Nos comentários à recente postagem do Carlinus da Ópera dos três vinténs de Weill/Brecht, mencionei o gênero artístico conhecido como Kabarett em alemão: “não tem nada a ver com o que nós chamamos de cabaré, e está realmente mais próximo da origem da palavra, o italiano camaretto – ‘quartinho’ ou ‘salãozinho’, porém aqui mais no sentido de ‘um pequeno espetáculo de câmara’. Geralmente se trata de um pianista e um cantor/ator ou cantora/atriz desenvolvendo num pequeno palco um espetáculo de texto cantado e/ou falado com tom fortemente político”.
Essa conversa me deu vontade de compartilhar aqui este trabalho dos anos 70 que me parece a junção de palavra falada e música instrumental mais bem resolvida que já vi (vocês sabem: é uma combinação que com muita facilidade fica brega. Aqui ficou qualquer coisa menos isso).
Não se trata literalmente de Kabarett, no sentido de se valer de um piano: são três multi-instrumentistas que compuseram todo o conjunto de 1974 a 77 em trabalho coletivo (fato a que dão destaque na capa, por evidente motivação política): Andreas Vollenweider (harpista que depois ficaria famoso com trabalhos bem menos críticos puxando para o ‘new age’), Orlando Valentini, e René Bardet – suíço que, além de tocar, dá voz a diversos poemas do romântico alemão Heinrich Heine, numa interpretação falada tão expressiva que não deixa de tocar mesmo quem não entende uma palavra de alemão.
Só não se deixem enganar pela palavra ‘romântico’, pois do mesmo modo que ‘cabaré’ isso pode significar uma coisa bem diferente no espaço cultural germânico: trata-se de poesia fortemente crítica sobre a exploração econômica, a religião e a política a serviço dessa exploração, a convencionalidade social burguesa inclusive quanto a sexo (‘a flor não pergunta à borboleta: você já não andou borboleteando em torno de outra ?’), variando da sátira impiedosa à indignação candente – porém também com uma profunda devoção pela vida, a que Bardet, com sua voz tantas vezes áspera, consegue dar expressão com contida porém infinita ternura: liebes Leben, ‘minha cara vida…’
Fiquei muitos anos sem ouvir isso depois que o meu velho cassete ‘furou’, mas recentemente encontrei ripado do vinil em dois arquivos: lado A e lado B. Não cabe detalhar as faixas aqui: vocês encontram isso no encarte (totalmente home made em tempos pré-informatização, vocês vão ver; ao que parece até mimeografado). E quem quiser os textos completos pode garimpá-los neste site ligado à Universidade de Trier: Heinrich Heine Portal.
Espero que apreciem!
. . . . . BAIXE AQUI – download here
Ranulfus
postagem original em 26.06.2010