Se você odeia a beleza, evite este disco. Se odeia especialmente jazz, baladas, interpretadas com suma maestria, mantenha o máximo de distância dessas faixas, pois lhe farão adoecer de tanto desagrado. Terá urticária nas trompas auditivas, que se espalhará pela massa cinzenta deixando-a ‘Blue’. Estes sons certamente o levarão a bater as botas, tal será o seu efeito deletério no seu organismo impermeável ao fantasticamente belo. Foi o nosso formidável Lamartine Babo que teria determinado para seu epitáfio a seguinte sentença: “Aqui jaz um compositor que nunca gostou de Jazz”. Mas ao nosso Lamartine tudo se perdoa, ele que nos legou tantas maravilhas e anedotas que merecem uma postagem à parte. Outro renomado que abominava e atacava o jazz, o filósofo Adorno, todavia, se eu mesmo tivesse sido apresentado ao que lhe apresentaram como jazz em seu tempo e lugar, abominaria da mesma forma: bandas germânicas macaqueando o chamado Dixieland.
Em 2014 foi filmado um excelente, intenso e comovente documentário sobre o trompetista Clark Terry, chamado “Keep On Keepin’ On”, de Allan Hicks. Nele o músico se expôs com uma coragem e humanidade sem igual, junto ao jovem pianista cego Justin Kauflin (1986). O filme conta, a partir da amizade dos dois, a trajetória do mestre e os primeiros passos do discípulo rumo ao seu estrelato no cenário jazzístico. Em um momento dificílimo para Terry, idoso, cego, massacrado pela idade e pela diabetes. Ao longo do filme são celebrados seus 91 e 92 anos. São rememorados seu nascimento em St. Louis, em 1920. Seu ingresso na grande orquestra de Count Basie, em seguida na também monumental orquestra de Duke Ellington. Sua amizade de décadas com Quincy Jones e apresentações com sua orquestra.
“Keep On Keepin’ On” traz algo até mais rico e inusitado do que a trajetória de um eminente músico. Nos mostra Clark Terry como um pioneiro na educação do jazz. Seu primeiro aluno foi o próprio Quincy, trompetista de 12 anos, “tão magro que poderia montar um galo”, nas palavras do próprio Clark. Este, ao longo do documentário, às vezes lutando para manter o otimismo, que é a característica dominante de seu temperamento. Grandes nomes do jazz visitam a ele e sua esposa Gwen em sua casa, em Pine Bluff, Arkansas, e os acompanham até o hospital quando sua saúde piora. É um dos maiores documentos sobre o jazz e sobre um músico já realizados. Infelizmente o tivemos por breve tempo na Netflix, que prima por retirar do ar o que há de melhor e entulhar séries idiotas, com raras exceções.
Clark Terry é um dos gênios do trompete no jazz. Um panteão sagrado ocupado por totens altíssimos, que remonta ao primeiro e lendário Buddy Bolden – que nada teria gravado ou se perdeu. O hierático Louis Armstrong, ladeado por Joe King Oliver e Bix Beiderbecke; Roy Eldridge, Dizzy Gillespie, Miles Davis; Freddie Hubbard, Clifford Brown, Booker Little; Chet Baker, Tom Harrell, Wynton Marsalis; e não poderia deixar de citar nosso ‘queridão’, Marcio Montarroyos. Clark tem a sorte de possuir aquele dom de ser reconhecido nas primeiras duas notas. Seu feeling marcante, seu swing, humor e qualidade sonora o demarcam. Em uma entrevista a uma revista de Jazz francesa na década de 70, Terry falou de sua mágoa em não ter sido também um trompetista “erudito”. Ele, que assim como outros colegas transitou pelo box por breve tempo (a exemplo de Kenny Dorham e Miles Davis – que flertou com o box e tomou um jab de Hermeto Pascoal, mas isso conto depois). Clark diz que em seu tempo sequer poderia passar na calçada de um conservatório, tal era o racismo vigente. Lembrando que também a suprema Nina Simone sofreu a mesma proscrição. Aqui entre nós, se Clark, com a habilidade que possuía por dom, tivesse se dedicado à música chamada “erudita”, teríamos como maiores referenciais nesta área, o seu nome e o do inefável Maurice André. Se passariam umas décadas e muito sacrifício para que fosse possível um Wynton Marsalis, bamba em ambos os flancos, aceito em seu contexto, e dali para o mundo.
No cardápio deste fantástico disco, o que há de ‘melhor impossível’. Abre com o clássico de Eroll Garner: Misty. Seguindo-se Nature Boy, lindíssimo tema imortalizado por imortais como Nat King Cole e tantos outros. Tema composto por um precursor do movimento hippie nos anos 40, chamado Eben Ahbez, que vivia e fumava seu boró debaixo daquele famoso letreiro de Hollywood. Certo dia, tocado pela inspiração, concebeu sua cantiga, desceu da montanha para os estúdios e ficou podre de rico. Se bem lembro, foi trilha de um estranho filme chamado O Menino dos Cabelos Verdes, ou algo assim. Na terceira faixa, Georgia! Ela mesma, on My Mind, celebérrima canção que nos faz lembrar Ray Charles, composta pelo sujeito que seria o tipo ideal para encarnar James Bond, conforme o próprio Ian Fleming: Hoagy Charmichael. Todas as outras faixas são belas e Clark é um daqueles Midas cujo toque a tudo transforma em ouro. Acompanhado por uma super orquestra, com arranjos e regência de Peter Herbolzheimer.
E por falar em beleza, numa entrevista, o presente mago do trompete Clark Terry, nos diz:
“Dizem que podemos sentir através da música das pessoas. Tem algo de verdadeiro nisso, porque sei que alguns homens são perversos, nervosos e maus; e soam ser perversos, nervosos e maus. Eu não gostaria de soar perverso, nervoso e mau. Gosto de soar tranquilo e alegre; e até, em alguns casos, belo! Mesmo sendo um homem velho e feio, gosto de pensar que ao menos minha alma é bela.”
Oh, Mr. Terry, vossa mercê é um Adônis, um príncipe de beleza. E este seu disco é um dos maiores espetáculos do Jazz. Conforme ele mesmo disse, seu preferido.
Dedico esta postagem ao grande amigo e padrinho de inúmeros trompetistas, da Bahia e de outras plagas, Sergio Benutti.
Clark After Dark – The Ballad Album, 1977
1 – Misty – Eroll Garner
2 – Nature Boy – Eben Ahdez
3 – Georgia on My Mind – Hoagy Charmichael
4 – November Song – Mike Hennessey
5 – Clark After Dark – Herbolzheimer e Terry
6 – Willow Weep for Me – Ann Ronell
7 – Yesterdays – Jerome Kern
8 – Emily – Johnny Mercer
9 – Angel Eyes – Matt Dennis
10 – Girl Talk – Bobby Troup
Blues & Roots é um álbum de Charles Mingus, gravado em 1959 e lançado em 1960. Foi reeditado em CD, pela Atlantic Records e Rhino .
Mingus explicou o nascimento desse disco nas notas do álbum:
“Esse disco é incomum, apresentando apenas uma parte do meu mundo musical, o blues. Há um ano, Nesuhi Ertegün sugeriu que eu gravasse um álbum inteiro de blues no estilo de Haitian Fight Song (Atlantic LP 1260), porque algumas pessoas, principalmente os críticos, estavam dizendo que eu não balançava o suficiente. Nesuhi queria dar a eles uma enxurrada de soul music: adoração, blues, swinging, earthy. Eu pensei sobre isso. Nasci no ritmo, bati palmas na igreja quando criança, mas cresci e gosto de fazer outras coisas além de dançar. Mas como o blues pode fazer mais do que apenas dar a batida, concordei e aí está.”
.: interlúdio :. Charles Mingus: Blues And Roots (The Complete Atlantic Recordings – CD 3 de 6)
CD 3
01. E’s Flat Ah’s Flat Too (Charles Mingus) 6:37
02. My Jelly Roll Sou (Charles Mingus) 6:47
03. Tensions (Charles Mingus) 6:27
04. Moanin’ (Charles Mingus) 7:57
05. Cryin’ Blues (Charles Mingus) 4:58
06. Wednesday Night Prayer Meeting (Charles Mingus) 5:42
07. E’s Flat Ah’s Flat Too (Alternate Take) 7:16
08. My Jelly Roll Soul (Alternate Take) 11:51
09. Tensions (Alternate Take) 5:30
10. Wednesday Night Prayer Meeting (Alt.) 6:56
Total time: 70:20 min
Sources:
CD 3: 1-6 From “Blues & Roots” (Atlantic 1305)
CD 3: 7-10 previosly unissued.
Personnel on CD 3:
Charles Mingus (b), John Handy (as), Jackie McLean (as), Booker Ervin (ts), Pepper Adams (bs), Willie Dennis, Jimmy Knepper (tb), Horace Parlan (p, except on #1 & 7), Mal Waldron (p, only on #1 & 7).
Recorded on February 4, 1959 at Atlantic Studios, New York City
Se vivo estivesse, Charles Parker, Jr. teria feito cem anos ontem.
Reconheço o ridículo do “se vivo estivesse” – pois, ainda que a heroína e a bebida não o matassem aos meros trinta e quatro anos, e de tal maneira que o legista pensou que ele tivesse sessenta, sua pobre carcaça não iria mesmo tão longe. Todavia, sempre o senti assim mesmo, tremendamente vivo. Cada vez que escuto algum de seus álbuns, é como se aquele som inimitável estivesse a ser criado ali do meu lado, naquele exato momento, com todo olor de goró e cigarros. Por outro lado, o impacto do meteoro Bird foi tão avassalador que é difícil imaginar um mundo sem ele, de modo que me parece estranho que ele tenha partido meros vinte anos antes de eu, que me acho tão garoto, aqui chegar para escutá-lo. Poucas pessoas foram tão influentes para a Música – quase nenhuma, com certeza, numa trajetória tão fulgurantemente breve – de modo que, sim: Bird está muito vivo.
E por achá-lo tão vivo que quase caí da cama ontem ao perceber, entre espessas remelas, que se passara quase todo o 29 de agosto e eu esquecera de prestar a Bird a homenagem que, há já um bom tempo, eu lhe prometera fazer pelo centenário. Mais ainda: não tinha a menor ideia de qual gravação eu lhes alcançaria do inestimável gênio. Enquanto pensava no que escrever, a abertura de “Just Friends”, que voltava sem parar a meus esquecidos miolos, resolveu a questão: aquele solo frenético e fluido a irromper após uma açucarada introdução das cordas sempre calou fundo cá comigo, e Charlie Parker with Strings foi a gravação que fundiu meu ouvido granítico e o convenceu a derreter-se com jazz.
Muitos fãs de Parker rechaçam With Strings como uma concessão comercialoide, feita justamente para ouvintes que, como eu outrora, jamais cogitaram adquirir uma gravação do gênero. Ainda assim, acho que ela se presta muito bem à homenagem. Aquelas sessões de gravação em New York City, somadas a algumas outras tomadas ao vivo, foram a realização dum sonho longamente acalentado por Bird, que muito desejava tocar com acompanhamento de cordas – e seu sax contralto, como é óbvio para qualquer um que aqui o ouça, ficou muito à vontade para decolar entre seus companheiros engomadinhos.
Com as devidas desculpas ao ídolo pelo lapso de esquecer seu centenário, e aos seus fãs, por uma escolha de repertório que talvez não os agrade, alcanço-lhes Charlie Parker with Strings com a certeza, reavivada enquanto a escuto pela trocentésima vez, de que Bird não nos deixou em 1955: outros cem anos se passarão, e talvez mais cem vezes cem, e seu visionário legado ainda não terá achado um ouvido capaz de lhe ser contemporâneo.
