Franz Schubert (1797-1828): Impromptus D899 & D935- Murray Perahia

Relembrando algumas antigas postagens, encontrei uma lá de 2019, com estas mesmas obras de Schubert, nas mãos mais que competentes de András Schiff. Mas o velho mestre optou em gravá-las em um pianoforte, instrumento com o qual vem gravando seus últimos discos.

A conversa aqui é outra e os tempos idem. Precisamos retroceder quase quarenta anos no tempo, quando éramos jovens e ambiciosos, e planejávamos um futuro brilhante para nós. Este que vos escreve já estava entrando em sua maioridade legal, 18 anos, e morando em uma pequena cidade do interior do país, nem imaginava o que poderia vir pela frente. Mas a paixão pela música já existia,  e apesar das dificuldades de acesso a bons discos, principalmente devido a falta de dinheiro, ainda vivendo sob as asas dos pais, cada centavo que conseguia guardar era gasto em discos, o que deixava os pais irritados, mas orgulhosos, de certa forma: poderia estar gastando com drogas ou álcool, mas ia até a capital pelo menos uma vez por mês para comprar adquirir os bons e velhos LPs.

Enfim, em certa ocasião então lhe caiu em mãos uma fita cassete, isso mesmo, onde o pianista Murray Perahia interpretava os belíssimos “Impromptus” de Franz Schubert. Na primeira vez em que colocou a fita para tocar no velho 3×1 a mãe veio até o quarto querendo saber que maravilha de música era aquela. Expliquei para ela que era Schubert, mas também muito mais que isso não sabia. As informações que vinham, quando vinham, nos encartes dos LPs e fitas cassetes eram escassas. Fui então até a Biblioteca Municipal pesquisar na famosa Enciclopédia Barsa (caraca, deve ter gente que nem imagina o que seja isso), e lá encontrei o verbete Franz Schubert. Fiz as anotações necessárias, e voltei para casa e contei para minha mãe quem era o compositor, em que época ele havia vivido, quando morreu, etc. (puxa, morreu tão jovem mas fez uma música tão bonita e profunda!!!).

É neste adjetivo que pretendo focar o resto de minha digressão aqui. Bela e profunda são dois adjetivos por demais simples para definirmos tais obras. Estes ‘improvisos’ schubertianos sempre me deixaram maravilhado, por mais que os ouça. Eles nos deixam mais introspectivos e concentrados. E curioso que mesmo sem saber do que se tratava, foi a primeira sensação que tive, assim como minha mãe. Depois de tanto tempo, ouvindo novamente essa gravação de Murray Perahia, fico feliz ao reconhecer que ela envelheceu muito bem. O romântico Perahia mergulha fundo na obra, e nos apresenta uma interpretação segura, madura, com paixão porém sem excessos.

Mas vou deixá-los degustar esse belíssimo disco, um de meus favoritos, daqueles eu levaria para uma praia deserta.

Impromptus, Op. 90 / D 899 (1827)
No. 1 in C minor. Allegro molto moderato
No. 2 in E flat major. Allegro
No. 3 in G flat major. Andante
No. 4 in A flat major. Allegretto

Impromptus, Op. 142 / D 935 (1827)
No. 1 in F minor. Allegro moderato
No. 2 in A flat major. Allegretto
No. 3 in B flat major. Andante
No. 4 in F minor. Allegro scherzando

Murray Perahia – Piano

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FDP

9 comments / Add your comment below

  1. Muito obrigado por destacar esta versão particular do Impromptus Schubert. Comprei sua segunda gravação das mesmas obras e descobri que não podiam comparar com essas gravações. ESTE É O MEU DISCO NÚMERO UM Ilha Deserta!
    Ao ouvir essas leituras maravilhosas de cada improviso, sinto toda a gama de emoções humanas, da alegria ao desespero. ALTAMENTE RECOMENDADO ♥♥♥♥♥

  2. Os Impromptus do ‘Magoo’ austríaco são dignos do texto. Cidade do interior do país e capital; deixa à imaginação deste que comenta, desde Lisboa, uma quase telenovela brasileira. Será nordestino? Gaúcho? Mineiro?
    Tenho essa música pela minha compatriota Maria João Pires que, creio, não é má de todo. Mas vou ouvir esta versão e tentar imaginar que oiço a “sua cassette” – que saudades! Obrigado

    1. Conheço bem a gravação da Maria João Pires, também a tenho há bastante tempo. Como não poderia deixar de ser, sua conterrânea fez uma belíssima leitura. Como o PQPBach falou abaixo, moro no sul do país, assim como ele, vivi bastante tempo na capital, mas já há algum tempo vivo no interior do estado de Santa Catarina.

  3. Verti lágrimas ao ler a cena com a mãe! Eu, que nasci em 70 no interiorzāo do Goiás, só fui conhecer música clássica quando vim para Uberlândia/MG para a universidade.

  4. A Barsa também foi minha companheira, a minha primeira janela para o mundo. A geração de hoje tem extrema abundância de tudo e não faz a mínima idéia de como era difícil ter acesso a música de concerto até poucas décadas atrás.

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