
Após estreia de “Les Vêpres siciliennes” – Paris, junho/1855, Verdi e Giuseppina permaneceram mais seis meses na França, viajando às termas de “Enghien-les-Bains”… Período de repouso, após contratempos que envolveram sua ópera francesa…
E de volta à Parma, reassumiam as lidas em “Sant’Agata”: “abandono total da música, um pouco de leitura e ocupações leves, com agricultura e cavalos”, escreveu Verdi a um amigo… Mas, em pouco tempo, tudo mudou. Convites de Veneza, Paris, Nápoles e Rimini demandaram nova ópera, “Simon Boccanegra”; música de ballet para produção francesa de “Il Trovatore” e revisão do libreto de “Rei Lear”; além do “rifacimento de Stiffelio”…
E se a índole para o trágico era traço marcante, a partir de “Rigoletto” aflorou fluente melodismo, de imenso apelo emotivo e reconhecimento de músicos consagrados, como Gioachino Rossini, que externou sua franca admiração a Verdi: “artista que se renovava e diferenciava no cenário europeu!”
“Simon Boccanegra” combina política, pelo nacionalismo e ideais do “risorgimento”, com afetos e perdas pessoais muito dolorosas, ou sejam, da amada morta e do desaparecimento da filha. Sentimentos muito caros a Verdi, que, invariavelmente, o levavam às lágrimas, sobretudo, memória da filha – Verdi perdera a família, quando jovem, esposa e dois filhos, num lapso de dois anos… E o tema histórico resgatava divergências entre nobres e plebeus, na Gênova do sec. XIV; sinalizando à união e fortalecimento dos sentimentos fraternos, no lugar dos ódios e ressentimentos…

Em “Simon Boccanegra”, Verdi afastou-se da forma tradicional – dos números encadeados, optando pela melodia contínua… Tema de escolha pessoal e do mesmo dramaturgo de “Il Trovatore”, o espanhol Garcia Gutiérrez, foi pontuado por música densa e sombria, pelas vozes graves e tons pessimistas; pela amargura dos protagonistas: Fiesco e Boccanegra… No entanto, final é sublimado pelo amor de dois jovens, Amélia e Gabriele, que simbolizam a esperança e perspectiva de melhores dias – através da transigência e do perdão; da concórdia e da aceitação do outro…
E o libreto, criado por Francesco Piave; alterado por Giuseppe Montanelli; e, mais tarde, revisado por Arrigo Boito, resultou, por fim, na versão de 1881, com a grande cena da “Câmara do Conselho” – música da maturidade de Verdi, escrita após “Aída” e a grande “Messa da Requiem”, portanto, preparando caminho para as últimas obras-primas: “Otello” e “Falstaff”, que constituíram últimas e contundentes contribuições, quando o músico era atacado pela jovem vanguarda italiana…
Entre os grandes trabalhos de Verdi, “Simon Boccanegra” obteve receptividade da crítica, embora reação comedida do público, talvez, decorrente da densidade e caráter introspectivo do drama: “da música que não produz efeito imediato”, escreveu crítico veneziano… “elaborada com sofisticada habilidade, demanda concentração, assimilação e aprofundamento”…

Motivações
Após dois anos e meio na França, para composição de “Les Vêpres siciliennes”, estreia em junho/55; e mais 6 meses de descanso em “Enghien-les-Bains”, norte de Paris, Verdi, de volta à “Sant’Agata”, relatou ao amigo De Sanctis: “Aqui, meus negócios reduziram-se à quase nada. Com abandono total da música, reservo tempo para leitura e ocupações leves, com agricultura e cavalos…”
E foi à Parma, assistir “I Puritani”, de Bellini. Também sugerir, ao ducado, participação em tratado internacional sobre direitos autorais, que reunia Inglaterra, França e Piemonte… Intransigente em questões nacionais, em Londres, havia recusado outra cidadania para obter benefícios, que não fosse a “parmigiana”: “Quero permanecer o que sou, vale dizer, um camponês de ‘Le Roncole’. E prefiro pedir ao governo de ‘Parma’ que faça um acordo com a Inglaterra”…

Também recebeu nova honraria da Sardenha-Piemonte: “Cavaleiro da Ordem de São Maurício e São Lázaro”… Victor-Emanuelle e seu obstinado reino não esmoreciam. Pelo contrário, seguiam em preparativos, através da organização econômica e da política externa de Cavour, na perspectiva da unificação e dos ideais do “risorgimento” – após derrota na “1ª guerra de independência”, marcada pelo simbólico “Levante de Milão”, de 1848…
E desde “Luiza Miller”, com estreia em Nápoles, 1849, Verdi aprimorava caracteres dramáticos e musicais dos personagens. De um lado, renovava a ópera, como drama lírico-musical; e de outro, reverenciava a tradição. Neste sentido, escreveu ao amigo Arrivabene, citando ‘Fígaro’, do “Barbeiro de Seviglia”, de Rossini: “não se trata de melodia ou harmonia, mas de palavra declamada, exata e verdadeira – isto é música!”

E certa ocasião, em Paris, o escritor Marc Monnier relatou curioso encontro, no “Théâtre-Italien”, em récita de “Otello”, de Rossini: “Verdi evitava o centro do foyer, reservado às celebridades, ficando à parte, absorvido em pensamentos. Então, indaguei-lhe sobre a ópera de Rossini, ao que comentou sobre Shakespeare”… Distante e ensimesmado, evitou opinar sobre a música de Rossini e, há tempo, dedicava-se ao libreto de “Rei Lear”, com o dramaturgo Antonio Somma, o que ainda lhe ocupava a mente e aguardava música… Também, o drama de “Otello” lhe causava profunda impressão, vindo, mais tarde, transformar-se em ópera monumental…

Então, Verdi viajou à Veneza, março de 1856, para acompanhar montagem de “La Traviata”, novamente encenada no teatro “La Fenice” e notável sucesso, após fracasso inicial… E escreveu ao poeta Francesco Piave da intensão de revisar “Stiffelio”… Também, ao amigo e empresario De Sanctis: “de minhas óperas ‘fora de circulação’, algumas, entendo, devo esquecê-las, pelos temas equivocados. Mas, há duas que não gostaria: ‘Stiffelio’ e ‘La battaglia de Legnano”…
Em resposta, Piave sugeriu montar “I Vespri siciliani” em Veneza, ao que Verdi concordou, mas em conjunto à revisão de “Stiffelio”. A proposta não se efetivou, mas revisão de “Stiffelio” sim e foi destinada à inauguração do novo “Teatro de Rimini”, em 1857…
E tal como em “La Traviata”, Verdi convidou Piave a instalar-se em “Sant’Agata” e agilizarem o trabalho, no lugar da tradicional troca de correspondência… E escreveu: “Venha rápido e, se puder, traga um ‘leone’, o que deixará Peppina encantada…” (gíria para cão ‘poodle’, presente à Giuseppina)… No entanto, Piave trouxe um “terrier maltês”, apelidado “loulou”, que logo se tornou membro da família e direito a retrato emoldurado…

Neste ínterim, surgiu outro tema: “Simon Boccanegra”, do dramaturgo espanhol, Antonio García Gutiérrez, mesmo autor de “Il Trovatore”, que ensejou nova ópera, também com libreto de Piave e montagem no teatro “La Fenice”, de Veneza…
“Simon Boccanegra”
A elaboração de “Simon Boccanegra” foi rápida e durante “rifacimento de Stiffelio”, que ao contrário da expectativa de Verdi, avançava lentamente, desde adaptação do contexto histórico até nova música para o último ato… Daí, numerar-se os “rifacimento” de Verdi como novas óperas, dado extensão e complexidade do trabalho – caso de “Jérusalem”, em relação à “I Lombardi”…

“Simon Boccanegra” realizou-se em meio a viagens, pois Verdi e Giuseppina decidiram por novo período de descanso: aproveitar o verão e o mar do Lido, em Veneza, por recomendação médica à esposa… E antes de partirem, Verdi propôs a Piave o novo tema, para elaboração de esboço e avaliação dos censores de Veneza. Assim, davam início ao trabalho e convite do teatro “La Fenice”…
De Veneza, o casal seguiu viagem à França, para venda de imóvel adquirido por Verdi, em 1848, quando iniciaram relacionamento afetivo… Também, mover ação contra empresário que pretendia encenar “Rigoletto” e “La Traviata” a partir de edições clandestinas espanholas – no entanto, perderam o caso, dado a fragilidade da legislação autoral… Para tanto, instalaram-se novamente nas termas de “Enghien-les-Bains”, norte de Paris…

E Piave, motivado, mas se excedendo, pretendeu elaboração de sinopse completa de “Simon Boccanegra”. Ao que Verdi, impaciente, logo advertiu: “de que adianta terminar a história antes do final do mês? Será que a polícia e direção do teatro não tem esboço suficientemente detalhado? Que importa se está em prosa, ou em verso?… Como você bem observou, este ‘Simon’ tem algo de original. E portanto, libreto, números e tudo mais, devem ser tão originais, quanto possível… O que não pode ser feito, sem que nos reunamos…”
Temática absorveu tanto, que Verdi, ansioso e obstinado, decidiu solicitar alterações do libreto a Giuseppe Montanelli, escritor e revolucionário toscano, exilado na França… E o processo foi tão rápido, que, ao retornar à Parma, tinha a ópera praticamente concluída. Convite a Montanelli, no entanto, gerou desconforto com Piave que, por fim, concordou em assinar o libreto…

Impasse com “Rei Lear”… “Le Trouvère”, em Paris
E Verdi, que decidira nunca mais escrever para Nápoles, após atropelos na estreia de “Luisa Miller”, sua 15ª ópera, reavaliou posição e considerou novo contrato com teatro “San Carlo”. Intensão era colocar música em “Rei Lear”, cujo libreto estava avançado. Para isto, retomou diálogo com Antonio Somma: “não estou convencido do 4º ato… E sei, não se deve impor tantos recitativos ao público… Não por simples capricho do compositor… Musicaria até um jornal ou carta, mas no teatro não funciona… Não estou seguro, algo não satisfaz… Por certo, falta brevidade e, talvez, maior clareza ou verdade”…
Também escreveu ao teatro napolitano, sobre características das vozes solistas: “barítono, especialmente bom, para ‘Lear’; soprano não dramático, mas expressivo, para ‘Cordélia’; bom contralto para o bobo; dois ótimos intérpretes secundários; e um tenor dramático…” Verdi tinha em mente o soprano Maria Piccolomini, de 24 anos, sucesso em Londres, em “La Traviata”, que aceitou o convite… Mas, diretoria do “San Carlo” não fechou contrato… E propuseram Rosina Penco, que Verdi admirava, mas não julgava apropriada para “Cordélia”…

E por falta de consenso, “Rei Lear” foi novamente adiada, sendo projeto que nunca efetivou-se: colocar música no drama shakespeariano… E Verdi passou a cogitar outro tema para Nápoles… Em Paris, trabalhava na composição de “Simon Boccanegra”, já destinada à Veneza… E outros convites surgiram. Então, assinou contrato para produção francesa de “Il Trovatore”, agregando música de “ballet” ao 3º ato, conforme tradição da “Grand Opéra”… E “Le Trouvère” estreou no “Opéra”, em 12/01/1857… No dia seguinte, Verdi e Giuseppina retornaram à “Sant’ Agata”, com a música de “Simon Boccanegra”, praticamente, concluída…
Para o músico, que escrevera ao amigo De Sanctis sobre “ocupações leves com agricultura e cavalos”, quem sabe, revisão de óperas anteriores, em pouco tempo, tinha escrito uma nova ópera – “Simon Boccanegra”; música de ballet para “Il Trovatore”, discutido libreto de “Rei Lear”, com Antonio Somma e preparava “rifacimento de Stiffelio”, que resultou em “Aroldo”, sua 22ª ópera…
A produção de “Le Trouvère” contou com Pauline Guéymard-Lauters, cantora belga que brilhou na Paris do séc. XIX… De grande extensão vocal, soprano e mezzo, Pauline atuou em “Don Giovanni”, de Mozart; “Der Freischutz”, de Weber; “Les Huguenots”, de Meyerbeer, e outras… Então, convidada para “Le Trouvère”, interpretou ‘Léonore’; e mais tarde, 1867, fez a ‘Princesa de Eboli’, em “Don Carlo”, outra ópera francesa, de Verdi…

Convite do “Opéra” veio de François-Louis Crosnier, hábil diretor da sala, que havia coordenado estreia de “Les Vêpres siciliennes” e contornado diversos percalços… Entre eles, inusual fuga da prima dona e ruptura contratual, reivindicada por Verdi… Assim, o músico concordou na versão francesa, aproveitando tradução realizada por Émilien Pacini e apresentada no teatro “La Monnaie”, de Bruxelas, 1856… Verdi decidiu rápido, sobretudo, porque estava incomodado, por questões autorais, com Toribio Calzado, diretor do “Théâtre des Italiens” – celeuma sobre edições clandestinas espanholas, de “Rigoletto” e “La Traviata”…
Peculiaridades da música de ballet de Verdi tem sido observadas por musicólogos. Alguns, comparando-a ao fluente melodismo de Tchaikowsky – livres comparações, mas que remetem à qualidade… E os ballets, sobretudo em “Jérusalem” e “Aída”, são especialmente cuidados e característicos… Apresentação de “Le Trouvère” ocorreu na “Salle Le Peletier”, à época, “l’Opéra” de Paris, em 12/01/1857. A última récita contou com presenças do Imperador Napoleão III e esposa, dona Eugénie…

Giuseppina Strepponi acompanhou, praticamente, toda a trajetória de Verdi. Desde sua 1ª ópera, “Oberto, conte di San Bonifacio”, estreada por ela, quando conheceu o jovem músico – Milão, 1839… Depois, cantou obra maior, “Nabucco”, sua 3ª ópera, que marcou nacionalismo de Verdi e adoção, pelo público italiano, como símbolo do “risorgimento”… E agora, testemunhava nova fase, de lirismo, originalidade e melodismo transbordantes; fase de plena criatividade e maturidade. E muito ainda viria, até “Don Carlo”, “Aída”, “Otello” e “Falstaff”, além da monumental “Messa da Requiem”…

Vida no campo e afeto pelos animais
Em contraste à vida cosmopolita de compositor de óperas – Europa do sec. XIX, Verdi era afeito ao meio rural, sempre retornando à tranquilidade de “Sant’ Agata”, interior de Parma, Itália… Algo mais difícil para Giuseppina, objeto de preconceito e maus tratos pela comunidade local – Giuseppina e Giuseppe não eram casados… O afeto pelos animais, no entanto, era permanente e, quem sabe, atenuante…
E Giuseppina encantou-se com encomenda de Verdi, a Piave: “meu ‘loulou’ branco é o mais lindo e sortudo cão. Aqui, governa a todos; e todos lhe obedecem…” Também Verdi apegou-se ao bichinho, conforme registro do cartunista Melchiore Delfico… E o carinho foi tão grande, que, vindo a falecer, “loulou” ganhou lápide em “Sant’ Agata”: “À memória de um de meus amigos mais fiéis”, colocou Verdi…

Naquele ambiente bucólico e interiorano, “loulou” incorporou-se à variedade local, que além de equinos e bovinos, incluía pavões, gatos, papagaios, faisões e galinhas… Com destaques para o irreverente “lorito” e os festivos “blach”, “yvette” e “moschino”, ativos cães “mastin”, acostumados às lidas do campo…
E digna de nota, foi intensa e bem humorada correspondência, em mais de 200 cartas, trocadas entre “blach” e “ron-ron”, cão do dileto amigo e editor, conde Oppradino Arrivabene… E não raro, “blach” confidenciava a “ron-ron” séria suspeita da sanidade mental do estranho secretário – espécie de ‘mordomo factotun’, cujo hábito era “desenhar centenas, quem sabe, milhares de ganchos em folhas papel”…
Através das cartas, cheias de ironia e simulações entre dois cães, Verdi conversava com Arrivabene, ambos do salão da condessa Clara Maffei, amiga, intelectual e ativista milanesa do “risorgimento”… Nelas, por vezes, o saudoso “blach” solicitava presença de “ron-ron” em “Sant’Agata”: “Amado irmão”… “você está tão errado em não me visitar, pois sempre o receberei com patas e mandíbulas abertas, além da ternura que só um cão pode oferecer!”

