A Obra Completa de Béla Bartók (1881-1945) – Quarteto de cordas no. 4 [Bartók – String Quartets nos. 1-6 – Tátrai Quartet] #BRTK140

Se deixamos o Bartók do segundo quarteto no final da I Grande Guerra,  assistindo ao colapso do mundo austro-húngaro em que crescera, nós o reencontramos a compor o quarto quarteto, em 1928, numa Hungria que ressurgia como nação e vivia suas dores de crescimento em outra de suas tantas décadas conturbadas, colorindo-se de fascismo depois de abraçar brevemente o comunismo.

Béla, entretanto, tinha voltado a uma situação confortável: radicado em Budapest, lecionava piano da Academia de Música Franz Liszt e estava de volta às expedições etnomusicológicas tão queridas a ele, nas quais dividia rumos e experiências com seu grande amigo Zoltán Kodály. Separado de Márta, mãe de de seu filho Béla Bartók, o Terceiro (pois o Primeiro foi o pai do compositor), vivia agora com a pianista Ditta, que fora sua aluna de piano e que ficaria a seu lado até seus últimos dias.

Depois da, assim a chamo, explosão radical de seu conciso quarteto anterior, Bartók compôs um expansivo tour de force em que parece querer testar as capacidades do conjunto de instrumentistas. No quarteto no. 4, o compositor instiga os intérpretes a atacarem as cordas tanto com a crina quanto com a madeira do arco (col legno); a beliscá-las e mesmo lançá-las contra os braços dos instrumentos (pizzicato); a fazerem-nas cantar anasaladas pela surdina, ou gemer pela estridente fricção do arco perto da ponte (sul ponticello). Some-se a todos esses truques o uso generoso dos glissandi, e nada resta a reclamar sobre exploração timbrística. Ela, no entanto, é apenas parte da riqueza dessa obra-prima: as tramas sonoras baseadas em motivos curtos, as harmonias dissonantes e ritmos impetuosos têm um frescor improvisatório que em parte ofusca a engenhosa concepção da obra. Nas raras palavras do próprio Bartók, que pouco se dedicava a explicar suas criaturas:

A obra é em cinco movimentos; seu caráter corresponde à clássica forma da sonata. O movimento lento é o cerne da obra; os outros movimentos são, por assim dizer, arranjados em camadas em torno dele. O movimento IV é uma variação livre do II, e o I e o V têm o mesmo material temático: ou seja, em torno do cerne (movimento III), metaforicamente falando, I e V são as camadas internas, e II e IV, as internas”

As “camadas externas” são frenéticas, repletas de dissonâncias e verve, e baseiam-se no mesmo motivo de seis notas. As “camadas internas” são dois scherzi que pegam um pouquinho mais leve – se é que se pode falar assim de peças que assaltam dessa maneira os sentidos – e se escoram em efeitos timbrísticos: o segundo, quase extraplanetário movimento é todo em surdina, enquanto o quarto é completamente executado em pizzicato, não só com a delicada técnica clássica do beliscar das cordas, como também com a indicação expressa de golpeá-las com tanta força que elas batam no braço dos instrumentos – efeito até então inusitado, e que se ficou celebrizou como “pizzicato Bartók”. O cerne, enfim, é um movimento lento à guisa de noturno, lírico como poucos outros na produção do compositor, e que respira a mesma atmosfera sonora do belíssimo Adagio da “Música para cordas, percussão e celesta”, de oito anos depois.

O resultado é, na minha desimportante opinião, o mais exuberante entre os seis quartetos e a maior obra-prima dessa extraordinária série. Seu efeito irresistível só cresce a cada nova audição: ao nos acostumarmos gradativamente à estranheza inicial trazida pelas dissonâncias e pelos modos incomuns, passamos a admirar a nova, singular harmonia e o rigor formal, quase clássico, de mais essa cria do magiar genial.


Béla Viktor János BARTÓK (1881-1945)

Quarteto de cordas no. 1, Op. 7, Sz 40 (1908-1909)

1 – Lento – Attacca:
2 – Allegretto
3 – Introduzione. Allegro – Attacca:
4 – Allegro vivace

Quarteto de cordas no. 2, Op. 17, Sz 67 (1915-1917)

5 – Moderato
6 – Allegro molto capriccioso
7 – Lento

Quarteto de cordas no. 3, Sz 85 (1927)

8 – Prima Parte. Moderato – Attacca:
9 – Seconda Parte. Allegro – Attacca:
10 – Ricapitulazione della Prima Parte. Moderato
11 – Coda. Allegro molto

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Quarteto de cordas no. 4, Sz 91
 (1928)

1 – Allegro
2 – Prestissimo, con sordino
3 – Non troppo lento
4 – Allegretto pizzicato
5 – Allegro molto

Quarteto de cordas no. 5, Sz 102 (1934)

6 – Allegro
7– Adagio molto
8 – Scherzo: Alla bulgarese
9 – Andante
10 – Finale: Allegro vivace

Quarteto de cordas no. 6, Sz 114 (1939)

11 – Mesto – Più mosso, pesante – Vivace
12 – Mesto – Marcia
13 – Mesto – Burletta
14 – Mesto

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Tátrai-vonósnégyes
Vilmos Tátrai e Mihály Szűcs, violinos
György Konrád,
viola
Ede Banda,
violoncelo

Gravado em 1966

Um “pizzicato Bartók” no papel

 

Vassily

3 comments / Add your comment below

  1. Estava morrendo de saudade do Blog! Quando vi, havia sumido! Que susto! Faz meses que procurava, onde teria ido parar!? Bom reencontrar o PQP! Estou muito feliz mesmo!

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