PQP acha Scott Ross (1951–1989) um mão pesada. Suas interpretações têm poucas nuances e expressão. PQP pensa que estas Suítes ainda aguardam por mais carinho. Algumas são muito belas.
Porém, vejam só o que escreveu em 2010 o postador original, Gabriel Clarinet: compostas por Handel por volta de 1720, essas Suites para Cravo são interessantes e ao mesmo tempo intrigantes. Dentro delas você pode encontrar desde fugas até 3 ou 4 variações dentro de uma mesma suite. É claro que esse é o estilo da época. Mas para mim, tão acostumado com Allegri, Scherzi, Presti, de repente dar de cara com uma construção dessas é meio difícil de aceitar. Todo esse dilema acaba quando você começa a ouvir. Daí tudo se torna céu. O interessante é que Handel explora ao máximo toda a sonoridade e combinações de sons do cravo, principalmente nas fugas. É claro que não se compara as fugas de Bach, mas ainda assim é muito bom.
Georg Friedrich Händel (1685-1759): 8 Suites para Cravo
Disco 1
01 – Série de 1720. Suíte I em lá maior – I. Prélude
02 – Série de 1720. Suíte I em lá maior – II. Allemande
03 – Série de 1720. Suíte I em lá maior – III. Courante
04 – Série de 1720. Suíte I em lá maior – IV. Gigue
05 – Série de 1720. Suíte II em fá maior – I. Adagio
06 – Série de 1720. Suíte II em fá maior – II. Allegro
07 – Série de 1720. Suíte II em fá maior – III. Adagio
08 – Série de 1720. Suíte II em fá maior – IV. Fugue
09 – Série de 1720. Suíte III em ré menor – I. Prélude
10 – Série de 1720. Suíte III em ré menor – II. Fugue
11 – Série de 1720. Suíte III em ré menor – III. Allemande
12 – Série de 1720. Suíte III em ré menor – IV. Courante
13 – Série de 1720. Suíte III em ré menor – V. Air
14 – Série de 1720. Suíte III em ré menor – VI. Variation 1
15 – Série de 1720. Suíte III em ré menor – VII. Variation 2
16 – Série de 1720. Suíte III em ré menor – VIII. Variation 3
17 – Série de 1720. Suíte III em ré menor – IX. Variation 4
18 – Série de 1720. Suíte III em ré menor – X. Variation 5
19 – Série de 1720. Suíte III em ré menor – XI. Presto
20 – Série de 1720. Suíte IV em mi menor – I. Fugue
21 – Série de 1720. Suíte IV em mi menor – II. Allemande
22 – Série de 1720. Suíte IV em mi menor – III. Courante
23 – Série de 1720. Suíte IV em mi menor – IV. Sarabande
24 – Série de 1720. Suíte IV em mi menor – V. Gigue
Disco 2
01 – Série de 1720. Suíte V em mi maior – I. Prélude
02 – Série de 1720. Suíte V em mi maior – II. Allemande
03 – Série de 1720. Suíte V em mi maior – III. Courante
04 – Série de 1720. Suíte V em mi maior – IV. Air con variazioni
05 – Série de 1720. Suíte V em mi maior – V. Variation 1
06 – Série de 1720. Suíte V em mi maior – VI. Variation 2
07 – Série de 1720. Suíte V em mi maior – VII. Variation 3
08 – Série de 1720. Suíte V em mi maior – VIII. Variation 4
09 – Série de 1720. Suíte V em mi maior – IX. Variation 5
10 – Série de 1720. Suíte VI em fá sustenido maior – I. Prélude
11 – Série de 1720. Suíte VI em fá sustenido maior – II. Lárgo – Fugue
12 – Série de 1720. Suíte VI em fá sustenido maior – III. Gigue
13 – Série de 1720. Suíte VII em sol menor – I. Ouverture
14 – Série de 1720. Suíte VII em sol menor – II. Andante
15 – Série de 1720. Suíte VII em sol menor – III. Allegro
16 – Série de 1720. Suíte VII em sol menor – IV. Sarabande
17 – Série de 1720. Suíte VII em sol menor – V. Gigue
18 – Série de 1720. Suíte VII em sol menor – VI. Passacaglia
19 – Série de 1720. Suíte VIII em fá menor – I. Prélude
20 – Série de 1720. Suíte VIII em fá menor – II. Fuga
21 – Série de 1720. Suíte VIII em fá menor – III. Allemande
22 – Série de 1720. Suíte VIII em fá menor – IV. Courante
23 – Série de 1720. Suíte VIII em fá menor – V. Gigue
Dou continuidade aqui ao diálogo transcrito e explicado em post anterior:
… Não posso dizer que minha vida em Nova York tenha sido ruim. Não faltou sucesso pra meus ragtimes, nem um casamento novo e melhor. O problema foi minha ópera, Treemonisha, que ninguém queria ouvir.
… Foram anos e anos de composição. Não era ragtime, não era comédia: era uma ópera séria, com grandes partes de coro escritas no melhor contraponto… e ninguém queria ouvir. Um negro podia compor ragtime, diziam; que quisesse escrever ópera era muita pretensão.
… Todos os meus esforços foram em vão. O desgosto apertou o gatilho da doença, e fui perdendo a razão. Fui internado, e morri sem ouvir Treemonisha soando no ar nem ao menos uma vez.
Músicos que eram, os membros do grupo compreendiam bem. Por uns instantes só alguns suspiros furaram o silêncio, até que o próprio Scott Joplin sorriu e disse:
– Mas no fundo estou vingado. Sessenta anos depois de minha morte Treemonisha foi montada, e com sucesso. Foi gravada em disco, e o mundo todo pôde conhecer.
– E é uma bela ópera, posso garantir – disse um dos músicos. – Seu estilo é único; não há no mundo obra que se pareça com ela.
Já outro deles falou assim:
– Sou amigo de Gunther Schuller, o musicólogo que recuperou a partitura e regeu a montagem. Como se vê no nome, é de origem alemã, como seu primeiro professor. Não lhe parece curioso?
– Sem dúvida. É um traço bem curioso do meu destino.
– Isso não rouba a pureza negra da sua música?
– Esse tipo de idéia é uma grande bobagem. Neste mundo há lugar pra tudo: para a expressão de todas as culturas “em estado puro”, e também pra todas as combinações que se possa imaginar.
… As coisas mais ricas, que abrem caminhos novos para a humanidade, acontecem onde os diferentes se encontram e, em vez de brigar ou de um calar a boca do outro, resolvem cantar juntos, com diferença e tudo. E aí, de repente, sem que ninguém possa prever como será, um caminho novo nasceu!
“Bravo, isso mesmo, é isso aí!”, aplaudiu todo o grupo – e nossos amigos sentiram que era hora de prosseguir.
Como dito no post anterior, o diálogo procede do livro O dia em que Túlio descobriu a África (R.Rickli, 1997, esgotado, disponível em PDF AQUI). Cabe registrar que a orquestração realizada pelo próprio Scott Joplin nunca foi encontrada, apenas a redução para piano cuja impressão ele pagou do próprio bolso. Gunther Schuller, autor de estudos clássicos e aprofundados sobre as origens do jazz, foi o primeiro a orquestrá-la e regeu sua estréia em 1972 – produção que foi lançada em vinil em 1976, e é a reproduzida aqui. De lá para cá foram feitas outras orquestrações e gravações, mas não cheguei a conhecer.
O arquivo postado inclui reprodução de capas e o libreto completo da ópera – também da autoria de Joplin, e por isso não vejo necessidade de maiores detalhes aqui.
Scott Joplin: Treemonisha – ópera em 3 atos (1910)
para solistas, coro, orquestra e ballet.
Gunther Schuller regendo o coro e orquestra da Houston Grand Opera Production
Carmen Balthrop, Betty Allen, Curtis Rayam: solistas principais
Gravação original: Deutsche Grammophon, 1976
Para apresentar este post e o seguinte, permitam-me transcrever aqui um diálogo ficcional entre um grupo de músicos e dois personagens reais de diferentes séculos: o Chevalier de Saint-George (de quem postei aqui 6 CDs não faz muito tempo) e o estadunidense Scott Joplin (1867-1917), de um livro com intenções paradidáticas (mais detalhes no final).
– … permita-me dizer, Monsieur le Chevalier: a fama é uma senhora muito injusta. Escolhe alguns nomes para perpetuar, e deixa outros iguais ou melhores no esquecimento. É uma barbaridade que seus concertos sejam tão pouco executados nos tempos modernos, pois não são em nada inferiores aos de Mozart e Haydn.
– Mais non, Monsieur! Agradeço sua intenção de me consolar, mas evidentemente o que o senhor diz não pode ser verdade! – protestou o Cavaleiro.
– Jamais buscaria consolá-lo com falsidades, Chevalier! É minha opinião sincera, e quem é do ofício e conhece sua música só pode concordar, estou certo.
“Sim, sim, é verdade”, apoiaram vários dos presentes, para evidente alegria do Cavaleiro. Era porém muito educado para permitir que a própria glória ocupasse mais que um momento na roda de amigos, de modo que logo desviou:
– Mas parece que a sua vida também foi das mais interessantes, Mr. Joplin! Gostaríamos muito de ouvi-lo!
– Nem de longe tão interessante como a sua, Chevalier. E, sinto dizer, não muito feliz.
– Ora – interveio um músico moderno – sua música teve grande sucesso popular, tanto na sua época quanto anos mais tarde. Quem não conhece a famosíssima The Entertainer, pelo menos da trilha sonora do filme Golpe de Mestre? – Cantarolou:
– Justamente: todo mundo conhece meus “ragtimes”, alegres, dançantes, mas a música de maior fôlego, quem conhece? Minhas óperas, quem quis ouvir?
– Fale um pouco da sua vida, Mr. Joplin. Assim poderemos entender melhor.
– Está bem, já que insistem…
… Nasci em 1868 no interior do Texas, respirando música: meu pai, ex-escravo, tocava violino – country music, bem entendido – enquanto minha mãe tocava banjo e cantava. Desde o início, porém, foi o teclado que me fascinou: onde existisse um piano na vizinhança, lá ia eu investigar.
… Minha mãe dava todo apoio que podia. Quando ficou sozinha e teve de se empregar em casas de família pra nos sustentar, pedia licença pra eu estudar no piano da patroa…
Por um instante tremulou na lembrança de Túlio a figura de sua própria mãe, Dona Aurora, e os olhos ameaçaram se molhar.
– E parece que o barulho de minhas experiências chamou atenção, e foi assim que o Professor apareceu. Era um alemão excêntrico que vivia lá em Texarkana, e me ofereceu aulas de piano e harmonia. Na verdade deu mais: deu pistas em todas as áreas do mundo do conhecimento, explodindo os limites do acanhado horizonte de Texarkana.
… Não que minha vida tenha ficado cosmopolita da noite pro dia! Adolescente, saí tocando pelos bares, às vezes pelos piores lugares, para ter o que comer.
Túlio ouviu na cabeça a voz de Milton Nascimento cantando: “foi nos bailes da vida, ou num bar em troca de pão / que muita gente boa pôs o pé na profissão / de tocar um instrumento e de cantar / não se importando se quem pagou quis ouvir…”
– De vila em vila, cidade em cidade, fui chegando às maiores: Saint Louis, Chicago… Em Sedalia fiquei alguns anos e consegui me matricular em cursos de harmonia avançada e composição. Vendia aqui e ali meus ragtimes, até que em 1899 o Maple Leaf Rag explodiu no mundo todo. Virei o “Rei do Ragtime”. Casei, podia estar tranqüilo pra sempre.
… Mas eu queria mesmo era escrever para o palco, realizar coisas de fôlego. Achei que agora as portas estariam abertas, mas… mesmo sendo o Rei do Ragtime, de todos os lados só ouvia “não”.
… A muito custo montei uma pequena ópera-rag, cujo manuscrito depois se perdeu. Minha filha morreu, meu casamento acabou, saí pelo mundo de novo, fui parar em Nova York, onde vivi até 1917 – quer dizer, pelo resto da vida.
