.: interlúdio :. 100 anos de Astor Piazzolla: Piazzolla ‘78 #Piazzolla100

11 de março de 2021 – ‘Astor faz Cem Anos’- poderia ser título de um filme de Saura, ele que nos deu o magnífico ‘Tango’. Enfim, aos grandes, a grandeza. E Astor, como seu nome bem o denota, andava neste mundo desviando a fronte das tramas estelares, donde vez por outra colhia melodias sem igual. Despertei essa manhã com a súbita consciência de que sendo um Piazzóllatra apaixonado não poderia cometer o desatino de não homenageá-lo com uma postagem. Sem qualquer receio de jazer datado, quero dizer que na noite ontem, dia 6 de março, no Teatro Colón, se deu o segundo concerto da série de 13 dedicados ao mestre, transmitidos ao vivo pelas rádios de Buenos Aires. Que noite, amigos! Que música, que músicos, que arranjos, que emoções! Foi revivido o seu octeto eletrônico com o repertório dos tempos de Libertango; mais a presença da monumental Amelita Baltar cantando os seus lapidares sucessos junto a Astor. A mais plena glória concedida ao que muitos chamaram de “assassino do tango”. Consideremos, Astor era pirracento e costumava lançar um balde de gasolina nesse fogaréu, falando por exemplo que La Cumparsita seria o pior dos tangos que já tocara ou criticando antigos mestres e estilos nos quais sua própria obra encontrava raízes. Peço perdão se esse texto sai engessado, carente de graça ou leveza. Nesse momento, sob um mundo adoecido e a cidade em estado de lei seca, devo poupar os últimos quatro dedos de whisky para o terceiro concerto logo mais às 17 horas. Caminhemos, como diria Herivelto Martins.

Esse disco, também lançado como ‘Mundial 78’ na época, foi um trabalho ligado a um campeonato de futebol. Seus títulos se remetem ao nobre esporte. Sou a pessoa menos indicada do mundo para falar de futebol, tarefa que deveria, pelo maior zelo da justiça, caber ao compadre mestre Milton Ribeiro. Todavia, na infância, em casa dos meus avós e pais, testemunhava a emoção que efervescia nas Copas do Mundo. Lembro de momentos verdadeiramente mágicos, onde via nomes como Garrincha, Pelé, Rivelino, Tostão, um filosófico e etílico Dr. Sócrates; e nomes estranhos como Cafuringa e Beto Fuscão. Sei que eram verdadeiros deuses, voavam, para eles não existiria limites de gravidade e inércia. A bola os obedecia. Eram magos, certamente. Hoje não sei se isso ainda existe. Astor não foi ligado ao futebol até se encantar com o magnífico Maradona. Preferia pescar tubarões, conforme nos conta a excelente biografia de Maria Susana Azzi, que tive a grande sorte de conseguir. Que livro, uma obra definitiva sobre Piazzolla. No presente disco, cada faixa se remete a elementos do futebol, como poderemos ler abaixo. É um disco pequeno, porém concentrado. Um pequeno frasco com matéria radioativa. Toda beleza e intensidade da música de Astor se encontra nessa miniatura. Seu estilo, diríamos, melodinâmico, que evoca pelejas de facas e amores lancinantes, emoções intensas e melodias inebriantes, se adapta perfeitamente à ideia da peleja esportiva, com suas tensões, disputas, anseios, suor e esforços, tropeços, faltas, pênaltis, gols, fracassos, esperanças, vitórias por vezes amargas…

Sintonizo agora a rádio La 2×4 de Buenos Aires, já vai começar o terceiro concerto em honra ao grande Piazzolla. Não perderei nenhum. Encerro esse texto mal engendrado com um breve trecho do filósofo romeno Emil Cioran, como prece e reflexão nesses tempos enfermos. E que as emoções e a beleza da obra de Astor nos fortaleçam, encorajem e abençoem.

“Que o entusiasmo irrompa na existência e que a alegria se assemelhe aos grandes êxtases, e que nosso desejo de ser seja tão universal quanto a tristeza de ser. Em sua luta, que o desejo de ser encha de paixão as trevas das tristezas e que nossa sede de absoluto sacie sua infinitude na obscuridade.”

Astor Piazzolla: Piazzola ‘78

1 Mundial 78
2 Marcación
3 Penal
4 Gambeta
5 Golazo
6 Wing
7 Corner
8 Campeón

Astor Piazzolla – Bandoneón, arranjos e direção
Arnaldo Ciato – Piano
Giani Zilioli – Órgão
Sergio Farina – Guitarra
Gigi Cappellotto, Giorgio Azzolini – Eletric Bass
Tullio de Piscopo – Drums
Sergio Almagano – Violino
Elsa Parravicini – Sax Alto
Hugo Heredia, Sergio Rigon, Giuseppe Parmigiani – Flautas
Paulo Salvi – Cello

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Astor faz 100 Anos

Wellbach

5 comments / Add your comment below

  1. Olá, boa noite. Tudo bom?

    Sim, Piazzolla é impressionante. Difícil até comentar algo sem ser redundante. Enfim. Gravou muito, que bom! Em uma lista contei cerca de 70 e poucos discos.

    Gostei da longa postagem que vocês fizeram “Astor Piazzolla: os 100 anos do combativ(d)o vanguardista”, a única que li inteira por enquanto.

    Difícil também é escolher uma boa ou a melhor. Mas lembro que Piazzolla gravou com os 2 Garry: o Garry Mullingan (sax) e o Gary Burton (vibrafone). São 2 discos bem interessantes de ouvir. Esse com o Mullingan tenho em LP mas meu aparelho já era.

    O outro com o Burton, tenho em algum HD antigo, vou procurar. Faz tempo que não o ouço, mas me parecia ter algo de Bartók na música do Piazzolla.

    Fica a sugestão de postagem. Piazzolla com os 2 Garry(s) …

    1. O disco com Mulligan – chamado, dependendo do país em que foi lançado, de “Summit”, “Reunión Cumbre” ou “Tango Nuevo”, e que eu adoro – virá em breve: só ficou de fora da homenagem de hoje porque, enfim, já tínhamos bastante coisa.

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