Tem uma história curiosa esta obra que está entre as mais importantes de meu pai, Johann Sebastian Bach. Porém, antes dela, um detalhe pessoal: tenho sete gravações da Oferenda Musical. Fico um pouco desconcertado pelo fato de que as três melhores estejam em discos de vinil. Não ouvi ninguém executar melhor esta obra do que Hermann Scherchen em 1964 ou Karl Münchinger em 1976 ou o Musica Antiqua de Köln nos anos 70 ou 80. Não obstante, a gravação que apresento aqui para vocês é bastante boa. Vamos às muitas curiosidades da obra. O texto abaixo foi retirado da Wikipedia. Fiz alguns cortes e pequenas correções.
O Tema do Rei
A coleção tem sua origem num encontro entre Bach e Frederico II em 7 de Maio de 1747. O encontro, que se deu na residência do rei em Potsdam, foi conseqüência do filho de Bach, Carl Philipp Emanuel Bach estar ali trabalhando como músico da corte. Frederico queria mostrar a Bach uma novidade. O pianoforte foi inventado uns poucos anos antes e o rei possuia esse instrumento experimetal, alegadamente o primeiro que Bach viu. Bach, que era bem conhecido por seu talento na arte da improvisação, recebeu um tema, o Thema Regium (“tema do rei”), para improvisar uma fuga.
Ao que parece, a proposta de Frederico, na realidade era para humilhar o velho Bach, pois o tema fornecido fora construído de tal forma que imaginava-se impossível aplicar a ele as regras da polifonia. Inicialmente Frederico ordenou que Bach improvisasse sobre o tema uma fuga a três vozes, o que para espanto do Rei e admiração de todos os presentes Bach fez de imediato. Insatisfeito, o Rei mandou que ele, desta feita, improvisasse uma fuga a seis vozes, uma tarefa considerada impossível por todos, inclusive os os músicos do Rei, os melhores e os mais competentes da época. Bach, que então contava com 62 anos, e que mal chegara de viagem e fora convocado ao palácio sem ter tido tempo de descansar, se desculpou alegando exaustão da viagem, e em 15 dias mandou para o Rei -impressa – sua resposta ao desafio na forma da Oferenda Musical.
Que Bach entendeu o objetivo escuso por trás da proposta do Rei é mais ou menos evidente (embora não possa ser provado) pelo nome que ele deu ao conjunto de peças, já que em alemão Opfer não significa apenas Oferenda, mas também pode significar uma oferta de uma vítima em sacrifício.
Estrutura, instrumentação
Na sua forma final, A Oferenda Musical compreende:
– Dois ricercares escritos em tantas pautas quanto o número de vozes:
– um ricercar a 6 (fuga a seis vozes)
– um ricercar a 3 (fuga a três vozes)
Dez cânones:
– Canones diversi super Thema Regium:
– 2 Cânones a 2
– Cânone a 2, per motum contrarium
– Cânone a 2, per augmentationem, contrario motu
– Cânone a 2, per tonos
– Cânone perpetuus
– Fuga canônica
– Cânone a 2 Quaerendo invenietis
– Cânone a 4
– Cânone perpetuus, contrario motu
Sonata sopr’il Soggetto Reale – uma sonata trio em quatro movimentos, para flauta, um instrumento que Frederico tocava:
– Largo
– Allegro
– Andante
– Allegro
Além da sonata trio, escrita para flauta, violino e baixo contínuo, as demais peças não têm indicações sobre a instrumentação a ser utilizada.
Os ricercares e os cânones têm sido executados de diversas maneiras. Os ricercari são, com
freqüência, executados ao teclado. Um conjunto de músicos de câmara, alternando os grupos de instrumentos e utilizando uma instrumentação semelhante à da sonata trio comumente interpreta os cânones. Mas também existem gravações com um ou mais instrumentos de tecla (piano, cravo) e instrumentações maiores, como uma orquestra.
Como a versão impressa dá a impressão de ser organizada para diminuir o número de “viradas” de página, a ordem das peças pretendida por Bach (se alguma ordem era pretendida) é incerta embora seja costume iniciar a obra com o Ricercare a 3 e tocar a sonata trio no final. Comumente se interpretam juntos os Canones super Thema Regium.