CHARLIE PARKER WITH STRINGS
Charlie Parker with Strings (primeiro LP, Mercury MG-35010)
01 – Just Friends (John Klenner, Sam M. Lewis)
02 – Everything Happens to Me (Tom Adair, Matt Dennis)
03 – April in Paris (Vernon Duke, E.Y. Harburg)
04 – Summertime (George Gershwin, Ira Gershwin, DuBose Heyward)
05 – I Didn’t Know What Time It Was (Richard Rodgers, Lorenz Hart)
06 – If I Should Lose You (Ralph Rainger, Leo Robin)
Charlie Parker, sax contralto
Mitch Miller, oboé
Bronislaw Gimpel, Max Hollander e Milton Lomask, violinos
Frank Brieff, viola
Frank Miller, violoncelo
Myor Rosen, harpa
Stan Freeman, piano
Ray Brown, contrabaixo
Buddy Rich, bateria
Jimmy Carroll, arranjos e regência
Gravadas em estúdio em 30 de novembro de 1949
Charlie Parker with Strings (segundo LP, Mercury MGC-109)
07 – Dancing in the Dark (Arthur Schwartz, Howard Dietz)
08 – Out of Nowhere (Johnny Green, Edward Heyman)
09 – Laura” (David Raksin, Mercer)
10 – East of the Sun (and West of the Moon) (Brooks Bowman)
11 – They Can’t Take That Away from Me” (George & Ira Gershwin)
12 – Easy to Love (Cole Porter)
13 – I’m in the Mood for Love (Jimmy McHugh, Dorothy Fields)
14 – I’ll Remember April (Gene de Paul, Pat Johnston, Don Raye)
Charlie Parker, sax contralto
Joseph Singer, trompa
Eddie Brown, oboé
Sam Caplan, Howard Kay, Harry Melnikoff, Sam Rand e Zelly Smirnoff, violinos
Isadore Zir, viola
Maurice Brown, violoncelo
Verley Mills, harpa
Bernie Leighton, piano
Ray Brown, contrabaixo
Buddy Rich, bateria
Xilofone e tuba – artistas desconhecidos
Joe Lipman, arranjos e regência (gravações em estúdio em 5 de julho de 1950)
Faixas-bônus:
15 – Temptation (Nacio Herb Brown, Arthur Freed)
16 – Autumn in New York (Vernon Duke)
17 – Lover (Richard Rodgers, Lorenz Hart)
18 – Stella by Starlight (Victor Young, Ned Washington)
Charlie Parker, sax contralto
Al Porcino, Chris Griffin e Bernie Privin, trompetes
Will Bradley e Bill Harris, trombones
Murray Williams e Toots Mondello, sax contralto
Hank Ross, sax tenor
Stan Webb, sax barítono
Artie Drelinger, oboé
Sam Caplan, Sylvan Shulman (provavelmente) e Jack Zayde, violinos
Verley Mills, harpa
Lou Stein, piano
Bob Haggart, contrabaixo
Don Lamond, drums
Madeiras, violinos, violas e violoncelo – artistas desconhecidos
Joe Lipman, arranjos e regência
Gravadas em estúdio em janeiro de 1952
19 – Repetition (Hefti)
Charlie Parker, sax contralto
Vinnie Jacobs, trompa
Al Porcino, Doug Mettome e Ray Wetzel, trompetes
Bill Harris e Bart Varsalona, trombones
John LaPorta, clarinete
Murray Williams e Sonny Salad, sax contralto
Pete Mondello e Flip Phillips, sax tenor
Manny Albam, sax barítono
Sam Caplan, Zelly Smirnoff, Gene Orloff, Manny Fiddler, Sid Harris e Harry Katzmann, violinos
Nat Nathanson e Fred Ruzilla, violas
Joe Benaventi, violoncelo
Tony Aless, piano
Curly Russell, contrabaixo
Shelly Manne, bateria
Diego Iborra, percussão
Neal Hefti, arranjo e regência
Gravado ao vivo no Carnegie Hall, New York City, em dezembro de 1947
20 – What Is This Thing Called Love? (Porter)
21 – April in Paris (Duke, Harburg)
22 – Repetition (Neal Hefti)
23 – You’d Be So Easy to Love (Porter)
24 – Rocker (Gerry Mulligan)
Charlie Parker, sax alto
Tommy Mace, oboé
Sam Caplan, Ted Blume e Stan Karpenia, violinos
Dave Uchitel, viola
Violoncelista desconhecido
Wallace McManus, harpa
Al Haig, piano
Tommy Potter, contrabaixo
Roy Haynes, bateria
Gravadas ao vivo do Carnegie Hall, New York City, em 17 de setembro de 1950
Túmulo de Charlie Parker em Kansas City, Missouri. Bird foi sepultado na cidade em que cresceu, homônima àquela em que nasceu, que fica do outro lado do rio Missouri, no estado do Kansas. O enterro cristão na cidade natal ocorreu aparentemente contra sua vontade – ele queria ser enterrado sem qualquer pompa em Long Island, ao lado da filha Pree, que morreu aos três anos. Notem que o instrumento na lápide, além de estar invertido, não é o sax contralto com que Bird se imortalizou, e sim um sax tenor (foto do autor)Vassily
The Clown é um álbum de Charles Mingus lançado em setembro de 1957 pela Atlantic Records. É o seguimento de Pithecanthropus Erectus de 1956 e apresenta narração improvisada de Jean Shepherd na música título do disco. Todas as faixas foram gravadas em 12 de março de 1957, exceto The Clown, gravada em 13 de fevereiro do mesmo ano.
De acordo com as notas principais de Nat Hentoff, Mingus explicou porque escolheu essas quatro faixas para o álbum: “Eu selecionei essas quatro sobre outras duas que eram mais complexas, porque alguns caras estavam dizendo que eu não balançava. Então eu fez alguns que fizeram eles balançar. Este álbum também tem os primeiros blues que eu já gravei.”
Os trechos a seguir vêm das notas originais e são declarações do próprio Mingus .
Sobre Haitian Fight Song, Mingus disse: “Eu diria que essa música tem um sentimento folclórico contemporâneo. Meu solo é profundamente concentrado. Eu não posso tocar direito a menos que esteja pensando em preconceito, ódio e perseguição. E em como isso é injusto. Há tristeza e choro, mas também determinação. E geralmente termina com o meu sentimento: “Eu disse a eles! Espero que alguém tenha me ouvido.”
Blue Cee é um blues padrão: “Eu ouvi um Basie nele e também um sentimento de igreja “
Reincarnation of a Lovebird é uma composição dedicada ao saxofonista bebop Charlie Parker, conhecido como “Bird”. “Eu não diria que me propus a escrever um artigo sobre Bird. […] De repente, percebi que era Bird. […] De certa forma, o trabalho não é bem como ele. É construído em longas temas e a maioria de suas linhas melódicas eram curtas. Mas é meu sentimento sobre Bird. Eu senti vontade de chorar quando escrevi.”
The Clown conta a história de um palhaço “que tentou agradar as pessoas como a maioria dos músicos de jazz, mas de quem ninguém gostava até ele morrer. Minha versão da história terminou com ele explodindo o cérebro com as pessoas rindo e finalmente sendo satisfeitas porque pensaram que era parte do show. Gostei da maneira como Jean mudou o final; deixa mais a questão a cargo do ouvinte.”
Tonight at Noon foi lançado pelo Atlantic em 1964. Compila faixas gravadas em duas sessões — as sessões de 1957 do álbum intitulado The Clown e as sessões de 1961 de Oh Yeah . Várias faixas foram adicionadas quando dos relançamentos em CD. A crítica do Allmusic de afrimou: “Enquanto a sessão anterior mostra Mingus indo para o blues através de harmonias europeias e abordagens melódicas com tempos de bop (especialmente na faixa-título), a última sessão com sua elegância noturna e irregularidades surgem mais como algum tipo de exercício na vanguarda de Ellington, as harmonias sofisticadas que dão lugar a marchas lânguidas e blues tingidos de evangelho… Apesar do fato de ser uma colcha de retalhos, ainda há muita magia em Tonight at Noon”. O poeta britânico Adrian Henri escreveu o poema Tonight at Noon que dedicou a Charles Mingus e à banda de Liverpool Clayton Squares.
.: interlúdio :. Charles Mingus: The Clown & Tonight At Noon (The Complete Atlantic Recordings – CD 2 de 6)
01. The Clown (Charles Mingus) 12:29
02. Passions Of A Woman Loved (Mingus) 9:43
03. Blue Cee (Charles Mingus) 7:48
04. Tonight At Noon (Charles Mingus) 5:58
05. Reincarnation Of A Lovebird (Mingus) 8:31
06. Haitian Fight Song (Charles Mingus) 11:57
Total time: 56:21 min
Sources:
CD 2: 1,3,5,6 From “The Clown” (Atlantic 1260)
CD 2: 2,4 From “Tonight At Noon” (Atlantic 1416)
Personnel on CD 2:
Charles Mingus (b), Shafi Hadi (Curtis Porter) (ts), Jimmy Knepper (tb), Wade Legge (p), Dannie Richmond (d). Jean Shepherd (improvised narration on #1).
Track #1 recorded on February 13, 1957 at Audio-Video Studios, New York City. Rest of tracks recorded on March 12, 1957 at Atlantic Studios, New York City
Pithecanthropus Erectus (1956) é um álbum do compositor e baixista de jazz Charles Mingus. Mingus observou que este foi o primeiro álbum em que ensinou os arranjos para seus músicos conversando e cantando, em vez de colocar os acordes e arranjos por escrito. De acordo com as notas do disco original, a música-título é um poema de dez minutos, representando a ascensão do homem desde suas raízes hominídeas (Pithecanthropus erectus) até uma eventual queda devido a “seu próprio fracasso em perceber a inevitável emancipação daqueles que ele procura escravizar e sua ganância ao tentar manter uma falsa segurança”. O Penguin Guide to Jazz atribuiu a ele uma classificação máxima de quatro estrelas e a adicionou à sua coleção principal, descrevendo-o como “Um dos melhores álbuns de jazz modernos”. A mesma publicação analisa em partes a primeira faixa, que é descrita como “absolutamente crucial para o desenvolvimento da improvisação coletiva livre da década seguinte”.
Pithecanthropus Erectus
01. Pithecanthropus Erectus (Charles Mingus) 10:33
02. A Foggy Day (George Gershwin) 7:47
03. Love Chant (Charles Mingus) 14:56
04. Profile Of Jackie (Charles Mingus) 3:07
05. Laura (David Raskin) 4:52
06. When Your Lover Has Gone (Einar Swan) 2:27
07. Just One Of Those Things (Cole Porter) 6:06
08. Blue Greens (Teddy Charles) 11:42
Total time: 61:38 min.
Sources:
CD 1: 1-5 From “Pithecanthropus Erectus” (Atlantic 1237)
CD 1: 5-8 From Teddy Charles’ “Word From Bird” (Atlantic 1274)
Personnel on CD 1:
Tracks #1-5: Charles Mingus (b), Jackie McLean (as), J.R. Monterose (ts), Mal Waldron (p), Willie Jones (d). Recorded at Audio-Video Studios, New York, on January 30, 1956
Tracks #5-8: Teddy Charles (vib), Hall Overton (p), Charles Mingus (b), Ed Shaughnessy (d). Recorded on November 12, 1956 in New York City
Um disco saboroso, com sabor brasileiríssimo. Para apresentá-lo deveria começar falando de coisas bem brasileiras, mas de futebol nada entendo, exceto que a bola é redonda e que deveriam se decidir pra que lado correr, e não ficarem pra lá e pra cá (que não me amaldiçoe o compadre mestre Milton Ribeiro, afeiçoado ao nobre esporte). De café não sou especialista, embora ame café. Só sei que o nosso café brasileiro é inigualável, imbatível. Já me deram cafés de outras plagas e nenhum se compara ao mais modesto dos nossos torrados. Feijoada, mocotó, moqueca e farofa! Meu Santo Onófre! Só mesmo invocando Vinícius na causa:
Não comerei da alface a verde pétala
Nem da cenoura as hóstias desbotadas
Deixarei as pastagens às manadas
E a quem maior aprouver fazer dieta.
