Os Quartetos para Piano (completo) (Leopold / Hamelin)

Johannes Brahms (1833-1897): Os Quartetos para Piano (completo) (Leopold / Hamelin)

IM-PER-DÍ-VEL !!!

Já que todos aqui estão depondo suas melhores pérolas para os visitantes, não serei eu a destoar de meus comparsas. Hoje é o dia em que nosso poeta Alessandro Reiffer vai enlouquecer de vez. Pois estes quartetos para piano absolutamente perfeitos estão numa gravação que — perdoe-me, FDP — bate o ex-campeão Beaux Arts Trio. O mundo é assim: quando achamos que ouvimos o absolutamente perfeito, vem uns malucos e fazem ainda melhor.

Gente, li tudo o que vocês escreveram sobre Brahms e concordo com muitas coisas, mas o principal não foi dito, penso: Brahms é denso pra caralho. Brahms explora um tema como papai fazia. Ele é bachiano até a raiz dos cabelos. Aliás, meus cinco compositores prediletos são Bach, Beethoven, Brahms, Bruckner, Bartók, Mahler e Shostakovich, todos com mania de repetição, sendo que Mahler devia ser também maníaco-depressivo. Vamos a um TEXTO MAIS ORGANIZADINHO E BONITINHO sobre Brahms? Nosso colaborador eventual Milton Ribeiro o escreve.

Como se não bastasse o trocadilho infame que o nome Brahms sugere a nós, brasileiros, ele era filho de um contrabaixista de Hamburgo que tocava em cervejarias. E, a partir dos dez anos de idade, o pequeno Johannes passou a trabalhar como pianista com seu pai, nas tabernas. Não sabemos se estas atividades foram nocivas à saúde do menino, sabemos apenas que ele, mais tarde, fez bom uso de seu conhecimento sobre o repertório popular alemão. Brahms teve apenas dois professores, ambos durante a infância e adolescência. Estava pronto após estudar Bach, Mozart e Beethoven.

Começou a compor cedo e, antes de completar 20 anos, seu Scherzo opus 4 já tinha entusiasmado e revelado afinidades com Schumann, a quem Brahms ainda desconhecia. Foi visitar Schumann e então os fatos são mais conhecidos: primeiro, Schumann escreve em seu diário “Visita de Brahms, um gênio!”, depois publica artigo altamente elogioso ao compositor, fazendo com que o jovem Brahms tivesse a melhor publicidade que um artista pudesse desejar. Schumann o considerava um filho espiritual e a esposa de Schumann, Clara, chamava-o de seu “deus loiro”. Muitas hipóteses são possíveis sobre a relação entre Clara e Brahms, mas só uma coisa é certa: eles destruíram a maior parte das cartas que dizia respeito a ela. Porém, a versão de que houve um forte componente amoroso na relação dos dois tem tudo para estar próxima da verdade.

O Quarteto para Piano é uma formação que envolve um piano e três outros instrumentos. Durante o período clássico, usualmente os outros instrumentos eram um trio de cordas –- violino, viola e violoncelo. Para esta formação, Mozart, Schumann, Brahms, Mendelssohn, Schubert, Dvorak, Berwald e Fauré, entre outros, escreveram obras. Mais modernamente, Mahler e Messiaen utilizaram a mesma formação, sendo que o Quarteto para o Fim dos Tempos de Messiaen envolve piano, violino, cello e um clarinete em lugar da viola.

Brahms compôs três quartetos para piano. Curiosamente, o último foi o primeiro a ser escrito, nos anos de 1855-1856, quando o compositor tinha 22-23 anos e estava hospedado na casa dos Schumann. Só que ele foi revisado e estreado apenas trinta anos depois, em 1875. O segundo a ser escrito e primeiro a ser estreado é o que recebeu o Nº1, Op. 25 (escrito em 1861 – Brahms com 28 anos) e o terceiro é o Nº 2, Op. 26 (1862 – Brahms com 29 anos).

Brahms é compositor originalíssimo. Suas obras representam uma tentativa única de fusão entre a expressividade romântica e as preocupações formais clássicas. O resultado é uma música de grande densidade e intensidade. Foi, em sua época, adotado pelos conservadores. Ele colaborou bastante com esta adoção ao assinar um manifesto contra a chamada escola neo-alemã de Liszt e Wagner. Teve tal estigma imerecido até o famoso ensaio de Schoenberg: “Brahms, o Progressista”.

Em seus últimos anos de vida, Brahms afirmava que suas maiores obras de câmara teriam sido as da juventude e citava nominalmente o Sexteto, Op. 18, e os Quartetos para Piano, Op. 25 e 26, como as suas preferidas.

Então, fica a pergunta: teria ele comido Clara Schumann?

Johannes Brahms (1833-1897): Os Quartetos para Piano (completo) (Leopold / Hamelin)

Piano Quartet No. 1 in G minor, Op. 25 (39:08)
1. Allegro
2. Intermezzo: Allegro Ma Non Troppo – Trio: Animato
3. Andante Con Moto
4. Rondo Alla Zingarese: Presto

Piano Quartet No. 3 in C minor (“Werther”), Op. 60 (35:06)
5. Allegro Non Troppo
6. Scherzo: Allegro
7. Andante
8. Finale: Allegro Comodo

Piano Quartet No. 2 in A major, Op. 26 (50:12)
1. Allegro Non Troppo
2. Poco Adagio
3. Scherzo: Poco Allegro – Trio
4. Finale: Allegro

Intermezzi (3) for piano solo, Op. 117 (16:16)
5. Andante Moderato
6. Andante Non Troppo E Con Molto Espressione
7. Andante Con Moto

Leopold String Trio
Marc-André Hamelin, piano

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O Leopold String Trio sem Hamelin
O Leopold String Trio sem Hamelin

PQP