Este CD maravilhoso estava comigo há mais de um ano, mas foi somente hoje que eu o escutei. A Cantata Itaipu foi composta por Glass no ano de 1989 em homenagem à hidrelétrica de mesmo nome, construída sobre o Rio Paraná, entre o Brasil e o Paraguai. O trabalho foi encomendado pela Orquestra Sinfônica de Atlanta. Atualmente, o presidente paraguaio Fernando Lugo, quer “um preço de mercado justo” (palavras dele) pela energia que o Paraguai vende ao Brasil. Mas isso é outra história. O texto da cantata de Glass foi composta em guarani, com tradução feita por Daniela Thomas, por informações não oficiais, parece que ela é filha do cartunista Ziraldo. Corrijam-me se estiver errado. Aproveitem!
Phillip Glass (1937-) – Itaipu and Three Songs
01. Mato Grasso [11:54]
02. Itaipu – The Lake (O Lago) [8:23]
03. Itaipu – The Dam (A Represa) [11:17]
04. Itaipu – To the Sea (Ao Mar) [4:52]
Los Angeles Master Chorale
Grant Gershon, regente
05. There are Some Men (Leonard Cohen) [2:52]
06. Quand les Hommes (Raymond Levesque) [2:59]
07. Pierre de Soleil (Octavio Paz) [4:02]
Na última semana, fui informado por CVL que Philip Glass esteve no Brasil (dia 29/07). Por isso, resolvi fazer esta postagem em homenagem ao americano, trazendo à tona a trilha sonora de um dos filmes da trilogia katsi, especificamente, o primeiro filme, Koyaanisqatsi (1983). A obra é com certeza um dos filmes mais impressionantes que já foram feitos ao meu modo de ver. Trata-se de um documento poderoso e atordoante. Não há como assisti-lo e não adquirir uma sensação, seja de susto ou de profundidade estética e filosófica. A sua intencionalidade nos provoca. A sobreposição de cenas nos conduz por um ambiente silencioso. Não há vozes no filme. Não há palavras humanas. Quem fala são os atos humanos, as ações humanas, o desequilíbrio humano. O filme possui por fundo uma trilha sonora notável, arrebatadora, que funciona como um guia para nos mostrar imagens indescritíveis. Philip Glass, responsável pela composição sonora, afirma que “a estrutura, a base, as imagens e a música são o elemento interdisciplinar” que tornam o filme belo. As imagens se movimentam e mostram a contingência notável entre natureza, homens e máquinas. Não é possível extrair do filme a música, pois ela também faz parte da ambientação. Quantos forem os telespectadores, tantas serão as impressões sobre esse belo objeto a serviço da arte. Assistir ao filme é ser convidado para uma experiência única.
O diretor Godfrey Reggio afirma que a sua principal razão para fazer o filme foi apontar o desequilíbrio da vida. O nome estranho foi tomado do idioma Hopi, uma tribo índigena americana (qatsi = vida; e koyaanis = loucura, tumulto, fora de compasso, desintegração ou um estado que pede por outro modo). Assim, o filme tem o significado básico de “vida louca”, “vida tumultuada”, “vida fora de balanço”, “vida desintegrando-se” ou “um estado na vida que pede por outro modo de viver”. Reggio ainda afirma que o filme buscou tratar sobre a essência da vida. Do homem mergulhado no silêncio do tempo, cercado pelo absoluto da tecnologia. “Não é que usemos a tecnologia, vivemos a tecnologia. Ela é tão indispensável quanto o ar que respiramos. Não temos mais ciência de sua presença”, afirma. Trata-se de um sistema que é alimentado pela necessidade humana. Os homens foram tragados pela via tecnológica. Ainda afirma: “O acidente de hoje não é visto por quem o presencia”. Com certeza, aí está uma assertiva profunda. O homem moderno deificou a tecnologia. A paisagem humana é tecnologizada. Os microchips de computadores são os portadores da nova inteligência. Godfrey, que afirma ter sido influenciado pela religião duarante a vida, diz que a nova religião do homem é a tecnologia. “A vida não questionada passa a ter um estado religioso”, assevera. O jornalista Aramis Millarch escreveu no ano de 1985 sobre o filme: “Em suma, o filme se propõe a mostrar a contradição entre a natureza em seu estado virgem e a montagem urbana do sonho americano”(…) Nova Iorque foi escolhida como a soma das virtudes e defeitos do “american way”: o efeito é sobrecarregador. Através dele chegamos ao paroxismo que logram criar as imagens animadas e a partitura musical, que retoma o formato de cantata (provérbios hopis), como na introdução e nos devolve