IN VINEA MEA: vinhos & vinhas na Idade Média com o Ensemble Chominciamento de Gioia

IN VINEA MEA: vinhos & vinhas na Idade Média com o Ensemble Chominciamento de Gioia

Para festejar a entrada de um novo ano o monge Ranulfus foi buscar vinhos de anos velhíssimos: a Idade Média.

Talvez o que mais o tenha inspirado a fazê-lo seja o nome do grupo: Chominciamento de Gioia – onde a primeira palavra (se não falha agora o tino linguístico do referido monge) com toda probabilidade é derivada no verbo italiano cominciare (começar), apenas que numa grafia incomum, dando ao conjunto o sentido de “puxar festa”, de provocação ou incitamento à alegria (gioia), ou até mesmo de “alegre começo”. Para que coisa melhor, então, numa entrada de ano?

Ainda mais falando de vinhos, videiras e vinhas!

Verdade que em muitas das peças o vinho entra domado por fortes sentidos religiosos – especialmente naquelas cantadas em (tinha que ser!) galaico-português.

Ainda assim, o monge espera que possa ser um bom divertimento a pelo menos uma boa parcela dos nossos leitores – ainda mais que os textos todos estão incluídos no arquivo. Isso ajuda até mesmo a seguir a versão orffiana (mais conhecida) da canção satírica In Taberna, da coletânea medieval de canções conhecida como Carmina Burana, que encerra o CD.

Mas agora vam’bora, cada um atrás da sua taça, que o ano não tarda!!

IN VINEA MEA: vinhos & vinhas na Idade Média com o Ensemble Chominciamento de Gioia

01 Bacche bene venies – Carmina Burana nº 200 – séc.13
02 Deficiente vino – Ms I-Pa 2788, Perugia – séc.14
03 Como Deus fez vynno 0 Cantigas de Santa Maria nº 23 – séc.13
04 Bon vin doit – Roman de Fauvel – séc.14
05 Alte clamat Epicurus – Carmina Burana nº 211
06 L’autre lèr cuidèl aver druda – Chãnson trobadorica, NN – séc.12
07 Ben pod’as cousas – Cantigas de Santa Maria nº 73 – séc.13
08 Sacerdos in aeternum – Ms I-Pa 2799, Perugia – séc.14
09 Procurans odium – Carmina Burana nº 12 – séc.13
10 Vinum bonum – Ms. Egerton – séc.13
11 Ges de disnar – Bertrand de Born – séc.12
12 Dixit pater familias – Ms I-Pa 2785, Perugia – séc.14
13 Poder a Santa Maria – Cantigas de Santa Maria nº 161 – séc.13
14 Felix vitis – Ms I-Pa 2785, Perugia – séc.14
15 A que Deus – Cantigas de Santa Maria nº 351 – séc.13
16 O Divina Virgo flore – Laudario di Cortona – séc.13
17 On parole / A Paris / Frese nouvella – Ms. Montpelier – séc.13
18 In taberna – Carmina Burana nº 196 – séc.13

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LINK ALTERNATIVO

PS: por muito tempo este CD pareceu inencontrável na Amazon – até que em 06/04/2016 o(a) leitor(a) que se identifica como Sedmagis nos enviou o link – que agora, finalmente, foi incorporado à imagem no alto do post, e de quebra matou a charada da inencontrabilidade: em 2010 recebi o arquivo com um erro de latim no título, que é IN VINEA, não IN VINA. Sem sermos especialistas em línguas mortas, acabamos engolindo essa mosca por mais de cinco anos. Valeu, Sedmagis!!

Johannes Vermeer: O Copo de Vinho (1658-1660). Gemalde Galerie Berlin.

Ranulfus

Madrigal ARS VIVA (1971): 1ªs gravações de Gilberto Mendes (1922-2016) e Willy Corrêa de Oliveira (1936) + Idade Média e Renascença

Gilberto Mendes 13/10/1922 a 01/01/2016Publicado originalmente em 11.07.2010. Revalidado in memoriam Gilberto Mendes.

Santos se diferencia das outras cidades importantes do estado de São Paulo por ser mais antiga e durante uns três séculos mais importante que a capital. A distância entre as duas é de apenas 75 Km, mas talvez o desnível abrupto de 700 metros tenha ajudado a preservar na cidade-porto uma identidade cultural própria, até um sotaque e caráter de povo diferente. Em alguns momentos isso se refletiu não só no futebol mas também numa vida musical digna de nota –

capa-peq… sobretudo nas décadas de 1960 e 70, com os compositores Gilberto Mendes (Santos, 1922), Willy Corrêa de Oliveira (Recife, 1936), e em parte também Almeida Prado (Santos, 1943) fazendo da cidade uma referência mundial com os Festivais de Música Nova.

