Nesta sexta postagem da série dedicada as sinfonias de Joseph Haydn (1732 — 1809) vamos trazer aos amigos do blog mais três CDs com a Austro-Hungarian Haydn Orchestra sob aregência do maestro Adam Fischer. Estas sinfonias marcam a época em que o compositor mostra sua maturidade e consolidou sua fama de grande músico. O sucesso profissional de Haydn não foi acompanhado em sua vida pessoal. Seu casamento com Maria Anna Keller em 1760 não produziu um lar agradável e pacífico, nem filhos. A esposa de Haydn não entendia de música e não demonstrou interesse no trabalho do marido. Seu desdém foi ao extremo de usar os manuscritos dele para forros de panelas. Haydn não era insensível às atrações de outras mulheres e, durante anos, manteve um caso de amor com Luigia Polzelli, uma jovem mezzo-soprano italiana a serviço do príncipe.
As três sinfonias do CD 16 foram escritas em Esterhaza em 1774, por sinal um ano movimentado em que Haydn recebeu recompensas extras de seu patrono. A sinfonia no.55 em Mi bemol maior, popularmente conhecida como “Der Schulmeister” (The Schoolmaster) a origem de seu apelido não é clara, mas foi listada em 1805 pelo assistente de Haydn, Eissler, como “Der verliebte Schulmeister”. O primeiro movimento começa com quatro acordes em fortíssimo, seguidos por uma resposta mais suave das cordas. Sinfonia elegante e bela. No segundo movimento temos um tema simples no qual alguns detectaram a mão do pedagogo e sua subsequente paixão. Haydn faz diversas variações sobre o tema, mantendo durante a maior parte do movimento a textura simples de duas vozes, com violinos dobrando um ao outro e viola dobrando violoncelo e contrabaixo. O jocoso minuet tem um trio contrastante para violinos e violoncelo solo, enquanto o Rondo final reserva uma seção apenas para os quatro instrumentos de sopro. A sinfonia termina com uma troca espirituosa entre todos os instrumentos em uma breve coda. A sinfonia nº 56 inicia elegantemente, na sequência a orquestra se junta em arpejo descendente, gentilmente respondida pelas cordas, que mais tarde introduzem o elegante segundo tema. O movimento lento desta sinfonia é um primor, aberto por violinos e depois silenciados, seguido pelo surgimento de um fagote solo, acompanhado pelas cordas. O movimento, à medida que prossegue, traz um uso efetivo dos dois oboés e passagens lindas do violino. O Prestíssimo final agitado proporciona empolgação no encerramento desta bela obra. A sinfonia nº 57 começa com uma introdução lenta, seguida por um Allegro energético, o destaque desta obra é o final rápido de movimento quase perpétuo, uma peça de escrita tecnicamente exigente.
O CD 17 começa com a sinfonia número 58 em Fá maior que foi datado de 1768. Já a sinfonia número 59 em Lá maior, apelidada de “Feuersymphonie” (Fire Symphony), pode ter adquirido seu epíteto descritivo por associação a uma peça encenada no teatro Eszterháza, e parece pelo menos ter sido utilizado, alguns anos após a sua composição, como um “entr’acte” para a peça de teatro. Em 1774, Haydn, agora estabelecido definitivamente em Eszterháza, fez uma sinfonia para a peça “Der Zerstreute“, uma adaptação da comédia francesa “Le distrait“, de Jean François Regnard, apresentada pela trupe de teatro liderada por Carl Wahr, que vinha se apresentando em sucessivas temporadas para o príncipe Nikolaus. A distração do personagem principal, sobre a qual a comédia gira, ecoou na música incidental de Haydn, a base de sua sinfonia número 60 em dó maior (“Il Distratto“) com seis movimentos. Marcada para uma orquestra que inclui trompetes e tímpanos, ela inicia com uma espécie de abertura, com um imponente Adagio inicial e um animado Allegro. O segundo movimento é o andante e nos oferece uma melodia suave, interrompida com mais pelos instrumentos de sopro e na seção central descrevendo uma antiga melodia francesa . Há um minuet e trio, sugerindo influência camponesa local. As cordas entram em uníssono no presto que se segue. O sexto movimento é um prestissimo que aparece mais uma canção folclórica, identificada por estudiosos como “O Vigia Noturno” e, em consequência, uma alusão à narrativa da peça. Sensacional este último movimento !