E noutras, mais ríspido, queixava-se: “por aqui, temos número bastante grande de imbecis, aos quais, volta e meia, batemos com as patas, para tentar colocá-los na linha”… E veja, “o maior deles, sem dúvida, é o ‘mordomo factotun’, que se continuar a rabiscar aqueles ganchos em folhas de papel, vou inscrevê-lo, definitivamente, numa ‘lista de loucos!”… (evidentemente, o suposto ‘mordono factotun’ era o próprio Verdi, falando de si mesmo através de ‘blach’…).
Ao longo dos anos, o afeto pelos cães acompanhou a família. E mais tarde, Verdi lamentou evelhecimento e debilidade de “blach”: “Meu pobre ‘blach’ está doente… mal se move e não viverá muito… Inevitavelmente, encomendei outro em Bologna, pois se ocorrer de escrever outro ‘Don Carlo’, não o farei sem colaborador desta espécie”… E, por fim, disse: “blach’ está morto!! De velho, sim, mas feliz demais (excesso de ‘macaroons’, talvez?…)” ‘Macaroons’ eram doces à base de coco ralado, claras de ovos, baunilha e açúcar…

Salão de Clara Maffei – Milão
No centro de Milão, sec. XIX, casal de nobres, Clara e Andrea Maffei, amigos de Verdi e Giuseppina, movimentaram importante salão literário, reunindo artistas, intelectuais e, sobretudo, ativistas do nacionalismo milanês e do “risorgimento”… Com libreto de Andrea Maffei, Verdi compôs “I Masnadieri”, sobre texto de Schiller, sua 11ª ópera; além de revisarem “Macbeth”, sua 10ª ópera. E com Clara Maffei, prestigiada escritora, jornalista e tradutora, manteve intensa correspondência – em mais de 600 cartas…

O salão de Clara reunia notáveis dramaturgos e artistas românticos, como Alessandro Manzzoni, Franz Liszt, Giovani Prati e, conta-se, Honoré de Balzac frequentou e dedicou-lhe “La fausse maitresse”, além de presenteá-la com textos originais… Entre os convidados mais próximos de Verdi, estavam Oppradino Arrivabene, Luciano Manara, Giulio Carcano e Francesco Hayez…
Ironicamente, o notável salão foi meio de compensar frustrações no casamento, oportunizando à Clara, vida social, intelectual e política… E a continuidade da crise, somada às divergências ideológicas, por fim, levaram o casal Maffei à separação… Da qual, Giuseppe Verdi e Giulio Carcano compareceram, oficialmente, como testemunhas…

E com passar do tempo, Clara aproximou-se afetivamente do escritor, jornalista e revolucionário, Carlo Tenca, apresentado por Verdi… Tenca defendia os ideais de Cavour e projeto da Sardenha-Piemonte, como líder da unificação. De outro, divergia de Giuseppe Mazzini, outro líder no âmbito do “risorgimento”, levando alguns ativistas afastarem-se do salão… Também dirigiu a “rivista Europea” e fundou o semanário “Il Crepuscolo”. Com a unificação e a nova ordem institucional, foi eleito para o parlamento milanês, priorizando projetos para educação…
Opositora ferrenha da presença austríaca e atuante no “levante de Milão”, de 1848, Clara integrou grupo de 50 mulheres que cuidaram dos feridos… Posteriormente, na retomada pelos austríacos e sob ameaça de prisão, exilou-se na Suiça… E em 1859, após nova campanha do “risorgimento” – “2ª guerra de independência”, com decisivo e exitoso apoio da França, retornou à Milão… Então, instaurava-se a monarquia italiana, com Victor-Emanuelle, da Sardenha-Piemonte, na regência; e através das ações militares de Garibaldi, gradualmente, consolidava-se a unificação…

Muitas mulheres, entre escritoras, jornalistas e poetisas destacaram-se no movimento revolucionário. Entre elas, Maria Giuseppa Guacci e Laura Beatrice Mancini, quando o Salão Maffei tornou-se sede militar e hospital… Também, a obstinada Cristina Trivulzio di Belgiojoso – “mulher de cinco vidas” – e a jornalista americana Margaret Fuller, atuaram intensamente, além de inúmeras heroínas anônimas…
E na “1ª guerra de independência”, a brasileira Anita Garibaldi lutou na tomada de Roma, quando os revolucionários expulsaram o papa Pio IX, obrigando-o a refugiar-se na Sicilia. Anita morreu grávida, na retirada das tropas, após derrotas de Garibaldi e Mazzini para austríacos, franceses e espanhois, que vieram em apoio do papa – pelos acordos firmados no “Congresso de Viena”, de 1815, após queda de Napoleão… Durante aquela efêmera república, Verdi se fez presente e estreou “La Battaglia di Legnano”, sua 14ª ópera, especialmente composta para Roma, em meio ao entusiasmo vigente, 1849…
Por fim, no 31/12/1859, após expulsão definitiva dos austríacos da Lombardia, realizou-se em Milão entusiástica e memorável celebração: “Feliz ano novo da redenção italiana! Viva Itália!”

E novos ares sopraram na península – “scapigliatura”… A partir de 1860, Clara retomou seu salão literário e passou a receber os “scapigliati” (livre tradução para “boêmios ou desalinhados”) – nova intelectualidade milanesa, entre eles, Arrigo Boito, aos quais chamava “meus queridos filhos”, que durou até cerca de 1880… Curiosamente, uma geração extremamente crítica do romantismo em voga, a que chamavam: “do conservadorismo lânguido e artificial; do provincianismo do ‘risorgimento’ e dos homens do passado”…

Embora lutado junto aos “camisas vermelhas”, de Garibaldi, “scapigliati” defendiam renovação imediata da cultura italiana, quando ainda se consolidavam a unificação e a nova monarquia, então, resultantes de sacrifícios e esforços inauditos… Tal acolhimento à vanguarda trouxe desconfortos a Clara, que valorizou o debate com jovens intelectuais, pelos liberalismo e perspectiva futura, mesmo em detrimento do que representaram os incansáveis patriotas do “risorgimento”, em suas obstinação e heroismo…

O movimento se espelhava em ETA Hoffmann, Jean Paul, Heine, Allan Poe e, sobretudo, Baudelaire. E foi precursor dos naturalismo, simbolismo e do decadentismo de Gabrieli D’Annunzio, com atenções ao patológico, ao macabro e ao deformado… Outra ala, “scapigliatura democratica”, foi precursora dos movimentos anarquistas e socialistas italianos. Sem manifesto formal, o movimento se expandia por concepções afins ou semelhantes, através das obras publicadas…
Complexo e diversificado no âmbito do comportamento, os “scapigliati” cultivavam liberdade, desregramentos e uso de substâncias, que não raro levavam às depressões e suicídios; além do abandono, doenças e mortes precoces… Mais tarde, entre seus jovens artistas, Giacomo Puccini filiou-se, estimulado por Arrigo Boito, contribuindo com as óperas “Le Villi” e “Edgar”; e depois, retratando o movimento em “La Bohème”…

Abertos à influência externa, os “scapigliati” introduziram as óperas de Wagner, na Itália, dirigidas por Franco Faccio. Esteticamente, rejeitaram Verdi e depois foram rejeitados pelos “veristas”, que priorizavam os personagens comuns, da pequena burguesia e da pobreza; do realismo de seus dramas e paixões, em geral, marcados pelas impulsividade, rusticidade e violência; no lugar das temáticas históricas e míticas…
Apesar ou por ser artista proeminente, sem nenhuma condescendência, Verdi foi exposto à “fritura artística”, como ícone da velha cultura, a ser esquecida e superada… Mais tarde, no entanto, o músico “deu o troco” e surpreendeu a todos, colocando a “vanguarda em apuros” – haviam subestimado, de forma apressada, o velho mestre…
E coube a Arrigo Boito, de um lado, perceber o equívoco; e à perspicácia de Verdi, de outro, em aguardar… E gradual aproximação ocorreu entre ambos, através do editor Giulio Riccordi e do maestro Franco Faccio. Inicialmente, pela revisão de “Simon Boccanegra” e, depois, pelas composições de “Otello” e “Falstaff”, comprovando-se o dito: “más sabe el diablo por viejo, que por diablo”…

Açodamentos entre Verdi e Piave…
A música de “Simon Boccanegra” foi praticamente concluída em Paris… E para adaptações do libreto, Verdi pediu a Giuseppe Montanelli, nacionalista toscano exilado, realizar alterações consideráveis. Então, escreveu à Piave: “Eis o libreto, abreviado e alterado… Você pode assiná-lo ou não, como lhe aprouver… Se sentir-se perturbado, também eu me encontro e, talvez, mais do que você, mas tudo que posso dizer é: foi uma necessidade!”

Montanelli, advogado e escritor, atuou na revista florentina “Antologia” e fundou o jornal “L’Italia”, que pregava “reforma da nacionalidade”… Revolucionário toscano, lutou e foi preso pelos austríacos nos levantes de 1848… Libertado em 1849, voltou a conspirar, formando, com Mazzini e Guerrazi, novo governo provisório – “triúnvirus da Toscana”, aliado da recente república romana, proclamada por Mazzini e Garibaldi… Todos, movimentos reprimidos por austríacos, franceses e espanhóis, em apoio ao papa Pio IX, na malograda “1ª guerra de independência”. Então, Montanelli exilou-se na França, apoiou autogolpe de Napoleão III e colaborou com Verdi no libreto de “Simon Boccanegra”…
Por seu lado, Verdi tornara-se símbolo do “risorgimento”, pela adesão política e popularidade de suas óperas… Sobretudo nos coros, como dos escravos hebreus, em “Nabucco”, exortava: “Va, piensero, sull’ali dorate… Oh, mia patria, si bella e perduta!” (“Voa, pensamento, em asas douradas… Oh, minha pátria, tão bela e perdida!”). Versos de Temistocle Solera eternizados na música de Verdi, que acalentavam sonhos de liberdade, cantados nos teatros e pelas ruas da Itália… Em 1859, novo e definitivo levante foi deflagrado, com apoios de França e Prússia, mudando definitivamente mapa político da península e conquistando a almejada unificação…

Evidentemente, a revisão de Montannelli causou desconfortos a Piave. Mas, dado a velha parceria e temperamento afável, Piave, por fim, assinou o libreto. Em fevereiro/1857, viajaram à Veneza. E Piave fora encarregado da produção e efeitos cênicos. Mas, não bastando revisão do libreto, à sua revelia, foi novamente atropelado por Verdi, que desenvolvera concepções próprias, enquanto compunha a música… E detalhou série de observações sobre cenários, iluminação e movimentos dos personagens, ignorando Piave, a quem restou, novamente, acatar…

Possivelmente, o afastamento imposto por Verdi, em Paris, durante a composição, impediu o libretista de acompanhar processo criativo, concepção dramática e natural troca de impressões… Após estreia, no entanto, Piave voltou a revisar o libreto a pedido de Verdi, que seguia insatisfeito… A ópera foi encenada em 12/03/1857, no “La Fenice”. E o teatro veneziano tornou-se palco de mais uma importante estreia verdiana, junto com “Rigoletto” e “La Traviata”, que também tiveram libretos de Piave…
Nascido em Murano, Piave compartilhou os ideais do “risorgimento”. E nos levantes de 1848, pegou em armas e lutou em Veneza, de onde informava o eufórico Verdi, que exclamava: “Cidadão Piave!!” Como libretista, colaborou com Giovani Pacini, Federico Ricci, Saverio Mercadante e outros… Além de poeta e libretista, foi jornalista e tradutor; também, diretor de palco do teatro “La Fenice” e, mais tarde, do teatro “alla Scala”, por indicação de Verdi… Personalidade flexível e conciliadora, ao contrário de Verdi, foi habilidoso negociador em tratativas com teatros e censores…
Mais tarde, Verdi convidou Piave para libreto de “Aída”, mas acometido por derrame, este ficou paralisado e impedido de falar… Nesta fase, Verdi ajudou na manutenção da família e, por fim, arcou com funeral, quando do falecimento do poeta, aos 65 anos… Quanto ao ativismo no “risorgimento”, Verdi não pegou em armas, mas empenhou-se, política e diplomaticamente, pelo apoio da França, além do fomento do sentimento nacional, através do simbolismo – poderoso e unificador – da música…
Amigos e parceiros antigos, Verdi acostumou-se com temperamento resiliente e submisso de Piave. Então, frequentemente, se excedia… E com Piave, praticamente, parte dos “móveis e utensílios de Sant’Agata”, foram escritas ou revisadas dez óperas: “Ernani”, “I due Foscari” e “Macbeth”, com revisão de Andrea Maffei; “Il Corsaro”, “Stiffelio”, “Rigoletto” e “La traviata”; “Simon Boccanegra”, com alterações de Montanelli e, mais tarde, de Arrigo Boito; “Aroldo” – “rifacimento de Stiffelio”; e por fim, “La forza del Destino”… Por conta disso, Piave foi libretista de imensos sucessos e quem mais colaborou com Verdi…

Estreia de “Simon Boccanegra”
Na estreia de “Simon Boccanegra”, 12/03/1857, elenco atuou com galhardia e qualidade, formado pelo barítono Leone Giraldoni, no papel principal; soprano Luigia Bendazzi, como ‘Maria’; tenor Carlo Negrini, como ‘Gabrieli’; e o baixo Giuseppe Echeverria, como ‘Fiesco’. Mas, a ópera não empolgou a plateia, que se manteve atenta, embora, sem rasgos de euforia… E a crítica, da “Gazzetta Privilegiata di Venezia”, escreveu: “Quanto à música é do tipo que não produz efeito imediato… pois, trata-se de música elaborada, escrita com mais sofisticada habilidade, que demanda assimilação e estudo detalhado”…

Assim, percepção foi de pesada e soturna concepção musical, com ausências de variedade e brilho… O que era, precisamente, intenção de Verdi, ao propor extremas densidade e circunspecção… Também, a crítica registrou: “manifestações desabonadoras foram de estrangeiros, não da plateia veneziana…” E suspeitou-se de claque organizada contra Verdi – muito característica do ambiente competitivo e desleal dos teatros de ópera do sec. XIX, ao que Verdi, em geral, respondia com surpreendente criatividade….
Mas, ignorando tais suspeitas, Verdi deteve-se em algo que pensara do fracasso inicial de “La Traviata”, ao escrever a Vicenzo Torelli: “Pensei ter composto algo razoavelmente bom, mas aparentemente estava enganado… Veremos, com passar do tempo, quem errou…” E pior, sobraram para Piave as críticas ao libreto, então modificado, à sua revelia, por Verdi e Montanelli….
Também circulou boato que Verdi teria escrito o libreto, deixando-o bastante irritado e confuso… E Verdi, de forma aleatória, suspeitou de Piave, cobrando do libretista, que tentou defender-se… Então, sentindo-se injusto, escreveu a Cesare Vigna: “será que os venezianos já se acalmaram? Quem poderia imaginar, esta pobre ‘Boccanegra’ provocar confusão dos diabos?… Boato de que escrevi o libreto é o fim!!… (mas, Verdi piora as coisas) … libreto que traz nome de Piave já se julga, previamente, como a pior poesia possível. Quisera eu escrever versos tão bons como ‘viene a mirar la cerula…’ ou …’delle faci jastanti al barlume’… Confesso, em minha ignorância, não seria capaz de fazê-los…”

Em “Simon Boccanegra”, o músico afastou-se da forma tradicional – dos números encadeados, preferindo a melodia contínua… A ópera é marcada pelos tons escuros e pessimistas, pela amargura dos personagens, apesar do final alentador, da união de Amélia e Gabriele… E, de volta à “Sant’ Agata”, seguia insatisfeito, mas aproveitou os dias ensolarados para caminhar pelos campos e bosques; também interagir com campesinos e animais, sempre aludindo “aos de quatro patas” serem os melhores companheiros…
E novamente chamou Piave, que retornou à “Sant’ Agata” para revisão de “Simon Boccanegra”. Também concordou em montar e dirigir a ópera em Reggio Emilia, onde obteve sucesso e adquiriu maior confiança; o mesmo sucedendo em Nápoles, no ano seguinte, 1858… Mas, na montagem de Milão, outro fracasso…
Verdi e o teatro “alla Scala” – Milão
Famoso teatro milanês foi palco da estreia do jovem Verdi, aos 26 anos. Também, de grande entusiasmo nas estreias de “Nabucco” e “I Lombardi”… Mas, da 2ª ópera, comédia “Un giorno di Regno”, Verdi guardou profunda mágoa. Não pela falta de receptividade, pois a considerava trabalho menor; mas porque era sabido, pela imprensa e por todos, da tragédia em sua vida pessoal…

Verdi perdera dois filhos e a esposa, num lapso de dois anos… Esperava, pelo menos, silêncio respeitoso na estreia de “Un giorno di Regno”, mas o público manifestou-se como sempre, aplaudir ou vaiar ao sabor do que via e ouvia… E “Un giorno di Regno” foi um fracasso. Assim, prudência e distanciamento tornavam-se aconselháveis, diante de tão impessoal e imprevisível comportamento… E da produção de “Simon Boccanegra”, em 1859, Verdi escreveu ao editor Tito Riccordi:
“O fiasco de ‘Boccanegra’, em Milão, tinha de acontecer e aconteceu. Um ‘Boccanegra’ sem ‘Boccanegra’!! Corte a cabeça de um homem e depois reconheça-o, se puder… Você está surpreso com a falta de decoro do público? Eu não estou surpreso, em absoluto. O público sempre fica feliz com um escândalo! Aos 25 anos, tinha ilusões e acreditava na cortesia da platéia; um ano depois, meus olhos se abriram. E percebi com o que tinha de lidar…”.
“As pessoas me fazem rir quando dizem, me repreendendo, que devo muito a esta ou aquela platéia! É verdade, no ‘Scala’, um dia, aplaudiram ‘Nabucco’ e ‘I Lombardi’. Mas, fosse pela orquestra, cantores, coro e produção, as récitas, em sua totalidade, não mereciam aplausos… E pouco mais de um ano antes, a mesma platéia tratou mal a ópera de um jovem pobre e doente, infeliz e com coração partido por terríveis acontecimentos… E todos sabiam, o que não os fez se comportarem com cortesia…”

“Ah, se ao menos o público, naquela ocasião, tivesse, não necessariamente aplaudido, mas tolerado minha ópera em silêncio, não encontraria suficientes palavras de gratidão! Mas, se agora encaram com suas boas graças minhas óperas, que já fizeram a volta ao mundo, então a questão está resolvida. Não os condeno: que sejam severos. Aceito suas vaias, na condição de não ter que pedir seus aplausos!”..

