Eis um disco letal para quem por desventura for alérgico a beleza (e olhe que há quem seja). Este disco é um gravíssimo atentado à feiura. Sob a direção da teoerbista austríaca Christina Pluhar (também alaudista e harpista), o grupo L’Arpeggiata vem realizando gravações de extrema excelência e beleza, com rica instrumentação, sobre um repertório de princípios do barroco, mais temas e estilos tradicionais. Explorando bastante o gênero chaconne (caracterizado pelas variações sobre a repetição de uma breve sequência harmônica, com um baixo ostinato). Aqui o L’Arpeggiata conta com uma verdadeira constelação de artistas, a exemplo do impressionante grupo vocal Barbara Furtuna da Corsega (liderado pelo expressivo cantor Maxime Merlandi); também a soprano Nuria Rial, o consagradíssimo Philippe Jaroussky, o barítono Fulvio Bettini e o tenorino napoletano Vincenzo Capezzuto (este, se não é um anjo, canta como tal. Ouçam para crer – faixa 18 ‘Stù Criatu). Como evidencia o título, é um disco no qual se reuniram peças com uma finalidade conceitual e sacra: VIA CRUCIS – Rappresentazzione della Gloriosa Passione de Cristo, à maneira de um Intermedi sacro renascentista. Peças do século XVII se mesclam a temas da Corsega e do Sul da Itália. Um dos arrebatadores momentos do disco é a faixa 3 – Maria, canção composta sobre uma canção tradicional dos pastores de Carpino, La Carpinese – destaque para o cornetto do virtuosíssimo Doron David Scherwin. Assim como também são impressionantes as outras faixas de canto corso nas quais atua o grupo Barbara Furtuna: Suda Sangre, Stabat Mater e Lamentu di Ghjesu sopra La Follia. O disco se divide em três segmentos: Maria – La Visione (faixas 1 a 5), La Morte de Xsto – O diu, tante suffranze (faixas 6 a 13) e Ci vedrem in paradiso (faixas 14 a 18). Tive a felicidade de encontrar esta beleza na Fnac do Chiado, em Lisboa, numa promoção inacreditável, na qual discos da Harmonia Mundi, por exemplo, variavam entre 2 e 9 euros. Este custou 5! Em nosso desventurado país não custaria menos de 80 contos. Como escreveu Tennessee Williams, “às vezes Deus aparece tão de repente…” rs
- L’Annociation – H. I. F. Von Biber
- Ninna nanna alla Napoletana – Ann. – P. Jaroussky
- Maria (sopra La Carpinese, trad.) – Barbara Furtuna.
- Hor ch’è tempo di dormire – Tarquinio Merula – Nuria Rial
- L’Aria – H. I. F. Von Biber
- Lumi, potete piangere – Giovanni Legrenzi – Nuria Rial, P. Jaroussky
- Suda Sangre – Trad. corso – Barbara Furtuna
- Queste pungente spine – Benedetto Ferrari – P. Jaroussky
- Voglio morire – Luigi Rossi
- Stabat Mater – Trad. corso – Barbara Furtuna
- Stabat Mater – Giovanni Felice Sances – Nuria Rial
- Passacaglia – Maurizio Cazzati
- Lamentu di Ghjesu (sopra La Follia) – Roccu Mambrini e L’ensemble Tavagna
- Ciaconna – Tarquinio Merula
- Laudate Dominum – C. Monteverdi – Nuria Rial
- Canario – Lorenzo Allegri
- Ciaccona di Paradiso e dell’Inferno – Ann. – P. Jaroussky, Fulvio Bettini
- ‘Stù Criatu – Enzo Gragnaniello (n.1954) – Vincenzo Capezzuto
Wellbach