Sobre a cantora: nos 20 ou 30 anos em que esteve no auge da carreira, Jessye Mae Norman (Augusta, Georgia, 1945 — New York, 2019) foi provavelmente a maior intérprete do repertório em alemão: Beethoven, Schubert, Wagner, Mahler, Strauss, Schoenberg… Outro dia uma amiga que morou em Viena por 20 anos me disse que, além da tremenda voz, ela cantava especialmente bem em alemão. Incompetente para opinar sobre esse idioma, falei com os colegas de blog Karlheinz e Vassily, que confirmaram: Jessye era absolutamente idolatrada na Alemanha e sua dicção na língua alemã era belíssima.
Sobre o compositor: outro dia vi alguém falar que a relação entre T.W. Adorno e A. Schönberg era praticamente o que hoje os jovens chamam de broderagem. Talvez fosse… O fato é que gente inteligente como o escritor Adorno e o maestro-compositor-TV-star L. Bernstein superestimaram a figura de Schönberg como grande luz que iluminaria a música erudita por séculos. Uso aqui “superestimar” com um pouco mais de rigor do que o uso hoje muito comum dessa palavra (a cantora A lançou um hit ontem, está no 1º lugar no spotify, os fãs da cantora B dizem: superestimada). Refiro-me ao impacto que Schönberg teve sobre a música nos, digamos, 50 anos após a sua morte: foi grande, mas nada comparável à influência de Beethoven nas décadas de 1830-1880 ou de Chopin nas décadas de 1850-1900. Estou falando tanto da influência sobre outros compositores como sobre os públicos, casas de edição de partituras, o vasto mundo lá fora: foi superestimada. Por outro lado, seria um erro descartar a obra do alemão. Erwartung é, na minha opinião, um dos seus pontos mais altos. E discordo de CDF Bach, abaixo, quando ele diz que não é algo bonito de se ouvir.
O. Messiaen disse sobre essa obra, em uma entrevista: “pode ser verdade que a escola serial escreveu apenas sobre assuntos mórbidos e obras quase sempre passadas à noite. Não é por acaso que Erwartung de Schoenberg se passa à noite e é um assunto horrível, uma mulher que vê o cadáver de seu amante… – [entrevistador] E podemos adicionar Wozzeck e… – Muitas outras que são obras-primas, sem dúvida, mas são obras-primas sombrias.
Pleyel
(a seguir a postagem original de 2009)
É tão compreensivo que um ouvinte rejeite a música de Schoenberg. Como sentir prazer diante de algo que só é possível assimilar (caso assimile) acostumando o cérebro às dissonâncias e contrastes expressionistas, muitas vezes reveladoras de uma face pouco encantadora da natureza humana? No entanto como podemos ser completos, observando o mundo e a nós mesmos, se não lidamos com todos os aspectos conflitantes, como aqueles revelados na literatura de Dostoievski e tão bem aceitos por nós? Mas a música, por ser algo mais direto, parece ter aceitação quando apenas nosso lado romântico, engraçado, virtuoso ou divino é mostrado.
Erwartung de Schoenberg é um monodrama sobre medo e o descontrole. Alguns críticos a chamam de música freudiana. Não é realmente algo bonito de se ouvir. A história é um monólogo psicológico sobre uma mulher que espera seu amante numa floresta, até que ela descobre o corpo do rapaz assassinado. A partir daí ela começa a ter uma série de distúrbios e lembranças sobre uma possível traição dele ou até mesmo dela ter sido a autora do crime. A obra foi escrita para soprano e orquestra com pavorosas situações de desespero e agonia. Jessye Norman confessou que foi o papel mais difícil de sua carreira. Mas como foi recompensador o seu esforço, não há quem a supere aqui.
Quem vai encarar?
Para aqueles que não vão nessa empreitada, tentem ouvir as músicas de cabaret de Schoenberg. São lindíssimas e engraçadas, com destaque para a última faixa do disco que não canso de ouvir.
Arnold Schoenberg (1874 – 1951):
1-9. Erwartung, Op.17
10. Cabaret Songs – Galathea
11. Cabaret Songs – Gigerlette
12. Cabaret Songs – Der genügsame Liebhaber
13. Cabaret Songs – Einfältiges Lied
14. Cabaret Songs – Mahnung
15. Cabaret Songs – Jedem das seine
16. Cabaret Songs – Seit ich so viel Weiber sah
17. Cabaret Songs – Nachtwandler
Jessye Norman – soprano
Metropolitan Opera Orchestra (NYC, USA)
Conducted by James Levine
CDF Bach
Excelente postagem CDF!
Tenho algumas perguntas (espero que não se importe):
Por acaso vc saberia onde encontro a partitura de Gurrelieder na net?
Existe alguma caixa com toda a obra de Schoenberg?
Vc tem algo de Havergal Brian? Fiquei curioso pois li que ele escreveu 32 sinfonias!
Abraço
Eu tenho a tal Sinfonia Gótica.
“a partitura de Gurrelieder na net?”
Não saberia dizer, já tentou no google?
“Existe alguma caixa com toda a obra de Schoenberg?”
Nem perto disso. Ainda não vi um disco triplo com obras de Schoenberg. Mas esse dia vai chegar, pelo menos as obras que receberam os opus.
“Vc tem algo de Havergal Brian?”
Nunca ouvi falar. Mas pretendo conhecer.
O plural de opus é opi.
Gosto muito da música de câmara no. 2 dele (opus 38). É uma peça mais assimilável do que outras mais adiantadas.
