Beethoven
Sonata Kreutzer
Schubert
Sonata Arpeggione
Bruno Philippe, violoncelo
Tanguy de Williencourt, piano
A Sonata Kreutzer poderia ter sido chamada Sonata Bridgetower, não fosse uma linda tarde de concertos seguido de grandes comemorações regadas ao bom vinho do Reno em uma famosa taverna nos arredores de Viena onde os ânimos voláteis se tornam facilmente incendiáveis. Bastou um comentário menos airoso feito (infelizmente) pelo violinista inglês sobre uma certa senhorinha que andava a fazer suspirar o inspirado compositor e pianista agora já cidadão vienense. Uma amizade que nascera de admiração profissional seguida de certas identificações pessoais foi pelos ares, por um comentário leviano de um, mas imperdoável para o outro.
A Sonata havia sido composta por Beethoven tendo em mente o violinista virtuose George Bridgetower que visitava Viena nos idos de 1803, ele que crescera ali por perto, na Corte de Esterházy, fora até aluno de Haydn e agora era famoso e se estabelecera em Londres. Nessa visita andava de boas com o Ludovico, tocando seus quartetos e até dando seus pitacos na parte de violino da sonata que juntos tocaram pela primeira vez.
A história é boa e merece ser mais elucidada. George Bridgetower havia sido criança prodígio, filho de mãe alemã e de pai originário de Barbados. O casal se encontrou na Polônia, mas mudou-se posteriormente para a Corte de Esterházy. A combinação de genes era realmente feliz para a música. O filho Joseph tornou-se violoncelista e George aprendeu a tocar o violino desde a mais tenra idade. Aos dez anos já fazia tours pelas cidades europeias e sua ascendências certamente era explorada para atrair ainda maior audiência. Era apresentado como Príncipe Africano e há notícias de ter sido fantasiado com roupas turcas, que na época era algo muito exótico.
Houve até uma dedicação jocosa feita pelo Ludovico: ‘Sonata mulattica composta per il mulato Brischdauer, gran pazzo e compositore mulattico’. A inscrição mostra como os laços entre Ludovico e George eram estreitos.
De qualquer forma, o nome Sonata Kreutzer pegou, mesmo que o tal violinista Kreutzer nunca tenha encarado a obra, que é realmente espevitada. Mas o que temos neste disco não exatamente aquela peça que pode ser ouvida nas interpretações intensas de Jascha Heifetz ou de Isabelle Faust, mas sim um transcrição feita para violoncelo e piano, pelo arranjador (oficial) de Luduvico, o fiel Carl Czerny. O jovem violoncelista Bruno Philippe tem todas as credenciais de virtuose para encarar a empreitada você já conhece de outra postagem, com as Suítes para Violoncelo de Bach.
Depois desse embate, piano e violoncelo, as peças de Schubert se sobressaem pelo lirismo e beleza encantadora. Arpeggione é o nome de um instrumento – uma guitarra tocada com arco – criação de um lutier vienense, que caiu rapidamente em esquecimento, mas não sem antes inspirar Schubert a compor a Sonata, em 1824. A Sonata renasceu, publicada em 1871 e caiu nas graças de violoncelistas e violistas de bom gosto. Há inúmeras gravações espetaculares disponíveis: Rostropovich/Britten, Maisky/Argerich e entre as gerações mais novas, Queyras/Tharaud, Capuçon/Braley, sem esquecer a prata da casa: Antonio Meneses…
Para completar esse lindo disco os jovens intrépidos intérpretes Bruno Philippe e Tanguy de Williencourt apresentam as transcrições de três Lieder (canções) de Schubert. Duas delas, Nacht und Träume e Der Jüngling und der Tod fazem a transição entre a Kreutzer e a Arpeggione. Fechando o cortejo a transcrição de uma das mais lindas canções da coleção Schwanengesang, Ständchen (Serenata).
Ludwig van Beethoven (1770 – 1827)
Sonata para violino e piano No. 9 ‘À Kreutzer’, op. 47, em lá maior
transcrição para violoncelo e piano por Carl Czerny (1791 – 1857)
- Adagio sostenuto – Presto
- Andante con variazioni
- Finale – Presto
Franz Schubert (1797 – 1828)
Nacht und Träume, D. 827
- transcrição para violoncelo e piano
Der Jüngling und der Tod, D. 545
- transcrição para violoncelo e piano
Sonata para arpeggione e piano, D821, em lá menor
- Allegro moderato
- Adagio
- Allegretto
Ständchen, D. 889
- transcrição para violocelo e piano
Bruno Philippe, violoncelo
Tanguy de Williencourt, piano
Faixa extra: Ständchen, D. 889
Roderick Williams, barítono
Iain Burnside, piano
BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE
FLAC | 353 MB
BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE
MP3 | 320 KBPS | 196 MB
O disco já é ‘velho’, de 2017, e Bruno Philippe já apareceu por aqui em produção mais recente, mas aposto que você não vai reclamar, se ouvir atentamente…
Aproveite!
René Denon
Caro René,
Sempre que possível, tento não “queimar a largada” e aguardo a publicação das gravações, em vez de escutá-las enquanto estão no prelo. Esperava o sublime desse álbum – e não perdi por esperar. Por fim, a “Ständchen” de Schubert atingiu-me em cheio, inda mais acompanhada de lembranças daquele amigo querido que o mundo recentemente perdeu.
Grato por mais essa!
Querido amigo Vassily!
Como todos, fiquei perplexo com a morte de nosso monge Ranulfus. Tinha como certo algum comentário dele, aqui ou no nosso canal privado, sobre a Sonata mulattica, pois foi dele que primeiro ouvi a história do violinista George Bridgetower.
E a canção do Schubert, que lindeza…
Apesar do baque, pois imaginava que ele fosse fazer mais algumas postagens, sinto que devemos seguir nos esmerando nas postagens, que seja para manter no blog as expectativas desses nossos colegas que agora o leem de alguma outra dimensão…
Forte abraço!
René