Cajus hei de chupar, mangas-espadas
Talvez pouco elegantes para um poeta
Mas peras e maçãs, deixo-as ao esteta
Que acredita no cromo das saladas.
Não nasci ruminante como os bois
Nem como os coelhos, roedor; nasci
Omnívoro: dêem-me feijão com arroz
E um bife, e um queijo forte, e parati
E eu morrerei feliz, do coração
De ter vivido sem comer em vão.
Eis tudo. Não dá pra ser vegano diante da sinfonia de sabores de nossa pátria gastronômica; nem dá pra ser Gregoriano com um disco desses.
Houve tempo em que música instrumental tinha guarida num cantinho do gosto popular brasileiro. E que instrumentistas tinham nome e renome, mesmo sendo uma alcunha, como ‘Papudinho’. José Lídio Cordeiro, trompetista pernambucano, 1931-1991. Quem hoje em dia conhece este nome? Alguns bem aventurados, com certeza já ouviram falar dele – e o ouviram. Todavia foi um referencial no trompete brasileiro, com discos solo e inúmeras participações em diversos e ressaltados trabalhos, junto a cantores e grupos orquestrais. Outro nome, e este se inscreve nas estrelas, nosso amadíssimo Hermeto Pascoal, na época ainda não transfigurado em Gandalf, Merlim, mago dos magos. Oriundo de Lagoa da Canoa, Alagoas, 1936. Cujos méritos, gênio e magia não preciso alardear, mesmo porque em postagem anterior já o fiz – a qual recomendo vivamente. Os demais cavaleiros desta tétrade sonora são Azeitona ao contrabaixo e Edilson, bateria. Sob o prosaico e oliváceo apelido de Azeitona, Arnaldo Alves de Lima atuou ao contrabaixo ao longo de três décadas, garantindo os fundamentos harmônicos e o balanço, desde o antológico disco Chega de Saudade do João Gilberto, até os poéticos e etílicos shows de Toquinho e Vinícius pelos palcos do mundo. Sobre o excelente Edilson, não encontrei rastros, exceto que onde estava Azeitona, estava Edilson, em diversos e formidáveis trabalhos instrumentais. Ninguém lamenta mais que eu por esta lacuna, e agradeço a quem trouxer informações sobre este importante músico. O disco é essencialmente jazzístico, tem solos improvisados e outros elementos que caracterizam um período da música instrumental brasileira entre os anos 50 e 60. Jazz, enfim, não é propriamente o que se toca, mas como se toca. Ou, se preferirem os puristas, um disco de ritmos brasileiros com influências jazzísticas; ou sendo ainda mais chato, um evidente ecletismo genérico musical com resultados híbridos. Ufa! PQP!
No repertório, delícias do cardápio ‘cantoral’ brasileiro (esta palavra não existe, exceto como sobrenome de um grande cancioneiro mexicano, mas tá valendo. Só aqui, pessoal, por favor). Perceberemos que apesar de termos 4 integrantes, ouviremos 5. O Trismegístico Hermeto usa de seus poderes e se desdobra entre o piano e a flauta ao mesmo tempo. Milagres não são novidade quando se trata Dele.
Um conselho que deixo aqui aos ouvintes, desfrutem com acompanhamentos: cerveja gelada ou whisky; suquinho para os passarinhos; tripa assada com muita cebola. Batatas fritas com alho ralado e torrado. Tudo isso antes da babilônica macarronada, ou uns dois metros de luzidias costelas de porco assadas, dignas de Nabucodonosor. De sobremesa um vinho do porto, pois que algum sábio latino andou dizendo que “borracho que bebe miel, ay de él!” E, se aprouverem aos céus, maravilhosa, ou maravilhosas companhias. Apreciem sem qualquer moderação. Não engorda, a música que engorda é Rossini, que era também gastrônomo.
CONJUNTO SOM 4 – 1965
Papudinho – Trompete
Hermeto Pascoal – Piano e Flauta
Azeitona – Contrabaixo
Edilson – Bateria
Consolação – Baden Powell e Vinícius de Morais
Samba Novo – Durval Ferreira e Newton Chaves
Minha Namorada – Carlos Lyra e Vinícius de Moraes
Deus Brasileiro – Marcos Vale e Paulo Sérgio Valle
Eu tomava o bondinho da St. Charles Avenue quase no ponto final, próximo à St. Clairborne Avenue e fazia uma adorável viagem de uns quarenta minutos, em direção ao French Quarter. Depois de uma curva de noventa graus, o bondinho seguia em um trajeto que parece um arco, por uma região lindíssima. Eu preferia sentar à esquerda, para avistar as margens do Mississipi. Passávamos o Audubon Park com suas magníficas árvores, pelo Uptown com suas grandes mansões, seguindo justamente a St. Charles Avenue até o cruzamento com a Jackson Avenue, onde normalmente descia do bondinho.
À direita, o rio Mississipi, em frente, o velho mercado, e à esquerda um emaranhado de ruas e avenidas repletas de cultura, belezas, sons e sabores. New Orleans é uma das cidades mais belas dos Estados Unidos da América. Certamente é uma das mais ricas em cultura. O melting pot, Big Easy. Os nomes das avenidas e dos lugares revelam as diferentes culturas que por lá passaram e deixaram suas marcas e costumes, num rico caldo cultural. Jefferson Avenue, Napoleon Avenue, Tchoupitoulas, Calle Real ou Royal Street.
Depois de tomar um café com beignets no Café Du Monde, uma paradinha na La Madeleine, um passeio pelas lindas lojas de antiguidades, você chega à Jackson Square. Um pouco de preguiça, espiar a fauna do lugar, música nas ruas. Aí, você enfia pela St. Peter street para ir a um lugar que não se pode deixar de ir – Preservation Hall.
Este disco me fez lembrar disso tudo, com saudade, mas saudade boa, daquela que conforta, que revigora a gente.
É verdade, este disco foi gravado uns trinta anos antes de que eu andasse por lá, mas é ainda mais autêntico por isso.
O Preservation Hall foi criado em 1961 e o disco gravado em 1963, you do your math…
A criação do Preservation Hall foi fundamental para (perdão pelo trocadilho, mas a ideia é exata) preservar a autêntica cultura musical, o jazz como havia nascido por lá. Nos comentários que estão na contracapa do disco pode-se entender a importância desta instituição. ‘Tocar no Preservation Hall tirou a demanda comercial, a pressão artificial da Banda do Barbarin e também de sua seleção (de músicas): nada do tradicional atacar de The Saints, nada de acelerar o tempo da música. A música de Barbarin, The Second Line, surge com uma inocência e simplicidade que mostra o trompete de Cagnolatti e o clarinete de Cottrell, ao lado do suave dedilhar de Sayles, no que eles têm de melhor’.
O disco é composto de duas sessões. Uma ocupada pela banda de Paul Barbarin e a outra pela turma do “Punch” Miller. Eles eram tão autênticos músicos de New Orleans quanto pode haver.
Este é um dos mais extraordinários discos do jazz. Tentarei dizer porquê. Não basta ser belo. Os bastidores do belo envolvem um infinito – e deflagram também um infinito em cada um que o contempla. Imagine-se de repente desperto num planeta no qual tudo é novo, você caiu ali de paraquedas e precisa sobreviver, em meio aos inquietos e intensos habitantes. Você quer interagir, encontrar seu lugar naquele contexto – não tem escolha. Você quer ser aceito e luta por conhecer as regras da casa. Para, olha, escuta, fala, segue e não quer ser atropelado nem pisar em falso. Próximo vê uma flor no chão da esquina, acolá uma avalanche! Corre! Quem são aqueles? Quem sou eu aqui? Procura entender e ser entendido. Parece que caiu num livro do Ray Bradbury (ou Kafka!). Pois bem. Neste disco o fabuloso saxofonista Stan Getz se vê diante de desafios semelhantes. O compositor Eddie Sauter (discípulo de Bartok) elaborou uma suíte, uma estupenda orquestração de cordas, uma floresta de timbres, uma metrópole de harmonias, onde o intrépido improvisador é atirado sem qualquer linha melódica definida. Ele poderá contar se muito com algumas cifras harmônicas, como ventoinhas para se guiar conforme as brisas e tempestades sonoras. A orquestra é um Golias, ele um Davi. Precisa lutar, algumas vezes para não profanar a delicada textura orquestral que o envolve, outras vezes para não ser engolido, esmagado, tolhido pela dinâmica endiabrada da orquestra; pela variedade de situações harmônicas e rítmicas. A orquestra o provoca, o seduz, por vezes cobra sedução. Em certo momento se vê numa verdadeira arena, diante da bateria infernal de Roy Haines. Briga, dialoga, sobrevive, como o Superman na vasta Metrópolis. Mas chega de delongas. Ouçamos esta maravilha jazzística na qual o jazz reside precisamente no improvisador. Todo o resto é escrito com rigor ‘erudito’. Este é certamente um dos melhores e bem-sucedidos experimentos neste sentido. Ouçam, abandonem-se aos sons. Como disse algum poeta do qual me foge o nome, “a confiança no apoio invisível confere ao pássaro a coragem de se atirar no vazio”. Lamento que o compositor não tenha intentado regravar sua orquestração com diversos artistas, numa série de discos. Seria um tesouro inestimável para a música. Este breve texto, agradeço ao Black & White, que me permitiu produzi-lo de improviso – diríamos, jazzisticamente. Confesso que o cachorrinho branco do rótulo me incomoda. Vou pintá-lo de azul, assim fica ‘Black n Blues’.
FOCUS – STAN GETZ & EDDIE SAUTER
I’m Late, I’m Late
Her
Pan
I Remember When
Night Rider
Once Upon a Time
A Summer Afternoon
I’m Late, I’m Late – Bonus track
I Remember When – Bonus track
Stan Getz – Sax Tenor
Steve Kuhn – Piano
John Neves – Bass
Roy Haynes – Drums
Alan Martin, Norman Carr, Gerald Tarack – Violins
Jacob Glick – Viola
Bruce Roger – Cello
Eddie Sauter – Arranger
Hershy Kay – Conductor
A questão aqui é saber se o álbum é bom ou é irrelevante. The Cats é um disco de hard bop creditado ao saxofonista tenor John Coltrane e ao pianista Tommy Flanagan. Com eles, estão Idrees Sulieman no trompete e Kenny Burrell na guitarra, mais Louis Hayes na bateria e Doug Watkins no baixo. Os quatro primeiros fazem solos em todas as faixas, com a exceção de “How Long Has This Been Going On?” que apresenta Tommy Flanagan em um trio de piano com Doug Watkins e Louis Hayes. Os solos são certamente obras de profissionais, mas comparado a outros álbuns, esse em particular não tem muitos momentos memoráveis. Um disco apenas médio de uma época do jazz — 1957 — onde nasciam quase só obra-primas memoráveis. Seria bom mencionar que o susto que Flanagan nós dá em Solacium, onde ele cita o início da Fantaisie Impromptu de Chopin. Ou seja, os gatos deste CD são meio vagabundos.
Tommy Flanagan, John Coltrane, Kenny Burrell e Idrees Sulieman: The Cats
1 “Minor Mishap” – 7:26
2 “How Long Has This Been Going On?” (George and Ira Gershwin) – 5:58
3 “Eclypso” – 7:57
4 “Solacium” – 9:10
5 “Tommy’s Tune” – 11:58
Personnel
Idrees Sulieman – trumpet
John Coltrane – tenor saxophone
Tommy Flanagan – piano – trio track 2
Kenny Burrell – guitar
Doug Watkins – bass
Louis Hayes – drums
On “How Long Has This Been Going On” Sulieman, Coltrane and Burrell do not play.
