In Memoriam Arthur Moreira Lima – Coleção Meu Piano/Três Séculos de Música para Piano – Parte 3 de 11: Volumes 5, 18 & 37 (Villa-Lobos I/Villa-Lobos & Radamés Gnattali/Villa-Lobos III)


Para honrar a memória e celebrar o legado extraordinário de Arthur Moreira Lima, um dos maiores brasileiros de todos os tempos, publicaremos a integral da coleção Meu Piano/Três Séculos de Música para Piano – seu testamento musical – de 16 de julho, seu 85° aniversário, até 30 de outubro de 2025, primeiro aniversário de seu falecimento. Esta é a terceira das onze partes de nossa eulogia ao gigante.


Partes:   I   |   II   |   III   |   IV   |   V   |   VI   |   VII   |   VIII   |   IX   |   X   |   XI

Ainda que desembarcasse em Paris com 18 anos, Arthur buscava em Lutécia resolver sua adolescência musical. Idos eram seus tempos de menino-prodígio, e longínqua lhe parecia ainda a perspectiva de viver de Arte. Ademais, deixara para trás o renome que tinha em seu país, imenso, esparso, periférico, para adentrar anônimo uma Meca cultural em que qualquer pedra que se levantasse do calçamento revelaria um punhado de artistas aspirantes – aos quais, agora, se somaria ele próprio. E aquele formigueiro artístico, percebia-se, já vestira roupas melhores: com a Revolução Argelina de vento em popa, a Quarta República ruía, e o vasto império colonial francês colapsava enquanto secavam seus cofres nutridos por riquezas sanguinolentas. Mesmo assim, a turbulenta Paris oferecia um cardápio vasto ao mocetão sedento de experiências que, com o idioma afiado pelos muitos anos no Liceu Francês, logo se jogaria de corpo inteiro ao seu desporto favorito: conversar sobre tudo e com todos, como um dos mais virtuosos paus-de-enchente que seu planeta viria a conhecer.

Tão animada era a entrega de Arthur à hedonia que seria fácil esquecer o piano. Quem garantiu que o esquecimento ficasse por ali mesmo, no futuro do pretérito, foi a responsável pela importação de Monsieur Le Bâton d’Inondation: Madame Marguerite Long. A mestra, sempre muito exigente, não demorou a corroborar a ótima impressão que tivera dele no Concurso Internacional do Rio e, sobretudo, a solidez da formação que tivera sob Lúcia Branco. O jovem boêmio manteve-se na linha, expandiu seu repertório – para antes e para muito além das obras do Alto Romantismo que eram cada vez mais seus xodós – e, só para variar, agregou mais alguns diplomas à coleção que, com folga, o tornaria o mais laureado pianista brasileiro: o primeiro prêmio da Academia Marguerite Long e a menção honrosa no Concurso Internacional Marguerite Long-Jacques Thibaud.

Depois do biênio na França, a volta ao Rio não poderia ter sido mais anticlimática. Afora aqueles que morriam de saudades, não houve comoção alguma com a sua chegada. Sentia-se um João-Ninguém, tocando para a indiferença, um pinto oprimido no ovo que era o circuito da música de concerto em seu país. Logo ficou claro que sua bússola teria que, novamente, apontar para o Exterior. Arthurzinho, o Concurseiro Virtuoso, buscou uma vez mais catapultar-se através de triunfos e, claro, conseguiu: o terceiro lugar na nova edição do Concurso Internacional do Rio de Janeiro rendeu-lhe uma viagem aos Estados Unidos. Participou do Primeiro Concurso Internacional Van Cliburn no Texas, e, ainda mais importante, conheceu seu jovem patrono, então o mais célebre pianista do planeta, ainda a surfar o tsunami de sua vitória da edição de estreia do Concurso Tchaikovsky em Moscou. Cliburn, impressionado com o Chopin que saía das mãos-sósias de Arthur, apresentou-lhe sua própria mestra, a russa Rosina Lhévinne, que o convidou a estudar por dois anos na Juilliard School, em Nova York. Nosso herói, sempre disposto a profundos mergulhos de cabeça, queria beber direto da fonte: a estudar com uma russa no Novo Mundo, preferiu a própria Escola Russa de piano, in loco. Assim, e muito estimulado por Cliburn, reuniu rapidamente um rol notável de recomendações – de professores do Conservatório de Moscou, que conhecera em concursos mundo afora, até Luís Carlos Prestes, com quem seu tio Lourenço lutara nos dois anos da Coluna Invicta – e as enviou à então Capital de Todas as Rússias. O telegrama de resposta o encheu de alegria: o Ministério da Cultura da União Soviética concedera-lhe uma bolsa de cinco anos para, sob Rudolf Kehrer, estudar no Conservatório Tchaikovsky e, de quebra,  charlar em inda outro idioma pelo maior país do planeta.