A sinfonia n ° 61 em ré maior que inicia o CD 18 pertence a um período ligeiramente posterior da vida de Haydn. Foi escrito em 1776, numa época em que predominavam os interesses do príncipe Nikolaus Ezsterházy no teatro e na ópera, com grupos de teatro visitantes trabalhando em Eszterháza e um teatro de marionetes estabelecido lá em 1773. Haydn forneceu música para óperas em ocasiões especiais, mas a presença sazonal dos atores e os requisitos do teatro de marionetes envolviam o fornecimento de música incidental para uma variedade de peças alemãs, incluindo traduções de Shakespeare. Embora o material da sinfonia 61 não possa ser diretamente associado a nenhuma das peças conhecidas por terem sido apresentadas em Eszterháza, ele pertence a um grupo de sinfonias que fazem uso de músicas incidentais originalmente destinadas a acompanhar os dramas. A vigorosa abertura Vivace desta sinfonia é seguida por um Adagio em movimento e um Menuet alegre, com a repetição habitual após um trio contrastante. Há um movimento final particularmente teatral que parece contar sua própria história. A Sinfonia número 62 é bela
e dramática, uma das obras do mestre que é relativamente desconhecida do período intermediário, compostas por volta de 1780 em Eszterháza, quando Haydn, cada vez mais ocupado com atividades teatrais, muitas vezes adaptava seus trabalhos de palco em sinfonias. A sinfonia número 63 em dó maior, conhecida como “La Roxelane”, parece ter sido concluída em sua segunda versão em 1780. O primeiro movimento foi retirado da abertura de Haydn para a ópera “Il mondo della luna”, encenado em Eszterháza em 1777. O movimento lento, do qual a sinfonia leva seu nome popular, foi retirado da comédia de “Favart Les trois sultanes”, aparentemente apresentada em Eszterháza em 1777 por uma trupe visitante. A própria Roxelane é uma das mulheres do elenco, e notavelmente problemática. Uma ótima obra, para encerrar esta postagem. Deliciem-se com mais estas nove sinfonias do mestre Haydn, sempre com a magnífica Austro-Hungarian Haydn Orchestra sendo regida pelo mestre Adam Fischer !
Disc: 16 (Recorded May 1996 (#55-57))
1. Symphony No. 55 (1774) in E flat major (‘The Schoolmaster’), H. 1/55: Allegro di molto
2. Symphony No. 55 (1774) in E flat major (‘The Schoolmaster’), H. 1/55: Adagio, ma semplicemente
3. Symphony No. 55 (1774) in E flat major (‘The Schoolmaster’), H. 1/55: Menuet & trio
4. Symphony No. 55 (1774) in E flat major (‘The Schoolmaster’), H. 1/55: Finale, prestissimo
5. Symphony No. 56 (1774) in C major, H. 1/56: Allegro di molto
6. Symphony No. 56 (1774) in C major, H. 1/56: Adagio
7. Symphony No. 56 (1774) in C major, H. 1/56: Menuet & trio
8. Symphony No. 56 (1774) in C major, H. 1/56: Finale, prestissimo
9. Symphony No. 57 (1774) in D major, H. 1/57: Adagio-allegro
10. Symphony No. 57 (1774) in D major, H. 1/57: Adagio
11. Symphony No. 57 (1774) in D major, H. 1/57: Menuet & trio, allegretto
12. Symphony No. 57 (1774) in D major, H. 1/57: Prestissimo