–––––
Havergal Brian
Aqui tem a no. 1, “Gótica”, que entrou pro Guinness e tal:
http://theconcerthall.blogspot.com/2008/11/havergal-brian-symphony-no-1.html
A “Gótica” é uma sinfonia bem curiosa, vale ouvir. É gigantesca.
Aos Filhos de Bach que se interessarem por algum Requiem dos compositores que eu citar por favor só dizer que trato de disponibilizar. Os compositores: Aeternitas, Alfred Schnittke, Andre Campra, Andrew Lloyd Webber, Antonin Dvorak, Bendetto Marcello, Benjamin Britten, Cristobal de Morales, Domenico Cimarosa, Eustache du Caurroy, Frank Martin, Franz von Suppe, Gaetano Donizetti, Gyorgy Ligeti, Hector Berlioz, Heinrich Ignaz Franz von Biber, Jan Dismas Zelenka, Jean Richafort, Johannes Ockeghem, John Reutter, Krzysztof Penderecki, Lorenzo Perosi, Luigi Cherubini, Maurice Durufle,Orlando di Lasso, Paul Hindemith, Pierre Tabart, Robert Schumann, Tomas Luis de Victoria eZbigniew Preisner. UFA!
A propósito CDF, as aulas de história da música agradecem suas postagens. valeu!
Achei alguém que mais de réquiens do que eu.
Caros
o texto da 9. Erwartung, Op.17 traduzido para português
http://www.confrariadovento.com/revista/numero14/poesia01.htm
adoro requiens tb
Dr Cravinhos
Bem, eu não sei qual a faixa etária das pessoas que visitam o blog, porque quem lembra do super nintendo? Do Mario World? Pois é… eu fiz um arranjo, amador, da música que toca no castelo do jogo. Quem quiser ouvir basta digitar no youtube “Mario World – Castle Theme Orchestra” é o 4º vídeo da lista. Se tiver alguém que saiba de arranjo, aceito dicas. valeu!
Acho a música de Schoenberg muito interessante, até pelo fato dela ainda ser música e não uma coleção de sons que posso ouvir em qualquer lugar ao meu redor.
Ok ok… Vocês venceram.
Abriram o meu ouvido para Schoenberg.
Grande postagem!!!
Obrigado!
Dr Cravinhos , muito obrigado pelo link!
Ivo Barroso é um dos grandes tradutores deste país e reponsável , salve engano meu, pela excepcional tradução da poética de Rimbaud, dentre outras.
Claro que Schoenberg é um do maiores compositores do Universo e sua obras são sempre bemvindas.
Ainda bem que o Samuel já concorda.
Jamais encontrei algo de Schoemberg que não fosse obra de um gran gênio da música.
Igualmente ele sai-se muito bem nas obras didáticas.
Sempre vale qualquer postagem do Schoemberg.
Elas enriquecem este blog.
Abração.
Edson
Concordo com o Edson.
Um dos maiores atrativos desse blog, sem sombra de dúvida, é o destaque dado ao vienense Schoenberg, provavelmente o maior compositor do século XX, e que foi alvo de injusto preconceito por muito tempo – rejeitado de início pelos conservadores por ser inovador demais, e mais tarde pelos inovadores por ser conservador demais.
O segredo para apreciá-lo é esquecer o que ele disse e o que dele foi dito, e simplesmente ouvir sua música.
Concordo com o Edson.
Um dos maiores atrativos desse blog, sem sombra de dúvida, é o destaque dado ao vienense Schoenberg, provavelmente o maior compositor do século XX, e que foi alvo de injusto preconceito por muito tempo – rejeitado de início pelos conservadores por ser inovador demais, e mais tarde pelos inovadores por ser conservador demais.
O segredo para apreciá-lo é esquecer o que ele disse e o que dele foi dito, e simplesmente ouvir sua música
Estou escrevendo atrasado , mas não importa. Queria só deixar uma sugestão para quem , como eu , não sabe por que lado abordar a música moderna. Clarice Lispector, em seus últimos livros, escreveu coisas instigantes e estranhamente engraçadas sobre esse gênero de música (e não só). Está lá na dedicatória de “A Hora da Estrela” e em outras partes desse livro , e perpassa todo o denso poema em prosa “Água Viva”, onde a música é contraponto de uma escritura dita “atonal” (mas que às vezes concede em ser cantabile).
EU ADORO A HITORIA
Olha… Ao ler o texto, fiquei
muito na vontade de ouvir…
Só que o link está com erro e
não pode mais ser baixado…
Poderiam upar novamente o disco?
“Error
This file is neither allocated to a Premium Account, or a Collector’s Account, and can therefore only be downloaded 10 times.
This limit is reached.
To download this file, the uploader either needs to transfer this file into his/her Collector’s Account, or upload the file again. The file can later be moved to a Collector’s Account. The uploader just needs to click the delete link of the file to get further information.”
Se for possível postar novamente, fico extremamente grato.
Obrigado.
olá, é possível colocar novo link?
saudações,
anderson.
por favor, vc poderia repostar? agradeço desde já.
Olá,
seria possível respostar a obra?
muito obrigado!
Camilo
Amigos do PQP
Consegui o disco e uploadeei. Eis o link:
Shoenberg – Canções de Puteiro
http://www.megaupload.com/?d=TCQJQRSQ
Aproveitem. Eu adorei essa obra.
Os links não estão mais ativos.