Querido Vassily Genrikhovich, autor original deste post:
Estamos com muitas saudades de você. Muitas mesmo. Bem, se você não quiser voltar, ficaremos tristes, claro, mas ao menos você poderia nos enviar os arquivos de suas esplêndidas postagens, não? Como esta, por exemplo. Que coisa fantástica este CD! O que Pandolfo faz é inacreditável. Ouçam a Sarabanda da Suíte Nº 4 só para começar, apenas como exemplo.
Ah, aviso aos visitantes que o arquivo com o livro do Pandolfo — link furadaço abaixo… –, só com nosso pranteado Vassily
Mas passemos a palavra ao fujão.
ATUALIZAÇÃO DE VASSILY EM 21/8/2018: estimado patrão, prometo voltar em muito breve. Por ora, deixo aqui o link que estava furadaço, mas agora está bem funcionante, para o livreto do Pandolfo.
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Os cellomaníacos que nos acompanham certamente já empunharam seus tomates podres, indignados que estão com o fato de, nas quatro últimas semanas, a série dedicada às maravilhosas Suítes para violoncelo solo de J. S. Bach ter postado versões para contrabaixo, violoncello da spalla e violão, ao passo que seu queridinho espigonado permanece sumido desde a postagem da lancinante Sonata de Kodály.
Enquanto preparo a armadura para minha Tomatina particular, anuncio-lhes com prazer que o Sr. Cello voltará na semana que vem, pois cedeu com muito gosto seu lugar de toda sexta-feira para uma das mais lindas gravações jamais feitas dessas obras-primas: a do mago Paolo Pandolfo em sua viola da gamba.

Há uma longa discussão não só acerca da propriedade de tocar essas suítes na viola da gamba, como também sobre se o violoncelo foi um substituto à altura de sua antepassada menos robusta e ressonante. O próprio Pandolfo escreveu um delicioso diálogo fictício entre a gamba e o violoncelo sobre o assunto, cuja versão em inglês, no que não me é muito típico, eu também disponibilizei para baixar.

Sim, a parada é séria, mesmo.
Deixemos o próprio Pandolfo contar-lhes os paranauês em minha macarrônica tradução do italiano:
“Parte-se do pressuposto de que a prática de transcrever música de um instrumento para outro tenha sido difundidíssima ao longo dos séculos, e que Bach foi frequentemente transcritor de si mesmo, transferindo composições próprias de um conjunto instrumental ao outro. Exemplo iluminante, para não irmos longe, é a própria Suíte no. 5, que existe integralmente em uma versão autógrafa para o alaúde.
Ainda que haja fatores de afinidade entre os instrumentos, para o complexo tema das diferenças e afinidades entre a viola da gamba e o violoncelo não bastaria certamente o pouco espaço concedido ao se prefaciar um CD, por ser longamente exaustivo: qualquer aceno neste sentido seria superficial e insuficiente. Basta dizer que eles são tão aparentemente afins quanto substancialmente diferentes, seja no plano organológico, seja naquele mais amplo e complexo do vocabulário musical que lhes é próprio.
É precisamente sobre este último campo que se desenvolve a justificativa mais forte acerca da elaboração das Seis Suítes para a viola. Tanto a própria forma da suíte quanto o tipo de escrita utilizado por Bach (com a contínua alternância entre monódia e polifonia) são indiscutivelmente elementos profundamente arraigados à viola da gamba e à sua história: mais ainda, pode-se afirmar que esses são elementos mais inerentes à primeira que ao segundo, cujo repertório tem nas Suítes de Bach talvez seu único exemplo num gênero do contrário intimamente entralaçado à história da viola da gamba da metade do século XVII às primeiras décadas do século XVIII.
No processo de elaboração, permiti que o instrumento sugerisse as soluções adequadas a cada momento. Busquei, pois, segui-lo e escutá-lo mais que conduzi-lo a rumos preestabelecidos. Isso determinou variações nada insignificantes, a primeira entre as quais aquela da tonalidade (das seis suítes, duas conservam a original), não obstante outras talvez menos óbvias, ainda que significativas. Assim, novas vozes parecem ornamentadas, ainda que não existissem, ou fossem tão só sugeridas; menos frequentemente, alguma voz desapareceu, para dar espaço à sugestão, à imaginação; em um caso, além de alterar a sonoridade da suíte, lancei mão do artifício da scordatura [alteração da afinação padrão]; para conservar o efeito de bordão, fui obrigado a fazer algumas vezes a transposição de uma oitava.
Em geral, deixei que ressonassem silenciosamente as inumeráveis suítes às quais a viola deu voz no longo curso de sua vida, ainda, e cada vez mais, capaz de falar uma língua antiga que se faz atual.
Paolo Pandolfo
Roma, 2001″
Pandolfo fala de sua viola como se fosse um ser vivo, e quem escutar essa extraordinária gravação não duvidará de que ela o é.
J. S. BACH – THE SIX SUITES
PAOLO PANDOLFO – VIOLA DA GAMBA
Johann Sebastian BACH (1685-1750)
Seis Suítes para violoncelo solo, transcritas para viola da gamba
DISCO 1
Suíte no. 1 em Sol maior, BWV 1007 (transposta para Dó maior)
01 – Prélude
02 – Allemande
03 – Courante
04 – Sarabande
05 – Menuets I & II
06 – Gigue
Suíte no. 3 em Dó maior, BWV 1009 (transposta para Fá maior)
07 – Prélude
08 – Allemande
09 – Courante
10 – Sarabande
11 – Bourrées I & II
12 – Gigue
Suíte no.5 em Dó menor, BWV 1011 (transposta para Ré menor)
13 – Prélude
14 – Allemande
15 – Courante
16 – Sarabande
17 – Gavottes I & II
18 – Gigue
DISCO 2
Suíte no. 2 em Ré menor, BWV 1008
01 – Prélude
02 – Allemande
03 – Courante
04 – Sarabande
05 – Menuets I & II
06 – Gigue
Suíte no. 4 em Mi bemol maior, BWV 1010 (transposta para Sol maior)
07 – Prélude
08 – Allemande
09 – Courante
10 – Sarabande
11 – Bourrées I & II
12 – Gigue
Suíte no. 6 em Ré maior, BWV 1012
13 – Prélude
14 – Allemande
15 – Courante
16 – Sarabande
17 – Gavottes I & II
18 – Gigue
Paolo Pandolfo, viola da gamba e transcrições
BÔNUS: “Um Livro Antigo – Um Diálogo Imaginário entre um Cello e uma Viola”, por Paolo Pandolfo (em inglês)

Vassily Genrikhovich


Publicado originalmente por Vassily em 11/12/2015, links restaurados por Pleyel em 8/8/2018 e, novamente, por Vassily em 17/1/2021.






Sumido ando e sumido manter-me-ei se o reproche que vier para esta publicação conseguir lamber os garrões daquele, monstruoso, que para ela prevejo.

PUBLICADA ORIGINALMENTE EM 24/7/2015