ooOoo

Falar de Villa-Lobos neste blogue carrega sempre a frustração de não compartilhar Villa-Lobos, pelos curtos e grossos motivos apontados aqui. Compensaremos essas clareiras com fontes alternativas das mesmas gravações nas plataformas de transmissão, enquanto esperamos – em chamas – pelo glorioso 1° de janeiro de 2030, quando por aqui retumbará um VILLA-LOBAÇO tamanho que será ouvido até lá nas Esferas de onde Heitor ora nos olha.

Oremos.


ARTHUR MOREIRA LIMA – MEU PIANO/TRÊS SÉCULOS DE MÚSICA PARA PIANO
Coleção publicada pela Editora Caras entre 1998-99, em 41 volumes
Idealizada por Arthur Moreira Lima
Direção artística de Arthur Moreira Lima e Rosana Martins Moreira Lima


Volume 5: VILLA-LOBOS I

Heitor VILLA-LOBOS (1887-1959)

Dezesseis Cirandas para piano, W220
1 – Therezinha de Jesus
2 – A Condessa
3 – Senhora Dona Sancha
4 – O Cravo brigou com a Rosa
5 – Cobra-Cega (Toada da Rede)
6 – Passa, Passa, Gavião
7 – Xô, Xô, Passarinho
8 – Vamos Atrás da Serra, Calunga
9 – Fui no Itororó
10 – O Pintor de Cannahy
11 – Nesta Rua, nesta Rua
12 – Olha o Passarinho, Dominé
13 – À Procura de uma Agulha
14 – A Canoa Virou
15 – Que Lindos Olhos
16 – Có, Có, Có

Bachianas Brasileiras no. 4, para piano, W264
17 – Prelúdio (Introdução)
18 – Coral (Canto do Sertão)
19 – Ária (Cantiga)
20 – Dança (Miudinho)

Arthur Moreira Lima, piano

Gravação: Master Studios, Rio de Janeiro, 1988
Produção: João Pedro Borges e Carlos E. de Andrade (Carlão)
Engenheiro de som: Denílson Campos.
Coordenação de produção: Manuel Luiz da Silva
Remasterização digital: Rosana Martins Moreira Lima, na Cia. de Áudio, São Paulo (1995)

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Volume 18: VILLA-LOBOS & RADAMÉS GNATTALI

Heitor VILLA-LOBOS

Concerto no. 1 para piano e orquestra, W453
1 – Allegro/Allegro
2 – Andante
3 – Allegro non troppo

Arthur Moreira Lima, piano
Orquestra Sinfônica da Rádio de Moscou
Vladimir Fedoseyev, regência

Gravado no estúdio central da Rádio de Moscou, União Soviética, 1974

Noel de Medeiros ROSA (1910-1937)
Arranjos para piano de Radamés Gnattali (1906-1988)

4 – Feitiço da Vila (em parceria com Osvaldo Gogliano, o Vadico)
5 – Último Desejo/Três Apitos
6 – Fita Amarela/Silêncio de um Minuto
7 – De Babado Sim (parceria com João Mina)/Até Amanhã

Arthur Moreira Lima, piano

Radamés GNATTALI (1906-1988)

Concerto para Noel Rosa, para piano e orquestra
8 – As Pastorinhas (sobre um tema de Noel Rosa e João de Barro)
9 – Em Feitio de Oração  (sobre um tema de Noel Rosa e Vadico)
10 – Conversa de Botequim (sobre um tema de Noel Rosa e Vadico)

Arthur Moreira Lima, piano
Radamés Gnattali, regência

Gravação: Estúdios Vice-Versa, São Paulo, 1978.
Produção: Marcus Vinícius
Engenheiros de som: Renato Viola e Wilson Gonçalves
Coordenação: Manuel Luiz da Silva

Remasterização digital: Rosana Martins Moreira Lima e Peter Nicholls, Londres, 1998.

