Bach
Suítes Inglesas
Gustav Leonhardt
Da cozinha vem o reconfortante cheiro do arroz sendo refogado ao som do martelinho amaciando os bifes… Ah, trabalhar em casa pode ser uma fonte de pequenos prazeres. Bem, o distante ruído de alguém aparando a grama não chega a incomodar, mas faz um contraponto de alerta, lembrando-me que nem tudo é sossego. Mas, a hora do almoço sempre reserva um intervalo de paz.
Da vitrola vem o som do cravo neste disco espetacular. Ao se dar conta, você está batendo o pé, acompanhando o ritmo, muito bom, do começo ao fim. E o som é ótimo. Eu confesso não ser um fanático pelo som do cravo. Talvez seja trauma por ter conhecido o som deste instrumento pelos velhos LPs da Wanda Landowska, mas assim que vejo ‘cravo’ na capa do disco, fico logo com um pé atrás. Mas em mais uma tentativa de quebrar essas rabugices, decidi revisitar as principais obras de João Sebastião interpretadas ao cravo. Comecei por estas Suítes Inglesas, na interpretação do Gustavo Coração de Leão e me dei muito bem. São gravações antológicas e figuram em muitas listas de mais-mais das obras de Bach. Elas foram objeto de uma postagem feita pelo PQP Bach em priscas eras. Dizem as lendas que naqueles dias os arquivos eram upados pela madrugada, quando o fluxo na internet permitia uma maior velocidade ao processo. Aqui está o texto original que foi ao ar em 21 de julho de 2010.
Confesso a vocês não ser um apaixonado pelas Suítes Inglesas de Bach. Meu pai, ao dar o nome a elas, foi presciente. Ele sabia do deserto de almas compositoras que sobreviria na Inglaterra entre os nomes de Henry Purcell e Benjamin Britten. Foram quase 300 anos de música de terceira linha. Então, reservou para os britânicos suas melodias mais previsíveis. Não obstante minha opinião, conheço pessoas que roubariam e matariam por elas, principalmente quando tocadas por Gustav Leonhardt, um verdadeiro viagra musical, capaz de erguer até um Cou… perin. Erguer Bach é muito mais fácil, não?
Assim, esta postagem conta para a série das PQP Originals!
Apesar das provocações perpetradas aos ingleses pelo nosso blogueiro-mor, Bach não tinha qualquer intenção de oferecer algum conjunto de suítes aos ingleses, assim como não escreveu suítes para os franceses. Tampouco escreveu algum concerto especificamente para os italianos. Apesar do nome bem estabelecido, não foi João Sebastião quem assim alcunhou estas peças. As possibilidades mais plausíveis para este nome – Suítes Inglesas – são para as diferenciar do outro conjunto conhecido por Suítes Francesas ou ainda o fato de o primeiro biógrafo de Bach, Johann Nicolaus Forkel, ter afirmado que as suítes foram ‘fait pour les Anglois’. O certo é que o nome Suítes Inglesas aparece no final do século XVIII em uma de suas cópias que pertencia a Johann Christian Bach, o Bach de Londres.
João Sebastião as chamou ‘Suites avec leurs Préludes’ e isto precisamente as diferencia das chamadas Suítes Francesas. As suítes das duas séries são formadas basicamente por quatro danças – allemande, courante, sarabande e gigue -, sendo que algumas outras danças de estilo francês são inseridas entre a sarabanda e a gigue. Mas no caso das Suítes Inglesas, a sequência recebe um prelúdio. Vamos a um exemplo comparativo. Veja os nomes dos movimentos de duas Suítes:
Suíte Inglesa No. 4 Suíte Francesa No. 5
Prélude
Allemande Allemande
Courante Courante
Sarabande Sarabande
Minueto I – Minueto II – Minueto I Gavotte – Bourrée – Loure
Gigue Gigue
Agora que você já sabe isto tudo, aproveite estas lindíssimas peças na interpretação de um dos melhores músicos de que temos notícia. Leonhardt além de cravista e regente, teve papel fundamental na formação de muitos outros excelentes músicos. Seu legado é inestimável.