“Nós, pobres ciganos, charlatões ou que quer que sejamos, vendemos nosso trabalho, nossos pensamentos e nossos sonhos, em troca de ouro… Por três liras, o público compra o direito de vaiar ou aplaudir. Nosso destino é a resignação. E isto é tudo! Mas, não importa o que digam meus amigos ou inimigos, ‘Boccanegra’ não é de forma alguma inferior a muitas de minhas óperas e que tiveram melhor sorte: talvez, precisasse de maior cuidado na interpretação e de platéia interessada em ouvi-la… Que coisa triste, o teatro!!”
Este fracasso no “alla Scala” foi acompanhado de outra produção malsucedida, em Florença. Período em que Verdi já se ocupava de sua 23ª ópera, a bela “Un Ballo in Maschera”… E nova estreia de “Simon Boccanegra” ocorreu no “alla Scala”, em 1881, portanto, 24 anos após estreia no “La Fenice”, com revisão de Arrigo Boito e direção de Franco Faccio, então, grande sucesso, com mais dez récitas na temporada – fase em que Verdi era defenestrado pela vanguarda italiana e, ironicamente, em plena maturidade, após criações de “Aída” e da grande “Messa da Requiem”…
Após estreia em Veneza, em 12/03/1857, Verdi dedicou-se, sobretudo, ao “rifacimento de Stiffelio”, denominada “Aroldo”, sua 22ª ópera, então destinada à inauguração do “Teatro Nuovo Comunale”, de Rimini, 16/08/1857… Portanto, duas estreias num único ano e, naquele momento, estava satisfeito com sua própria e bem-sucedida montagem de “Simon Boccanegra”, em Reggio Emilia…

Antonio García Gutiérrez
Nascido em Cadiz, Espanha, no mesmo ano de Verdi – 1813, Antonio María de los Dolores García Gutiérrez estudou medicina, mas optou pelas carreiras de jornalista e escritor, mudando-se para Madrid, onde atuou como tradutor de peças francesas… Então, traduziu obras de Eugène Scribe e Alexandre Dumas, pai. E como dramaturgo, ganhou projeção com “El Trovador”, de 1836, que se transformou na conhecida ópera de Verdi. Posteriormente, também obteve sucesso com “Simon Boccanegra”, de 1843…
Verdi encantou-se com os dramas de Gutiérrez e colocou música nas duas peças… Entre os autores espanhóis do sec. XIX, destacou-se, sobretudo, pelas emoção e caráter de seus personagens femininos; pela preocupação social e exaltado ideário liberal… Também escreveu poemas e comédias – experimentando-se numa versão comédia de “El Trovador”…

E nos chamados “dramas em tese”, discutiu o seu tempo, entre moralidade e costumes… Assim, em “Caminhos Opostos”, concluiu que excessivos rigor ou brandura produziam, igualmente, efeitos danosos na educação… Em “Los desposorios de Inés”, condenou o casamento por arranjo, do sec. XIX; e em “Eclipse Parcial”, posicionou-se contra o divórcio… Por fim, nas peças “A Grain of Sand”, “The Millionaires” e “The Industry Knight”, reiterou: “trapaceiros sempre acabam vítimas de suas próprias armadilhas, sejam pela incongruência dos próprios sentimentos ou pela continuidade no convívio social”….
Apesar do sucesso inicial, dificuldades financeiras levaram Gutiérrez à Cuba e, depois, ao México, onde trabalhou como jornalista, retornando à Espanha em 1850… E de volta, para sua surpresa, em pouco tempo tornou-se amplamente conhecido, graças à ópera de Verdi – “Il Trovatore”, de 1853… Coincidência ou não, a partir daí, recebeu inúmeros cargos e honrarias: “Comendador da Ordem de Carlos III”, 1856; “Supervisor da Dívida Espanhola em Londres”, 1855 – 1856; membro da “Real Academia Espanhola”, 1862; “Cônsul de Espanha em Bayonne e Génova”, 1870 – 1872; e a “Cruz de Isabel II”…

Sem dúvida, o interesse de Verdi projetou Gutiérrez… Sendo também inegável sua extensa produção literária. Posteriormente, ainda publicou uma zarzuela, “El grumete”, 1853; o drama histórico “La Venganza catalana”, de 1864; e “Juan Lorenzo”, ambientado em Valência, em 1865… Por fim, dirigiu o “Museu arqueológico de Madrid”, vindo a falecer aos 71 anos, em 1884…

Personagem histórico – Boccanegra
De influente família, Simon Boccanegra foi rico corsário genovês, sendo eleito “1° doge” de Génova, em 1339, ao suceder os chamados tribunos do povo – “abbati”, então, escolhidos exclusivamente pela nobreza. Com a mudança e ascenção ao poder, Boccanegra sofreu dura oposição das famílias Doria, Spinola, Grimaldi e Fieschi, aliadas do papa. Por fim, obrigado a deixar o poder, 1347, exilou-se em Pisa, onde reorganizou suas forças e regressou nove anos depois, em 1356, restabelecendo a “república genovesa”…
Políticamente, a península itálica dividia-se entre os “guelfi”, partidários do papa; e os “gibelinos”, que preferiam submeter-se ao “Sacro Império Romano Germânico”. Portanto, escolhas por submissão e, quando possíveis, pelo domínio menos opressor… Tal como ocorreu na Sicília, com as “guerras das Vésperas”, que prolongaram-se de 1282 à 1372 – tema de outra ópera de Verdi…
Neste período, Boccanegra recuperou Mônaco, 1357, ao derrotar Carlos Grimaldi, almirante de França; também conquistou a ilha grega de “Chios”; e expulsou os povos tártaros da cidade de “Caffa”, antigo porto e assentamento genovês do mar Negro, península da Criméia… Provavelmente, Boccanegra morreu envenenado, em 1362. A ópera de Verdi, mesclando relações afetivas e familiares fictícias, resgatava o histórico líder genovês no contexto político do “risorgimento”…

Sinopse e libreto de “Simon Boccanegra”
Tema original de Antonio Gutierrez tratava do “1° doge de Gênova” e despertou imediato interesse de Verdi. Libreto e circunstâncias da elaboração, no entanto, trouxeram insatisfação a Verdi. Possivelmente, em decorrência da própria ansiedade do músico, que se encontrava em Paris, quando compunha, e solicitou suporte de outro autor, a revelia de Piave, para agilizar processo criativo…
Até última revisão, 25 anos depois, realizada com Arrigo Boito, Verdi manteve entusiasmo pela ópera. Sobretudo, quando deparou-se com duas cartas, de época, do poeta Francesco Petrarca, dirigidas aos doges de Gênova e Veneza, no sec. XIV. Então, escreveu a Boito:

“Duas cartas magníficas de Petrarca – uma endereçada ao ‘doge Boccanegra’, e outra, ao ‘doge de Veneza’, onde o poeta repreende ambos por se prepararem para uma guerra fratricida, quando eram filhos da mesma mãe – a Itália! Esse sentimento de pátria italiana, naquela época, foi sublime! Claro, tudo isso é político, não dramatúrgico, mas um homem perspicaz poderia adaptar os fatos para o palco…”
E sobre o drama de Gutierrez, a ópera apresenta dois personagens, nobre e plebeu, ricos e poderosos, Fiesco e Boccanegra, perdidos em seus próprios tempo e destino. Boccanegra, ao experimentar realidade que mudava sua existência e aspirações afetivas, apesar do sucesso político; e Fiesco, nobre derrotado politicamente, além de ressentido no âmbito familiar, com Boccanegra. Em torno deles, se desenvolvem demais personagens. Para tanto, Verdi permeou a música em tonalidades graves, da mais intensa e sombria dramaticidade, em notável contribuição à dramaturgia operística e, particularmente, ao repertório de baixo e barítono…
O enredo, um tanto complexo, mesclava personagens históricos com relações afetivas fictícias. E inicia pelo amor impossível, entre Simon Boccanegra, corsário e rico plebeu; com Maria, filha do nobre e arquirrival, Jacopo Fiesco (dito Andrea Grimaldi – nome falso, após expulsão de Gênova). Maria, no entanto, vem a falecer, mas deixa uma filha, que desaparecera misteriosamente…
Em meio à profunda dor, pela morte de Maria, Simon é eleito 1° doge de Gênova. E Fiesco, frustrado pela derrota política dos “guelfi”, cobra de Simon entrega de suposta neta, fruto do “amor impuro”, com Maria. Simon lamenta, pois procurou, incansavelmente, sua filha, mas sem sucesso… Mais tarde, no entanto, caberá a Fiesco, expulso de Gênova por Boccanegra, de forma casual, adotar uma menina, a quem chamou Amélia Grimaldi…

– Os dramas de Gutierrez, tal como em “Il Trovatore”, são marcados por soluções improváveis, como esta surpreendente adoção da neta pelo avô… Também, lapso de 25 anos entre o prólogo e o 1° ato; duplicidades de nomes, como Jacopo Fiesco (Andrea Grimaldi) e Amélia Grimaldi (Maria Boccanegra); e o vilão Lorenzino, personagem oculto, dificultavam compreensão do drama… Mas, para Verdi, cujo fascínio era criar grande música dramática, apesar de situações pouco verossímeis, essencial era pontuar intensidade emotiva das cenas, tais como ensejadas pelas perdas de um pai, impossibilitado de casar-se e de conhecer a filha; e da perspectiva de encontrá-la, mais tarde…
Assim, após alguns anos e vivendo em Gênova, Amélia Grimaldi (Maria Boccanegra) torna-se moça e conhece Gabriele Adorno, nobre genovês, a quem ama. Mas, também é cortejada por Paolo, líder plebeu e amigo dileto de Simon… Por fim, em grande e comovente encontro, Simon e Amélia se reconhecem, como pai e filha, através de retratos da mãe, que ambos carregavam no peito. Momento em que Paolo os observava, à distância, interpretando o afetuoso encontro como um caso amoroso… E de fiel amigo de Simon, mas acossado por ciúmes, passa a odiá-lo e desejar vingança…

Perturbado, Paolo manda sequestrar Amélia, que consegue fugir. E Gabriele Adorno, indignado pelo desaparecimento da amada, mata Lorenzino, o raptor; e passa a suspeitar de Simon, como mandante… Então, Gabriele leva denúncia ao grande conselho e desafia o doge, ameaçando matá-lo… Mas, é impedido por Maria (Amélia), que reaparece e se interpõe entre eles… Simon, por sua vez, passa a desconfiar de Paolo e o amaldiçoa. Paolo se retira, mas não esmorece na sina por vingança. Vai aos aposentos de Simon e coloca veneno num cálice; também propõe a morte de Boccanegra a Andrea Grimaldi (nome falso de Fiesco, quando retornara à Gênova), mas este se recusa…
Por fim, sob efeito do veneno e desfalecendo, Boccanegra se reconcilia com Jacopo Fiesco. Também, são esclarecidas as surpreendentes relações parentais… E ambos, sensibilizados, aprovam casamento de Maria (Amélia) e Gabriele, com indicação de Gabriele para sucessão do doge… Assim, o amor entre dois jovens e suas circunstâncias políticas ensejam a conciliação entre nobres e plebeus, cujos líderes, fragilizados por amarguras e ressentimentos antigos, transigem pelo convívio na diversidade. Com tal florecimento do amor e da concórdia, o desfecho, de certa forma, resgata e legitima o grande amor do passado, entre Maria Fiesco (mãe) e Simon…

– Com final alentador, embora ao custo da morte de Boccanegra, a ópera se inseria no contexto político do “risorgimento”. E, sobretudo, na ária “Plebe! Patrizi! Popolo!” (“Plebeus! Patrícios! Povo!”), evocava os ideais proféticos do poeta Petrarca, a cerca de 500 anos, referidos por Verdi: “qual a razão de tantas guerras fratricidas, quando somos filhos da mesma mãe – a Itália!”
Na última revisão, com Arrigo Boito, ambos, compositor e libretista entenderam a concepção demasiado sombria e intimista. E acrescentaram grande cena da “Câmara do Conselho”, com solistas e coros, em maior contraste às cenas individuais e ensembles. A revisão, no entanto, não logrou uma ópera mais leve ou acessível, embora muitos a considerem melhor. Entre os grandes trabalhos de Verdi, “Simon Boccanegra”, gradualmente, ganhou os palcos do mundo, sendo regularmente encenada…

Libreto
Ação ocorre em Gênova, sec. XIV
- Personagens: Maria Boccanegra (Amélia Grimaldi), filha de Simon e neta de Fiesco (soprano); Gabrieli Adorno, nobre genovês (tenor); Simon Boccanegra, rico plebeu, dodge de Gênova (barítono); Jacopo Fiesco (Andrea Grimaldi), patrício (nobre) genovês e dodge anterior, avô de Maria (baixo); Paolo Albiani, plebeu e ourives, pretendente recusado por Maria (barítono); Pietro, amigo de Paolo e líder dos plebeus (baixo);
- Coros: Conselheiros, marinheiros, artesãos, patrícios (nobres) e povo de Gênova.
Prólogo – Numa praça de Gênova
Sem abertura ou prelúdio, na versão de 1881, após breve introdução orquestral, ensejando a noite, cena abre com reunião política, numa praça de Gênova. Paolo, líder dos plebeus, e Pietro, outro membro influente, discutem próxima eleição do abate (doge). Em recitativo, Paolo defende candidatura de Boccanegra, enquanto Pietro propõe Lorenzino… Canta Paolo, “Che dicesti?… all’onor di primo abate Lorenzino, l’usuriere?…” (“Que disseste? para honorável 1° abate (doge), o usurário?…”) Pietro responde, “Altro proponi di lui più degno!” (“Proponha outro mais digno!”) E Paolo sugere, “Il prode che da’ nostri Mari cacciava l’african pirata!” (“Homem corajoso, que expulsou de nossos mares o pirata africano!”)