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE (sem/without Villa-Lobos)


Volume 37: VILLA-LOBOS III

Heitor VILLA-LOBOS

A Prole do Bebê nº 1, W140
1 – Branquinha (A Boneca de Louça)
2 – Moreninha (A Boneca de Massa)
3 – Caboclinha (A Boneca de Barro)
4 – Mulatinha (A Boneca de Borracha)
5 – Negrinha (A Boneca de Pau)
6 – Pobrezinha (A Boneca de Trapo)
7 – O Polichinelo
8 – Bruxa (A Boneca de Pano)

Ciclo Brasileiro, para piano, W374
9 – Plantio do Caboclo
10 – Impressões Seresteiras
11 – Festa no Sertão
12 – Dança do Índio Branco
13 – Chôros No.5, “Alma Brasileira”, para piano, W207

14 – Rudepoêma, para piano, W184

Arthur Moreira Lima, piano

Gravação: Master Studios, Rio de Janeiro, 1988
Produção: João Pedro Borges e Carlos E. de Andrade (Carlão)
Engenheiro de som: Denílson Campos.
Coordenação de produção: Manuel Luiz da Silva
Remasterização digital: Rosana Martins Moreira Lima, na Cia. de Áudio, São Paulo (1995).

BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Até que irrompa a alvorada do VILLA-LOBAÇO de 1° de janeiro de 2030, as sensacionais leituras de Arthur estarão legalmente disponíveis nas seguintes (e em outras) plataformas, rendendo aos responsáveis a bagatela de  (assim estimamos) 0,0000000001 centavo por audição. Vamos torná-los ricos? 


Heitor Villa-Lobos por Arthur Moreira Lima – Cirandas

16 Cirandas para piano

 

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Heitor Villa-Lobos por Arthur Moreira Lima
Rudepoema – A Prole do Bebê no. 1

Rudepoema
New York Skyline
A Lenda do Caboclo
A Prole do Bebê no. 1
Choros no. 5, “Alma Brasileira”

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Heitor Villa-Lobos por Arthur Moreira Lima
Bachianas Brasileiras no. 4 – Ciclo Brasileiro

Bachianas Brasileiras no. 4
Tristorosa (Valsa)
Ciclo Brasileiro
Valsa da Dor

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Como a gravação do Concerto no. 1 de Villa não está nas plataformas, a cornucópia do Instituto Piano Brasileiro veio, como sempre, em nosso socorro:

Digna de nota é a capa da edição soviética dessa gravação, em que se vê que a orquestra, listada modestamente em português como “Sinfônica da Rádio de Moscou”, era em verdade a GRANDE ORQUESTRA SINFÔNICA DA RÁDIO DE TODA A UNIÃO – pelo menos em nome, um Leviatã capaz de encarar as insanas dificuldades da partitura de Villa.


Já que recorremos à cornucópia do IPB, aproveitei para colher dela três outros lindos pomos com a música de Villa:


Esse álbum lançado somente no Japão em 1977 é um dos melhores na imensa discografia de Arthur. Certamente ciente da qualidade maravilhosa do som, ele parece aproveitar a oportunidade para saborear até os últimos harmônicos de cada nota. A Valsa da Dor tem, aqui, minha interpretação favorita em todos os tempos.

 

As incursões búlgaras de Arthur, que renderam as gravações da integral de Chopin para piano e orquestra, também nos deixaram esse álbum com peças brasileiras em que Villa predomina. Digno de nota o heroísmo do tradutor búlgaro, que transformou “Apanhei-te, Cavaquinho” em “Tenho tempo pra ti, Ukulele”.

