.: interlúdio :. Quarteto Novo

Publicado originalmente em 07.09.2012

De vez em quando acontecem esses momentos musicais que são como eclipses. E este é daqueles raros, seculares; talvez o melhor disco de música instrumental feito no Brasil em todos os tempos.

Viveu pouco, porém forte, o Quarteto Novo. Que nasceu Trio Novo em 1966, meio punhado de músicos para acompanhar Geraldo Vandré num programa de tevê patrocinado pela farmacêutica Rhodia. Que no ano seguinte não renovaria seus contratos publicitários, deixando o grupo à sorte. Sorte mesmo: pois que quando um flautista chamado Hermeto Paschoal juntou-se, em 1967, à Theo de Barros, Heraldo do Monte e Airto Moreira, Vandré resolveu bancar do próprio bolso ensaios e turnês do grupo. Que durou apenas mais dois anos, e deixou apenas um disco, que saiu pela Odeon; e que disco é, caros amigos. Tivesse feito mais um ou dois desses e hoje o mundo seria diferente. O brazilian northeastern jazz seria nosso principal produto de exportação e influência musical. Não que tenha passado despercebido, longe disso. Diga “Quarteto Novo” a qualquer expert internacional do jazz e presencie uma cascata de elogios maior do que sou capaz de reproduzir. (Última reedição é da Blue Note, inclusive.)

Patriotismo (que não me pertence) à parte, puxa vida: se fosse sempre possível elevar dessa forma nossas mais brazucas expressões musicais. Como toda junção de estilos bem feita, não se trata de uma soma simples; é um caldo cozido a fogo lento e onde os sabores se entranham uns nos outros. A linguagem do jazz se adapta tanto à marcação de samba quanto ao 2/4 do baião; as linhas de flauta substituem os trompetes tradicionais (e a voz — lembrem que era 1967 e a bossa nova mandava e desmandava); a guitarra vai dar norte a Pat Metheny e, quando sai de lado para a viola ou violão de 12 cordas, se ouve tudo que Duofel vai fazer nos próximos 40 anos. O álbum flutua no mapa e vai do sertão (Algodão) à Nova York (mas) (Vim de Sant’ana) voando numa nuvem. Às vezes é Lampião de terno, batendo triângulo com Dolphy num bar de Chicago; noutras é Wes Montgomery comendo torresmo e tocando com o dedão engraxado. Imaginário à parte, a sofisticação dos arranjos; coisa fina como pouco se vê fazerem aqui, e já há tanto. Também o fato de uma banda que parece saber telepatia musical; Barros usando com a mesma sabedoria tanto contrabaixo elétrico como double bass, Airto Moreira simplesmente assinando um contrato com o futuro, na primeira linha do jazz internacional pro resto da vida. E a flauta-abraço de Hermeto, com sua performance singular e seu toque de Midas na alma: impossível ouvir Hermeto sem brotar um sorriso na cara.

Quarteto Nôvo – 1967: Quarteto Nôvo (320 kbps)
Theo de Barros: violão, contrabaixo
Heraldo do Monte: guitarra, viola caipira
Airto Moreira: bateria, percussão
Hermeto Pascoal: flauta, piano, arranjos.

01 O Ôvo (Vandré/Pascoal)
02 Fica Mal com Deus (Vandré)
03 Canto Geral (Vandré/Pascoal)
04 Algodão (Gonzaga/Dantas)
05 Canta Maria (Vandré)
06 Síntese (Monte)
07 Misturada (Moreira/Vandré)
08 Vim de Sant’Ana (Barros)
Faixas-bônus da reedição de 1993
09 Ponteio (Lobo)
10 O Cantador (Caymmi/Motta)

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Boa audição, e bom feriado!
Blue Dog
(post renovado por Ranulfus, em consequência
do comentário entusiasmado do leitor Sal)

26 comments / Add your comment below

  1. receber de graça uma preciosidade como essa só mesmo acreditando que a predestinação é uma realidade. verdade. agradeço com reverencia.