O diálogo (do livro O dia em que Túlio descobriu a África, de R.Rickli, 1997, esgotado, disponível em PDF AQUI) prosseguirá no post seguinte. Por enquanto deixo vocês com uma seleção de “piano rags”, ou ragtimes, tocados por Joshua Rifkin – mas não sem advertir que tenho certeza de que a música do “Ernesto Nazareth dos Estadis Unidos” pode ser tocada com muito mais bossa.
Não se trata da velocidade: Scott Joplin passou a vida advertindo os compradores de suas partituras contra a tentação de tocar acelerado; “o tempo do ragtime não é rápido”, insistia sempre. O branco Rifkin segue o conselho de Joplin quanto a isso, mas afora isso toca tudo inacreditavelmente igual. Só que essa é a única versão que consegui, e quero crer que “ruim com ela, pior sem ela”, espero que vocês concordem.
Joshua Rifkin plays Scott Joplin’a piano rags
01 Maple leaf rag
02 The entertainer
03 The ragtime dance
04 Gladiolous rag
05 Fig leaf rag
06 Scott Joplin’s new rag
07 Euphonic sounds
08 Elite syncopations
09 Bethena
10 Paragon rag
11 Solace
12 Pineapple rag
13 Weeping willow rag
14 The cascades
15 Country club
16 Stoptime rag
17 Magnetic rag
Os Sete Pecados Capitais de Weill e Brecht (cujo nome completo é Os Sete Pecados Capitais da Classe Média) é uma obra bastante conhecida e divertida. Nos mostra como a família burguesa foi transformada num núcleo econômico, onde a moral cristã muitas vezes conflita com os interesses e necessidades econômicas.
Como dizem Marx e Engels no Manifesto Comunista:
O palavreado burguês acerca da família e da educação, acerca da relação íntima de pais e filhos, torna-se tanto mais repugnante quanto mais, em consequência da grande indústria, todos os laços de família dos proletários são rasgados e os seus filhos transformados em simples artigos de comércio e instrumentos de trabalho.
Podemos estender isso à classe média, principalmente aquela que está próxima da pobreza mas quer ascender por via de fazer algum dos filhos enriquecer. As relações entre familiares acaba se tornando puramente instrumental e funcional (em função do capital), onde a função dos pais para o filho é prover dinheiro para que a criança/adolescente possa consumir, a função do homem para a família é prover dinheiro para a “sustentação” da casa, e a função da mulher para o lar no geral é realizar todo o trabalho doméstico improdutivo e não remunerado para a manutenção da própria força de trabalho do homem (dar comida e um lar onde ele possa descansar para poder trabalhar no dia seguinte), e da força de trabalho futura (a criança). Dessa forma, todo aquele indivíduo que deixa de exercer sua função econômica no núcleo familiar, acaba por ser descartado. E se se mantém em suas funções, se torna cada vez mais alienado de si.
Kafka percebeu essas relações instrumentais e seus males muito bem e fez uma ótima metáfora em A metamorfose. No romance, um caixeiro viajante de nome Gregor que está cansado de trabalhar para sustentar a família, um dia acorda e sê vê metamorfoseado num inseto. A primeira coisa que pensa Gregor é que se atrasará para o trabalho. Isso demonstra bem duas coisas: o processo de alienação a que ele está submetido pelo trabalho, e a monstruosidade em que ele se torna ao se ver cansado de uma relação alienante a que ele não pode fugir.
Weill tinha bem em mente essa relação quando em Paris, a convite de escrever uma obra para uma companhia de dança, resolve compor a obra. Brecht o ajuda e escreve o libreto. Os sete pecados retratados são pecados do ponto de uma classe específica, a classe média, que verá como pecado qualquer ação que vá contra o objetivo de manter seu padrão de vida e a ordem social em que vive.
Cada movimento representa um pecado diferente, onde Anna (a protagonista), viaja por uma nova cidade. Cada movimento também tem um andamento de dança distinto: valsa, furiant[1], foxtrote[2], shimmy[3], dixieland[4] e tarantella[5]. Essas danças não são ocasionais, mas revelam um tipo de dança presente em cada cidade pelo qual Anna passa (Memphis, Los Angeles, Philadelphia, Boston, Baltimore, San Francisco). Na versão para teatro, o papel de Anna é dividido em dois, onde uma canta e a outra dança. Isso é porque ela tem duas personalidades, onde a “principal” é representada pela Anna boazinha e ingênua (a dançarina), que é quem aparentemente cai nos diversos pecados de cada movimento/cidade/dança. Já a outra Anna (cantora), seu alter ego, é sarcástica e devotada ao seu papel: instigar sua outra personalidade, da forma que for necessária, a prover dinheiro para a família pensando em seu objetivo: construir uma pequena casinha às margens do Mississípi. A divisão entre as duas personalidades poderia ser descrita como o pensamento de um trabalhador e de um burguês, ou o pensamento alienado e a razão instrumental. Ou seja, uma mentalidade que recebe ordem e está sujeita aos “vícios” do tipo de vida que leva, e o outro pensamento que está preocupado com os fins que deve tomar, independentemente de suas consequências sociais, éticas ou morais.
Para ilustrar melhor a história, recomendo a vocês que vejam essa versão feita para TV:
Ficam evidentes os pecados a que a Anna ingênua é tentada: Ter preguiça de ser explorada, ter orgulho de não mostrar seu corpo nu para ganhar dinheiro, ter raiva das injustiças que presencia em Los Angeles, ter a gula de querer comer quando está com fome devido a um regime segundo um contrato, ter a luxuria de preferir amar e dar dinheiro ao homem que ama em vez de vender o corpo ao rico que a paga bem, ter a ganância de não ficar com nenhum dinheiro nem poder amar ninguém e ter a inveja daqueles que não precisam se sujeitar a tudo isso. Graças ao seu sábio alter ego, por sete anos, em sete cidades diferentes, Anna resiste a estes pecados! Do ponto de vista da classe média americana da época, seria totalmente razoável praticar qualquer um desses atos para fazer dinheiro (aceitar um emprego precário lavando louça ou exibindo o corpo em boates, fazer regime para atingir um padrão de beleza, ficar com o homem mais rico em vez daquele a que se ama, ignorar as injustiças sociais que vê na rua diariamente, se contentar com as coisas como elas são, etc.).
Também fica claro para nós o porquê da família ter enviado a Anna para fazer dinheiro e não seus dois irmãos: o corpo de uma mulher jovem e esbelta numa sociedade como a americana do século XX é uma peça de valor comercial, e esse corpo, tão proibitivo no cristianismo, deverá ser profanado das formas mais violentas possíveis pelo mercado, sendo vendido parcial e/ou integralmente das mais diversas formas possíveis.
Essa condição da mulher como mercadoria infelizmente não se limitou apenas ao contexto da classe média americana do século XX, mas foi regra desde pelo menos o século XIX, e ainda perdura em nossos dias. Dizem Marx e Engels no Manifesto:
O burguês vê na mulher um mero instrumento de produção. Ouve dizer que os instrumentos de produção devem ser explorados comunitariamente, e naturalmente não pode pensar senão que a comunidade virá igualmente a ser o destino das mulheres.
Não suspeita que se trata precisamente de suprimir a posição das mulheres como meros instrumentos de produção.
Neste sentido, de suprimir a condição da mulher como meios de produção, é que devemos aproveitar um ano como o nosso, de 2017, onde faz 100 anos da Revolução Russa para pensar a emancipação feminina novamente. Pois foi na Rússia revolucionária onde pela primeira vez na história as mulheres tiveram direito iguais explicitamente declarados na constituição, tiveram direito a igualdade de direitos políticos e sociais no geral. Ao criarem as creches, restaurantes e lavanderias públicas conseguiram socializar o trabalho doméstico o que ajudou a libertar a mulher desse trabalho para que pudesse participar da vida pública tanto quanto o homem. A família passou a ser baseada principalmente no amor livre, e não tanto na dependência econômica. Pelo menos assim se formava a sociedade soviética russa em sua primeira década após a revolução.
—
Trago duas interpretações dessa obra, a principal e mais clássica é feita por Lotte Lenya, que era mulher do próprio Kurt Weill. Talvez pelo fato de conhecer bem as intenções de Weill, ela faz uma interpretação que nos lembra muito as cantoras dos cabaré de Berlim ou Paris, muito populares nos anos 20 e 30. Esse estilo de cabaré (ou kabarett, no original), foi muito utilizado por Weill em suas obras, e falarei mais disso no próximo post. A voz estridente nos parece ligeiramente “vulgar” e nos remete à tudo que havia de mais mundano e profano dos anos 20 e 30. As ironias latentes da própria história – além das diferenças de personalidade – ficam evidentes em na interpretação de Lenya. A outra interpretação é de Gisela May, que embora não saiba ser tão teatral em sua voz, tem um timbre bastante agradável e que dá um tom levemente épico e dramático à história, e que igualmente sabe interpretar as diferentes personalidades em sua voz.
Notas:
[1] Rápida dança em compasso ternário do folclore da Boêmia. (DOURADO, 2004).
[2] Variada e alegre dança norte-americana de salão para casais em compasso binário e às vezes quartenário, surgiu no início do século XX. Originou-se do ragtime e é caracterizado por ritmos sincopados e passos corridos. (DOURADO, 2004).
[3] Dança em compasso binário de negros norte-americanos do início do século XX, guardava semelhanças com o ragtime e tornou-se popular também entre os brancos em shows de cabarés, como as Zigfield follies (Folias de Siegfield). (DOURADO, 2004).
[4] Gênero jazzístico criado por músicos brancos de Nova Orleans cuja execução era caracterizada principalmente por pequenos conjuntos ou combos. De maneira genérica, refere-se ao estilo de jazz inspirado naquele estilo, executado em toda a região sulina e até os dias de hoje cultivado entre aficionados nos EUA e no mundo inteiro. A palavra tem origem na música Dixie, de Daniel Emmett, precursor dos negros ministrels (menestréis negros) norte-americanos, cujo tema foi adotado como verdadeiro hino na Guerra de Secessão. (DOURADO, 2004)
[5] Dança rápida em compasso 6/8 geralmente acompanhada por pandeiro e castanholas, é típica de regiões interioranas da Itália, como Taranto. No século XVII supunha-se que o andamento ágil da tarantela serviria para expulsar os demônios que as tarântulas inoculavam nos corpos de suas vítimas. Na música romântica, foi empregada por compositores como Bottesini, Weber, Liszt, Wieniawski, Glière e Chopin. (DOURADO, 2004).
Bibliografia:
DOURADO, Henrique Autran. Dicionário de termos e expressões da música. – São Paulo: Editora 34, 2004.
HOBSBAWM, Eric J. História Social do Jazz. – São Paulo: Paz e Terra, 2016.
MARX, Karl. Manifesto do Partido Comunista. Edições Avante!. Disponível em: Arquivo Marxista Online.