E Pietro responde, “Intesi… e il premio?…” (“Entendo… e o prêmio?…”) Então, canta Paolo, “Oro, possanza, onore…” (“Ouro, poder, honra…”) Pietro responde, “Vendo a tal prezzo il popolar favore” (“A tal preço, vendo o favor popular”). E finalizada a negociação, conclui Paolo, com indignação, “Aborriti patrizi! Alle cime ove alberga il vostro orgoglio, disprezzato plebeo, salire io voglio!” (“Abomináveis patrícios. Às alturas, onde habita vosso orgulho, desprezado plebeu ascenderá!”)
Entra Simon Boccanegra. E chamado à reunião, concorda em representar os plebeus contra candidato dos patrícios (nobres)… Cena desenvolve-se em duetto. Canta Simon, “Un amplesso… Che avvenne? Perché qui m’appellasti?” (“Um abraço… que acontece? porque me chamaste?”) Paolo responde, “All’alba eletto esser vuoi nuovo abate?” (“Você quer ser eleito novo abate (doge), ao amanhecer?”) E Simon mostra pouco interesse pelo poder, “Vaneggi?” (“Estás delirando?”)… Então, Paolo pergunta por Maria, filha do nobre Fiesco. Simon responde, “O vittima innocente del funesto amor mio!… Dimmi, di lei che sai? Le favellasti?…” (“Oh! vítima inocente de meu amor maldito! O que você sabe? Falou com ela?…”) Paolo responde, “Prigioniera, geme in quella magion…” (“Prisioneira, sofre naquela mansão…”). “Maria!!”… exclama Simon, dolorosamente…

Então, Paolo retoma assunto da eleição, “Tutto disposi… e sol ti chiedo. Parte ai perigli e alla possanza… in vita e in morte…” (“Tudo está organizado. Exortamos que compartilhes os perigos e o poder… na vida e na morte…”) Simon exita, mas, por fim, concorda, “Sia!”. E para dirigir-se aos apoiadores, Paolo pede que Simon se retire…
E reunidos, Paolo, Pietro, marinheiros e artesãos preparam escolha do candidato, em “All’alba tutti qui verrete?” (“Todos virão aqui ao amanhecer?”). Todos anuem e afirmam estarem prontos para votar em Lorenzino. Mas, Paolo questiona, “Venduto è a’ Fieschi?”… (“Vendido à Fiesco?…”) Coro responde, “Dunque chi fia l’eletto?” (“Então, quem será o escolhido?”) Paolo propõe, “Un prode! Un popolan!” (“Um homem corajoso! Um plebeu!”) E o coro, “Ben dici… ma fra i nostri sai l’uom?” (“Então, diz… quem será o homem?”) E Paolo sugere, “Simon Boccanegra! Sì… il Corsaro all’alto scranno…” (“Simon Boccanegra! Sim… o corsário no acento mais alto…”)
E Paolo se volta para o palácio Fieschi, “Taceranno!” (“Eles se calarão!”) E lembra presença de Maria, na escura e perversa mansão, “Una beltà infelice geme sepolta in quello; Sono i lamenti suoi la sola voce umana…” (“Infeliz beleza geme enterrada nela. Seus lamentos são a única voz humana…”) E o coro reitera, “La bella prigioniera, la misera Maria…” (“A bela prisioneira, triste Maria…”) Paolo canta, “Si schiudon quelle porte solo al patrizio altero, Che ad arte si ravvolge nell’ombre del mistero…” (“Cujas portas são abertas apenas para o arrogante patrício, que habilmente cultiva sombras e mistério…”) E o coro canta, “Par l’antro de’ fantasimi!… O qual terror!…” (“Parece uma caverna de fantasmas… Oh, que terror!…”) E saudando eleição do novo doge, Paolo conclui: “Si caccino i demoni col segno della croce… All’alba!” (“Que os demônios sejam expulsos com o sinal da cruz… ao amanhecer!”). Então, Pietro grita palavras de ordem e exclama, “Simon!!”. E marinheiros e artesãos respondem, “Qui!!”

Então, avista-se tênue luz saindo do palácio. Fiesco se aproxima, em direção à praça… Orquestra inicia sombrio “andante sostenuto” e o nobre lamenta a morte da filha, Maria Fiesco, no recitativo, “A te l’estremo addio, palagio altero, freddo sepolcro dell’angiolo mio!…” (“A ti meu último adeus, orgulhoso palácio, túmulo frio de anjo meu!…”) E depois, na comovente romance, “Il lacerato spirito del mesto genitore…” (“Dilacerado espírito de um triste pai…”) Por trás da cena, ouvem-se mulheres e criados, que lentamente adentram o palco em pungente lamento, “È morta!… È morta!… a lei s’apron le sfere!… Mai più!… mai più non la vedremo in terra!…” (“Está morta! Está morta!… as esfereras se abrem para ela!… Nunca mais!… nunca mais a veremos na terra!…”) E o coro masculino responde, “Miserere!… miserere!…” – momento de grande comoção, pontuado por música fúnebre…

E escolhido candidato, Simon Boccanegra reaparece, exultante e na esperança de casar-se com Maria, ainda ignorando sua morte… Mas, encontra Fiesco e travam amargo diálogo, onde lamentam a perda de Maria e destino de suposta filha com Simon, portanto, neta de Fiesco… Seguem, dramáticos recitativo e duetto. E diante de irreparável perda, Simon implora por misericórdia, mas Fiesco, irredutível, expressa toda sua ira, “Qual cieco fato, a oltraggiarmi ti traea?…” (“Qual destino cego, foste levado a me ultrajar?…”)
E canta Simon, “Sopra l’ali della gloria, strappai serti alla vittoria per l’altare dell’amor!” (“Nas asas da glória, rasguei coroas de flores da vitória pelo altar do amor!”). E Fiesco responde, “Io fea plauso al tuo valore, ma le offese non perdono… Te vedessi asceso in trono…” (“Aplaudo tua coragem, mas tuas ofensas não tem perdão… Vais ascender ao trono…”). E segue, “No! pace non fora, se pria l’un di noi non mora!” (“Não haverá paz, sem que um de nós morra!”). E Simon, em profunda dor pela morte da amada, canta, “Vuoi col sangue mio placarti? (Gli presenta il petto) Qui ferisci!…” (“Queres apaziguar-te com meu sangue? aqui podes me atingir!…”) e mostra o peito a Fiesco….
Mas Fiesco, acossado pela existência de suposta neta, responde: “Assassinarti?!… Ascolta: Se concedermi vorrai linnocente sventurata, che nascea d’impuro amor, Io, che ancor non la mirai, giuro renderla beata e tu avrai perdono allor.” (“Assassinar-te?!… Escuta: se me devolveres a inocente infeliz, que nasceu de amor impuro e que ainda não conheço, juro fazê-la feliz e estarás perdoado”) Simon responde, “Non poss’io! Sorte lei rapi…” (“Não posso! Ela desapareceu…”)

E relata: “Del mar sul lido tra gente ostile crescea nell’ombra quella gentile” (“À beira-mar e em meio hostil, a gentil criança cresceu”)… “Di là una notte varcando, solo dalla mia nave scesi a quel suolo” (“Certa noite, navegando solitário, pisei naquele chão”)… “Corsi alla casa… n’era la porta, serrata, muta!” (“Corri até uma casa, fechada e silenciosa!”)… “Misera, trista, tre giorni pianse, tre giorni errò; scomparve poscia, né fu, più vista… D’allora indarno cercata io l’ho” (“Miserável e triste, por três dias vagueei; mas, a menina desapareceu e nunca mais foi vista… Desde então, a procuro em vão…”). E intransigente, Fiesco reage: “Se il mio desire compir non puoi, pace non puote esser tra noi! Addio, Simone…” (“Se não podes cumprir meu desejo, paz não haverá entre nós! Adeus, Simon…”). E vira as costas…

Atormentado pelo encontro com Fiesco e desejando despedir-se da amada, Simon canta, “Oh de’ Fieschi implacata, orrida razza! E tra cotesti rettili nascea Quella pùra beltà?… Vederla io voglio… Coraggio!” (“Oh! Fieschi, raça implacável e horrível! Como nasceu, desses répteis, beleza tão pura?… Quero vê-la… Coragem!”) Simon vai ao palácio, bate à porta e a encontra aberta, “Nessuno!… qui sempre, silenzio e tenebra…” (“Ninguém!… como sempre, silêncio e escuridão…”). E ao tomar uma lanterna, depara-se com o corpo. E não se contendo, grita: “Maria!… Maria!!”. Ao ouvir Simon, Fiesco vocifera: “L’ora suonò del tuo castigo…” (“A hora de teu castigo chegou…”)
Aterrorizado, Simon deixa o castelo, “È sogno!… Sì, spaventoso, atroce sogno il mio!” (“É sonho!… Sim, um assustador e atroz sonho!”) Ao mesmo tempo, da praça, escutam-se gritos: “Boccanegra!! Boccanegra!!”. Mas, atordoado e delirante, Simon reage: “Eco d’inferno è questo!…” (“Ecos do inferno!…”)… Simon não percebe que fora eleito doge de Gênova!
Chegam Paolo e Pietro, “Doge! il popol t’acclama!” (“Doge! o povo te aclama!”). Mas, sofrendo e confuso, Simon canta, “Via fantasmi! Paolo!… Ah!… una tomba…” (“Fora, fantasmas! Paolo!… Ah… um túmulo…”) Paolo insiste, “Un trono!”. E Fiesco, de outro, lamenta a vitória, “Doge Simon… m’arde l’inferno in petto!…” (“Doge Simon… o inferno queima em meu peito!…”) Enquanto o povo de Gênova exulta: “Viva Simon, del popolo l’eletto!!” (“Viva Simon, escolhido pelo povo!!”) Prólogo se encerra com tal dualidade: de um lado, Simon em profunda dor pela perda de Maria; de outro, regozijo da multidão, que o saúda “1° doge de Gênova!”

1° Ato – Nos jardins do Palácio Grimaldi, em Gênova (25 anos depois…)
Frente ao mar, nos jardins do Palácio Grimaldi e evocando o amanhecer, uma delicada introdução orquestral abre 1° ato. Cena ocorre 25 anos depois e Simon Boccanegra permanecia doge de Gênova, amealhando grande poder. Neste interregno, Fiesco fora banido por atividade subsersiva. E fugira para Pisa, onde adotou falso nome, Andrea Grimaldi… Com este nome, Fiesco retornou à Gênova e trouxe uma filha adotiva, agora jovem mulher, a quem chamou Amélia Grimaldi… Seus filhos, no entanto, seguiam banidos…
Após introdução instrumental, entra a bela Amélia Grimaldi e canta seu amor por Gabriele Adorno, um jovem patrício, na ária “Come in quest’ora bruna, sorridon gli astri e il mare!” (“Nesta hora escura, os astros e o mar sorriem!”). Também reflete sobre a solidão e sua condição de orfã, “Ma gli astri e la marina. Che dicono alla mente dell’orfana meschina?…” (“Mas, e as estrelas e a marina, o que dizem à mente de miserável órfã?…”) Abandonada quando menina, Amélia fora cuidada por uma anciã, que a acolheu. E certa noite, novamente, teve que fugir sem rumo: “La notte atra, crudel, quando la pia morente sclamò: ‘ti guardi il ciel'” (“A noite era alta, cruel, quando a mulher moribunda exclamou: ‘que o céu te proteja”)… Sobrevivente de triste destino, Amélia, de forma casual, fora adotada por Andrea Grimaldi (nome falso de seu avô, Jacopo Fiesco, que desconhecia tal grau de parentesco)…

Então, à distância, ouve-se Gabriele Adorno, que chegava ao palácio, em “Cielo di stelle orbato, di fior vedovo prato, è l’alma senza amor” (“Céu sem estrelas, prado sem flores, são a alma sem amor”). A música se agita e Amélia exulta, “Ciel!… la sua voce!… È desso!… Ei s’avvicina!… oh gioia!… Tutto m’arride l’universo adesso!…” (“Céus!… a voz dele!… se avizinha!… Oh alegria!… Universo inteiro sorri para mim!…”). E iniciam apaixonado dueto, “Anima mia!” (“Alma minha!”)
Apesar do encontro apaixonado e do grande amor entre eles, Amélia tinha outras preocupações. E o duetto evolui para tensão e desconfiança… Amélia percebia presenças e movimentações estranhas no palácio, inclusive a mando do doge Boccanegra, que a deixavam apreensiva e angustiada. E extravasa, “Pavento…” (“Tenho medo…”) “L’arcano tuo conobbi… A me il sepolcro appresti, il patibolo a te!” (“Sei do teu segredo… preparas meu túmulo… e a forca para ti!”). Gabriele, surpreso, canta, “Che pensi?”… (“Que pensas?”)… Amélia continua, “Io amo Andrea qual padre, il sai!” (“Amo Andrea como pai, ele sabe!”) “Pur m’atterrisce… in cupa notte, sotte le tetre volte errar sovente pensosi, irrequieti” (“Mas, me apavora… à noite escura, te vejo muitas vezes vagando sob as abóbodas sombrias, pensativo, irrequieto”). Gabriele indaga, “Chi?…” (“Quem?…”). Amélia segue, “Tu, Andrea, Lorenzin e gli altri…” (“Tu, Andrea, Lorenzino e outros…”)

Num sobressalto, Gabriele pede que Amélia se cale, “Ah, taci… il vento ai tiranni potria recar tai voci! Parlan le mura… un delator s’asconde ad ogni passo…” (“Ah, cala-te… o vento pode levar tuas palavras ao tirano! As paredes falam… espiões se escondem a cada passo…”). E Amélia observa, “Tu tremi?” (“Estás tremendo?”)… E duetto segue em certa resignação. Amélia canta, “Fantasmi dicesti?… vieni a mirar la cerula; Là Genova torreggia sul talamo spumante; là i tuoi nemici imperano, Vincerli indarno speri… ripara i tuoi pensieri al porto dell’amor” (“Fantasmas, disseste?… vem e contempla o azul celeste; Gênova se ergue sobre cintilante câmara nupcial; alí, reinam teus inimigos; em vão, esperas derrotá-los; volta teus pensamentos no porto do amor”) Ao que Gabriele responde, “Angiol che dall’empireo piegasti a terra l’ale; non ricercar dell’odio i funebri misteri; ripara i tuoi pensieri al porto dell’amor” (“Anjo que do empíreo pousaste asas sobre a terra, não te acerques de funestos mistérios; volta teus pensamentos ao porto do amor”)…
Então, percebem chegada de um estranho. Amélia canta, “Vedi quell’uom?… qual ombra, ogni dì appar” (“Vês aquele homem?… como uma sombra, aparece todos os dias”). E um serviçal anuncia, “Del doge, un messaggier di te chiede” (“Mensageiro do doge pergunta sobre Amélia”). Entra Pietro, plebeu e amigo de Paolo – juntos, organizaram eleição do doge, há 25 anos, e canta: “Il Doge, dalle caccie tornando di Savona, questa magion visitar brama!” (“Doge, retornando da caça em Savona, deseja visitar este palácio!”)

Gabriele indaga, “Il Doge qui?”… (“Doge, aqui?”)… Amélia responde, “Mia destra a chieder viene” (“Por minha mão vem perguntar”). Gabriele, “Per chi?”. Amélia, “Pel favorito suo. D’Andrea vola in cerca… T’affretta… va… prepara Il rito nuzial… mi guida all’ara!” (“Pelo seu favorito. Vai em busca de Andrea… Te apressa… vai… cuida do rito nupcial… me guia até o altar!”) Na conclusão do duetto, ritmo se intensifica, em “streta – allegro brilante”, e ambos cantam: “Sì, sì dell’ara il giubilo contrasti il fato avverso!” (“Sim! a alegria do altar contra destino adverso!”) “E tutto l’universo Io sfiderò con te!” (“E todo universo desafiarei contigo!”) “Innamorato anelito è del destin più forte!” (“No desejo do amor, destino maior!”) “Amanti oltre la morte! Sempre vivrai con me!” (“Amantes além da morte! Sempre viverás comigo!!”). Amélia e Gabriele se abraçam e Amélia se retira…
Chega Andrea Grimaldi… Gabriele se apraz da oportunidade. Andrea indaga, “Sì mattutino, qui?…” (Tão cedo, por aqui?…”). Gabriele ensaia, “A dirti…”, mas Andrea emenda, “Che ami Amelia” (“Que amas Amélia”) E Gabriele indaga, “Tu che lei vegli con paterna cura, a nostre nozze assenti?” (“Tu que a zelas como pai, estarias ausente de nosso casamento?”). Segue Andrea, “Se parlo, forse tu più non l’amerai” (“Se eu falar, talvez deixes de amá-la”). Gabriele responde, “Non teme ombra d’arcani l’amor mio! T’ascolto” (“Meu amor não teme segredos sombrios! Te escuto”). Segue Andrea, “Amelia tua d’umile stirpe nacque” (“Amélia nasceu de origem umilde”). Portanto, era uma plebeia; enquanto Gabriele, um patrício (nobre) – um “guelfi”, partidário do papa…

