Postado originalmente em 05.09.2012
Há poucos dias o colega PQP postou aqui “Mandé Variations”, de Toumani Diabaté, e pouco depois eu revalidei uma postagem minha de 2010 com o CD “New Ancient Strings”, do mesmo instrumentista malinês. Nesse post falei um pouco da kora, espécie de harpa da África Ocidental, e disse que só considero possível entender uma tal música como clássica.
Liguei ainda essa tradição clássica à herança dos povos mandê e alguns outros, que constituíram impérios de grande extensão, poder e riqueza cultural numa vasta área da África Ocidental, a partir do que chamamos século X.
Hoje trago um pouco mais de Toumani, desta vez junto com um músico simultaneamente mais velho e mais novo: Ali Farka Touré (1939-2006) já tinha 26 anos quando Toumani nasceu – no entanto sua música remonta, de modo geral, mais à síntese que se formou no século XX entre o que permaneceu na África e o retorno das aventuras musicais realizadas por afrodescendentes na diáspora, sobretudo no Caribe e nos EUA. Touré tocava violão – instrumento que não remonta aos antigos impérios, e o tocava muitas vezes com sabor de blues, de salsa, até de choro.
Já Toumani, embora mais jovem, cresceu no caldo de um movimento de reafirmação das antigas tradições culturais mandê, que teve seu auge nos anos 50 e começo de 60, no bojo dos grandes movimentos pela re-independização política dos povos africanos. Seu pai Sidiki Diabaté (1923-1996) foi um nome representativo desse movimento que (deixa eu ver minha cola aqui, da qual perdi o link – hehehe) teria se chamado Jurana Kura, e este CD contém inclusive música composta por ele.
Neste disco, de certa forma o “velho moderno” retorna ao universo da tradição acompanhado do “jovem antigo”, sem deixar de trazer seu tempero – nem deixar que ele encubra o sabor da tradição. O resultado… vocês vão ouvir.
“In the Heart of the Moon” – No Coração da Lua – foi gravado em 2005, em três sessões realizadas no auditório da cobertura do Hotel Mandé na atual capital do Máli – Bamako -, com vista para o Rio Níger. Antes desse encontro, Ali e Toumani haviam se encontrado esparsamente e tocado juntos um total de três horas, ao longo de 15 anos. Aí sentaram e gravaram este CD sem ensaios… pelo menos é o que se divulgou!
Não vou comentar nada do disco em detalhe, exceto que a faixa 4, intitulada em francês “O senhor prefeito de Niafunké”, se refere ao fato de Ali Farka Touré ter sido eleito prefeito da sua cidade no meio das temporada de três sessões de gravação. Consta que na véspera da eleição ele não estava fazendo campanha e sim gravando parte deste disco… Chamo atenção para o começo dessa faixa, especialmente as “falas” do violão quando está liderando, e pergunto se vocês já não ouviram coisas parecidas na música de um determinado país exótico da América do Sul…
Para terminar, uma observação minha: muitas vezes tenho a impressão de ouvir aí um sabor de modo lídio – aquele que seria uma escala maior não fosse a quarta aumentada – portanto uma escala sobre-maior, por assim dizer. Acho que não é bem, e não tenho condições de levantar no momento, mas sei que traz um “up”, um quê de espíritos do fogo dançando “nas pontas dos pés”, com leveza, brilho e ao mesmo tempo substância…
Mas vou deixar que vocês viajem sua própria viagem. Agora vai!
IN THE HEART OF THE MOON (2005)
Ali Farka Touré, violão
Toumani Diabaté, kora (harpa mandê)
01 Debe
02 Kala
03 Mamadou Boutiquier
04 Monsieur le Maire de Niafunké
05 Kaira
06 Simbo
07 Ai Ga Bani
08 Soubou Ya Ya
09 Naweye Toro
10 Kadi Kadi
11 Gomni
. . . . . . . BAIXE AQUI – download here
Ranulfus
Postagem excelente, Ranulfus! Sim, parece música brasileira mesmo. Infelizmente, não toco no violão, mas isso, naturalmente, não me impede de gostar de seu som. A harpa idem.
Lindo álbum. Curiosidade: este ano saiu no Brasil um disco do Diabate em parceria com o Arnaldo Antunes e o Edgard Scandurra, que em algumas faixas, principalmente lá pro final, em “Rio seco” e “Yacine”, soa como o Paco de Lucia. A corá do Diabate de fato parece brasileira às vezes, há momentos em que me lembra o Almir Sater! Deixo um link aqui. Parabéns pelo blog.
http://www.mediafire.com/?527ghvy3v4sv3nk
Ranulfus,
tenho escutado este CD há alguns dias, e que coisa linda! Contraria um pouco o senso comum que se tem da música africana, que se imagina ser sempre eminentemente percussiva. Aqui as melodias são lindas, ricas e extremamente delicadas. Gostei muito!
Sensacional a vasta obra de Ali Farka! Muito agradecido pelo post!
Música para fazermos viagens infindas livres de fumaça e de pó.
Infelizmente não pude baixar nada do Toumani Diabaté. snif snif.
O MEGA e o PQP share são fantásticos, nunca tive problemas com eles e não tem que baixar nenhum arquivo.exe
Obrigado
Valeu, Ranulfus! (Pô, achei que tivesse esquecido.)
Forte abraço.
Obrigado pela disponibilização de acervo fantástico. Sem uma fonte como
esta dificilmente poderiamos haurir tão grande beneficio para nossa cultura.
Vocês demonstram grande paciencia, um dominio muito bom da área e alem
de tudo são leves no contato com os usuarios. Adorei as ultimas postagens!
Gostaria de uma abordagem sobre a chaconne da partita Nº.2 in D minor
BWV1004 de J.S.Bach.
Bye! abraços
Nao consigo baixar os discos africanos pelo MEGA.CO.NZ. Saberm como corrigir isso. Possuo um MacBook Air
Verei se meus colegas de blog têm alguma dica em relação a isso, Edson – mas isso certamente demorará vários dias, pois todos têm mil outras atividades… Suponho que o mais fácil e rápido fosse você baixar em outra máquina (de amigo, lan house etc.) e depois transferir para a sua.
Edson,
Possuo um iMac e tenho baixado tudo direitinho no MEGA.CO.NZ.
Ele baixa rapidamente até 99% e demora um pouco para chegar nos 100%.
Me avise se não conseguir assim mesmo.
Um abraço,
Avicenna