Frédéric Chopin (1810-1849): Mazurkas (Cor de Groot) / Variações “Là ci darem la mano”, Op. 2 (Moreira Lima)

A mazurka é um tipo de dança folclórica polonesa de compasso ternário. Nesta gravação das Mazurkas, Cor de Groot utiliza um piano Pleyel, que era a marca preferida por Chopin. Para casa de campo de George Sand em Nohant, por exemplo, foram encomendados dois instrumentos Pleyel: um piano de cauda para Chopin e um piano de armário para Sand e sua filha Solange. Entre os convidados em Nohant estava o pintor Eugène Delacroix, que descreveu em uma carta:

« Par instants, il vous arrive, par la fenêtre ouverte sur le jardin, des bouffées de musique de Chopin, (…) qui se mêlent au chant des rossignols et au parfum des roses. » Auprès de son ami Pierret, Delacroix se félicitait de sa vie de couvent: «Nous attendions Balzac qui n’est pas venu, et je n’en suis pas fâché. C’est un bavard (…). J’ai des tête-à-tête à perte de vue avec Chopin que j’aime beaucoup et qui est homme d’une distinction rare. »

“De vez em quando, pela janela que dá para o jardim, nos chegam sopros de música de Chopin, (…) que se misturam com o canto dos rouxinóis e o perfume das rosas.” Com seu amigo Pierret, Delacroix felicitou-se por seu isolamento: “Estávamos esperando por Balzac que não veio, e não lamento. Ele é um falador (…). Tenho incontáveis encontros a dois com Chopin, de quem gosto muito e que é um homem de rara distinção.”

Frédéric Chopin por Eugène Delacroix

Como vocês sabem, a escritora George Sand teve uma ligação apaixonada e tumultuosa com Chopin por cerca de dez anos. Gosto de imaginar essas mazurkas na casa de George Sand, seja essa casa de campo ou sua casa em Paris, a poucos minutos a pé de Montmartre e do Moulin Rouge (mas o famoso cabaré só abriria em 1889). Com companhias como Delacroix e Balzac… (mas talvez o genial autor das Ilusões Perdidas, viciado em café e fã de Beethoven, não tivesse a calma suficiente para apreciar essas obras.) É nesse tipo de ambiente que as mazurkas de Chopin soam bem, e não em salas de concerto imensas. O que foi dito nesta postagem sobre as obras de Brahms para piano a quatro mãos vale também aqui: o piano Pleyel do século XIX combina perfeitamente com o caráter íntimo das mazurkas, com seu gosto agridoce feito de alegrias suaves e de dores inconfessáveis.

O holandês Cor de Groot (1914-1993) mostra aqui que, entre os charmes das mazurkas, estão os ornamentos: trinados, mordentes e outros tipos de alternância entre notas próximas, que no timbre muito característico do piano Pleyel chegam a lembrar de longe o som dos ornamentos no cravo de Bach ou Scarlatti. É música para se ouvir com amigos, familiares e outras pessoas queridas, não combina com os grandes palcos.

Esses dois discos fazem parte de uma daquelas caixas de vários CDs, neste caso, da gravadora Brilliant Classics, famosa por comprar e relançar gravações de outros selos. Assim, por um desses acasos, as 41 mazurkas gravadas por Cor de Groot (ele não gravou as últimas, op.67 e 68, sabe-se lá por quê) são seguidas por uma obra de juventude de Chopin. As Variações sobre “Là ci darem la mano”, para piano e orquestra (opus 2) foram escritas ainda na Polônia, em 1827, sobre um tema da ópera Don Giovanni de Mozart.

A interpretação dessa obra tão pouco tocada fica a cargo do pianista brasileiro Arthur Moreira Lima e da Orquestra Filarmônica de Sofia, na Bulgária. Enquanto a orquestração é leve e mozartiana, Moreira Lima faz uma leitura intensa, não hesitando em levar ao pé da letra as marcações do compositor como “con forza e prestissimo” ou “risoluto“. Nada poderia ser mais diferente do caráter íntimo, familiar, ao pé do ouvido, das mazurkas por Cor de Groot. Essa escolha da Brilliant Classics de juntar esses dois repertórios é ao mesmo tempo estranha, contraditória e interessante. Após o Chopin sofisticado, tocando para amigos da alta sociedade parisiense como Sand e Delacroix e mais algumas condessas e marquesas, o Chopin jovem virtuose dos palcos – um Chopin raro, pois foram poucas as suas apresentações em grandes teatros, ao contrário de Liszt ou Mozart que tocaram concertos com orquestras até perder a conta.

No diário de Clara Wieck (futura Clara Schumann) em 1831 ela anotou: “As Variações op. 2 de Chopin, que aprendi em oito dias, são a peça mais difícil que já vi ou toquei até agora.” Robert Schumann, seu futuro marido, escreveu, no mesmo ano e sobre a mesma obra: “Tirem os chapéus, cavalheiros: um gênio!”

Frédéric Chopin (1810-1849): Mazurkas quase completas / Variações “Là ci darem la mano”, Op. 2

41 Mazurkas: Op. 6, Op. 7, Op. 17, Op. 24, Op. 30, Op. 33, Op. 41, Op. 50, Op. 56, Op. 59, Op. 63
Cor de Groot – Grand Piano Pleyel 1847

Variations On “La Ci Darem La Mano” From Mozart’s Don Giovanni, In B Flat Major Op. 2 For Piano And Orchestra
Arthur Moreira Lima – Piano; Orquestra Filarmônica de Sofia, Dimitri Manolov

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Piano Pleyel (1843) que Chopin tocava na casa da Condessa Natalia Obreskoff. Entre os pertences da condessa, se encontram manuscritos de duas mazurkas assinados pelo compositor

Outra excelente gravação de Chopin em piano de época: este álbum de Lubimov tocando um piano Erard (1837). E no aniversário de Moreira Lima, não deixem de ouvi-lo nas Valsas de Esquina recém-postadas…

E vamos às curiosidade inúteis das cenas da vida parisiense: assim como o Moulin Rouge, a loja da Pleyel, 20, rue Rochechouart, fica a menos de 15 minutos a pé da casa parisiense de George Sand. Esta casa, aliás, hoje é o “Museu da Vida Romântica” – Musée de la Vie Romantique

Hoje é aniversário de 82 anos de Arthur Moreira Lima. Parabéns!

Pleyel

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