suavemente aos valores primários da natureza”. O sistema criado pelo homem se movimenta. O silêncio da natureza, trabalhou durante as eras magnificentemente as formas dos montes, dos rios, dos vales. O homem transformou o mundo recentemente. Certa vez ouvi Leonardo Boff dizer que “a terra surgiu nos últimos dois minutos da história do universo; e o homem , por sua vez, há cinco segundos”. A vida criada pelo homem é desequilibrada, louca, tumultuada e está fora de controle. O último dos seres a surgir no planeta é a mais espetacular e a mais terrível das criaturas. Assim, o filme busca criticar a vida que está fora de equilíbrio. Fora dos eixos. O monstro manco feito pelo homem – a besta – ou seja, o estilo de vida. Reggio arremata dizendo o seguinte: “É sobre uma beleza incrível, terrível ou a beleza da fera nossa ilustre fera, o modo de vida” [que o filme trata]. Ao final, existe a afirmação chocante, atordoante, de três profecias antigas traduzidas pelo diretor Gofrey Reggio: “Se escavarmos preciosidades da terra, convidaremos ao desastre”. Isso parece inevitável e certo. A segunda: “Próximo do Dia da Purificação haverá teias de aranha a rodar no céu”. A terceira: “Um pote de cinzas pode um dia ser jogado do céu, o que poderia queimar a terra e ferver os oceanos”. Impossível apenas narrar com palavras. As palavras apenas dizem. É preciso ver ao filme para se impressionar e refletir a profundidade atordoante deste belessímo documentário de Reggio. Às vezes ponho o DVD do filme e fico silencioso a me embriagar com os efeitos espantosos da obra. Ouça a música e deixe-se levar por essa reflexão, principalmente a última faixa: “Prophecies”.
Este é um dos capítulos do filme que mais me impressiona. Ele nos faz refletir sobre o que é o homem. Frágil, complexo, denso, espetaculoso. Capaz de cavar imensidões e se caotizar com a própria criação.
Afinal, que animal é este?
Philip Glass (1937 – ) – Trilogia Qatsi – Koyaanisqatsi
O disco abaixo é bastante delicioso. É um registro instigante com Philip Glass. Na verdade, trata-se da trilha sonora do filme “As Horas” (2002) do diretor Stephen Daldry. A película em si é um belo poema de cunho existencial baseado no livro homônimo de Michael Cunninghan. Cunninghan, por sua vez, teve por motivo temático, o livro “Mrs. Dalloway” da escritora inglesa Virgínia Woolf . Já vi ao filme “As Horas” algumas vezes. Cada vez que o vejo, fico com aquela impressão de silêncio e embasbacamento. O filme conta a história de três mulheres separadas pelo tempo. Elas estão conectadas pelo livro Mrs. Dalloway. Em 1923 vive Virginia Woolf (Nicole Kidman), autora do livro, que enfrenta uma crise de depressão e ideias de suicídio. Em 1951 vive Laura Brown (Julianne Moore), uma dona de casa grávida que mora em Los Angeles, planeja uma festa de aniversário para o marido e não consegue parar de ler o livro. Nos dias atuais vive Clarissa Vaughn (Meryl Streep), uma editora de livros que vive em Nova York e dá uma festa para Richard (Ed Harris), escritor que fora seu amante no passado e hoje está com AIDS e morrendo. Em suma: a ficção do livro é humanizado pelo drama existencial de cada um dos personagens. As três personagens vivem ao seu modo a angústia, o medo e o desalento das horas que passam a trazer revelações sobre o nada. A vida não é aquilo que se planejou, pois os momentos imparciais que passam trazem aquilo que não pode ser controlado. A música de Glass se encaixa com perfeição neste mosaico com três peças – a massa que liga os elementos do quebra-cabeças é o livro. A trilha sonora possui um tema básico, contínuo, que “caminha” à semelhança de rio. A música evoca a vida e a vida não é nada mais nada menos do que suceções de horas. É um filme muito bonito que deve ser visto e que possui uma trilha sonora muito bem elaborada pela competência de Philip Glass. Não deixe de ouvir. Boa apreciação!
Philip Glass (1937-) – As Horas (The Hours) – trilha sonora
01. The Poet Acts
02. Morning Passages
03. Something She Has To Do
04. “For Your Own Benefit”
05. Vanessa And The Changelings
06. “I’n Going To Make a Cake”
07. An Unwelcome Friend
08. Dead Things
09. The Kiss
10. “Why Does Someone Have To Die?”
11. Tearing Herself Away
12. Escape!
13. Choosing Life
14. The Hours
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