Colloquium olympicum (fictum): Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) – As Sonatas para piano – Glenn Gould (4/4)

MI0000960404[epílogo das três partes anteriores, retomando do ponto em que Amadeus ficou horrorizado com o andamento frenético com que Gould tocou uma de suas sonatas, a ponto de exclamar “So ein spiellen und scheissen ist bey mir einerley!”]

GOULD: Assim fica melhor? [toca novamente o Allegro moderato da Sonata em Dó maior, K. 330, mas dessa vez adota o andamento mais lento de sua gravação de 1958]. Melhor?
MOZART: Melhor, sim. Mas as indicações dinâmicas – o contraste entre forte e piano, os sforzandi
G: “Culpado, meritíssimo!”. Eu nunca toco sforzandi, “já que eles representam um elemento de quase-teatralidade pelo qual minha alma puritana tem vigorosa objeção”.
M: (cautelosamente) Mas o que dizem os críticos? Quero dizer, acerca dos sforzandi que faltam e o resto…
G: (com uma gargalhada) Oh, os críticos! Deveria ler-lhe o que um desses cavalheiros escreveu sobre minha interpretação para sua Sonata em Lá maior? “É muito difícil captar o que Gould tenta provar, a não ser que o boato de que ele realmente odeia essa música seja verdadeiro. Andamentos são dolorosamente lentos, a articulação picotada e destacada viola a estrutura frasal (e muitas das indicações específicas de Mozart) […] isso tudo evoca a imagem de um moleque tremendamente precoce mas muito sacana tentando aprontar uma para seu professor de piano”.
M: (inseguro de si mesmo) E você, er, realmente odeia essa música… minha música?
G: (sinceramente) Não, Sr. Mozart. É verdade que eu a ouço, entendo e interpreto diferentemente da maior parte das pessoas, e sem dúvidas diferentemente de você, “e tenho certeza de que frequentemente você não aprovaria o que eu faço com sua música. No entanto, mesmo que seja cego, o intérprete tem que estar convicto de que está fazendo a coisa certa e de que ele pode achar maneiras de interpretá-la das quais nem o próprio compositor estaria ciente”.
M: Poderia pedir-lhe para tocar-me uma de suas interpretações que você acha que eu aprovaria?
G: Que tal o Alla turca de sua Sonata em Lá maior?
M: (nervosamente) Er…
G: (com uma gargalhada) Não se preocupe, não o tornarei um Presto, quanto menos um Prestissimo. Muito pelo contrário: vou tocá-lo como um Allegretto, como você mesmo indicou (e como, acrescento, ele é raramente ouvido).
M: (com dúvidas) E também com os contrastes entre piano e forte?
G: Esses, também! (com uma gargalhada) Ainda mais porque não há sforzandi neste movimento!
M: Nota por nota, então, como eu o escrevi?
G: Nota por nota – exceto por alguns pequenos arpejos na coda, que dá ao movimento seu toque “turco”.
M: Bem, então… eu sou todo ouvidos!

[Michael Stegemann, 1994 – Tradução de Vassily]

MOZART – THE PIANO SONATAS – GLENN GOULD

Wolfgang Amadeus MOZART (1756-1791)

AS SONATAS PARA PIANO (4/4)

Sonata no. 15 em Fá maior, K. 533/K. 494
01 – Allegro (K. 533)
02 – Andante (K; 533)
03 – Rondo. Allegretto (K. 494)

Sonata no. 16 em Dó maior, K. 545, “Sonata facile”
04 – Allegro
05 – Andante
06 – Rondo. Allegretto.

Sonata no.17 em Si bemol maior, K. 570
07 – Allegro
08 – Adagio
09 – Allegretto

Sonata no. 18 em Ré maior, K. 576
10 – Allegro
11 – Adagio
12 – Allegretto

Fantasia em Ré menor, K. 397 (385g)
13 – Andante

Fantasia em Dó menor, K. 475
14 – Adagio

Glenn Gould, piano

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Vassily Genrikhovich

5 comments / Add your comment below

    1. Salve, Joaquim!
      Uma dessas dezenove sonatas (Si bemol maior, K. 498a), durante muito tempo atribuída a Mozart, é de autoria de August Müller – caso semelhante à da Sinfonia no. 37, que é de Michael Haydn, com um movimento acrescentado por Mozart.

  1. Essas declarações do Glenn são famosas e ridículas. Fossem ditas por um pianista menos famoso, cairiam rapidamente na chacota. Somente o Réquiem de Mozart, tivesse Mozart composto só ele e nada mais, já o colocaria como um gênio musical, mesmo inconcluso, e valeria por toda sua vida, mesmo que ele tivesse vivido 200 anos. E vale umas 1000 vidas do Glenn. Um mero intérprete. Bom, mas não dos melhores, na minha opinião.

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