Em algum lugar eu li e nunca mais esqueci: “Schubert nasceu para a música como as fagulhas saltam para o ar. De todos os compositores com um dom acima do mortal, o seu foi talvez o mais espontâneo, o mais abundante, o mais puramente lírico”. Sem dúvida estas Sonatas que ora vamos compartilhar com os amigos do blog em duas partes são uma pequena porção do gênio criativo e abundante criador de melodias que foi Schubert. Todos os escritores dizem que ele era amável, sincero, alegre, generoso, sem o menor vestígio de rancor ou inveja. Se algum de seus amigos dava um baile, ele era capaz de improvisar valsas durante horas. Alguns compositores vivem para a música. Schubert era a música. Diz a lenda que ele dormia muitas vezes de óculos a fim de não ter que perder tempo a procura-los se lhe ocorresse alguma ideia a noite. O amigo de Schubert o pintor Moritz von Schwind disse certa vez: “Não poderia haver existência mais feliz. Todas as manhãs, Schubert compunha alguma bela peça e toda tarde ia passear e encontrava os amigos, tocava e cantava, ficávamos arrebatados, depois íamos a alguma taverna jogar bilhar e beber. Não tínhamos um tostão, mas éramos felizes”.
Devemos a redescoberta das Sonatas ao grande pianista austríaco Artur Schnabel, cujas execuções dessas obras vieram como grande revelação ao mundo musical. As sonatas para piano de Schubert permaneceram desconhecidas um tempo muito longo. Para se ter uma ideia Rachmaninov não sabia de sua existência. Um dos motivos pode ser que o caráter das sonatas tem visão diferente da forma convencional, são obras longas, “comprimento celestial”, e tocante leveza lirica vienense. Schubert venerava Beethoven e parece que ele estava muito consciente de suas próprias deficiências, não em ideias ou inspiração, mas em controlar o material que dispunha e desenvolvê-lo de maneira pianística. As sonatas, não são tão dramáticas quanto as de Beethoven e nem tão conhecidas quanto as de Mozart ou ainda tão conhecidas como os seus Impromptus. No entanto elas são alegres e ótimas de ouvir.
Confesso que quando me deparei com este álbum num sebão do centro de São Paulo ainda no início deste século, fiquei emocionado. Acho as performances de Kempff (1895 – 1991) atraentes, com uma variedade fabulosa de cores tão apropriadas à música de Schubert, interpreta as sonatas com um romantismo lírico contido. As leituras são silenciosas, meditativas e focadas. Como Kempff afirma em suas anotações: “Schubert revela seus segredos mais íntimos para nós no pianíssimo”, gravou as sonatas de Schubert entre 1965 e 1969 em Hannover, Alemanha dividi em 2 postagens os 7 CDs da coleção.
A DG resolveu colocar em ordem decrescente as sonatas, nesta primeira parte com 4 CDs temos a última das sonatas de 1828 (dois meses antes da morte prematura do gênio), a maravilhosa Sonata em Ré maior, D960, esta obra começa como muitas das canções de Schubert e seu primeiro tema suave domina o movimento. O movimento lento tem uma bela serenidade e é seguido por um scherzo delicadamente gracioso. O alegre rondo final sugere a influência do movimento final do quarteto op. 130 de Beethoven, este final exemplifica a qualidade da dimensão celestial da música de Schubert tantas vezes citado pelos escritores. O brilho translúcido da interpretação de Kempff da sonata D840 combina maravilhosamente e acredito que faz valer a afirmação (um tanto exagerada talvez) de que “Schubert é como Beethoven no céu”. Kempff está inspiradíssimo quando interpreta as cinco delicadas peças que completam o primeiro CD elas são obras de beleza única, adoro o piano de Schubert com o Kempff. Resumindo um pacotaço com a mais sublime e delicada música pela música (Schubert).