Disc: 17 (Recorded May 1996 (#58-60))
1. Symphony No. 58 (1775) in F major, H. 1/58: Allegro
2. Symphony No. 58 (1775) in F major, H. 1/58: Andante
3. Symphony No. 58 (1775) in F major, H. 1/58: Menuet alla zoppa-trio
4. Symphony No. 58 (1775) in F major, H. 1/58: Finale, presto
5. Symphony No. 59 (1769) in A major (‘Fire’), H. 1/59: Presto
6. Symphony No. 59 (1769) in A major (‘Fire’), H. 1/59: Andante o più tosto allegretto
7. Symphony No. 59 (1769) in A major (‘Fire’), H. 1/59: Menuetto & trio
8. Symphony No. 59 (1769) in A major (‘Fire’), H. 1/59: Allegro assai
9. Symphony No. 60 (1774) in C major (‘Il distratto’), H. 1/60: Adagio-allegro di molto
10. Symphony No. 60 (1774) in C major (‘Il distratto’), H. 1/60: Andante
11. Symphony No. 60 (1774) in C major (‘Il distratto’), H. 1/60: Menuetto & trio
12. Symphony No. 60 (1774) in C major (‘Il distratto’), H. 1/60: Presto
13. Symphony No. 60 (1774) in C major (‘Il distratto’), H. 1/60: Adagio (di Lamentatione)
14. Symphony No. 60 (1774) in C major (‘Il distratto’), H. 1/60: Finale, prestissimo
Disc: 18 (Recorded May 1996 (#61 & 63) and June 1997 (#62))
1. Symphony No. 61 (1776) in D major, H. 1/61: Vivace
2. Symphony No. 61 (1776) in D major, H. 1/61: Adagio
3. Symphony No. 61 (1776) in D major, H. 1/61: Menuet & trio, allegretto
4. Symphony No. 61 (1776) in D major, H. 1/61: Prestissimo
5. Symphony No. 62 (1781) in D major, H. 1/62: Allegro
6. Symphony No. 62 (1781) in D major, H. 1/62: Allegretto
7. Symphony No. 62 (1781) in D major, H. 1/62: Menuet & trio, allegretto
8. Symphony No. 62 (1781) in D major, H. 1/62: Finale, allegro
9. Symphony No. 63 (1781) in C major (‘La Roxelane’), H. 1/63: Allegro
10. Symphony No. 63 (1781) in C major (‘La Roxelane’), H. 1/63: La Roxelane, allegretto (o più tosto allegro)
11. Symphony No. 63 (1781) in C major (‘La Roxelane’), H. 1/63: Menuet & trio
12. Symphony No. 63 (1781) in C major (‘La Roxelane’), H. 1/63: Finale, presto
Rainer Küchl, violin
Wolfgang Herzer, cello
Gerhard Turetschek, oboe
Michael Werba, bassoon
Austro-Hungarian Haydn Orchestra
Conductor: Adam Fischer
Não me furtarei a postar algumas linhas, em complemento – a rigor desnecessário – e principalmente em eco às de nosso Ammiratore, admirável em sua oferta deste tesouro musical que são as sinfonias do mestre de Rohrau. Daquelas que conformam este volume os meus destaques vão para a de n.57, grandiosa, já querendo deixar antever alguns dos futuros trabalhos destinados a Paris e Londres; 59, que em alguns momentos faz recordar e respirar os ares Sturm und Drang de sinfonias de números antecedentes; e a de n.60, inusitada pelo número de movimentos mas principalmente pelo brilhantismo de seu conjunto, particularmente do último, como já salientado. Mais uma fornada de obras do sempre inventivo, elegante e denso Haydn!
Aproveitando o ensejo: tenho para mim que a gravura do salão de concertos do Palácio Esterházy não é de Viena, e sim do Haydnsaal, em Eisenstadt, cidade em que a família para quem Haydn trabalhava residia.