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Eram outros tempos, muito diferentes. Dias antes, em Leningrado, foram planejados ataques aos alemães a fim de que eles não incomodassem durante a execução da obra através de um ajuntamento de músicos famintos e estropiados. E, assim, a Sinfonia Nº 7 de Shostakovich foi estreada em Leningrado no dia 27 de dezembro de 1941, tornando-se instantaneamente popular na URSS e no Ocidente como um símbolo da resistência ao totalitarismo e militarismo nazista.
No dia 19 de julho de 1942, a NBC transmitiu a Sétima para todos os Estados Unidos na mais espetacular iniciativa da era do rádio até então — anunciada inclusive na capa da revista Time, que ostentava (abaixo) a figura do compositor como bombeiro, uma de suas atribuições na cidade sitiada há meses.

A maioria dos compositores de peso estavam nos EUA — Schoenberg, Bartók, Stravinsky, Eisler, Hindemith, Rachmaninov — e grudaram no rádio. E tiveram uma enorme decepção. A mais popular das sinfonias era horrível. Schoenberg e Hindemith esbravejaram publicamente. Bartók ficou pasmo diante da ruindade do primeiro movimento, mas confidenciou apenas a amigos. O grande problema era, obviamente, o primeiro movimento. Após uma introdução pastoral que descreve as maravilhas do tempo pré-guerra com Stalin, há o tema da invasão, claramente inspirado no Bolero de Ravel.
Concordo que é tudo muito simples e anormal para Shostakovich, mas, anos depois, terminada a guerra e acalmados os ânimos, os críticos começaram a ver o que sempre esteve sob seus tolos narizes. A descrição musical da URSS trabalhadora, feliz, tranquila e pastoral durante o regime de Stalin era um evidente e claríssimo sarcasmo. Fato conhecido de todos — inclusive dos envolvidos — é que Shosta detestava Stalin e jamais daria uma chance a ele. Além do mais, era um homem talentoso, inteligente, complexo e muito, mas muito corajoso, apesar de seus problemas. Ora, a ironia forma-se no ato de dizer-se as coisas exatamente ao contrário e com certo exagero. Como é que ninguém deu-se conta de que aquele açúcar todo tinha o endereço de Stalin? Já o restante da música é extremamente dramático e bom.
A gravação de Mariss Jansons e da RCO é uma coisa de louco.
Dmitri Shostakovich (1906-1975): Sinfonia Nº 7, Op. 60, “Leningrado” (Jansons / RCO)
1. Shostakovich – Symphony 7 in C major, op. 60 – Leningrad: Allegretto 27:22
2. Shostakovich – Symphony 7 in C major, op. 60 – Leningrad: Moderato (poco allegretto 11:17
3. Shostakovich – Symphony 7 in C major, op. 60 – Leningrad: Adagio 18:37
4. Shostakovich – Symphony 7 in C major, op. 60 – Leningrad: Allegro non troppo 17:11
Royal Concertgebouw Orchestra
Mariss Jansons

PQP


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Eu gosto muito de Berwald. Aliás, compositores suecos são raros. Escrevi “compositores eruditos suecos” e o Google mudou espertamente para “compositores escandinavos”. Citou Berwald, mas já dentro deste novo escopo. Coisas da AI. Ele escreveu 4 belas Sinfonias, das quais as duas primeiras estão aí. Franz Berwald, descendente de uma família de músicos suecos de remota origem alemã, era violinista por formação e se tornou a figura mais importante da música sueca do século XIX. Em suma, ele teve razoável sucesso em seu próprio país, eventualmente se voltando para os negócios, gerenciando uma fábrica de vidro e abrindo uma serraria. Ser músico na Suécia do século XIX devia dar uma grana… Ele acabou nomeado professor de composição da academia sueca apenas em 1867, um ano antes de morrer.