Gabriele pergunta, “Ma come de’ Grimaldi, anco il nome prendea?…” (“Mas, como adotou nome dos Grimaldi?…”). Andrea responde, “De’ fuorusciti…” (“Dos exilados…”) Então, Gabriele reafirma seu amor, “L’orfana adoro!” (“Adoro a orfã!”) E Andrea conclui, “Di lei se’ degno” (“Então, és digno dela”) E Gabrieli indaga, “A me fia dunque unita?” (“Então, ela estará unida a mim?”)… Andrea consente, “In terra e in ciel!” e abençoa Gabriele, “Vieni a me, ti benedico nella pace di quest’ora. Lieto vivi e fido adora l’angiol tuo, la patria, il ciel!” (“Vem até mim, te abençoo na paz desta hora. Viva feliz e adore fielmente teu anjo, tua pátria, teu céu!”) Gabrieli enaltece a grandeza de sentimentos de Andrea, “Eco pio del tempo antico, la tua voce è un casto incanto; Serberà ricordo santo de’ tuoi detti il cor fedel” (“Eco piedoso de tempos antigos, tua voz é puro encantamento; meu coração fiel guardará lembrança sagrada de tuas palavras”) Música adquiri caráter grave e solene – “sostenuto religioso”, encerrando duetto…
E toques de trompetes, em breve fanfarra de metais, anunciam chegada do doge! Gabriele e Andrea se retiram e Andrea exorta pelo dia da vingança, “Ah! presto il dì della vendetta sorga!” (“Ah! Que o dia da vingança logo chegue!”) Entram, o doge Boccanegra seguido por Paolo, Pietro, caçadores e guardas. Amélia também entra, acompanhada por damas de honra… Doge observa, “Ci spronano gli eventi, di qua partir convien” (“Acontecimentos exigem nossa presença, logo deveremos partir”) E Paolo, à chegada de Amélia, observa sua imensa beleza. Todos se retiram, enquanto Amélia e Doge permanecem. Então, iniciam grande duetto…
Ambos se apresentam. Doge indaga pelos irmãos exilados de Amélia e comenta, “A me inchinarsi sdegnano i Grimaldi…” (“Os Grimaldi se curvariam diante do doge…”) e entrega um documento à Amélia, que lê, “Che veggo!… il lor perdono?” (“Que vejo!… perdão a eles?”). Doge segue, “Dinne, perché in quest’eremo tanta beltà chiudesti? Del mondo mai le fulgide Lusinghe non piangesti? Il tuo rossor mel dice…” (“Diz-me, porque escondes tanta beleza neste claustro?”) “Del mondo mai le fulgide lusinghe non piangesti?” (“Nunca lamentaste as brilhantes lisonjas do mundo?”) E conclue, “Il tuo rossor mel dice…” (“Teu rubor me diz…”)

Segue Amélia, “T’inganni, io son felice…” (“Estás enganado, eu sou feliz…”) Doge responde, “Agli anni tuoi l’amore…” (“Em todos estes anos, você amou…”) Segue Amélia, “Ah mi leggesti in core! Amo uno spirto angelico che ardente mi riama… Ma di me acceso, un perfido, l’orror dei Grimaldi brama…” (“Ah, leste meu coração! Amo um espírito angelical, que ardentemente me ama… Mas, a mim, um pérfido, horror dos Grimaldi, deseja…”) Doge afirma, “Paolo!”. E Amélia, “Quel vil nomasti!…” (“O ser vil que nominaste!…”) E Amélia segue, “E poiché tanta Pietà ti muove dei destini miei, Vo’ svelarti il segreto che mi ammanta… Non sono una Grimaldi…” (“Se tens tanta piedade pelo meu destino, vou te revelar um segredo… Não sou uma Grimaldi…”)
Surpreso, Doge indaga, “Oh! ciel… chi sei?…” (“Oh! céus… quem é você?”) Amélia responde, “Orfanella il tetto umile, m’accogliea d’una meschina; Dove presso alla marina Sorge Pisa…” (“Orfã de umilde teto, que acolheu uma menina pobre; perto do mar, onde se ergue Pisa”) Doge se surpreende, “In Pisa, tu?” (“Em Pisa, tu?”) Segue Amélia, “Grave d’anni, quella pia era solo a me sostegno” (“Naqueles anos difíceis, uma mulher pura foi único apoio”) “Io provai del ciel lo sdegno. Colla tremola sua mano, involata ella mi fu. Pinta effigie mi porgea” (“Experimentei a ira do céu. Com as mãos trêmulas, ela me foi roubada. E me deixou uma efígie pintada”) E segue, “Mi baciò, mi benedisse, levò al ciel, pregando, i rai…” (“Então, me abraçou, abençoou e elevou suas preces ao céu, rezando…”)

Impossível para o doge, que perdera a filha naquele mar, próximo de Pisa, não associar o destino relatado por Amélia… E para si mesmo, reflete, “Se la speme, o ciel clemente, fosse sogno!… estinto io sia, ch’or sorride all’alma mia, della larva al disparir!” (“Se há esperança, o céu é misericordioso, como um sonho!… que sorri para minha alma, extinguindo a chaga do desaparecimento!”) E Amélia lamenta, “Come tetro a me dolente s’appressava l’avvenir…” (“Que triste e sombrio futuro se aproximava de mim…”)
Doge indaga, “Dinne… alcun là non vedesti?…” (“Diga… e viste alguém?…”) Amélia responde, “Uom di mar noi visitava…” (“Um homem do mar nos visitou…”) Segue Boccanegra, “E Giovanna si nomava lei che i fati a te rapîr?…” (“E se chamava Giovanna, aquela que o destino te tirou?…”) Surpresa, Amélia respode, “Si!”… Então, doge mostra uma efígie, “E l’effigie non somiglia questa?” (“E a efígie não se parece com esta?”), tirando um retrato do peito e mostrando a Amélia, que faz o mesmo com retrato idêntico, que carregava… Amélia exclama, “Uguali son!…” (“São iguais!…”) Doge grita, “Maria!”. Amélia exclama, ” Il mio nome!”. Doge, “Sei mia figlia!” (“És minha filha!”) E Amélia reluta, “Io…” Doge, radiante e comovido, extravasa amor contido, “M’abbraccia, o figlia mia!!” (“Abraça-me, filha minha!!”) Então, ambos se reconhecem e Amélia exulta de alegria, “Padre, padre il cor ti chiama! Stringi al sen Maria che t’ama!” (“Pai! pai, meu coração te chama! Abraça Maria, que te ama!”)
Climax musical acentua dimensão do encontro. E ambos exprimem toda felicidade, após angústia e frustrações guardadas, há muito tempo. Em “Allegro giusto”, Doge canta, “Figlia!… a tal nome palpito qual se m’aprisse i cieli…” (“Filha!… ao dizer esta palavra tremo como os céus estivessem se abrindo para mim…”). E Amélia responde, “Padre, vedrai la vigile figlia a te sempre accanto” (“Pai, terás filha sempre vigilante ao teu lado”). Então, Boccanegra acompanha Amélia, que se dirige ao palácio; e depois a contempla, à distância, extasiado: “O figlia!!”, concluindo jubilosamente o duetto…

Doge permanece e Paolo, que aguardava pelo diálogo com Amélia, se aproxima. “Che rispose?” (“O que ela respondeu?”) indaga Paolo, na expectativa de desposar Amélia. Doge responde, “Rinunzia ogni speranza” (“Desista de qualquer esperança”) A música se agita e Paolo reage, “Doge, nol posso!…” (“Doge, eu não posso!…”) E o Doge reitera, “Il voglio” (“Eu desejo isto”) Paolo se surpreende e apela à lealdade política, “Il vuoi!… scordasti che mi devi il soglio?” (“Você deseja!… esqueceu que me deve o trono?”) Mas, irredutível ao pedido, doge se retira e entra Pietro, amigo de Paolo e também aliado do doge…
– A partir de então, conflitos políticos e afetivos estão colocados. De uma lado, Boccanegra fragiliza sua base de apoio entre os plebeus, ao desencorajar união desejada por Paolo, com Amélia – Paolo sentiu-se traído por Simon… De outro, Andrea Grimaldi (Fiesco), embora confessado ao nobre pretendente, Gabriele Adorno, que Amélia, sua filha adotiva, era plebeia, ainda desconhecia, pelos descaminhos do destino, que tratava de sua neta, filha de Boccanegra e Maria Fiesco – portanto, surpreendente ligação sanguínea entre dois rivais políticos… E seguem os desdobramentos:

Inconformado, pela negativa de Boccanegra, Paolo propõe a Pietro sequestro de Amélia. E decide, “Rapirla!” (“Sequestrá-la!”)… Pietro responde, “Come?”… E Paolo, “Sul lido, a sera, la troverai solinga. Si tragga al mio naviglio. Di Lorenzin si rechi alla magion…” (“Na praia, à noite, ela estará sozinha. Traga-a para meu navio. Para isto, vá à mansão de Lorenzino…”) E Pietro, “S’ei nega?” (“E se ele negar?”) Então, canta Paolo, “Digli che so sue trame e presterammi aita… Tu gran mercede avrai…” (“Diga que conheço suas pretensões e que, ao colaborar, será bem recompensado…”) Pietro acata, “Ella sarà rapita!” (“Ela será raptada!”)… Na ópera, Lorenzino é personagem oculto, afeito à corrupção e toda sorte de malfeitos em troca de vantagens…
Cena seguinte abre em reunião na Cãmara do Conselho. No Palácio, ao centro, Doge com doze conselheiros nobres, de um lado, e outros doze conselheiros plebeus, de outro; além de quatro cônsules do mar e dois condestáveis, Paolo e Pietro… Boccanegra inicia pauta com votação de questões comerciais, “Messeri, il re di Tartaria vi porge Pegni di pace e ricchi doni e annunzia schiuso l’Eusin alle liguri prore” (“Senhores, rei da Tartária oferece-lhes promessas de paz, ricos presentes e anuncia que Euxino está aberto às proas da Ligúria”). “Euxino”, antiga denominação do mar Negro e Liguria, região italiana onde se situa Gênova. Então, pergunta o doge, “Acconsentite?” (“Como votam?”). Conselho delibera, “Si!”
Outro ponto, anuncia o doge, “Ma d’altro voto più generoso io vi richiedo” (“Neste ponto, peço voto mais generoso”) “La stessa voce che tuonò su Rienzi; vaticinio di gloria e poi di morte, or su Genova tuona” (“Mesma voz que dirigiu-se à Rienzi, com ameaças de morte e glória, agora ameaça Gênova”). E nesta questão, ferozmente, todos respondem, “Guerra a Venezia!”. Mas, doge pondera, “E con quest’urlo atroce, fra due liti d’Italia, erge Caino la sua clava cruenta! – Adria e Liguria, hanno patria comune” (“Com este grito atroz, entre as duas costas da Itália, Caim levanta sua maldita clava! Adria e Ligúria são a mesma pátria…”). Libreto alude às cartas de Petrarca, dirigidas aos doges de Gênova e Veneza, certa ocasião – “Itália, mãe e pátria única!”

Então, solidários e confiantes, todos reiteram, “È nostra patria Genova!” (“Gênova é nossa pátria!”). E em meio à reunião, instala-se grande tumulto… Assembleia se agita, “D’onde tai grida?” (“De onde vem os gritos?”) Paolo vai ao balcão e observa, “Dalla piazza de’ Fieschi!” (“Da praça dos Fieschi!”). E todos exclamam, “Una sommossa!” (“Uma revolta!”); outros gritam,”Morte! Morte!”… Em meio ao tumulto, Paolo e Pietro reconhecem Gabriele Adorno! E Doge exclama, “Ciel! Gabrieli Adorno dalla plebe assalito… accanto ad esso combatte un guelfo – a me un araldo!” (“Céus! Gabriele Adorno atacado pela plebe… ao lado dele, um ‘guelfo’ luta – chamem um aralto!”) E tal confusão era causada pelo desaparecimento de Amélia!
Pietro alerta Paolo, “Paolo, fuggi o sei côlto…” (“Paolo, fuja ou serás preso…”) Doge percebe Paolo se afastando e ordena, “Consoli del mare, custodite le soglie! Olà, chi fugge è un traditor” (“Cônsules do mar, guardem os muros! Cuidado, quem está fugindo é traidor”) Paolo, confuso, se detém… E a multidão, na praça, intensifica os gritos: “Morte ai patrizi!” (“Morte aos patrícios!”). Então, conselheiros nobres reagem, “All’armi!” (“Às armas!”). E na praça, plebeus gritam,”Viva il popolo!”. Enquanto, do palácio, conselheiros plebeus reiteram, “Evviva!” (“Viva!”)…

Então, Boccanegra adverte a todos, “E che? voi pure? Voi, qui!! vi provocate?” (“O que? Vocês estão todos se provocando?…”) E quando exortam, da praça, “Morte al Doge!”… Boccanegra reage energicamente, “Morte al Doge? sta ben, tu, araldo, schiudi le porte del palagio e annuncia al volgo gentilesco e plebeo ch’io non lo temo!” (“Morte ao doge? está bem… aralto, abre as portas do palácio e anuncia à multidão gentílica e plebeia que não os temo!”) “Che le minaccie udii, che qui li attendo…” (“Pelas ameaças que ouvi, eu os aguardo aqui…”). E por fim, ordena aos conselheiros, “Nelle guaine i brandi!” (“Guardem as espadas!”). E de pronto, todos obedecem!
Da praça, desordem aumenta e a turba grita, “Armi! Saccheggio! Fuoco alle case!” (“Armas! Saques! Fogo nas casas!”). E outros respondem, “Alla gogna!” (“Ao pelourinho!”). Soa a trombeta e o arauto fala! Todos silenciam… Então, o doge é ovacionado pelos plebeus: “Evviva il Doge!”. Boccanegra responde, “Ecco le plebi!” (“Aqui estão os plebeus!”). E a multidão adentra o palácio, ficando ao lado dos conselheiros plebeus; enquanto conselheiros nobres colocam-se à parte… Multidão clama por vingança, “Vendetta! vendetta! Spargasi il sangue del fiero uccisor!” (“Vingança! Vingança!! Que o sangue do assassino seja derramado!”) Doge ironiza, “Quest’è dunque del popolo la voce? Da lungi tuono d’uragan, da presso, gridio di donne e di fanciulli…” (“Então, esta é a voz do povo? De longe, estrondos de um furação, de perto, gritos de mulheres e crianças…”)

Então, doge indaga a Gabriele Adorno: “Adorno, perché impugni l’acciar?” (“Adorno, porque impunhas a espada?”) Adorno responde, ” Ho trucidato Lorenzino…” (“Eu matei Lorenzino…”). Multidão reage, “Assassin!”. Mas, Adorno denuncia Lorenzino, “Ei la Grimaldi Aveva rapita” (“Ele sequestrou a Grimaldi”) E o povo reage, “Menti!” (“Mentiroso!”)… Gabriele segue, “Quel vile Pria di morir disse che un uom possente al crimine l’ha spinto” (“Aquele covarde, antes de morrer, confessou que foi empurrado ao crime por gente poderosa!”)… E Pietro adverte Paolo, “Ah! sei scoperto!” (“Você está exposto!”) E o doge exige, “E il nome suo?” (“E o nome dele?”)…
Olhando, ironicamente, para o doge, Gabriele responde, “T’acqueta! il reo si spense pria di svelarlo” (“Se isto te acalma! Culpado morreu antes de revelar o nome”). Gabriele insinua que sequestro foi ordem do doge Boccanegra, “Pel cielo! Uom possente tu se’!…” (“Pelos céus! És um homem poderoso!…”) Ao que Boccanegra repele com ódio, “Ribaldo!” (“Canalha!”) Adorno reage e reafirma, “Audace rapitor di fanciulle!” (“Ousado sequestrador de meninas!”) “Empio corsaro incoronato! muori!” (“Perverso corsário coroado! Vais morrer!”). E avança, impulsivamente, na direção de Simon para desferir golpe de espada!