Enigmas
Alguns dos cânones da Oferenda Musical são representados na partitura original por não mais do que pequena melodia monódica com alguns compassos, junto com uma uma inscrição enigmática, em Latim, colocada acima da melodia. Estes trechos são normalmente chamados de ‘fugas-enigma’ (algumas vezes, de maneira mais apropriada, chamadas de cânones-enigma). Esperava-se que, resolvendo os enigmas, os executantes interpretassem a música como uma obra com várias partes (uma obra com várias melodias entrelaçadas). Tem sido argumentado que alguns destes enigmas têm mais de uma solução possível, embora atualmente, a maioria das edições impressas da partitura apresentem apenas uma solução mais ou menos “padronizada”, de modo que os intérpretes podem executar a obra sem se preocupar com o latim ou com o enigma.
Um dos cânones-enigma, in augmentationem, isto é, com o tamanho (a duração) das notas aumentada, tem a inscrição: Notulis crescentibus crescat Fortuna Regis (possa a fortuna do rei aumentar como o tamanho das notas), enquanto que um cânone modulante que termina num tom maior do que o tom em que começou, tem a inscrição: Ascendenteque Modulationis ascendat Gloria Regis (que a glória do rei aumente como uma modulação ascendente).
Como foi recebida
Sabe-se pouco a respeito da reação de Frederico com relação à partitura a ele dedicada, se ele tentou resolver os enigmas ou se ele tocou a parte da flauta da sonata trio. Frederico era conhecido por não gostar de música complicada e logo depois da visita de Bach ele entrou numa campanha militar, portanto é possível que o presente não tenha sido bem recebido.
Adaptações e citações do século XX
Arranjos: O “Ricercar a 6” sofreu diversos arranjos, tendo sido Anton Webern o seu arranjador mais importante, o qual, em 1935, escreveu uma versão para pequena orquestra notável por seu estilo Klangfarbenmelodie, isto é, linhas melódicas que passam de um instrumento para outro depois de um pequeno número de notas, cada nota recebendo a “coloração tonal” do instrumento em que é executada:
Sofia Gubaidulina mais tarde utilizou o Tema Real da Oferenda Musical em seu concerto para violino Ofertorium. Orquestrado conforme um arranjo semelhante ao de Webern, o tema é desconstruído nota a nota através de uma série de variações, e é reconstruído na forma de um hino da Igreja Ortodoxa Russa.
Bart Berman compôs três novos cânones baseados no Tema Real, que foram publicados em 1978 como um suplemento especial de feriado do jornal musical holandês Mens en Melodie (publicado por Elsevier).
J.S. Bach (1685-1750): A Oferenda Musical, BWV 1079 (Capella Istropolitana, Benda)
1 Ricercar a 3 05:33
2 Canon perpetuus super Thema Regium 01:19
3 Canon 2. a 2 Violini in unisono 00:47
4 Canon 3. a 2 per Motum contrarium 01:08
5 Canon 4. a 2 per Augmentationem, contrario Motu 03:04
6 Canon 5. a 2: Canon circularis per Tonos 02:54
7 Sonata sopra il Soggetto Reale: Largo 07:23
8 Sonata sopra il Soggetto Reale: Allegro 06:08
9 Sonata sopra il Soggetto Reale: Andante 03:25
10 Sonata sopra ill Soggetto Reale: Allegro 03:03
11 Canon a 4 06:20
12 Fuga canonica in Epidiapente 01:58
13 Canon a 2 Quaerendo invenietis: I 01:43
14 Canon a 2 Quaerendo invenietis: II 01:11
15 Canon a 2 Quaerendo invenietis: III 01:10
16 Canon a 2 Quaerendo invenietis: IV 01:37
17 Canon 1. a 2: Canon cancrizans 00:50
18 Canon perpetuus a Flauto traverso, Violino e Basso continuo 02:28
19 Ricercar a 6 07:11
Christian Benda, cello
Sebastian Benda, harpsichord
Nils Thilo Kramer, flute
Ariane Pfister, violin
Capella Istropolitana, conducted by Christian Benda
Total Playing Time: 59:14
PQP
Saudações agradecidas, em primeiro lugar, ao generoso P.Q.P., pelo nobre trabalho Robiniano (tirar dos ricos para distribuir entre os pobres) realizado através deste blogue. Ainda que não seja exatamente um adepto da pirataria, volta e meio não resisto e baixo alguns arquivos.A Oferenda foi um destes. A obra me interessa sobremaneira, já que estou envolvido na preparação da primeira audição porto-alegrense (!) com instrumentos históricos. Um questão: de onde saiu essa teoria da conspiração/humilhação real? Nunca vi referência a isso em nenhum lugar, e, por tudo que já li nos tratados da época, e de relatos sobre Frederico, não creio que essa especulação lhe faça justiça. Bach, ao contrário do que nos fez crer o folclore romântico (com seu mito do gênio incompreendido), era tremendamente respeitado entre os músicos e conhecedores de seu tempo (ainda que muitos, inclusive seus filhos, divergissem em questões de GOSTO). Uma coisa é humilhar, outra, bem diferente, é propor um desafio aparentemente impossível à maior autoridade viva no assunto, e ver o que acontece. Frederico tocava bem (há relatos confiáveis),compunha, mantinha alguns dos maiores músicos de seu tempo à sua volta, e tinha reputação de justo e sensível. Eu não lhe atribuiria tal pequenez.