“Em 50 anos, serei lembrado apenas pelo meu concerto para violino em sol menor… Brahms foi um compositor muito maior do que eu porque assumiu riscos”. OK, então, neste CD, temos Bruch representado por sua melhor música e ela não parece uma obra complementar — é muito bonita. Claro que Brahms é Brahms , mas Bruch não faz feio, de modo algum. Talvez a comparação direta mais conhecida entre os concertos para violino de Brahms e Bruch venha de Hans von Bülow, que comentou que, enquanto Bruch havia escrito um concerto para violino, Brahms havia composto um contra ele. E embora isso seja talvez um pouco duro com Brahms, pode-se entender o ponto de von Bülow: Bruch usa a orquestra para apoiar seu solista, enquanto Brahms tenta tratar tanto o solista quanto a orquestra como iguais. Comparações à parte, ambos são exemplos imponentes do gênero e permanecerão estabelecidos como pedras fundamentais do repertório de concertos. Aqui, os dois concertos são tocados com raro brilho.

O nome de Rafael Kubelik é garantia de qualidade e durabilidade. Ele não deforma, não tem cheiro e não solta as tiras. E quando ele pega um boêmio a coisa se torna realmente linda. É uma gravação de referência para a Nona de Dvořák. A Nona Sinfonia foi escrita em 1892 no período em que o compositor estava nos Estados Unidos. Ao mesmo tempo que estava encantado com o novo lugar sentia saudades de sua terra. Essa confusão pra lá de fingida aparece neste Op. 95 quando temas norte-americanos dialogam com eslavos e a obra ganha um tom trágico. A obra estreou em 1893 no Carnegie Hall de Nova York em comemoração ao aniversário da conquista do novo mundo, fato que deu nome à obra. Já a transcrição de quarteto de cordas para orquestra do Fugão de Beethoven é desnecessária. Ouça a versão original e estamos conversados.
Meus astutos e ínclitos pequepianos, esta é uma gravação mezzo antiquada, com vibratões e instrumentos modernos, mas há algo de especial nela. Além do repertório LINDO, VERDADEIMENTE EXTRAORDINÁRIO, além do talento de Rilling, há Dietrich Fischer-Dieskau cantando. Só esta versão da Cantata BWV 82 é superior a todas as gravações de Karl Richter somadas, apenas para citar um contemporâneo de Rilling. Pois Rilling não é um romântico de Bach. E acreditem, ele está vivo até hoje. Ele é bem conhecido por suas performances da música de Bach e seus contemporâneos. Foi o primeiro a ter gravado duas vezes (em instrumentos modernos) as obras vocais completas de Bach, uma tarefa monumental envolvendo mais de 1.000 peças musicais — abrangendo 170 CDs. Ele também gravou muitas obras corais e orquestrais românticas e clássicas, incluindo as obras de Johannes Brahms.