Kurt Weill (1900-1950): Die sieben Todsünden (Os sete pecados capitais)
CD 1: Lotte Lenya
Die sieben Todsünden (The Seven Deadly Sins)
01 Prolog (Andante sostenuto)
02 Faulheit (Allegro vivace)
03 Stolz (Allegretto, quasi andantino – Schneller Walzer)
04 Zorn (Molto agitato)
05 Völlerei (Largo)
06 Unzucht (Moderato)
07 Habsucht (Allegro giusto)
08 Neid (Allegro non troppo – Alla marcia un poco tenuto)
09 Epilog (Andante sostenuto)
Lotte Lenya
Ernst Poettgen
Fritz Göllnitz
Julius Katona
Sigmund Roth
Die Dreigroschenoper (The Threepenny Opera)
10 Moritat vom Mackie Messer
11 Barbara-Song
12 Seeräuberjenny (Pirate Jenny)
The Rise and Fall of the City of Mahagonny
13 Havana-Lied
14 Alabama Song
15 Denn Wie Man Sich Bettet
Happy End
16 Bilbao-Song
17 Surabaya-Johnny
18 Was die Herren Matrosen sagen (The Sailor’s Tango)
Berlin Requiem
19 Vom ertrunkenen Mädchen (Ballad of the Drowned Girl)
The Silverlake, A Winter’s Tale
20 Lied der Fennimore (I Am a Poor Relative)
21 Cäsars Tod (Ballad of Caesar)
Die sieben Todsünden
01 Die sieben Todsünden – 1. Prolog
02 Die sieben Todsünden – 2. Faulheit (Sloth)
03 Die sieben Todsünden – 3. Stolz (Pride)
04 Die sieben Todsünden – 4. Zorn (Wrath)
05 Die sieben Todsünden – 5. Völlerei (Gluttony)
06 Die sieben Todsünden – 6. Unzucht (Lust)
07 Die sieben Todsünden – 7. Habsucht (Greed)
08 Die sieben Todsünden – 8. Neid (Envy)
09 Die sieben Todsünden – 9. Epilog
Gisela May
Peter Schreier, tenor
Hans-Joachim Rotzsch, tenor
Günther Leib, Barítono
Herman Christian Polster, baixo
Rundfunk-Sinfonie-Orchester Leipzig
Herbert Kegel, regente
Berliner Requiem
10 Vom ertrunkenen Mädchen
Gisela May
Studio-Männerchor
Studio-Orchester
Henry Krtschil, regente
Happy End
11 Surabaya Johnny
12 Bilbao-Song
13 Was die Herren Matrosen sagen
14 Ballade von der Höllen-Lili
Aufstieg und Fall der Stadt Mahagonny
15 Havanna Song
16 Wie man sich bettet, so liegt man
Die Dreigroschenoper
17 Barbara Song
18 Song von der sexuellen Hörigkeit
19 Seeräuber-Jenny
Gisela May
Studio-Orchester
Heinz Rögner, regente
Berliner Requiem
20 Zu Potsdam unter den Eichen
Gisela May
Studio-Orchester
Henry Krtschil, adaptação e regente
Estes dias o compadre Vassily deixou todo mundo boquiaberto ao comentar que um dia recebeu um email do pianista Murray Perahia, querendo informações sobre o grande Antônio Guedes Barbosa, que Vassily está concedendo a graça de ressuscitar para nossos ouvidos aqui no blog.
Pois bem: desde aquele dia não parei de pensar que a única postagem que o Monge Ranulfus fez envolvendo Murray Perahia estava fora do ar há muito tempo – e que, uma vez a tenham conhecido, xs senhorxs hão de convir que isso foi um grave pecado de sua parte!
Assim, o monge resolveu aproveitar o domingo para se penitenciar, mesmo se um tanto pela metade, pois no momento pode apenas revalidar o link, e não acrescentar à postagem um texto decente – o mesmo que, coincidentemente, aconteceu há mais de cinco anos, quando da postagem original. Mas pra não dizer que não falei das obras, vamos lá: duas ou três palavras:
Tanto as Variações do 3º quanto a Sonata do 4º Grande B existem também em versões com orquestra (no caso de Bartók, na forma do Concerto para 2 pianos e orquestra, de 1940), mas foram compostas originalmente na forma para dois pianos que se ouve aqui.
As variações de Brahms são tradicionalmente ditas “sobre um tema de Haydn”, mas não é preciso ouvir mais que um compasso para perceber que essa atribuição deve ser questionada, como de fato tem sido. O tema também é referido como “Hino de Santo Antônio”, e com ele as variações – as quais foram estreadas pelo próprio Brahms e por Clara Schumann (quem mais?) numa audição privada em Bonn, em 1873.
E agora, Brahms & Bartók por Solti & Perahia ficam com vocês!
Béla Bartók: Sonata para 2 pianos & percussão (1937)
01 I Assai lento 12:50
02 II Lento ma non troppo 06:27
03 III Allegro non troppo 06:37
Johannes Brahms: Variações sobre um tema de Joseph Haydn
(‘Chorale Sankt Antoni’) para 2 pianos, op.56b (1873)
04 Thema: Chorale St. Antoni: Andante
05 Var.1 Andante con motto
06 Var.2 Vivace
07 Var.3 Con motto
08 Var.4 Andante
09 Var.5 Poco presto
10 Var.6 Vivace
11 Var.7 Grazioso
12 Var.8 Poco presto
13 Finale: Andante
Murray Perahia e Sir Georg Solti, pianos David Corkhill e Evelyn Glennie, percussão
Gravado na Inglaterra em 1987
Quando bati o olho na postagem do PQP, semana passada, com obras para clarinete, lembrei-me imediatamente deste álbum fantástico, e pensei: “seria injusto não compartilhar essa preciosidade”.
Supremo entre os clarinetistas do século XX, Benny Goodman era tão versátil que sentia-se perfeitamente à vontade tocando o “Concerto para Clarinete” de Mozart ou passeando através de “Honeysuckle Rose” de Fat Waller. A participação de Béla Bartók, Leonard Bernstein, Aaron Copland, Morton Gould e Igor Stravinsky nesta gravação comprova alta estima destes pelo seu talento, e é uma merecida homenagem e um maravilhoso registro de sua espantosa maestria e domínio inigualável do instrumento.
Leornard Berstein
01 Prelude, Fugue And Riffs 7:47
Columbia Jazz Combo, Leonard Berstein
Aaron Copland
02 Concerto For Clarinet And String Orchestra (with Piano & Harp) 16:53
Columbia Symphony Orchestra, Aaron Copland
Igor Stravinsky
Ebony Concerto
03 I – Allegro Moderato 3:00
04 II – Andante 2:34
05 III – Moderato; Con Moto 3:40
Columbia Jazz Combo, Igor Stravinsky
Morton Gould
Derivations For Clarinet And Band
06 I – Warm-Up 3:06
07 II – Contrapuntal Blues 6:36
08 III – Rag 2:16
09 IV – Ride-Out 3:59
Columbia Jazz Combo, Morton Gould
Béla Bartók
Contrasts
10 I – Verbunkos (Recruiting Dance) 5:28
11 II – Pihenö (Relaxation) 4:29
12 III – Sebes (Fast Dance) 6:57
Joseph Szigeti, Violin
Béla Bartók, Piano
Quem nunca se deliciou com as obras de Gogol entende pouco a alma russa. O descrédito às instituições e à burocracia é fonte, por exemplo, da ótima e engraçada peça Inspetor Geral, o conto O Nariz e o grande romance semi-queimado Almas Mortas. O humor de Gogol transcende seu tempo e parece impregnar a arte russa. Algo que também surge na música de Prokofiev e principalmente de Shostakovich. Foi dessa fonte literária e musical que Schnittke escreveu várias brincadeiras musicais reunidas na chamada Suíte Gogol. Uma das obras mais divertidas e empolgantes que ouvi (aliás, inúmeras vezes). Essa obra é um refresco que contrapõe a pesada e densa peça chamada Labyrinths. Um grande obra de Schnittke que mereceria um texto mais longo e detalhado. Mas como hoje é dia dos namorados, um evento de absoluta importância, é realmente a Suíte Gogol que destaco aqui.
Alfred Schnittke (1934 -1998): Gogol Suite; Labyrinths
Gogol Suite
1. I. Overture. Allegro
2. II. Chichikov’s Childhood. Andantino
3. III. The Portrait. Slow Valse
4. IV. The Cloak. Andante-Accelerando
5. V. Ferdinand VIII
6. VI. The Bureaucrats. Allegro
7. VII. The Ball. In Tempo Di Valse
8. VIII. The Legacy. Pesante
Labyrinths
9. I. Moderato-Allegretto Scherzando-Meno Mosso-Adagio
10. II. Moderato
11. III. Allegretto
12. IV. Agitato
13. V. Cadenza-Andante-Maestoso
Alfred Schnittke é um dos grandes nomes da música russa (quiçá mundial) nos últimos 50 anos. O presente post traz os “Salmos dearrependimento“. Essespedaçosde coral, com baseempoemasdo século15, para comemorar mil anosdecristianismonaRússia, revelam em muito as características sarcásticas oua ironia presente nas obrasdeSchnittke. Os salmos em questão são uma músicado coração, de expressão emocionaldireta. Otrabalhoassumeumapungência especial. São dramáticos, por isso, belos. Propícios à nossa época natalina. Boa apreciação!
Alfred Schnittke (1934-1998) – Psalms of Repentance
01. I (2:55)
02. II (5:06)
03. III (4:00)
04. IV (2:37)
05. V (3:18)
06. VI (2:10)
07. VII (6:23)
08. VIII (2:02)
09. IX (8:14)
10. X (3:42)
11. XI (4:07)
12. XII (8:26)
Resolvi fazer minha primeira incursão no jazz neste blog. Como o colega PQP disse de si, não sou nenhum especialista nesse gênero: nem pensem em discutir comigo detalhes de estilos, gravações, nomes – mas, como em quase todos os campos, tenho minhas paixões também no jazz – e esta é provavelmente a maior. Não estranhem, portanto, que se trate de alguém que chegou a esse campo por uma porta lateral ou dos fundos, ou que fez qualquer caminho que não o mais usual em qualquer coisa: quase todas as minhas paixões são assim!
Miss Simone, ou melhor, Eunice Kathleen Waymon (com 36 anos na foto ao lado), começou com o piano aos 3 anos e fez um caminho de aprendizado clássico, como se nota das inflexões chopinianas da faixa 9 e sobretudo nas bachianas por toda parte, em especial na faixa 7.
Acontece que os recursos para bancar os estudos, pra variar um pouquinho, eram escassos, e Miss Waymon começou a levantar uns trocos tocando e cantando na noite – coisa que a senhora sua mãe pastora metodista fundamentalista não podia saber de jeito nenhum, pois apesar de não haver lido Drummond jamais consideraria isso uma solução, apenas uma quase-rima: com DEMON.
Foi assim que nasceu uma nova pessoa: Nina Simone – que levou uma vida tão cheia de aventuras e desventuras (pelo Caribe, África e França, inclusive impedida – acreditem – de voltar aos EUA por razões legais) que vocês deveriam procurar ler sobre ela em algum lugar.
Em 1958 sai então o primeiro disco dessa figura, então com 25 anos: Little Girl Blue. Estou dizendo porque todas as fontes dizem, mas não estranho se vocês duvidarem como eu duvidei: “isso não pode ser um disco de estreia!”
Não ouso dizer que seja um dos melhores discos da história do jazz porque, como já disse, não sou especialista e poderia ser apedrejado. Mas para mim, meu sentir pessoal, é um dos discos mais belos da história, ponto. Sim, yes, ja, oui: outros podem sentir diferente, mas eu sinto isso, digo há tempos e a impressão não parece querer mudar.
Mas como cada um é cada um, sugiro que vão sem nenhuma expectativa – como, aliás, acho que a gente devia ir sempre a qualquer coisa nova, não?
Nina Simone: Little Girl Blue (1958)
01 – Mood indigo [originalmente faixa 02]
02 – Don’t smoke in bed
03 – He needs ne
04 – Little girl blue
05 – Love me or leave me
06 – My baby just cares for me
07 – Good bait
08 – Plain gold ring
09 – You’ll never walk alone
10 – I loves you, Porgy [originalmente faixa 01]
11 – Central Park Blues
[Faixas-bônus – posteriores – incluídas na fonte utilizada]
12 – He’s got the whole world in His hands
13 – For all we know
14 – African mailman
15 – My baby just cares for me (extended version)
Este foi o primeiro disco de Debussy adquirido por este velho monge quando jovem, no início de seus estudos musicais na cidade de Curitiba, em 1972 ou 73… e definiu já de início a imagem desse compositor para bem além da imagem que alguns ainda têm dele, a de um arranjador de sons bonitinho-agradáveis ou algo assim – o que poderia ter acontecido caso se houvesse conhecido apenas a encantadora Petite Suite, segunda obra deste disco.