Sob tamanha tensão, de súbito, Amélia adentra “Câmara do Conselho”, interpondo-se entre os dois… Amélia conseguira fugir de seus raptores e correu até o palácio… Juntos, Boccanegra, Fiesco e Gabriele rejubilam, “Amelia!!”… E todos repetem, “Amelia!!” Então, ela exorta ao doge, “O Doge… ah salva… Salva l’Adorno tu!” (“Oh, doge… salva… salva Adorno!) Boccanegra ordena aos guardas que continham Gabriele, “Nessun l’offenda” (“Ninguém o ofenda”) E segue, “Cade l’orgoglio e al suon del suo dolore tutta l’anima mia parla d’amore…” (“Orgulho desmorona diante da tua dor e toda minha alma fala de amor…”) “Amelia, di’ come tu fosti rapita e come al periglio potesti campar” (“Amelia, conte-nos como foste raptada e como escapaste do perigo”)…
Amélia relata, “Nell’ora soave che all’estasi invita, soletta men givo sul lido del mar” (“Em tranquila hora, que convida ao êxtase, caminho sozinha pela praia”) “Mi cingon tre sgherri, m’accoglie un naviglio” (“Então, três capangas me cercaram e me levaram a um navio”). Povo presente exclama, “Orror!”… Segue Amélia, “Soffocati non valsero i gridi… Io svenni e al novello dischiuder del ciglio, Lorenzo in sue stanze presente mi vidi…” (“Meus gritos, sufocados, nada adiantaram… desmaiei e, ao abrir os olhos, vi Lorenzino…”) Outra vez, povo exclama, “Lorenzino!”… Nobres reagem, “Abbasso le scuri!” (“Abaixem os machados!”). Amélia suplica, “Pietà!” (“Compaixão!”)…

E Simon, indignado, grita: “Fratricidi!!!…” E canta famosa ária, “Plebe! Patrizi! Popolo!” (“Plebeus! Patrícios! Povo!”), onde lamenta as cisões e as rivalidades, “Dalla feroce storia! Erede sol dell’odio, mentre v’invita estatico Il regno ampio dei mari” (“De feroz história, somos herdeiros apenas do ódio, enquanto vasto reino dos mares nos convida ao êxtase”) “Piango su voi, sul placido raggio del vostro clivo, là dove invan germoglia Il ramo dell’ulivo. Piango sulla mendace festa dei vostri fior… E vo gridando: pace! E vo gridando: amor!” (“Choro por tudo, pelo raio plácido da encosta, onde o ramo da oliveira brota em vão… Choro pela celebração mentirosa das flores… E sigo gritando: Paz! Amor!…”)
Então, Amélia se dirige a Fiesco, “Pace! lo sdegno immenso raffrena per pietà! Pace! t’ispiri un senso di patria carità!” (“Paz! contenha sua imensa indignação com piedade!… Paz! que te inspire o senso da caridade patriótica!”) E Pietro segue alertando Paolo, “Tutto fallì, la fuga sia tua salvezza almen” (“Tudo falhou, a fuga será tua salvação”) Paolo responde, “No, l’angue che mi fruga è gonfio di velen” (“Não, o verme que me procura está cheio de veneno”)… E Gabriele se dirige a Amélia, “Amelia è salva, e m’ama! Sia ringraziato il ciel! Disdegna ogni altra brama l’animo mio fedel” (“Amelia está segura e me ama! Graças a Deus! Minha alma fiel desdenha qualquer outro desejo”)…

E Fiesco, incomodado pela liderança de Simon e aferrado às rivalidades políticas, canta, “O patria! a qual mi serba vergogna il mio sperar! Sta la città superba nel pugno d’un corsar!” (“Oh, Pátria! para a qual minha esperança é vergonha! A cidade orgulhosa está no punho de um corsário!”). Mas, os presentes respondem ainda sensibilizados pelas palavras do doge, “Il suo commosso accento sa l’ira in noi calmar; vol di soave vento che rasserena il mar…” (“Seu tom comovente acalma nossa raiva; assim como a brisa suave acalma o mar…”)
Então, Gabriele oferece sua espada ao doge, “Ecco la spada!” (“Eis minha espada!”) Doge ordena a Gabriele, “Questa notte sola qui prigione sarai, finché la trama tutta si scopra; No, l’altera lama serba, non voglio che la tua parola!” (“Esta noite estarás prisioneiro, até que a trama seja esclarecida. Não, tua orgulhosa lâmina não apreendo, me basta tua palavra!”) E Gabriele acata, respeitosamente, “E sia!” (“Que assim seja!”)…
Mas, a Paolo, doge dirige-se energicamente, “Paolo!”… Atônito em meio aos demais, Paolo responde, “Mio Duce!” (“Meu doge!”). E o doge, com tremenda autoridade, energia crescente e desconfiando de Paolo, canta, “In te risiede l’austero dritto popolar; è accolto l’onore cittadin nella tua fede: bramo l’ausiglio tuo…” (“Em ti reside o direito austero do povo; e a honra da cidade é acolhida em tua fé: assim, anseio por tua ajuda…”) “V’è in queste mura un vil che m’ode e impallidisce in volto. Già la mia man l0 afferra per le chiome! Io so il suo nome… È nella sua paura. Tu al cospetto del ciel e al mio cospetto sei testimon. Sul manigoldo impuro piombi il tuon del mio detto: Sia maledetto! e tu ripeti il giuro” (“Há dentro destas muralhas um homem vil que me ouve e empalidece. Minha mão já o agarra pelos cabelos! Eu sei o nome dele… Está no medo dele. Você é uma testemunha diante do céu e diante de mim. Que o trovão de minhas palavras caia sobre canalha impuro: Maldito seja!”) Paolo, aterrorizado e trêmulo, sussurra, “Sia maledetto… Orror!” (“Maldito sejas… Horror!”) E ferozmente, todos hostilizam Paolo, “Sia maledetto!!! Sia maledetto!!!” (“Maldito sejas!!! maldito sejas!!!”), concluindo 1° ato!

2° Ato – Aposentos do doge, no Palácio Ducal de Gênova
Breve introdução orquestral – “allegro agitato”, sugere ansiedade e insegurança, preparando entrada de Paolo, secundado por Pietro, nos aposentos do doge. Da varanda, Paolo orienta Pietro, “Quei due vedesti?Li traggi tosto dal carcer loro per l’andito ascoso, che questa chiave schiuderà” (“Vés aqueles dois? Traga-os como prisioneiros, liberte-os com esta chave, da passagem escondida na prisão”)… Pietro obedece e se retira…
Ressentido e vingativo, Paolo canta, “Me stesso ho maledetto! E l’anatéma m’insegue ancor… e l’aura ancor ne trema! Vilipeso… reietto dal Senato e da Genova, qui vibro l’ultimo strai pria di fuggir; qui libro la sorte tua, Doge, in quest’ansia estrema. Tu, che m’offendi e che mi devi il trono, qui t’abbandono al tuo destino in questa ora fatale…” (“Ele me amaldiçoou! E o que disse ainda me assombra… minha respiração treme! Vilipendiado… rejeitado pelo Senado e por Gênova, aqui, último momento antes da fuga; aqui reservo teu destino, doge, nesta extrema ansiedade. Tu, que me ofendeste e me deves o trono, agora te abandono, aqui, ao destino e hora fatal…”)

Então, Paolo toma um frasco e esvazia conteúdo num cálice: “Qui ti stillo una lenta, atra agonia…” (“Aqui, te destilo uma agonia lenta e sombria…”) “Là t’armo un assassino. Scelga morte sua via fra il tosco ed il pugnale” (“Vou te tratar como criminoso. Deixemos que a morte escolha teu destino, entre o veneno e o punhal”)…
Entram Fiesco e Gabriele, acompanhados por Pietro, que retorna… Fiesco indaga, “Prigioniero, in qual loco m’adduci?”(“Prisioneiro, em que lugar estou?”) E Paolo responde, “Nelle stanze del Doge; e favella a te Paolo” (“Nos aposentos do doge; e Paolo fala com você”) Fiesco segue, “I tuoi sguardi son truci…” (“Tua aparência é sombria…”) E canta Paolo, “Io so l’odio che celasi in te. Tu m’ascolta…” (“Conheço o ódio dentro de você. Me escute…”) Paolo fala do exército “guelfo” para enfrentar o doge, mas Fiesco alerta: “Ma vano fia tanto ardimento! Questo Doge, abborrito da me quanto voi l’abborrite, v’appresta nuovo scempio…” (“Tal ousadia será em vão! Este doge, que abomino tanto quanto você, está preparando novo massacre…”)
E Fiesco, surpreendido com proposta de Paolo, canta, “Mi tendi un agguato!” (“Uma emboscada!”) E Paolo reitera, “Un agguato?… Io t’insegno vittoria!” (“Uma emboscada?… eu te proponho uma vitória!”) “Trucidarlo qui, mentre egli dorme…” (“Matá-lo aqui, equanto ele dorme…”). Mas, lider honrado, apesar da rivalidade com Boccanegra, Fiesco se nega, “Osi a Fiesco proporre un misfatto?” (“Ousas propor a Fiesco um atentado?”)… E diante da negativa de Fisesco, Paolo, incisivo, determina, “Al carcer ten va!” (“Então, voltes ao cárcere!”)

Fiesco se retira e Gabriele tenta segui-lo, mas é detido por Paolo, que indaga, “Amelia dunque mai tu non amasti?” (“Então, você nunca deixou de amar Amélia?”). Surpreso, Gabriele responde, “Che dici?…” (“Que dizes?…”) Paolo segue, “È qui” (“Ela está aqui”) E Gabriele, surpreso, canta, “Qui, Amelia!” (“Aqui, Amélia!”) E Paolo conta da desconfiaça, ao confundir encontro afetuoso entre Simon e Amélia, pai e filha, como um caso amoroso, guardando profunda decepção… E vocifera, “E del vegliardo segno è alle infami dilettanze” (“Do velhaco, ela é motivo de prazeres infames”)… Indignado, Gabrile adverte, “Astuto dimon, cessa…” (“Diabo astuto, pare…”) Então, Paolo se apressa em fechar as portas e ameaça Gabriele: “Da qui ogni varco t’è conteso. – Ardisci Il colpo… O sepoltura avrai fra queste mura!” (“A partir de agora, cada passagem está fechada para ti. Atreva-se… e serás enterrado entre estes muros!”)… E parte às pressas!
Sozinho e perturbado, Gabriele amarga as desconfiaças reveladas por Paolo… “O inferno! Amelia qui! L’ama il vegliardo!…” (“Oh, inferno! Amélia aqui! O velhaco a ama!…”) “E il furor che m’accende m’è conteso sfogar!…” (“A fúria que me inflama, preciso conter!…”) “Tu m’uccidesti il padre… tu m’involi il mio tesoro…” (“Você matou meu pai… você levou meu tesouro…”) “Trema, iniquo… già troppa era un’offesa, doppia vendetta hai sul tuo capo accesa” (“Treme, vilão… fui por demais ofendido, dupla vingança paira sobre tua cabeça”)… E segue grande ária, onde Gabriele canta, “Sento avvampar nell’anima furente gelosia!” (“Ciúme furioso queima em minha alma!”) “Piango!… pietà, gran Dio, del mio martiro!… Pietoso cielo, rendilà, rendila a questo core!” (“Clamo!… piedade, grande Deus, pelo meu martírio!… Piedoso céu, devolva-a, devolva-a a este coração!”)

Subitamente, entra Amélia e encontra Gabriele. Ambos se perguntam como chegaram ao palácio. Gabriele fora preso, trazido por Paolo e Pietro, então, insinua, “Il tiranno ferale… Egli t’ama?…” (“O tirano selvagem… Ele te ama?…”) E Amelia responde, “D’amor santo… l’amo al pari…” (“De amor sagrado… e eu o amo igualmente…”). Segue Amélia, “Infelice!… mel credi, pura io sono…” (“Infeliz!… creia, eu sou pura…”) “Concedi che il segreto non aprasi ancor” (“Comprometa-se que o segredo não seja revelado”) Gabriele reage, “Parla – Il tuo silenzio è funebre vel che su me distendi” (“Fala – teu silêncio é véu fúnebre, que se estende sobre mim”) E Amélia canta, “Sgombra dall’alma il dubbio… Santa nel petto mio l’immagin tua s’accoglie come nel tempio Iddio” (“Limpe sua alma de dúvidas… pois, acolho uma imagem no peito como num templo de Deus”), aludindo ao retrato da mãe…
Neste momento, percebem a chegada do doge e Amélia pede que Gabriele se esconda… Gabriele se nega e Amelia adverte, “Il patibol t’aspetta” (“O cadafalso te espera”) “Nell’ora stessa teco avrò morte…” (“E no mesmo momento, terei morrido com você…”). Então, Amélia convence Gabriele a se esconder… Entra Boccanegra, “Figlia!…”. Amelia responde, “Sì afflitto, o padre mio?” (“Você está triste, meu pai?”) E o doge, ‘Inganni… ma tu piangevi?…” (“Me engano… ou estavas chorando?…”) E segue o doge, “La cagion m’è nota delle lagrime tue… Già mel dicesti… Ami; e se degno fia dite l’eletto del tuo core…” (“A razão das lágrimas eu sei… você já me disse… tu amas; e se ele for digno, revela o escolhido do seu coração…”) Amélia canta, “Adorno”. E o doge reage, “Il mio nemico!… congiura coi Guelfi…” (“Meu inimigo!… que conspira com os guelfos…”)

Amélia segue, “Ciel!… perdonagli!…” (“Céus!… perdoa-lhe!…”) Doge responde, “Nol posso!”. E Amélia adverte, “Con lui morrò…” (“Então, morrerei com ele…”) Doge indaga, “L’ami cotanto?” (“Vovê o ama tanto assim?”) Amélia exclama, “Io l’amo d’ardente, d’infinito amor. O al tempio con lui mi guida, o sopra entrambi cada la scure del carnefice…” (“Amo com amor ardente e infinito. Ou me levem ao templo com ele, ou que o machado do carrasco caia sobre nós dois…”)
Canta Simon, “O crudele destino! O dileguate mie speranze! Una figlia ritrovo; ed un nemico a me la invola… Ascolta: s’ei ravveduto… forse il perdono” (“Oh, cruel destino! Oh, minhas esperanças perdidas! reencontro minha filha e um inimigo a leva… Escuta: se ele se arrepender… talvez o perdoe…”) Amélia exulta, “Padre adorato!…” (“Pai adorado!…”) E Simon ordena, “Ti ritraggi!” (“Então, saia!”) Amélia tenta permanecer, mas Simon insiste. E receosa por Gabriele, ainda escondido, sai sussurrando, “Gran Dio! come salvarlo?…” (“Grande Deus, como salvá-lo?…”)
Gabriele segue escondido, a pedido de Amelia. E o doge, que permanece em cena, reflete, “Doge! ancor proveran la tua clemenza I traditori? Di paura segno fora il castigo. – M’ardono le fauci” (“Doge! Traidores ainda testarão tua clemência? Medo será sinal para a punição… meus maxilares queimam”) Então, Simon pega uma taça e bebe conteúdo (envenenado por Paolo…) E canta, “Perfin l’onda del fonte è amara al labbro dell’uom che regna… O duol… la mente è oppressa… (“Até água da fonte é amarga aos lábios de quem reina… Oh, dor… tenho a mente oprimida…”) E exausto, senta-se, “Stanche le membra… ahimè… mi vince il sonno” (“Meus membros estão cansados… ah… o sono me vence…”) E reflete, “Oh! Amelia… ami… un nemico…” (Oh! Amélia… ama… um inimigo…”). Então, se deita e adormece…

E escondido, cautelosamente, Gabriele aparece, se aproxima e contempla o doge… “Ei dorme!… quale sento ritegno?… E riverenza o tema?… vacilla il mio voler?… (“Está dormindo… sinto-me contido?… por reverência ou medo?… minha vontade vacila?…) “Th dormi, o veglio, del padre mio carnefice, tu mio rival… Figlio d’Adorno!… la paterna ombra ti chiama vindice…” (“Dorme, oh! velho carrasco de meu pai, agora, meu rival… Como filho de Adorno! sombra paterna clama por vingança…”) E Adorno toma um punhal, pronto para esfaquear o doge… Mas, Amélia, que havia se retirado, retorna e de novo se interpõe…

Canta Amélia, “Insensato! Vecchio inerme il tuo braccio colpisce!” (“Insensato! Teu braço ataca um velho indefeso!”) Gabriele reage, “Tua difesa mio sdegno raccende!” (“Tua defesa reacende minha raiva!”) E Amélia insiste, “Santo, il giuro, è l’amor che ci unisce, né alle nostre speranze contende” (“Santo, eu juro, o amor que nos une, não compete com nossas esperanças”)… E Gabriele, “Che favelli?…” (“Que dizes?…”). Doge começa a acordar… E Amélia segue, “Nascondi il pugnale, vien… ch’ei t’oda…” (“Guarda o punhal, vem… deixe-o te ouvir…”) E Gabriele, estarrecido e indignado, canta “Prostrarmi al suo piede?” (“Prostrar-me aos pés dele?”)…
Repentinamente, doge se levanta e novamente oferece o peito ao ódio de Gabriele, “Ecco il petto… colpisci, sleale!” (“Aqui está meu peito… golpeie-o, traidor!”) Simon era um guerreiro, velho e inabalável; de muitas lutas, em terra e nos mares… Então, indaga, “Chi t’aprì queste porte?” (“Quem te abriu a porta?”)… Amélia nega ter sido ela. E Gabriele responde, “Niun quest’arcano saprà” (“Ninguem saberá”) E Doge repreende, “Il dirai fra tormenti…” (“Então, responderás em tormento…”) Amélia clama, “Ah pietà!” (“Ah! Misericórdia!”) E segue o doge, “Ah, quel padre tu ben vendicasti, che da me contristato già fu… Un celeste tesor m’involasti… La mia figlia…” (“Ah! teu pai vingaste bem, pela tristeza que causei… Tesouro celestial me roubaste… a minha filha!”)

