Publicado hoje no blog de Al Reiffer, O Fim, um notável texto de alguém que efetivamente compreende Shosta.
Em 25 de setembro de 1906, nascia, em São Petersburgo, Rússia, o genial compositor Dmitri Shostakovich (1906-1975). O texto a seguir não conta a história de Shostakovich, não trata de sua vida, não é uma análise, não é uma dissertação. É um agradecimento em forma de uma humilde homenagem a um dos meus compositores favoritos. Portanto, é um texto altamente subjetivo, é uma forma de expressar a minha visão da obra daquele que considero como o maior compositor nascido no século XX.
Obrigado, Shostakovich, por mostrar ao homem do século XX o que o homem do século XX era. E ainda é. Porque o agora é o fruto do século XX. Obrigado por colocar a humanidade em seu devido lugar. Obrigado por não sonhar, mas ter pesadelos. Por dizer à tua época, à nossa época, a todas as épocas aquilo que cada uma das épocas não gostaria de ouvir. Obrigado pela verdade quase palpável da tua música. Pela expressão do teu mundo que indicou o caminho que a humanidade seguiria nos anos presentes e subsequentes.
Obrigado, Shostakovich, por não ter piedade ou sentimentalismos. Obrigado, por desnudar o ser humano sem misericórdia, por retirar o ranço de todas as suas máscaras, das suas falsidades, hipocrisias e mentiras. Obrigado por devastar nossos ouvidos com a imensidão da miséria humana. E por debochar, ridicularizar, fazer escárnio, escracho de toda a vergonha desses ideais falhos que ainda insistem em apregoar que nos levarão a algum lugar, que atingirão algum substancial objetivo. Obrigado pela força apocalíptica do teu pessimismo. Pelo teu cuspe na cara do homem. Do homem da riqueza e da empresa. Do homem da guerra e da política. Do homem do nada e da desgraça.
Obrigado, Shostakovich, pela gravidade tensa e ao mesmo tempo sarcástica da forma como nos revelaste. Obrigado pelo teu pesar rítmico sem freios e sem meio-termos. Pela tua obsessão nervosa em expressar o caos e a loucura, a desesperança e a fatalidade. Aquilo que persistem em negar. Em esconder. Em esquecer. Obrigado pela coragem da tua obra. Pela fúria dos teus compassos. Pela sombra das tuas notas densas. Pelo áspero tom de nunca que atravessa as ondas do teu tempestuoso mar.
Obrigado, Shostakovich, pelo teu mistério. Pela névoa aflita das tuas florestas noturnas. Pela morte que paira em cada canto das tuas funerárias partituras que nunca cedem. Pelo agouro de entre céus nublados. Pelo desconhecido que falou através de ti. Talvez sem mesmo tu conheceres. Pelo grito insano entre risos e ânsias que preenche a treva dos tempos. Obrigado pela tua angústia frente à existência.
E obrigado por venceres. Por te ergueres assustador e invencível diante do vazio humano. E, obrigado, com tua sombria vitória, por teres desvendado nossa essência. E o nosso ego. Eu te agradeço, amigo, pela companhia, pela catarse, pela compreensão. Obrigado, Shostakovich.
muito bom o texto.
Falou bem no ponto. Shosta não era pessimista, só realista, e bastante ironico e sarcástico diversas vezes, quase indo pro deboche mesmo.
No fundo ele deveria rir disso tudo.
UAU!!! Parabéns, Al Reiffer! Juro que aplaudiria de pé se ouvisse isso sendo lido. Você é um poeta nato. E o PQP é um compartilhador nato (poeta, também… rsrsrsrs). Eu resumiria tudo isso com: “Obrigado, Shostakovich, por ter sido o compositor que foi”.
Shostakovich é um grande comentarista de nosso tempo num idioma que amamos.
“E por debochar, ridicularizar, fazer escárnio, escracho de toda a vergonha desses ideais falhos que ainda insistem em apregoar que nos levarão a algum lugar, que atingirão algum substancial objetivo. Obrigado pela força apocalíptica do teu pessimismo.”
Nada a acrescentar a isto nem a tudo que escreveu o Reiffer.
Valeu, Milton, valeu, pessoal! Já há meses pensava em escrever esse agradecimento meio poético ao Shosta, mas resolvi esperar o aniversário do mestre. Abraço a todos.
Feliz aniversário pro Shosta. Não é da mesma magnitude, mas Gould também nasceu hoje.
Você somente descreveu o estilo de obra de Shosta, não é um texto nada subjetivo e é de uma gratidão inútil ao estilo e personalidade musical de Shostakovich.
Eu amo ele também e suas sinfonias estrondosas e maravilhosas, mas seu texto está fraquinho viu amigo.
Não creio que “Obrigado por devastar nossos ouvidos com a imensidão da miséria humana.” seja uma frase digna de Shostakovich. Isso é tolo e rídiculo, então queres dizer que você agradece a miséria humana? E a música dele DEVASTA vossos ouvidos, então você o agradece por devastar seus ouvidos? que tolo!
Reescreveria essa frase da seguinte forma:
“É bela a descrição fervorosa e imensa da miserável realidade humana que paira em sua gloriosa obra sobre nossos ouvidos”