Prezado tio, você não deve saber, mas quando seu irmão, C.P.E.Bach trabalhava na corte de Frederico em Potsdam, conheceu no palácio de Sansussi (recém construido) uma dama da corte com a qual teve um tórrido e rápido relacionamento. Após meu nascimento fui acolhido por pastores anabatistas, que só recentemente revelaram minha origem. Vem daí minha afeição pelo trabalho dos nossos ancestrais. Parabéns pelo blog, e não deixe de ler, sobre o episódio do encontro entre Bach e Frederico, o livro “Uma noite no palácio da razão” da editora Record.
Salve, P.Q.P, parabéns pelo blogue.
A propósito, assisti ontem (29mar2009) à apresentação da Oferenda Musical (BWV 1079) na sala do coro da Sala São Paulo. Infelizmente, faça-se justiça, foi apresentação das mais pífias, onde o ouvinte atento pôde notar imediatamente as seguintes deficiências: pouco ensaio, pouca familiaridade com o fraseado, a ornamentação e a dinâmica barrocas, ausência de direção musical, flutuação da afinação e não raro tempos desencontrados nas fugas. Na se trata aqui de interpretação, que os músicos estavam evidentemente aquém dessa etapa. É muito triste ver que poucos músicos brasileiros, apesar de sua proficiência, estejam aptos a executar Bach e a música barroca em geral. Gostaria de saber se alguém mais teve essa impressão.
Olá pessoal,
O link para este download encontra-se quebrado. Se puderem, favor consertar.
Muito obrigado!!!
Estou aqui matutando com meus botões sobre o último download que fiz, com a interpretação das Sonatas e Partitas de Bach com a Mullova, em relação àquela da Hillary Hahn. Não entendo muito de música, algumas poucas leituras só e também textos de cada postagem do PQP, FDP e da Clara e estou empacando em formular um juízo de valor entre elas.
Obrigado pelo trabalho que fazem!
O arquivo não existe mais! seria possível upar novamente?
Salve! Blog surrealmente espetacular! Dessacralizador! Acompanho-o com espaçamentos desde muito tempo!
Adquiri há perto de quinze anos um livro que, imagino, é capital para quem quer refletir sobre muitas coisas, inclusive sobre música, idiomas, matemática e lógica. O nome é “Gödel, Escher, Bach, um Entrelaçamento de Gênios Brilhantes”, e traça uma trama que liga Alice, a das Maravilhas, em seus mergulhos dimensionais, à obra impressionante de Escher, com algumas de suas gravuras contradimensionais, agrupando com a teoria da indecidibilidade de Gödel,por exemplo, à Oferenda Musical, de Johann Sebastian Bach. Trata-se de um esforço hercúleo, de um assombro inacreditável de um filho de prêmio Nobel que, com tal obra, ganhou o prêmio Pulitzer ainda antes dos seus quarenta anos.
É um livro bem difícil, ainda estou adquirindo o cabedal necessário e a concentração suficiente para devorá-lo.