Espantado, Gabriele canta, “Suo padre, sei tu!!… Suo padre, sei tu!!” E atordoado, mas confortado, segue, “Perdono, Amelia – Indomito geloso amor fu il mio…” (“Perdão, Amélia – Indômito foi meu amor ciumento…”) “Doge, il velame squarciasi… Un assassin son io… dammi la morte; il ciglio A te non oso alzar” (“Doge, o véu está rasgado… Sou um assassino… condena-me à morte; não ouso mais te levantar meu olhar”) Gabriele havia assassinado Lorenzino, que sequestrara Amélia em conluio com Paolo… E Amélia, sussurrando, clama por sua mãe, “Madre, che dall’empireo proteggi la tua figlia” (“Mãe, do epíreo, protege tua filha”) “Del genitor all’anima meco pietà consiglia…” (“Ao genitor, aconselha piedade pela minha alma…”) “Ei si rendea colpevole solo per troppo amor…” (“Ele – Gabriele – é culpado apenas por amar demais…”)
Doge reflete, “Deggio salvarlo e stendere la mano all’inimico?…” (“Devo salvá-lo e estender a mão ao inimigo?…”) E segue,”Sì – pace splenda ai Liguri, si plachi l’odio antico; sia d’amistanze italiche Il mio sepolcro altar!” (“Sim – que a brilhe a paz entre os lígures, que o antigo ódio seja aplacado; que meu túmulo torne-se altar da fraternidade italiana!”), em clara alusão às rivalidades e desunião vividas na penísnsula, sobretudo, referindo-se aos ideais do sec. XIX, que brandiam pela unificação!

Mas, grande revolta estourava em Gênova. Da praça, ouvem-se gritos, pelo coro interno, “All’armi, all’armi, o Liguri, patrio dover v’appella – Scoppiò dell’ira il folgore” (“Às armas, às armas, Oh, ligurianos, dever patrótico vos chama – Relâmpago da raiva irrompeu!”) “E notte di procella. Le guelfe spade cingano di tirannia lo spalto – del coronato veglio, su, alla magion, l’assalto!” (“A noite será tempestuosa. Espadas guelfi, cerquem o bastião da tirania – do velho coroado, avancem, mansão acima, em assalto!”).
Amélia corre para o balcão, “Quai gridi?…” (“Quem grita?…”) Gabriele se dirige ao Doge, “I tuoi nemici…” (“Teus inimigos…”) Doge acente, “Il so” (“Eu sei”) E Amélia alerta, “S’addensa Il popolo” (“Multidão se adensa”) Doge ordena a Gabriele, “T’unisci a’ tuoi…” (“Vá juntar-se aos seus…”) E Gabriele responde, “Mai più…” (“Nunca mais…”) Doge insiste e escreve um bilhete, “Dunque messaggio, ti reca lor di pace. E il sole di domani non sorga a rischiarar fraterne stragi!” (“Leve esta mensagem, ofereça-lhes a paz… Não permitam que o sol do amanhecer nasça para iluminar outro massacre fraterno!”)
Gabriele concorda e afirma sua lealdade a Simon, “Teco a pugnar ritorno, se la clemenza tua non li disarmi!” (“Se tua misericórdia não os desarmar, voltarei para lutar ao teu lado!”) E, acenando para Amélia, doge canta, “Sarà costei tuo premio!” (“Ela – Amélia – será teu destino!”) E Gabriele exulta, “O inaspettata gioia!” (“Oh, suprema alegria!”). Assim, doge autoriza união de ambos e Amélia exclama, “O padre!”, concluindo magnífico e comovedor tercetto… E com a multidão ao fundo, em polvorosa, doge e Gabrieli reafirmam suas lealdade e decisão de lutarem juntos – sacam as espadas e todos cantam, “All’armi!! All’armi!!…” – finalizando o 2° ato!

3° Ato – No grande salão do Palácio Ducal, com vista para Gênova e pro mar
Após confronto entre os partidários guelfi e as forças do doge, ouvem-se gritos: no interior do Palácio Ducal, “Evviva il Doge!”; e externamente, pelo coro interno, “Vittoria! Vittoria!”. Um capitão, comandante das forças palacianas, entrega a Fiesco sua espada, libertando-o. E Fiesco indaga sobre a batalha, “E i Guelfi?” (“E os guelfos?”) Capitão informa, “Sconfitti…” (“Derrotados…”) Fiesco lamenta, “O triste libertà…” (“Oh, triste liberdade…”) E entre os derrotados, reconhece Paolo, “Che?… Paolo?! – Dove sei tratto?” (“Você?… Paolo? – De onde você veio?”) Paolo se aproxima e responde, “All’estremo supplizio…” (“Do extremo suplício…”) “Il mio demonio mi cacciò fra l’armi dei rivoltosi e là fui colto; ed ora mi condanna Simon; ma da me prima fu il Boccanegra condannato a morte…” (“Meus demônios me empurraram para os braços dos deuses rebeldes e fui preso; agora, Simon me condena; mas antes de mim, Boccanegra foi condenado à morte…”)

Fiesco indaga, “Che vuoi dir?” (“Que queres dizer?”) Paolo responde, “Un velen… più nulla io temo, gli divora la vita” (“Um veneno… lhe devora a vida e nada mais temo”) Fiesco grita, “Infame!”. E Paolo reage, “Ei forse già mi precede nell’avel!…” (“Talvez ele me preceda no túmulo!…”). Em meio a tais vendetas e ódios, grande coro interno, em contraponto, clama pela paz e canta a união de Amélia e Gabriele, “Dal sommo delle sfere proteggili, o Signor; di pace sien foriere Le nozze dell’amor!” (“Do cume das esferas, protege-os, Senhor; que as bodas de amor sejam prenúncios de paz!”)
Frustrado, Paolo reage, “Ah! orrore!! Quel canto nuzial, che mi persegue, l’odi?… in quel tempio Gabriello Adorno sposa colei ch’io trafugava…” (Ah! Horror!! um canto nupcial que me assombra, ouves?… No templo, Gabriele Adorno desposa aquela que eu sequestrei…”) E novamente espantado, Fiesco reage, “Amelia?! Tu fosti il rapitor?! Mostro!!” (“Amélia?! Foste o raptor?! Monstro!!”). E chegam alguns guardas, que prendem e arrastam Paolo…

Canta Fiesco, “Inorridisco!… no, Simon non questa vendetta chiesi, d’altra meta degno (“Estou horrorizado!… não, Simon, não tramei tal vingança, que ofende minha dignidade”) “Eccolo… il Doge. Alfine è giunta l’ora di trovarci a fronte!” (“Chega… o Doge. Finalmente, a hora de nos encontrarmos”). E, à entrada do doge, Fiesco escolhe local discreto e pouco iluminado…
Solenemente, entram o Doge, acompanhado por um capitão mais um trompetista. Da varanda, após a vitória, capitão anuncia as novas ordens: “Cittadini! per ordine del Doge S’estinguano le faci e non s’offenda col clamor del trionfo i prodi estinti” (“Cidadãos! por ordem do doge, que as tochas sejam apagadas e que os heróis falecidos não sejam ofendidos com o clamor do triunfo”). E o capitão se retira…

Doge inicia com uma reflexão, “M’ardon le tempia… Ah! ch’io respiri L’aura beata del libero cielo! Oh, refrigerio!… la marina brezza!… Il mare!… il mare!… quale in rimirarlo di glorie e di sublimi rapimenti. Mi si affaccian ricordi! – Il mare!… il mare!… perché in suo grembo non trovai la tomba?… (“Minhas têmporas queimam… Ah! deixe-me respirar o ar feliz do céu livre! Oh, frescor!… a brisa do mar!… O mar!… o mar!… enquanto o contemplo, memórias de glórias e sublimes arrebatamentos me invadem! O mar!… o mar!… por que não encontrei o túmulo em teu colo?…”)
Canta Fiesco, com profundo ressentimento, “Delle faci festanti al barlume cifre arcane, funebri vedrai – Tua sentenza la mano del nume sopra queste pareti vergò. Di tua stella s’eclissano i rai; La tua porpora in brani già cade; Vincitor fra le larve morrai!” (“Das tochas que celebram figuras arcanas, fúnebres as verá – A mão de Deus escreveu tua sentença nestas paredes. Os raios de tua estrela estão eclipsados; tua púrpura já cai em pedaços; vitorioso entre as larvas, você morrerá!”)

Estranhando a presença, doge canta, “Quale accento?” (“Que sotaque?”) “Fia ver? – Risorgon dalle tombe i morti?…” (“Isto é verdade? – mortos ressucitam dos túmulos?…”) E Fiesco desafia, “Non mi ravvisi tu?” (“Você não me reconhece?”) Então, Doge se surpreende, “Fiesco!…”. E ironicamente, o outro responde, “Simon!… I morti ti salutano!…” (“Simon!… os mortos te saudam!…”) Doge canta, “Gran Dio!… compiuto alfin di quest’alma è il desio!” (“Grande Deus!… desejo desta alma, finalmente, realizado!”) Mas, extremamente rancoroso, Fiesco segue, “Come fantasima Fiesco t’appar, antico oltraggio a vendicar” (“Como fantasma, Fiesco aparece para vingar antiga insolência”)…
E ao ódio de Fiesco, Simon contrapõe desejo de concórdia, “Di pace nunzio Fiesco sarà. Suggella un angelo nostra amistà” (“Da paz, Fiesco será o anunciador. Pois um anjo selará nossa amizade”) Fiesco ainda não sabe de Amélia, sua neta, filha de Simon e Maria… Da menina plebeia, que outrora adotou… E indaga, “Che dici?” (“Que dizes?”) Então, Simon canta, “Se a te l’orfanella concedea che perduta per sempre allor piangea; in Amelia Grimaldi a me fu resa e il nome porta della madre estinta…” (“Se a ti foi concedida a órfã que chorava, perdida para sempre; em Amélia Grimaldi, a mim ela foi devolvida e leva o nome de sua falecida mãe…”)

Fiesco exclama, “Cielo!… perché mi splende il ver sì tardi?” (“Céus!… porque a verdade brilhou tão tarde, para mim?”) Então, Fiesco se comove, enquanto Simon canta, “Piangi?… perché da me volgi gli sguardi?…” (“Choras?… porque desvias os olhos de mim?…”) E Fiesco segue, “Piango, perché mi parla In te del ciel la voce; sento rampogna atroce fin nella tua pietà…” (“Choro porque voz celestial fala em você; ouço reprovações atrozes, mesmo em sua piedade…”) Acolhedor e buscando a concórdia, Simon canta, “Vien, ch’io ti stringa al petto, o padre di Maria; balsamo all’alma mia il tuo perdon sarà” (“Vem, deixa te abraçar em meu peito, oh! pai de Maria; seu perdão será um bálsamo para minha alma”). Acolhendo Simon e solidário, Fiesco alerta do veneno, que Paolo colocou nos aposentos ducais, “Ahimè! morte sovrasta… un traditore il velen t’apprestò!” (“Ai de mim! tua morte se aproxima… traidor te preparou um veneno!”)
Doge canta, “Tutto favella, il sento, a me d’eternità…” (“Tudo que dizes, eu sinto, da eternidade…”) Fiesco reage, “Crudele Fato!” (“Cruel destino!”). Maria se aproxima e doge pede a Fiesco, “Taci, non dirle… anco una volta benedirla voglio…” (“Quieto, não conte a ela… quero abençoá-la mais uma vez…”) E abandona-se numa cadeira, enfraquecido…

Entram Maria (Amélia), Gabriele, senadores nobres e plebeus, além de pagens com algumas tochas… Maria exclama, “Chi veggo!…” (“Quem vejo!…”) Simon canta, “Deponi la meraviglia – in Fiesco, il padre vedi dell’ignota Maria, che ti die’ vita” (“Deixe admiração de lado – em Fiesco vês o pai da desconhecida Maria, que te deu a vida”) E Maria canta, “Egli?… Fia ver?…” (“Ele?… verdade?…”) Fiesco exclama, “Maria!!”, que responde, “Oh gioia! Dunque gli odii funesti han fine!…” (“Oh, alegria! Então, os ódios fatais acabaram!…”) Doge acente, “Tutto finisce, o figlia…” (“Tudo acabado, oh! filha…”) “Per me l’estrema ora suonò!” (“Mas, para mim, a hora final chegou!”)
Exitante, Maria indaga, “Qual ferale pensier t’attrista sì sereni istanti?” (“Que pensamento cruel te entristece, em momento tão sereno?”) Doge canta, “Maria, coraggio… A gran dolor t’appresta…” (“Coragem Maria… prepara-te para grande dor…”) Maria e Gabriele indagam, “Che parli?… ” (” Do que falas?…”) e caem aos pés do doge, suplicantes… Doge canta, “Gran Dio, li benedici pietoso dall’empiro; a lor del mio martiro cangia le spine in fior” (“Grande Deus, abençoe-os do teu piedoso império; por eles, espinhos de meu martírio se transformam em flores”) Maria canta, “No, non morrai, l’amore vinca di morte il gelo” (“Não, não morra, deixe o amor vencer a gélida morte”) “Risponderà dal cielo petade al mio dolor!” (“Sinal celestial responderá à minha dor!”)

E Gabriele lamenta, “O padre, o padre, il seno furia mi squarcia atroce… come passò veloce l’ora del lieto amor!” (“Oh pai, oh pai, meu peito dilacera com fúria atroz… tão depressa passou a hora feliz do amor!”) E Fiesco responde, “Ogni letizia in terra è menzognero incanto. D’interminato pianto fonte è l’umano cor…” (“Toda alegria na terra é encantamento mentiroso. O coração humano é fonte de choro sem fim…”) E Simon canta, “T’appressa, o figlia… io spiro… stringi… il morente… al cor!…” (“Te aproxima, oh! filha… estou morrendo… segura… este moribundo… em teu coração!…”)
Coro canta, “Sì – piange, piange… s’avvolge la natura in manto di dolor!” (“Sim – chora, chora… a natureza se envolve em manto de dor!”) Agonizando, doge determina aos senadores que se aproximem: “Senatori, sancite il voto estremo… questo serto ducal la fronte cinga di Gabriele Adorno! Tu, Fiesco, compi il mio voler…” (“Senadores, sancionem voto derradeiro… que a coroa ducal envolva cabeça de Gabriele Adorno! E tu, Fiesco, cumpre minha vontade…”) E, em último suspiro, Simon clama pela eterna amada, “Maria…” Então, desfalece e morre…

Comovidos, Maria e Gabriele ajoelham-se diante do corpo, “O padre!!”… E Fiesco, atendendo última vontade do Doge, dirige-se ao balcão, acompanhado por senadores e pajens. Então, anuncia: “Genovesi!… In Gabriele Adorno il vostro Doge or acclamate!” (“Genoveses!… Aclamem Gabriele Adorno, seu novo doge!”) O povo, indignado e confuso, reage: “No – Boccanegra!!!”… E Fiesco segue, “È morto… Pace per lui pregate!!…” (“Está morto… paz por ele, rogai!!…”) Sinos anunciam morte do grande líder plebeu – todos se compadecem e rogam: “Pace per lui… Pace per lui…”
– Cai o pano –
Entre os grandes trabalhos de Verdi, “Simon Boccanegra” privilegia as vozes graves, entre barítonos e baixos. E após estreia em Veneza, 12/03/1857, gradualmente ganhou os palcos do mundo… Em obra densa, composta aos 44 anos, Verdi adotou a música contínua, evitando os números isolados… E a revisão com Arrigo Boito, de 1881, ensejou cena da “Câmara do Conselho”, com nova música e de extremo vigor; música da maturidade de Verdi, composta após “Aída” e a grande “Messa da Requiem”…

De outro, a estreia, em Veneza, antecedia de dois anos a deflagração da “2ª guerra de independência”, com apoios da França e Prússia. E em dez anos, austríacos foram definitivamente derrotados e proclamada a monarquia italiana. Assim, temática política e apelo à unificação são marcantes. Também a relação pai e filha, algo extremamente sensível para Verdi, pois lhe evocava perda da família, quando jovem, entre 24 e 26 anos – esposa e dois filhos… Lembranças que, invariavelmente, o levavam às lágrimas, especialmente, a memória da filha… Assim, música de Amélia, único personagem feminino no drama, é pungente e marcante…
Além disto, parceria com Arrigo Boito reafirmava grandeza e talento do músico, quando era alvo de escárnio e agressivos ataques da vaguarda italiana. Assim, até os 80 anos, Verdi aceitou desafios e renovou-se, surpreendendo o mundo artístico com respostas, sobejamente, maiores que as críticas e rotulações recebidas…