Glenn Gould era um original. No auge da carreira, abandonou os concertos pelas gravações, cantava durante as mesmas, era um mago no estúdio e corrigia seu som quando isto era “roubar no jogo”, fazia entrevistas consigo mesmo, produzia notáveis programas radiofônicos. Era um gênio e um gênio do piano, mas… preferiu tocar A Arte da Fuga, ou metade dela, ao órgão. Claro, vocês sabem que Glenn Gould era dado a estranhas opções de andamentos e brigava com muita gente boa, como Lenny Bernstein. Mas eu aprovo este CD, apesar de alguns críticos atacarem a digitação muito pouco “organística” de GG. Se o CD é estranho pela utilização de órgão por parte de Gould, ele é absolutamente sensacional a partir da faixa 10, onde retorna definitivamente o piano. Ele acentua tudo de forma demasiada no órgão — não sei explicar — é também muito bonito.
O grande René Denon postou estes CDs em 2019 com muito mais categoria. Bem 
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A música barroca é algo realmente sem fim e, cada vez que posto mais um bom compositor, fico impressionado com uma proporção que antes não via em minha cedeteca. O troço não acaba nunca e pasmo para a época em que meu pai nos concebeu — falo de mim, FDP e CDF. Este CD foi gravado em 1970 e relançado em 2003 pela providencial gravadora APEX, que está nos trazendo de volta coisas antológicas. Aqui, temos o grande Nikolaus Harnoncourt e seu Concentus musicus de Viena cuidando de outro austríaco, Fucks, digo, Fux. Já notaram como esses compositores barrocos viviam bastante? Fucks, digo, Fux viveu 81 anos e sei de uns vinte que ultrapassaram a idade vivida por meu pai (65 anos). Johann Joseph Fucks, digo, Fux nasceu em Hirtenfeld na Áustria. Foi filho de camponeses e autodidata em música. Foi Kappelmeister e compositor da corte. É autor do Gradus ad Parnassum, o mais importante tratado de contraponto já escrito. Fucks, digo, Fux morreu em Viena. Deixou 405 obras além do Gradus ad Parnassum que é um diálogo, em latim, entre professor e aluno, seguido de exercícios de composição.
William Byrd foi um compositor inglês da Renascença. Considerado um dos maiores compositores britânicos, teve grande influência, tanto da sua Inglaterra natal como do continente. Ele escreveu em muitas das formas correntes na Inglaterra na época, incluindo vários tipos de polifonia sagrada e secular, teclado (a chamada escola virginalista) e música para grupos. Embora tenha produzido música sacra para serviços religiosos anglicanos, em algum momento durante a década de 1570 ele se tornou católico e passou a escrever música sacra católica. Byrd foi o compositor mais importante da época de William Shakespeare. Seus salmos e motetos, bem como seus madrigais, estão entre as composições mais aclamadas do século XVI. Ele também escreveu obras para órgão e piano.
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Kenneth Schermerhorn (1929-2005) estava estudando com Bernstein durante a criação de West Side Story e foi até considerado um possível maestro para a estreia. Finalmente tendo sua chance quase 50 anos depois, Schermerhorn conduz a partitura com uma autoridade e entusiasmo que revela seu conhecimento íntimo e convicções pessoais, mesmo que às vezes seus andamentos se arrastem (como em I Feel Pretty). Esta gravação utiliza a partitura de Bernstein em sua forma original, antes de passar pelas revisões necessárias para torná-la mais adequada às necessidades do teatro musical da época. Na verdade, tudo soa praticamente o mesmo, as distinções mais óbvias são alguns compassos faltando perto do final do Prólogo e o arranjo vocal diferente para America. A Sinfônica de Nashville toca com uma mistura ideal de elegância sinfônica e jazzística que mostra por que esta obra é um clássico tão maravilhoso. Apenas a gravação multimicrofonada e obviamente destinada ao estúdio, com suas vozes artificialmente próximas, decepciona um pouco. No entanto, este CD recria fielmente o mundo mágico e fascinante que é West Side Story, e qualquer pessoa que venha a esta peça novamente terá uma experiência rara e especial. (

Não adianta. Nem todos são Beethoven, Mozart ou meu pai. Mas alguns podem chegar a um bom patamar como este Beck. Suas obras são muito boas, muito agradáveis, mas sem aquela faísca que um gênio colocaria em determinado momento para virar o jogo. Ele representa a Escola de Mannheim e foi, em vida, um equivocado. Imaginem que ele fugiu da Alemanha, chegou a Veneza e Nápoles, terminando por fixar-se em Marselha por ter participado de um duelo em que pensou ter matado seu oponente. Mas não matou. Seu inimigo talvez esteja vivo até hoje… A vida é assim mesmo. Ele compôs um apreciado Stabat Mater (não Matar, como eu tinha escrito em ato falho), muitas sinfonias e aberturas. O CD é bom, muito bom até. Mas não é Mozart, nem Haydn, nem… vocês sabem.
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Ignoro quem foi o autor desta façanha. Além do bitrate rasante, todos os CDs com esta gravação de Gardiner têm também uma obra de Schütz, compositor que amo, chamada O Bone Jesu, Fili Mariae. Quem botou este CD na rede esquartejou a coisa, retirando esta peça que abria o disco e que deve ser interessante. E, por falar em esquartejamento, Membra Jesu Nostri é um ciclo de sete pequenas cantatas compostas em 1680. A letra, Salve mundi salutare – também conhecida como Rhythmica oratio – é um poema atribuído às vezes a São Bernardo de Claraval (1153), outras vezes a Arnulf de Louvain (1250), ambos da ordem cisterciense. Cada uma das sete partes em que se divide a obra é dedicada a uma parte do corpo crucificado de Jesus: pés, joelhos, mãos, costas, peito, coração e cabeça. É música sacra da melhor qualidade. Buxtehude, tenho a dizer que era imenso compositor, organista admiradíssimo por meu pai – que viajou algumas vezes para encontrá-lo e vê-lo tocar – e que seria mais conhecido, não fora a presença sufocante de papai em nossa cultura. Entre nós, os mais jovens da família, era conhecido como tio Bux.