Mas não: o disco começa com com a complexa e sofisticada exposição sonora de sentimentos e reflexões do compositor sobre a guerra então em curso – valendo lembrar que Debussy perdeu sua guerra pessoal contra o câncer, aos 56 anos, durante um bombardeio de Paris pelas forças alemãs. Não à toa esse mestre do colorido musical declara já no nome que aqui está apresentando uma obra em branco e preto (En Blanc et Noir). Creio que seu segundo movimento (Lento, sombrio) é a faixa que mais me impressiona, com destaque para a insólita citação do hino luterano Ein feste Burg / Castelo Forte, algumas vezes chamado “a Marselhesa da Reforma Protestante” – que aparentemente só tem como estar aqui num papel de vilão (talvez como o que a própria Marselhesa desempenhou na Abertura 1812 de Tchaikovski, onde ‘lutou’ com um tema russo).
Há mais sobre as peças nos scans que acompanham os arquivos musicais – em alemão e numa tradução ao português, bastante deficiente, mas que não deixa de ajudar a ouvirmos mais informadamente. Bom desfrute!
DEBUSSY: OBRA INTEGRAL PARA 2 PIANOS E PIANO A 4 MÃOS
Werner Haas / Noel Lee, pianistas
En blanc e noir (1915) – 2 pianos
1.1 Avec emportement
1.2 Lent. Sombre
1.3 Scherzando
Petite suite (1886-89) – piano a 4 mãos
2.1 En bateau
2.2 Cortège
2.3 Menuet
2.4 Ballet
Lindaraja (1901) – dois pianos
3.1 •
Six épigraphes antiques (1914) – piano a 4 mãos
4.1 Pour invoquer Pan
4.2 Pour un tombeau sans nom
4.3 Pour que la nuit soit propice
4.4 Pour la danseuse aux crotales
4.5 Pour l’Égyptienne
4.6 Pour remercier la pluie au matin
Marche écossaise (sobre a Marcha do Duque de Ross) (1891) – piano a 4 mãos
5.1 •
Originalmente postado pelo CVL em abril de 2009. Repostagem pelo Avicenna.
Para solicitar a ativação de algum link, deixe sua mensagem clicando no quadradinho em branco no lado superior direito desta postagem.
Outro achado de um de nossos visitantes, chamado Geraldo: o desconhecidíssimo mineiro Padre José Maria Xavier, que eu também não conhecia e que – apesar de ter vivido no séc. XIX – é classicista de primeira linha. Tudo bem que, ao ouvir este CD, parece que se trata mesmo de Mozart, mas esse era o gosto dominante em música sacra nos tempos do império e principalmente nos cafundós do judas, como era a pacata São João Del Rei, terra do padre (isso valia para qualquer cidade longe do Rio).
Comentários de Paulo Cesar Machado dos Santos: Compositor e instrumentista, foi discípulo de seu tio Francisco de Paula Miranda com quem aprendeu canto, violino e clarineta. Estudou no Seminário de Mariana, ordenando-se padre em 1846. Designado a trabalhar em Rio Preto, retornou à sua terra natal, São João del-Rei, por motivos de saúde. Além do sacerdócio, exerceu múltiplas funções como vigário forâneo e lecionou música em várias escolas da cidade. Filiado a todas as associações religiosas, foi padre comissário da Ordem Terceira do Carmo e, também, capelão da Irmandade de Nosso Senhor dos Passos e da Confraria de Nossa Senhora do Rosário. De sua vasta obra são conhecidas mais de cem composições, executadas, tradicionalmente, em solenidades religiosas são-joanenses, especialmente na Semana Santa, na Novena de Nossa Senhora da Boa Morte e no Natal. As peças Matinas do Natal e Missa nº 5 foram editadas em Munique, na Alemanha, fato raro na música oitocentista brasileira. O compositor nasceu em 1819 e faleceu em 1887.
Comentários de Harry Crowl: Não há nada de barroco nem no Pe. José Maria Xavier, nem nos compositores coloniais anteriores a ele. Quando estudava no Seminário de Mariana, em meados do sec.XIX, J.Ma. Xavier ficou encantado com a obra do Pe. João de Deus de Castro Lobo, que falecera em 1832. JMXavier procurou escrever numa linguagem parecida, mas já com influência muito forte da ópera italiana introduzida pela corte no Rio, na época de D.João VI e D.Pedro I. Essa influência estava também presente na música de João de Deus. Só que no caso do último, o domínio da orquestração e da instrumentação e a eventual disponibilidade de músicos fez de sua obra algo muito mais elaborado. Tive a oportunidade de tocar viola com a Orquestra Ribeiro Bastos, em São João del Rei, em várias semanas santas, na década de 90. Toquei inclusive esse Ofício algumas vezes. É uma obra de grande força dramática e de escrita muito simples para a orquestra, pois a prática instrumental no Brasil no tempo do Império, especialmente no interior, já era amadora. Porém, São João Del Rei foi a única cidade no Brasil que conseguiu manter viva essa tradição. Vale muito a pena dar uma chegada até lá na época da semana-santa. É uma excelente oportunidade para se entender como a música funcionava dentro da liturgia católica até o final do sec.XIX, antes do estabelecimento do moto próprio, em 1906.
Ofício de Trevas – vol 1
Pe. José Maria Xavier (São João del Rey, 1819-1887) Ofício de Trevas 1. Ofício de Quinta-feira Santa – Antiphona – Zelus Domus Tuae Ofício de Trevas 2 :Ofício de Quinta-feira Santa – Responsorium I – In Monte Oliveti Ofício de Trevas 3. Ofício de Quinta-feira Santa – Responsorium II – Tristis Est Ofício de Trevas 4. Ofício de Quinta-feira Santa – Responsorium III – Ecce Vidimus Ofício de Trevas 5. Ofício de Quinta-feira Santa – Responsorium IV – Amicus Meus Ofício de Trevas 6. Ofício de Quinta-feira Santa – Responsorium V – Judas Mercator Pessimus Ofício de Trevas 7. Ofício de Quinta-feira Santa – Responsorium VI – Unus Ex Discipulis Meis Ofício de Trevas 8. Ofício de Quinta-feira Santa – Responsorium VII – Eran Quasi Agnus Ínnocens Ofício de Trevas 9. Ofício de Quinta-feira Santa – Responsorium VIII – Una Hora Ofício de Trevas 10. Ofício de Quinta-feira Santa – Responsorium IX – Seniores Populi Ofício de Trevas 11. Ofício de Sexta-feira Santa – Antiphona – Astiterunt Reges Terrae Ofício de Trevas 12. Ofício de Sexta-feira Santa – Responsorium I – Omnes Amici Mei Ofício de Trevas 13. Ofício de Sexta-feira Santa – Responsorium II – Velum Templi Ofício de Trevas 14. Ofício de Sexta-feira Santa – Responsorium III – Vinea Mea Ofício de Trevas 15. Ofício de Sexta-feira Santa – Responsorium IV – Tamquan Ad Latronem Ofício de Trevas 16. Ofício de Sexta-feira Santa – Responsorium V – Tenebrae Factae Sunt Ofício de Trevas 17. Ofício de Sexta-feira Santa – Responsorium VI – Animam Meam Ofício de Trevas 18. Ofício de Sexta-feira Santa – Responsorium VII – Tradiderunt Me Ofício de Trevas 19. Ofício de Sexta-feira Santa – Responsorium VIII – Jesum Tradidit Impius Ofício de Trevas 20. Ofício de Sexta-feira Santa – Responsorium IX – Caligaverunt Oculi Mei Laudes Ofício de Trevas 21. Ofício de Sexta-feira Santa – Antiphona – Posuerunt Super Caput Ejus Ofício de Trevas 22. Ofício de Sexta-feira Santa – Christus Factus Est
Ofício de Trevas – vol 1 – 2004
Orquestra Sinfônica de Minas Gerais & Coral Lírico Palácio das Artes
Maestro Marcelo Ramos .
Avicenna se encantou com o primeiro volume do Ofício de Trevas.
Mas, como bom mineiro-persa, perguntou aos ventos do oriente qual a origem do nome “Ofício de Trevas”. Alguma conotação com o post-mortem? Ou com rituais cabalísticos?
Quem responde é o Maestro Marcelo Ramos:
“A tradição que envolve o ofício é antiqüíssima. Esta denominação de Trevas está envolvida num contexto ritualístico, extremamente rico em simbologia, e merece uma justificativa litúrgica. Desde o séc. VII, celebra-se com orações as exéquias do Senhor. No séc. VIII, a liturgia franco-romana já conhecia o apagar das luzes durante o ofício. Desde o séc. XII, o nome “Ofício de Trevas” indicava a oração noturna (matinas e laudes) do ofício divino nos três dias que antecedem o Domingo da Ressurreição. As matinas e laudes rezadas seguidas contam 14 salmos, nove leituras (incluindo três lamentações do profeta Jeremias) e nove responsórios. É “de trevas” pois, no decorrer dele, apagam-se sucessivamente as 14 velas em memória das trevas que cobriram a Terra na morte do Senhor. Para esse fim, é usado um candelabro triangular com 15 velas.
A vela da ponta, a décima quinta, representa o Cristo. As outras representam os onze apóstolos e as três Marias. Segundo vários autores medievais, apagar uma vela após cada salmo significa o abandono de Jesus por seus seguidores, principalmente no horto. A liturgia antiga colocava a última vela acesa atrás do altar para trazê-la de volta mais tarde, talvez ao amanhecer, simbolizando assim a morte do Senhor; em São João del-Rey (MG) esta tradição permanece intocada. Em Portugal, a décima quinta vela no alto do candelabro é conhecida como galo ou galo das trevas.
No final do ofício, cantado em latim, era costume fechar os livros com força exagerada ou bater os pés no chão com veemência, simbolizando o terremoto que acompanhou a morte de Jesus e a destruição de Jerusalém.”
Avicenna apresenta o Segundo volume do “Ofício de Trevas”, composto pelo Padre José Maria Xavier (1819-1887, S. João del-Rey, MG), com a Orquestra e Coro dos Inconfidentes, regidos pelo Maestro Marcelo Ramos, gravado na Sala Sérgio Magnani, Palácio das Artes, Belo Horizonte, em dezembro de 2005.
Ofício de Trevas – vol II Pe. José Maria Xavier (São João del Rey, 1819-1887) Ofício de Trevas 23. Matinas de Sábado Santo – Antiphona: In pace in idipsum Ofício de Trevas 24. Matinas de Sábado Santo – Responsorium I: Sicut ovis Ofício de Trevas 25. Matinas de Sábado Santo – Responsorium II: Jerusalem surge Ofício de Trevas 26. Matinas de Sábado Santo – Responsorium III: Plange quasi virgo Ofício de Trevas 27. Matinas de Sábado Santo – Responsorium IV: Recessit pastor noster Ofício de Trevas 28. Matinas de Sábado Santo – Responsorium V: O vos omnes Ofício de Trevas 29. Matinas de Sábado Santo – Responsorium VI: Ecce quomodo Ofício de Trevas 30. Matinas de Sábado Santo – Responsorium VII: Astiterunt reges terrae Ofício de Trevas 31. Matinas de Sábado Santo – Responsorium VIII: Aestimatus sum Ofício de Trevas 32. Matinas de Sábado Santo – Responsorium IV: Sepulto Domino Ofício de Trevas 33. Matinas da Ressureição – Invitatório Ofício de Trevas 34. Matinas da Ressureição – Responsorium I: Angelus Domini Ofício de Trevas 35. Matinas da Ressureição – Responsorium II: Cum transisset sabbatum Ofício de Trevas 36. Matinas da Ressureição – Laudes do Tempo Pascal: Haec dies Ofício de Trevas 37. Matinas da Ressureição – Antiphona Final: Regina Coeli Manoel Dias de Oliveira (São José del Rey [Tiradentes], 1735-1813) Ofício de Trevas 38. 8ª Leitura de Sábado Santo
Ofício de Trevas – Volume 2 – 2005
Orquestra e Coro dos Inconfidentes
Maestro Marcelo Ramos .