Neste sentido, revisão de “Simon Boccanegra” teve caráter experimental. E, bem-sucedida, possibilitou, nos 12 anos seguintes, 1881/93, mergulho nas últimas obras-primas: “Otello” e “Falstaff”. Imenso percurso criativo, acompanhado por Giuseppina desde a 1ª ópera – “Oberto, conte di San Bonifacio”… E após a morte da esposa, aos 82 anos, 1897, Verdi não mais compôs para o teatro… Falecido aos 88 anos e adentrando o sec. XX, 1901, tornou-se autor de óperas mais encenado no mundo…
Após estreia em Veneza, no “La Fenice”, 12/03/1857, seguiram-se apresentações com sucesso em Reggio Emilia e Nápoles, 1858; em seguida, fracasso no “alla Scala”, em 1859, reiterando frustração de Verdi com o teatro milanês… No entanto, revisão com Boito ensejou nova montagem no “alla Scala”, em 1881, então, grande sucesso; depois, “Simon Boccanegra” foi retomada em Viena, em 1930; no “Metropolitan Opera”, New York, 1932; e novamente no “alla Scala”, em 1933. E seguiram-se, “Maggio musicale Fiorentino”, Florença, 1938; “Teatro Municipal”, Rio de Janeiro, 1942; “Sandler’s Wells Theatre”, Londres, 1948, e outras; gradualmente, consolidando-se no repertório…

Gravações de “Simon Boccanegra”
Vigésima primeira ópera de Verdi, considerando “Jerusalém – rifacimento de I Lombardi”, “Simon Boccanegra” ganhou os palcos do mundo. Entre os grandes trabalhos de Verdi, destacam-se os papéis masculinos, embora, papel de Amélia tenha particular importância dramática, brilhando nos ensembles e grandes concertatos. Seguem algumas gravações em CDs e DVDs:
- Gravação em CD – Une Music, 1939
“The Metropolitan Opera House Orchestra and Chorus”, direção Ettore Panizza
Solistas: Elisabeth Rethberg (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Lawrence Tibbett (Simon Boccanegra) – Ezio Pinza (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Giovanni Martinelli (Gabrieli Adorno) – Leonard Warren (Paolo Albiani) – Louis D’Angelo (Pietro)
New York, USA
- Gravação em LP/CD – CETRA, 1951
“Orchestra e Coro del Teatro dell’Opera di Roma della RAI”, direção Molinari-Pradelli
Solistas: Antonietta Stella (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Paolo Silveri (Simon Boccanegra) – Mario Petri (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Carlo Bergonzi (Gabrieli Adorno) – Walter Monachesi (Paolo Albiani) – Giorgio Giorgetti (Pietro)
Roma, Itália
Obs: Excelente produção, dado nível dos solistas, coro e orquestra!
- Gravação em CD – Naxos/EMI/Angel/Virgin/Imports, 1957
“Orchestra e Coro del Teatro dell’Opera di Roma”, direção Gabrieli Santini
Solistas: Victoria de los Angeles (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Tito Gobbi (Simon Boccanegra) – Boris Christoff (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Giuseppe Campora (Gabrieli Adorno) – Walter Monachesi (Paolo Albiani) – Paolo Dari (Pietro)
Roma, Itália

- Gravação em LP/CD – IDIS, Instituto Discográfico Italiano, 1958
“Orquestra e Coro do teatro San Carlo”, direção Mario Rossi
Solistas: Leyla Gencer (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Tito Gobbi (Simon Boccanegra) – Ferruccio Mazzoli (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Mirto Picchi (Gabrieli Adorno) – Walter Monachesi (Paolo Albiani) – Giovanni Omodeo (Pietro)
Nápoles, Itália
Obs: Excepcional produção, dado nível dos solistas, coro e orquestra!
- Gravação em LP/CD – Walhall, 1961
“Metropolitan Opera Chorus and Orchastra”, direção Nino Verchi
Solistas: Renata Tebaldi (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Frank Guarrera (Simon Boccanegra) – Giogio Tozzi (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Richard Tucker (Gabrieli Adorno) – Ezio Flagello (Paolo Albiani) – Norman Scott (Pietro)
Nova York, USA
- Gravação em LP/CD – Gala, 1961
“Wiener Philharmoniker”, direção Gianandrea Gavazzeni
Solistas: Leyla Gencer (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Tito Gobbi (Simon Boccanegra) – Giogio Tozzi (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Giuseppe Zampieri (Gabrieli Adorno) – Rolando Panerai (Paolo Albiani) – Vittorio Susca (Pietro)
“Chor der Wiener Staatsoper”, Salzburg, Áustria
- Vídeo youtube – Teatro Colón, 1964
“Orquestra e Coro do Teatro Colón”, direção Bruno Bartoletti
Solistas: Leyla Gencer (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Cornell MacNeil (Simon Boccanegra) – William Wilderman (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Carlo Cossutta (Gabrieli Adorno) – Gian-Piero Mastromei (Paolo Albiani) – Tulio Gagliardo (Pietro)
Buenos Aires, Argentina
- Áudio youtube – Metropolitan Opera, 1968
“Metropolitan Opera Chorus & Orchestra”, direção Francesco Molinari-Pradelli
Solistas: Gabriella Tucci (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Cornell MacNeil (Simon Boccanegra) – Jerome Hines (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – George Shirlei (Gabrieli Adorno) – Sherrill Milnes (Paolo Albiani) – Louis Sgarro (Pietro)
Nova York, USA
- Gravação em CD/LP – Myto Records, 1969
“Wiener Philharmoniker”, direção Josef Krips
Solistas: Gundula Janowitz (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Eberhard Wächter (Simon Boccanegra) – Nicolai Ghiaurov (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Carlo Cossutta (Gabrieli Adorno) – Robert Kerns (Paolo Albiani) – Tulio Gagliardo (Pietro)
“Chor der Wiener Staatsoper”, Viena, Áustria

- Gravação em CD – OPD/Opera d’Oro, 1972
“Orquestra e Coro do Teatro Alla Scala”, direção Claudio Abbado
Solistas: Mirella Freni (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Piero Cappuccilli (Simon Boccanegra) – Nicolai Ghiaurov (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Gianni Raimondi (Gabrieli Adorno) – Felice Schiavi (Paolo Albiani) – Giovanni Foiani (Pietro)
“Teatro Alla Scala”, Milão, Itália
- Video youtube – “San Francisco Opera”, 1975
“San Francisco Opera Orchestra and Chorus”, direção Paolo Peloso
Solistas: Kiri Te Kanawa (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Ingvar Wixell (Simon Boccanegra) – Martti Talvela (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Giorgio Merighi (Gabrieli Adorno) – Allan Monk (Paolo Albiani) – James Courtney (Pietro)
San Francisco, USA
- Vídeo youtube, 1976
“Orquestra do Teatro Alla Scala”, direção Claudio Abbado
Solistas: Katia Ricciarelli (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Piero Cappuccilli (Simon Boccanegra) – Ruggero Raimondi (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Veriano Luchetti (Gabrieli Adorno) – Felipe Schiavi (Paolo Albiani) – Konstantin Sfiris (Pietro)
“Coro do Teatro Alla Scala”, direção Romano Gandolfi
“Teatro Alla Scala”, Milão, Itália
- Gravação em DVD – VAI, 1976
“NHK Symphony Orchestra”, direção Oliviero de Fabritis
Solistas: Katia Ricciarelli (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Piero Cappuccilli (Simon Boccanegra) – Nicolai Ghiaurov (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Giorgiu Merighi (Gabrieli Adorno) – Lorenzo Sacomani (Paolo Albiani) – Paolo Mazzotta (Pietro).
- Vídeo youtube, 1978
“Orquestra do Teatro Alla Scala”, direção Claudio Abbado
Solistas: Mirella Freni (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Piero Cappuccilli (Simon Boccanegra) – Nicolai Ghiaurov (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Veriano Luchetti (Gabrieli Adorno) – Felice Schiavi (Paolo Albiani) – Giovanni Foiani (Pietro)
“Coro do Teatro Alla Scala”, direção Romano Gandolfi
“Teatro Alla Scala”, Milão, Itália
Obs: Produção nas comemorações do bicentenário do teatro “Alla Scala” (1778-1978).
- Gravação em CD/LP – Deutsche Grammophon, 1979
“Orquestra do Teatro Alla Scala”, direção Claudio Abbado
Solistas: Mirella Freni (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Piero Cappuccilli (Simon Boccanegra) – Nicolai Ghiaurov (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Jose Carreras (Gabrieli Adorno) – José van Dam (Paolo Albiani) – Giovanni Foiani (Pietro)
“Coro do Teatro Alla Scala”, direção Romano Gandolfi
“Teatro Alla Scala”, Milão, Itália
Obs: Reconhecida produção, dado nível dos solistas, direção, coro e orquestra.
- Gravação em DVD – Video, 1984
“Metropolitan Opera Chorus & Orchestra”, direção James Levine
Solistas: Anna Tomowa-Sintow (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Sherrill Milnes (Simon Boccanegra) – Paul Plishka (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Vasile Moldoveanu (Gabrieli Adorno) – Richard J. Clark (Paolo Albiani) – James Courtney (Pietro)
Nova York, USA
- Gravação em CD/LP – Decca, 1989
“Orquestra do Teatro Alla Scala”, direção George Solti
Solistas: Kiri Te Kanawa (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Leo Nucci (Simon Boccanegra) – Paata Burchuladze (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Giacomo Aragall (Gabrieli Adorno) – Paolo Coni (Paolo Albiani) – Carlo Colomabara (Pietro)
“Coro do Teatro Alla Scala”, direção Giuliu Bertola
“Teatro Alla Scala”, Milão, Itália
- Gravação em DVD – Deutsche Grammophon, 1995
“Metropolitan Opera Orchestra and Chorus”, direção James Levine
Solistas: Kiri Te Kanawa (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Vladimir Chernov (Simon Boccanegra) – Robert Lloyd (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Placido Domingo (Gabrieli Adorno) – Bruno Pola (Paolo Albiani) – Hao Jiang Tian (Pietro)
Nova York, USA
- Gravação em LP/CD – RCA Red Seal, BMG Classics, ORF, 1998
“Wiener Philharmoniker”, direção Claudio Abbado
Solistas: Katia Ricciarelli (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Renato Bruson (Simon Boccanegra) – Ruggero Raimondi (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Veriano Luchetti (Gabrieli Adorno) – Felipe Schiavi (Paolo Albiani) – Konstantin Sfiris (Pietro)
“Chor der Wiener Staatsoper”, Viena, Áustria
- Video youtube – “San Francisco Opera”, 2001
“San Francisco Opera Orchestra and Chorus”, direção Donald Runnicles
Solistas: Carol Vaness (Maria Boccanegra ou Amélia Grimaldi) – Paolo Gavanelli (Simon Boccanegra) – Samuel Ramey (Jacopo Fiesco ou Andrea Grimaldi) – Carlo Ventre (Gabrieli Adorno) – Nikolai Putilin (Paolo Albiani) – Raymond Aceto (Pietro)
San Francisco, USA
– Download no PQP Bach
Para download e compartilhamento da música de Verdi em “Simon Boccanegra”, sugerimos gravação da “Orquestra e Coro do teatro San Carlo”, de Nápoles, direção Mario Rossi, com Leyla Gencer, Tito Gobbi, Ferrucio Mazzoli, Mirto Picchi e outros – registro pelo selo “IDIS, Instituto Discográfico Italiano”, de 1958:

Interpretando “Amélia Grimaldi (Maria Boccanegra)”, grande soprano turca, Leyla Gencer, nascida nos arredores de Istambul, estudou com o soprano italiano Giannina Arangi-Lombardi. Então, cantou no “Coro Estatal da Turquia” e estreou como “Santuzza”, em “Cavalleria Rusticana”, de Mascagni, 1950…
Seu repertório incluiu mais de 70 personagens e a estreia internacional ocorreu no teatro “San Carlo”, de Nápoles, em “Madamma Butterfly”, de Puccini; depois, em “Eugene Onegin”, de Tchaikovsky. Então, estreou no “alla Scala”, de Milão, em “Diálogos das Carmelitas”, de Francis Poulenc, 1957…

Conhecida como “La diva turca” ou “La regina”, notabilizou-se pela cor, extensão e amplos recursos vocais; ao que agregou talento de atriz, sendo considerada “uma das vozes mais arrebatadoras de todos tempos” – conforme nota do teatro “alla Scala”, quando de seu falecimento, em 2008… Da mesma geração de Maria Callas e Renata Tebaldi, deixou poucos registros fonográficos, apesar da longa carreira – mais de 40 anos… Pela intensa carga dramática, notabilizou-se em interpretações de Donizetti e Verdi…
Além de Gencer, a produção conta com renomados intérpretes. E realizando papel de “Boccanegra”, Tito Gobbi, barítono italiano, nascido em Bassano del Grappa. Ainda jovem, Tito Gobbi abandonou os estudos de direito para dedicar-se, inteiramente, ao canto lírico e, ao longo da carreira, realizou mais de cem papéis, incluindo obras raras e contemporâneas, como “Wozzeck”, de Alban Berg; além do repertório permanente e tradicional, com óperas de Rossini, Verdi e Puccini…

Gobbi também deixou registros para o cinema e dividiu o palco inúmeras vezes com Maria Callas, cujas amizade e parceria resultaram na derradeira gravação da diva greco-americana – cena do 2° ato da ópera “Tosca”, de Puccini, “morte de Scarpia”…
E como “Jacopo Fiesco (Andrea Grimaldi)”, personagem complexo e ferrenho opositor político de “Simon Boccanegra”, o talentoso baixo italiano, Ferruccio Mazzoli, nascido em Budrico. De grandes recursos vocais e ampla carreira internacional, Mazzoli realizou muitos dos principais papéis líricos, em óperas de Rossini, Bellini, Verdi e Boito….

Interpretando “Gabriele Adorno”, notável tenor dramático italiano, Mirto Picchi, nascido em San Mauro, perto de Florença. Mirto Picchi estudou em Milão, onde estreou como “Radamés”, em “Aída. E após, seguiram-se “Andrea Chenier”, de Giordano, “Fidelio”, de Beethoven, “Lucrezia Borgia”, de Donizetti, “The Rake’s Progress”, Stravinsky, “Carmen”, de Bizet, e muitas outras. Mirto Picchi destacou-se em óperas de Verdi e Puccini. E atuando com grandes solistas e diretores de seu tempo, realizou maior parte da carreira na Itália…
Na direção da “Orquestra do teatro San Carlo”, Mario Rossi, credenciado maestro italiano, nascido em Biletto. Formado em composição, com Ottorino Respighi, destacou-se tanto no repertório padrão, quanto no resgate de óperas antigas, como “Il ritorno d’Ulisse in Patria”, de Monteverdi; “Il filosofo de Campagna”, de Galuppi; e “La buona Figliona”, de Piccini; além de concertos sinfônicos com prestigiados solistas internacionais, como Sviatoslav Richter e Arturo Benedetti Michelangeli…

Em obras do sec. XX, dirigiu estreia de “Antonio e Cleópatra”, de Malipiero… E na Itália, Rossi esteve à frente do “Maggio musicale Fiorentino”, 1937/46; e por 23 anos, regeu a “Orquestra RAI”, de Turin, no Piemonte, elevando-a em nível internacional. Nesta gravação, pelo selo IDIS, realiza notável registro, tanto pela densidade dramática, quanto pela qualidade sonora…
Por fim, além dos notáveis solistas e direção, cumprimentamos e aplaudimos os excelentes “Coro e orquestra do teatro San Carlo”, de Nápoles, Itália, que realizaram esta primorosa gravação, de 1958, e permitiram seguirmos apreciando e celebrando a música de Verdi!

- Para download no PQP Bach: (BAIXAR AQUI)
Sugerimos também:
Gravação youtube – “Orchestra e Coro del Teatro dell’Opera di Roma della RAI”, direção Molinari-Pradelli, com Antonietta Stella (soprano) – Paolo Silveri (barítono) – Mario Petri (baixo) – Carlo Bergonzi (tenor) – Walter Monachesi (barítono) – Giorgio Giorgetti (baixo). Roma, 1951: (BAIXAR AQUI)
Gravação youtube – “Orquestra do Teatro Alla Scala”, direção Claudio Abbado, com Katia Ricciarelli (soprano) – Piero Cappuccilli (barítono) – Ruggero Raimondi (baixo-barítono) – Veriano Luchetti (tenor) – Felipe Schiavi (barítono) – Konstantin Sfiris (baixo). “Teatro Alla Scala”, Milão, 1976: (BAIXAR AQUI)
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“In memoriam de dois grandes amigos”
Alex DeLarge
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