Esses festivais ainda acontecem, mas infelizmente, é preciso dizer, não com a mesma vitalidade e impacto de antes. Como outras cidades do mesmo porte, Santos parece ter a sina de ser berço de gente que vai brilhar em outros lugares. De todo aquele movimento, só Gilberto Mendes permanece lá [escrito em 2010], ao que parece ainda insuperado em irreverência e espírito jovem – aos 88 anos!

Outro dos protagonistas que deve ter feito muita falta ao movimento foi o regente Klaus-Dieter Wolff – este por sua morte prematura. Klaus nasceu em 1926 em Frankfurt mas viveu no Brasil desde os 10 anos. Em 1951 fundou o Conjunto Coral de Câmara de São Paulo; em 1961 o Madrigal Ars Viva de Santos. Em 1968 colaborou com Roberto Schnorrenberg – três anos mais jovem e que em 1964 fundara o Collegium Musicum de São Paulo – na primeira realização brasileira das Vésperas de Monteverdi. Em 1971 gravou este disco, pioneiro em muitos sentidos – mas já em 1974 veio a falecer, com meros 48 anos. (Clique AQUI para mais informações sobre a formação e atuação dos dois).

Tanto Klaus quanto Roberto trabalhavam com o ideal declarado de ampliar o repertório conhecido no Brasil, e ao que parece foi esse ideal que presidiu a escolha das peças deste disco, que contém alguns verdadeiros standards do repertório medieval (como Alle psallite cum luya) e renascentista (como Mille regretz de vous abandonner – “mil mágoas por vos deixar” -, canção que inspirou muitíssimos instrumentistas e outros compositores ao longo dos séculos seguintes), ou então exemplos de compositores de primeira grandeza desses 4 séculos (Machault, Josquin des Près, Lassus, Jannequin).

Nem sempre acho felizes as opções do regente Wolff: ainda é compreensível que Alle psallite apareça tão lenta, pois se trata de um canto de cortejo, de procissão, mas um Rodrigo Martínez assim tão duro e quadrado? (Em breve posto o de Roberto de Regina, e vocês terão oportunidade de ver quase que o exagero oposto).

Mas nas peças mais introvertidas Klaus me parece conseguir uma combinação belíssima de concentração, intensidade e delicadeza (Ave Maria, Todos duermen corazón, Pámpano verde, Mille regretz, etc). É pena que os meus meios técnicos atuais não dêem conta de eliminar 100% do ruído que aparece nas frases finais de Mille regretz, um dos momentos mais delicados do disco.

As três peças ‘de vanguarda’ são de 1962, 66 e 69, todas inspiradas em poemas concretos (de Décio Pignatari e de José Lino Grünewald). Beba Coca-Cola é hoje uma peça consagrada, com muitas gravações no Brasil e no exterior – mas esta foi a primeira.

Na contracapa e no encarte há ricos textos informativos de Gilberto Mendes, e também os textos de todas as peças (muitas vezes naquelas esdrúxulas misturas lingüísticas características do renascimento) – e então acho que já posso entregar a bola a vocês!

Madrigal Ars Viva (Santos, SP)
Regência: Klaus-Dieter Wolff
(1926-1974)
Gravação: 1971 (independente)

A01  Alle psalite cum luya – anônimo séc.13
A02 Nel mezzo a sei paone – madrigal de Johannes/Giovanni de Florentia, séc.14
A03 Lasse! Comment oublieray / Se j’aim mon loyal ami / Pour quoy me bat mes maris
– motete (3 textos simultâneos) de Guillaume de Machault, séc.14
A04  Alma Redemptoris Mater – Johannes Ockeghem, séc.15
A05  Ave Maria – ‘carol’ anônimo, séc.15
A06 Nowell sing we – ‘carol’ anônimo, séc.15
A07  Todos duermen, corazón – Baena, séc.15-16
A08 Rodrigo Martínez – anônimo, séc.15-16
A09 Pámpano verde – Francisco de Torre, séc.15-16
A10 Mille regretz de vous abandonner – Josquin des Prez/Près, séc.15

B01 Bonjour, mon coeur – Roland de Lassus (1532-1594)
B02 Les cris de Paris – Clement Jannequin, séc.16
B03 Um movimento vivo (1962) – Willy Corrêa de Oliveira (*1936)
B04 Beba Coca-Cola (1966) – Gilberto Mendes (*1922)
B05 Vai e Vem (1969) – Gilberto Mendes

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Ranulfus