Este CD não me sai da cabeça desde o início da semana. Já pude ouvi-lo por diversas vezes. O fato é que a Sinfonia para Cello e orquestra do inglês Benjamim Britten é perturbadoramente incrível. Não me canso de ouvir. E mais: é regido pelo próprio Britten e tem no cello nada mais nada menos do que Rostropovich. Ou seja, não se trata de qualquer registro. Deve ser por isso que ele me fisgou. É um CD com intenções diferenciadas. De um lado temos um Britten visceral e do outro temos Haydn com o seu já conhecido Concerto para Cello e orquestra. Ouça este CD e tire suas próprias conclusões!
Rostropovich, Galina Vishnevskaya e Britten na vida louca
Benjamim Britten (1913-1976) – Sinfonia para Cello e Orquestra, Op.68
01 Britten – Symphony for Cello & Orchestra – I. Allegro maestoso
02 Britten – Symphony for Cello & Orchestra – II. Presto inquieto
03 Britten – Symphony for Cello & Orchestra – III. & IV
Joseph Haydn (1732-1809) – Concerto para Cello e Orquestra in C
04 Haydn – Cello Concerto in C – I. Moderato
05 Haydn – Cello Concerto in C – II. Adagio
06 Haydn – Cello Concerto in C – III. Allegro molto
The English Chamber Orchestra
Mstilav Rostropovich, cello
Benjamim Britten, regente
Já faz várias semanas que o Avicenna preparou cuidadosamente os arquivos para esta postagem, convidando-me honrosamente a mais uma parceria no texto… e eu venho vergonhosamente adiando mais do que seria aceitável!
A razão é que tanto eu quanto o Avicenna não acharíamos graça em fazer esta postagem em particular sem um texto consideravelmente substancioso acompanhando-a – e já contei pra vocês que a saúde vem me impedindo de me jogar muito a fundo em atividades de tecelagem verbal.
Mas a vontade também é forte, e aí decidi que não deixaria a coisa passar deste penúltimo domingo de inverno. Aí vai, então: não é pra ser um tratado, mas também não deixará de tocar em duas ou três áreas que nos instigam em especial.
A ABORDAGEM DE KARL RICHTER (1926-1981) A J.S.BACH (1685-1750): É lugar-comum dizer que Richter foi um dos últimos a empregar uma abordagem “romântica” em Bach, numa época em Harnoncourt e tantos outros já haviam partido para a abordagem “histórica”, que se caracteriza basicamente por: (a) uso de instrumentos construídos na época, ou construídos hoje segundo modelos da época; (b) sobretudo nas obras sacras, emprego das vozes de contratenores homens no lugar da de contraltos mulheres, e de meninos antes da mudança de voz no lugar de sopranos mulheres; (c) tamanho menor dos grupos instrumentais e corais; (d) tempos mais acelerados (i.é, velocidade), articulação e agógica mais dinâmicas (jogo de ligado x destacado, fraseado, irregularidades expressivas no tempo etc).
Richter de fato não usou nada disso: usou instrumentos modernos, mulheres solistas, grupos consideravelmente volumosos… porém seus tempos não são só lentos: são sobretudo rigorosamente regulares – como de metrônomo ou relógio do princípio ao fim de cada trecho.
Isso me faz perguntar sobre a adequação de chamar “romântica” a sua abordagem… se o que talvez mais caracterize o romantismo seja o rubato, ou seja: um determinado tipo de irregularização expressiva do tempo. Em Richter inexistem tanto a “inegalité” e a agógica barrocas quanto o rubato, e nesse sentido eu chamaria sua abordagem de “classicista”, não de romântica.
Mas além disso Richter era filho de pastor luterano, e sua formação se deu fundamentalmente no espaço eclesiástico – diferente de regentes como um Klemperer, de quem também se diz ter abordado a São Mateus “romanticamente”. Minha impressão é que Richter foi mostrar no teatro o que se fazia nas igrejas… e isso embasaria o clima litúrgico e devocional que parecemos encontrar aqui, em contraste com abordagens mais teatrais, operísticas e/ou “de concerto”.
ALGUNS DESTAQUES DA REALIZAÇÃO E DA OBRA: Antes de mais nada, o coro – ou melhor: os coros (a obra inteira é composta para 2 coros a quatro vozes, 2 orquestras e 2 conjuntos de solistas, que se respondiam da frente e dos fundos da igreja, e ainda uma nona voz coral: um grupo de meninos em uníssono, que intervém somente nas faixas 1 e 35). Impressionam nesta realização a textura veludosa, a precisão e a qualidade expressiva das massas corais, quer nos COROS (peças livres) quer nos CORAIS (nome para “hinos” na tradição luterana).
Segundo, a participação do que foi talvez o melhor barítono do século 20: Dietrich Fischer-Dieskau (28.05.1925-18.05.2012). Destaque para os dois pares recitativo-e-ária que são as faixas 65-66 e 74-75. Para mim só essas quatro faixas já justificariam a preservação desta gravação e nossa atenção a ela!
Falar das diferentes árias maravilhosas da São Mateus é um assunto infinito em que não quero entrar – mas por afinidades pessoais não quero deixar de chamar atenção para o dueto soprano-alto com coro quase no final da primeira parte (faixa 33), e para a ária Aus Liebe (‘É por amor…’ – faixa 58) – esta especificamente porque para mim é um inegável CHORO – quero dizer no sentido musical brasileiro da palavra – com os volteios sentimentais da flauta apoiados (?) em acordes flutuantes de 2 oboés e um corne inglês mais ou menos na mesma tessitura de um cavaquinho, sem baixo nenhum. Como diria o filho do véio: IM-PER-DÍ-VEL!
SOBRE A RELAÇÃO COM O TEXTO: Hoje o interesse pela música de Bach é mais freqüente entre pessoas intelectualizadas… e justo entre essas não é freqüente conseguirem levar a sério o enredo e os sentidos teológicos que essa música se propõe a ilustrar. Surge daí com freqüência uma proposta de audição assim: “a composição musical é maravilhosa, mas os textos são uma baboseira superada que é melhor a gente nem ficar sabendo”.
Por um lado considero perfeitamente válido que para apreciar esta música ninguém precise acreditar que estaria condenado a assar no inferno pela eternidade caso Jesus não tivesse se disposto a sofrer para apaziguar um Deus-Pai capaz de determinar isso… Mas por outro lado acho que há uma inegável perda de experiência estética quando não nos dispomos a experimentar como é sentir isso – no mínimo do mesmo modo como nos dispomos a sentir os terrores e esperanças dos gregos ou dos indianos diante dos seus deuses e heróis, quando vamos conhecer a Ilíada ou o Mahabhárata.
Para mim o bonito dos tempos pós-modernos é justamente isso: o convívio entre múltiplas formas diferentes de experimentar a mesma coisa, formas muitas vezes incompatíves mas que nem por isso precisam incorrer na infantilidade de lutar para suprimir umas às outras. No caso: há gente que irá ouvir só pela música; alguns pela música e pelo mito entendido como fantasia; outros pelo mito entendido como verdade sagrada; outros ainda por nostalgia em relação aos seus queridos passados que cultivavam essa forma de religiosidade – etc. etc. etc.
Minha forma pessoal, se alguém se interessar em saber, eu classificaria como um tanto antropológica: entendo como essência do mythos cristão a admissão, por parte do ser humano, de um descompasso ou insuficiência de sua parte frente a uma ordem maior – e quem diz que isso se refere a um velho barbudo que diz que você não pode pensar no que tem por baixo da saia ou calça da/do coleguinha da escola, ou duvidar de que a mãe de Jesus era virgem ou coisas assim? A realidade da destruição ambiental do planeta, ou das crianças lançadas à fome por conta de disputas de poder-pelo-poder, não são amostras de que o ser humano realmente pisa na bola frente àquilo que ele mesmo é capaz de conceber como o bom e o desejável? E será assim tão ridículo dispor-se a deixar ressoar em cada um de nós o que é o sofrimento de um outro que tem raiz em atos nossos? E ainda: aspirar por que essa compreensão respeitosa do sofrimento do outro, e admissão de culpa, gere um desejo de superação das nossas insuficiências em questão – um desejo tal que se torne força capacitadora de uma tal superação?…
Essa é, no humilde ver de Ranulfus, uma tradução antropológica do mythos cristão – e não tenho dúvidas de que era com esse magma de emoções que Bach trabalhava, independente de se com pura intuição ou com maior ou menor dose de consciência. E quem se dispõe a empreender uma viagem através de imagens simbólicas desse drama fundamental da admissão de culpa e aspiração por redenção, com certeza irá extrair de Bach uma experiência estética ainda muito mais profunda que aquele que diz “a música é divina, os textos são pura baboseira”.
Foi assim que eu entendi o impulso que o colega Avicenna teve de não postar esta obra sem colocar à disposição o texto com tradução em português (mesmo se não há nenhuma poeticamente satisfatória!), bem como os títulos das faixas em português: contribuições para uma experiência mais integral desses “Autos de Mysterio” que são as Paixões de Bach –
… experiência para quê a atitude menos teatral e mais litúrgico-devocional adotada por Karl Richter talvez possa ser uma contribuição, apesar de todas as suas infidelidades musicológicas.
J.S. Bach: PASSIO SECUNDUM MATTHÆUM, BWV 244
1.ª das gravações dirigidas por Karl Richter: 1958, Herkules-Saal, München
Münchener Bach-Chor & Münchener Chorknaben (diretor do coro: Fritz Rothschuh)
Münchener Bach-Orchester
Tenor [Evangelista, árias]: Ernst Haefliger
Baixo [Jesus]: Kieth Engen
Soprano [árias]: Irmgard Seefried
Soprano [1.ª criada; esposa de Pilatos]: Antonia Fahberg
Contralto [árias, 2.ª criada]: Hertha Töpper
Baixo [árias]: Dietrich Fischer-Dieskau
Baixo [Judas, Pedro, Pilatos, Sumo Sacerdote]: Max Proebstl
LISTA DAS FAIXAS
Jesus ungido em Betânia (São Mateus 26: 1-13)
01 Vinde, filhas, auxilia-me no pranto (Kommt, ihr Töchter)
02 Quando Jesus terminou estas palavras (Da Jesus diese Rede vollendet hatte)
03 Amado Jesus (Herzliebster Jesu)
04 Então se reuniram em conselho (Da versammleten sich die Hohenpriester)
05 Que não seja em dia de festa (Ja nicht auf das Fest)
06 Estando Jesus em Betânia (Da nun Jesus war zu Bethanien)
07 Para que este desperdício (Wozu dienet dieser Unrat)
08 Os advertindo, Jesus os falou assim: (Da das Jesus merkete, sprach er zu ihnen)
09 Tu! Salvador bem amado! (Du lieber Heiland du)
10 Contrição e arrependimento (Buss’ und Reu’)
Última Ceia (São Mateus 26: 14-35):
11 Então um dos doze (Da ging hin der Zwölfen einer)
12 Sangra, querido coração! (Blute nur, du liebes Herz)
13 Então no dia dos primeiros ázimos (Aber am ersten Tage der süssen Brot)
14 Onde quer que façamos (Wo willst du, dass wir dir bereiten)
15 Ele os disse ide a cidade (Er sprach-Gehet hin & Rez (Ev)-Und sie wurden)
16 Sou eu. Deveria expiá-lo (Ich bin’s, ich sollte büssen)
17 Ele os respondeu (Er antwortete und sprach)
18 Apesar de que meu coração (Wiewohl mein Herz in Tränen schwimmt)
19 Quero entregar-te meu coração (Ich will dir mein Herze schenken)
20 E tendo proclamado o hino de ação de graças (Und da sie den Lobgesang gesprochen hatten)
21 Reconhece-me, meu Guardião (Erkenne mich, mein Hüter)
22 Porém Pedro, respondendo, lhe disse (Petrus aber antwortete)
23 Quero permanecer aqui junto de Ti (Ich will hier bei dir stehen)
No monte das Oliveiras (São Mateus 26: 36-56):
24 Então marchou Jesus com eles (Da kam Jesus mit ihnen zu einem Hofe)
25 Oh, dor! Como treme seu coração angustiado (O Schmerz & Chor-Was ist die Ursach’)
26 Quero velar ao lado do meu Jesus (Ich will bei meinem Jesu wachen & Chor-So schlafen unsre)
27 Avançou alguns passos (Und ging hin ein wenig)
28 O salvador cai de joelhos (Der Heiland fällt vor seinem Vater nieder)
29 Com prazer queria eu levar sua cruz (Gerne will ich mich bequemen)
30 E ao retornar até onde estavam seus (Und er kam zu seinen Jüngern)
31 Que se cumpra sempre a vontade de meu Senhor (Was mein Gott will, das g’scheh allzeit)
32 E retornando, os encontrou novamente (Und er kam und fand sie aber schlafend)
33 Assim meu Jesus é preso (So ist mein Jesus nun gefangen)
34 E eis que um dos que estavam com Jesus (Und siehe, einer aus denen)
35 Oh homem! Chora teu grande pecado (O Mensch, bewein dein Sünde gross)
Falso Testemunho (São Mateus 26: 57-63):
