Bogusław Schaeffer é uma figura curiosa nas artes polonesas. Além de compositor e instrumentista, é também teatrólogo e, eu diria, um obcecado pela experimentação. Construiu toda sua obra dentro de um conceito de que cada peça tem sua própria lógica, que mesmo em seu desenvolvimento é cambiante, não aplicando padrões à sua produção. Ainda assim, justamente essa falta de padrões acaba trazendo uma característica e um clima que aproximam todas as suas obras (e, sim, criam um padrão): elas não têm linearidade, não têm unicidade clara, sempre têm um certo ar de vagar que particularmente me cativa. Apesar de toda a experimentação, uma coisa é clara: o compositor não abre mão da expressão. Por todas as vias tortas chegamos ao lirismo, ao êxtase, ao lúdico. O única questão é que tudo isso logo se transforma, muda de clima, ganha constantemente outra expressão.
De um certo ponto de vista, Schaeffer é um <em>enfant terrible</em> da música polonesa. Sua obra ainda é pouco tocada mesmo na Polônia, ganhou poucos prêmios, as gravações são dificílimas de achar. Mas do alto de seus 80 anos, continua a produzir sem cessar e, aparentemente, sem se importar.
Aqui vai a primeira obra que conheci dele, o Concerto nº3 para piano, orquestra e computador, de 1990. Do que sei (e não é muito, já que ele produziu muito, mas é muito pouco tocado mesmo na Polônia), é uma das raras obras com divisão em movimentos, o que torna o passeio não-linear bem mais fácil. O uso do computador é muito interessante e de certa forma discreto, harmonizando bem com a trama orquestral. Um trechinho dessa peça foi usado em um filme do David Lynch, Império dos Sonhos (2006) e, por isso é uma peça mais fácil de ver por aí (ainda que no cd da trilha sonora esteja só marcado como “Piano Concerto”).
Boa diversão.
Bogusław Schaeffer (1929- )
Concerto para piano, orquestra e computador (1990)
I. Entrata
II. Tumultuoso
III. Drammatico
IV. Nostalgia
V. Gaio
VI. Fuga
VII. Notturno
VIII. Amoroso
IX. Blues
X. Estasi
XI. Finale
Bogusław Schaeffer, piano
Marek Choloniewski, computer
Orquestra da Rádio de Katowice
Bogdan Oledzki, regência
itadakimasu
Caro Vanderson,
a pouco tempo atrás, na abertura do festival de inverno de Campos do jordão, a Osesp tocou O livro dos Sons, de Rodolfo Coelho de Souza. A obra é toda atonal e no segundo movimento um computador entra na orquestra. Não me agrada os ouvidos o atonalismo, mas eu realmente fiquei fascinado pela obra.
O pessoal do blog tem um trabalhão fara fazer as postagens e ainda por cima o itadakimasu, que faz pesquisas intermináveis para fazer postagens. Creio que ele não gostaria de ver um comentário falando que acha a obra dele Ridícula. Penso que você poderia usar um termo mais brando pra expressar a sua opinião sobre a obra.
Abraços.
Prezado Vanderson, não há nada de ridículo nisso. Música eletrônica feita em tempo real pelo computador é coisa comum hoje em dia.
”de ver um comentário falando que acha a obra dele ridícula”
Quis dizer: de ver um comentário falando que a postagem dele é ridícula
Abraços
Caro Itadakimasu:
Muito boa a postagem! Enquanto escrevo estou ouvindo-a. Tenho baixado todos os seus posts. Através destes tenho conhecido compositores que nunca tinha ouvido falar. Acho que é o mínimo que podemos fazer para prestigiar o excelente trabalho realizado aqui na casa do Filho de Bach.
Caro Adriano, fico contente que tenha gostado dos 3 posts que fiz até o momento. Espero me esmerar para continuar contando com seu interesse.
Olá a todos…
Há um bom tempo atrás, eu toquei juntamente com a Orquestra Experimental de Repertório, de São Paulo, um concerto para computador e orquestra, do Rodolfo Coelho de Souza. Pena que ainda não existe gravação desta obra prá ser postada aqui.
Olá, Lu. Na verdade, existe sim, eu a tenho aqui. Só não lembro mais onde consegui e não tenho ideia de quem a está interpretando (além de estar em 128kbps, tristemente). Vou ver se a posto aqui nos próximos dias.
Vanderson, quanto ao mal-entendido, sem problemas. Foi útil para você aprender um pouco sobre possibilidades musicais. Ainda que pouca coisa puramente eletrônica me agrade (minha maior referência é uma peça do compositor romeno, Octavian Nemescu, Secula-Seculorum, que foi feito completamente em computador e que eu acho linda que só), há coisas fascinantes em música eletroacústica e pretendo sempre estar postando algo aqui e ali.