Recentemente eu escrevi que o Brasil tem uma rica tradição pianística, apesar dos pesares. Sobre o órgão de tubos, não se pode dizer o mesmo. São instrumentos caros, imensos, precisam de manutenção com mão de obra especializada… Tirando as honrosas exceções aqui e ali, muitas igrejas em nosso país deixaram seus órgãos definhar com os cupins e a maresia.
Pretendo trazer para o PQPBach um pouco desse instrumento. O CD de hoje tem algumas obras essenciais do repertório para órgão como os corais de Bach e a toccata de Widor.
Seis curiosidades sobre o órgão de tubos:
1. O órgão é um dos instrumentos mais antigos de que se tem notícia, segundo a tradição foi inventado no século III a.C. em Alexandria, muitos séculos antes do cravo ou do piano. O que não significa que ele só serve para tocar música antiga: compositores como os franceses Litaize, Duruflé e Messiaen escreveram muita música de vanguarda para órgão no século XX, sem falar nos mais recentes Xenakis (1922–2001), Ligeti (1923—2006), Terry Riley (1935–) e Philip Glass (1937–).
2. Antes da eletricidade, um assistente ficava atrás do órgão o tempo todo. Isso mesmo, nos tempos de Bach o som só saía continuamente enquanto alguém estivesse bombeando ar para os foles…
3. Órgãos fazem muito eco. Principalmente em igrejas amplas e altas, com grande reverberação, o som continua ecoando vários segundos depois do órgão parar de tocar. Ao vivo esse efeito é incrível e no disco de Olivier Latry também é possível ouvir o eco que fica no ambiente sonoro da Catedral Notre Dame de Paris.
4. Cada órgão é único: eles não são feitos em série, ao contrário de carros ou pianos. Por exemplo o órgão barroco Arp Schnitger de Mariana/MG tem semelhanças com seus irmãos que vivem na Alemanha e na Holanda, mas também tem muitas diferenças.
5. Órgãos têm teclados manuais – que podem ser dois, três, quatro… cada um com um registro, ou seja, tipo de som – e ainda uma pedaleira para os sons mais graves. Assim, com duas mãos e os pés, o organista pode tocar obras a três vozes como as Triosonatas de Bach.
6. Händel, W.F. Bach, C.P.E. Bach, Haydn, Mozart e Beethoven escreveram obras para órgãos mecânicos, ou “relógios musicais”, que eram instrumentos autômatos, sem um músico tocando, e deviam causar um grande espanto no século 18. As obras de Händel e Mozart aqui presentes fazem parte desse grupo, mas a gravação aqui tem um músico tocando, porque soa melhor, né?
Olivier Latry – 12 des plus belles pages de sa discographie
01 – Pieces for a Musical Clock, Georg Friedrich Händel (A voluntary on a flight of angels; Allegro; Menuet; Gigue)
02 – Choral ”Wachet auf, ruft uns die Stimme” (BWV 645), J.S. Bach
03 – Prélude & Fugue en fa mineur (BWV 534), J.S. Bach
04 – Choral ”Wir glauben all an einen Gott” (BWV 740), J.S. Bach
05 – Trio Sonata No. 2 (BWV 526), J.S. Bach
06 – Fantasia for mechanical organ in F minor, K. 608, Wolfgang Amadeus Mozart
07 – Symphonie No. 5 pour orgue: I. Adagio, Charles-Marie Widor
08 – Symphonie No. 5 pour orgue: II. Toccata, Charles-Marie Widor
09 – Naïades (24 Pièces de Fantaisie), Louis Vierne
10 – Carillon de Westminster (24 Pièces de Fantaisie), Louis Vierne
11 – Scherzo, Gaston Litaize
12 – Toccata, Maurice Duruflé
Olivier Latry – Órgão
Órgãos utilizados:
Händel, Mozart – órgão Stumm em Kirchheimbolanden, Alemanha (1745)
Bach (Coral BWV 645) – órgão Giroud em Le Grand Bornand, França (1988, ‘estilo século XVII’)
Bach (BWV 534) – órgão Aubertin em Vichy, França (1991)
Bach (Coral BWV 740) – órgão Aubertin em Viry-Chatillon, França (1991)
Bach (Trio Sonata) – órgão Giroud em Grenoble, França (1982)
Duruflé – órgão Cliquot/Cavaillé-Coll/Beuchet-Debierre em St Étienne du Mont, Paris, França (1777/1863/1956)
Widor, Vierne, Litaize: órgão Cavaillé-Coll (modificado) em Notre Dame de Paris, França (1868)