36 Ah! Meu bom Jesus já não está aqui! (Ach, nun ist mein Jesus hin!)
37 Os que prenderam a Jesus o conduziram (Die aber Jesum gegriffen hatten)
38 O mundo me julgou cruelmente (Mir hat die Welt trüglich gericht’t)
39 Apesar de tê-lo tentado com numerosos testemunhos falsos (Und wiewohl viel falsche Zeugen)
40 Meu Jesus guarda silêncio ante as calúnias (Mein Jesus schweigt zu falschen Lügen stille)
41 Paciência! Se línguas mentirosas me ofenderem (Geduld! Wenn mich falsche Zungen Stechen)
Jesus ante Caifás e Pilatos (São Mateus 26: 63-75; 27: 1-14):
42 O Sumo Pontífice o respondeu dizendo (Und der Hohepriester antwortete)
43 Então começaram a cuspir-lhe no rosto (Da speieten sie aus)
44 Quem te golpeia assim (Wer hat dich so geschlagen)
45 Pedro estava sentado fora (Petrus aber saß draussen)
46 Então se pôs a maldizer e a jurar (Da hub er an, sich zu verfluchen)
47 Tem piedade de mim, Meu Deus (Erbarme dich, mein Gott)
48 Ainda que me separe de Ti (Bin ich gleich von dir gewichen)
49 Pela manhã, todos os príncipes (Des Morgens abre)
50 Então ele lançou as moedas de prata no templo (Und er warf die Silberlinge)
51 Devolva-me o Meu Jesus! (Gebt mir meinen Jesum wieder!)
52 E depois de terem discutido (Sie hielten aber einen Rat)
53 Dirige teu caminho (Befiehl du deine Wege)
Entrega e Flagelação (São Mateus 27: 15-30):
54 Durante a festa era costume que o governador (Auf das Fest aber hatte der Landpfleger Gewohnheit)
55 Que incompreensível é este castigo! (Wie wunderbarlich ist doch diese Strafe!)
56 O governador replicou (Der Landpfleger sagte)
57 Ele fez o bem a todos (Er hat uns allen wohlgetan)
58 Por amor quer morrer meu Salvador (Aus Liebe will mein Heiland)
59 Porém eles, elevando a voz, gritavam (Sie schrieen aber noch mehr)
60 Piedade. Senhor! (Erbarm’ es Gott!)
61 Se as lágrimas do meu rosto (Können Tränen meiner Wangen)
62 Então os soldados do governador tomaram a Jesus (Da nahmen die Kriegsknechte)
63 Oh, cabeça lacerada e ferida (O Haupt voll Blut und Wunden)
A Crucificação (São Mateus 27: 31-54):
64 E depois de tê-lo humilhado (Und da sie ihn verspottet hatten)
65 Sim, ditosa a hora em que a carne e o sangue humanos (Ja! freilich will in uns das Fleisch und Blut)
66 Vem, doce cruz (Komm, süsses Kreuz)
67 E então chegaram ao lugar chamado Gólgota (Und da sie an die Stätte kamen)
68 Até os mesmos bandidos que haviam sido crucificados (Desgleichen schmäheten ihn auch die Mörder)
69 Ah, Gólgota (Ach, Golgatha)
70 Veja, Jesus estende sua mão (Sehet, Jesus hat die Hand)
71 E desde a hora sexta até a hora nona (Und von der sechsten Stunde)
72 Quando eu tiver que partir (Wenn ich einmal soll scheiden)
73 E eis que o véu do templo (Und siehe da)
O enterro (São Mateus 27: 55-66):
73b Estavam também ali, um pouco afastadas (Und es waren viel Weiber da)
74 Ao entardecer, quando refrescou (Am Abend, da es kühle war)
75 Purifica-te, Meu coração (Mache dich, mein Herze, rein)
76 José tomou o corpo e o envolveu em um lençol (Und Joseph nahm den Leib)
77 Agora o Senhor descansa (Nun ist der Herr zur Ruh gebracht)
78 Chorando nos prostramos ante teu sepulcro (Wir setzen uns mit Tränen nieder)
Dia desses um amigo mandou um clip de áudio para ilustrar um ponto em uma conversa de whatsapp. De imediato fui surpreendido pela entrada de um quarteto de cordas, quando o tal amigo não é conhecedor de “clássico”. Em seguida entrou o que de início julguei uma voz feminina grave, que pela tessitura, timbre e modo de enunciar as palavras e frases me lembrou nitidamente Nana Caymmi, apenas que (me permitam) com a afinação aperfeiçoada.
Mas as palavras pareciam de um universo estranho ao repertório daquela notável cantora. Não houve, inclusive, como não pensar numa referência religiosa ao ouvir as palavras “meu bem sofre de maldade, faz o mal querendo sempre o bem” (São Paulo aos Romanos: “o bem que quero não faço, mas o mal que não quero, esse faço”) – mas anos-luz mais refinada que o usual na música de uso religioso produzida hoje em dia no país (a qual não passa de paródia alcohol-free de música inventada originalmente para outros fins…) – e refinada não pela complexidade ou abundância de elementos, mas, de um modo talvez zen, justamente pela economia de meios, despojamento mesmo, deixando o essencial da música e texto ousadamente a nu – no que poderia ter revelado precariedade mas, pelo menos no meu sentir, evidenciou foi elegância artística e sensibilidade intelectual.
Perguntei ao meu amigo quem seria responsável por esse instigante objeto, e foi aí que ele me apresentou Caio Prado: jovem negro crescido nos subúrbios do Rio, com passagem pela Escola Villa-Lobos e por pelo menos duas vezes “massacrado” em concursos de tevê por júris absolutamente incapazes de perceber o refinamento que já estava presente em suas tentativas de apresentação, mesmo se de fato ainda inseguras e imaturas – mas hoje já com realizações consistentes e um círculo de admiradores considerável, mesmo se mais em qualidade que em quantidade.
Não me parece inadequado ver Caio Prado como parte da onda criativa de renovação cultural que flui a partir das periferias urbanas brasileiras desde meados da década de 1990 – quando, pela primeira vez na história do país, massas de jovens das “massas” reunidas nessas periferias pela frenética urbanização das décadas anteriores adentraram o Ensino Médio e começaram mesmo a ir além.
Mas Caio é geralmente listado em uma onda mais específica que vem surgindo dentro da primeira desde 2014 ou pouco antes: uma onda de músicos performáticos que se dedicam todos a “tensionar os papéis de gênero” e outras questões de diversidade sexual de modo direto, não apenas alusivo como havia feito um Ney Matogrosso – onda que inclui nomes como Liniker, o grupo As Bahias e a Cozinha Mineira, ou o rapper Rico Dalasam. Seria um erro pensar na produção desse pessoal como uma arte de interesse restrito a um gueto, pois, curiosamente, suas produções estão de fato entre o que tem sido feito de melhor e mais renovador na chamada MPB na presente década. E, dentro disso, minha impressão é que Caio faz o trabalho artisticamente mais depurado, mais capaz de sobreviver como arte perene, independente das circunstâncias e modas estilísticas de uma época. Essa a razão da pergunta “popular?” no título da postagem. (Clique aqui para um artigo de 2016 que aborda onze dos artistas ou grupos mais representativos dessa onda).
Só mais um detalhe, antes de deixar vocês com a palavra (em trecho de entrevista), imagem (na palhinha em vídeo) e música de Caio Prado: em suas entrevistas, Caio costuma mencionar vários nomes consagrados da MPB entre suas influências – entre eles, sempre o de… Nana Caymmi. Parece que o ouvido do velho monge aqui não falhou…
Caio Prado: trecho de entrevista a Fabiane Pereira http://www.ubc.org.br/publicacoes/noticias/4400
– Seu primeiro disco traz 10 faixas autorais. O que o inspira a compor?
– A boa poesia me instiga. E o verso musicado é o que me desperta à criação. O amor, paixões e relações do ser humano foram as minhas primeiras inspirações. Minha primeira música, aos 10 anos, é “Meus Sonhos e Fantasias” e carrega toda a inocência e as idealizações de um apaixonado. Sou amante das palavras e me interesso pela sonoridade ímpar de cada uma delas. Vejo música quando reconheço uma palavra e um verso, gosto tanto da poesia lírica quanto do coloquialismo das ruas. De um pisciano utópico a um existencialista social, me vi influenciado pela filosofia e sociologia, e hoje minha música passa por questões mais complexas de observação social. Entendo que a música está a serviço da cultura e comunicação de um povo, por isso me interesso em ressaltar temas como superação, autoconhecimento e sempre potência ativa. Tudo vejo como arte e tudo vejo como política.
Palhinha:
CAIO PRADO : CD “VARIÁVEL ELOQUENTE” (2015)
Caio Prado: textos, melodias e voz
Produção musical: Clemente Magalhães e Maycon Ananias
Arranjos para quarteto de cordas: Maycon Ananias
01 Prelúdio
02 Maldade do meu bem
03 Lamento
04 Se um dia
05 Cantiga do início
06 Meu perdão
07 Anomia
08 Não recomendado
09 Roteirista
10 Variável eloquente
Vamos às duas últimas sinfonias de Jean Sibelius. Agora surgem as de número 6 e 7. São trabalhos de profunda e intensa beleza. Durante muito tempo Sibelius fomentou a possibilidade de compor a sua Oitava Sinfonia. Nas década de 30 e 40 havia uma especulação no mundo da música de que o trabalho estava sendo escrito. Um burburinho, um frenesi tomava a todos. Afinal, aqueles que não simpatizavam com as inovações suscitadas por Schoenberg, Stravinsky e companhia limitada, apegavam-se à velha forma – não em sentido depreciativo – e Sibelius era um ícone. Alguns o chamavam de novo Beethoven. Seus trabalhos eram aplaudidos com veemência. A expectativa era geral. Mas por outro lado, Sibelius era alguém que tinha problemas sérios com a bebida. Sua saúde piorava. Uma vísivel degradação roía o compositor. A expectativa da Oitava era um fantasma que consumia a psiquê de Sibelius. A Oitava seria o coroamento de toda a sua obra. Nela se encontraria o condensamento de tudo aquilo que compusera. Mas, em dado dia, Sibelius acometido por uma crise de instabilidade, jogou no fogo as partituras com tudo aquilo que compusera para a Oitava Sinfonia. Que pena! Sendo assim, ficamos com apenas 7 sinfonias do compositor. Gosto tanto das sinfonias do compositor, que penso que Sibelius deveria ter escrito 15 sinfonias como fez Shostakovich ou mais – quem sabe!. Boa apreciação dos dois últimos CDs dessa fenomenal caixa com Bernstein!
Jean Sibelius (1865-1857) – Sinfonia No. 6 em Ré menor, Op. 104 e Sinfonia No. 7 em Dó maior, Op. 105
Sinfonia No. 6 em Ré menor, Op. 104
01. 1. Allegro molto moderato
02. 2. Allegretto moderato
03. 3. Poco vivace
04. 4. Allegro molto – Allegro assai – Doppio più lento
Sinfonia No. 7 em Dó maior, Op. 105
Sinfonia No. 7 em Dó maior, Op. 105
Depois de uma temporada em que acontecimentos vários me levaram a postar quase exclusivamente música brasileira do século 20, volto a um resgate mais variado daqueles vinis mais queridos dos anos 70, dos quais posso dizer, sem muito exagero, que ‘fizeram de mim quem eu sou hoje’.