E não sabemos se Arthur foi visto dormindo em Sofia, pois é impressionante que, além de todo resto, tenha também tido tempo para dar esse recital mastodôntico (um costume que criou na União Soviética, como veremos em breve).


BÔNUS: como compensação por nada podermos postar de Heitor, o Proibidão, ofereceremos algo da mestra francesa de Arthur. Muito próxima de Ravel, Marguerite Long foi honrada com o convite para ser a solista da première do Concerto em Sol, em 1932, sob a batuta do compositor. A primeira gravação da obra, que apresentaremos a seguir, aconteceria algumas semanas depois, com o português Freitas Branco no pódio e o compositor a supervisionar dos bastidores (e não regendo, a despeito de muitas afirmações em contrário, inclusive da capa do álbum). Inclusas, também, a regravação que Long fez do Concerto em 1952, alguns anos antes de conhecer Arthur, e a primeira gravação do Concerto no. 1 de Milhaud, com a regência do próprio.

Joseph Maurice RAVEL (1875-1937)

Concerto em Sol maior para piano e orquestra, M. 83
1 – Allegramente
2 – Adagio assai
3 – Presto

Marguerite Long, piano
Pedro de Freitas Branco, regência

Gravado em Paris em 1932, sob supervisão do compositor

Darius MILHAUD (1892-1974)

Concerto para piano e orquestra no. 1, Op. 127
4 – Très vif
5 – Mouvement de Barcarolle
6 – Final (Animé)

Marguerite Long, piano
Darius Milhaud, regência

Gravado em Paris em 1935

Maurice RAVEL

Concerto em Sol maior para piano e orquestra, M. 83
7 – Allegramente
8 – Adagio assai
9 – Presto

Marguerite Long, piano
Orchestre de la Société des Concerts du Conservatoire
Georges Tzipine,
regência

Gravado em Paris, 1952

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Terceira parte do podcast “Conversa de Pianista”, com as entrevistas que Alexandre Dias conduziu com Arthur em 2020. Nessa parte, “ele falou sobre sua ida em 1963 para a cidade de Moscou, e como foi sua experiência na União Soviética em plena Guerra Fria, tanto suas vantagens como desvantagens. Comentou sobre as matérias que cursou no Conservatório Tchaikovsky, e suas aulas de piano com o professor Rudolf Kehrer. Falou sobre a necessidade de um pianista ter uma formação humanista, interessando-se por várias áreas do conhecimento – neste contexto, falou sobre como os russos valorizam muito a cultura. Relembrou nomes de gigantes do piano russo, como Heinrich Neuhaus, Emil Gilels e Sviatoslav Richter, alguns dos quais ele chegou a assistir em concertos. Depois, falou sobre sua preparação para participar do Concurso Chopin de 1965, no qual viria a ficar em 2º lugar, tornando-se favorito do público e obtendo fama mundial, e detalhou o repertório que estudou, e a rotina intensa de estudos a que se submeteu, com grande antecedência. Também relembrou como foi a experiência no concurso em si, em que conheceu Martha Argerich, e onde também encontrou Magda Tagliaferro, como membro do júri. Por fim, mencionou vários países em que realizou gravações nesta época, e que ainda não foram encontradas”.

Em homenagem a Fluminense Moreira Lima, seguimos com o álbum de figurinhas dos campeões da Copa Rio de 1952. Eis o zagueirão João Carlos Batista Pinheiro, o Pinheiro (1932-2011), que formou com o goleiro Castilho e o capitão Píndaro a “Santíssima Trindade” da defesa tricolor.

Vassily

3 comments / Add your comment below

  1. Vassily, uma pena o bloqueio ao Villa! Estou acompanhando atento aqui a série do Moreira Lima e fazendo a coleção. Mesmo os arquivos ficando no OneDrive eles derrubam a postagem?

    1. Pelo que eu saiba eles já tentaram derrubar o blog mesmo, as obras do Villa ainda tem direitos autorais, não estão em domínio público como outros compositores mais antigos

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