Charles Ives (1874-1954): Sinfonia No. 2 e Sinfonia No. 3 “The Camp Meeting”

Charles Ives (1874-1954): Sinfonia No. 2 e Sinfonia No. 3 “The Camp Meeting”

Este CD é finalizado com uma palestra explicativa de Leonard Bernstein sobre a música de Ives e sua posição dentro da cultura norte-americana e mundial. Só isso já vale o CD. Abaixo, copio um belo texto de Eduardo Prjadko (roubado quase completo da excelente Obvious) sobre o mesmo assunto.

Ives foi um compositor anônimo em sua época. Era dono de uma empresa de seguros em Nova York e teve uma vida abastada, mas nas horas vagas era compositor. Quando jovem teve uma vida musical bastante intensa, patrocinada pelo pai, que também era músico. Aprendeu a tocar piano, órgão, e mesmo muito novo, já fazia composições. Sua formação musical foi a tradicional europeia, no entanto Ives estava na América. Neste mesmo ambiente se desenvolvia o Jazz e todo tipo de experimentação.

Como Ives não tinha muito tempo para compor e também era bastante detalhista, suas obras levavam muitos anos para ficarem prontas. Uma de suas obras mais importantes, Three Places in New England, que consiste em três movimentos, levou cerca de 25 anos desde os primeiros esboços até os últimos retoques. Desta obra em específico, datam os primeiros esboços de 1903. Nesta mesma época Schoenberg terminava de compor Pelleas und Melisande, uma obra pra lá de tonal e tradicional.

O mais importante a se dizer da Three Places in New England está no segundo movimento, chamado Putnam’s Camp, Redding, Connecticut. Os primeiros cinco segundos já deixam o ouvinte de cabelos em pé, com uma entrada forte e densa, bastante incomum. Dalí para frente não é difícil identificar vários momentos em que a música se torna caótica e difícil de entender. A ideia de Ives foi justamente demonstrar isto: o ambiente caótico dos sons das ruas, onde se ouve uma banda de sopro passar numa esquina ao mesmo tempo que se ouve uma marcha na outra. Não se pode dizer que é uma obra completamente atonal, mas com certeza não tinha muito compromisso com o tonalismo.

Existem bibliografias que dizem que o próprio pai de Ives fazia experimentações na música, o que explicaria as obras muito à frente de seu tempo, mas não vou me aprofundar neste assunto. O fato é que a liberdade que a América proporcionava, sem as amarras de uma tradição secular, dava à Ives – e à quem mais quisesse – um ambiente onde era possível criar obras completamente fora do comum.

Outra obra bastante interessante é a The Unanswered Question. Nela, Ives criou uma melodia que se repete mas não é finalizada adequadamente. É como se você fizesse uma pergunta e não obtivesse a resposta (assim como propõe o nome da obra: A Questão não Respondida, em português). O trompete faz sempre a mesma “pergunta”, enquanto que um quarteto de sopro tenta responder de maneira adequada, mas sempre falhando. À medida que a música evolui, o quarteto de sopro se torna cada vez mais dissonante e mais difícil de entender. Se esta obra tivesse sido apresentada em público naquela época, Ives teria sido alvo de piadas.

Apesar de Ives ter sido um compositor anônimo, era bastante convicto de seus ideais. Acreditava no homem comum, que trabalha para sustentar seu lar. Era um verdadeiro praticante do American Way of Life, onde se pode chegar com uma mão na frente e outra atrás e trabalhar duro para se tornar bem sucedido. Entre suas convicções também estavam a de que a música na América devia ser mais audaciosa, mais máscula. Numa ocasião em que um compositor, amigo de Ives, fora vaiado ao apresentar sua obra, Ives não mediu esforços para xingar os detratores de maricas, dizendo para usarem seus ouvidos como homens.