Johann Sebastian Bach (1685 – 1750)
CD1
Suíte Inglesa No. 1 em lá maior, BWV 806
- Prélude
- Allemande
- Courante I – Courante II avec deux Doubles
- Sarabande
- Bourrée I – Bourrée II – Bourrée I
- Gigue
Suíte Inglesa No. 2 em lá menor, BWV 807
- Prélude
- Allemande
- Courante
- Sarabande – Les agréments de la même Sarabande
- Bourrée I altenativement – Bourrée II – Bourrée I
- Gigue
Suíte Inglesa No. 3 em sol menor, BWV 808
- Prélude
- Allemande
- Courante
- Sarabande – Les agréments de la même Sarabande
- Gavotte I alternativement – Gavotte II ou la Musette – Gavote I
- Gigue
CD2
Suíte Inglesa No. 4 em fá maior, BWV 809
- Prélude (vitement)
- Allemande
- Courante
- Sarabande
- Menuet I – Menuet II – Menuet I
- Gigue
Suíte Inglesa No. 5 em mi menor, BWV 810
- Prélude
- Allemande
- Courante
- Sarabande
- Passepied I em Rondeau – Passepied II – Passepied I
- Gigue
Suíte Inglesa No. 6 em ré menor, BWV 811
- Prélude
- Allemande
- Courante
- Sarabande – Double
- Gavotte I – Gavotte II – Gavotte I
- Gigue
Gustav Leonhardt, cravo
Produção de Gerd Berg
Gravado na Holanda em 1984
O cravo usado nesta gravação foi construído por Nicholas Lefebvre em 1755 e foi restaurado por Martin Skrowonneck em 1984. Vale a pena uma visita a uma página que fala do trabalho de Skrowonneck. Caso você esteja interessado, basta clicar aqui.
BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE
FLAC | 664 MB
BAIXE AQUI – DOWNLOAD HERE
MP3 | 320 KBPS | 222 MB
The Penguin Guide to Recorded Classical Music, editado por Ivan March e CIA, diz: Leonhardt’s playing here has a flair and vitality that one does not always associate with him.
Ah, esqueci de contar, a sobremesa aqui foi uma tasca de goiabada!
Aproveite!
RD
PQP Bach-Quiz!
Nesta foto, Gus está:
a) Rindo a bandeiras despregadas
b) Rindo
c) Sorrindo
d) Tentando entender a piada
e) Todas as alternativas anteriores…
Curioso para saber o que vem por aí em relação a essa reaudição das obras pra cravo.
Gostei muito dessas suítes em outras interpretações, ainda não conheço essa. Baixando!
Denon,
Você esqueceu a última opção:
“f) Nenhuma das anteriores: ele está mesmo pensando no chá com biscoitos após concluir a interpretação das suítes de seu coração…”
😉
P.S.: thanks for the Chopin. Baixando, como escreveu Sal!
P.S.: há biscoitos de gengibre e canela na dispensa do PQP Musical Club? Ainda há tempo de providenciá-los, não é de bom tom frustrar Mr. Leonhardt!
😀
Certamente, caríssimo Rameau!
Nunca deixamos faltar tão importante item…
Mas, obrigado por alertar-nos!
Forte abraço do René
Lendo, como sempre com muito prazer os seus textos, pensei que as saudades de trabalhar em casa na época da pandemia permanecem… Eu lidei bem com isso e confesso nunca mais ter sido o mesmo, por inúmeros motivos, mas sobretudo por esse. E a goiabada no final foi um primor, eis uma guloseima dos deuses. Abraços.
olá, Marcelo…
obrigado por trazer essa postagem, pois quem é visto, é lembrado!
desfrute , pois essas gravações são ‘papa fina’!
até mais
abraços do René