Schubert Sonatas primeira parte – Wilhelm Walter Friedrich Kempff
CD1
01 – Sonata No.21 in B flat major, D.960 – I. Molto moderato
02 – Sonata No.21 in B flat major, D.960 – II. Andante sostenuto
03 – Sonata No.21 in B flat major, D.960 – III. Scherzo Allegro vivace
04 – Sonata No.21 in B flat major, D.960 – IV. Allegro ma non troppo
05 – Five Piano Pieces (Sonata No.3 in E major), D.459 – I. Allegro moderato
06 – Five Piano Pieces (Sonata No.3 in E major), D.459 – II. Allegro
07 – Five Piano Pieces (Sonata No.3 in E major), D.459 – III. Adagio
08 – Five Piano Pieces (Sonata No.3 in E major), D.459 – IV. Scherzo Allegro
09 – Five Piano Pieces (Sonata No.3 in E major), D.459 – V. Allegro patetico
CD2
01 – Piano Sonata No. 19 in C minor, D. 958 Allegro
02 – Piano Sonata No. 19 in C minor, D. 958 Adagio
03 – Piano Sonata No. 19 in C minor, D. 958 Menuetto & Trio, Allegro
04 – Piano Sonata No. 19 in C minor, D. 958 Allegro
05 – Piano Sonata No. 20 in A major, D. 959 Allegro
06 – Piano Sonata No. 20 in A major, D. 959 Andantino
07 – Piano Sonata No. 20 in A major, D. 959 Scherzo & Trio, Allegro vivace… Un poco piu lento
08 – Piano Sonata No. 20 in A major, D. 959 Rondo, Allegretto
CD3
01 – Schubert, Sonata No.18 in G major, D. 894, I. Molto moderato e cantábile
02 – Schubert, Sonata No.18 in G major, D. 894, II. Andante
03 – Schubert, Sonata No.18 in G major, D. 894, III. Menuetto. Allegro moderato
04 – Schubert, Sonata No.18 in G major, D. 894, IV. Allegretto
05 – Schubert, Sonata No.17 in D major, D. 850, I. Allegro vivace
06 – Schubert, Sonata No.17 in D major, D. 850, II. Con moto
07 – Schubert, Sonata No.17 in D major, D. 850, III. Scherzo. Allegro vivace
08 – Schubert, Sonata No.17 in D major, D. 850, IV. Rondo. Allegro moderato
CD4
01 – Piano Sonata No. 16 in A minor, D. 845 (Op. 42) Moderato
02 – Piano Sonata No. 16 in A minor, D. 845 (Op. 42) Andante poco moto
03 – Piano Sonata No. 16 in A minor, D. 845 (Op. 42) Schero & Trio, Allegro vivace… Un poco piu lento
04 – Piano Sonata No. 16 in A minor, D. 845 (Op. 42) Rondo, Allegro vivace
05 – Piano Sonata No. 15 in C major (‘Relique’), D. 840 Moderato
06 – Piano Sonata No. 15 in C major (‘Relique’), D. 840 Andante
07 – Piano Sonata No. 14 in A minor (‘Grande Sonate’), D. 784 (Op. posth. 143) Allegro giusto
08 – Piano Sonata No. 14 in A minor (‘Grande Sonate’), D. 784 (Op. posth. 143) Andante
09 – Piano Sonata No. 14 in A minor (‘Grande Sonate’), D. 784 (Op. posth. 143) Allegro vivace
Wilhelm Walter Friedrich Kempff – Piano
Ammiratore
Schubert por Kempff! Double treat! Muito bom! Na verdade, ótimo!
Abração!
MOlivero
Oi Mário, gosto muito da leveza do Kempff para estas sonatas de Schubert.
Abração !
Este texto que vc cita no início é do encarte de uma coleção de LPs do Reader’s Digest, “Música dos grandes Mestres”. Me acompanhou na infância, e este texto sobre Schubert também me marcou. Foi por conta dele que resolvi, muito mais tarde, estudar o fenômeno da inspiração. Obrigado pela lembrança.
Isso mesmo Das Chucruten, só não lembrava se era da coleção da Reader’s ou da Abril “Clássicos de todos os tempos”.
Para mim esta marcante frase também me acompanhou desde a infância. Muito feliz o autor.
Obrigado !
Alguns críticos dizem das “limitações técnicas de Kempff”, imagina… Conheci seu trabalho com um disco lindo de peças de Bramhs, muito elogiado pela revista Classic CD que os melômanos daqui devem bem se lembrar. Esse dele tocando Schubert eu não conhecia, muito grato pela postagem.
Oi Juca, obrigado pelo comentário. No dia 31/01 , aniversário de Schubert, postaremos a parte 2.
Valew