É possível imaginar que um dos motivos que levaram Ives a não se lançar como compositor, foi justamente por não se sentir confortável com a música que era praticada e com a maneira como a música era tratada. Dizia que a música americana foi prostituída; não gostava da ideia de ser obrigado a agradar ao público. A música devia ser feita para engrandecer o homem. O anonimato e suas fortes convicções foram importantes para seu desenvolvimento como compositor. Ives não precisou explicar e justificar seus métodos à público nenhum; apenas compunha como achava que deveria compor, sem se importar com o que pensariam. Já, compositores famosos estavam o tempo todo sub o julgo de seus admiradores e inimigos. Schoenberg passou boa parte de sua carreira tendo de explicar seus métodos, e na maior parte deste do tempo, não conseguiu.

Somente muitos anos depois de sua morte, a música de Ives foi descoberta e revivida. Deve ter sido espantoso para os historiadores descobrir que muito antes de Schoenberg iniciar seus trabalhos com o atonalismo, Ives já se aventurava com muita desenvoltura em obras extremamente dissonantes para a época. Charles Ives acabou se tornando um tipo de herói americano. Em 1974, o centenário de Ives, sua música foi oficialmente declarada como a primeira música genuína norte americana.

Longe de ser uma simples aventura sem sentido, a música de Ives tem uma consistência e uma audácia espantosas. Vale lembrar que até hoje, ainda existe quem torça o nariz para o atonalismo ou qualquer tipo de arte transcendental. Isto nos mostra a genialidade deste compositor, que ultrapassou os limites da música tonal muito antes de seus companheiros de época. A liberdade e a motivação para fazer algo novo, transformaram Charles Ives num ícone Norte Americano e um artista mundialmente reconhecido.

Charles Ives (1874-1954) – Sinfonia No. 2 e Sinfonia No. 3, S. 3 (K.1A3) – The Camp Meeting

Sinfonia No. 2
01. I. Allegro moderato
02. II. Allegro
03. III. Adagio cantabile
04. IV. Lento maestoso
05. V. Allegro molto vivace

Sinfonia No. 3, S. 3 (K.1A3) – The Camp Meeting
06. I. ‘Old Folks Gatherin’_ Andante maestoso
07. II. ‘Children’s Day’_ Allegro
08. III. ‘Communion’_ Largo

Leonard Berstein Discusses Charles Ives
09. Leonard Berstein Discusses Charles Ives

New York Philharmonic
Leonard Bernstein, regente

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Charles Ives: o maior compositor norte-americano foi um anônimo em vida. Era o riquíssimo dono de uma empresa de seguros em Nova York.
Charles Ives: o maior compositor norte-americano foi um anônimo em vida. Era o riquíssimo dono de uma empresa de seguros em Nova York.

PQP

Charles Ives (1874-1954) – Sinfonia No. 1, Sinfonia No. 4 e Central Park in the Dark

