A Sinfonia no. 7 foi, como já sabemos, um clamoroso sucesso e teve várias reapresentações nos meses que se seguiram à sua estreia. Beethoven estava ciente de que tinha ouro em mãos e por isso postergou sua publicação, para a aproveitar a exclusividade de execução e negociar em posição mais vantajosa com as editoras. Quando a Op. 92 enfim foi à prensa, em 1816 – quatro anos depois de sua composição e três depois da estreia -, rapidamente apareceram vários arranjos, como era a praxe da época para a divulgação de obras sinfônicas, que permitiam não só o estudo das mesmas, mas também sua execução por amadores em domicílios ou por conjuntos instrumentais menores, bem como a pirataria, preocupação recorrente do compositor, e sobre a qual não tinha o menor controle depois da publicação.
Um desses arranjos surgiu quase que simultaneamente à obra original, pelo que se infere que, mesmo que claramente não tenha sido feito por Beethoven, deve ter pelo menos contado com sua ciência e aprovação. Embora se desconheça o autor do arranjo, é bastante provável que ele seja da lavra do boêmio Wenzl Sedlák (1776-1851), que fez outras transcrições semelhantes de obras do renano para um octeto de sopros semelhante àquele para o qual Ludwig já escrevera música em Bonn, ao qual somou um contrabaixo.
Nesta gravação que lhes alcanço, o conjunto de sopros liderado pela sensacional Sabine Meyer preferiu, num ato escancarado de, ahn, nepotismo de naipe, trocar o contrabaixo por um contrafagote. O noneto resultante, como já ouvimos num outro disco, tem um som encantador. Há que, claro, se dar um desconto para ele na primeira audição, pois o portento que é a Sétima, toda cheia de cordas e de ferozes ataques a elas, não conseguiria ser transposto para um conjunto menor sem perdas. Quem superar o estranhamento e, talvez, a sensação de incompletude saboreará uma interpretação maiúscula, tanto nas execuções individuais quanto no conjunto. Não se pode deixar de comentar que Sabine Meyer, consagrada solista, tem amargas memórias do ano e pouco que passou como clarinetista da Filarmônica de Berlim, da qual foi uma das primeiras integrantes femininas e (supõe ela que por isso mesmo) defenestrada por votação dos demais músicos ao final do período de experiência. Ouvi-la liderar um conjunto numa execução tão competente duma obra sinfônica, portanto, agrada-me muito e, luvadas de pelica à parte, dá-me a certeza de que os filarmônicos berlinenses não lhe fizeram falta alguma.
Consta que Sádlak, o arranjador, transformou pelo menos seis das sinfonias restantes em nonetos. Seu arranjo para a Oitava, talvez a que mais se preste à formação e aquela que mais se adequa à longa tradição germânica da Harmoniemusik, foi infelizmente perdido. Assim, Sabine Meyer e seus sopristas encomendaram seu próprio arranjo, feito pelo catalão Joan Barcons, e que vocês também ouvirão a seguir.
Ludwig van BEETHOVEN (1770-1827)
Sinfonia no. 7 em Lá maior, Op. 92, em arranjo para noneto de sopros
Composta entre 1811-12
Publicada em 1813
Dedicada ao conde Moritz von Fries
Arranjo anônimo contemporâneo, provavelmente feito por Wenzl Sedlák (1776-1851)
1 – Poco sostenuto – Vivace
2 – Allegretto
3 – Presto – Assai meno presto
4 – Allegro con brio
Sinfonia no. 8 em Fá maior, Op. 93, em arranjo para noneto de sopros
Composta em 1812
Publicada em 1817
Arranjo de Joan Barcons (1942)
5 – Allegro vivace e con brio
6 – Allegretto scherzando
7 – Tempo di menuetto
8- Allegro vivace
Sabine Meyer Bläserensemble
Diethelm Jonas e Thomas Indermühle, oboés
Reiner Wehle e Sabine Meyer, clarinetes
Sergio Azzolini e Georg Klütsch, fagotes
Klaus Frisch e Bruno Schneider, trompas
Klaus Lohrer, contrafagote
“Tudo o que você sempre quis saber sobre o contrafagote, mas tinha medo de
lhe baterem com um e preferiu não perguntar”
Vassily
Que trabuco esse contrafagote! E quantas informações interessantíssimas nesse post.
Um banho de cultura pra começar bem o dia.
Esses vídeos da OAE são muito bons, já tinha visto muitos, mas não esse do contrafagote.
Vocês são mesmo demais de bom!
Sensacional, né? Eu quase morro de rir com o contraste entre a calma didática do distinto cavalheiro em seu fleumático sotaque inglês e os sons cavernosos com que ele ilustra sua ótima apresentação. Quando ele mostra a diferença entre as palhetas, hahaha, eu me esborracho.
Que coisa linda essa Sinfonia 7 tocada com sopros. Eu fiquei arrepiado com o Allegretto. No primeiro movimento, algumas vozes me soaram claras como nunca e reveladora de detalhes que eu nunca antes havia percebido!
Confesso que nos últimos tempos tenho redescobrido a sétima (talvez a sinfonia menos ouvida por mim dentre as grandes sinfonias de Beethoven). Engracado como a idade muda a percepcao musical.
Bom dia,
Fantástico o vídeo… agora que conheço, vou respeitar o contrafagote…, mas o irmão dele (ou será o filho?) é que é sublime… que o diga, “una furtiva lacrima”.
Bom retorno de quarentena a todos…