Nota: esta postagem, assim como todas as demais com obras de Heitor Villa-Lobos, não contém links para arquivos de áudio, pelos motivos expostos AQUI
Fazia tempo que eu queria postar esse CD, mas ele simplesmente tinha desaparecido. Lembrei dele, porque senti falta da Fantasia para Saxofone e Orquestra entre as obras postadas, mas acabei perdendo a oportunidade de postá-lo em homenagem aos 50 anos de falecimento de Villa-Lobos, exatamente por não saber onde andava o meu exemplar. Agora que o encontrei, cá estou compartilhando com vocês.
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O instrumento mais representativo da música brasileira é o violão. Não é à toa que uma das parcelas mais legítimas da obra de Heitor Villa-Lobos seja dedicada a este instumento. É claro que seria incongruente afirmar-se que há composições mais ou menos legítimas do que outras. Mas, no caso específico de Villa-Lobos, a obra para violão, principalmente os Préludios, os Estudos e o Concerto para Violão e Pequena Orquestra, já integram em caráter definitivo o repertório universal do violão, enquanto outras obras ainda aguardam a vez de se legitimarem. Todo compositor passa por esse processo. Mahler, Bruckner e muitos outros também viveram essa experiência, embora já estivessem mortos.
Em 1951, atendendo a um pedido do violonista Andrés Segóvia, Villa-Lobos compôs o Concerto para Violão e Pequena Orquestra. Hoje em dia, a popularidade de uma obra, sem nos descuidarmos de sua valoração intrínseca, pode ser medida estatisticamente, através do número de gravações registrado em catálogos. Nos últimos dez anos, o Concerto para Violão mereceu mais de vinte gravações, tendo como intérpretes alguns dos maiores violonistas da atualidade: Juliam Bream, Pepe Romero, John Williams, Turíbio Santos e outros. Na verdade, o Concerto é um verdadeiro achado, dividido nos tradicionais três movimentos, obedientes aos andamentos rápido-lento-rápido. Uma das grandes atrações inventadas por Villa-Lobos é a cadenza que faz a união do segundo com o terceiro movimento, onde o violonista exige suas habilidades técnicas em harmônicos, ritmos e citações de grande sutileza.
Talvez a identificação de um paralelismo entre Bach e a essência da música brasileira tenha sido a principal marca da genialidade de Heitor Villa-Lobos. Foi a partir daí que a representação de nossos sistemas rítmicos adquiriu a grandeza indispensável à fama internacional. Doa a quem doer, o sistema rítmico da antiga MPB era viciado no uso e abuso da síncope, tanto na melodia quanto no acompanhamento, o que dificultava sua reprodução por músicos de outras culturas. Uma vez Villa-Lobos se referiu à dificuldade com que os compositores brasileiros da primeira metade do século anotavam o samba. Além do mais, os ritmos que acentuam os tempos fortes do acompanhamento se tornam mais populares (a valsa, a marcha, o tango, o blues, etc.). A grandeza das Bachianas foi sublinhada justamente por essa característica rítmica mais universal, sem que se perdessem os padrões brasileiros. O grande exemplo é a Quarta Bachianas. Já a Bachianas Nº 9 é mais econômica e, devido a isso, talvez seja mais representativa das intenções de Villa. Composta originalmente para vozes, sendo em seguida reestruturada para orquestra, apresenta como introdução um Prelúdio de escritura absolutamente despojada, seguido por uma Fuga a seis vozes, onde Heitor esbanja seus conhecimentos de contraponto.
Tanto a Fantasia para Saxofone e Pequena Orquestra, de 1948, quanto a Ciranda das Setes Notas, para fagote e quinteto de cordas, de 1933, mostram o compositor numa de suas preferências: a combinação de instrumentos de sopro e conjuntos de cordas. Na verdade, a Fantasia para Saxofone, funciona como um pequeno concerto, também nos três movimentos tradicionais, rápido-lento-rápido, já empregados no Concerto para Violão.
Na Ciranda, as sete notas do título são enunciadas pelas cordas e repetidas pelo fagote, do primeiro ao sétimo grau da escala, com um retorno imediato ao sexto. Um tema simples, que passará por diversos estágios, garantindo ao fagote o papel de condutor de uma estrutura composta em forma contínua, mas que na realidade têm um sabor de suíte. A comunicação através de uma escritura multifacetada, às vezes tipicamente brasileira, outras vezes, em tonalidades reflexivas, tão bem desenhadas pelo timbre nostálgico do instrumento solista.
Fonte: Encarte do CD. (Victor Giudice)
Uma ótima audição!
