.: interlúdio :. Goran Bregovic – Black Cat White Cat (Soundtrack) (2000)

IM-PER-DÍ-VEL !!!

À exceção de West Side Story, não creio que exista uma trilha sonora de qualidade tão alta quanto Black Cat White Cat. Então… Vamos nos divertir de um jeito diferente hoje. A música popular dos Balcãs é uma coisa de louco. E Goran Bregovic é um dos principais artistas da região. Já tocou muitas vezes no Brasil, inclusive fez duas apresentações em Porto Alegre. Compositor, instrumentista, cantor e extraordinário arranjador, seus discos nunca são esquecíveis. Black Cat White Cat é a trilha sonora do filme homônimo de Emir Kusturica. Depois de vários trabalhos juntos a dupla se desentendeu.

Este CD dá uma mostra de quem é Bregovic. Não há economia, nem de alegria ou de criatividade, e muito menos de recursos. Há cantores, flautistas, cordas, organistas, grupos peruanos, de salsa e muita mas, muita música da Bósnia e da Sérvia com seus metais, metais, metais. O que há de tubas, trombones, trompetes e trompas é um absurdo. Além disso, há um grupo de rock que chega a cantar I want to break free em ritmo marcial… E cada um dos 30 temas têm arranjos inteiramente diferentes, cada um com personalidade própria. Há um compositor alucinado e um arranjador do tamanho de George Martin dentro de Bregovic.

Goran ...
Goran …

Goran Bregovic considera-se iugoslavo e os itálicos a seguir copio uma entrevista que ele concedeu ao El País espanhol em 2009, época do espetacular CD Alkohol:

Si tu país desaparece, descubres que no era algo político ni geográfico, sino emocional. No me siento represente de una nación o un Estado. Sólo represento ese territorio emocional que no tiene nada que ver con la política.

O que diz sobre os criminosos de guerra:

Creo que conozco a casi todos los criminales de guerra. Conozco a Radovan Karadzic, que antes de la guerra era poeta. Algunos de mis profesores de la Facultad de Filosofía están en La Haya. Eran políticos pequeños que creyeron interpretar personajes históricos. Los seres humanos están condicionados. Si les dejas la oportunidad de convertirse en animales se convertirán en animales. La cultura no nos protege.

Sobre o poder da arte mudar as pessoas:

A los artistas occidentales les gusta decir grandes cosas, como que la música puede cambiar el mundo. Vengo de un país comunista y sé dónde está el poder. Aunque trabajo con la misma temperatura que los artistas occidentales, sé que hay un largo camino hasta ser iluminado. Las luces pequeñas ayudan, pero en el fondo no cambian nada.

Sobre uma destas pequenas luzes, ele narra um acontecimento quando de seu primeiro concerto em Buenos Aires:

Al llegar al hotel me dieron un sobre que me habían dejado de parte de Ernesto Sábato. Contenía un libro, Sobre héroes y tumbas, y una carta en la que me pedía disculpas por no acudir al concierto. Me explicaba que mi música le había salvado en momentos de depresión. Lo curioso es que cuando hice el servicio militar en Nis, en la época comunista, robé de la biblioteca del cuartel un ejemplar de ese libro. Lo tuve en mi casa de Sarajevo durante años y lo perdí. Con la guerra perdí todo, también mi biblioteca. Puedes empezar dos veces tu vida, pero no puedes empezar dos veces una biblioteca. Todas las cosas grandes que me han pasado están guiadas por cosas pequeñas que se vuelven grandes, como el libro de Sábato.

Ele surpreende ao falar sobre algumas acusações de plágio:

Me llaman compositor porque compongo lo que ya existe. Así ha sido siempre, desde Stravinski, Gershwin, Bono, Lennon… Se trata de un viejo método: tomas algo de tu tradición, robas y dejas atrás cosas para que otros con talento roben también. La cultura es eso, una transformación continua.

E este filho de pai sérvio e mãe croata, casado com uma muçulmana, finaliza:

La guerra no es sólo matar gente, quemar casas, la guerra mata una infraestructura cultural, edificada por los hombres con gran dificultad durante mucho tiempo.

É uma boa entrevista. O que me emocionou foi a referência que ele fez a sua biblioteca perdida:

Com a guerra perdi tudo e também minha biblioteca. Podes começar tua vida duas vezes, mas não podes começar duas vezes uma biblioteca.

... Bregovic
… Bregovic

Eu nunca tinha pensado nisso. Uma biblioteca pessoal é algo que não se recomeça. Ou ela é inteira ou é um amontoado. Uma biblioteca sem as tantas bobagens lidas durante a adolescência, sem as anotações que não consigo deixar de fazer nos livros e sem as anotações dos amigos, deixaria de contar à sua maneira minha história e a de meu tempo. Eu não iria morrer sem esses 3000 ou mais paralelepípedos cheios de pó mal organizados às minhas costas. Mas perderia o meu mais importante meio de recordações, pois só consigo chegar ao PQP de 15 anos quando abro O Lobo da Estepe e constato o quanto amei e manuseei aquele exato livro que hoje leria com enfado. E quando abro Baía dos Tigres sei onde estava e o que pensava enquanto o lia e o mesmo ocorre com quase todos os outros. Sei lá por quê, minha vida tem largos períodos sem fotos e minha memória associa-se sempre aos livros. Não sei se esta é uma sensação comum às pessoas que leem permanentemente. Não sei mesmo. Aliás, antes do dia de hoje nem sabia que uma biblioteca não se recomeçava…

Goran Bregovic – Black Cat White Cat (Soundtrack) (2000)

01. Intro (El Pasa)
02. El Bubamara Pasa
03. Black Cat White Cat
04. Daddy Dance
05. The Szombathely Jiga (Ashik Cygan)
06. Bubamara (Main Version)
07. Daddy’s gone
08. Czardsz (Ashik Cygan)
09. Dejo dance
10. Lies
11. Flor De Venganza
12. Duj Sandale
13. Hunting
14. Bubamara (Spij Kochanie)
15. Spij Kochanie, Spij (Kayah)
16. Vivaldi (Bubamara Version)
17. Jek Di Tharin
18. Long Vehicle
19. Pit bull (Mixed by Pink Evolution)
20. Ja volim te jos – Meine Stadt
21. Bulgarian dance
22. Bubamara (Sunflower)
23. To Nie Ptak (Kayah)
24. Railway Station
25. Jek Di Tharin II (New Version)
26. Daddy, don’t ever die on a friday
27. 100 Lat Mlodej Parze (Kayah)
28. Bubamara (Tree Stump)
29. Prawy Do Lewego (Kayah)
30. Bubamara (Final)

BAIXE AQUI — DOWNLOAD HERE

Bregovic + Kusturica: músicos por todo lado
Bregovic + Kusturica: músicos por todo lado

PQP

8 comments / Add your comment below

  1. Parece uma ilha de encantamento no meio de um oceano de musica erudita!! Muito bonito. Gostei muito dos instrumentos e acessórios bem como das vozes dos “ciganos”, vozes ora apaixonadas ora roucas de comoção…!
    abraços – manuel

  2. Goran é formidável. muito grato. A música dos balcãs é fascinante e difícil, eu queria tocar com alegria que eles tocam. Maravilhoso.

Deixe um comentário para Georges Piriou Cancelar resposta