Um deles é este, apesar de que nas primeiras audições nem tenha me agradado tanto: achei um pouco afobado e sem profundidade. Pouco tempo depois, no entanto, já havia se juntado àqueles a que eu recorria quanto sentia muita, mas muita vontade mesmo de “voltar pra casa”: por alguma razão sempre foi no renascimento e barroco inicial que me senti em casa – e ainda mais quando é um puro som de cordas dedilhadas, como o deste disco, tocado inteiro em duo.
Mas o maior presente que este disco de 1974 me deu foi ter me revelado de modo gritante a conexão cultural entre o Mediterrâneo e o Nordeste Brasileiro: eu se fosse vocês não deixava de ouvir com atenção as “três branles de aldeia” (branle ou bransle é uma dança de roda), especialmente a que aparece a 1 min 20 s da faixa!
E pra provocar ainda um pouco mais, na audição de hoje – 35 anos (ai!) depois de comprar o disco – tive a nítida impressão de ouvir prenúncios do som de New Orleans na faixa B10, Les Bouffons. Sinais de demência precoce? Se acharem que sim, por favor me alertem para eu postar todo o resto rápido!…
Música da Renascença para alaúdes, vielas e bandurra
Guy e Elisabeth Robert
Edição original: LP Arion France 1974
Edição brasileira: LP CBS Odissey, 1974
Digitalizado por Ranulfus, ago.2010
ESPANHA
A01 Cinco diferencias sobre Las Vacas (n.n.)
A02 La dama le demanda (Antonio de Cabezón)
A03 Pavana Italiana (Antonio de Cabezón)
A04 Recercada sobre el passamezzo moderno (Diego Ortiz)
A05 Conde Claros (Enrique de Valderrabano)
ITÁLIA
A06 Due Fantasie (Francesco da Milano)
A07 Spagna et Canon (Francesco da Milano)
A08 Contrapuncto (Vicenzo Galilei)
A09 Fantasia (Melchiore de Berberiis)
INGLATERRA
B01 Rogero (John Johnson)
B02 Levecha Pavan and Galliard (John Johnson)
B03 My Lor Chamberlain his Galliard (John Dowland)
B04 La rossignol (n.n.)
B05 Drewies accorders (n.n.)
B06 Fancy (Thomas Robinson)
B07 A toye (Thomas Robinson)
B08 Twenty ways upon The Bells (Thomas Robinson)
B09 Flatt Pavan (John Johnson)
FRANÇA
B10 Les bouffons (n.n.)
B11 Trois bransles de village (Jean-Baptiste Bésard)
B12 Allegez-moy (Pierre Phalèse)
B13 Grace et Vertu (Pierre Phalèse)
Um CD imensamente agradável. Enquanto realizo algumas atividades aqui em casa, estou a ouvir essa música alegre, bela, simples, cheia de uma poesia comovente. Destaco o Concerto para cello de Mozart. Revela aquele aspecto mais essencial de Mozart: dizer de forma singela aquilo que nos comove, envolvendo-nos por completo. Mozart sempre me faz sentir bem. Tenho uma relação de prazer com a beleza e com a alegria todas as vezes que o escuto. Consigo identificar a música e as peculiaridades tão características do compositor à distância. No CD ainda temos Haydn, Boccherini e Tartini. Boa apreciação!
Joseph Haydn (1732-1809) – Divertimento for Cello and String Orchestra in D major
01. Adagio
02. Minueto & Trio
03. Allegro di molto
Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) – Concerto for Cello and Orchestra in D major K.447
04. Allegro
05. Romanze
06. Rondo
Luiggi Boccherini (1743-1805) – Adagio and Allegro for Cellor and String Orchestra in A major
07. Adagio
08. Allegro
Giuseppe Tartini (1692-1770) – Concerto for Cello and String Orchestra in D major
09. Poco Largo. Pomposo
10. Allegro Moderato
11. Grave espressivo
12. Allegro
Yuli Turovsky, cello
I Musici de Montréal Chamber Orchestra
Essa versão das sinfonias de Sibelius com Leonard Bernstein é a melhor que já ouvi. Impressiona. Ouvi-las (as sinfonias) é uma experiência de grande contemplação e deleite. As sete são poemas de apreço à natureza. Ouvir Sibelius me traz à memória as palavras de Alberto Caeiro e os seu Guardador de Rebanhos: Toda paz da natureza sem gente/ Vem sentar-se ao meu lado./ Mas eu fico triste como um pôr-de-sol/ Para a nossa imaginação, / Quando esfria no fundo da planície/ E se sente a noite entrada/ Como uma borboleta pela janela. O finlandês Jean Sibelius viveu na pequena Ainola em contato com a natureza. Essa relação pode ser percebida em seus trabalhos. As duas sinfonias que aparecem neste post, por sua vez, revelam dois aspectos diferenciados. A de número 4 é soturna, repleta de uma temática circular, que sempre remete ao mesmo espaço, ao mesmo lugar. É uma trabalho que revela angústia e impressões noturnas. Acredito que seja a sinfonia mais sombria de Sibelius. Já Sinfonia número 5 é cristalina, repleta de inclinações contemplativas. Os acordes iniciais nos remete a outra frase de Caeiro: “Sejamos simples e calmos, / Como os regatos e as árvores…”. Bom deleite!
Jean Sibelius (1865-1857) – Symphony No. 4 in A minor, Op. 63 e Symphony No. 5 in E flat major, Op. 82
Symphony No. 4 in A minor, Op. 63
01. Tempo molto moderato, quasi adagio
02. Allegro moto vivace
03. Il tempo largo
04. Allegro
Symphony No. 5 in E flat major, Op. 82
05. Tempo molto moderato – Largamente
06. Allegro moderato – Presto
07. Andante mosso, quasi allegretto
08. Allegro molto – Un pochettino largamente – Largamente assai
Acho que é notório que eu, Marcelo Stravinsky, adoro arranjos orquestrais de peças pianísticas e vice-versa. Gosto muito, também, de suítes para balé, e aproveitando a deixa do Carlinus, em reviver Schumann , quero compartilhar uma peça que buscava há um certo tempo. Carnaval, Op. 9, é uma série de 22 pequenas peças para piano, baseada nas personagens da Commedia dell’arte. Escrita no período de 1834 a 1835, foi dedicada ao violinista Karol Lipiński. É subtitulada Scènes mignonnes sur quatre notes (Pequenas cenas em quatro notas).
***
Carnaval, Op. 9
Em cada seção de Carnaval, aparecem uma ou ambas das duas Séries de notas musicais. São elas:
* Lá, Mi bemol, Dó, Si (A-E♭-C-B); em alemão são escritas como A-Es-C-H
* Lá bemol, Dó, Si; em alemão (A♭-C-B): As-C-H.
Essas duas Séries na verdade soletram o que, em alemão, é o nome da cidade onde a namorada de Schumman, Ernestine von Fricken, nasceu (Asch, que agora é Aš, pertencente à República Checa). São também as letras musicais de seu próprio nome: Schumann’.
Em Carnaval, Schumann vai musicalmente além de Papillons, para quem ele mesmo concebeu a história de que era uma ilustração musical. Carnaval permanece famosa por suas passagens resplandecentes de cordas e por seu deslocamento rítmico.
Dentre os vários que orquestraram Carnaval, temos Ravel, que fez arranjos de apenas algumas partes. A versão aqui apresentada, tem orquestrações de Alexander Glazunov, Nikolai Rimsky-Korsakov, Anatoly Lyadov e Alexander Tcherepnin, por encomenda dos Balés Russos, na pessoa de Sergei Diaghilev.
Bertolt Brecht, Máximo Gorki e Hanns Eisler? O que o maior dramaturgo do século XX tem a ver com um dos escritores russos mais lidos em todo o mundo e um compositor alemão praticamente esquecido? Ora, é fácil, a obra “A Mãe” (Die Mutter).
Gorki foi quem escreveu o romance, que fez e ainda faz muito sucesso em todo o mundo. Brecht fez uma adaptação para o teatro, a qual eu estou louco para ler, e Eisler pegou a peça de Brecht como se fosse um libreto e fez uma cantata.
A história desta obra — seja o romance, a peça ou a cantata — se passa na Russia czarista, pré revolução de 1905, e conta a história de uma mãe que, vendo seu filho parando de ir pra bebedeira, estudando e levando amigos bondosos e barbudos pra casa, começa a se preocupar seriamente e então busca saber mais do socialismo que eles tanto falam. Apesar de eu estar apresentando-a desta forma levemente cômica, “Die Mutter” é uma obra bastante tocante. Não é que ela seja dramática — não há nada de um drama burguês nela — mas é tocante pois consegue mostrar a realidade do ponto de vista da classe trabalhadora, em sua ignorância, anseios e dificuldades. Também mostra toda a nobreza de espírito daqueles que dedicam suas vidas à luta por um mundo melhor.
Nenhuma obra seria mais adequada para homenagear o mês de Abril, que foi de extrema importância na história da Revolução Russa. Foi no dia 16 deste mês que Lenin, há 100 anos atrás, volta à Russia após um um longo exílio e é bem recebido na Estação Finlândia em um dos momentos mais famosos da história, que é quando ele exclama: “Todo Poder aos Sovietes!”. Poucos dias depois Lenin publicaria as Teses de Abril, analisou os acontecimentos políticos e expôs as táticas e a estratégia que deveria ser seguida pelos bolcheviques. Ao perceber que os sovietes (conselhos) que haviam surgido na revolução de fevereiro eram o instrumento adequado para realizar a revolução socialista, Lenin muda a estratégia: ao invés de apoiar a consolidação da revolução burguesa de Fevereiro, os bolcheviques deveriam a partir dali preparar o terreno para realizar a revolução socialista. A grandeza de Lenin reside em outros fatos além desse, como também perceber o caráter permanente da revolução, ir contra todo o pessimismo da conjuntura, ir contra a guerra capitalista que se arrastava, etc.
Muitos julgaram Lenin louco, mas alguns meses depois a revolução se concretizava, da forma teorizada por Lenin. Em nenhum momento na história alguém conseguiu realizar na prática o que teorizou. É pouco ou querem mais?
A adaptação de Eisler, apesar de nada ter a ver com a Revolução Russa, tem muito a ver com o socialismo. A obra tem elementos neoclássicos claros, e é uma das primeiras obras do realismo socialista. No meio de uma Europa entre-guerras marcada por vários compositores de vanguarda, o realismo socialista foi um movimento contraditório que era marcado internamente pelo progresso na concepção de mundo mas o atraso da evolução da forma. Hanns Eisler soube mediar bem essa contradição; temos vez ou outra uma aproximação com o dodecafonismo de Schoenberg, sem chegar à nada demasiadamente abstrato ou academicista, como por exemplo o trecho “Lob der dritten Sache” (tributo às causas das classes baixas). Talvez para facilitar, a obra toda é seguida de um narrador que vai contando a história, quase como um oratório tradicional.
Hanns Eisler teve uma longa relação artística com Bertolt Brecht durante boa parte da sua vida, assim como Kurt Weil. Sua obra pode nos empolgar desse espírito tão presente na obra de Gorki, a nobreza de lutar por algo que visa libertar os explorados, e o poder que uma convicção como essa tem de transformar as pessoas.