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Esta é uma gravação de 1963 quando Bernstein ainda não tinha desenvolvido o “seu próprio Mahler”. É uma versão vendida bem baratinho pela Sony, meio que com vergonha daquilo de Lenny fez depois na DG. Foi tão, mas tão barato que comprei mesmo sabendo da decepção. Claro, é de alto nível, mas vários maestros fizeram depois versões muito superiores. Abbado, por exemplo. O excelente filme Tar fala muito nesta música que foi composta entre 1901 e 1902, principalmente durante os meses de verão na casa de férias de Mahler em Maiernigg. Entre suas características mais distintivas estão o solo de trompete que abre a obra com um motivo rítmico semelhante à abertura da Sinfonia nº 5 de Ludwig van Beethoven, os solos de trompa no terceiro movimento e o Adagietto tão frequentemente executado. A sinfonia é geralmente considerada a sinfonia mais convencional do compositor, mas mesmo assim ela tem várias peculiaridades. Ela “quase” tem uma estrutura de quatro movimentos, já que os dois primeiros podem ser facilmente vistos como um só. A sinfonia também termina com um rondó, no estilo clássico. Algumas surpresas são a marcha fúnebre que abre a peça e o Adagietto para harpa e cordas que contrasta com a orquestração complexa dos outros movimentos.

Na verdade, acho que Glass teve um bom começo como compositor e depois foi superado por vários outros minimalistas. E olha que só ponho na conta os norte-americanos! Neste momento de decadência artística, teve que encarar a realidade e atirou-se a uma série de projetos cinematográficos, operísticos, teatrais e de merchandising pessoal — principalmente o último — , sem nunca retornar à qualidade que tinha no início de sua carreira. Mas há quem goste. E quando gostam são agressivos e escabelados na defesa de um telhado de vidro.
Kevin Volans nasceu em Pietermaritzburg, na África do Sul. Sua formação musical foi orientada na direção do classicismo europeu. Mais tarde, abraçou a vanguarda europeia. Inevitavelmente, porém, a África emergiu luminosa de suas composições. “A luz, as texturas, as cores e a paisagem africanas, além dos sons dos pássaros e os insetos são totalmente diferentes da Europa. É um ambiente mais ambiental do que cultural”, explica. “Você pode alternar as culturas como quiser, mas não posso negar o fundo ambiental de meu continente.”
Os mais antigos aqui no PQP sabem da enorme admiração que tenho pelo trabalho do Kronos Quartet. Sinônimo de qualidade + ousadia, o Kronos realizou este disco com, nada mais nada menos, o próprio Piazzolla ao bandoneón.
Belíssimo CD do compositor erudito e baixista inglês 

Em primeiro lugar, dirijo-me aos neófitos: trata-se de música do século XX, o que pressupõe que o ouvinte conhece e gosta de música atonal, de dissonâncias, de ambientes tensos, e não procura linha melódica… Os devotos exclusivos de Mozart ou Haydn, em termos de quartetos de cordas, correm o risco de se assustarem… Por outro lado, os aventureiros correm o risco de se apaixonarem por este disco magnífico, magistral, com obras de grande intensidade e de interesse constante, que revela música profunda e soberba, no topo da sua arte, com o extraordinário Quarteto LaSalle, cuja discografia é infelizmente muito pequena.