Traduzido mal e porcamente por PQP Bach. Achei aqui, ó.
Em 26 de maio de 1980, cinco músicos de jazz reuniram-se no Talent Studio em Oslo, Noruega. Eles estavam atrasados após os respectivos voos, estavam de olhos vermelhos e tinham um dia inteiro de gravação pela frente. A sessão foi idealizada pelo mais jovem, um guitarrista de 26 anos que sonhava em trazer alguns de seus músicos preferidos para tocarem juntos pela primeira vez. O que se seguiu foi uma das sessões de gravação mais produtivas e inspiradoras do jazz moderno. Após pouco mais de um dia de gravação, a sessão rendeu um álbum duplo em LP que completou 40 anos de admiração e sucesso no último mês de maio. Vamos um pouco da história desta reunião de gênios promovida por Pat Metheny para a gravadora ECM.
Metheny não era novo no local de gravação e nem no selo da ECM com seu gerente Manfred Eicher. Em 1974, quando fazia parte da banda de Gary Burton, ele conheceu Eicher ao gravar o álbum Ring. No ano seguinte, gravou o álbum Dreams So Real com Gary Burton e seu primeiro álbum solo, Bright Size Life. Sua primeira vez no Talent Studio com o engenheiro Jan Erik Kongshaug foi em 1976 para a gravação de Passengers, do quinteto de Gary Burton, para a qual ele também escreveu parte do material. Os dois primeiros discos do Pat Metheny Group e o fantástico solo New Chautauqua vieram logo depois, também gravados pela lendária dupla de produtores / engenheiros Eicher / Kongshaug. O bom gosto que eles aplicaram no estúdio agora faz parte do lendário som ECM e funcionou perfeitamente para o estilo que Metheny estava criando no final dos anos 70. Então, após uma louca turnê, incluindo Shadows and Light, de Joni Mitchell, ele estava pronto para o próximo projeto.
Em uma entrevista de 1978 para a revista Downbeat, Pat Metheny expressou suas reservas sobre as restrições impostas a ele por Manfred Eicher: “Se Manfred conseguir o que quer, todo álbum que fizer terá seis baladas e uma bossa nova. Existem alguns problemas pra mim na ECM, mas ainda assim é 50 vezes melhor do que qualquer outra coisa.” Seu último álbum dos anos 70, American Garage, era de fato uma raridade no catálogo da ECM por ser produzido pelo próprio Metheny com a ajuda de Richard Niles. Metheny tinha o maior respeito por Eicher, mas este dissera certa vez que Metheny era “muito comercial…”, frase normalmente ausente no vocabulário de um produtor musical. Em cordial resposta, Pat disse: “Para mim, a única falha real é que Manfred tende a escolher artistas que não sabem dançar”. No entanto, no início de 1980, Metheny era uma estrela na cena do jazz e sua nova posição no mundo permitia-lhe escolher quem convidar para uma sessão de gravação. De fato, naquela sessão de maio de 1980, todos os quatro músicos balançavam como pouquíssimos.
Metheny não pediu apenas que quatro notáveis músicos viessem para as sessões de 80/81. Ele tinha uma visão clara de como eles soariam juntos e escreveu novas músicas com o som e a personalidade deles em mente. Curiosamente, também reunira músicos que nunca tinham tocado ou gravado antes. Por incrível que pareça, o baixista Charlie Haden e o baterista Jack DeJohnette, que entre tocaram com quase todo mundo no jazz que vale a pena ouvir nos quinze anos que antecederam a sessão 80/81, não tinham gravado nada juntos até aquele momento. Os dois saxofonistas tenor, Dewey Redman e Mike Brecker, também estrearam juntos. Metheny decidiu excluir do álbum sua colaboração com Ornette Coleman na música Song X, que foi lançada depois.
Metheny lembra: “Pela primeira vez trabalhei com sopros e tive de considerar o elemento da respiração. Um dia, notei que todos os instrumentos com os quais eu havia trabalhado nas gravações de Gary e meus eram instrumentos do grupo rítmico: piano, baixo, guitarra, vibrafone, bateria, percussão e sintetizador. Nunca tive a oportunidade de escrever para este elemento Humano, o sopro, e realmente me arrependi de não tê-lo feito antes.”
Os dois saxofones tenor são apresentados juntos em três temas do álbum. Dois deles são enérgicos e permitem que Redman e Brecker se esbaldem. Open, um veículo de improvisação para todos os solistas, e Pretty Scattered, com um tema que se assemelha a algumas das melodias distorcidas de Ornette Coleman. A terceira é a mais tranquila The Bat, que teve uma apresentação diferente e memorável no álbum seguinte de Metheny, Offiramp.
O quão bem Redman e Brecker se conectaram é melhor contado por Metheny. Em um podcast que dedicou ao making of 80/81, ele contou uma história que aconteceu durante a curta turnê europeia que o grupo tocou no verão de 1981: “Algo que aconteceu com Mike e Dewey nessa turnê que é uma das as coisas mais incríveis que já experimentei. Eles eram tipos diferentes de instrumentistas, eles não se sobrepunham de forma alguma. No início, tivemos um show em um festival de jazz em Portugal e David Oakes, na época um técnico de som relativamente novo, disse: “OK, deixe-me ouvir um pouco dos sax tenores. Mike, toque”. Mike subiu no palco e tocou. Então, “Dewey, toque alguma coisa”. E Dewey subiu no microfone e tocou qualquer coisa. Então ele completou seu teste: “Agora vocês dois tocam algo ao mesmo tempo”. Jack DeJonette e eu estávamos sentados atrás deles, e vimos ambos caminharem até o microfone e tocarem uma longa frase improvisada, total e completamente em uníssono, como um só saxofone. E eles, Jack, eu e David Oakes paramos e nos encaramos por cerca de dez segundos. Como? O que aconteceu? Se você tivesse escrito uma cadência e dissesse “toquem isso”, eles a praticariam por alguns dias até tocarem daquela forma.
A música 80/81 foi escrita para Dewey Redman, que Metheny conheceu durante uma turnê com a banda de Gary Burton no início dos anos 70. Redman também tocava no quarteto americano de Keith Jarrett. Esse quarteto, incluindo Charlie Haden no baixo e Paul Motian na bateria, foi uma das melhores combinações de jazz dos anos 70 e deixou uma profunda impressão em Metheny, que lembrou os métodos peculiares de Redman: “Keith escrevia temas para Dewey que eram muito difíceis e ele descobria uma forma de tocá-las que não seriam o que você esperaria. Quando dei a música a Dewey, ele a levou ao banheiro por cerca de duas horas e praticou arpejos. Então, saiu e disse: OK, vamos gravar. E não tocou nada parecido em seu brilhante solo.”
Depois de tocar todas as composições que Pat Metheny preparou para a sessão, a banda percebeu que tinha material para mais de um álbum. Manfred Eicher sugeriu que continuassem gravando para preencher um registro duplo. Pat Metheny ficou sem material, mas Charlie Haden trouxe alguns arranjos de Ornette Coleman. Um deles foi Turnaround, lançado pela primeira vez no segundo álbum de Ornette, Tomorrow Is the Question!, de 1959. Metheny, mesmo bem versado na música de Coleman, não conhecia essa música e a aprendeu no estúdio. Já Haden e DeJohnette estavam se divertindo muito, e Charlie Haden pode ser ouvido no final da gravação, todo empolgado com a interpretação de Jack DeJohnette.
Um dos destaques do 80/81 é uma música que Metheny escreveu para Mike Brecker, Every Day (I Thank You). Ela foi escrita em um quarto de hotel em Bremen, Alemanha, tarde da noite, depois de um show. No rico catálogo de melodias bem elaboradas de Metheny, essa é uma das mais memoráveis e especiais, devido ao toque emocionante de Brecker. Como composição, é certamente a mais interessante e complexa do álbum, e se encaixou perfeitamente no repertório do Pat Metheny Group: “Eu tive muito trabalho para criar uma música com diferentes seções e tempos, mas tudo isso não é nada comparado à profundidade emocional com que Mike tocou a melodia.” Para Mike Brecker, que estava no processo de abandonar as drogas na época, toda a sessão foi um evento que mudou sua vida, e essa música em particular o afetou profundamente. Metheny: “Quando eu estava escrevendo a música, imaginava como Mike tocaria isso, e a música está fortemente associada a ele. Ele estava passando por um momento difícil, no meio de um processo complicado. Estava sofrendo muito. Nas notas para a série ECM Selected Recordings dedicada à sua música, Metheny escreveu: “Mike Brecker sempre falou sobre como esse disco foi um ponto de virada para ele e o que ele fez ali afetou tudo o que fez depois. “
O 80/81 foi lançado como código de catálogo ECM 1180/81, pois a ECM possui um número único para cada LP, incluindo LPs duplos e conjuntos de caixas. A banda gravou e lançou o álbum em 1980 e o apresentou ao vivo durante sua turnê em 1981. Número de shows à parte, o álbum foi bem-sucedido para a ECM e Metheny, alcançando de cara o número quatro nas paradas de jazz da Billboard. Uma rápida olhada no resto da parada daquela semana mostra o sombrio estado do jazz norte-americano da época, com álbuns pouco inspiradores. 80/81 ganhou o prêmio de registro de jazz do ano.
Minha música favorita no álbum é a abertura Two Folk Songs. Ainda me lembro da primeira vez que ouvi o álbum e a pura emoção que senti imediatamente após a agulha cair no lado um do primeiro LP. Este deve ser uma das melhores primeiras músicas de álbuns de todos os tempos. O violento e bonito toque de violão marca você e, antes que você tenha tempo de se recuperar da surpresa, o resto da banda se une com uma energia implacável que continua por mais de 20 minutos da música. Metheny introduziu esse estilo de dedilhar no New Chautauqua do ano anterior, mas Two Folk Songs ainda não tinham sido usadas no contexto de um quarteto de jazz. Metheny: “Até onde eu sei, foi a primeira vez que houve esse tipo de dedilhar de guitarra integrado estilisticamente com a abordagem ultramoderna de Jack DeJohnette tocar bateria. Além disso, a conexão que Charlie e eu tínhamos com Missouri fez com que o Two Folk Songs tivesse um pulso mais autêntico.”
Todos os músicos estavam em sua melhor forma em Two Folk Songs. Brecker toca como se eu nunca o tivesse ouvido em nenhum outro lugar. Metheny percebeu isso no estúdio durante a gravação: “O jeito que Brecker tocava nessa faixa era meio assustador na época. Era, cara, o que é isso? Era algo que tem todo o vocabulário pós Coltrane. Em uma ocasião separada, Metheny disse: “A posição mais traiçoeira no jazz era a de ser o cara que precisa fazer um solo logo após Mike Brecker”.
Cerca de 13 minutos e meio da música, enquanto a banda encerra a primeira música folclórica, Charlie Haden inicia a segunda tocando uma versão lenta e com alma do Old Joe Clark, uma antiga música folclórica americana geralmente tocada com banjo ou rabeca. E em alta velocidade. Ele tocara essa música vinte anos antes no álbum Change Of The Century do quarteto de Ornette Coleman. A vivência de Metheny e Haden no meio-oeste norte-americano podem ter começado aqui e culminado no álbum Beyond The Missouri Sky: “Charlie realmente experimentou essa coisa do meio-oeste. Quando ele era criança, estava em turnê com a banda da família, tocando em programas de rádio e tocando com a mãe Maybelle Carter. Ele tem isso de uma maneira muito mais profunda do que eu, mesmo que eu sempre tenha me sentido muito próximo do tipo de música que sai de lá ”.
