Assim como Domenico Scarlatti foi organista na Basílica de São Pedro do Vaticano quando jovem, o Padre Antonio Soler aproximou-se da corte espanhola quando, aos 23 anos e após já ser titular do órgão de igrejas menores, assume os cargos de organista e diretor de coro no grandioso Monasterio de El Escorial, construído no século 16 próximo a Madrid e que, além de Monastério, também era um Palácio Real e local de enterro dos reis da Espanha. Durante os últimos cinco anos de vida de Scarlatti, Soler foi seu aluno e também parece ter sido seu copista, pois ele escreve “e se se encontra nas Obras de Scarlatti tal sinal [duplo sustenido], não a tenham por escrita dele, mas minha.”
Ao mesmo tempo, Soler já começava a compor suas próprias sonatas para cravo, e a proximidade dos dois era tamanha que, em um manuscrito da época, intitulado “Sonatas del Sr. Dn. Domingo Escarlati y otras de frai Antonio Soler”, as sonatas dos dois se misturam ao longo de todo o documento. O nome “frai Antonio Soler” faz referência ao seu período como frade da ordem de São Jerônimo, mas durante a maior parte de sua vida ele foi citado como padre.
Além de sonatas, Soler compôs seis concertos para dois órgãos, além de mais de 300 obras vocais incluindo missas, hinos, motetos e também villancicos, que são obras profanas. E atualmente sua obra mais famosa é um dançante Fandango cheio de variações sobre um baixo constante, muito tocado nos recitais de gente como Scott Ross e Christian Zacharias. O Fandango tem tido sua autoria questionada, mas não deixa de ser uma grande obra espanhola do século 18, sendo ou não de Soler.
Soler é descrito como um homem culto, profundo conhecedor de Latim, de espírito sensível e profundamente religioso. Muito humilde, recusou-se a ser retratado para a galeria dos músicos ilustres da Espanha, postura que nos impediu de conhecer o seu rosto. Grande estudioso, ele publicou um tratado em 1762: Llave de la modulación, y antigüedades de la música. Ali, Soler busca conceituar a modulação que ele e seus contemporâneos faziam no cravo, pianoforte e órgão, normalmente de forma improvisada: “a Modulação, segundo sua definição geral, é a suavidade nos trânsitos de um tom a outro”. No prefácio, Don Joseph de Nebra, Organista e Vice-Maestro da Real Capela de Sua Majestade, afirma: “Confesso com ingenuidade que nunca pensei que pudessem dar regras fixas para Modulações tão sofisticadas: acreditava que eram produzidas pela prática, pelo bom gosto, pela fineza do ouvido …” E Don Antonio Ripa, outro grande organista da época, apresentou a obra de Soler com estas palavras que deixam claro que a função da obra era sobretudo como guia para o improviso, e que nem todos os improvisadores da Espanha eram tão bons como Soler, alguns até incomodavam os ouvidos:
“Julgo que esta Obra há de ser de muita utilidade, não só para Mestres de Capela e Organistas, a quem abre portas com várias regras e Modulações de bom gosto, para que à sua imitação suas produções musicais tenham novidade e boa harmonia, sem incorrer no defeito da aspereza e sem serem ingratas ao ouvido”.
Eu gosto de álbuns como este, em que Maggie Cole toca a música de Soler em dois instrumentos: um fortepiano e um cravo. Fica evidente que a música de Soler soa bem em ambos e que a busca por um instrumento mais correto que os outros às vezes é um preciosismo bobo, provavelmente impensável nos tempos de Soler, quando se tocava com o instrumento que estivesse disponível e afinado. Outra constatação: ao contrário do piano dos nossos dias, de som muito mais potente que o cravo, naquela época talvez os pianofortes fosse mais suaves e com um som menos encorpado do que seu parente mais velho. De fato, muitos cravos de meados do século 18 eram bem maiores do que aqueles do século anterior… Como resume o especialista em instrumentos antigos Michael Latcham, os novos cravos na corte espanhola tinham sessenta e uma notas, mais do que qualquer um dos cinco pianofortes que a rainha Maria Bárbara havia encomendado de Florença. O maior cravo, segundo Latcham, era transportado de palácio em palácio conforme a corte se mudava ao longo do ano. No outono a corte ficava no Escorial. Ali, Soler deve ter ouvido Maria Bárbara e Scarlatti tocarem neste instrumento.
Padre Antonio Soler (1720-1783) – Sonatas, Fandango
01. Sonata 72 in F minor
02. Sonata 41 in E flat Major
03. Sonata 18 in C minor
04. Sonata 19 in C minor
05. Sonata 87 in G minor
06. Sonata 78 in F sharp minor
07. Fandango
08. Sonata 84 in D Major
09. Sonata 86 in D Major
10. Sonata 85 in F sharp minor
11. Sonata 90 in F sharp Major
12. Sonata 88 in D flat Major
Maggie Cole, fortepiano (1-6) and harpsichord (7-12)
Fortepiano: Derek Adlam 1987, after Anton Walter, Vienna circa 1795
Harpsichord: Robert Goble 1986, after AH Haas, Hamburg 1740
Recorded at Abbey Road Studio nº1, London November 1989
Pleyel