BTHVN250 – A Obra Completa de Ludwig van Beethoven (1770-1827) – Octeto em Mi bemol maior, Op. 103 – Rondino, WoO 25 – Septeto, Op. 20 (arranjo para noneto) – Sabine Meyer Bläserensemble

Já que nos debruçamos sobre a ótima música para instrumentos de sopro que Beethoven escreveu em sua juventude, permitam-me dar um salto em seu catálogo de obras para apresentar-lhes o Op. 103, seu único octeto.

Apesar de se supor composto para a extraordinária Harmonie a serviço de Maximilan Franz, Eleitor de Colônia e patrono em sua Bonn natal, o octeto não foi executado por aquele conjunto de sopros antes da chegada de Beethoven a Viena para estudar com o grande Haydn. Intitulado originalmente “Parthia” e com a indicação “num concerto”, que faz supor que, em algum momento, ele fosse destinado a um palco, e não ao entretenimento duma corte, ele foi explicitamente mencionado numa carta de Beethoven a Nikolaus Simrock, seu amigo de Bonn, trompista da Harmonie e futuro editor, em que perguntava se o octeto já tinha sido tocado por lá. Alguns meses mais tarde, Haydn escreveria ao Eleitor de Colônia para dar conta dos progressos feitos por seu aluno turrão e solicitar um aumento da bolsa paga a Beethoven, anexando, para documentar tais progressos, algumas das composições do rapaz. O Eleitor foi demolidor em sua resposta, afirmando que já estava a gastar muito dinheiro e que quase todas as composições enviadas, incluindo o octeto, já tinham sido escritas em Bonn e que, portanto, não representavam progresso algum. Haydn deve ter ficado com cara de tacho e, já mais preocupado com suas exaustivas, ainda que muito lucrativas, excursões à Inglaterra do que em dar aulas ao renano enrolão, acabou por deixar de lado suas lições, o que muito aliviou o pupilo, que procurou a tutela de Albrechtsberger e Salieri para, sem a ajuda do Eleitor de Colônia, conquistar a cena musical vienense.

Ainda que composto em Bonn e revisado em Viena em 1793, o octeto só foi publicado em 1830, o que justifica seu alto número de Opus. Talvez mais conhecido em sua recauchutagem como um quinteto de cordas (Op. 4), é uma obra que, embora claramente evocativa do estilo de Mozart, tem a acidez e as explosões de temperamento tão típicas de Beethoven. Do ponto de vista formal, ele já demonstra a predileção do jovem compositor por um scherzo no lugar do minueto, apesar de ainda intitulá-lo Menuetto. Embora haja equilíbrio entre as partes, é notória a proeminência das difíceis partes para trompa, instrumento a que Ludwig estava aparentemente muito familiarizado, talvez pela amizade com Simrock. Da mesma forma, o primeiro oboé conduz os três primeiros movimentos – incluindo um dueto com o fagote no Andante – e o clarinete se encarrega de incendiar o Finale com muito virtuosismo.

No manuscrito do octeto, após o minueto, há um curto e riscado fragmento de um Andante, que foi descartado pelo compositor e substituído pelo Finale supracitado. Descoberto entre os papeis de Beethoven após sua morte, o Andante foi intitulado “Rondino” e publicado separadamente em 1830.

A gravação que lhes apresentamos traz a extraordinária clarinetista Sabine Meyer a liderar um conjunto de sopristas não menos fabulosos, que inclui Albrecht Mayer, oboísta dos filarmônicos de Berlim, e se encerra com um arranjo muito interessante do septeto de Beethoven feito por Jiří Družecký (que, germanizado e sem diacríticos, fica Georg Druschetzky). Nele, as partes do violino, da viola e do violoncelo foram redistribuídas entre pares de oboés, clarinetes, trompas e fagotes, aos quais se soma um contrafagote, que assume o papel do contrabaixo. Não sei se Beethoven chegou a conhecer esse arranjo, mas tenho o palpite – a despeito de seu hábito de renegar o septeto, mesmo com todo sucesso que teve, por considerá-lo muito inferior às suas obras ulteriores – de que ele o aprovaria. O contrafagote muda completamente o caráter da peça, além de estar bem de acordo com o uso que Ludwig fez dele no final da carreira, acrescentando uma parte para o instrumento a todas suas obras mais importantes. Além disso, a virtuosística parte do primeiro clarinete, tomada ao violino, permite a Sabine Meyer alguns belos voos e nos faz lamentar que o mestre de Bonn não nos tenha legado um concerto para esse instrumento.

Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)

Octeto em Mi bemol maior para dois oboés, dois clarinetes, dois fagotes e duas trompas, Op. 103
Composto em 1792
Publicado em 1834

1 – Allegro
2 – Andante
3 – Menuetto
4 – Finale. Presto

Rondó (Rondino) em Mi bemol maior para dois oboés, dois clarinetes, dois fagotes e duas trompas, WoO 25
Composto em 1793
Publicado em 1830
5 – Andante

Sabine Meyer Bläserensemble
Diethelm Jonas e Albrecht Mayer
, oboés
Reiner Wehle e Sabine Meyer, clarinetes
Dag Jensen e Georg Klütsch, fagotes
Nikolaus Frisch e Bruno Schneider, trompas

Septeto em Mi bemol maior para violino, viola, clarinete, trompa, violoncelo, fagote e contrabaixo, Op. 20, em arranjo para noneto de sopros por Jiří Družecký (1745-1819)
Composto entre 1799-1800
Publicado em 1802 (septeto)
Dedicado à imperatriz Maria Theresa da Áustria
Arranjo para noneto publicado em 1814

6 – Adagio – Allegro con brio
7 – Adagio cantabile
8 – Tempo di menuetto
9 – Tema con variazioni (Andante)
10 – Scherzo
11 – Andante con moto alla marcia

Sabine Meyer Bläserensemble
Diethelm Jonas e Albrecht Mayer,
oboés
Reiner Wehle e Sabine Meyer,
clarinetes
Dag Jensen e Georg Klütsch,
fagotes
Nikolaus Frisch e Bruno Schneider,
trompas
Klaus Lohrer,
contrafagote

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#BTHVN250, por René Denon

Vassily

 

 

3 comments / Add your comment below

  1. Obrigado Vassily por este disco maravilhoso. As versões da Sabine e do seu grupo são sempre excelentes. Soma-se a isso o apelo da versão do Settimino preparada para o noneto pelo grande Druschetzky, grande como arranjador e também como compositor.
    Saudações

  2. Venho aqui deixar essa mensagem, pois nas semanas passadas joguei no google PQPBACH e fiquei triste de perceber que o site com o domínio anterior havia sumido. Passei alguns dias tentando novamente e já esperava pelo pior. Para mostrar minha admiração, vou colar abaixo o texto que escrevi quando tinha me convencido que o blog havia acabado. Um abração a todos os envolvidos.

    Algumas semanas atrás fui visitar o melhor blog (sim, isso ainda existe) sobre música clássica do Brasil e descobri que ele havia sumido. Depois de muito vasculhar, não encontrei qualquer explicação sobre o ocorrido, então decidi aguardar alguns dias, visto que isso já havia se passado antes. Porém após tanto tempo creio que dessa vez o fim seja definitivo. Estou falando, é claro, do P.Q.P.Bach.
    Sim, o nome pode causar estranhamento, mas o conteúdo era sem dúvida inigualável, e o melhor sobre o assunto entre todos os sites que visitei.
    Me tornei freqüentador assíduo em 2007 e, através dele, tomei conhecimento de muitas das grandes músicas e compositores que admiro até hoje. Luciano Berio, Mahler, Prokofiev e Shostakovich são apenas alguns exemplos que me foram apresentados por lá, coisa pela qual serei eternamente grato por toda a vida.
    Mesmo com o acesso às plataformas de streaming — o blog oferecia links para downloads gratuitos, muitos deles raríssimos —, o PQP seguia como um norte, sempre trazendo indicações certeiras, através de uma pesquisa acurada e muito bem contextualizada, mas sempre carregada de bom humor, que a ajudava a desmistificar o estigma que envolve o ouvinte e a própria música clássica como algo elitista — no pior sentido da palavra — e ou chato. Com a quantidade gigantesca de música para se conhecer e apenas uma vida para se viver, o papel que eles tiveram para mim — e para tantos outros — é digno de total respeito e admiração. Obrigado pessoal, a eternidade agradece.

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