Os três anos que separam as estreias da primeira e da segunda sinfonias marcam não somente um significativo salto estilístico, produto da evolução artística de um Beethoven cada vez mais propenso a extrapolar as convenções de todos os gêneros em que compunha, mas também apartam os lados dum abismo que lhe era cada vez maior: a surdez, que já se manifestara na década passada, tornara-se pervasiva o bastante para ele temer que algum dia se tornasse completa e, pior ainda, já atrapalhava suas tarefas cotidianas – uma sentença capital, temia ele, para sua carreira como compositor. Seu compreensível desespero levou-o a contemplar o suicídio. Por recomendação médica, passou uma temporada no lugarejo de Heiligenstadt, nos arredores de Viena – cujo nome eternizou-se no famoso testamento, na verdade uma carta escrita aos irmãos, que nunca lhes foi entregue – e lá, entre outros afãs, dedicou-se a compor a segunda sinfonia.
Que uma obra de caráter tão luminoso e alegre seja um produto de uma época de terrível sofrimento psíquico é algo deveras notável, à altura talvez da capacidade de Mozart, então às portas da morte, de compor aquele belíssimo concerto para clarinete. Podemos supor que tudo, desde a escolha da ensolarada tonalidade de Ré maior até os toques humorísticos e as traquinagens harmônicas e dinâmicas que permeiam a sinfonia, fosse produto de um escapismo alimentado pela pacata vida no retiro em Heiligenstadt. Minha impressão, citando Platão, é que Beethoven simplesmente apertou o botão vermelho de f***-se (e quero ver vocês me provarem que Platão nunca disse isso) e escreveu com a deliberada intenção de, ignorando convenções de forma, provocar reações em quem a ouvisse. Independentemente de minhas desimportantes suposições, ela foi adorada pelo público, e recebeu – nenhuma surpresa – ressalvas dos críticos. Um deles comparou-a a um dragão agônico que, recusando-se a morrer, se contorce e estrebucha até se morrer exangue no movimento final – cujo primeiro tema já foi comparado a um soluço, um arroto ou mesmo um traque, fenômenos bastante familiares ao compositor, cronicamente desgraçado por problemas digestivos.
Bem, talvez os três juntos – e mais uma gargalhada do renano.
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
Sinfonia no. 2 em Ré maior, Op. 36
Composta entre 1801-02
Publicada em 1804
Dedicada ao príncipe Karl von Lichnowsky
1 – Adagio molto – Allegro con brio
2 – Larghetto
3 – Scherzo: Allegro
4 – Allegro molto
Wiener Philarmoniker
Wilhelm Furtwängler
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NBC Symphony Orchestra
Arturo Toscanini
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Pittsburgh Symphony Orchestra
Fritz Reiner
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Berliner Philharmoniker
Herbert von Karajan
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Chicago Symphony Orchestra
Sir Georg Solti
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Sinfonieorchester des Norddeutschen Rundfunks
Günter Wand
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Koninklijk Concertgebouworkest
Bernard Haitink
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The Hanover Band
Monica Huggett
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Orchestre Révolutionnaire et Romantique
John Eliot Gardiner
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Symphonieorchester des Bayerischen Rundfunks
Mariss Jansons
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Gewandhausorchester Leipzig
Riccardo Chailly
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Berliner Philharmoniker
Sir Simon Rattle
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O “Testamento de Heiligenstadt”, em tradução de Erico Verissimo, lido por Paulo Autran
Vassily