I
Grand Théâtre de Genève, Suíça, década de 90
Antonio Meneses [em inglês]: Oi! Para quem é o autógrafo?
Vassily Genrikhovich [em português]: Olá, Antonio! É para [o nome do impostor que está em meu RG], por favor.
AM: Rapaz, eu nunca diria que você é brasileiro! [sorri enquanto autografa o CD do Don Quixote com os filarmônicos de Berlim sob Karajan]
VG: Às vezes até eu tenho dúvidas.
AM [em inglês, dirigindo-se à então esposa, a pianista filipina Cecile Licad, que o acompanhara no recital]: Eu achei que ele era filipino.
Cecile Licad [interessadíssima, em tagalog]: Você é pinoy? [termo tagalog para “filipino”]
VG [em inglês, porque fala lhufas de tagalog] Sou brasileiro.
CL [sem mais qualquer interesse no semblante]: …
AM [em português, rindo]: Acho que ela não gosta de brasileiros [devolvendo-me o CD autografado] Ainda bem que ela me abriu uma exceção…
II
Philharmonie de Colônia, Alemanha, primeira década do século XXI
VG [em português]: Olá, Antonio! Para [o nome do impostor, novamente], por favor.
AM [sorrindo]: Brasileiro tem todas as caras, mesmo! [autografa o programa, em que tocara o primeiro concerto de Haydn]
VG: Há uns dez anos, em Genebra, você achou que eu fosse filipino.
AM: É mesmo? Hoje eu diria que você é japonês!
VG [rindo]: Fui rebaixado?
AM [com um sorriso maroto]: Foi promovido!
[a ficha só cairia depois do Google me contar que Antonio, divorciado de Cecile, se casara com a japonesa Satoko]
III
Sala São Paulo, exatamente cinco 3-de-agostos antes deste último e tão triste 3 de agosto
AM: Oi!
VG: Olá, Antonio! Sou [nome do impostor, uma vez mais].
AM [autografando o programa do concerto da Osesp com a estreia mundial do Concerto para violoncelo de Marlos Nobre, dedicado a ele próprio]: Gostou do concerto?
VG: Adorei!
AM: O Marlos não teve pena de mim, não.
VG: Sou seu fã há décadas, desde que ouvi seu Don Quixote com Karajan.
AM: Que bacana! Obrigado por vir!
VG: Fico imaginando o que era tocar com Karajan.
AM: Karajan era tranquilo. Mas o…
VG: ?
AM [gargalhando e devolvendo o programa autografado]: Deixa quieto…
Não conseguirei escrever seu obituário. Partiu cedo demais e com muito ainda a oferecer ao Som. E, porque eu o sinto vivo, farei com que ele viva também entre os leitores-ouvintes através das três gravações que nos deixou das eudaimônicas suítes do Demiurgo da Música, cada uma delas mais ou menos contemporânea das breves janelas que se me abriram para ele e que me deram a medida da falta que o virtuose da Música e das panelas, professor zeloso e querido amigo fará aos que lhe foram próximos.
Em memória de Antonio Meneses Neto (23 de agosto de 1957, Recife – Basileia, 3 de agosto de 2024).
Johann Sebastian BACH (1685-1750)
Suítes para violoncelo solo, BWV 1007-1012
No. 1 em Sol maior, BWV 1007
Prélude
Allemande
Courante
Sarabande
Menuets I & II
Gigue
No. 2 em Ré menor, BWV 1008
Prélude
Allemande
Courante
Sarabande
Menuets I & II
Gigue
No. 3 em Dó maior, BWV 1009
Prélude
Allemande
Courante
Sarabande
Bourrées I & II
Gigue
No. 4 em Mi bemol maior, BWV 1010
Prélude
Allemande
Courante
Sarabande
Bourrées I & II
Gigue
No. 5 em Dó menor, BWV 1011
Prélude
Allemande
Courante
Sarabande
Gavottes I & II
Gigue
No. 6 em Ré maior, BWV 1012
Prélude
Allemande
Courante
Sarabande
Gavottes I & II
Gigue
Antonio Meneses, violoncelo
Gravado na Sala Casals em Tokyo, Japão,
de 14 a 16 de outubro e em 18 e 19 de dezembro de 1993.
Lançado em 25 de abril de 1994 pelo selo Philips, somente no mercado japonês.
Gravado na Igreja Saint Martin, East Woodhay, Hampshire, Reino Unido, de 2 a 5 de junho de 2004.
Lançada em 2004 pelo selo Avie.
Gravado no Estúdio Arsis de São Paulo (SP) em 2023.
Lançado em 15 de dezembro de 2023 – seu canto do cisne discográfico – pelo selo Azul.
Recomendo fortemente que, ao ouvirem estas gravações, escutem também as seis primeiras faixas do álbum a seguir, que servem como preâmbulos às Suítes do Maior de Todos:
Do saudoso Antonio vocês já me viram postar aqui:
Richard Strauss (1864-1949) – Don Quixote – Till Eulenspiegel – Meneses – Karajan
Vassily
Lindo post !!! Muito obrigado por isto!
Caro amigo “pinoy “, muito boa tarde!
Que post-homenagem maravilhoso.
Agora tenho três versões para apreciar e tentar encontrar nuances de interpretação destas obras-primas, executadas pelo gigante AM.
Forte abraço daqui do interior caipira de SP.