Pat Metheny: 80/81
Disc 1
1. Two Folk Songs 20:46
2. 80/81 7:27
3. The Bat 5:58
4. Turnaround 7:05
Disc 2
1. Open 14:26
2. Pretty Scattered 6:56
3. Every Day (I Thank You) 13:16
4. Goin’ Ahead 3:51
Pat Metheny – guitar
Charlie Haden – bass
Jack DeJohnette – drums
Michael Brecker – tenor saxophone
Dewey Redman – tenor saxophone
Um impressionante álbum de músicas novas da pianista / compositora / band leader Carla Bley (84), cujo trio com Andy Sheppard (63) e Steve Swallow (80) está agora em seu 25º ano. Mas a associação é ainda mais antiga: o baixista Swallow — marido de Bley há décadas — gravou pela primeira vez uma música dela em 1961. Então, quando Bley diz Life Goes On, fala de muita vida. Após dois outros álbuns do trio para a ECM, Trios (2013) e Andando el Tiempo (2016), esta gravação, realizada no Auditorio Stelio Molo Studio em Lugano, em maio de 2019, com a produção de Manfred Eicher, assume a forma de três suítes de danças calmas e de musicalidade perfeitas. A peça-título é como um blues estoico, primeiro melancólico e depois esperançoso. Beautiful Telefones, inspirado pela primeira observação de um presidente dos EUA ao entrar no Salão Oval, tem muito do humor e da inteligência sombria de Bley. E Copycat explora como os improvisadores seguem (e imitam) os pensamentos um do outro. O piano de Carla, com suas notas de Monk e Satie, é belamente enquadrado pelo eloquente e elegante baixo de Swallow e pelos sax de Sheppard. Esse trio tem um som coletivo único, refletindo um raro domínio musical. Eu amo Carla Bley e ponto.
.: interlúdio :. Carla Bley (Life goes on)
1. Life Goes On: Life Goes On (6:00)
2. Life Goes On: On (4:47)
3. Life Goes On: And On (4:10)
4. Life Goes On: And Then One Day (9:03)
5. Beautiful Telephones (Pt. 1) (4:36)
6. Beautiful Telephones (Pt. 2) (6:14)
7. Beautiful Telephones (Pt. 3) (6:16)
8. Copycat: After You (5:29)
9. Copycat: Follow The Leader (0:17)
10. Copycat: Copycat (9:52)
Carla Bley: piano
Andy Sheppard: saxofones tenor e soprano
Steve Swallow: baixo
A capa do disco parece da ECM. Colocamos o CD para ouvir e, bem, ele segue parecendo um disco da ECM. As músicas de Kent começam com um ostinato interessante, ganham melodias e somem. Não chega a ser uma loucura de disco bom, mas agrada sem jamais incomodar. A ideia é excelente. Green and Grey, verde e cinza, a grama e o concreto, a justaposição entre o mundo natural e o ambiente construído pelo homem que devem coexistir em harmonia, mas na prática com muita frequência em conflito. Nas 11 faixas, a violoncelista canadense Julia Kent, residente em Nova York, tenta construir um poema para explorar as tensões inerentes ao relacionamento da humanidade com o mundo ao nosso redor. Um segundo Koyannisqatsi. Kent toca desacompanhada, usando apenas seu violoncelo sampleado, mergulhado em sons ambientes ao lado de alguns eletrônicos sutis, além de gravações de campo de sons naturais, como água e sons noturnos.
Julia Kent: Green and Grey
1 Pleiades 5:08
2 Ailanthus 4:58
3 The Toll 3:49
4 Acquario 4:16
5 Tithonos 3:00
6 Guarding The Invitations 4:28
7 Overlook 4:59
8 A Spire 3:59
9 Missed 4:38
10 Dear Mr. Twombly 3:05
11 Wake Low 4:53
Cello – Julia Kent, Robert Brewer Young
Electronics – Julia Kent
Newark é uma cidade americana no estado de New Jersey muito próxima a Nova Iorque. Newark detêm uma enorme concentração de brasileiros. A razão disto é que, antes dos brasileiros, era um reduto de portugueses. Os patrícios chegaram lá primeiro e acabaram nos acolhendo. Se você está há algum tempo nos EUA e bater aquela vontade de comer um pastel acompanhado de caldo de cana ou guaraná, basta dar um pulo em Ironbound, a brazilian neighborhood. Encontrará muitas opções. Mas nosso interesse hoje em Newark é outro. Foi nesta cidade, em 17 de agosto de 1918, que nasceu Ike Quebec, o cara do disco desta postagem. Um disco de jazz.
Na página do selo Blue Note, para o qual ele gravou seus discos e onde trabalhou como arranjador e no setor de A&R, descobrimos que ele foi influenciado por Coleman Hawkins e Ben Webster. Inicialmente era dançarino e pianista e tinha grande habilidade para ler qualquer partitura de primeira vista, mas adotou o saxofone tenor como principal instrumento. E fez muito bem, pois foi do primeiro time de saxofonistas nos anos 1940 e 1950. O disco da postagem foi gravado em 1961, um período de breve retorno às gravações, uma vez que Ike Quebec morreu em 1963. Breve retorno, pois durante os anos 1950 gravou pouco, devido a problemas pessoais e também devido ao decrescimento do interesse na música das Big Bands.
Blue & Sentimental é um ótimo disco que mistura baladas românticas e músicas de ritmo mais envolvente. Prepare aquele pen-drive especial para o fim de tarde e se houver companhia então…
Blue & Sentimental
“Blue and Sentimental” (Count Basie, Mack David, Jerry Livingston) – 7:28
“Minor Impulse” (Quebec) – 6:34
“Don’t Take Your Love from Me” (Henry Nemo) – 7:04
“Blues for Charlie” (Green) – 6:48
“Like” (Quebec) – 5:21
“That Old Black Magic” (Arlen, Mercer) – 4:52
“It’s All Right With Me” (Porter) – 6:05
“Count Every Star” (Bruno Coquatrix, Sammy Gallop) – 6:16
Ike Quebec- saxofone tenor, piano (faixas 2, 4, 7)
Grant Green- guitarra
Paul Chambers(faixas 1-7), Sam Jones (faixa 8) – baixo
Louis Hayes(faixa 8), Philly Joe Jones (faixas 1-7) – bateria
Sonny Clark- piano (faixa 8)
Gravado em 16 de dezembro (faixas 1-7) e 23 de dezembro (faixa 8) de 1961.
Momento dedicado aos nossos professores de inglês: The Allmusic review by Steve Huey awarded the album 5 stars and calling it “a superbly sensuous blend of lusty blues swagger and achingly romantic ballads… a quiet, sorely underrated masterpiece”.
In 2004, critic Richard Cook wrote that the album “might be Quebec’s masterpiece”.
Há certo tempo venho intentando postar esse disco, para mim um dos melhores de Chet Baker, numa das suas melhores formações, com o guitarrista Philip Catherine e o baixista Jean-Louis Rassinfosse, ambos extraordinários músicos belgas. Não o fizera ainda por dúvidas quanto ao texto que o acompanharia. Em outra postagem sobre Chet, havia escrito que sobre ele tudo já fora dito; e ao final da mesma, disse que sobre ele sempre haveria algo a se dizer. Portanto, diga o que disser, estamos no lucro. Os que conhecem seu gênio, seu estilo, seu som e seu feeling, entenderão. Os que não conhecem têm aqui uma excelente oportunidade de conhecer. A faixa título, Estate, é um dos temas mais queridos e gravados, até mesmo pelo nosso João Gilberto, que Deus o tenha – só imagino o que seria um disco dele junto com Chet! O tema é de Bruno Martino (1925 – 2000), um cantor romântico italiano muito popular em seu tempo e que, eu diria, descobriu a galinha dos ovos de ouro ao ser abençoado com a ideia dessa melodia. É um dos mais belos e deliciosos e inspiradores temas que um instrumentista possa desejar tocar, e sobre ele improvisar. Outro ponto alto do disco é a faixa Chrystal Bells, tema do saxofonista Charlie Mariano (para mim, junto a Charles Lloyd, um dos mais chatos saxofonistas do jazz, mas isso é cá comigo). Nele, Catherine cria uma aura sonora para o trompete, que nos traz a intimista e melancólica melodia, mergulhando direto no solo improvisado, que nos transporta para regiões tipicamente bakerianas. Mais um ápice do disco é um tema do maior trombonista do jazz, J. J. Johnson, Lament. Não conheço melhor gravação ao trompete, mesmo do próprio Chet alhures, que este momento. Completando uma quadra de pontos altos do disco, Leaving, do pianista Richard Beirach (1947), composto para o próprio Chet, que o tocou inúmeras vezes, em estúdio e ao vivo. Tema de grande beleza e harmonia expressiva. Se Chet nos transporta, Catherine e Rassinfosse não deixam por menos. Gravada tempos depois das outras, a faixa My Funny Valentine, peça carro chefe na carreira de Chet, complementa os ápices do disco. Strollin’, do grande Horace Silver e a velha e boa Cherokee, fecham a sessão. Neste último tema, Chet toca com agilidade extraordinária. Chet sempre foi extraordinário. Sua carreira, que se pode dividir em antes e depois do triste e dramático episódio da agressão sofrida em 1968, sempre foi brilhante. Um gênio verdadeiro, com toda a propriedade da palavra. À parte os momentos esfuziantes de Cherokee e mais animados de Strollin’ o tom do disco é de um desalento sublimado pela beleza – mágica na qual Mr. Baker é um dos maiores magos.
Costumo atrelar algo cinematográfico ou literário às postagens. Me parece que as emoções e impressões não se encalacram no reino dos sons, mas que abrem janelas para outros veículos da arte. Nestes tempos para todos nós difíceis de reclusão domiciliar, tenho visto filmes antigos, revisitado livros e discos. Tenho a sorte de poder fazer isso enquanto muitos, lamentavelmente, são obrigados a se arriscar fora de casa por necessidades de trabalho e sobrevivência – e com eles me solidarizo. Creio que muitos dos que como eu têm tal privilégio estão também revisitando seus afetos culturais ou descobrindo novas maravilhas. De certa maneira o atentado à liberdade que tem abatido o mundo inteiro nos avizinhou a todos. Quem não está com saudades da vida? Revisitei um dos meus amores literários, Graham Greene (1904-1991), em alguns contos e no seu grande livro “The Heart of The Matter” – “O Cerne da Questão”, também já traduzido como “O Coração da Matéria” (com cuidado para não confundir com “Heart of Darkness” de Conrad); publicado em 1948. A atmosfera das obras de Greene costuma ser, quando não de um cinismo mordaz, de profundo desalento. Embora em música tal sentimento costume se transfigurar na invisibilidade misteriosa dos sons, com a literatura a coisa é bem diferente. O quadro dos enredos é pintado – ou cinzelado – direto em nossa ideia, e nas mãos de um soberbo escritor, os efeitos podem ser devastadores. Curiosamente existe quem sobreviva melhor à literatura e não suporte a intensidade da música. Já conheci pessoas assim e as compreendo. Música pode fazer muito mal. Mal que muitas vezes buscamos apaixonadamente, afinal, amor é amor – O Cerne da Questão.
O livro de Greene traz uma triste narrativa. Mas antes de resumi-la gostaria de dizer que não comentarei exceto muito de passagem a questão religiosa de Greene, indissociável de sua biografia e obra. Ele que se dizia “agnóstico-católico”, seja como for que isso funcionasse. Avesso a qualquer monoteísmo, não me arvoro a comentar e jamais compreenderia a realidade de um católico inglês. No livro este ‘fator humano’ é um ônus, para o livro e para o protagonista, que se consome numa culpa de natureza em grande parte religiosa – para mim um horror e uma autoimolação inconcebível. O livro acabou sendo chamado de Romance Católico e Green chamado de “escritor católico”. Me parece exagero. Como alguém já observou, seria como chamar os livros de Jorge Amado e a ele de romances e escritor candomblecistas – o que não ocorre.