  2. Nunca tinha ouvido falar disso, mas já fiquei sabendo que é realmente uma maravilha!! Valeu, e aproveito pra avisar que está baixando sim, e bem rapidinho. Só é uma pena ter isso em mp3, acho que não se encontra para comprar nem irão relançar. Nesses casos, acho que poderia ser postado em formatos melhores.

  3. Pessoal, em primeiro lugar, parabéns pelo blog. Embora comente pouco, sou um assíduo frequentador… Peço desculpas por introduzir aqui um assunto que pouco ou nada tem a ver com a postagem, a não ser o fato de falar de música da mais alta qualidade (o Quarteto Novo é maravilhoso!!). Gostaria de pedir a ajuda de vocês para divulgar aqui o Artes Vertentes, Primeiro Festival de Arte Internacional de Tiradentes, que vai acontecer entre 09 e 23 de setembro em Tiradentes, MG. A programação inclui música erudita, world music, cinema, artes visuais, literatura, teatro, circo e dança; são mais de 50 artistas, vindos de 15 países diferentes. Pra vocês terem uma ideia do nível da programação: a abertura, dia 9/09, será um concerto de Nelson Freire na Igreja Matriz de Santo Antônio! Segue um link para a programação musical completa: http://www.artesvertentes.com/programacao/musica/
    Muito grato. Esperamos vocês aqui!!

    1. Bem que eu gostaria… Minha mãe e minha irmã já estiveram lá em Tiradentes. Sabia que a orquestra de uma das igrejas (não me pergunte qual é, que eu não sei ao certo) ainda continua a mesma? Pois é, só mudaram os músicos. rsrsrs Que graça! Foi o guia da turma delas que contou essa…

      Blue Dog, parabéns pelo post. Só não entendi uma coisa: double bass não é a mesma coisa que contrabaixo? Ou é um trocadilho? 😐

  4. Fantástico o blog, acredito que por um bom caminho cheguei até aqui.Caros amigos do blog meu nome é Leonardo, sou Audiófilo amante da excelente música e do Áudio High-End, onde tenho uma empresa que é a LMB Áudio&Vídeo, trabalho com sistemas de Home Theater / High-End;
    Áudio 2Channel High-End e Automação Residencial, quero dizer a todos os amigos que terei o imenso prazer em participar deste belo blog fazendo novas e excelentes amizades e contribuindo humildemente com meu conhecimento na área de áudio High-End que penso ser o muitos aqui querem também,ou seja,ádio de excelente qualidade para ouvir estas preciosidades que aqui neste blog encontramos, desde agora terei o imenso prazer em falar com vocês no que for necessário.
    Abs
    Leonardo Marcello Boubee
    LMB Áudio&Vídeo High-End
    http://www.lmbaudioevideo.com.br / [email protected]

  5. Caros visitantes
    Este post é antigo mas é ouro puro.
    Eu consegui esse disco em outra fonte e só depois vi que tinha sido postado aqui. Tenho ouvido quase que diariamente nos últimos dois meses. Que cacetada!!! É simplesmente uma das melhores gravacoes de música instrumental já produzida nesse planeta. Simplesmente genial, conseguiu elevar a música brasileira a universalidade.
    Fica também outra dica de outro album do Hermeto: “Em Tom Maior Smabrasa Trio”, procurem que vao achar por ai. É outro petardo, estou absolutamente maravilhado e por isso compartilho aqui no PQP

  6. Show de bola!!!
    A música brasileira é um consolo. Faz lembrar o lado bom do Brasil. Em tempos tao sombrios, tem sido importante achar uma fonte de otimismo.

  7. VALEU, Angelo!!
    Parece que estamos descobrindo uma confraria de curtidores desse filão precioso e quase esquecido da música brasileira.

    E por falar em Fino da Bossa, está em preparo uma postagem suculenta nesse sentido, aguardem!

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