Hanns Eisler (1898-1962): Die Mutter
Die Mutter Op. 25
Versão 1 (1950-51)
1 Wie Die Krähe
2 Das Lied Von Der Suppe
3 Der Zerissene Rock
4 Gedanken Über Die Rote Fahne
5 Lob Des Kommunismus
6 Lob Des Lernens
7 Lob Eines Revolutionärs
8 Im Gefängnis Zu Singen
9 Lob Der Wlassowas
10 Lob Der Dritten Sache
11 Grabrede
12 Steh Auf!
13 Lob Der Dialektik
Versão 2 (1969-1972)
1 Ouvertüre
2 Wie Die Krähe
3 Das Lied Von Der Suppe
4 Der Zerissene Rock
5 Gedanken Über Die Rote Fahne
6 Lob Des Kommunismus
7 Lob Des Lernens
8 Lob Eines Revolutionärs
9 Im Gefängnis Zu Singen
10 Lob Der Wlassowas
11 Lob Der Dritten Sache
12 Grabrede
13 Steh Auf!
14 Lob Der Dialektik ( Suite Nr. 4 Op. 30 )
15 Marsch Der Jugend, Die Das Wort Hat (Nr. 3)
16 Finale (Grave – Pesante – Allegro) (Nr. 4)
Rundfunk-Sinfonie-Orchester Berlin
Heinz Rögner, conductor
Um fabuloso CD com a minha musa Anne-Sophie Mutter. É um registro soberbo, magnífico. Talvez a minha admiração por Anne-Sophie Mutter e pela música de Bach exacerbe os conceitos que estou a emitir sobre o post. Acredito que aquele que escute este CD com atenção tem tudo para se impressionar. Surpreendente ainda é a peça de mais de 32 minutos da compositora russa Sofia Gubaidulina. Uma peça que nos transmite uma carga de dramaticidade e angústia notáveis. Arrebata. Entusiasma. Impressiona. Anne-Sophie consegue traduzir com beleza, suavidade, mas com uma tensão comovente as peças desse CD, principalmente a “Em praesens tempus”, de Sofia Gubaidulina. Gubaidulina presenteou a senhora Mutter com a peça. Gergiev conduz a obra à frente da Sinfônica de Londres. Os resenhistas da Amazon foram unânimes em dar 5 estrelas ao CD. Preste a atenção no concerto de Gubaidulina. Boa apreciação incontida!
Johann Sebastian Bach (1685-1750) – Violin Concerto No.1 in A minor, BWV 1041 e Violin Concerto No.2 in E, BWV 1042
Violin Concerto No.1 in A minor, BWV 1041
01. (Allegro Moderato)
02. Andante
03. Allegro assai
Violin Concerto No.2 in E, BWV 1042
04. Allegro
05. Adagio
06. Allegro assai
Trondheim Soloists
Anne-Sophie Mutter, violino e condução
Sofia Gubaidulina (1931-) – In tempus praesens – Concerto for violin and orchestra
07. In tempus praesens – Concerto for violin and orchestra
Anne-Sophie Mutter, violino
London Symphony Orchestra
Valery Gergiev, regente
Tenho escrito bastante nestes posts de resgate do legado de Guiomar Novaes, e desta vez vou deixar que a música fale por si. Apenas comento que estas três séries de peças foram extraídas da edição original em vinil, e não do CD duplo ao lado, o qual contém também as demais gravações que Guiomar fez de Schumann: as Fantasias op.12, Estudos Sinfônicos op.13 e o Concerto, este mais uma vez com a Sinfônica de Viena regida por Klemperer.
Isso NÃO significa que esteja prevista a postagem dessas peças, meus caros! A menos que…
Explico: gostaria muito de reunir aqui seu acervo de gravações completo, mas em 20 dias já postei quase tudo que consegui garimpar: de Chopin, os Noturnos, os Estudos, a Sonata op.35 e mais um álbum de peças diversas. De Beethoven, duas versões do 4.º Concerto e a Sonata ao Luar. Além disso, uma série de transcrições e miniaturas diversas, seu disco de música brasileira de 1974, e agora este Schumann. Por publicar restam apenas a Sonata op.58 de Chopin e, de interesse duvidoso, as digitalizações dos seus 78 rotações de 1919 a 1927.
E os Prelúdios, o 2.º Concerto e tantas peças mais de Chopin? E o Imperador? E as demais peças de Schumann? Claro que tudo interessa… mas agora só vai ser possível se houver colaborações. Ou seja: se você tem alguma gravação da Guiomar, especialmente se já digitalizada, que tal participar? ( Contato, vocês sabem: [email protected] )
Diferente dos meus primeiros posts de Franck e de Pachelbel, desta vez não coloco o título “O órgão essencial de…”
Por quê? Porque não acho que este disco dê a conhecer suficientemente este magnífico compositor a ponto de merecer o título “O essencial de”.
E por quê o estou postando mesmo assim?
Porque, acreditem ou não, não estou encontrando outra gravação deste compositor não só magnífico como também chave na história da música: um dos que operaram a transição Renascença-Barroco paralelamente a Monteverdi. Talvez se possa inclusive dizer que este fez a transição na Europa do Sul, aquele na Europa do Norte. (E, coincidência engraçada, cada um deles baseado numa “cidade dos canais”: Veneza, “a Amsterdam do Sul”, e Amsterdam, “a Veneza do Norte”).
Enfim, senhores, tenham certeza: Sweelinck é mais.
Mas não por isso deixem de baixar este disco que, apesar de ser menos do que podia, ainda assim já me rendeu tantas e tantas horas de encantamento e serenidade sensível (diferente de “sentimental”!)
Aliás, querem saber em que ponto é que eu encrenco com este disco? Lembro que em 1980 e pouco eu conversava com um amigo baixista da noite, e dizia deplorar a invasão das baterias eletrônicas. Disse-lhe que a música perdia coração, perdia vida, já que o músico humano sempre deixa escapar certas oscilações e irregularidades no tempo – o que, longe de ser um defeito, é um dos elementos fundamentais da expressividade da música. E aí ele me disse: “pois é, mas as mais novas já vem com um botão chamado humanizer, o “humanizador”, que introduz artificialmente algumas irregularidades pra deixar a música mais natural…”
Aí está. Desculpem de coração os tantos que gostam dele, mas para mim Gustav Leonhardt é uma ovelha branca que ainda não entendo como foi aceita no movimento de restauração da autenticidade da música antiga. Chego a suspeitar que se trate de um robô: um robô que toca todas as notas com perfeição, mas foi construído antes da invenção do humanizer. Ou seu metrônomo está regulado da velocidade fixa “x”, ou na velocidade fixa “y”, definitivamente não sabe oscilar, gingar, fazer uma transição.
E nunca vou esquecer a lição que o Padre Penalva costumava proclamar em todo ensaio aos seus coralistas, em Curitiba: “mais vale a bossa que a nota”.
(E apesar disso tudo… eu se fosse vocês não perdia esta escassa oportunidade de ouvir o inspirado Sweelinck – nome que, em tempo, os holandeses pronunciam ‘suêilink’).
Jan Pieterszoon Sweelinck (1562-1621) Fantasias, Tocatas e Variações para órgão
A1 Echo-Fantasie (Fantasia em Eco) n.º 12, em la 4:20
A2 Da pacem, Domine, in diebus nostris (variações) 8:43
A3 Hexachord Fantasie 9:50
B1 Fantasie n.º 4, em re 13:55
B2 Puer nobis nascitur / Ons is gheboren (variações) 3:30
B3 Toccata n.º 17, em la
Gustav Leonhardt ao órgão da St.Jakobskerk, Den Haag (Haia)
Gravação original em LP (vinil): Harmonia Mundi, 197?
Digitalizado por Ranulfus, jul. 2010
O dia 8 de Março é mundialmente famoso por ser o dia Internacional da Mulher. Poucos lembram ou sabem, que nesta mesma data, há 100 anos atrás, as tecelãs de São Petersburgo fizeram uma greve histórica, que acabou por ser o estopim daquilo que hoje conhecemos como a Revolução Russa. Cansadas pelas jornadas de trabalho extenuantes e em péssimas condições, que lhes dava um salário miserável, cansadas da participação do regime czarista na guerra imperialista entre as potências europeias, as tecelãs de São Petesburgo pararam a produção no dia 8 de Março (que no calendário Juliano era 23 de Fevereiro), data que era celebrada como Dia Internacional da Mulher desde 1914. Por terem iniciado a revolução que foi o maior paradigma do século XX, essas mulheres são lembradas e homenageadas na mesma data até hoje.
Para homenagear os 100 anos dessa greve histórica, venho postar a Magnum Opus de Frederic Rzewski: “The People United Will Never Be Defeated!” (O Povo Unido Jamais Será Vencido!). Baseada na composição de Sergio Ortega e o grupo Quilapayún, “El pueblo unido jamás será vencido“, que também compuseram o famoso hino da campanha de Allende, “Venceremos“. A obra foi composta por Rzewski em 1975, em homenagem à luta do povo chileno contra um regime que derrubou o presidente eleito Salvador Allende e instaurou a ditadura militar de Augusto Pinochet.
A música contém referências a outras lutas da esquerda, como citações à tradicional canção socialista italiana “Bandiera Rossa” e a “Canção da Solidariedade” de Bertolt Brecht e Hanns Eisler.
É uma obra excêntrica. O pianista deve usar técnicas incomuns, como por exemplo gritar, bater a tampa do piano e coisas do tipo. Tipicas técnicas de vanguarda do século XX. Mas não se preocupem, a maior parte da obra é tonal, usando muita da linguagem do romantismo do século XIX, mas misturando tonalidade diatônica, musica modal, e técnicas seriais. Assim como as Variações Goldberg de Bach, o tema inicial é repetido ao final.
Para além dos aspectos técnicos, a música é uma bela homenagem às lutadores e aos lutadores que tentaram fazer do nosso mundo um lugar melhor para se viver.
Viva a greve das tecelãs de São Petersburgo! Feliz dia Internacional das mulheres! 100 anos de Revolução Russa!
Frederic Rzewski (1938):
The People United Will Never Be Defeated!
36 Variations on “El pueblo unido jamas sera vencido” by Sergio Ortega
1 Theme — With determination (1:20)
2 Variation 1 — Weaving: delicate but firm (0:50)
3 Variation 2 — With firmness (0:52)
4 Variation 3 — Slightly slower with expressive nuances (1:09)
5 Variation 4 — Marcato (0:59)
6 Variation 5 — Dreamlike, frozen (1:02)
7 Variation 6 — Same tempo as beginning (1:07)
8 Variation 7 — Tempo (Lightly, impatiently) (0:58)
9 Variation 8 — With agility; not too much pedal; crisp (1:08)
10 Variation 9 — Evenly (1:00)
11 Variation 10 — Comodo, recklessly (1:00)
12 Variation 11 — Tempo I, Like fragments of an absent melody — in strict time (0:58)
13 Variation 12 (1:09)
14 Variation 13 — ♩ = 72 or slightly faster (1:34)
15 Variation 14 — A bit faster, optimistically (1:34)
16 Variation 15 — Flexible, like an improvisation (1:14)
17 Variation 16 — Same tempo as preceding, with fluctuations (1:21)
18 Variation 17 — L. H. strictly half note = 36, R. H. freely, roughly as in space (1:00)
19 Variation 18 (1:26)
20 Variation 19 — With Energy (0:37)
21 Variation 20 — Crisp, precise (0:35)
22 Variation 21 — Relentless, uncompromising (0:53)
23 Variation 22 — ♩ = 132 (0:48)
24 Variation 23 — As fast as possible, with some rubato (0:28)
25 Variation 24 — ♩ = 72 (2:00)
26 Variation 25 — ♩ = ca. 84, with fluctuations (1:55)
27 Variation 26 — ♩ = 168 In a militant manner (1:09)
28 Variation 27 — ♩ = 72 Tenderly, and with a hopeful expression (4:46)
29 Variation 28 — ♩ = 160 (1:22)
30 Variation 29 — ♩ = 144–152 (0:32)
31 Variation 30 — ♩ = 84 (2:18)
32 Variation 31 — ♩ = 106 (0:55)
33 Variation 32 (0:57)
34 Variation 33 (0:58)
35 Variation 34 (1:02)
36 Variation 35 (1:03)
37 Variation 36 (1:22)
38 Improvisation (2:38)
39 Theme — Tempo I (2:40)
Ursula Oppens, piano
Four Hands
40 I. ♩ = 96~104 (6:06)
41 II. senza misura (ca. 30” per line) (3:14)
42 III. ♩ = 72 (1:28)
43 IV. ♩ = 96 (5:05)