Scobie é um major policial inglês que trabalha em uma colônia africana (Serra Leoa) durante a Segunda Guerra Mundial. Após a partida de sua esposa Louise (sempre lamuriosa e infeliz por seu marido não ter galgado certa posição e consequente êxito pecuniário) para a África do Sul, ele participa do resgate de um naufrágio, e ali presencia a morte de uma criança. Este episódio o faz reviver a perda de sua filha, que falecera poucos anos antes. Enquanto revive essa tristeza, conhece Helen, vítima do naufrágio, cujo marido perecera no mesmo. Tornam-se amantes. Depois de ser chantageado pelo personagem para mim mais simpático do livro, o contrabandista sírio Yusef, Scobie se vê metido em ações corruptas envolvendo tráfico de diamantes. Para agravar o estado das coisas, ele é espionado por Wilson, caçador de espiões e colaboracionistas, que corteja a Sra. Scobie como pretenso amante. Passando a viver dividido entre os deveres de sua profissão e da vida afetiva, mais as cobranças do seu catolicismo. É uma tragédia. No final Scobie escolhe abdicar da vida. Seu maior anseio era viver em paz e rotina, sabendo que as pessoas que ama estariam felizes – uma remotíssima possibilidade. Sentindo-se culpado por ofender seu casamento com o adultério e não conseguir assumir sua amante, e ainda se vendo enleado em crimes de contrabando e assassinato, Scobie simula um problema cardíaco e se mata com uma overdose de soníferos com gin. O livro recebeu uma versão cinematográfica na década de 50, com Trevor Howard no papel principal. Infelizmente é um filme raríssimo para nós.
Talvez não fosse o momento para uma postagem com um tema tão desolador. Peço desculpas por isso e creio que O Cerne da Questão em nossa página, afinal, é a música; e por mais que o disco seja intimista, a música, com sua beleza, nos salvará no final. Recortei alguns trechos do livro para que tenhamos a delícia das entrelinhas.
“Wilson gostava de poesia, mas costumava absorvê-la em segredo, como uma droga.”
“Eles tinham sido corrompidos por dinheiro; ele, por sentimento. O sentimento era o mais perigoso, porque não era possível especificar seu preço. Um homem aberto a subornos merecia confiança acima de um certo número, mas o sentimento podia brotar no coração à lembrança de um nome, uma fotografia, até mesmo um cheiro.”
“A verdade, ele pensava, nunca teve real valor para nenhum ser humano – é um símbolo buscado por matemáticos e filósofos. Nas relações humanas, a generosidade e os laços de afeição valem mil verdades.”
“Ele tinha praticamente tudo, só precisava de paz”
“O desespero é o preço que pagamos por nos comprometermos com uma meta impossível. (…) um pecado que nunca é cometido pelos corruptos e pelos maus. Eles sempre têm esperança. Nunca atingem aquele estado paralisante que é o conhecimento do fracasso absoluto. Só os homens de boa vontade levam sempre no coração essa capacidade para a desgraça.”
“Nós perdoaríamos a maioria das coisas se conhecêssemos os fatos. (…) Um policial deve ser a pessoa mais magnânima do mundo se entender corretamente os fatos.”
“…pela primeira vez percebeu a dor inevitável em qualquer relacionamento humano – dor sofrida e dor afligida. Que tolice ter medo da solidão.”
“…na noite confusa esqueceu por ora o que a experiência lhe ensinara – que nenhum ser humano pode entender outro ser humano, que ninguém pode providenciar a felicidade do outro.”
“…a amizade é uma coisa na alma. É uma coisa que a gente sente. Não é uma retribuição por alguma coisa. (…) – Eu gostaria que não falasse tanto, Yusef. Não estou interessado em sua amizade. – Suas palavras são mais duras que seu coração, major Scobie.”
“A felicidade nunca é realmente tão bem vinda quanto a imutabilidade.”
“Um pouco de cerveja então, major Scobie. – O Profeta não proíbe isso? – O Profeta não conheceu nem cerveja gelada nem whisky engarrafado, major Scobie. Nós temos de interpretar suas palavras à luz da modernidade!”
“Que coisa absurda era esperar felicidade num mundo tão cheio de sofrimento. Ele reduzira suas próprias necessidades ao mínimo, guardara as fotografias em gavetas, tirara os mortos da cabeça. Um afiador de navalhas, um par de algemas enferrujadas usadas como enfeite. Mas ainda temos nossos olhos, ele pensou, nossos ouvidos. Mostre-me um homem feliz e eu lhe mostro um egoísmo extremo, o mal – ou uma ignorância absoluta.”
“Um único ato de coragem pode alterar toda noção da medida do possível.”
“Até o sifão azul de soda estava no mesmo lugar: tudo tinha uma ar de eternidade, como a mobília do inferno.”
“Pareceu-lhe por um momento que Deus era demasiado acessível. Não havia nenhuma dificuldade em aproximar-se d’Ele. Como um demagogo popular, Ele estava disponível para receber a qualquer hora o menor dos Seus seguidores. Olhando para a cruz, ele pensou: Ele até mesmo sofre em público!”
“…fazia muito tempo que ele se tornara incapaz de qualquer coisa tão honesta como a loucura: era uma desses condenados na infância à complexidade.”
“Em nossos coração há um ditador impiedoso, pronto a contemplar a infelicidade de mil desconhecidos se ela assegurar a felicidade dos poucos que amamos.”
“Não podemos ser prudentes o tempo todo, morreríamos de desgosto.”
“Ele se deu conta de que para quem não ama o tempo nunca para.”
“Não acredito em ninguém que diz amo, amo, amo. Isso significa eu, eu, eu.”
“Ninguém pode dizer um monólogo sozinho por muito tempo. Outra voz sempre se fará ouvir. Todo monólogo, mais cedo ou mais tarde, se torna uma discussão.”
“Um homem não vem a nós para confessar suas virtudes.”
O texto já se estendeu demais. Letras demais para um só disco. Apenas para arrematar o tema literário: George Orwell atacou o livro com seu bisturi de gelo e pôs abaixo a coerência da caracterização do próprio protagonista: Se fosse tão ligado em religião, como optou pelo condenável suicídio? Se era tão cristão, como podia ser um policial de colônia? Não sei como Greene responderia a Orwell entre um drink e outro – seria um encontro magistral. Devo concluir com a impressão de que os motes de culpa e redenção, expiação e suicídio, tenham sido elementos talvez catárticos para o autor. Ele próprio, segundo se comenta, maníaco depressivo, que na juventude andou brincado de roleta russa – literalmente falando. O personagem, no fim das contas, é quase um santo, que se sacrifica para não perpetuar a infelicidade das pessoas que ama. Possivelmente uma espécie de alter ego religioso do autor, quem sabe. Ao longo da obra nos vemos numa encruzilhada sobre qual seria o ‘Heart of The Matter’. Os vetores às vezes apontam para o amor, às vezes para a infelicidade, às vezes para a compaixão – que nos remete ao primeiro.
Embora possam discordar alguns adeptos e compositores de música chamada “moderna” (que já vai em cem anos), música diz tanto quanto diz a literatura. Música e retórica estão profundamente imbricados ao longo dos contextos históricos. A pena de Green nos fala, o trompete de Baker nos fala. De maneiras distintas, mas que se cruzam em certo ponto: Mais um Cerne da Questão.
Postagem dedicada a Judy Esteves.
CHET BAKER TRIO – ESTATE
Chrystal Bells
Strollin’
Lament
Leaving
Cherokee
Estate
My Funny Valentine
Chet Baker – Trompete e vocal
Philip Catherine – Guitar
Jean-Louis Rassinfosse – Bass
Fiz questão de deixar em tamanho grande a imagem da capa deste CD, pois a achei muito bonita,mais um detalhe a a destacar neste belíssimo CD duplo, gravado ao vivo, que traz dois dos maiores pianistas da atualidade tocando juntos.
Chick Corea dispensa apresentações, é uma lenda viva do piano no Jazz. Hiromi Uehara, ou simplesmente Hiromi, representa o frescor da juventude, mas, apesar da cara de moleque, e de se vestir como uma adolescente rebelde, já completou 40 anos, só que a gravação deste show aconteceu lá em 2009, ou seja, a moça ainda estava entrando nos seus trinta anos. Já tive a oportunidade de trazer em outra ocasião trouxe dois outros cds dela tocando com antigos parceiros do próprio Chick Corea: Lenny White e Stanley Clarke, turminha que arrasava lá dos anos 70, em um super grupo que se chamava Return to Forever. Quem não conhece, sugiro procurarem maiores informações.
Neste belíssimo e delicadíssimo CD, a dupla desfila seu talento interpretando canções famosas, que vão da nossa dupla Tom Jobim / Vinícius de Moraes (How Insensitive, ou traduzindo, Insensatez), passando por Beatles (Fool on the Hill) e obras já clássicas do próprio Chick Corea, passando por Bill Evans, Gershwin, Thelonius Monk além de peças da própria Hiromi.
Chick Corea & Hiromi Uehara: Duet
CD 1
1 Very Early
Written-By – Bill Evans
2 How Insensitive
Written-By – Antonio Carlos Jobim, Vinicius De Moraes
3 Déjà Vu
Written-By – Hiromi Uehara
4 Fool On The Hill
Written-By – John Lennon, Paul McCartney
5 Humpty Dumpty
Written-By – Chick Corea
6 Bolivar Blues
Written-By – Thelonious Monk
CD 2
1 Windows
Written-By – Chick Corea
2 Old Castle, By The River, In The Middle Of A Forest
Written-By – Hiromi Uehara
3 Summertime
Written-By – DuBose Heyward, George Gershwin, Ira Gershwin
4 Place To Be
Written-By – Hiromi Uehara
5 Do Mo [Children’s Song #12]
Written-By – Chick Corea
6 Concierto De Aranjuez/Spain
Written-By – Chick Corea, Joaquín Rodrigo
Comecei ouvindo Keith Jarrett ainda na minha adolescência, com o excepcional ‘Nude Ants’, que comprei despretensiosamente em um sebo de Curitiba. Não sabia o que esperar. Conhecia seu trabalho solo, principalmente o ‘Köln Concert’, hoje já considerado um dos maiores discos de improviso do Jazz de todos os tempos. Fiquei impressionado com a energia que saia de seu piano, e como ele se entregava na hora de tocar. Poucos músicos são tão expressivos quando Keith Jarrett. Seu gestual corporal é único, como se retorce, faz caretas, geme, enfim, uma catarse total a cada interpretação. Em um primeiro momento podemos achar exagerado, mas quando conseguimos captar a essência da música, entendemos que o que ocorre ali é único. Nunca mais ouviremos a mesma música da mesma forma.
Quando se reuniu ao baixista Gary Peacock e ao baterista Jack DeJohnette, a integração foi total. Já perdi a conta de quantos discos eles já lançaram, mas vou fazer esta pesquisa. Esses caras tocam juntos há muito tempo, e são verdadeiros mestres em seus instrumentos. Então, repito o que escrevi acima, nunca mais ouviremos a mesma música da mesma forma, e aí está a genialidade do(s) improvisador (es).
As capas minimalistas da ECM escondem tesouros por trás delas. Este disco que ora vos trago foi gravado em Oslo, Noruega, em 1989, pouco mais de trinta anos se passaram, e muita coisa aconteceu neste vasto mundo desde então. Mas mesmo assim, é incrível como ele é moderno em sua essência. Faixas como ‘Just in Time’ nos mostram um verdadeiro embate entre gigantes, o piano de Keith Jarrett, o contrabaixo de Gary Peacock e a máquina de ritmo chamada Jack DeJohnette.
Sempre recomendo um bom fone de ouvidos para se ouvir estes discos. Assim os senhores podem prestar atenção aos detalhes, fundamentais em um disco em que se improvisa 99% do tempo.
Portanto, podem se deliciar. É papa finíssima.