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Villa-Lobos: Concertos para Solista e Orquestra
Concerto para Violão e Pequena Orquestra (1951)
01. Allegro preciso (5:14)
02. Andantino ed Andante – Cadenza (7:03)
03. Allegro non troppo (4:43)
Bachianas Brasileiras Nº 9 para orquestra de cordas (1945)
04. Prelúdio (2:11)
05. Fuga (6:50)
Fantasia para Saxofone e Orquestra (1948)
06. Animé (4:41)
07. Lent (3:11)
08. Très animé (3:12)
09. Ciranda das Sete Notas para fagote e cordas (1933) (10:26)
Turíbios Santos, violão
Paulo Moura, saxofone soprano
Noel Devos, fagote
Orquestra de Câmara Brasileira
Bernardo Bessler
BAIXE AQUI / DOWNLOAD HERE
Marcelo Stravinsky
Marcelo, o seu texto diz: em comemoração aos 50 anos de falecimento do compositor, não querendo lhe corrigir, já que escreves muito bem, mas creio que o correto seria dizer: em homenagem ao compositor que faleceu há 50 anos, já que o texto que escreveste dá a entender que se comemora a morte do compositor, quando justamente queremos homenagear a memória do ilustre compositor, e para finalizar, parabéns por essa postagem, que maravilha esses concertos para violão e saxofone, não conhecia, estou encantado, que poesia, explêndido!
KkkkkkkkkkkKKkkkK, tens toda razão! Muito bem observado, Luis, quem já se viu comemorar a morte de alguém, ainda mais esse alguém sendo Heitor Villa-Lobos.
Não não, pode-se falar comemorar sim, não quer dizer necessarimanete fazer festa ou alegrar-se, mas simplesmente recordar.
Talvez até possa, Lucas, mas concordo com o Luis, soa mal pra caramba. Obrigado pelo comentário!
Daqui a algum tempo vou postar o Concerto para violão com o Julian Bream. 😉
OHH essa fez o meu dia!
Essa versão do cencerto para violão com o Turibio Santos é simplemente decepcionante, a pior que já ouvi, e esperava que fosse justamente o contrário, concerto para sax também não ficou nada boa.
Não digo nada em relação ao Concerto para Violão, mas sobre a Fantasia, é a melhor interpretação, na minha opinião.
Cara, nunca vi esse comercial, até porque não moro no Rio, mas se você encontrar o vídeo do comercial, passe o link que a gente verifica que obra é essa. Eu até procurei alguma coisa no Youtube, mas não achei nada.
De qualquer forma, dá uma olhada nesse link:
http://www.youtube.com/watch?v=MQjZbkNIx2E
Strava, conhece a versão da Fantasia desse link abaixo da EMI? Não conheço o solista, mas me parece bem melhor do que essa com o Paulo Moura, é simplesmente perfeita, ah, o concerto para Violão com Angel Romero me parece também melhor do que a versão do Turibio, a começar pela orquestração mais coesa, enfim, quiser conferir: http://sictransitoperamundi.blogspot.com/2009/11/villa-lobos-heitor-instrumental-and.html
O álbum da EMI é notável, principalmente pelo primeiro CD, com a Cristina Ortiz arrebentando no “Momoprecoce” – de longe, a melhor composição para solista e orquestra de Villa-Lobos. Genial.
As gravações brasileiras de Villa-Lobos, como a do Turíbio Santos, as do choros de câmara, emocionam pela intimidade com a linguagem e pela musicalidade geral, mas são tecnicamente muito deficientes. Única exceção: o ciclo da OSESP, perfeito do começo ao fim.
(Sim, acho o Neschling muito bom nos Choros; ele ter abdicado das Bachianas foi uma bênção, pois seu estilo não combina. Sem contar que isso permitiu ao Minczuk fazer as melhores interpretações EVER dessas obras.)
Conheço sim, Miguel, e com certeza John Harle é um intérprete muito respeitado, mas confesso que aprecio muito a musicalidade e brasilidade de Paulo Moura. E concordo com você a respeito do Concerto para Violão – a orquestra deixa muito a desejar.
Bom, pessoas, na semana que entra entrará no ar também mais uma gravação dessa Fantasia de Villa-Lobos: a de Eugène Rousseau no sax com a Orquestra de Câmara Paul Kuentz – num duplo oferecimento Strava-Ranulfus… rsrs
Não tem a MALANDRAGEM meio chorona meio jazzista que esta tem, mas considero grande realização musical – da “música perene”, acima dos estilos de época… Bom, esperem só um pouquinho e depois me digam!
Quanto ao Paulo Moura, minha relação com o som dele nunca deixou de ser ambígua… e acabei encontrando razões para vê-lo como uma espécie de “Elza Soares do sax”, não sei se me entendem…
Vanderson, por acaso, não seria “O Trenzinho do Caipira”, tocata da “Bachianas Brasileiras Nº 2”?
Versão Orquestral
http://www.youtube.com/watch?v=DC8oFe5bkeY
Versão Canto Popular
http://www.youtube.com/watch?v=N5M6zlruNKA&feature=related
Olá Ranulfus,
“Bom, pessoas, na semana que entra entrará no ar também mais uma gravação dessa Fantasia de Villa-Lobos: a de Eugène Rousseau no sax com a Orquestra de Câmara Paul Kuentz – num duplo oferecimento Strava-Ranulfus… rsrs
Não tem a MALANDRAGEM meio chorona meio jazzista que esta tem, mas considero grande realização musical – da “música perene”, acima dos estilos de época… Bom, esperem só um pouquinho e depois me digam!”