Ives tinha uma vida extraordinariamente ativa. Após sua formação profissional como organista e compositor, ele trabalhou durante 30 anos no setor dos seguros, escrevendo no seu tempo livre. Usou uma grande variedade de estilos – desde o Romantismo tonal até a experimentação radical, mesmo em peças escritas no mesmo período. Suas principais obras muitas vezes lhe custaram anos de trabalho, desde o primeiro esboço até a revisão final, e muitas delas não foram executadas durante décadas. Suas auto-publicações no início dos anos 1920 trouxeram um pequeno grupo de admiradores que trabalhou para promover a sua música. Ele logo deixaria de escrever novas obras, dedicando-se a revisões e preparações para execuções de obras já compostas. Quando morreu, Ives já era um compositor reconhecido e muitas de sua obras tinham sido publicadas. Sua reputação continuou a crescer postumamente, e por ocasião do seu centenário, em 1974, ele foi reconhecido mundialmente como o primeiro compositor a criar uma “música distintamente americana”. Desde então, sua música tem sido mais freqüentemente executada e registrada e a sua reputação cresceu, menos tanto por suas inovações mas sobretudo pelo mérito intrínseco da sua música. As circunstâncias únicas da carreira de Charles Ives criaram alguns mal-entendidos. Seu trabalho no setor dos seguros, combinado com a diversidade da sua produção e do pequeno número de performances durante os seus anos de compositor, conduziram Ives a uma imagem de amador. No entanto, ele tinha uns 14 anos de carreira como organista profissional e um meticuloso treinamento formal na composição. Dado que se desenvolveu como compositor longe dos olhos do público, as suas obras maduras pareceram radicais e desconectas do passado, quando publicadas. No entanto, quando a sua música se tornou conhecida, as suas raízes profundas no Romantismo do século XIX e o desenvolvimento gradual de uma expressão pessoal altamente moderna e idiomática tornaram-se evidentes. As primeiras obras de Ives apresentadas ao público foram: Orchestral Set nº.1: Three Places in New England, The Concord Sonata, os movimentos da Sinfonia nº 4 e A Symphony: New England Holidays. Eram altamente complexas, incorporavam diversos estilos musicais e faziam uso freqüente de “empréstimos musicais”. Estas características levaram à conclusão de que algumas de suas obras só poderiam ser entendidas através das explicações programáticas que ele ofereceu e não foram especificamente organizadas com princípios musicais. Ainda traçando a evolução das suas técnicas através de suas obras anteriores, estudiosos demonstraram o trabalho que há por trás até de partituras aparentemente caóticas e mostraram a estreita relação de seus processos com os dos seus predecessores e contemporâneos europeus. O resultado do caminho incomum de Ives é que a cronologia da sua música é difícil de estabelecer. Sua prática de compor e as revisões das obras ao longo dos anos muitas vezes torna impossível atribuir a um pedaço uma única data. Ele trabalhou em diversas composições com muitas linguagens diferentes ao mesmo tempo e isso fez a relação cronológica entre as obras ainda mais complexa. Há, muitas vezes, obras sem verificação das datas que Ives atribuiu a elas, que podem ser anos ou décadas antes da primeira publicação ou execução. Foi sugerido, também, que ele datou várias peças muito cedo e ocultou revisões significativas, a fim de reivindicar prioridade sobre os compositores europeus que utilizavam técnicas semelhantes (Solomon, C1987) ou a esconder de seus negócios quanto tempo ele estava gastando na música(Swafford, C1996). Recentes estudos, no entanto, estabeleceram datas firmes pelos tipos de papel usado por Ives e refinou-se a estimativa de datas pelas diversas caligrafias, permitindo mais manuscritos para serem colocados dentro de um breve espaço de anos (Sherwood, C1994 e E1995, com base Kirkpatrick ,A1960, e Baron, C1990). Estes métodos têm muitas vezes confirmado as datas de Ives, o que demonstra que ele, na verdade, desenvolveu inúmeras técnicas inovadoras antes de seus contemporâneos europeus, incluindo politonalidade, clusters, acordes baseados em 4ªs ou 5ªs, atonalidade e poliritmia. Quando há discrepância – no caso de várias obras longas, por exemplo – esta pode resultar de sua prática de datar as peças em sua concepção inicial, nas primeiras idéias elaboradas no teclado ou em esboços já perdidos. As datas que aqui estão, então, são baseadas em manuscritos existentes, completadas por documentos recentes e depoimentos de Ives.

(…)

Extraído DAQUI

Charles Ives (1874-1954) – Symphony No. 1, Symphony No. 4 e Central Park in the Dark

Sinfonia No. 1
01. 1. Allegro (con moto)
02. 2. Adagio molto (sostenuto)
03. 3. Scherzo- Vivace
04. 4. Allegro molto

Sinfonia No. 4
05. 1. Prelude- Maestoso
06. 2. Comedy- Allegretto
07. 3. Fugue- Andante moderato con moto
08. 4. Very slowly (Largo maestoso)

Central Park in the Dark
09. Central Park in the Dark

Dallas Symphony Orchestra
Andrew Litton, regente

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Carlinus