01 – All Of You
02 – Little Girl Blue
03 – Just In Time
04 – Old Folks
05 – Love Is A Many-Splendored Thing
06 – Dedicated To You
07 – I Hear A Rhapsody
08 – How About You
Keith Jarrett – Piano
Gary Peacock – Bass
Jack DeJohnette – Drums
É desnecessário tecer maiores comentários sobre estes trabalhos de Keith Jarrett. Já me considero suspeito para falar o óbvio ululante, de que é um gênio, que tudo o que toca vira ouro, sei lá que outras redundâncias poderia citar. Prefiro deixar que os senhores, se quiserem, tirem suas conclusões. Ouço essa turma já há quase quarenta anos, e ao contrário de muitas outras coisas que comecei a ouvir na época, e que hoje me parecem datados, sempre que ouço essa turma ouço de outra forma, e faço novas descobertas. Parecem camadas sobrepostas, a cada audição tiramos uma daquelas camadas e descobrimos outras possíbilidades por baixo.
Keith Jarrett, em minha modesta opinião, alcançou um nível de excelência que poucos músicos alcançaram. De sua geração, poderia citar Chick Corea e Herbie Hancock, músicos que começaram praticamente juntos, talvez Hancock um pouco antes, todos excepcionais músicos, virtuoses, e revolucionaram a arte de tocar piano no Jazz, seguindo os passos de outros gênios do passado, como Monk, Bil Evans, Oscar Peterson, dentre outros que já se foram.
Neste CD, Jarrett e seu fiel escudeiro Gary Peacock se juntam a outra lenda, não, aqui não temos Jack de Johnette, e sim Paul Motian. O mesmo Paul Motian que fez parte de outro trio de Jarrett, com Charlie Haden.
Minhas próximas postagens no interlúdio serão dedicadas a esse cara. Não pretendo trazer tudo o que tenho dele, ficaria até o final do ano, apenas alguns discos que considero fundamentais, porém confesso que é muito difícil fazer essa seleção. Começo com essa pintura gravada na mítica casa de Jazz “Deer Head Inn”, na Pensilvânia. Espaço pequeno, porém aconchegante, que permite um grau maior de intimidade entre os músicos e o público.
Recomendo fortemente, acompanhado de uma garrafa de um bom vinho, ainda mais neste período de pandemia e de isolamento social.
01. Solar
02. Basin Street Blues
03. Chandra
04. You Don’t Know What Love Is
05. You And The Night And The Music
06. Bye Bye Blackbird
07. It’s Easy To Remember
Revirando o PQPBach, descobri que nunca postamos nada deste lendário grupo, o ‘The Modern Jazz Quartet’. Isso é absolutamente inadmissível, em se tratando de um blog que se propõe a pollinizar a blogosfera com talento, virtuosismo, com música de alto nível e de alta qualidade, e em se tratando destes quatro camaradas, sofisticação. Vou tentar suprir esta falta trazendo o disco que me apresentou eles, já há algumas décadas, duas ou três, não tenho certeza. Era a banda favorita de um grande amigo, que aliás, me apresentou este disco, e que considerava o que de melhor havia de se produzido em se tratando de jazz. E é difícil não concordar com ele.
Este título, na verdade, é uma pegadinha. Não foi a última apresentação deles. Na verdade a banda realmente se separou por alguns anos, mas voltaram a gravar e se apresentar até 1997. Na verdade, eles encerraram sua longeva carreira lá em 1985, onze anos após este registro que ora vos trago. Não por acaso, este disco duplo está na lista dos 1000 mais importantes álbuns da história do Jazz. Nunca houve um grupo tão coeso e tão unido quanto o Modern Jazz Quartet. O que dizemos do Beaux Arts Trio podemos facilmente atribuir a estes quatro excepcionais músicos: a facilidade com que eles tocam juntos, tudo flui belo, uno, e essa é a melhor definição para eles: a capacidade de tocarem como se fosse apenas um só. Milt Jackson é um monstro no vibrafone, mas não estamos tratando aqui de certos músicos que fazem tudo rodar ao seu redor: não, aqui é diferente, antes de tudo, se pensa no grupo. Ouçam o clássico ‘Roun´ Midnight’, e me digam se não é uma das mais belas versões desta obra imortal.
Este disco também me traz boas lembranças, dos tempos em que o ouvi pela primeira vez, ainda estudando na Universidade. Espero que apreciem.
CD 1
01 – Softly As In A Morning Sunrise
02 – The Cylinder
03 – Summertime
04 – Trav’lin’
05 – Blues In A Minor
06 – One Never Knows
07 – Bags’ Groove
CD 2
01 – Confirmation
02 – ‘Round Midnight
03 – Night In Tunisia
04 – The Golden Striker
05 – Skating In Central Park
06 – Django
07 – What’s New
The Modern Jazz Quartet:
John Lewis – Piano
Milt Jackson – Vibraphone
Perci Heath – Bass
Connie Kay – Drums
Em 2020, Orchestrion poderia se chamar Quarantine por ser um trabalho absolutamente individual de Metheny. Ele tocou todos os instrumentos e o resultado foi bom. O álbum, obviamente de estúdio, foi lançado pela Nonesuch em janeiro de 2010. A orquestra de Metheny foi construída pelo engenheiro Eric Singer e a Liga de Robôs Urbanos Musicais Eletrônicos (LEMUR), Ken Caulkins em Ragtime West, Mark Herbert, Cyril Lance e Peterson Electro-Musical Products . O conjunto inclui pianos, marimba, vibrafone, sinos de orquestra, baixos, GuitarBots, percussão, pratos e tambores, garrafas sopradas e outros instrumentos mecânicos, acústicos e personalizados.
Desde criança, Metheny passava os verões mexendo e alterando coisas no piano de seu avô. Ele sempre foi fascinado pela mecânica de fazer música. Com Orchestrion, ele arrasta sua obsessão infantil para o século XXI. Orchestrions eram mini-orquestras tocadas mecanicamente do século XIX, geralmente construídas em torno do piano, e a capa do álbum ilustra a interpretação moderna de Metheny do orchestrion. Ele fica pequeno ao lado dos imensos racks de mecanismos, instrumentos de percussão personalizados, guitarbots, pianos e garrafas Disklavier, todos controláveis através de seu violão através de solenóides e MIDI. Embora seja tocada por máquinas, essa música soa surpreendentemente humana. Há batimentos cardíacos na percussão, vozes zumbindo nas cordas e músicas sem palavras de garrafas sopradas. A faixa-título é otimista, com um aceno para o povo irlandês e a consonância e dinâmica que você espera da música de Metheny. Há percussão densa em todos as faixas e o álbum inteiro está mergulhado em lirismo, com linhas de guitarra pungentes patinando sobre belas mudanças harmônicas.
Peças introspectivas como o Entry Point e o Soul Search não funcionam tão bem assim. A falta de um toque humano no piano é perceptível. Ao contrário de Tubular Bells ,de Mike Oldfield, Orchestrion não desfila cada instrumento numa passarela. É o violão ou o piano que lideram em cada faixa, enquanto os outros instrumentos fornecem textura. A dinâmica é impressionante e os instrumentos parecem naturais, mas falta a excitação de um ego humano real disparando sobre outro. Apesar das algumas deficiências, Orchestrion é Pat Metheny. Afinal, ele compôs, tocou e improvisou todos os sons que você ouve. E chegou perto do seu objetivo de tornar este álbum mais do que uma curiosidade, mas o impacto real seria certamente o de ver seu Orchestrion ao vivo.
Parte de geringonça está aqui, ó:
.: interlúdio :. Pat Metheny (1954): Orchestrion
01. Orchestrion 15:52
02. Entry Point 10:28
03. Expansion 8:37
04. Soul Search 9:20
05. Spirit Of The Air 7:45
O pianista McCoy Tyner morreu no dia 6 de março de 2020, aos 81 anos. Dos membros do mais famoso quarteto de Coltrane, era o último entre nós. A causa da morte não foi divulgada.
Tyner era mais conhecido por seus anos como membro do John Coltrane Quartet, um dos grupos mais icônicos e revolucionários do jazz. Foi com Coltrane, de 1960 a 65, que Tyner reescreveu as regras do piano de jazz com seus acordes percussivos e cheios de notas.
O primeiro disco dessa formação do quarteto de Coltrane, My Favorite Things, foi lançado em 1961 e teve grande sucesso, especialmente a faixa-título. O pianista atacou a música de Rodgers & Hammerstein com ondas marteladas de acordes modais e repetitivas, porém atraentes, que eram tão proeminentes quanto o saxofone soprano de Coltrane. A música se tornou o cartão de visitas de Coltrane, tocada todas as noites – mas era igualmente importante, se não mais, para Tyner. (Pleyel, com trechos copiados de JazzTimes)
Queria postar Mingus (e o farei em breve) – mas não tenho ouvidos pra ele ultimamente; tenho passado as horas a reencontrar meu disco preferido de jazz. My Favorite Things, gravado entre 24 e 26 de outubro de 1960 por Coltrane, é uma aula de música envolta em uma aura de simplicidade e candura. Não obstante, a faixa-título é uma valsa – de The Sound of Music, o musical. Coltrane (e McCoy Tyner, ao piano) abraçam o ouvinte pelas orelhas e o fazem girar em notas mais do que perfeitas e jamais excedentes. O quarteto mostra mais do que coesão – também generosidade de Trane, que em seus arranjos favorece a construção sonora mais do que a própria voz (o sax). São as sheets of sound que formaram sua identidade musical. Puro deleite de jazz modal, indicado inclusive para iniciantes que se sentem oprimidos pelo bop mas desejam um pouco mais de complexidade. Aproveitem o rip em alta definição e não tenham medo de usar os fones de ouvido. (Bluedog)
John Coltrane – My Favorite Things
01 My Favorite Things (Rodgers, Hammerstein) – 13’47
02 Everytime We Say Goodbye (Porter) – 5’54
03 Summertime (G. Gershwin, Heyward) – 11’37
04 But Not for Me (G. Gershwin, I. Gershwin) – 9’35
John Coltrane: soprano saxophone (1, 2), tenor saxophone (3, 4)
McCoy Tyner: piano
Steve Davis: bass
Elvin Jones: drums
Produzido por Nesuhi Ertegun para a Atlantic
Em tempos de quarentena, muitos de nossos amigos têm se dedicado a atividades como meditação, yoga, ta-chi-chuan. Outros aumentam o consumo de ervas ou cogumelos, buscando nos paraísos artificiais a fuga da ansiedade com os difíceis tempos por vir. Em todos esses casos, o isolamento social traz a possibilidade de momentos de pausa absolutamente importantes para a saúde física e mental.
Este é um disco IM-PER-DÍ-VEL para ouvir durante a meditação e outros momentos similares. Gravado em 1968 sob a grande cúpula do Taj Mahal, o disco tem apenas três instrumentos: a flauta de Paul Horn (1930-2014), a voz de um homem não identificado (guarda do Taj Mahal que canta a capella sem ensaios, ou pelo menos essa é a história oficial), e finalmente o próprio Taj Mahal, com seus ecos de até 28 segundos, produzindo incontáveis sobreposições e harmônicos.
Para o ouvinte que fala português ou espanhol, o álbum tem um interesse a mais: na faixa 8 (Jumma), o guarda não identificado canta uma melodia com origem no norte da África (marroquina, bérbere ou algo do tipo), com uma grande semelhança com as línguas ibéricas. Versos, por exemplo, como “po[r] ca[usa] de ti”, nos lembram o quanto as civilizações dos dois lados do estreito de Gibraltar estão próximas geográfica e culturalmente, apesar da separação fruto de guerras e religiões.