A Fantasia de Villa-Lobos,possui 3 excelentes gravações:
1- Eugene Rousseau – A primeira e adorada pelos puristas
2- Paulo Moura – A segunda mostrando o Sax Brasileiro
3- Paquito de D’Rivera – terceira e houve uma certa conveniência junto a gravadora.
De minha parte fico com a de Paulo Moura pois já o assisti tocando “Fantasia para saxofone soprano” ao vivo com Clara Sverner ambos tocavam a peça de cór e corretamente .Mais uma coisa eu sempre adorei em Villa Lobos e Paulo Moura, no primeiro aquela unha suja de terra do Brasil e em Paulo Moura a sua competência em tocar as peças de Villa Lobos e outros compositores Brasileiros.
Na realidade Fantasia possui uma parte que é um chorinho e bem sincopado e saudosista , coisa que um ouvido mais atento irá perceber.
Há sim,Eugene Rousseau é um saxofonista fantástico mais não devemos comparar gênios pos eles são únicos.
http://www.youtube.com/watch?v=5A1Jq_NNOPE&feature=fvst
http://www.youtube.com/watch?v=ipinNCl4Cvw
http://www.youtube.com/watch?v=btPaRIb5zY0&feature=related
sds.
Obrigado por essa verdadeira aula, William! Comentários assim nos dão certeza de estar DIALOGANDO (o que significa ao mesmo tempo “crescendo”), e não só jogando palavras num poço sem fundo!
Estive ouvindo de novo as 2 versões (Moura e Rousseau) com um amigo, e chegamos justamente à conclusão de que nenhuma pode ser descartada. O fraseado de Moura é imbatível. O primeiro movimento de Rousseau fica realmente reduzido em comparação: reduzido a ‘notas tocadas’, enquanto Moura ‘diz frases’.
Mas o CORPO DO SOM de Rousseau é sempre, a cada nota, uma das coisas mais bonitas que a vida me deu a oportunidade de conhecer!
No geral (e um pouco no espírito dos Estudos do Imaginário de Gilbert Durand), ficamos com que Paulo Moura se sai muito melhor nas manhas e meandros NOTURNOS no primeiro movimento, mas que Rousseau parece dar mais conta do tom HERÓICO – vertical e diurno – do terceiro.
Tudo elocubrações provisórias, claro.
O que ressalta de tudo isso é que essa pequena obra, longe de ser apenas “mais uma” no mar de composições de Villa-Lobos, está entre os maiores acertos do nosso grande. Acho que nunca deveria deixar de ser mencionada entre suas obras principais!
Vou entrar na conversa também, apesar de perceber que o papo parece já estar se dando por encerrado…
Posso até estar exagerando, mas a minha impressão sobre a interpretação do Rousseau, é como se colocasse a partitura para um computador tocar, tipo arquivo MIDI – entonação perfeita das notas, tempos, dinâmicas, som maravilhoso e técnica impecável, porém sem alma. Mas a culpa não é dele. São culturas e costumes diferentes. Por que Rampal não tocava chorinho?!?! Porque não gostava?!?! Por falta de convívio, falta de cultura brasileira.
O sax de Moura, pode até soar esquisito, zombeteiro, sujo, sei lá, mas é uma interpretação só dele, uma interpretação que nos aproxima do nosso jeito de ser, que fala diretamente aos nossos corações, o que me agrada muito.
Abraços a todos!
Ranulfus
“Estive ouvindo de novo as 2 versões (Moura e Rousseau) com um amigo, e chegamos justamente à conclusão de que nenhuma pode ser descartada. O fraseado de Moura é imbatível. O primeiro movimento de Rousseau fica realmente reduzido em comparação: reduzido a ‘notas tocadas’, enquanto Moura ‘diz frases’.
Mas o CORPO DO SOM de Rousseau é sempre, a cada nota, uma das coisas mais bonitas que a vida me deu a oportunidade de conhecer!”
Strava
“O sax de Moura, pode até soar esquisito, zombeteiro, sujo, sei lá, mas é uma interpretação só dele, uma interpretação que nos aproxima do nosso jeito de ser, que fala diretamente aos nossos corações, o que me agrada muito.
Abraços a todos!”
Ranulfus e Strava,
Gostei muito do comentário de vcs. uma coisa que notei foi o respeito,conhecimento e posicionamento de particular de cada um.
O regente e a orquestra são elementos de base para um bom concerto, no disco de vinil que tenho da mesma peça com o Paulo Moura sobre regência do Julio Medaglia e dele com a Clara Sverner em cada uma as interpretações soam de maneira diferente. E, é disso que gosto no músico brasileiro, mais não há nenhuma duvida da beleza melodica e da técnica instrumental dessa peça.
Aproveitando o café, gostei da interpretação do “Concerto para Violão e Pequena Orquestra”, já conhecia uma interpretação desse concerto sendo executada pelo Narciso Yepes, parece que em um violão de 10 cordas mais essa gravação com Turíbios Santos ficou muito 10.
Abraços.