Paul Horn tinha participado das bandas de Duke Ellington e Nat King Cole, mas foi no Taj Mahal que ele encontrou sua voz mais original, com a flauta improvisando notas longas e cuidadosas. Este disco foi uma grande influência para a música new age que seria produzida anos depois e acabaria virando trilha sonora de elevador. Após mais de um milhão de cópias vendidas, é claro que Paul Horn ia tentar repetir a fórmula… Gravou álbuns dentro da Grande Pirâmide de Gizé, da Catedral de Vilnius e por aí vai…
Trata-se de um disco belo, estranho e totalmente único ao mesmo tempo, como escreveu o crítico do The Guardian que o incluiu na lista de 101 discos mais estranhos disponíveis no Spotify (boa recomendação para aqueles com tempo livre e mentes muito abertas).
A(s) big band(s) formadas por Duke Ellington são inacreditáveis. Todos parecem ser grandes solistas e ninguém erra. E a banda se transmuta de grande em pequena, quando quer, atuando em perfeitos subconjuntos. O som deste CD não é o melhor, mas na terceira faixa já esquecemos disso, tal a qualidade da música e dos músicos. Ellington foi grande compositor e arranjador. Nada parece ser ocioso ou fora do lugar.
Depois de uma longa excursão pela Ásia, incluindo o Sri Lanka, e depois de duas semanas no Reino Unido, de 15 de fevereiro a 1 de março, a orquestra desembarcou no continente no dia 2, em Stuttgart, viajando por várias cidades até o dia 23, data do último concerto em Limoges. Acrescente a essa agenda estonteante o fato de que a banda costumava dar dois shows por dia e que alguns músicos às vezes realizavam sessões de gravação à tarde… Entre outras maravilhas, temos aqui cinco extratos (faixas 2 a 5 e 13) do que se tornaria em 1966 a Far East Suite, que ouvimos aqui pela primeira vez.
Duke Ellington: Paris, March 1964
1 Take The ”A” Train
2 Amad
3 Agra
4 Bluebird Of Delhi (Minah)
5 Depk
6 The Opener
7 Happy Reunion
8 Blow By Blow
9 Harmony In Harlem
10 Stompy Jones
11 Caravan
12 Tutti For Cootie (Fade Up)
13 Isfahan
14 Things Ain’t What They Use To Be
15 Banquet
16 Skillipoop (Jungle Triangle)
17 Satin Doll
Gente, que CD! Se ele contivesse apenas a Toot Suite já seria imperdível, mas ele tem muito mais. Tem até Ella e Dinah em duas faixas. Uma coisa de louco!
Edward Kennedy “Duke” Ellington (Washington, 29 de Abril de 1899 — Nova Iorque, 24 de Maio de 1974) foi um compositor de jazz, pianista e líder de orquestra estadunidense eternizado com a alcunha de “The Duke” e distinguido com a Presidential Medal of Freedom (condecoração americana) em 1969 e com a Legião de Honra (condecoração francesa) em 1973, sendo ambas as distinções as mais elevadas que um civil pode receber. Foi ainda o primeiro músico de jazz a entrar para a Academia Real de Música de Estocolmo, e foi honoris causa nas mais importantes universidades do mundo.
A música de Duke Ellington foi uma das maiores influências no jazz desde a década de 1920 até à de 1960. Ainda hoje suas obras têm influência apreciável e é, por isso, considerado o maior compositor de jazz americano de todos os tempos. Entre os seus muitos êxitos encontram-se “Take the A Train” (letra e música por Billy Strayhorn), “Satin Doll”, “Rockin’ in Rhythm”, “Mood Indigo”, “Caravan”, “Sophisticated Lady”, e “It Don’t Mean a Thing (If It Ain’t Got that Swing)”. Durante os anos 20 e 30, Ellington partilhava frequentemente seus créditos de compositor com seu manager Irving Mills, até que no final dos anos 30 desentenderam-se. Billy Strayhorn passou a ser o colaborador de Ellington (nem sempre creditado como tal) desde 1940 até à sua morte nos anos 70.
Ellington tinha a preocupação de adaptar as suas composições de acordo com o talento dos músicos que compunham a sua orquestra, entre eles estiveram Johnny Hodges, Bubber Miley, Joe “Tricky Sam” Nanton, Barney Bigard, Ben Webster, Harry Carney, Sonny Greer, Otto Hardwick, e Wellman Braud. Muitos músicos permaneceram ao lado de Ellington durante décadas.
Durante toda a sua vida gostou de fazer música experimental (em busca de novas sonoridades), gravou com John Coltrane e Charles Mingus e ainda com a sua dotada orquestra. Nos anos 40 e 50, a banda atingiu um pico criativo, quando escreveu para orquestra a várias vozes com grande criatividade.
Duke Ellington: Les Girls! (The Girls Suite & Toot Suite Premieres) 1958-1963
NBC Telecast, “Bell Telephone Hour-American Festival”, New York, February 10, 1959
1 –Duke Ellington With Ella Fitzgerald Medley: Satin Doll – Don’t Get Around Much Anymore – Caravan – Mood Indigo – I’m Just A Lucky-So-And-So – Caravan – Do Nothing Till You Hear From Me – I’m Beginning To See The Light 11:15
Monterey Jazz Festival, Fair Grounds, Monterey, Cal., September 23, 1961 “The Girls Suite”
2 –Duke Ellington And His Orchestra Girls 3:46
3 –Duke Ellington And His Orchestra Sarah 2:00
4 –Duke Ellington And His Orchestra Lena 3:14
5 –Duke Ellington And His Orchestra Mahalia 3:53
6 –Duke Ellington And His Orchestra Dinah 4:26
State Fair Grounds, Detroit, Mich., August 26, 1963
7 –Duke Ellington And His Orchestra With Dinah Washington Spoken Introduction By Duke Ellington 1:24
8 –Duke Ellington And His Orchestra With Dinah Washington Do Nothing Till You Hear From Me 2:57
9 –Duke Ellington And His Orchestra With Dinah Washington Evil Gal Blues 2:39
Same Date, Dinah Washington
10 –Duke Ellington And His Orchestra Jam With Sam 5:37
Sheraton Hotel, French Lick, Ind., August 15, 1958 “Toot Suite”
11 –Duke Ellington And His Orchestra Red Garter 4:53
12 –Duke Ellington And His Orchestra Red Shoes 4:46
13 –Duke Ellington And His Orchestra Red Carpet 8:30
14 –Duke Ellington And His Orchestra Ready Go 4:06
Track 1:
DUKE ELLINGTON AND ELLA FITZGERALD
Ella Fitzgeral (voc) – Duke Ellington (p) – Jim Hall (g) – Wilfred Middlebrooks (b) – Gus Johnson (b) + studio orchestra.
NBC telecast, “Bell Telephone Hour-American Festival”, New York, February 10, 1959
Tracks 2-6:
DUKE ELLINGTON AND HIS ORCHESTRA
Willie Cook, Ed Mullens, Cat Anderson, Ray Nace (tp) – Lawrence Brown, Lou Blackburn (tb) – Chuck Connors (btb) – Johnny Hodges (as) – Russell Procope (cl, as) – Jimmy Hamilton (cl, ts) – Paul Gonsalves (ts) – Harry Carney (bar) – Duke Ellington (p, cond) – Aaron Bell (b) – Sam Woodyard (d)
Monterey Jazz Festival, Fair Grounds, Monterey, Cal., September 23, 1961
“The Girls Suite” (D. Ellington, B. Strayhorn)
Tracks 7-9:
DUKE ELLINGTON AND HIS ORCHESTRA WITH DINAH WASHINGTON
Willie Cook, Rolf Ericson, Cat Anderson, Cootie Williams, That Jones (tp) – Lawrence Brown, Buster Cooper (tb) – Chuck Connors (btb) – Johnny Hodges (as) – Hilton Jefferson (as) – Jimmy Hamilton (cl,ts) – Harry Carney (bar) – Duke Ellignton (p, cond) – Ernie Shepard (b) – Sam Woodyard (d) – Dinah Washington (voc).
State Fair Grounds, Detroit, Mich., August 26, 1963
Track 10:
DUKE ELLINGTON AND HIS ORCHESTRA
Same date, Dinah Washington out.
Tracks 11-14:
DUKE ELLINGTON AND HIS ORCHESTRA
Haold Baker, Cat Anderson, Clark Terry, Ray Nance (tp) – Britt Woodman, Quentin Jackson (tb) – John Sanders (v-tb) – Johnny Hodges (as) – Russel Procope (cl, as) – Jimmy Hamilton (cl, ts) – Paul Golsalves (ts) – Harry Carney (bar) – Duke Ellington (p, cond) – Jimmy Weoode (b) – Sam Woodyard (d).
Sheraton Hotel, French Lick, Ind., August 15, 1958
“Toot Suite” (D. Ellington, B. Strayhorn)
O ano de 1963 foi lotado de compromissos para a orquestra de Ellington, entre uma longa turnê europeia de 9 de janeiro a 4 de março e uma excursão não menos longa ao Oriente Médio e Ásia, de 6 de setembro a 22 de novembro, de Damasco a Bombaim, via Bagdá, Teerã e Cabul… Sim, parecia o time do Santos com Pelé. Menos conhecido é o fato de que a orquestra viajou à Europa no verão de 63 e passou a maior parte de junho na Suécia. Incrível a naturalidade e a atmosfera calorosa, descontraída e informal destes concertos dos quais oferecemos aqui trechos. É o exemplo acabado do que gostaríamos de ouvir com mais frequência em disco. Música tocada com alegria e entusiasmo, às vezes com erros, mas cheia de surpresas e momentos de pura loucura…
Duke Ellington – Stockholm, June 1963
1 Take The “A” Train
2 Jeep’s Blues
3 Rose Of The Rio Grande
4 Kinda Dukish / Rockin’ In Rhythm
5 In A Sentimental Mood
6 Mr Gentle And Mr Cool
7 I Let A Song Go Out Of My Heart / Don’t Get Around Much Anymore
8 Entr’acte
9 I Didn’t Know About You
10 Suite Thursday, 1st Mouv.: Misfit Blues
11 Suite Thursday, 2nd Mouv.: Schwiphti
12 Suite Thursday, 3rd Mouv.: Sweet Zurzday
13 Suite Thursday, 4th Mouv.: Lay-By
14 Laura
15 Afro-Bossa
Meu dia começou triste quando nosso guru PQPBach, em férias pela Europa, mandou uma mensagem noticiando a morte de Lyle Mays, o emblemático tecladista que acompanhou Pat Metheny por muitos anos.
Para nós, fãs confessos do grande guitarrista que é Pat Metheny, a notícia é desoladora. É como se com ele se fosse uma fase de nossas vidas, quando aguardávamos ansiosos as novidades da banda pelo selo ECM. Não sei se eu consideraria Mays um virtuose, mas sim alguém com um amplo conhecimento musical, que servia de base para Metheny desfilar todo o seu talento e nos trazer discos fundamentais, que acompanharam nossa adolescência, que serviram de trilha sonora. Claro que não podemos ignorar outros músicos que tocaram com Metheny naquela época, como o baixista Steve Rodby, principal arranjador e produtor do grupo. Mas ouvindo discos como ‘American Garage’ ou ‘First Circle’ não há como não entender o papel fundamental que os teclados de Mays exercem na música produzida.
Fica um sentimento muito grande de perda, perda de um músico que embalou meus sonhos de juventude e de jovem adulto. Rodei milhares de quilômetros ouvindo estes discos com meu walkman, e mais tarde com meu discman. Poderia dizer que estes discos fizeram (e fazem) parte da trilha sonora de minha vida. Para quem não o conheceu, sugiro assistir ao vídeo do Youtube abaixo para entender o que estou falando.
Escolhi o ‘First Circle’ para homenageá-lo.
Descanse em Paz, Lyle Mays.
01. Forward March
02. Yolanda, You Learn
03. The First Circle
04. If I Could
05. Tell It All
06. End Of The Game
07. Mas Alla (Beyond)
08. Praise
Pat Metheny – Guitar
Steve Rodby – Bass
Lyle Mays – keyboards
Pedro Aznar – Percussion
Paul Wertico – Drums